Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
727/18.0PCBRG.S1
Nº Convencional: 5.ª SECÇÃOJSTJ000
Relator: ANTÓNIO GAMA
Descritores: RECURSO PER SALTUM
FURTO
ROUBO
MEDIDA DA PENA
PENA ÚNICA
PENA PARCELAR
PENA DE PRISÃO
ATENUAÇÃO ESPECIAL
REINCIDÊNCIA
IMPROCEDÊNCIA
Data do Acordão: 11/10/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO.
Sumário :

I- A atitude do arguido ao afirmar na audiência de julgamento e reportando-se aos factos da acusação, não me lembro, não estando em causa a sua legitimidade, não é obviamente confissão nem arrependimento.

II - A pretensão de redução das penas parcelares «para a medida mínima prevista» é infundada quando o arguido foi condenado como reincidente e praticou os ilícitos durante o período de liberdade condicional.

Decisão Texto Integral:


Processo n.º 727/18.0PCBRG.S1

Acórdão em conferência no Supremo Tribunal de Justiça

I

1. No Juízo Central Criminal de Juízo Central Criminal ... foi proferida a seguinte decisão (transcrição):

a) Homologar a desistência de queixa apresentada pela ofendida AA, quanto à prática de um crime de furto, na forma consumada, p. e p. pelo artigo 203.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal [apenso G], determinando-se, em consequência, a extinção, nessa parte, do presente procedimento criminal contra o arguido BB.

b) Absolver o arguido BB da prática, em autoria material, de:

i. um crime de furto qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22.º, n.ºs 1 e 2, alíneas a) e b), 23.º, n.ºs 1 e 2, 203.º, n.ºs 1 e 2, 204.º, n.º 2, alínea e), por referência ao disposto no artigo 202.º, alínea e), todos do Código Penal, do apenso C, de que vem acusado.

ii. um crime de furto qualificado, na forma consumada, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1, e 204.º, n.º 2, alínea e), por referência ao disposto no artigo 202.º, alínea e), todos do Código Penal, do apenso C, de que vem acusado;

iii. um crime de furto, na forma consumada, p. e p. pelo artigo 203.º, n.º 1, do Código Penal, do apenso F, de que vem acusado.

iv. três crimes de furto qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22.º, n.ºs1 e 2, alíneas a) e b), 23.º, n.ºs1 e 2, 203.º, n.ºs1 e 2 e 204.º, n.º1, alínea e), todos do Código Penal, do apenso K, de que vem acusado.

c) Condenar o arguido BB pela prática, em autoria material e em concurso real e efetivo, como reincidente, de:

i. um crime de furto, na forma consumada, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º1, do Código Penal, no apenso H, na pena de um (1) ano de prisão;

ii. um crime de roubo, na forma consumada, p. e p. pelos artigos 210.º, n.º1, do Código Penal, no apenso A, na pena de dois (2) anos de prisão;

iii. um crime de roubo, na forma consumada, p. e p. pelos artigos 210.º, n.º1, do Código Penal, no apenso B, na pena de dois (2) anos e dois (2) meses de prisão;

iv. um crime de furto, na forma consumada, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º1, e 204.º, n.º1, alínea b) e n.º4, por referência ao disposto no artigo 202.º, alínea c), do Código Penal, no apenso D, na pena de um (1) ano de prisão;

v. um crime de roubo, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22.º, n.ºs 1 e 2, alíneas a) e b), 23.º, n.ºs1 e 2 e 210.º, n.º1, do Código Penal, no apenso D, na pena de dois (2) anos e quatro (4) meses de prisão;

vi. um crime de furto, na forma consumada, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1, do Código Penal, no apenso J, na pena de um (1) ano de prisão;

vii. um crime de furto, na forma consumada, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1, do Código Penal, no apenso I, na pena de um (1) ano de prisão;

viii. um crime de furto, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22.º, n.ºs 1 e 2, alíneas a) e b), 23.º, n.ºs1 e 2 e 203.º, n.ºs1 e 2, do Código Penal, no apenso K, a pena de um (1) ano de prisão; e,

ix. um crime de roubo, na forma consumada, p. e p. pelos artigos 210.º, n.ºs 1 e 2, alínea b), por referência ao disposto no artigo 204.º, n.º2, alínea f) e n.º4 do Código Penal, nos autos principais, na pena de três (3) anos de prisão.

d) Condenar o arguido BB, em cúmulo jurídico das penas referidas nas subalíneas i. a ix., da alínea c), na pena única de 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de prisão.

e) Condenar o arguido BB no pagamento de uma indemnização, no montante de €300,00 (trezentos euros), à vítima CC, nos termos dos artigos 67.º-A, n.º1, alíneas a) e b) e n.º3, 82.º-A, n.º1, do Código de Processo Penal e 16.º, n.º2, da Lei n.º130/2015, de 04.09, acrescida de juros de mora, à taxa supletiva das dívidas civis, contados desde a notificação deste acórdão, nos termos dos artigos 804.º, 805.º, n.º1, e 806.º do Código Civil.

