Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
8/07.5TBSNT.S1
Nº Convencional: 3ª SECÇÃO
Relator: MAIA COSTA
Descritores: CÚMULO JURÍDICO
NULIDADE INSANÁVEL
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
MATÉRIA DE FACTO
Data do Acordão: 05/11/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: ANULADO O ACÓRDÃO RECORRIDO
Sumário :

I - Padece de nulidade, o acórdão que procede à operação de cumulo jurídico de penas impostas ao recorrente, se nele se omitiu:
- a referência à data do trânsito em julgado das diversas decisões que o condenaram nas penas parcelares (só é dada essa informação relativamente à decisão proferida nestes autos e à proferida noutro processo), não se podendo, assim, avaliar se existe uma relação de concurso entre elas;
- a indicação das penas parcelares aplicadas nos processos A e B, referência essencial, já que não são as penas conjuntas neles cominadas que entram no concurso global, mas sim as respectivas penas parcelares;
- o destino das penas de prisão suspensas dos processos C e D, pois que tendo se esgotado há muito os prazos de suspensão dessas penas, ignora-se se elas foram declaradas extintas ou se foram cumpridas como penas de prisão. Só neste último caso essas penas poderão entrar no concurso, na medida em que o art. 78.º, n.º 1, do CP, deverá ser interpretado como compreendendo no concurso apenas as penas cumpridas, mas já não as extintas ou as prescritas, caso em que terão que ser excluídas do concurso.
- os factos relativos à personalidade do arguido, ao ignorar o relatório social presente nos autos, sendo este um instrumento fundamental para apurar os factos referentes à personalidade do condenado, obviamente de valor muito superior, pelo desenvolvimento da informação e pela isenção da fonte, ao das declarações do próprio arguido, nas quais o Tribunal recorrido se baseou.
- a ocorrência de ressarcimento dos danos provocados, a que muito vagamente se alude no acórdão (“tem pago parte das quantias a que se referem os processos acima indicados”), mas que convirá determinar com a maior precisão possível, em ordem a avaliar o valor daquela atenuante, relevante para a fixação da pena única – art. 71.º, n.º 2, al. e), do CP.
II - Perante tal quadro de omissões essenciais, impõe-se a respectiva anulação da decisão, por insuficiente fundamentação de facto, nos termos do disposto nos arts. 374.º, n.º 2, e 379.º, n.º 1, al. a), do CPP.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:


I. RELATÓRIO

AA, com os sinais dos autos, foi condenado nas seguintes penas parcelares:
- nos autos: por factos ocorridos entre Outubro e Novembro de 2001, foi condenado em 18.7.2008, pela prática de um crime de burla agravada, p. e p. pelos arts. 217º e 218º, nºs 1 e 2, a) e c), do Código Penal (CP), na pena de 3 anos de prisão;
- no proc. nº 510/02.5GHSNT, da Vara Mista de Coimbra, foi condenado em 2.4.2004, pela prática, em 27.9.2002, de um crime de burla agravada, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 anos;
- no proc. nº 10080/99.4TDLSB, da 6ª Vara Criminal de Lisboa, foi condenado em 18.11.2005, pela prática, em Abril de 1999, de um crime de falsificação, p. e p. pelo art. 256°, nº 1, c), do CP, na pena de 1 ano de prisão, e de dois crimes de burla agravada, p. e p. pelos arts. 217° e 218°, nº 2, a), do CP, respectivamente, na pena de 3 anos de prisão e na pena de 3 anos e 6 meses de prisão, tendo em cúmulo jurídico destas três penas sido condenado na pena única de 4 anos e 6 meses de prisão;
- no proc. nº 481/03.0SILSB, da 8ª Vara Criminal de Lisboa, foi condenado em 12.8.2006, pela prática, em 27.1.2003, dos crimes de burla qualificada e de falsificação de documento, na pena única de 3 anos e 3 meses de prisão;
- no proc. nº 588/04.7TATVD, do 1° Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Torres Vedras, o arguido foi condenado em 28.11.2006, pela prática, em Junho e Julho de 2004, de um crime de burla e de três crimes de burla qualificada na pena única de 6 anos e 10 meses de prisão;
- no proc. nº 5342/03.0TDLSB, da lª Vara Criminal de Lisboa, foi condenado em 10.5.2007, pela prática, em 2.9.2002, de um crime de burla qualificada, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão;
- no proc. nº 1548/04.3TDLSB, do 1° Juízo Criminal de Oeiras, foi condenado em 16.6.2008, pela prática, em 1.2.2004, de um crime de falsificação de documento, na pena de 1 ano e 8 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo, com sujeição a regime de prova.
Foi realizado o cúmulo destas penas no Juízo de Grande Instância Criminal de Sintra, da Comarca da Grande Lisboa-Noroeste, por acórdão de 10.11.2010, que condenou o arguido na pena única de 12 anos de prisão.
Dessa decisão interpôs o arguido recurso para este Supremo Tribunal, concluindo:

1. O recorrente foi condenado em cúmulo jurídico a uma pena única de 12 anos de prisão, a qual é considerada exagerada.
2. A decisão que efectiva o cúmulo jurídico das penas parcelares, tem que necessariamente demonstrar, fundamentando, que além de indicados foram efectivamente avaliados os factos e a interacção destes com a personalidade.
3. No caso vertente o Tribunal a quo não valorou devidamente todos os elementos necessários a uma boa decisão, mais concretamente o imputado ressarcimento dos prejuízos na medida da pena.
4. Por essa razão o acórdão violou o previsto nos arts. 374º nº 2, 379º, 97º nº 5, 410 nº 2 a) e c) todos do CPP, e 70º, 71º, 77º e 78º todos do CP, devendo o mesmo ser declarado nulo e dado sem efeito.
5. É inequívoca a verificação de uma situação de concurso de crimes ou crime continuado, tal como define o art. 30 nº 1 e 2 do CP, cometido pelo recorrente. Donde a verificação deste pressuposto legal só pode levar à imposição de uma única pena nos termos do art. 77º ou 79º do CP.
6. Está-se perante estas duas figuras quando hipoteticamente é concebível a possibilidade de realização de um único julgamento por todos os crimes.
7. Tendo em atenção os crimes praticados pelo recorrente, nomeadamente burla, falsificação de documento, a similaridade do modus operandi, a existência de uma suposta linha ininterrupta em termos temporais da prática dos crimes, sem margem para dúvida que se está perante uma única resolução criminosa/crime exaurido, ou então perante uma situação de um crime continuado, devendo ser aplicada uma única pena com base numa única culpa, não tendo decidido dessa forma violou o Tribunal “a quo” o art. 30º, 77º e 79º todos do CP.
8. A decisão que efectiva o cúmulo jurídico das penas parcelares necessariamente que terá que demonstrar fundamentando que foram avaliados o conjunto dos factos e a interacção destes com a personalidade. Poderá eventualmente concluir por uma impossibilidade de percepção do poliformismo do perfil da personalidade na sua interacção com os actos criminosos.
9. Independentemente da circunstância de a avaliação da personalidade em função dos factos não se poder reconduzir a um apelo a repetidas fórmulas de natureza genérica (que induzem a elaboração de um cúmulo jurídico à revelia dos concretos factores a ponderar) é evidente que, no caso vertente, o denominado modo de vida se consubstancia na existência do concurso de infracções que dá origem à elaboração do cúmulo jurídico.
10. Sendo esta operação um caso especial de determinação da pena que, necessariamente, assume um conteúdo agravativo é evidente que definir a pena conjunta em função da existência de um concurso de crimes constitui uma valoração que, sendo dupla, é inadmissível.
11. A referência à personalidade começa e acaba na referência ao modo de vida não permitindo concluir se o Tribunal avaliou, ou não a personalidade em termos da globalidade dos factos detectando indícios de uma personalidade vocacionada para a prática deste tipo de infracções indicando-se uma tendência que se deverá traduzir num sentido agravativo ou se hipoteticamente, estarem perante uma pluralidade pouco sedimentada na personalidade.
12. O arguido ressarciu totalmente os ofendidos no processo n.º 510/02.5GHSNT, Vara Mista de Coimbra, processo n.º 10080/99.4TDLSB, 6ª Vara, e processo n.º 481/03.0SILSB, 8ª Vara, assim como nos presentes autos, os ofendidos com excepção da C....
13. E quanto à C... esta entidade além de ter faltado sempre ao julgamento que se realizou após decisão do Tribunal da Relação, não ficou em situação económica difícil, o que seria uma agravante no caso concreto.
14. Caso a Lei de Processo Penal que entrou em vigor em Setembro de 2007 abrangesse o arguido nestes processos, art.º 206º, n.º 1 do CPP ou se o arguido tivesse sido julgado mais tarde, isto é, a partir de Setembro de 2007 as penas que lhe foram aplicadas quer na 6ª vara, 8ª Vara, Coimbra não existiriam porque os procedimentos teriam sido arquivados.
15. Assim na aplicação da pena única ter-se-á que ter em conta esta situação, que não poderá prejudicar o arguido, pondo o legislador na mão do julgador, o emendar da situações injustas, tais como não aplicar à lei adjectiva o mesmo principio que o da lei substantiva, ou seja a lei mais favorável ao arguido.
16. Assim no cômputo da pena além da atenuante por ressarcimento dos danos considerando as declarações feitas pelos ofendidos de desistência da queixa e juntas aos autos temos que ter em conta a não existência da pena na vigência da presente lei.
17. Assim, temos que as penas que deveriam ser contabilizadas para efeitos do cúmulo seriam as penas do processo n.º 588/04.7TATVD de Torres Vedras com pena total de 6 anos e 10 meses e da 1ª Vara Criminal, 4 anos e 6 meses e a pena destes autos devidamente atenuada atendendo ao ressarcimento de todos os ofendidos e desistência de queixa com excepção da C....
18. Fazendo a soma aritmética destas penas quase que totalizam a mesma em que o arguido foi condenado.
19. Quanto ao processo que correu termos pelo Tribunal de Oeiras, o mesmo não podia ser sujeito a cúmulo jurídico, já que o Tribunal onde o arguido também ressarciu o ofendido quis-lhe dar um voto de confiança, arquivando o processo quanto ao crime de burla e suspendendo-lhe a pena quanto ao crime de falsificação.
20. Ao integrar esta pena no cúmulo das penas de prisão, está este Tribunal a prejudicar o arguido e a decidir quanto a uma decisão transitada em julgado e não revogada.
21. Por prejudicar as garantias do próprio recorrente não podia esta pena ser englobada no cúmulo sob pena de se violar o caso julgado e garantias de defesa do arguido.
22. Desta forma foi violado o preceituado no art. 50, 56 do CP.
23. Outra interpretação que não seja esta, é violadora e contrária ao preceituado no art.º 32 da CRP.
24. O ideal teria sido apensar os processos, o que teria permitido o julgamento unitário da actividade que respeita aos processos. Como tal não foi feito, a solução para “remediar” a situação deverá ser aquela a que se chegaria se tivessem sido adoptados os procedimentos adequados.
25. A tudo isto acresce, o largo tempo em que o arguido está preso e a interiorização que fez dos factos, o apoio familiar que possui e a sua idade já avançada, factor inibidor de atitudes propensas à prática de novos crimes.
26. Deverá pois, ter-se em linha de conta a idade do arguido, a sua postura processual, as condições de reinserção e o apoio familiar na aplicação da pena final.
27. O arguido demonstrou já arrependimento de uma conduta delituosa que o acompanhou durante alguns anos.
28. A forma de demonstrar esse arrependimento é pagar aos ofendidos, o que tem feito até onde pode.
29. Aliás uma circunstância a que o Tribunal deve atender para determinar a medida da Pena está plasmada na al. e) do nº 2 do artº 71º do C.P. para onde remete o art.º 77º nº 2 do mesmo diploma.
30. Conduta posterior destinada a reparar as consequências do crime. A sua conduta posterior aos factos releva ao nível da prevenção que através desses actos de arrependimento/reparação se mostra acautelada contrariamente ao defendido no Acórdão de que se recorre, que não valorou devidamente a reparação, não o tendo relevado quanto à medida de pena.
31. Demonstra o arguido através da reparação do dano que interiorizou os factos e reconhece o valor do bem jurídico violado.
32. O Tribunal de 1.ª instância violou art. 70.º, 71.º, 72.º, 77.º e 78.º do CP.

