Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 2.ª SECÇÃO | ||
Relator: | AFONSO HENRIQUE | ||
Descritores: | CONFISSÃO DE DÍVIDA DOCUMENTO PARTICULAR FORÇA PROBATÓRIA PLENA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA ERRO NA APRECIAÇÃO DAS PROVAS CONTRADIÇÃO PROVA VINCULADA MATÉRIA DE DIREITO AÇÃO EXECUTIVA TÍTULO EXECUTIVO EMBARGOS DE EXECUTADO | ||
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Data do Acordão: | 07/06/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | CONCEDIDA | ||
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Sumário : | I - A confissão extrajudicial, em documento particular, considera-se prova nos termos aplicáveis a estes documentos e, se for feita à parte contrária, tem força probatória plena. II - É o caso dos autos, em que os embargantes/executados subscrevem documento, no qual se responsabilizam pessoalmente, perante os embargados/exequentes, relativamente ao empréstimo que estes lhes fizeram. III - Face à força probatória plena do documento particular que serve de título executivo, bem como o disposto no art. 674.º, n.º 3, aplicável, ex vi, art. 682.º, n.º 2, ambos do CPC, excepcionalmente pode o STJ dar como não provados os questionados factos dados como assentes pelo tribunal da Relação. | ||
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Decisão Texto Integral: |
ACORDAM NESTE SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (2ª SECÇÃO) I - AA e BB, residentes em ..., intentaram contra: CC, DD, residentes em ..., e outros, execução para pagamento de quantia certa de €762.800, sendo 475.000 de capital e o resto de juros, mais juros de mora vincendos, com base em declaração de dívida. Os executados deduziram embargos alegando, em síntese, que: - O exequente é accionista da executada J..., SA, e como tal, fez suprimentos à mesma, não podendo pedir à referida sociedade, nos termos e circunstâncias em que o fez, o pagamento de tais suprimentos e muito menos pode exigir o pagamento de tais suprimentos/empréstimos, feitos à sociedade, aos ora embargantes. Os exequentes contestaram alegando, em suma, que: - A declaração de dívida que serve de fundamento à presente execução foi livremente assinada pelos executados ora embargantes, correspondendo à sua vontade expressa naquele documento, por saberem que tal documento reflectia a verdade do que fora acordado, entre exequentes e executados. O Tribunal de 1ª Instância julgou os embargos improcedentes. II – Os embargantes recorreram daquela sentença e o Tribunal da Relação, por acórdão, de 9-11-2021, julgou procedente o respectivo recurso, “revogando a sentença apelada, e, consequentemente, se declarando extinta a execução.” III – Os embargados/exequentes, por sua vez, recorreram para o Supremo Tribunal de Justiça/STJ, tendo este, por acórdão de 8-9-2021 decidido do seguinte modo: “(…) Pelo exposto, acordam os Juízes deste Supremo Tribunal em julgar parcialmente procedente a revista e, consequentemente: A - eliminar as respostas afirmativas dadas pelo Tribunal da Relação à factualidade constante das alíneas d), e), f) e g) dos factos dados como não provados e supra descrita nos n°s 19, 20, 21 e 22, mantendo-se as respostas negativas dadas pelo Tribunal de 1a instância a esta mesma factualidade; B - mandar baixar os autos ao Tribunal da Relação para decidir da impugnação da decisão sobre a matéria de facto deduzida pelos embargados no que respeita aos factos dados como provados pelo Tribunal da 1a Instância no n° 18 e aos factos constantes das alíneas a) e c) dos factos não provados, e, na decorrência disso, julgar em conformidade. (…)” IV – Reenviados os autos para o Tribunal da Relação, por acórdão de 9-11-2021, foi proferida a seguinte decisão: “(…) Pelo exposto, julga-se procedente o recurso, assim se revogando a sentença apelada, e, consequentemente, se declarando extinta a execução. (…)” V – Os exequentes/embargados, voltaram a recorrer para o STJ, o qual, por acórdão de 31-2-2022, decidiu o seguinte: “(…) Pelo exposto, acordam os Juízes deste Supremo Tribunal em conceder parcialmente a revista interposta pelos recorrentes e, consequentemente, anular o acórdão recorrido e determinar a baixa do processo ao Tribunal da Relação para, de harmonia com o disposto no art. 682°, n° 3 do CPC, suprir a contradição factual supra identificada no ponto 3.2.4 e, na decorrência disso, decidir novamente de direito. (…)” VI – Na sequência do novo reenvio ordenado pelo STJ, o Tribunal da Relação, em 31-3-2022, proferiu um terceiro acórdão, com voto de vencido – parte decisória: “-…- Pelo exposto, julga-se procedente o recurso, assim se revogando a sentença apelada, e, consequentemente, se declarando extinta a execução. -…-” VII – Os exequentes/embargados vieram, mais uma vez, recorrer de revista para este Supremo Tribunal de Justiça/STJ, formulando as seguintes CONCLUSÕES: 1 - Cumpre antes de mais consignar que foi com de novo grande surpresa que os recorrentes receberam a decisão de que se recorre, e que é um acórdão produzido na sequência de um douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça que mandou descer os autos para nova decisão. 