f) Condenar o arguido BB no pagamento de uma indemnização, no montante de €300,00 (trezentos euros), à vítima DD, nos termos dos artigos 67.º-A, n.º1, alíneas a) e b) e n.º3, 82.º-A, n.º1, do Código de Processo Penal e 16.º, n.º2, da Lei n.º130/2015, de 04.09, acrescida de juros de mora, à taxa supletiva das dívidas civis, contados desde a notificação deste acórdão, nos termos dos artigos 804.º, 805.º, n.º1, e 806.º do Código Civil.

g) Condenar o arguido BB no pagamento de uma indemnização, no montante de €600,00 (seiscentos euros), à vítima EE, nos termos dos artigos 67.º-A, n.º1, alíneas a) e b) e n.º3, 82.º-A, n.º1, do Código de Processo Penal e 16.º, n.º2, da Lei n.º130/2015, de 04.09, acrescida de juros de mora, à taxa supletiva das dívidas civis, contados desde a notificação deste acórdão, nos termos dos artigos 804.º, 805.º, n.º1, e 806.º do Código Civil.

h) Condenar o arguido BB no pagamento de uma indemnização, no montante de €750,00 (setecentos e cinquenta euros), à vítima FF, nos termos dos artigos 67.º-A, n.º1, alíneas a) e b) e n.º3, 82.º-A, n.º1, do Código de Processo Penal e 16.º, n.º2, da Lei n.º130/2015, de 04.09, acrescida de juros de mora, à taxa supletiva das dívidas civis, contados desde a notificação deste acórdão, nos termos dos artigos 804.º, 805.º, n.º1, e 806.º do Código Civil.

i) Julgar improcedente o pedido de arbitramento de indemnização ao ofendido GG, absolvendo-se o arguido do mesmo.

j) Declarar perdida a favor do Estado a quantia de €460,00 (quatrocentos e sessenta euros), correspondente à vantagem ilícita obtida pelo arguido BB com a prática dos crimes acima enunciados, condenando-se o mesmo a pagar ao Estado tal quantia, nos termos do disposto no artigo 110.º, n.º1, alínea b), n.ºs 3 e 4, e 111.º, n.º3 do Código Penal, sem prejuízo dos direitos dos ofendidos; absolvendo-se o arguido do demais pedido.

2. Inconformado, recorre o arguido apresentando as seguintes conclusões (transcrição):

«1. O ora Arguido/Recorrente praticou os actos pelos quais veio a ser condenado sem qualquer consciência dos mesmos, por se encontrar sob o efeito de medicamentos (prescritos devido ao problema de saúde mental que tem) e, em simultâneo, sob o efeito de estupefacientes de que é dependente há vários anos.

2. O ora Arguido/Recorrente apesar de não ter prestado declarações, mostrou sempre arrependimento e vergonha pela violação dos preceitos legais em concreto, tendo apresentado pedidos de desculpa aos ofendidos logo no início da audiência de julgamento.

3. A pena aplicada ao ora Arguido/Recorrente é excessiva.

4. O Tribunal deverá considerar as circunstâncias atenuantes dadas como provadas, e que, devidamente ponderadas, possibilitam a diminuição das penas de prisão a que fora condenado (em separado) e a pena única em cúmulo jurídico, devendo ser reduzidas para a medida mínima prevista pelos limites mínimos legais, cumprindo o preconizado nos artigos 40º, 42º, 71º e 72º do Código Penal.

5. Sendo que, apenas desta forma, será entendida e considerada a personalidade do Arguido/Recorrente, as consequências do seu acto, o grau de ilicitude e de culpa e o arrependimento, e acima de tudo a sua capacidade de interiorizar a pena como ressocializante e justa, e nunca repressiva e desmoralizante, satisfazendo o estatuído no Código Penal, a prevenção de perigosidade do Arguido/Recorrente e constituirá a censura adicional do seu acto.

Nestes termos, e nos melhores de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá a douta sentença ser revogada e substituída por outra que se coadune com a pretensão exposta, ssim se fazendo a costumada JUSTIÇA!».

3. Respondeu o Ministério Público pronunciando-se pela improcedência do recurso.

4. Neste Supremo Tribunal de Justiça o Procurador-Geral Adjunto foi de parecer que:

Não se podem atender os elementos invocados no sentido de alterar a decisão recorrida – como a alegada inimputabilidade do arguido, ou a confissão dos factos – por não resultarem dos factos provados, antes estando provados factos àqueles contrários (como sucede com a consciência da ilicitude por parte do arguido/recorrente, nunca no processo se tendo levantado a questão da inimputabilidade e determinada/requerida a efetivação de perícia, não sendo igualmente verificada qualquer situação que aponte no sentido do arrependimento por parte do arguido, nem tendo este prestado declarações);

Os demais factos invocados em sede de recurso para formulação do pedido de redução da pena resultante de cúmulo (única que o recorrente parece colocar em crise) e efetivamente dados como provados (como sejam os problemas de ordem psíquica e a toxicodependência, bem como a existência de apoio familiar) foram igualmente atendidos na escolha da pena concreta;

Tendo o Tribunal Coletivo de 1ª instância tido aqueles elementos em conta, bem como todos os demais necessários para tal escolha;

Escolha que se revela correta atentas todas as necessidades que se fazem sentir em termos de proteção dos bens jurídicos e da reintegração social do agente, sendo atendidas as necessidades de prevenção geral e especial, não sendo ultrapassada a medida da culpa do arguido ora recorrente.