O sr. Procurador da República respondeu, dizendo:

1.ª A pena de 12 anos de prisão imposta é adequada visto que o Tribunal considerou que em qualquer dos crimes pelos quais foi condenado o dolo foi muito intenso, que os crimes cometidos pelo arguido AA ao longo dos anos de 2001, 2002, 2003 e 2004, todos os crimes de burla agravada e falsificação, permitem que lhe seja assacado «um perfil que revela uma especial tendência para a prática de determinados ilícitos relacionados com o património (burlas e falsificações)».
2.ª O Tribunal avaliou globalmente a personalidade do arguido e considerou que o conjunto dos factos não sugere uma situação de pluriocasionalidade mas antes uma tendência criminosa. Para mais, para além da evidente necessidade de prevenção especial, o Tribunal invocou razões prementes de prevenção geral.
3.ª De qualquer modo a pena concreta de 12 anos revela que o Tribunal nem sequer aderiu a uma jurisprudência mais”repressiva”, visto que à pena parcelar mais alta (4 A e 6 M) limitou-se a adicionar sensivelmente um terço das restantes penas parcelares.
4.ª Será pois de concluir que a pena é adequada e o Tribunal avaliou bem todos os aspectos que depunham a favor e contra o Arguido, tendo-o referido expressamente, como seja designadamente o ressarcimento aos ofendidos, pelo que não ocorre violação da imposição contida na norma do artigo 374.º,n.º 2 do C. P. P.
5.ª Não é aqui aplicável a figura do crime continuado. As penas parcelares que entraram no cúmulo jurídico superveniente têm a sua culpa definida. Os critérios para a determinação das penas parcelares são diferentes dos critérios com vista à aplicação de uma pena única. Agora trata-se de uma ponderação conjunta em que a “nova culpa” é definida em função da interligação entre todos os factos em presença e a personalidade evidenciada pelo arguido na sua relação entre todos os crimes, razão pela qual não se mostram violadas as normas dos artigos 30.º, 77.º ou 79.º do C. Penal
6.ª As penas suspensas na sua execução não devem entrar no cúmulo jurídico se anteriormente já tiverem sido declaradas extintas nos termos do artigo 57.º do C. Penal.
No caso concreto porém nada nos diz que a pena relativa ao processo do Tribunal de Oeiras tenha sido declarada extinta nos termos sobreditos, pelo que parece também nesse âmbito não assistir razão ao Recorrente.

Neste Supremo Tribunal, o sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu o seguinte parecer:

Nos termos das disposições conjugadas dos artigos 471.°, n.º 1, e 14.°, n.º 2, al. b), do CPP, o tribunal colectivo é o territorialmente competente para cumular as penas parcelares aplicadas ao arguido.
As regras da punição do concurso de crimes com uma única pena mostram-se definidas no art. 77. °, n.º 1, do CP, sendo pressuposto da respectiva aplicação que vários crimes tenham sido praticados pelo mesmo autor e num período temporal limitado pela primeira condenação transitada em julgado pela prática de qualquer um deles.
Quando ocorram os pressupostos do art. 78.º do Código Penal, todos os crimes praticados antes de transitar em julgado a referida primeira condenação por um deles, devem ser punidos com uma única pena, independentemente do facto de a situação de concurso apenas ter sido conhecida em momento temporal posterior.
A ratio da norma é facilmente entendível, já que a falta de conhecimento oportuno do concurso, ocorre amiúde por razões decorrentes das diferentes vicissitudes processuais, as quais não podem redundar em prejuízo do arguido.
Constitui jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal dizer-se que o momento decisivo para a verificação da ocorrência de um concurso de crimes a sujeitar a uma pena única, é o trânsito em julgado da primeira condenação (arts. 77.º, nºs 1 e 2 e 78.º, n.º 1, do CP). E isto, também, por se entender que os crimes cometidos posteriormente a essa decisão transitada, solene advertência que o arguido não respeitou, não estão em relação de concurso, devendo ser punidos de forma autónoma, com cumprimento sucessivo das respectivas penas.
O trânsito em julgado em julgado obstará a quem com essa infracção ou com outras cometidas até esse momento, se cumulem infracções que venham a ser cometidas até esse momento ou se cumulem infracções que venham a ser praticadas posteriormente a esse mesmo trânsito, que funcionará, assim, como barreira excludente, não permitindo o ingresso no circulo de crimes em concurso dos cometidos após aquele limite.
O conjunto temporal definido pelos art. 77 e 78 do CP fixa o máximo alargado de conhecimento das penas conjuntas que pode ser conhecido por uma pena única.
VIII. Conforme tem sido afirmado uniformemente pelo Supremo Tribunal de Justiça, são as conclusões da motivação que determinam o respectivo âmbito.
O quadro legal respeitante à punição do concurso de crimes, encontra-se plasmado no art. 77º do Código Penal, cujo nº 1 estabelece que, “quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa única pena; na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente,” prescrevendo o nº 2 que “a pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e 900 dias tratando-se de pena de multa; e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes.
A propósito deste preceito, refere o Prof. Figueiredo Dias, que “a pena do concurso será encontrada pelo tribunal "em função das exigências gerais da culpa e de prevenção. ... Tudo deve passar-se como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma «carreira») criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade”. (Direito Penal Português – II As Consequências Jurídicas do Crime, pág. 291).
O tratamento, no quadro da pena conjunta, da pequena criminalidade deve divergir do tratamento devido à média criminalidade e o desta do imposto pelo tratamento da criminalidade muito grave, de tal modo que a pena conjunta de um concurso (ainda que numeroso) de crimes de menor gravidade não se confunda com a atribuída a um concurso (ainda que menos numeroso) de crimes de maior gravidade: E daí, por exemplo, que um somatório de penas até 2 anos de prisão – ainda que materialmente o ultrapasse em muito - não deva exceder, juridicamente, 8 anos, por exemplo; que um somatório de penas até 4 anos de prisão não ultrapasse, por exemplo, 10 anos, que um somatório de penas até 6 anos de prisão não ultrapasse, por exemplo, 12 anos.
A medida da pena conjunta só deverá atingir o seu limite máximo absoluto em casos extremos (quatro penas de 20 anos de prisão, por exemplo), devendo por isso o efeito repulsivo/compressor desse limite máximo ser, proporcionalmente, tanto maior quanto maior o limite mínimo imposto pela pena parcelar mais grave e maior o somatório das demais penas parcelares.
IX. Antes de avançarmos, há que dizer que da leitura do acórdão recorrido resulta patente uma deficiente factualização suporte da aplicação da pena conjunta importa ao arguido.
Para além destes "requisitos primários", impõe-se a inserção na fundamentação de facto de outros elementos, igualmente factuais, resultantes da análise da história de vida delitual presente no caso, que concita a particular atenção do julgador, determinando inclusive, a realização de uma audiência adrede marcada para o efeito, com observância do contraditório, e que tem por objectivo a aplicação de uma pena final, de uma sanção de síntese, que corresponda ao sancionar de um conjunto de factos cometidos num determinado trecho de vida, interligados por um elo de contemporaneidade, de que o tribunal tem conhecimento apenas mais tarde. As condições pessoais, familiares e sociais do arguido, dados referentes à personalidade do arguido ao tempo da ocorrência dos factos e a eventual indagação do que é expectável socialmente, quanto a este arguido, quanto ao futuro, acompanhando, nesta parte.
Dados processuais tais como sejam o trânsito em julgado das penas parcelares, em que se refere no acórdão a data do trânsito em julgado da pena aplicada no n.º NUIPC 8/7.5TBSNT, a indicação que transitou em julgado a pena aplicada no NUIPC 10080/99, sem indicação dos demais.
Omissão de investigação quanto ao NUIPC 10/02.5GHSNT e NUIPC n.º 1584/04.3TDLSB, em que houve condenação em pena suspensa e não se averiguou, dado o tempo decorrido se houve revogação das ou se as mesmas foram extintas.
A falta da indicação do trânsito em julgado de todas as penas menos uma não nos permite formular uma relação de cúmulo jurídico, como supra referimos.
XI. Termos em que se emite parecer no sentido em que:
a) São de incluir na facticidade a considerar para efeitos de cúmulo jurídico os dados de factos de forma correcta e completa, de acordo com o exposto supra de modo a poder determinar-se a medida da pena única, em cúmulo jurídico, omissos no acórdão. A nosso ver incorre, aqui, o acórdão numa nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do art. 379.1. al. c) do CPP, com referência ao art. 374.2 do CPP.
b) Somos, deste modo, que o recurso merece provimento, pelas razões antes apontadas. Nomeadamente a omissão das datas da ocorrência da trânsito em julgado das penas parcelares, menos uma.