2 - Na verdade, esta é a terceira vez que os embargados recorrem a este Supremo Tribunal. 3 - Sendo que sevêem forçados a fazê-lo, desta feita, porque parece não ter sido entendido por dois membros do colectivo de juízes do tribunal a quo a determinação constante do último acórdão deste Supremo Tribunal. 4 - Efectivamente, decidiu o tribunal ad quem no ultimo Acórdão proferido nos autos “anular o acórdão recorrido e determinar abaixa do processo ao Tribunal da Relação para, de harmonia com o disposto no art. 682º, nº3 do CPC suprir a contradição factual supra identificada no ponto 3.2.4 e na decorrência disso decidir novamente de direito.” 5 - Por sua vez, no ponto 3.2.4 do Acórdão, os Srs. Colendos Juízes Conselheiros consideram que o tribunal a quo não poderia ter considerado provados factos que contrariam o documento escrito particular celebrado entre exequentes e executados. 6 - Que o Supremo Tribunal considerou ser um documento particular que integra uma confissão extrajudicial, qual seja, a de que os executados são devedores aos embargados da quantia de 545 mil euros, nos termos do art. 358º, nº2 do Código Civil. 7 - Que se reveste de força probatória plena contra o confitente (força probatória material). 8 - E diz mesmo o Supremo Tribunal que “A confissão contida no ponto 1 da referida declaração de que são devedores aos segundos outorgantes da quantia de 545 mil euros, subsiste, integra, ficando deste modo, plenamente provado este facto.” 9 - Concluindo que “não tendo os embargantes contrariado a prova plena do documento particular em causa, com base na falsidade do documento, (arts. 347º e 372º, nº1, ambos do Código Civi), ou mediante a prova dos alegados factos integrativos de erro ou de vicio da vontade (cfr. Factos dados como não provados) susceptíveis de determinar a nulidade ou anulação da confissão e resultando provado no ponto 18 que “os embargantes assinaram o documento referido em 2 de forma livre e espontânea”, não há dúvida que os factos dados como provados pelo Tribunal da Relação nos pontos 3-A e 3-B contrariam esta realidade”. 10 - E determina “daí que, e perante tal contradição se imponha, ao abrigo do art. 682, nº3 do CPC, determinar a baixa do processo à Relação para suprir esta contradição em ordem a viabilizar a adequada decisão jurídica do presente litígio.” 11 - Ora, os pontos 3-A e 3- B têm o seguinte conteúdo: 3-A - O documento referido em 2. e 3. não corresponde à realidade, uma vez que apenas foram feitos empréstimos à sociedade e não aos executados para o exercício do comércio pelos mesmos, por si e enquanto casal; 3-B - os executados não quiseram vincular-se ao teor do documento referido em 2 e 3. 12 - Só que o tribunal a quo manteve na decisão recorrida a redacção do facto 3-A e; alterou a redação do facto 3-B apenas nos seguintes termos “os executados não quiseram vincular-se ao teor do documento referido em 2. / Pontos 2 e 3. 13 - Ora, acompanhando o voto vencido do Venerando Desembargador, tendo em consideração a ponderação feita no acórdão do STJ, afigura-se que estes factos têm de ser declarados não provados porque contrariam frontalmente a declaração de dívida assinada por exequentes e executados que configura uma confissão por parte dos executados perante os ora exequentes. 14 - De acordo com o art. 352º do CC, a confissão é o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária. 15 - Ou seja, desfavorável neste contexto é não só a declaração de que são devedores, mas de que o são pessoalmente e em conjunto com a empresa. 16 - Mas desfavorável é também, neste contexto, a declaração de que o documento é expressão da sua livre e espontânea vontade, uma vez que este facto desde logo lhes retira qualquer possibilidade devirem a invocar que não quiseram vincular-se ao teor do documento, cujo conteúdo também ali declaram conhecer. 17 - Todos estes factos - o reconhecimento da sua qualidade de devedores pessoais, a livre e espontânea vontade com que assinam e se vinculam ao documento, bem como o conhecimento que afirmam nele ter do conteúdo do mesmo, são confissão da existência da divida e do seu reconhecimento livre e válido, no contexto ali afirmado e descrito. 18 - E assim sendo, logicamente, sob pena de violação do art. 358º, nº 2 do CC, os factos provados 3-A e 3-B têm que ser considerados não provados. 19 - O que deve desta feita ser determinado pelo tribunal ad quem, seguindo-se a consequente aplicação do direito ao caso concreto, nos termos que a seguir melhor detalharemos. 20 - Sem conceder, mesmo que se entenda que assim não é, defendem os recorrentes, com o devido respeito que, o tribunal ad quem está em condições de aplicar o direito com os factos que estão provados, 21 – E, designadamente com a nova redação do facto provado 3B. 22 - É que mesmo que os executados não tenham querido vincular-se aos pontos 2 e 3 do 2, como defende o tribunal recorrido, eles confessaram ou reconheceram ser devedores aos exequentes da quantia de 545 mil euros. 