Pelo que se emite parecer no sentido da manutenção integral da decisão recorrida, sendo o recurso julgado improcedente.

6. Colhidos os vistos, o processo foi presente à conferência para decisão.

II

A

Factos provados (transcrição):

[Apenso H]

1. No dia 04 de agosto de 2018, pelas 03h20, no estabelecimento de restauração e bebidas denominado «C...», sito na Rua ..., em ..., concelho ..., o arguido dirigiu-se junto da ofendida HH e, aproveitando-se do facto de esta apresentar a bolsa que trazia ao ombro aberta e se encontrar distraída, colocou a mão no interior da mencionada bolsa e dali retirou, fazendo seu, um telemóvel da marca Samsung, modelo Galaxy J7 2017, no valor de €300,00 (trezentos euros), propriedade da ofendida HH.

2. Imediatamente após, o arguido pôs-se em fuga, abandonando o local para parte incerta.

3. Ao atuar da forma acima descrita, agiu o arguido de forma livre, voluntária e consciente, com o propósito alcançado de fazer seu o telemóvel de que se apoderasse, o que conseguiu, bem sabendo que o mesmo não lhe pertencia e que agia contra a vontade da respetiva proprietária, a ofendida HH.

[Apenso A]

4. No dia 16 de agosto de 2018, pelas 01h16m, no Posto ..., sito na Avenida ..., em ..., concelho ..., o arguido abeirou-se do ofendido CC, que se encontrava junto da máquina ATM ali situada, a proceder à operação de levantamento de dinheiro.

5. Aí, sem que nada o fizesse prever, o arguido desferiu um encontrão no ofendido CC e retirou da máquina uma nota do Banco Central Europeu com o valor facial de €10,00 (dez euros), fazendo-a sua.

6. De seguida, o arguido colocou-se em fuga em direção ao Bairro ..., levando consigo a quantia indicada em 5., integrando-a na sua esfera patrimonial.

7. Ao atuar da forma descrita em 4. e 5., agiu o arguido livre, intencional e conscientemente, com o fito atingido de fazer sua a quantia monetária da qual se apoderasse, bem sabendo que a mesma não lhe pertencia e que agia contra a vontade do respetivo proprietário, o ofendido CC, sabendo ainda o arguido que a força exercida sobre o ofendido, fá-lo-ia facilitar tal entrega, como efetivamente veio a suceder.

[Apenso B]

8. No dia 16 de agosto de 2018, pelas 04h15, novamente no Posto ..., sito na Avenida ..., em ..., concelho ..., o arguido acercou-se do ofendido DD, que se encontrava junto à gaveta de pagamento exterior daquele posto de abastecimento.

9. Aí, o arguido, sem que nada o fizesse prever, abeirou-se do ofendido e, com um puxão, retirou-lhe do bolso da camisa que aquele envergava a quantia de €35,00 (trinta e cinco euros), em notas do Banco Central Europeu, fazendo-a sua.

10. Após, o arguido abandonou o local para parte incerta, levando consigo a quantia indicada em 9., integrando-a na sua esfera patrimonial.

11. Ao atuar da forma descrita em 8. e 9., agiu o arguido livre, intencional e conscientemente, com o fito atingido de fazer sua a quantia monetária da qual se apoderasse, bem sabendo que a mesma não lhe pertencia e que agia contra a vontade do respetivo proprietário, o ofendido DD, sabendo ainda o arguido que a força exercida sobre o ofendido, fá-lo-ia facilitar tal entrega, como efetivamente veio a suceder. [Apenso D]

12. No dia 19 de agosto de 2018, pelas 07h00, junto ao estabelecimento denominado «D...», sito na Rua ..., em ..., o arguido dirigiu-se ao veículo automóvel propriedade do ofendido EE, que ali se encontrava aparcado, abriu o mesmo, sentando-se no banco dianteiro esquerdo.

13. Já no interior da referida viatura, o arguido dali retirou, fazendo seu, um canivete multifunções propriedade do ofendido EE, no valor de €40,00 (quarenta euros).

14. Ato contínuo, como fosse surpreendido pelo ofendido EE, o arguido dirigiu-se a este e puxou, com vigor, o dinheiro, na quantia de €30,00 (trinta euros), que o ofendido trazia no interior do bolso da camisa que trajava.

15. Sucede, porém, que, como o ofendido resistisse, agarrando o bolso da camisa, o arguido desferiu um golpe nas pernas do ofendido, caindo este no solo.

16. No entanto, como o ofendido EE continuasse a resistir, impedindo que o arguido fizesse seu o mencionado dinheiro, logo o arguido continuou a sua atuação, puxando o dinheiro com energia, enquanto desferiu um número não apurado de pontapés no ofendido, atingindo-o na zona do tronco.

17. Tal atuação apenas terminou em virtude da intervenção de populares que por ali passavam, que socorreram o ofendido, tendo o arguido abandonado o local, seguindo para parte incerta, levando apenas consigo o canivete indicado em 13., que integrou na sua esfera patrimonial.