Foi dado cumprimento ao disposto no art. 417º, nº 2, do Código de Processo Penal (CPP), não tendo o recorrente respondido.
Colhidos os vistos, cumpre decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO

É a seguinte a matéria de facto fixada:

1. Nos nossos autos NUIPC 8/07.5TBSNT, por factos ocorridos entre Outubro e Novembro de 2001, foi o arguido condenado em 18/07/2008, por acórdão transitada em julgado em 28/05/2009, pela prática de 1 crime de burla agravada, p. e p. pelos artºs 217 e 218, nºs 1 e 2, als. a) e c) na pena de 3 anos de prisão.
Nestes autos deu-se como provado que:
Em data não apurada, compreendida entre o dia 1 e 23 de Outubro de 2001, BB comprometeu-se com um colega de sua mulher, de nome CC, em assumir a posição de avalista num contrato de financiamento para aquisição do veículo automóvel marca Audi 3, de cor preta, matricula ...-...-PD, por parte de CC, em virtude deste se encontrar impedido do uso de cheques.
Este veículo encontra-se registado a favor da M... Aluguer Comércio Automóveis S. A, o que BB, sua mulher e CC desconheciam.
O arguido disse a BB e sua mulher que para conseguirem que a C... financiasse todo o valor do veículo Audi 3, seria solicitado o financiamento para um veículo Audi 6, de valor superior e posteriormente, após a concessão do financiamento, a situação seria regularizada pela Shop-car.
Para esse efeito, BB, acompanhado da sua mulher DD, no dia 23 de Outubro de 2001, dirigiram-se a ..., onde se localizava o Stand e foram recebidos por EE.
EE era funcionário de AA e todo o trabalho por ele desenvolvido no stand, era do inteiro conhecimento e segundo indicações precisas deste último.
EE logo se mostrou ao corrente e inteirado do negócio, dispondo-se a ir buscar a documentação necessária e que, segundo ele, correspondia ao aval que pretendiam prestar no contrato de financiamento de aquisição de automóvel do qual seria comprador CC.
Recebendo desta forma no interior do stand, EE apresentou a BB e DD, completamente em branco a proposta de financiamento n.° ..., relativa ao contrato de crédito n° ... da C... — Grupo Banco Espírito Santo, indicando-lhes o local onde deveriam assinar de forma a garantirem o contrato na posição de avalistas.
BB e DD, por serem completamente desconhecedores de tais formalidades, confiaram na boa fé do responsável pelo stand, visto este possuir um estabelecimento aberto ao público com veículos de toda a gama de cilindrada para venda, incluindo veículos de alta cilindrada e por trabalhar com a C..., Financiadora do Grupo Espírito Santo, fazia aparentar toda a legalidade no desempenho comercial e situação financeira credível.
Por estes razões assinaram a documentação no preciso local que lhes foi indicado, plenamente convencidos que subscreviam aquele contrato de crédito, meramente na posição de avalistas.
BB e DD deixaram no stand Shop-car cópia dos seus documentos de identificação, a fim de facilitar, ulteriormente, o preenchimento da proposta relativa àquele contrato de crédito.
O arguido AA preencheu a proposta de crédito identificando o veículo a comprar com sendo um Audi 6, a diesel, matrícula ...-...-NO.
O arguido bem sabia que tal contrato de crédito, não correspondia a um autêntico pedido de financiamento da aquisição do veículo matrícula ...-...- NO, pois este automóvel já tinha sido vendido em Junho de 2001 por si próprio, a FF, tendo este já pago a totalidade do preço ao stand que representava.
O veículo A6 matricula ...-...-NO encontra-se na posse de FF que o adquiriu a pronto pagamento no mesmo Stand” Shop-car “, tendo o negócio de compra e venda sido consumado pelo filho de FF, de seu nome GG, numa altura em que o pai estava ausente do país.
Para integral pagamento do preço do automóvel, de 34.417,01 Euros (trinta e quatro mil, quatrocentos e dezassete euros e um cêntimos), o GG entregou ao arguido AA, dono do Stand o cheque, de que era titular, no valor Esc 5.400.000$00, (de cinco milhões e quatrocentos mil escudos) ou 26. 935,04 Euros (vinte e seis mil, novecentos e trinta e cinco euros e quatro cêntimos) e ainda como retoma o veículo automóvel marca Renault Megane matrícula ...-...-GM, pertencente ao seu pai, FF, no valor de 7. 481,97 (sete mil, quatrocentos e oitenta e um euros e noventa e sete cêntimos).
Passados cerca de dois dias da entrega do cheque n.° ... no valor de 5.400.000$00, ocorrida em 4 de Junho de 2001, FF passou pelo stand e deixou ficar ao arguido cópias do seu Bilhete de Identidade e cartão de contribuinte, ficando assim aquele arguido de tratar da documentação relativa à transferência da propriedade do veículo.
BB nunca contratou com a Credibanco, desconhece o indivíduo chamado II e nunca se dispôs a figurar como titular em qualquer contrato de financiamento para aquisição do veiculo AUDI A6, matricula ...-...-NO ou como avalista da aquisição de veículo não especificado.
Na posse de documentação que lhe tinha sido facultada o arguido em
24/08/2001 efectuou um primeiro registo do automóvel matrícula ...-...-NO, a favor de FF.
Posteriormente a 7/11/2001, o arguido AA preencheu uma declaração de venda com os dados do veículo Audi 6, matrícula ...-...-NO, e nela colocou o nome de FF, imitando a assinatura deste a partir dos documentos pessoais do mesmo, que se encontravam na sua posse e onde colocou também um número de BI que não correspondia à identidade do pretenso subscritor.
Assim, o arguido AA criou uma declaração de venda fictícia do mesmo veículo, que em nada correspondia à verdade, tudo para fazer crer que tal declaração de venda tinha sido preenchida e assinada por FF, legítimo proprietário do veículo, quando sabia que tal automóvel (Audi A 6) nunca tinha sido objecto de venda por este último.
Desta forma, o arguido AA utilizando esta declaração de venda do veículo Audi A6 matrícula ...-...-NO, que nunca existira, nem nunca fora subscrita por FF, conseguiu simular o negócio de compra e venda do veículo Audi A 6 matricula ...-...-NO por FF a BB e assim conseguir o financiamento da C....
Com a simulação deste negócio, o arguido AA conseguiu assim obter novo registo da propriedade do automóvel marca Audi 6, matrícula ...-...- NO, em nome de BB, com reserva de propriedade a favor da C... — Sociedade Financeira para Aquisições S. A., com sede na Avª ...
Com o comportamento acima descrito, o arguido AA elaborou o contrato de financiamento, o n.° ... da C..., de 23/10/2001, para aquisição de veículo cujo preço já estava liquidado, figurando BB e DD como titulares.
Com este seu comportamento, o arguido AA obteve para si enriquecimento ilegítimo no valor de 29.198,70 Euros (vinte e nove mil, cento e noventa e oito euros e setenta cêntimos) correspondente ao financiamento efectuado, à custa do património de BB que, desde logo, ficou obrigado ao pagamento da dívida à C.... (…)
Em consequência do comportamento do arguido AA, FF viu-se envolvido num processo judicial, o que lhe causou tristeza e sentiu-se desiludido.
A apreensão do veículo A6 causou a FF prejuízos, pois ficou impedido de proceder a vendas de carpetes, em feiras, em Espanha assim como a apreensão do veículo sem ter qualquer uso provocou deterioração do mesmo, em montantes não apurados.
Em consequência do comportamento do arguido AA, BB ficou moral e psicologicamente afectado; de cada vez que lhe surgia uma notificação no correio, enquanto não confirmava que respeitava ao processo já seu conhecido, entrava em grande ansiedade; viu-se obrigado a dar uma explicação na sua entidade patronal; perdeu o sono e a vontade de trabalhar; ficou ansioso; sentiu-se vexado; ficou com o nome referenciado como mau pagador; viu-se obrigado a recorrer à ajuda financeira dos filhos.
2. Por acórdão proferido em 02-04-2004 nos autos de processo comum colectivo com o NUIPC 510/02.5GHSNT da 2ª Secção da Vara Mista de Coimbra, o arguido foi condenado pela prática em 27-09-2002 de um crime de burla agravada, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 anos. ----
Nestes autos deu-se como provado que:
- O ofendido HH tinha adquirido o veículo automóvel ligeiro de passageiros. de marca Volkswagen, modelo Golf 1.9 TDI Highline, com a matrícula ...-...-MS, não tendo ainda procedido ao registo em seu favor;
- Necessitando de realizar dinheiro, em Setembro de 2002, o HH colocou, numa revista da especialidade, “Auto Compra e Venda”, de 15 a 30 de Setembro e 1 a 15 de Outubro, um anúncio para venda da viatura;
- Na sequência da publicação do tal anúncio, o HH foi contactado telefonicamente, no dia 20 de Setembro de 2002, por um indivíduo que se intitulou por AA e sócio da empresa “G...& A..., Lda. “, com sede na Rua ..., que lhe disse estar interessado na compra do veículo anunciado;
- Depois de vários contactos telefónicos, combinaram o dia 27 de Setembro de 2002, em Cascais, para o HH lhe mostrar a viatura, dado que se deslocava, em serviço, à zona de Lisboa. O arguido disse ao HH que residia na Quinta da Marinha, razão pela qual o encontro se faria à entrada de Cascais;
- No dia 27 de Setembro de 2002, o arguido compareceu no local combinado, cerca das 19.30 horas, conduzindo a viatura de matrícula ...-...-NN, cor preta, marca Porsche. O arguido efectuou uma vistoria ao veículo Volkswagen e acordou como HH na realização do negócio de compra e venda do veículo automóvel pelo valor de 20,250 euros (vinte mil duzentos e cinquenta euros). Combinaram que o HH lhe entregaria o veículo em Coimbra e, logo nesse dia, o arguido acompanhou-o, na dita viatura, até Coimbra, a fim de, no regresso, nela se fazer transportar para a sua residência. Na estação de serviço de Aveiras o arguido abasteceu o Golf com 25 euros de combustível, pagando com o cartão “American Express”.
- Chegados a Coimbra, o arguido entregou ao HH, para pagamento do veículo automóvel, o cheque n.° ..., sacado sobre o Banif — Banco Internacional do Funchal, retirado de um livro de 150 cheques da empresa ‘G...& A..., Lda” datado para o dia 02.10.2002, no valor de 20.250 euros;
- Convicto de que o arguido dispunha de desafogo financeiro, por se ter apresentado num Porsche e referir que residia na Quinta da Marinha, o HH ficou ciente que ele teria intenção de proceder ao pagamento do preço combinado. Entregou-lhe, por isso, o livrete, o título de registo de propriedade e a declaração de venda referentes ao veículo automóvel e as duas chaves a ele pertencentes. Declaração de venda que se encontrava preenchida pelo titular inscrito no registo, somente quanto ao vendedor. M...& O..., Serviços Médicos, Lda, com a assinatura do seu sócio-gerente notarialmente reconhecida;
- Apresentado a pagamento, o cheque foi devolvido com a indicação de ter sido extraviado, conforme indicação que, entretanto, o arguido, titular da conta sacada, havia comunicado ao Banco;