23 - O que por si só, e mesmo neste caso, devia ter levado o tribunal a quo a retirar uma outra conclusão, qual seja, ter, em cumprimento do Acordão do STJ, considerado o título executivo válido ao abrigo de uma correcta aplicação do art 46º, alínea c) do CPC, na redacção do DL. n.º 329-A/95, de 12/12. Termos em que deve o recurso interposto ser considerado procedente, e consequentemente, deve este Colendo Tribunal revogar o Acórdão recorrido, e determinar a validade do título executivo e o prosseguimento dos autos de execução, declarando improcedentes os embargos deduzidos. VIII - Foi devidamente admitido o presente recurso/revista. A) APRECIANDO E DECIDINDO Thema decidendum - Em função das conclusões do recurso, temos que: Os recorrente/exequentes entendem que a Relação fez, mais uma vez, uma indevida valoração do documento particular que serve de título executivo, “e assim sendo, logicamente, sob pena de violação do art. 358º, nº 2 do CC, os factos provados 3-A e 3-B têm que ser considerados não provados”, o que determinaria a improcedência dos embargos. B) DA QUESTÃO DE FACTO Factos Provados 1- No dia 30.03.2017, AA e BB requereram a execução, além dos demais, de DD e CC, com vista ao pagamento da quantia de € 762.800,00 (setecentos e sessenta e dois mil e oitocentos euros), o que constitui os autos principais. 2- No processo referido em 1, os exequentes, ora embargados apresentaram, como título executivo, um documento intitulado “Declaração de Dívida”, datado de 13 de Dezembro de 2010, onde constam como primeiros outorgantes EE, FF, CC e DD e como segundos outorgantes BB e AA, com o seguinte teor: “(…) 1. Pela presente declaração os primeiros outorgantes declaram expressamente, para todos os devidos efeitos legais, que são devedores aos segundos outorgantes da quantia de € 545.000 euros (quinhentos e quarenta e cinco mil euros). 2. Tal dívida resulta do incumprimento do designado “Protocolo para Reembolso de Suprimentos”, celebrado pelos primeiros e segundos outorgantes em 19 de Novembro de 1999, onde se estabelece que até Dezembro de 2003 seria entregue aos segundos outorgantes a quantia de 475 mil euros que fora por estes emprestada à sociedade “J..., S.A.” de que os primeiros outorgantes são únicos responsáveis e administradores, bem como dos juros acordados e entretanto não pagos, no montante de 70 mil euros. 3. Tal dívida é assumida pessoalmente pelos primeiros outorgantes e solidariamente com a sociedade “J..., Lda.” porque estes reconhecem expressamente que a quantia emprestada foi utilizada para o exercício do comércio por estes em benefício da economia comum dos respectivos casais. 4. 1 - Os primeiros outorgantes obrigam-se e comprometem-se a pagar aos segundos outorgantes a importância de € 475 mil euros (quatrocentos e setenta e cinco mil euros) até ao dia 31 de Dezembro de 2010, vencendo-se a partir dessa data juros sobre a quantia devida, juros estes no montante de 30 (Trinta) mil euros ao ano. 2 - Caso não seja cumprido o prazo de pagamento estabelecido no número anterior, os juros que se vencerem a partir de 31 de Dezembro de 2010 relativos à quantia em dívida identificada no número um da presente cláusula serão pagos pelos primeiros outorgantes aos segundos em prestações mensais de 2500 euros (dois mil e quinhentos euros). 3 - Quanto aos juros vencidos e devidos até agora no montante de 70 mil euros, serão pagos pelos primeiros aos segundos outorgantes em duas prestações iguais de 35 mil euros, nos meses de Junho de 2011 e Dezembro de 2011. 4 - O não cumprimento de qualquer dos pagamentos estabelecidos no número dois determina o vencimento integral da quantia que se mantiver em dívida e o pagamento de juros convencional de 6% ao ano sobre tal quantia. 5. Ficarão a cargo dos primeiros outorgantes devedores, todas as despesas judiciais que os segundos outorgantes façam para manter, garantir e haver este crédito. 6. Os outorgantes têm pleno conhecimento do teor da presente declaração, e abaixo a assinam e rubricam em cada uma das quatro páginas por que é composta, de livre e espontânea vontade, na presença de duas testemunhas que abaixo igualmente assinam, dando como verdadeiros todos os factos nela descritos. (…)” 3 - Os embargantes assinaram o documento referido em 2. 3-A. O documento referido em 2. e 3. não corresponde à realidade, uma vez que apenas foram feitos empréstimos à sociedade e não aos executados para o exercício do comércio pelos mesmos, por si e enquanto casal. 3-B. Os executados não quiseram vincular-se ao teor do documento referido em 2. pontos 2 e 3 e 3-. 4 - Os exequentes alegaram em sede de requerimento executivo: «(…)1 - Exequentes e executados celebraram em 13 de Dezembro de 2010 acordo que se junta como doc nº1 e se dá por reproduzido para todos os efeitos legais, 2 - ao abrigo do qual os executados se reconheceram devedores para com os exequentes da quantia de 545.000,00€ (quinhentos e quarenta e cinco mil euros)-vide clausula primeira do doc nº1. 