18. Em resultado da conduta do arguido, o ofendido EE teve necessidade de ser assistido no Hospital ..., onde recebeu tratamento médico adequado e urgente.

19. Como consequência direta e necessária dos factos acima descritos, o ofendido EE sofreu incómodos e dores na grelha costal à esquerda, que lhe demandaram 10 (dez) dias para a cura, sem afetação da capacidade para o trabalho geral ou profissional e sem consequências permanentes.

20. Agiu o arguido livre, voluntária e conscientemente, com a intenção de se apoderar do canivete acima descrito da forma supra referida e de o fazer seu, o que conseguiu, bem sabendo que o mesmo não lhe pertenciam e que agia contra a vontade do respetivo proprietário, o ofendido EE.

21. Agiu ainda o arguido de forma livre, intencional e consciente, com o escopo de fazer seu o dinheiro do ofendido EE, bem sabendo que a mesma não lhe pertencia e que agia contra a vontade do respetivo proprietário, sabendo ainda o arguido que a força exercida sobre o ofendido, fá-lo-ia facilitar tal entrega, o que apenas não ocorreu por facto alheio à sua vontade, designadamente pela pronta intervenção de populares que ali passaram e vieram em socorro do ofendido.

[Apenso J]

22. No dia 24 de agosto de 2018, pelas 09h32, o arguido dirigiu-se à esplanada no estabelecimento denominado «M...», sito na Avenida ..., União das Freguesias ..., ... e ..., concelho ... e, aproveitando-se do facto de a ofendida II se encontrar distraída, abeirou-se da mesma e retirou a bolsa que aquela havia pendurado na cadeira onde se sentou.

23. A bolsa referida em 22. continha no seu interior os documentos pessoais da ofendida II, concretamente, o cartão de cidadão, título de condução, cartão de débito da sua conta domiciliada no Montepio Geral, cartão de débito/estudante domiciliado na Caixa Geral de Depósitos, as chaves de entrada de sua residência, bem como a quantia aproximada de €15,00 (quinze euros), em notas do Banco Central Europeu.

24. Seguidamente, o arguido abandonou o local, levando consigo a sobredita bolsa, bem como todos os objetos e valores ali contidos, que integrou na sua esfera patrimonial.

25. Com a descrita conduta, agiu o arguido de forma livre, voluntária e conscientemente, com a intenção de se apoderar dos bens acima referidos e de os fazer seus, o que conseguiu, bem sabendo que os mesmos não lhe pertenciam e que agia contra a vontade da respetiva proprietária, a ofendida II.

[Apenso I]

26. No dia 02 de setembro de 2018, entre as 16h00 e as 16h30, no estabelecimento comercial denominado «N...», sito na Rua ..., União das Freguesias ..., ... e ..., concelho ..., o arguido, aproveitando um momento de distração da ofendida JJ, dali retirou, fazendo sua, a carteira da ofendida que se encontrava pousada no armário do vestíbulo dos funcionários.

27. A carteira em referência era da marca Woman Secret, de cor rosa claro, em forma de gato, de valor aproximado de €10,00 (dez euros), e continha no seu interior o cartão de cidadão da ofendida e cartão multibanco da conta titulada pela ofendida no Millennium BCP.

28. Com a descrita conduta, agiu o arguido de forma livre, voluntária e conscientemente, com a intenção de se apoderar dos produtos acima referidos e de os fazer seus, o que conseguiu, bem sabendo que os mesmos não lhe pertenciam e que agia contra a vontade da respetiva proprietária, a ofendida JJ.

[Apenso K]

29. Entre as 13h25m e as 13h39m, do dia 02 de setembro de 2018, o arguido deslocou-se ao estabelecimento denominado «C...», sito no Largo ..., em ..., com intenção de fazer seus os valores que se encontrassem no interior da caixa registadora daquele estabelecimento.

30. Assim, na execução do plano delineado, o arguido ali se deslocou e, aproveitando um momento de distração do proprietário, o ofendido KK, por três vezes, colocou-se em cima do balcão, debruçando-se e, ato contínuo, tentou retirar da máquina registadora os valores que ali encontrasse.

31. O que somente não alcançou, em virtude da pronta intervenção do ofendido KK, que o surpreendeu.

32. Ato contínuo, o arguido abandonou o local, fugindo para parte incerta.

33. Ao atuar da forma descrita, na data indicada em 29., agiu o arguido livre, intencional e conscientemente, com o fito atingido de fazer seus os valores que encontrasse na caixa registadora daquele estabelecimento, bem sabendo que os mesmos não lhe pertenciam e que agia contra a vontade do respetivo proprietário, o ofendido KK, o que somente não atingiu por facto externo à sua vontade, designadamente em virtude da pronta intervenção do ofendido, que o surpreendeu. [Autos Principais]

34. No dia 14 de setembro de 2018, cerca das 04h00, junto ao Posto ..., sito na Rua ..., União das Freguesias ..., ... e ..., concelho ..., o arguido abeirou-se do ofendido FF e desferiu, com a mão que tinha engessada, um murro na zona da face daquele, tendo a carteira e o telemóvel que o mesmo trazia caído no solo.