- O HH telefonou ao arguido para o número de telemóvel ..., que este costumava usar nos contactos telefónicos que com ele mantinha, ao que este respondeu que, quando recebesse o cheque devolvido pelo Banco, lhe ligasse, pois teria dinheiro disponível no cofre e pagar-lhe-ia o valor inscrito do cheque. Depois disso, não mais o HH conseguiu contactar telefonicamente com o arguido, por não atender o telemóvel;
- No dia 17 de Outubro de 2002, o HH deslocou-se ao Cacém à procura da empresa G...& A..., Lda. e foi informado pelos vizinhos que estava encerrada, tendo constatado que a loja estava vazia;
- No dia 29 de Setembro de 2002, apresentando-se como dono do Volkswagen, o arguido vendeu o veículo a P...J...G...A..., pelo preço de 17.209 euros, preço esse que lhe foi pago através do cheque n.° ..., da Nova Rede;
- No dia 2 de Outubro de 2002, o P...J...G...A... veio a vender o veículo a L...J...S...da S..., na posse de quem se encontrava quando, em 18,10.2002. foi apreendido;
- Depois dessa data, ainda era Outubro desse ano, o assistente veio a ter conhecimento que o referido veículo automóvel se encontrava para venda na revista “Auto Compra e Venda”, n.° 43, Ano 10, Série V, pág. 18, onde o anúncio mencionava o valor de 19852 euros e mencionava para contacto o número de telemóvel ..., pertencente ao L...J...S...da S...:
- O arguido agiu voluntária, livre e conscientemente, com o propósito de, usando mecanismos ardilosos, convencer o ofendido que tinha um nível de vida que lhe permitia pagar o veículo e que era sua intenção cumprir o acordado, para obter um enriquecimento que sabia ser ilegítimo. O arguido nunca teve a intenção de proceder ao pagamento do preço acordado, mas usou aqueles mecanismos com o propósito conseguido de convencer o ofendido a entregar-lhe os documentos e o veículo em causa, o que este fez, causando-lhe o prejuízo inerente ao valor acordado para o negócio;
O arguido actuou com o propósito de beneficiar o seu património à custa do assistente, apesar de saber que a sua conduta era contrária à lei (…).
O assistente deslocou-se a Lisboa 3 vezes para tratar de assuntos relacionados com o negócio e com a averiguação do paradeiro da viatura e efectuou várias telefonemas, no que despendeu a quantia global de 250 euros. Não mais conseguiu localizar o arguido. Este não procurou contactá-lo nem reparar o prejuízo.
3. Por acórdão proferido em 18/11/2005, nos autos de processo comum colectivo com o NUIPC 10080/99.4TDLSB da 6ª Vara Criminal de Lisboa, transitado em julgado, o arguido foi condenado pela prática em Abril de 1999, de 1 (um) crime de falsificação, p. e p. pelo art. 256°, n,° 1, al. c). do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão e de 2 (dois) crimes de burla agravada, p.. e p. pelos arts. 217° e 218°, n,° 2, al. a), do Código Penal/95, respectivamente, na pena de 3 (três) anos de prisão e na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão, tendo em cúmulo jurídico destas três penas, o arguido foi condenado na pena única de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão.
Deram-se como provados os seguintes factos:
A assistente A...M...H..., em Abril de 1999, decidiu vender o veículo de que era proprietária, de marca Mercedes Benz SLK 230, matrícula ...-...-JQ.
Solicitou ao seu cunhado, J...H..., que o vendesse com a condição de o adquirente efectuar o pagamento a pronto, em dinheiro ou cheque visado, pelo preço de 8.750.000$00 e de a declaração de venda só ser emitida depois do pagamento.
O J...H... publicitou a venda do veículo no jornal “Auto Hoje”, em dia não apurado de Abril de 1999. -
No dia seguinte à publicação do anúncio, o arguido contactou telefonicamente o J...H..., mostrando-se interessado na aquisição do veículo;
Nesse mesmo dia, fazendo-se transportar num BMW, modelo M3, descapotável, deslocou-se ao escritório do J...H..., situado na Av. 5 de Outubro, apresentou-se como sendo um empresário do ramo da perfumaria, proprietário de três estabelecimentos comerciais, chegando a oferecer ao J...H... diversas amostras de perfumes;
Pediu para ver o veículo com urgência, a pretexto de que a sua mulher fazia anos no domingo seguinte e que pretendia adquiri-lo para lhe oferecer;
O arguido depois de examinar o veículo e de ser informado do preço mostrou interesse em adquirir o Mercedes pelo preço solicitado e disse ao J...H... que, mais tarde, o contactaria;
Na sexta-feira da mesma semana, deslocou-se, de novo, ao escritório do J...H... dizendo que pretendia adquirir o veículo, mas que tinha de o levar naquele dia para o oferecer à mulher;
Propôs pagar o preço do veículo com dois cheques sacados da sua conta n.° ... do Banco Bilbao, com os nºs ... e ..., no montante de 4375000$00, cada um, e datados de 22-04-1999 e 05-05-1999, assegurando que naquelas datas, os cheques podiam ser apresentados a pagamento, pois seriam pagos;
Os cheques já se encontravam assinados e totalmente preenchidos por pessoa não identificada que os preencheu, a pedido do arguido;
O J...H..., convencido que o arguido era um empresário de sucesso do comércio de perfumes aceitou entregar-lhe o veículo nesse dia e receber os dois cheques para pagamento do preço informando-o que apenas lhe entregava a declaração de venda assinada pela proprietária depois do pagamento dos dois cheques, o que o arguido aceitou;
Assim, entregou os supra aludidos cheques e recebeu o veículo bem como o livrete e o registo de propriedade, documento da inspecção periódica e do imposto sobre veículos;
Nesse mesmo dia, o arguido voltou a contactar telefonicamente o J...H... e pediu-lhe que enviasse, via fax, a identificação da proprietária do veículo;
Para um fax indicado pelo arguido, o J...H... enviou ao arguido cópias do verso do 81 e do cartão de contribuinte de A...H...;
No dia 20-04-1999, o arguido apresentou, no Banco Bilbao, na agência do Monte Estoril um requerimento a pedir o cancelamento dos cheques entregues a J...H..., alegando justa causa, falta ou vício na formação da vontade;
Apresentados tais cheques a pagamento foram devolvidos com a menção de revogados, pelo que a A...H... não recebeu a quantia de 8750000$00;
Entretanto, em data não apurada, anterior a 19-04-1999, o arguido, conduzindo o Mercedes que lhe tinha sido entregue pelo J...H... nas circunstâncias acima descritas, dirigiu-se ao stand automóvel pertencente à M... - Comércio de Automóveis, Lda., situada na estrada nacional n..., em Mafra, onde contactou com o sócio gerente, L...E...A..., apresentou-se como comerciante de automóveis e disse ter para venda a viatura em que se transportava;
O L...A... mostrou-se interessado na compra e depois de inspeccionar o veículo ofereceu ao arguido a quantia de 7.550.000$00, pago através de dois cheques, sendo um emitido na data da entrega do veículo, documentos e declaração de venda e o outro uma semana mais tarde;
O arguido aceitou vender o veículo nas condições propostas, levando consigo a declaração de venda para ser assinada pela proprietária do Mercedes;
Em circunstâncias não apuradas, por ordem e cora o conhecimento do arguido, foi preenchido e assinado o requerimento-declaração para registo de propriedade de fls. 921, na qual se fez constar o nome da proprietária do veículo, a sua morada, número do BI, estado civil, identificação do veículo e o nome “A...M...C...de A...J...B...H...” no local destinado à assinatura do vendedor, como se tal documento tivesse sido preenchido e assinado pela proprietária;
Também em condições não apuradas foi preenchida e assinada a declaração de fls. 922, na qual se qual fez constar o nome da proprietária do veículo, número de contribuinte e o nome de “A...M...C...de A...J...B...H...”, como se tal tivesse sido preenchido e assinado pela proprietária do veículo;
No dia 19-04-1999, o arguido entregou no “M...” o veículo automóvel de matrícula ...-...-JQ. o livrete e registo de propriedade, cópia do 81 e número de contribuinte de A...H..., documento da inspecção periódica, do imposto sobre veículos, o requerimento-declaração para registo de propriedade e a declaração;
A cópia do BI e do cartão de contribuinte que o arguido entregou correspondiam ao fax que lhe tinha sido remetido pelo J...H...;
O L...A... na convicção de que as declarações entregues pelo arguido tinham sido emitidas pela proprietária do veículo, adquiriu o Mercedes e entregou ao arguido dois cheques do Banco Fonsecas & Burnay, da sua conta n.° ... titulada pela “M..., Lda.” com os nos ... e ..., respectivamente, no montante de 4.000.000$00 e 3.500.000$00 e datados de 19-04-1999 e 25-04-1999;
Nestas datas, o arguido apresentou os cheques a pagamento apoderando-se da quantia de 7.550.000$00;
A “M...” expôs o veículo para venda no seu stand, situado na Estrada Nacional, n°... em Mafra e publicou um anúncio na revista “Auto Compra e Vende”;
Na sequência deste anúncio e a pedido da A...H..., o veículo e os documentos foram apreendidos e entregues à sua proprietária, no dia 12-05-1999, quando se encontrava exposto no stand;
À data da apreensão o veículo foi avaliado em 7.452.000$00;
O arguido nunca pretendeu pagar o veículo à A...H..., conseguindo apoderar-se do mesmo por ter convencido o J...H... de que era um empresário de sucesso, que pretendia adquirir o veículo com urgência para dar de presente à sua mulher e que os cheques seriam pagos na data neles aposta;
O J...H..., nesse convencimento e uma vez que o arguido aceitou não receber a denominada declaração de venda, entregou-lhe o veículo;
O arguido sabia que, ao pedir cópia do BI da proprietária do veículo e o número de contribuinte, não levantava suspeitas, conseguindo que o J...H... lhe enviasse tais cópias, necessárias para o preenchimento da declaração de venda;
Ao agir de forma descrita o arguido sabia que as menções que um indivíduo a seu mando fez constar no requerimento-declaração para registo de propriedade e da declaração, punha em causa a confiança e credibilidade merecidas por tais documentos, causando um prejuízo ao Estado e a terceiros;
Ao vender o veículo com tais documentos forjados que sabia não terem sido emitidos pela respectiva proprietária, actuou com o propósito de conseguir a venda daquele;
Convenceu o sócio-gerente da “M...”, L...A..., de que era o legítimo portador do veículo, tendo para o efeito exibido e entregue os documentos de identificação e declaração de venda;
36. Mediante as condutas acima descritas, o arguido conseguiu apoderar-se da quantia de 75550.000$OO (€37659,24) à custa de A...H... e da M...;
O arguido agiu livre, deliberada e conscientemente;
Sabia que a sua conduta era proibida por lei;
Com relevância para o pedido civil apurou-se que a M... nunca recebeu os montantes que entregou ao arguido, no total de 7.550.000$00 (€37.659,24);