3 - Mais se obrigaram os executados a pagar aos exequentes a importância de € 475 mil euros (quatrocentos e setenta e cinco mil euros) até dia 31 de Dezembro de 2010, vencendo-se a partir dessa data juros sobre a quantia devida de 30 mil euros ao ano. 4 - Ainda acordaram que, caso não fosse cumprido o prazo de pagamento estabelecido no número anterior, os juros que se vencessem a partir de 31 de Dezembro de 2010 relativos à quantia em divida identificada no número um da presente clausula seriam pagos pelos executados aos exequentes em prestações mensais de 2500 euros (dois mil e quinhentos euros). 5 - Mais estabeleceram que os juros vencidos e devidos até àquele momento, no montante de 70 mil euros, seriam pagos pelos executados aos exequentes em duas prestações iguais de 35 mil euros, nos meses de Junho de 2011 e Dezembro de 2011. 6 - Por último, acordaram as partes que o não cumprimento de qualquer dos pagamentos estabelecidos no número quatro do presente articulado, determinaria o vencimento integral da quantia que se mantivesse em divida e o pagamento de juro convencional de 6% ao ano sobre tal quantia. 7 - EE, FF, CC e DD assinaram o titulo executivo, por si e na qualidade de accionistas e administradores da também executada, J..., S.A. 8 - Entretanto, EE faleceu no dia .../.../2012, conforme certidão de óbito que se junta como doc nº2 e dá por reproduzido para todos os efeitos legais; 9 - Tendo deixado como herdeiros FF, DD, GG e em representação do filho anteriormente falecido HH, II e JJ 10 - Sucede que, até hoje, nenhum dos executados liquidou a divida que tem para com os exequentes. 11 - Apesar de variadíssimas insistências pelo cumprimento das obrigações que haviam assumido, sendo que os ora exequentes chegaram mesmo a enviar uma carta de interpelação aos executados - que se junta como doc nº3 e se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais - concedendo-lhes prazo peremptório de oito dias para o pagamento integral da divida; 12 - Que uma vez mais os executados não cumpriram, não tendo até ao momento pago qualquer quantia do montante em divida. 13 - Assim, devem os executados aos exequentes as seguintes quantias: a) 475.000,00€ até 31 de Dezembro de 2010; b) 180 mil euros, a titulo de juros pelo incumprimento do pagamento da quantia referida na alínea a); c) 70 mil euros de juros já vencidos até 31 de Dezembro de 2010; 14 - A este montante acrescem, ainda, juros de mora vincendos, desde a propositura do presente requerimento executivo até efectivo e integral pagamento. 15 - À presente execução serve de base o documento particular que importa o reconhecimento de uma obrigação, e que constitui titulo executivo nos termos do art. 46º, nº1, alínea c) do CPC, na sua versão do DL 329-A/95 e em obediência ao Acórdão do Tribunal Constitucional nº 408/2015 de 14/10 onde se "Declara, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade da norma que aplica o artigo 703.º do Código de Processo Civil, aprovado em anexo a Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, a documentos particulares emitidos em data anterior a sua entrada em vigor, então exequíveis por força do artigo 46.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil de 1961, constante dos artigos 703.º do Código de Processo Civil e 6.º, n.º 3, da Lei n.º 41/2013, de 26 de junho." 16 - A dívida é certa, líquida e exigível. 17. Sendo que os executados devem aos exequentes a quantia total de 762.800,00 euros (setecentos e sessenta e dois mil e oitocentos euros). (…)” 5- Por escritura pública celebrada em 19 de Novembro de 1999, no ... Cartório Notarial ..., foi aumentado o Capital Social da empresa J..., Lda., para cinquenta e cinco milhões de escudos, sendo a importância do aumento de cinco milhões de escudos subscrita em partes iguais pelo ora Exequente e por KK, através da emissão de cinco mil acções ao portador de mil escudos cada. 6- Em 19 de Novembro de 1999, HH, CC, DD, EE e FF, na qualidade de primeiros outorgantes, e KK e BB, na qualidade de segundos outorgantes, firmaram documento intitulado “Protocolo para reembolso de suprimentos”, com o seguinte teor: “(…)1º Primeiros e segundos outorgantes são os actuais e únicos accionistas da sociedade comercial denominada “J..., S.A., (…) 3º Os segundos outorgantes, por escritura pública celebrada na presente data no ... Cartório Notarial ..., subscreveram em partes iguais o aumento de capital da referida sociedade comercial no montante de cinco milhões de escudos, distribuídos por cinco mil acções ao portador no valor individual de mil escudos. 4ºTambém na presente data, na qualidade de accionistas (…) e a título de suprimentos, os segundos outorgantes emprestam à sociedade a quantia de cento e noventa e cinco milhões de escudos. 5º Os primeiros outorgantes, enquanto accionistas e únicos titulares dos actuais órgãos da identificada sociedade aceitam para esta o referido suprimento, obrigando-se a reembolsá-lo a partir de 31 de Dezembro de 2000 e até 31 de Dezembro de 2002, Por acordo entre primeiros e segundos outorgantes o prazo atrás estipulado poderá prorrogar-se até 30 de Junho de 2003. 