35. Ato contínuo, como o ofendido tentasse recuperar os objetos caídos no chão, o arguido, munido de um objeto cujas características em tudo se assemelhavam a uma navalha, desferiu, com o indicado objeto, um golpe no ofendido, atingindo-o na zona lombar.

36. De seguida, dali retirou, fazendo-o seu, um telemóvel da marca Samsung, no valor aproximado de €50,00 (cinquenta euros).

37. Após, o arguido abandonou o local, levando consigo o telemóvel indicado em 36., integrando-o na sua esfera patrimonial.

38. Em resultado da atuação do arguido, o ofendido FF foi transportado para o Hospital ..., onde recebeu tratamento adequado e urgente.

39. Como consequência direta e necessária da conduta do arguido, o ofendido FF sofreu dores, incómodos, bem como as seguintes lesões:

a. Face: escoriação da crista nasal medindo 1 cm, linear;

b. Abdómen: cicatriz da região lombar esquerda, normocrómica, medindo 1x0,5cm.

40. Tais lesões demandaram para o ofendido FF 15 (quinze) dias para a cura, sem afetação da capacidade para o trabalho geral ou profissional e sem consequências permanentes.

41. Agindo da forma acima descrita, atuou o arguido de forma livre, deliberada e conscientemente, com o escopo concretizado de fazer seus a carteira e o telemóvel acima referidos, bem sabendo que os mesmos não lhe pertenciam e que agia contra a vontade do respetivo proprietário, o ofendido FF, sabendo ainda o arguido que a força exercida sobre o ofendido, bem como o objeto por si empunhado e utilizado, fá-lo-ia ceder em tal entrega, o que efetivamente veio a suceder.

42. Sabia ainda o arguido que o objeto por si utilizado era adequado a produzir lesões sérias e que se traduzia num meio especialmente perigoso.

43. Sabia por fim o arguido que as apontadas condutas eram e são proibidas e punidas por lei penal e, ainda assim, não se coibiu de as praticar da forma como praticou. Reincidência

44. Por acórdão proferido nos autos de Processo Comum (Tribunal Coletivo) n.º547/07...., que correram seus termos no extinto ... Juízo Criminal de ... – Comarca ..., transitado em julgado em 15.07.2009, e com o respetivo acórdão cumulatório transitado em 02.03.2012, foi o arguido BB condenado pela prática:

a. Em 15.07.2007, em autoria material, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos artigos 143.º, n.º1, 146.º, n.ºs1 e 2, e 132.º, n.º2, alínea h), todos do Código Penal, 22.º, 23.º, 73.º, 223.º, n.º1, do Código Penal;

b. Em 21.10.2008, 25.10.2008, 27.10.2008, 28.10.2008 e 07.11.2008, de 6 (seis) crimes de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.º 1, do Código Penal;

c. Em 25.10.2008, de 3 (três) crimes de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.º 1, do Código Penal,

Na pena única de 7 (sete) anos de prisão.

45. O arguido esteve detido à ordem dos autos indicados em 44 desde 15.07.2007 a 16.07.2007 e, à ordem do Processo n.º3002/08...., desde 07.11.2008 a 25.05.2009.

46. E iniciou o cumprimento da pena que lhe foi aplicada em 44 em 01.06.2012, tendo-lhe sido concedida liberdade condicional em 17.10.2016, a vigorar até 11.11.2018.

Condições pessoais, sociais e económicas do arguido

47. O processo de desenvolvimento do arguido decorreu no núcleo de origem, constituído pelos progenitores e quatro descendentes, no qual estabeleceu laços afetivos vinculativos e experienciou conforto emocional.

48. Durante a sua infância e adolescência, o arguido revelou um estado psíquico instável e desequilibrado, que careceu de intervenção terapêutica especializada e posteriores internamentos.

49. O arguido frequentou o ensino até 10.º ano de escolaridade, que não concluiu por desmotivação, absentismo e dificuldades de adaptação ao contexto escolar, essencialmente pela instabilidade emocional manifestada.

50. Concomitante, o arguido iniciou aos 14 anos de idade o consumo de haxixe, envolvendo-se mais tarde no consumo de substâncias de maior poder aditivo.

51. Pelos 19 anos de idade, iniciou a atividade laboral na área da restauração, seguida de diversos enquadramentos laborais de curta duração em diferentes áreas, apresentando um trajeto prejudicado pelas dificuldades de adaptação às exigências profissionais.

52. Após a morte do pai, o estado de saúde mental do arguido agravou-se, culminando em descompensações psicológicas e despoletando a necessidade de intervenção especializada de urgência, com o diagnóstico de psicose esquizofrénica, determinante de sucessivos internamentos hospitalares, que, na altura, se revelaram insuficientes para o controlo das recidivas no consumo de substâncias estupefacientes (cocaína).

53. A partir de 2008, o arguido registou contactos com o sistema de justiça, com imposição das medidas de coação de prisão preventiva e de obrigação de permanência na habitação fiscalizada, por meios eletrónicos de controlo à distância, quer no domicílio materno, quer em comunidade terapêutica, designadamente no “...” e o cumprimento de pena de prisão até 17.10.2016.