4. Por acórdão proferido em 12-08-2006 nos autos de processo Comum colectivo com o n.° 481/03.0SILSB da 8ª Vara Criminal de Lisboa, o arguido foi condenado pela prática em 27-01-2003 dos crimes de burla qualificada e de falsificação de documento, na pena única de 3 anos e 3 meses de prisão. ---
Nestes autos deu-se como provado que:
Durante o mês de Janeiro de 2003 o ofendido L...R... publicitou no “Correio da Manhã” a venda da sua viatura BMW, com a matrícula ...-...-IL;
O arguido AA, ao ler o anúncio, entrou em contacto com o ofendido mostrando-se interessado na compra do veículo;
Começou por propor ao L...R... que conduzisse o BMW até uma bomba de gasolina, em Oeiras;
Porém, dado que a viatura se encontrava guardada na garagem da casa do L...R... situada no Largo Casal Vistoso, em Lisboa, acabaram por combinar que o arguido aí se deslocaria;
Assim, cerca das 19h, do dia 27/1/2003, o arguido AA, conduzindo um jeep Mercedes preto e fazendo-se acompanhar de um outro indivíduo, cuja identidade não foi possível apurar, deslocou-se até junto da residência do ofendido, a fim de concretizar a compra da viatura supra identificada;
Tendo aceite pagar por ela o montante de 16.000,00 €;
Enquanto o ofendido estabelecia os termos do contrato com o acompanhante do arguido, que se identificou como sendo A...R..., o AA dava indicações sobre o modo como o negócio se devia realizar;
Mostraram interesse em levar a viatura logo nesse dia, o que foi recusado, tendo o ofendido dito que só a entregaria mediante o pagamento em numerário ou com entrega de cheque visado;
O arguido AA alegou ter muita pressa em fazer o negócio uma vez que já tinha um cliente interessado na sua aquisição e que se não levasse a viatura, pelo menos para o cliente a ver, perdia a oportunidade de fazer o negócio;
Para melhor convencer o ofendido, o arguido AA entregou-lhe a declaração de venda que já tinha começado a preencher, mas o ofendido recusou assiná-la enquanto o pagamento não fosse feito do modo por si pretendido;
O arguido AA mostrou-se sempre muito simpático e sugeriu então que o ofendido deixasse levar a viatura só para mostrar ao cliente, contra a entrega de um cheque que ficaria como garantia e que no dia seguinte a devolveria;
O L...R..., convencendo-se que o arguido estava de boa fé, aceitou entregar-lhe o veículo nos termos sugeridos;
O arguido disse então ao seu acompanhante que preenchesse um cheque e o entregasse ao ofendido, o que este fez, preenchendo o cheque, junto a fls. 15, no valor de 16.000 € da conta da firma “G...e A..., Lda.”, e assinando, como sendo A...R...;
Em circunstâncias não apuradas, o arguido AA, durante o mês de Janeiro de 2003, tinha entrado na posse de uma carteira de cheques da conta aberta no BPN em nome da sociedade “G...e A..., Lda.” cujas quotas tinha adquirido em 20/5/2002 e tinha cedido a A...R... poucos meses depois, em 27/9/2002;
O arguido AA entregou o cheque ao ofendido e este emprestou-lhe a viatura bem como os documentos, junto dos quais se encontrava a cópia do seu BI;
O arguido levou a viatura mas nunca mais a devolveu nem atendeu os telefonemas que o ofendido fez para o número de telemóvel que lhe havia dado;
O L...R..., no dia 3 1/01/2003, quando apresentou o cheque a pagamento foi informado pelos funcionários bancários de que havia problemas com as pessoas relacionadas com a conta sacada;
Ao agir da forma descrita quis o arguido AA induzir o L...R... em erro, resultado que obteve, uma vez que o ofendido acreditou que ele se encontrava de boa fé e só por isso lhe entregou a viatura e os respectivos documentos para que com eles pudesse circular;
O arguido, porém, nunca pensou pagar a veículo ao ofendido;
À data dos factos a viatura valia 16.000,00€;
Na posse do BMW, no dia seguinte, o arguido deslocou-se ao estabelecimento comercial de L...M... e vendeu-lho pelo montante de 12,000€;
O L..., entregou ao AA dois cheques no valor total de 9.500,00 €, um de 5,000€ e outro de 4,500 €, e o restante ficou por conta de uma divida anterior do arguido ao L...;
Tais cheques, como decorre do verso, foram apresentados a pagamento pelo arguido AA no dia 28/1/2003 cerca das 11h. 07m.
Com a entrega dos cheques o L... recebeu os documentos do carro, bem como a declaração de venda a qual o arguido AA ou alguém a seu mando tinha preenchido com os elementos da viatura e com a aposição, por imitação, da assinatura do L...R...;
O L... vendeu de seguida o BMW a J...M...D...de S..., pelo valor de 12.968,00€ tendo-lhe entregue a viatura bem como a declaração
Modelo n°2 e a fotocópia do BI do L...R...;
O J...D..., por sua vez, vendeu-a a J...S..., pelo preço de 14.250, 00€ e entregou-lhe a declaração Modelo n° 2 e a fotocópia do BI do ofendido L...R...;
Posteriormente o J...S... vendeu a viatura a L...A...R... pelo valor de 17.000,00€, tendo entregue a este a viatura bem como a declaração
Modelo n° 02 e a fotocópia do BI do L...R...;
Na posse do documento o L...R... viria a registar o BMW a seu favor;
Ao ter imitado ou pedido a alguém que imitasse a assinatura de L...R..., no documento “Modelo n°2”, visando obter beneficio ilegítimo para si, possibilitou que na Conservatória do Registo Automóvel, de Lisboa, os funcionários de tal serviço tivessem tomado por bom o documento junto a fls. 372 e tivessem feito constar do cadastro da viatura o nome de L...R... desde 5/3/2003;
O arguido agiu livre, deliberada e conscientemente;
Sabia que a sua conduta era proibida por lei;
5. Por acórdão proferido em 28-11-2006 nos autos de processo comum colectivo com o n.° 588/04.7TATVD do 1° Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Torres Vedras, o arguido foi condenado pela prática em Junho e Julho de 2004 de um crime de burla e de três crimes de burla qualificada pena única de 6 anos e 10 meses de prisão. ---
Nestes autos deu-se como provado que:
No dia 17 de Junho de 2004 o arguido AA contactou por telefone J...A...S...G..., a quem disse estar interessado na aquisição do veículo da marca Peugeot, modelo 106, com a matrícula ...-...-QJ, de que aquele era proprietário e tinha colocado um anúncio para venda no jornal “Ocasião”.
Na sequência do contacto telefónico, o arguido e o ofendido J...G... combinaram encontrar-se no sábado seguinte, 19 de Junho, na loja auto deste último, sita em Sobreiro Curvo, A-dos-Cunhados, Torres Vedras.
No referido dia 19 de Junho o arguido AA compareceu no local combinado, tendo-se apresentado com a identidade falsa de “P...C...M...”, dizendo que pretendia comprar o veículo para uma amiga da sua mulher, tendo ambos acordado na venda da viatura pelo valor de € 7.000,00 (sete mil euros).
Na tarde desse mesmo dia, como forma de pagamento do veículo, perante J...G..., AA preencheu com o seu próprio punho e entregou-lhe o cheque com o n.° ..., da conta ...., da Nova Rede, agência da Gare do Oriente, conta essa titulada por P...C...M..., inscrevendo no local da assinatura o nome P...C...M... e, no local a tanto destinado, a quantia de € 7.000,00.
O ofendido J...G..., por acreditar que o arguido se chamava P...C...M... e, como tal, estava habilitado a assinar os cheques referentes à conta acima identificada, entregou ao arguido o veículo Peugeot e toda a documentação referente ao mesmo.
A declaração de venda foi entregue sem preenchimento do comprador.
Nesse mesmo dia 19, J...G... mostrou a AA um outro veículo que tinha para vender, um Jeep Mitsubishi Pajero, com a matrícula ...-...-MT, tendo o arguido declarado na altura que não estava interessado na aquisição do mesmo.
No entanto, cerca das 23H30 desse dia 19, o arguido voltou a contactar telefonicamente o J...G..., a quem disse que afinal tinha uma pessoa interessada no “Jeep”.
Ambos combinaram logo a venda do veículo por € 16.300 (dezasseis mil e trezentos euros), combinando encontrar-se no dia seguinte para concretizar o negócio.
No período da manhã do dia 20 de Julho de 2004, que recaiu num domingo, o arguido AA compareceu a pé no local previamente combinado com o ofendido e, como forma de pagamento do veículo, na presença deste, preencheu com o seu próprio punho e entregou ao J...G... o cheque com o n.° ..., da mesma conta acima referida, inscrevendo no local da assinatura o nome P...C...M... e no valor a quantia de € 16.300,00.
De novo J...G..., por acreditar que o arguido se chamava P...C...M... e, como tal, estava habilitado a assinar os cheques referentes à conta acima referida, entregou ao arguido o Jeep e toda a documentação referente ao mesmo.
A declaração de venda foi entregue sem preenchimento do comprador.
O arguido mais uma vez levou consigo o veículo com a matrícula ...-...- MT, fazendo-o coisa sua.
No dia 22 de Junho o ofendido J...G... depositou o cheque no valor de € 7.000,00 na sua conta no BPI, tendo o mesmo sido devolvido com a menção de “extravio”.
No dia 25 de Junho o ofendido depositou o cheque no montante de € 16.300,00 na sua conta no BPI, tendo o mesmo sido devolvido com a menção de falta de provisão.
J...G... ficou sem os veículos sem ter recebido a contrapartida monetária pela venda dos mesmos, no valor constante dos cheques.
J...G... entregou os veículos ao arguido AA por acreditar, face à conduta deste último, que ele se chamava P...C...M..., era titular da conta referente aos cheques e, como tal, habilitado a emiti-los, o que não correspondia à verdade.
Com efeito, o arguido havia adquirido, em datas e circunstâncias não apuradas, vários impressos de cheques de P...C...M..., e decidiu utilizá-los para adquirir veículos sem ter de pagar as contrapartidas monetárias.
O arguido AA quis agir como agiu, de forma planeada e astuciosa, com intenção de induzir em erro J...G..., fazendo-o crer que se chamava P...C...M... e que, como tal, podia emitir os cheques que emitiu para pagamento dos veículos, o que não correspondia à verdade.
Quis ainda assinar os cheques com um nome que não era o seu, criando a aparência de que tinha sido o titular da conta a assiná-los.
Com data de 17 de Julho de 2004 o arguido preencheu com o seu próprio punho o cheque n.° ..., da conta n.° ..., do Montepio Geral, agência de Massamá, titulada por M...S...R...S..., colocando uma rubrica no local da assinatura.
Apesar de não ser titular da mencionada conta o arguido AA inscreveu no cheque o valor de € 1.400,00 e entregou-o a J...F....
No dia 19 do mesmo mês o J...F... depositou o cheque numa conta por si titulada no Barclays, tendo o mesmo sido devolvido com a menção de cheque revogado, por extravio.
O arguido não era titular da conta acima identificada, pertencendo os cheques sobre ela sacados a uma sua antiga companheira, M...S...R...da S...., com quem vivera como se fossem marido e mulher, a quem não os restituiu após cessarem a vida em comum, bem sabendo que não lhe pertenciam e que não estava autorizado a movimentar a conta respectiva.