6º O reembolso acima referido, a efectuar na residência de cada um dos segundos outorgantes, ou por outra forma que ambos encontrem mais conveniente, será subordinado aos seguintes requisitos: a) Prefere a qualquer outro reembolso, de outros eventuais suprimentos. b) O capital emprestado vence juros a uma taxa anal, nominal, de 5%, a pagar aos segundos nos dias 31 de Dezembro de 2000, 2001, 2002 e 2003. c) Nas operações de loteamento a levar a cabo na vila e concelho ... (as únicas que actualmente a identificada sociedade tem em curso nesta localidade), os segundos outorgantes receberão uma percentagem de vinte por ceno, no total dos lucros realizados com a venda pela sociedade dos lotes para construção urbana, de que esta é ali proprietária. (…)” 7 - Em 19 de Novembro de 1999, KK, LL, BB e AA, na qualidade de primeiros outorgantes, e HH, CC, DD, EE e FF, na qualidade de segundos outorgantes, firmaram documento intitulado “Contrato Promessa de Compra e Venda”, com o seguinte teor: “(…) 1º Os primeiros outorgantes maridos são donos e legítimos possuidores, em partes iguais, de cinco mil acções ao portador no valor individual de mil escudos, que fazem parte do capital social da sociedade comercial denominada “J..., S.A.”(…). 3º Pelo presente contrato, os primeiros outorgantes maridos prometem vender aos segundos, na proporção que neste momento todos os segundos outorgantes detêm na identificada sociedade, as mencionadas cinco mil acções ao portador. Os segundos outorgantes, por sua vez, prometem comprar aos primeiros, na mesma proporção que estes determinarem, as mesmas cinco mil acções. (…)” 8 - O irmão do ora embargante, KK, é amigo de CC há mais de 50 anos. 9 - Este trabalhava na empresa co-executada nos presentes autos. 10 - Sendo que todos eles viviam exclusivamente dos proveitos obtidos com a actividade dessa empresa. 11 - Após algum período de afastamento, os dois reencontraram-se em 1995, tendo-se reaproximado e passado a conviver diariamente, com as respectivas famílias. 12 - Solidificando uma forte amizade, baseada na confiança e cumplicidade mútuas. 13 - Em Outubro de 1999 os embargados venderam uns terrenos, tendo arrecadado cerca de um milhão de euros, o mesmo tendo sucedido o irmão do embargado, KK. 14 - O irmão do embargado/exequente comentou então com o amigo CC a venda que havia realizado. 15 - Na sequência de tal conversa, vieram a ser celebrados os acordos mencionados em 5, 6 e 7. 16 - O embargado é Engenheiro ... e o irmão médico. 17 - O exequente nunca acompanhou em pormenor a actividade da empresa co-executada. 18 - Os embargantes assinaram o documento referido em 2 de forma livre e espontânea. C) DA QUESTÃO DE DIREITO Para uma melhor análise do presente recurso – vide A) - importa fazer o cotejo entre o último acórdão(2º) deste STJ e o acórdão da Relação (3º) que era suposto ter dado total cumprimento aquele aresto. 1 - Escreveu-se nesse acórdão do STJ com particular relevância na apreciação deste novo (3º) recurso/revista: “-…- Significa isto que a confissão contida no ponto 1, da referida declaração, de que «são devedores aos segundos outorgantes da quantia de € 545.000 euros» subsiste, íntegra, ficando, deste modo plenamente provada este facto. De esclarecer, todavia, que contrariamente ao sustentado pelos recorrentes, não se vê que a denominada "Declaração de Dívida", corporize uma pura e simples declaração unilateral de reconhecimento de dívida sujeita ao regime previsto no art. 458°, n°l, do C. Civil, caso em que não há verdadeiramente a confissão dum facto desfavorável ao autor da declaração. Com efeito, enquanto nas situações enquadráveis neste art. 458°, existe apenas uma mera confissão de dívida, presumindo-se até prova em contrário a existência da relação fundamental (causal) e permitindo-se, nos termos do disposto no art. 350°, n° 2, do C. Civil, ao autor da declaração que ilida a presunção, mediante a prova de que nenhuma relação negocial existe na base da declaração de reconhecimento emitida, diversamente, no caso de confissão inserida em documento particular cuja veracidade esteja reconhecida, a que alude o art. 352° do C. Civil, os factos compreendidos na declaração e contrários aos interesses do declarante valem a favor da outra parte nos termos da declaração confessória efetuada, nos termos do disposto no art. 358°, n° 2, do mesmo diploma. Vale isto por dizer que, no caso dos autos, a força probatória plena da confissão feita na sobredita declaração, mais do que um reconhecimento de dívida ilidível nos termos do citado art. 458°, prova plenamente que os recorridos são devedores aos recorrentes da quantia de € 545.000,00, conforme acima se procurou demonstrar. De resto sempre se dirá que, tal declaração, para além de consubstanciar o reconhecimento por parte dos recorridos de que devem aos recorrentes a quantia de € 545.000,00, não deixa de formalizar um contrato celebrado entre as partes outorgantes, pois bastar atentar no clausulado nos seus pontos 4.1, 4.2, 4.3 e 4.4., para facilmente se constatar