54. Ao longo do percurso criminal e dos períodos de institucionalização, o arguido, reconhecendo a necessidade de tratamento, cumpriu com os acompanhamentos especializados e as prescrições terapêuticas e manteve, pelo menos até julho de 2018, a adequação da conduta, bem como aderiu às orientações dos Serviços de Reinserção Social.

55. Durante este período, o arguido diligenciou pela colocação laboral tendo conseguido exercer diferentes atividades, por períodos de 7 a 30 dias, integrou curso de formação profissional de soldador, durante 10 dias, evidenciando, contudo, dificuldades de inserção laboral e de formação, sobretudo pelos efeitos da medicação, indispensável à sua estabilidade mental.

56. O arguido frequentou assiduamente as consultas de psiquiatria no Hospital ..., tendo cumprido com a medicação prescrita, de toma quinzenal.

57. Em agosto de 2018, o arguido em contexto de convívio social retomou o consumo de cocaína, intensificando o uso desta substância, acabando por se envolver em situações de risco pessoal.

58. Por referência à data dos factos, o arguido integrava o agregado constituído pela progenitora e irmã mais velha, núcleo familiar apoiante e coeso.

59. A família habita em habitação própria, adquirida com recurso a crédito bancário, despendendo para o efeito o montante de €400 mensais, inserido numa freguesia sem problemáticas sociais relevantes, em zona urbana residencial, onde o percurso criminal do arguido é pouco conhecido.

60. Economicamente o agregado familiar do arguido subsiste com a pensão de reforma e de viuvez da progenitora, no valor de €700, e com o vencimento da irmã de €630,00.

61. No início de setembro de 2018, o arguido passou a residir no ... hospedado numa pensão, tendo estabelecido relacionamento com uma namorada.

62. E, para além de não exercer atividade profissional, mantinha os hábitos de adição a cocaína associada à toma da medicação.

63. Em 15.09.2018, o arguido deu entrada no Estabelecimento Prisional ... para cumprimento da medida de coação imposta no âmbito do processo n.º74/18...., onde se manteve até 08.10.2020, data em que foi restituído à liberdade, uma vez que beneficiou do perdão ao abrigo da lei n.º 9/2020, de 10.04.

64. Continuou a beneficiar de uma rede familiar preocupada com o seu bem-estar e que o apoiou através de visitas no Estabelecimento Prisional.

65. Restituído à liberdade, voltou a integrar o agregado constituído pela progenitora e irmã, mantendo uma conduta adequada.

66. No meio comunitário de residência, o arguido acolhia aceitação social, sendo considerado um indivíduo discreto, não se relacionando com os vizinhos.

67. O arguido encontra-se atualmente preso à ordem do processo n.º662/18...., em cumprimento de 11 meses e 12 dias, resultante da revogação da execução da pena de prisão em regime de permanência na habitação, estando afeto ao Estabelecimento Prisional ... desde 11.01.2022, data em que reentrou no sistema prisional.

68. Em abstrato, o arguido revela capacidades para reconhecer a ilicitude e a existência de vítimas e danos, contudo, tende a extrapolar em justificações em casos de toxicodependência ou outro descontrolo emocional.

69. Em contexto prisional, o arguido tem mantido uma conduta de confronto com o normativo disciplinar, registando uma sanção disciplinar, decorrida em 27.02.2022, por ter agredido outro recluso, e encontra-se inativo ao nível ocupacional.

70. Em termos de saúde, mantém o acompanhamento médico e terapêutico especializado, através de consultas regulares de psicologia e psiquiatria, que lhe têm permitido equilíbrio psico-emocional.

71. Não obstante a reclusão, o arguido continua a dispor de apoio familiar por parte da progenitora e irmãos, consubstanciado em visitas regulares no Estabelecimento Prisional.

Antecedentes criminais do arguido

72. No processo comum singular n.º547/07...., que correu termos no ... Juízo do Tribunal Judicial ..., por sentença de 25.06.2009, transitada em julgado a 15.07.2009, foi o arguido condenado, por factos ocorridos a 15.07.2007, pela prática de um crime de ofensa à integridade física grave qualificada, p. e p. pelos artigos 143.º, n.º1, 146.º, n.ºs1 e 2 e 132.º, n.º2, alínea h), do Cód. Penal, na pena de um ano e quatro meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, subordinada a regime de prova e à obrigação de o arguido pagar a LL o montante de €3.936,59, comprovando tal pagamento nos autos.

73. No processo comum coletivo n.º3002/08...., que correu os seus termos na Vara de Competência Mista do Tribunal Judicial ..., por acórdão de 25.05.2009, transitado em julgado a 05.03.2010, foi o arguido condenado, por factos ocorridos entre 21.10.2008 e 07.11.2008, pela prática de seis crimes de roubo, ps. e ps. pelo artigo 210.º, n.º1, do Cód. Penal, na pena única de cinco anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, com regime de prova.

74. No processo comum coletivo n.º1048/08...., que correu os seus termos na Vara de Competência Mista do Tribunal Judicial ..., por acórdão de 16.06.2009, transitado em julgado a 01.03.2010, foi o arguido condenado, por factos ocorridos em 25.10.2008, pela prática de um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.º1, do Cód. Penal, na pena de dois anos e três meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, com regime de prova.