No dia 15 de Julho de 2004, T...L...do C...B...F... colocou um anúncio num jornal no sentido de vender um veículo BMW M3, com a matrícula ...-...-XP, do qual era proprietário, tendo encarregue o seu amigo G...A...P...S... de receber os contactos de eventuais interessados, uma vez que iria estar indisponível nos dias imediatos.
No dia 19 de Julho de 2004 o arguido AA contactou com G....S..., a quem declarou estar interessado em ver o veículo, tendo ambos combinado encontrar-se no dia seguinte, junto ao estádio do Belenenses, em Lisboa.
No dia 20 o arguido encontrou-se com G....S..., conforme o combinado, a quem disse chamar-se P...C...M... e que o veículo seria para um jogador de futebol.
Algum tempo depois, AA voltou a ligar para G....S... dizendo-lhe que o jogador de futebol queria comprar o veículo, oferecendo € 52.000 pelo mesmo.
Uma vez que o ofendido T...F... aceitou esse preço, o arguido, o ofendido e G....S... encontraram-se junto do referido estádio para concretizar a venda.
Na ocasião o arguido disse que ia levar o veículo, uma vez que se encontrava apeado, acrescentando ter sido transportado pela esposa até ao local do encontro, a fim de poder levar consigo o BMW M3.
AA, depois de pedir toda a documentação, perguntou a T...F... se preferia o pagamento num cheque da empresa dele ou de uma conta da mulher, que era dona da “Perfumes & o que não correspondia de todo à verdade.
Uma vez que T...F... declarou que lhe era indiferente, o arguido disse que emitiria então um cheque da mulher para o dia 22, alegando que seria para dar tempo de fazer umas transferências, e que o ofendido não se preocupasse, pois o cheque teria provisão.
O arguido preencheu assim, com o seu próprio punho, um novo cheque com o n.° ..., sacado sobre a conta n° ..., do Montepio Geral, agência de Massamá, titulada por M...S...R...S..., inscrevendo uma rubrica no local destinado à assinatura e o valor de € 52.000.
T...F..., por ter acreditado que AA era titular da conta referente ao cheque e, como tal, habilitado a movimentá-la, sendo a M...S... a esposa deste, recebeu o cheque e procedeu no acto à entrega do veículo e de toda a documentação referente ao mesmo, que o arguido logo na ocasião levou consigo, fazendo-o coisa sua.
Por curiosidade, G....S... perguntou quem era o jogador de futebol a quem o veículo se destinava, tendo o arguido respondido que era o “Beto”, do Sporting.
T...F... depositou o cheque na sua conta do BCP, tendo o mesmo sido devolvido com a menção “cheque revogado por extravio”.
T...F... ficou sem o veículo e sem ter recebido a respectiva contrapartida monetária, de montante equivalente ao inscrito no cheque.
O arguido AA quis agir como agiu, de forma planeada e astuciosa, com intenção de induzir em erro T...F..., fazendo-o crer que se chamava P...C...M..., que M...S...R...S... era sua esposa e, como tal, podia movimentar a conta por esta titulada, estando legitimado para emitir o cheque que emitiu para pagamento do veículo.
Criou ainda a aparência de que o veículo era para entregar a um jogador de futebol, o que não era verdade, apenas para credibilizar a sua actuação.
Quis ainda assinar o cheque, criando a aparência de que era titular da conta sacada, o que sabia não corresponder à verdade.
Após os factos acima referidos, ainda no mês de Julho de 2003, em data anterior a 23, o arguido AA deslocou-se ao stand de J...P...da S...M..., sito na Rua ..., Lisboa, propondo a venda do veículo BMW M3, com a matrícula ...-...-XP, do qual se tinha apropriado nas circunstâncias acima referidas.
J...P...M..., por acreditar que AA era proprietário legítimo do BMW M3, tanto mais que este tinha em seu poder os documentos relativos ao mesmo, aceitou trocar o veículo por dois outros, um Jeep da marca Mercedes, modelo ML 270 CDI, com a matrícula ...-...-PB, e um BMW 318 IS, com a matrícula ...-...-GC.
Tendo chegado a acordo, efectuaram a troca, tendo o arguido ficado na posse destes dois veículos, fazendo-os seus, entregando a J...P...da S...M... o BMW M3.
J...M... apenas entregou os dois veículos por acreditar que AA era legítimo possuidor do BMW M3, o que não correspondia à verdade.
Posteriormente, o arguido AA pediu ao arguido P...D... que procedesse à entrega do veículo da marca Mercedes, com a matrícula 32-51- PB, cuja venda havia telefonicamente acordado com J...M...da F...T..., legal representante do stand que gira comercialmente sob a denominação “Qualidade Car”, sito na Amadora, devendo o arguido P... assumir-se como o vendedor.
O arguido P... D... acedeu, tendo-se deslocado no dia 23 de Julho de
2004 ao stand de automóveis “Qualidade Car”, sito na Av. ..., onde procedeu à entrega do Mercedes ML.
O legal representante do stand, por acreditar na regularidade do negócio, adquiriu o veículo por € 26.250,00 tendo emitido um cheque de idêntico montante em nome do arguido P...D..., que o depositou em conta por si titulada, vindo tal quantia a reverter em favor do arguido AA.
Ainda no mês de Julho o arguido P...D... deslocou-se ao stand Auto Podium, sito em Barcarena, e pediu ao gerente A...R... para lhe colocar à
venda o BMW 318, tendo este ficado em exposição até à data da sua apreensão à ordem
dos presentes autos, o que ocorreu em 10 de Agosto de 2004.
P...D... disse a A...R... que o veículo era de uma pessoa que lhe devia dinheiro, sendo o produto da venda para amortizar essa dívida.
O arguido P...D... quis agir como descrito, não se assegurando, como podia e devia, do modo como a viatura BMW 318 IS havia sido adquirida pelo arguido AA, pretendendo ajudá-lo a obter a quantia correspondente ao produto da venda da mesma.
No dia 27 de Julho de 2004 o arguido AA deslocou-se ao estabelecimento comercial Líder Pneus, sito em Massamá Norte, onde adquiriu 4 jantes e 4 pneus para o veículo BMW, com a matrícula 34-53-GO, pertença do arguido P...D..., no valor de € 1.168,75, tendo a Líder Pneus nesse mesmo dia procedido à montagem das jantes e pneus.
O arguido foi buscar o veículo já com as jantes e pneus montados, tendo, como forma de pagamento, preenchido com o seu próprio punho o cheque n.° ..., da conta n.° ..., do Montepio Geral, agência de Massamá, titulada por M...S...R...S..., colocando uma rubrica no local da assinatura e nele inscrevendo o valor de € 1.168.
Seguidamente, o arguido fez entrega do título assim preenchido ao funcionário da empresa, a quem disse que se tratava de um cheque da conta da sua esposa.
O funcionário, por acreditar que o arguido era titular da conta e, como tal, habilitado a emitir o cheque, considerou o pagamento efectuado e entregou o veículo com as jantes e pneus, tendo-os o arguido feito coisa sua (jantes e pneus).
O cheque foi depositado no dia 2 de Agosto, numa conta da Líder Pneus, no BPN, e devolvido no dia 3 de Agosto, com a menção de revogado por extravio.
A Líder Pneus ficou sem as jantes e pneus e sem receber a respectiva contrapartida monetária, em valor correspondente ao inscrito no cheque.
O arguido não era titular da conta, não podendo movimentar a mesma com a sua assinatura.
Quis agir como descrito, com intenção de induzir em erro o funcionário da Líder Pneus, de forma astuciosa e planeada, fazendo-o crer que podia emitir o cheque em causa, para poder levar as jantes e pneus sem as pagar, como conseguiu.
No dia 12 de Agosto de 2004 o arguido P...R... foi constituído fiel depositário do veículo da marca Mitsubishi, modelo Pajero, com a matrícula 27-62-MT, que tinha em seu poder, tendo sido, na ocasião, expressamente advertido que a viatura ficava à sua guarda, com a obrigação de a entregar quando lhe fosse exigido, pelo que não podia utilizar ou alienar a mesma, por qualquer forma, sob pena de incorrer na prática de um crime.
Tal viatura havia sido adquirida pelo mesmo arguido no dia 26 de Julho de
2004, no stand Carbela, sito na Quinta das Torres, São Gonçalo, Cabanas, Palmela, de BB , pelo valor de € 18 000,00, preço que pagou tendo, para o efeito, recorrido a crédito.
O stand C..., por seu turno, havia adquirido o mesmo veículo A J.F. M..., comerciante de automóveis de Quinta do Conde, que o adquirira à Leiloeira BCA, de Mem Martins, o qual fora vendido a esta por Samarino, aluguer e comércio de automóveis, Lda. que, por sua vez, o havia comprado ao aqui arguido AA logo no dia 21 de Junho de 2004.
Na sequência da apreensão da viatura o arguido P...R... contactou o vendedor C...S... que, na circunstância, deu conhecimento de tais factos à J. F. M..., Lda., que lho havia vendido.
A J.F. M..., por seu turno, contactou a Leiloeira BCA., tendo acordado na revogação do negócio celebrado.
Contactou o C...S... o arguido P...R..., demandando deste a entrega da viatura, tendo-lhe restituído o preço de aquisição que por este havia sido pago.
Para tanto, invocou o mesmo C...S... a existência de ordem do Tribunal, nos termos da qual a entrega da viatura tinha sido ordenada, informação prestada pelo legal representante da BCA.
Com efeito, com data de 29/9/2004 fora proferido despacho judicial a levantar a apreensão, para além do mais, da viatura com a matrícula 27-62-MT, mas determinando a sua entrega a J...A...G..., despacho não notificado ao arguido P...R....
Face ao referido em 64. e 65., acreditando que obedecia a ordem judicial, o arguido P..., que até então mantivera o veículo na sua garagem, dispôs-se a fazer entrega da mesma ao C...S... que, para o efeito, se deslocou à residência daquele, entrega que teve lugar a 15 de Outubro de 2004.
O arguido P...R... já recebera do BB Santos, dias antes, a quantia de € 18.000,00, montante correspondente ao preço por si pago.
O veículo foi depois entregue pelo C...S... ao vendedor J. F. M..., encontrando-se em poder do legal representante de Samarino, aluguer e comércio de automóveis, Lda., que se recusou a proceder à sua entrega (cfr. fls. 825 dos autos).
Os arguidos AA e P...D... actuaram como descrito, de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo serem proibidos os seus comportamentos.
6. Por acórdão proferido em 10-05-2007 nos autos de processo comum colectivo com o n.° 5342/03.0TDLSB da 1ª Vara Criminal de Lisboa, o arguido foi condenado pela prática em 02-09-2002 de um crime de burla qualificada, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão.
Nestes autos deu-se como provado que:
O arguido decidiu que se dirigia às instalações da C.J. M...de V..., Lda. sitas na Av. ..., a fim de encomendar a esta duas pás carregadoras de marca Bobcat, modelo 753, uma mini-escavadora de marca Bobcat, modelo 322 e uma pá carregadora da marca Bobcat, modelo 753;
O arguido decidiu também que acordaria com a vendedora que no acto da entrega dos equipamentos pagaria 15% do preço total e que lhe entregaria cheques com datas a 30, 60 e a 90 dias para pagamento do remanescente do preço, mas que só pagaria 15% do valor dos equipamentos, revogando posteriormente os cheques que emitisse para pagamento do remanescente do preço;