que as mesmas, na decorrência do reconhecimento da dívida plasmado na confissão, estabeleceram, por mútuo acordo, o tempo e o modo de realização do pagamento devido pelos embargantes. Aqui chegados, vejamos, então, se existe, efetivamente, contradição entre, de um lado, a confissão feita no documento particular intitulado "Declaração de dívida" de que os embargantes são devedores aos embargados da quantia de €545.000 e os factos dados como provados no n° 18 (Os embargantes assinaram o documento referido em 2 deforma livre e espontânea) e, de outro lado, os factos dados como provados nos n°s 3-A (O documento referido em 2. e 3. não corresponde à realidade…») e 3-B (Os executados não quiseram vincular-se ao teor do documento referido em 2. e 3), tendo em conta que, nesta matéria, constitui jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal que a contradição entre factos dados como provados capaz de inviabilizar a decisão jurídica do pleito e, por isso, relevante para efeitos do disposto no art. 682°, n° 3 do CPC, é aquela que traduz a existência entre eles de uma relação de exclusão, no sentido de estarmos perante factos inconciliáveis. E a este respeito diremos que a nossa resposta não pode deixar de ser afirmativa, pois, não tendo os embargantes contrariado a prova plena do documento particular em causa, com base na falsidade do documento (arts. 347° e 372°, n°l, ambos do C. Civil) ou mediante a prova dos alegados factos integrativos de erro ou de vício da vontade (cfr. facto dados como não provados e supra descritos nas alíneas b) e c) do ponto 3.1), suscetíveis de determinar a nulidade ou anulação da confissão e resultando provado no ponto 18 que "os embargantes assinaram o documento referido em 2 de forma livre e espontânea", não há dúvida que os factos dados como provados pelo Tribunal da Relação nos pontos 3-A e 3-B, contrariam esta realidade. Daí que, neste contexto e perante uma tal contradição se imponha, ao abrigo do art. 682.°, n.º 3, do CPC, determinar a baixa do processo à Relação para suprir esta contradição em ordem a viabilizar a adequada decisão jurídica do presente litigo. -…-” 2 - No seguimento da última decisão do STJ, a Relação proferiu um terceiro acórdão de que destacamos estes partes: “-…- Nesta conformidade, as questões a resolver são as seguintes: Superação de contradição factual. 1. Falta/Vício de vontade dos embargantes ao assinarem a declaração de dívida. 2. Importa clarificar neste momento o que está em jogo na presente decisão. (…) 3. Com todo o respeito se diz que não divisamos a apontada contradição factual, porque uma pessoa pode assinar um documento de forma livre e não se querer vincular ao teor do mesmo (por ex: nas situações de reserva mental ou declarações não sérias). Seja como for devemos obediência ao acórdão do STJ e consequentemente vamos tentar superar a indicada contradição. (…) Afigura-se-nos como certo que afinal foi realizado um simples mútuo, e não suprimentos, como consta da declaração de dívida e no protocolo de suprimentos, como revelaram e nos iluminaram os principais interessados nessa declaração de dívida e título executivo dado à execução, exequente e seu irmão, nas suas declarações e seu depoimento, que nos mereceram suficiente e sólida credibilidade face ao depoimento não convincente do embargante de que seriam meros suprimentos. Também nos convencemos que esse mútuo foi realizado a favor da sociedade, e não às pessoas singulares embargantes e sogros/pais, pois o mútuo destinava-se a investimento da sociedade em lotes para construção civil na ... (e o seu reembolso, além dos juros efectivamente recebidos pelos exequentes, passaria pelo recebimento de uma percentagem no total dos lucros realizados com a venda dos lotes para construção no terreno de que a sociedade era ali proprietária). Inexiste qualquer elemento probatório que aponte para uma falta de liberdade na assinatura da declaração de dívida.”. Desta motivação ressalta, para nós, com toda a evidência, que se deu prevalência ao princípio da livre e prudente apreciação (plasmado no art. 607º, nº 5, 1ª parte, ex vi do art. 663º, nº 2, ambos do NCPC), com base no apuramento da vontade real das pessoas envolvidas no negócio e depoimentos testemunhais, como o STJ reconhece (no ponto 3.2.3., a págs. 33, do seu acórdão). Desta sorte, num esforço por superar a indicada contradição, mas tendo em conta o respeito pela nossa livre convicção e a motivação concreta da decisão da matéria de facto que se expressou, vamos alterar o facto provado 3-B. precisando mais particularmente o mesmo, em conjugação com o facto provado 3-A., e articulação com a restante matéria apurada, designadamente os factos provados 2-, 3- e 18-, o que se faz nos seguintes termos (a negrito, ficando a anterior redacção em letra minúscula): 3-B. Os executados não quiseram vincular-se ao teor do documento referido em 2-, pontos 2. e 3., e 3-. 