75. Por acórdão de 19.01.2012, transitado em julgado a 02.03.2012, proferido no processo n.º547/07...., foi efetuado o cúmulo jurídico das penas em que o arguido foi condenado nesse processo e nos processos n.º3002/08.... e n.º1048/08...., tendo sido aplicada uma pena única de 7 (sete) anos de prisão.

76. No processo comum coletivo n.º1404/11...., que correu os seus termos na Vara de Competência Mista do Tribunal Judicial ..., por acórdão de 22.05.2012, transitado em julgado a 11.06.2012, foi o arguido condenado, por factos ocorridos em 07.12.2011, pela prática de dois crimes de roubo, ps. e ps. pelo artigo 210.º, n.º1, do Cód. Penal, na pena única de dois anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, com regime de prova e na condição do arguido se sujeitar a tratamento psiquiátrico, declarada extinta por decisão de 08.07.2014.

77. No processo comum coletivo n.º74/18...., que correu os seus termos no Juízo Central Criminal ... – Juiz ..., por acórdão de 19.12.2018, transitado em julgado a 18.01.2019, foi o arguido condenado, por factos ocorridos em 14.09.2018, pela prática de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203.º, n.º1, do Cód. Penal, e de um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.º1, do Cód. Penal, na pena única de dois anos de prisão efetiva.

78. No processo comum coletivo n.º662/18...., que correu os seus termos no Juízo Central Criminal ... – Juiz ..., por acórdão de 18.12.2020, transitado em julgado a 01.02.2021, foi o arguido condenado, por factos ocorridos em 23.08.2018, pela prática de um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.º1, do Cód. Penal, na pena de dois

*

B

O Direito

1. O recorrente anunciou que o recurso se limitava à matéria de direito, mas sustentou, entre o mais, que «praticou os actos pelos quais veio a ser condenado sem qualquer consciência dos mesmos, por se encontrar sob o efeito de medicamentos (prescritos devido ao problema de saúde mental que tem) e, em simultâneo, sob o efeito de estupefacientes de que é dependente há vários anos», e alegou ainda que «apesar de não ter prestado declarações, mostrou sempre arrependimento e vergonha pela violação dos preceitos legais em concreto, tendo apresentado pedidos de desculpa aos ofendidos logo no início da audiência de julgamento».

2. Como o recorrente não impugnou a decisão proferida sobre a matéria de facto (art. 412.º/3, CPP), nem sequer arguiu qualquer vício da decisão (art. 410.º/2, CPP) e lida a decisão, nomeadamente os factos provados, os não provados e respetiva fundamentação, conclui-se que não padece de qualquer vício, pelo que a precedente alegação só pode ser entendida como crítica à decisão recorrida por não ter ponderado na determinação da medida das penas, a referida factualidade. E não ter ponderado não constitui qualquer omissão, porque entre os factos provados, não consta a factualidade agora invocada.

3. Se o recorrente entendia que esses factos eram relevantes devia ter começado pela sua alegação em sede de contestação, o que não fez, ou impugnado a decisão recorrida pelo modo adequado a que fossem acrescentados aos provados os ditos factos. Sabemos o que não fez o recorrente e o que não deve fazer: alegar como provados factos que não constam como tal nos provados. Como sabe o arguido, no processo penal em tema de confissão e arrependimento, o que o arguido sente vale apenas na medida em que o exterioriza e o tribunal considera provado. A atitude do não me lembro, não estando em causa a sua legitimidade, não é obviamente confissão nem arrependimento.

4. No mais, diz o recorrente, que a pena aplicada é excessiva; que o tribunal «deverá considerar as circunstâncias atenuantes dadas como provadas, e que, devidamente ponderadas, possibilitam a diminuição das penas de prisão a que fora condenado (em separado) e a pena única em cúmulo jurídico, devendo ser reduzidas para a medida mínima prevista pelos limites mínimos legais, cumprindo o preconizado nos artigos 40º, 42º, 71º e 72º do Código Penal.

5. Em tema de atenuação especial importa distinguir entre os casos das tentativas puníveis em que a atenuação é automática pois resulta de norma expressa (art. 23.º/2, CP) das situações de crimes consumados em que por existirem circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena, há a possibilidade de atenuação especial da pena (art. 72.ºCP). Na determinação da medida da pena, nos casos de crimes tentados pelos quais foi condenado, foi corretamente considerada a moldura especialmente atenuada. Quanto à pretensão do recorrente de lhe ser aplicada relativamente aos demais crimes a atenuação especial prevista no art. 72.º, CP, apesar de o recorrente invocar a norma, não identifica qual a concreta circunstância que no seu modo de ver diminui por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade de pena. Não a identifica nem se descortina, tanto mais que o recorrente foi condenado como reincidente, condenação que não sindicou.