Em cumprimento deste plano, o arguido dirigiu-se no dia 21 de Agosto de 2002 às instalações da vendedora, encomendou os equipamentos e obteve o acordo da vendedora para pagamento do preço nos moldes atrás referidos;
Acordaram ainda que os primeiros equipamentos seriam entregues no dia 26 de Agosto de 2002 e a pá carregadora seria entregue no dia 2 de Setembro de 2002;
No dia 26 de Agosto de 2002, em Massamá, a vendedora entregou ao arguido os primeiros equipamentos, tendo este emitido um cheque no valor de 15% do preço, ou seja de 10.595 €, que entregou à vendedora, cheque esse que foi pago;
No mesmo dia, o arguido entregou à vendedora, cheques por si emitidos e assinados, sacados sobre a conta sedeada no Banif, e de que é titular naquela instituição bancária a sociedade G...& A... Lda. da qual o arguido era à data sócio gerente, a saber:
-um cheque no valor de 20.000 € datado de 1.10.02;
-um cheque no valor de 20.000 € datado de 2.11.02;
-um cheque no valor de 20.000 € datado de 3.12.02.
No dia 2 de Setembro de 2002, em Tercena, a vendedora entregou ao arguido a pá carregadora, tendo este emitido um cheque no valor de 15 do preço, ou seja, de 3.561 €, que entregou à vendedora, cheque que foi pago;
No mesmo dia, o arguido entregou à vendedora, cheques por si emitidos e assinados, sacados sobre a conta sedeada no Banif, e de que é titular naquela instituição bancária a sociedade G...& A... Lda. da qual o arguido era à data sócio gerente, a saber:
- Um cheque no valor de 6.727 € datado de 10.10.02;
-Um cheque no valor de 6.727 € datado de 11.11.02;
-Um cheque no valor de 6.727 € datado de 11.12.02.
Em cumprimento do plano que traçara e uma vez que a vendedora já lhe entregara todos os equipamentos, o arguido dirigiu-se ao Banif e revogou os cheques datados de 11002 e de 1010.02, emitidos em 26.8.02 e em 2.9,02, respectivamente, para pagamento do remanescente do preço;
No dia 27 de Setembro de 2002, o arguido cedeu as quotas da Sociedade G...& A... Lda. de que era titular, a A....J...da C...R..., o qual veio a tornar-se titular da conta da G...& A... Lda. no Banif e veio, no dia 10.10.02 a revogar os restantes cheques emitidos em 26.8.02 e em 2,9.02 pelo arguido, mediante instruções deste neste sentido;
Em razão do comportamento do arguido atrás descrito, o Banif não pagou os cheques que lhe foram apresentados a pagamento pela vendedora para pagamento do remanescente do preço, por motivo de revogação dos mesmos, não tendo a vendedora sido paga de parte do preço dos equipamentos que entregou ao arguido, no valor de 80,171 €;
Agiu o arguido sabendo que contra a entrega dos cheques emitidos para pagamento do remanescente do preço a vendedora lhe entregaria os equipamentos e que, revogando esses cheques, que sabia terem sido entregues para pagamento do remanescente do preço, não pagaria à vendedora parte da quantia que lhe era devida pela entrega daqueles equipamentos, quantia que sabia ascender a 80.171 €, tendo querido praticar tais factos com intenção de ficar para si com os referidos equipamentos pagando apenas 15% do seu valor;
Sabia o arguido que a sua conduta é proibida por lei.
7. Por acórdão proferido em 16-06-2008 nos autos de processo comum colectivo com o n.° 1548/04.3TDLSB do 1º Juízo Criminal de Oeiras, o arguido foi condenado pela prática em 01-02-2004 de um crime de falsificação de documento, na pena de 1 ano e 8 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo, com sujeição a regime de prova.
Nestes autos deu-se como provado que:
No Mês de Janeiro de 2004, N...C...O...M..., decidiu colocar à venda o seu veículo automóvel, marca Toyota, modelo Yaris, com a matrícula ...-...-RG.
Para o que encarregou o seu pai, A...V...M... de proceder às diligências para o efeito.
Então, A...M... estacionou aquele veículo em frente da sua residência, sita na Av. Jaime Cortesão, área desta comarca, e, no seu interior, colocou um papel onde anunciava a venda e com o seu contacto telefónico.
Pelo que, no dia 31.01.2004, cerca das 16H00, recebeu um telefonema do arguido AA que referiu chamar-se P...questionando sobre o preço do veículo.
Informado do valor pretendido, solicitou a A...M... que se deslocasse ao automóvel, pois pretendia vê-lo.
Ao pedido de € 10.000,00 formulado por aquele, o arguido contrapôs o valor de € 9.720,00, ficando de telefonar no dia seguinte para saber se a sua proposta havia sido aceite.
O que fez por volta do meio-dia do dia seguinte — 1.02.2004.
Na altura referiu que o veículo era para a sua esposa, professora de profissão.
Uma vez que a sua proposta havia sido aceite, o arguido combinou deslocar-se ao local onde se encontrava o veículo por volta das 17H30, alegando que se encontrava às compras e que ainda tinha de ir à sua casa buscar o cheque.
Porém, acabou por aparecer apenas cerca das 21H00.
Nessa altura, o arguido, na presença de A...M..., assinou o cheque n.° ..., com uma assinatura ilegível, no valor de € 9.720,00, da conta n.° ...., titulada por AA, do banco NOVA REDE, BCP, sucursal da Gare do Oriente, traçou-o e escreveu no verso o n.° de telemóvel ..., o n.° ..., e a respectiva data de emissão — 13.10.1990 -, supostamente correspondente ao seu Bilhete de Identidade, datou-o de 6.02.2004 e entregou-o àquele.
Solicitando que apenas fosse apresentado a pagamento dali a cinco dias, data que colocara no mesmo.
Fazendo deste modo crer a A...M... que se tratava efectivamente do titular do cheque.
De seguida, alegando estar com pressa, pediu as chaves do veículo, certificou-se que os documentos se encontravam no porta-luvas e foi-se embora levando o Toyota Yaris que o A...M... lhe entregara, juntamente com os respectivos documentos e a declaração de venda devidamente assinada pelo seu proprietário.
A...M... ficou convencido que entregava o veículo ao titular do cheque.
Porém, apresentado a pagamento, veio aquele cheque a ser devolvido com a menção de “Falta de Provisão” e “Assinatura Falsa”.
Efectivamente, o arguido, em data e de modo não apurado, mas certamente anterior a 15 de Abril de 2002 tinha-se apropriado de cheques titulados por AA, que terá sido seu sócio numa firma de comércio de automóveis.
Sendo que este, em 15.04.2002, havia comunicado ao banco a revogação desses cheques, designadamente do cheque entregue pelo arguido a A...M....
Ao escrever, pelo seu próprio punho, uma assinatura ilegível no local destinado à inscrição do titular do cheque e os números de telemóvel e de BI no referido cheque, teve o arguido o propósito concretizado de convencer A...M... de que o mesmo lhe pertencia e de que a assinatura tinha sido efectuada pelo titular da conta e era, consequentemente, verdadeira.
Pelo que o cheque era um título válido.
Tendo perfeito conhecimento de que o cheque em causa não lhe pertencia e que tinha sido emitido sem autorização e o conhecimento do seu titular.
Logrando, deste modo, obter para si um beneficio económico naquele montante, ao qual sabia igualmente não ter direito.
Bem como sabia que, deste modo, lesava patrimonialmente o proprietário do veículo.
Assim como punha em crise a confiança, credibilidade e fé pública que os cheques, quando verdadeiros, merecem à generalidade das pessoas.
Sabia, ainda, que desta forma prejudicava terceiros e o Estado.
Uma vez na posse do Toyota Yaris, matrícula ...-...-RG o arguido, logo no dia seguinte — 2.02.2004 deslocou-se ao stand de automóveis, denominado “GRUPINVEST, Comércio e Reparação de Automóveis, Lda”, sito na R..., em Lisboa, onde contactou A...da N...A...M..., referindo-lhe pretender vender o referido veículo.
Assim, após A...M... se ter certificado de que o veículo se encontrava em bom estado e completamente legal, uma vez que lhe foram apresentados todos os documentos, designadamente livrete, Título de Registo de Propriedade, Declaração de Venda, modelo 2, assinada pelo seu proprietário, fotocópia do BI deste, com a indicação do respectivo número de contribuinte, bem como a chave e duplicado e, ainda, os livros “Manual do Condutor” e de “Manutenção”, e tendo chegado a acordo sobre o preço, acabou por concretizar tal negócio.
Pelo que fez a entrega ao arguido AA de um cheque, por si titulado, no valor de € 6.200,00, entregando-lhe o restante em dinheiro, de modo a perfazer a quantia acordada de € 6.585,00.
Nessa altura, o arguido passou e entregou-lhe um recibo comprovativo do recebimento dessa quantia.
Porém, quando no dia 19.02.2004 tentou fazer a transferência de propriedade para seu nome, foi surpreendido pela recusa da Conservatória do Registo de Automóveis, que lhe devolveu o expediente com a indicação de que haviam sido pedidas segundas vias dos documentos e que o veículo havia sido transferido para outro nome, o que inviabilizava tal transferência.
Posteriormente, procedeu à entrega do Toyota Yaris, matrícula ...-...-RG a A...M..., na sequência de notificação efectuada pelo tribunal de Oeiras.
Ao agir da maneira supra descrita, pretendeu o arguido AA criar no ofendido A...M... a convicção de que aquele veículo lhe pertencia e que se encontrava perfeitamente legalizado, pelo que o negócio era válido.
Para, deste modo, lograr obter vantagem patrimonial, no valor de €
6.585,00, correspondente ao preço acordado e, efectivamente pago por este.
De facto, a vantagem patrimonial obtida pelo arguido é correspondente à quantia paga por A...M..., não obstante este valor ser inferior ao pretensamente pago a A...M..., tendo em consideração o modo de actuação do arguido, supra descrito, aquando da aquisição a este do veículo.
Bem sabendo o arguido de que, deste modo, causava um prejuízo de igual montante ao ofendido A..., uma vez que o veículo havia sido adquirido de modo não licito.
O arguido agiu sempre de modo livre e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram punidas por lei.
8. O arguido tem 2 filhos com 13 e 4 anos de idade que o visitam no EP.
9. Antes de preso vivia com a mulher e com os 2 filhos.
10. Está arrependido e tem pago parte das quantias a que se referem os processos acima indicados.
11. Tem apoio familiar e quando sair do EP pensa dedicar-se ao ramo da hotelaria.
12. Como justificação para os factos refere que tudo foi uma “bola de neve”, uma vez que também lhe foram entregues cheques que não foram pagos.
13. O arguido encontra-se preso em cumprimento de pena.
14. No Estabelecimento Prisional, o arguido trabalha na oficina de componentes eléctricos, é delegado desportivo e tem visitas regulares de todos os membros da família.
2.2 - MOTIVAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO:
O Tribunal formou a sua convicção com base nos elementos constantes das decisões condenatórias juntas aos autos, do CRC do arguido (fls. 2054 a 2067), nos documentos juntos pelo arguido (2075 a 2080) e nas suas declarações prestadas em sede de audiência de julgamento.