3.1. Nova clarificação se impõe relembrar, neste momento, na parte dedicada à fundamentação jurídica. Face ao novo acórdão do STJ ficou arrumada definitivamente a questão de saber se a declaração de dívida contante do documento referido no facto provado 2. era um reconhecimento de dívida, nos termos e para os efeitos do art. 458º do CC, que, também, tinha sido fundamento do último recurso dos exequentes, tese que o STJ rejeitou. 3.2. Face aos factos provados, mesmo perante o novo 3-B., não vemos razão para alterar o que na parte de direito foi exarado no nosso anterior acórdão pelo que vamos repetir essa parte. -…-” - Que dizer? Sobre a prova documental e a noção de documento estabelece o artº362º do Código Civil/CC: - Prova documental é a que resulta de documento; diz-se documento qualquer objecto elaborado pelo Homem com o fim de representar de reproduzir ou representar uma pessoa, coisa ou facto. Como refere, José Lebre de Freitas, “o título executivo extrajudicial ou judicial impróprio é um documento que constitui prova legal para fins executivos, e que a declaração nele representada tem pro objecto o facto constitutivo de direito de crédito ou é, ela própria, este mesmo facto” – in, “A AÇÃO EXECUTIVA À LUZ DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2013, 7ª edição da Gestelegal, pags.83 e 84 - 3.7.1. Sobre o conceito de confissão, as sua formas e o seu valor probatório formal e material, existe vasta e pacífica doutrina, designadamente, vide: - Andrade, M. A. Domingues de, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, Coimbra, 1979, pp. 228 a 256; - Lima, Pires de/ Varela, Antunes, Código Civil Anotado, vol. 1, 4.ª ed., Coimbra Editora, 1987, pp. 313 a 320; - Mendes, João de Castro, Direito Processual Civil, II vol., revisto e actualizado, AAFDL, Lisboa, 1987, p. 697 a 707; - Reis, J. Alberto, Código de Processo Civil anotado, III, 4.ª ed., Coimbra, 1985, pp. 435 a 441; - Serra, Adriano Vaz, Provas (Direito Probatório Material), BMJ, n.º 110 pp. 200 a 256 e n.º 111, pp. 5 a 70; - Varela, Antunes/Bezerra, Miguel/Nora, Sampaio, Manual de Processo Civil, 2.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 1985, pp. 523 a 565. São estes os questionados factos – cfr. supra Questão de Facto: “(…) 3-A. O documento referido em 2. e 3. não corresponde à realidade, uma vez que apenas foram feitos empréstimos à sociedade e não aos executados para o exercício do comércio pelos mesmos, por si e enquanto casal. 3-B. Os executados não quiseram vincular-se ao teor do documento referido em 2. pontos 2 e 3 e 3-. (…)” Tais factos dados como provados violam o disposto no artº358º nº 2 do CPC, como defendem os recorrentes, atento à “declaração de dívida” a que corresponde o documento particular que serve de título executivo. Senão vejamos: No caso vertente estamos perante um documento particular assinado pelos seus autores, nos termos constantes do ponto 18 dos factos assentes: “18- Os embargantes assinaram o documento referido em 2 de forma livre e espontânea, garantindo aos exequentes o cumprimento do que ali acordaram, com recurso ao património da empresa ou com recurso ao seu próprio património.” Está, portanto, reconhecido o seu valor probatório formal, concretamente a sua autenticidade – artº373º nº1 do CC. Por sua vez, o aludido artº358º CC diz-nos qual o valor probatório material da confissão dos executados expresso no título executivo em apreço: - A confissão extrajudicial, em documento autêntico ou particular, considera-se prova nos termos aplicáveis a estes documentos e, se for feita à parte contrária ou a quem o represente, tem força probatória plena. Sendo pacífico que o discutido documento particular foi livremente subscrito pelos embargantes/executados, temos que o mesmo só poderia ser posto em crise através da arguição e prova da sua falsidade, o que não se verificou – nº1 do artº376º do CC. Logo, e em consequência, os factos confessados pelos executados/embargantes em tal documento não podem ser infirmados por prova testemunhal - nº 2 do mesmo artº376º do CC. A nível jurisprudencial, sobre a força probatória da prova em análise, destacamos os seguintes arestos: - Acordão do STJ de 26-02-2015 - Revista nº 5642/03.0TVLSB-A.L1.S1 - 2ª Secção (relatado pelo Conselheiro Tomé Gomes), não publicado, com este sumário: “I - A força probatória da declaração confessória é a fixada pelo art. 358.º, n.º 2, do CC: considera-se provada nos termos aplicáveis ao documento de que consta (força probatória formal); e, tendo sido feita à parte contrária, reveste-se de força probatória plena contra o confitente (força probatória material). II - Decorre do art. 359.º, n.ºs 1 e 2, do CC, que o confitente não pode impugnar a confissão produzida alegando e provando, simplesmente, que o facto confessado não é verdadeiro: para destruir a força probatória da confissão terá que alegar e provar o erro ou outro vício de que tenha sido vítima. III - Nas situações enquadráveis no art. 458.º do CC não há verdadeiramente a confissão dum facto desfavorável ao autor da declaração, mas uma mera confissão de dívida, presumindo-se até prova em contrário a existência da relação fundamental (causal); permite-se ao autor da declaração, portanto, que ilida a presunção (art. 350.