6. Vejamos o que realçou a decisão recorrida quanto às penas parcelares:

O grau de ilicitude associado aos factos é elevadíssimo (…) O dolo é intenso por ser direto, querendo o arguido levar a cabo as condutas em causa, mesmo tendo presente o modo de atuação e as consequências dos crimes, demonstrando vontade firme na prática dos crimes. A motivação do arguido foi, certamente, a de obter bens, dinheiro e/ou valores alheios, para satisfazer porventura as suas necessidades aditivas (…) As consequências dos factos assumem gravidade significativa, tendo em atenção a natureza, as caraterísticas e o valor dos bens subtraídos e, bem assim, as lesões físicas e psíquicas que provocou nos ofendidos (…) As exigências de prevenção geral são muito elevadas (…) O passado criminal do arguido, anterior aos factos em análise do arguido, dá-nos conta de uma conduta anterior não positiva (…); a forma reiterada do comportamento do arguido, voltando a delinquir, de igual modo, é revelador de uma total indiferença pelas consequências penais da sua conduta, havendo, assim, uma maior necessidade de prevenir a prática de futuros crimes e, por outro, de que o arguido tem uma personalidade desconforme ao direito e adequado aos factos típicos que cometeu, verificando-se, por isso, uma necessidade de maior intervenção ressocializadora através da pena (…); também não é positiva a avaliação da conduta posterior aos factos do arguido porque após a prática dos factos que ora nos ocupam o arguido já sofreu outras condenações (por factos ocorridos na mesma altura aos dos presentes autos), sobretudo, por crimes contra o património (furto e roubo); o arguido praticou os factos em causa durante a vigência da liberdade condicional que lhe havia sido concedida em 17.10.2016, no âmbito do processo n.º686/12.... (…); as condições pessoais do arguido poderão de alguma forma mitigar os seus comportamentos, e fazer perceber o seu agir, ainda que sempre injustificável; (…) encontra-se preso em cumprimento de pena desde 11.01.2022, apresentando, em meio prisional, um comportamento de confronto com o normativo disciplinar (tem sanção disciplinar registada, por factos ocorridos em 27.02.2022) e encontrando-se inativo a nível ocupacional.

E quanto à pena única:

«(…) a moldura abstrata do presente cúmulo vai assim do mínimo de três anos de prisão ao máximo de catorze anos e seis meses de prisão.

Assim, para fixação da pena única, devemos considerar as considerações feitas a propósito da graduação das penas e, em particular, as seguintes:

- a mesma natureza dos crimes em concurso: crimes contra o património;

- o período temporal da atuação do arguido, situado entre 04 de agosto e 14 de setembro de 2018, ou seja, um mês e uma semana, agindo o arguido do mesmo modo, com vista à obtenção de dinheiro e/ou bens.

- a gravidade objetiva dos factos, aferida pela concreta forma de atuação e pelo tipo de bens e valores;

- as consequências dos factos assumem gravidade relevante, correspondente aos prejuízos materiais causados aos ofendidos e aos danos morais sofridos pelas vítimas dos crimes de roubo;

- as atuais condições pessoais, familiares e sociais do arguido: mostra-se recluso no EP ... desde 27 de janeiro de 2022;

- a circunstância de ser consumidor de estupefacientes, associado ao quadro de doença psíquica de que padece;

- os seus antecedentes criminais;

- a falta de interiorização do desvalor e da gravidade das suas condutas, refletida pelo seu percurso criminoso;

- a idade do arguido: o arguido conta com 38 anos (à data dos factos, tinha 34 anos)».

7. A pretensão de redução das penas parcelares «para a medida mínima prevista pelos limites mínimos legais» é infundada desde logo porque foi condenado como reincidente. Acresce que o grau de ilicitude, a intensidade do dolo, o grau de violação dos deveres impostos ao agente, dado que praticou os ilícitos durante o período de liberdade condicional, as necessidades de prevenção geral e especial não permitam a aplicação de penas parcelares pelos limites mínimos legais.

8. Perante o quadro fático apurado a pretensão do recorrente é infundada. As penas – parcelares e única – são proporcionadas aos comportamentos reiterados do arguido contra o direito. É impensável qualquer redução das penas aplicadas a um arguido reincidente que levou a cabo as condutas, algumas delas com o emprego de violência contra as vítimas, durante o período de liberdade condicional e que posteriormente a estes factos já cometeu outros crimes da mesma natureza. Há nas ações do recorrente um escalar de violência de que só não resultaram lesões corporais mais graves por mero acaso. A pretensão do requerente assenta em factos não apurados, o que só por si é motivo de rejeição do recurso por manifesta improcedência (ac. STJ de 20.02.91, referido por Simas Santos e Leal-Henriques, Recursos…2002, p. 106). O que fez o recorrente foi alegar uma genérica e não concretizada violação de normativos legais, o que também é motivo de rejeição (5.06.97, ob. cit. p. 108).

9. Lida a decisão recorrida, nomeadamente os factos provados, não provados, a respetiva motivação e a fundamentação, e o recurso que lhe move o recorrente, conclui-se sem margem para dúvida que é infundada a crítica que lhe move o recorrente, porquanto se estriba em fundamentos que não constam dos factos provados e em violação de normas relativas à medida das penas que claramente não foram violadas.

Basta, assim, uma avaliação sumária dos fundamentos do recurso para se concluir, sem margem para dúvidas, que o mesmo está votado ao insucesso.

Decisão:

Nega-se provimento ao recurso.

Custas pelo recorrente fixando-se a taxa de justiça em 5 UC.

Supremo Tribunal de Justiça 09.11.2022

António Gama (Relator)

João Guerra.

Orlando Gonçalves