Da leitura da matéria de facto ressalta a constatação de diversas omissões essenciais, que passam a analisar-se.
Desde logo, falta a referência à data do trânsito em julgado das diversas decisões que condenaram o recorrente nas penas parcelares (só é dada essa informação relativamente à decisão proferida nestes autos e à do proc. nº 10080/99.4TDLSB), não se podendo, assim, avaliar se existe uma relação de concurso entre elas.
Aliás, falta também a indicação das penas parcelares aplicadas nos procs. nºs 481/03.0SILSB e 588/04.7TATVD, referência essencial, já que não são as penas conjuntas neles cominadas que entram no concurso global, mas sim as respectivas penas parcelares.
O acórdão é também omisso quanto ao destino das penas de prisão suspensas dos procs. nºs 510/02.5GHSNT e 1548/04.3TDLSB. Na verdade, esgotaram-se há muito os prazos de suspensão dessas penas e ignora-se se elas foram declaradas extintas ou se foram cumpridas como penas de prisão.
Só neste último caso essas penas poderão entrar no concurso, já que o art. 78º, nº 1, do CP deverá ser interpretado como compreendendo no concurso apenas as penas cumpridas, mas já não as extintas ou as prescritas. Ver a este propósito o ac. de 10.2.2010, proc. nº 39/03.4GCLRS-A.L1.S1, desta Secção.
Há, pois, que indagar qual o destino das penas suspensas aplicadas naqueles dois processos. Caso tenham sido declaradas extintas terão que ser excluídas do concurso.
Verifica-se ainda omissão quanto aos factos relativos à personalidade do arguido.
Na verdade, o acórdão ignorou pura e simplesmente o relatório social de fls. 2547-2550, sendo certo que este é um instrumento fundamental para apurar os factos referentes à personalidade do condenado, obviamente de valor muito superior, pelo desenvolvimento da informação e pela isenção da fonte, ao das declarações do próprio arguido, nas quais o Tribunal recorrido se baseou.
Não valerá a pena acentuar a importância dessa indagação sobre a personalidade, pois ela resulta evidente da norma do art. 77º, nº 1, do CP, ao dispor que a medida da pena do concurso resultará da apreciação em conjunto dos factos e da personalidade do agente.
Por último, uma outra circunstância factual importa apurar com rigor, porque seguramente relevante para a fixação da pena única. É a referente ao ressarcimento dos danos provocados, a que muito vagamente se alude no acórdão (“tem pago parte das quantias a que se referem os processos acima indicados”), mas que convirá determinar com a maior precisão possível, em ordem a avaliar o valor daquela atenuante – art. 71º, nº 2, e), do CP.
Em síntese, a sentença é nula, por insuficiente fundamentação de facto, nos termos dos arts. 374º, nº 2, e 379º, nº 1, a), do CPP.
Prejudicado fica o conhecimento das demais questões colocadas pelo recorrente.

III. DECISÃO

Com base no exposto, anula-se o acórdão recorrido, com fundamento nas disposições do CPP atrás citadas.
Sem custas.

Lisboa, 11 de Maio de 2011

Maia Costa (Relator)
Pires da Graça