º, n.º 2, do CC) mediante a prova de que nenhuma relação negocial existe na base da declaração de reconhecimento emitida. IV - Na confissão inserida em documento particular cuja veracidade esteja reconhecida, diversamente, os factos compreendidos na declaração e contrários aos interesses do declarante valem a favor da outra parte nos termos da declaração confessória efectuada (…). - No mesmo sentido, o Acordão do STJ, de 31-05-2011 - Revista n.º 4716/10.5TBMTS - A.S1 - 6.ª Secção (relatado pelo Conselheiro Salazar Casanova), publicitado in, http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/b13d9a59d7d0bef6802578a7003144fa?OpenDocument: “(…) Tem força probatória plena a confissão extrajudicial de dívida, na qual se alude ao empréstimo que foi concedido em determinado montante, confissão essa exarada em documento autêntico (escritura pública) em que outorgaram o ora exequente, destinatário da confissão (art. 358.º, n.º 2, do CC) e os executados, documento que constitui título exequível de harmonia com o disposto no art. 46.º, n.º 1, al. b), do CPC; a força probatória plena dessa confissão significa, nestas circunstâncias, que a prova do facto confessado – o empréstimo da referida quantia a restituir em determinada data – pode ser ilidida só com base na falsidade do documento (arts. 347.º e 372.º, n.º 1, do CC) ou mediante a invocação de factos integrativos de falta ou de vício da vontade que determinem a nulidade ou anulação da confissão.” Voltando ao caso “decidendi” Em sintonia com a substância da confissão extrajudicial proclamada pelos executados/embargantes, a sua documentada “declaração de dívida”, e nos termos dos fundamentos jurídicos que acabámos de explicitar, não podemos deixar de reafirmar o que já foi escrito nos anteriores acórdãos deste STJ quanto força probatória plena inerente a tal confissão desfavorável dos embargantes/executados. Há, assim, evidente erro na apreciação da prova que constitui o documento particular referido em 2 dos factos assentes, e em consequência, na fixação dos factos afirmados em 3-A (O documento referido em 2. e 3. não corresponde à realidade, uma vez que apenas foram feitos empréstimos à sociedade e não aos executados para o exercício do comércio pelos mesmos, por si e enquanto casal) e 3-B (Os executados não quiseram vincular-se ao teor do documento referido em 2. pontos 2 e 3-). Sabemos que o artº 682º do CPC (termos em que julga o tribunal de revista) consagra como regra a distinção entre questão de facto e questão de Direito, reservando o STJ a sua competência na aplicação do Direito aos factos que as instâncias tiverem fixado. “Todavia, a lei excepciona os casos previstos no artº 674º nº 3 (CPC): ofensa de lei expressa que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova. Quando, na enunciação da matéria de facto provada, se constate que a(s) instância(s) desrespeitaram norma expressa, o Supremo, por iniciativa própria ou por impulso das partes, deve modificar a decisão e ajustá-la ao preceito imperativo que se mostre violado” – citação de António Abrantes Geraldes, in, Recursos em Processo Civil, 7ª Edição actualizada, pag.504, sendo que de pag.503 a 506, este tema é particularmente analisado do ponto de vista doutrinal e jurisprudencial; e na mesma obra, pag.469, é dado como exemplo, precisamente, os factos resultantes de declaração confessória com força probatória plena que não foi atendida. No mesmo sentido, Lebre de Freitas, Ribeiro Mendes, Isabel Alexandre, in, Código De Processo Civil Anotado, 3ª Edição, em particular, pag. 254. Considerando a manifesta contradição entre os factos provados no ponto 2 dos factos provados e o também provado nos pontos 3-A e 3-B – cfr. B) DA QUESTÃO DE FACTO - e a força probatória plena do documento factualmente descrito em 2, impõe-se dar como não provados os factos constantes dos aludidos pontos 3-A e 3-B. Provada a responsabilização pessoal dos embargantes/executados nos termos constantes do documento que serve de título executivo, o insucesso destes embargos é inevitável. Sumariando: - A confissão extrajudicial, em documento particular, considera-se prova nos termos aplicáveis a estes documentos e, se for feita à parte contrária, tem força probatória plena. - É o caso dos autos, em que os embargantes/executados subscrevem documento, no qual se responsabilizam pessoalmente, perante os embargados/exequentes, relativamente ao empréstimo que estes lhes fizeram. - Face a força probatória plena do documento particular que serve de título executivo, bem como o disposto no artº 674º nº 3, aplicável, ex vi, artº 682º nº 2, ambos do CPC, excepcionalmente pode o STJ, dar como não provados os questionados factos dados como assentes pelo Tribunal da Relação. DECISÃO - Assim e pelos fundamentos expostos, julga-se procedente a revista, e consequentemente, declaram-se improcedentes os embargos. - Custas pelos embargantes. Lisboa, 06 de julho de 2023 Afonso Henrique (relator) Isabel Salgado Maria da Graça Trigo |