Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
04B3644
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: MOITINHO DE ALMEIDA
Descritores: CONSERVADOR DO REGISTO PREDIAL
JUSTIFICAÇÃO JUDICIAL
COMPETÊNCIA MATERIAL
Nº do Documento: SJ200411250036442
Data do Acordão: 11/25/2004
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: T REL LISBOA
Processo no Tribunal Recurso: 9663/03
Data: 03/16/2004
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Sumário : Não existindo litígio, pertence hoje aos conservadores a competência para , em processo de justificação (artigo 116° do Código do Registo Predial), suprir a falta de título da propriedade de imóveis com fundamento no usucapião.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:


1. "A", seu marido B e outros intentaram a presente acção declarativa, com processo ordinário, contra C, seu marido D e outros, pedindo, em substância, que sejam reconhecidos como legítimos possuidores e proprietários das parcelas de terreno e casas que identificam, prédios autónomos, distintos, divididos e demarcados, condenando-se os Réus a reconhecerem o direito de propriedade dos Autores e absterem-se da prática de quaisquer actos que perturbem ou impeçam o exercício de tais direitos.
Alegaram para o efeito e em resumo que, após a morte dos antepossuidores E e mulher F, respectivamente em 12 de Abril de 1974 e 18 de Setembro de 1977, seus filhos, genros e netos, agora Autores e Réus procederam à partilha verbal da herança, tendo sido adjudicado aos autores o prédio rústico sito no Casal da Boavista, Glória do Ribatejo que identificam, onde se encontra edificada uma morada de casas de habitação.
Este prédio foi entre eles dividido pela forma que especificam.
Os Autores encontram-se, assim, na posse efectiva dos prédios a eles adjudicados desde a morte de seus pais, sogros e avós. Sempre os têm cultivado, amanhado e explorado como prédios independentes, individualizados e devidamente demarcados. Os Autores G e marido possuem a morada de casas de habitação, edificada na sua parcela de terreno, também há mais de vinte anos.
Esses prédios foram, assim, adquiridos por usucapião.

Os Autores não dispõem de títulos que lhes permitam fazer a prova do seu direito de propriedade, nem têm a possibilidade de os obter de outra forma.
A petição inicial foi indeferida liminarmente, por incompetência do Tribunal em razão da matéria.
Por acórdão de 16 de Março de 2004, a Relação de Lisboa negou provimento ao recurso de agravo interposto pelos Autores.
Inconformados, recorreram para este Tribunal, concluindo as alegações do seu agravo nos seguintes termos:
1. Os pedidos formulados pelos autores não podem ser da competência de uma Conservatória do Registo Predial ou de um Cartório Notarial;
2. O conteúdo dos pedidos formulados pelos Autores está perfeitamente inserido na acção comum declarativa, constitutiva e de condenação, prevista nos arts.4° e 460° do CP.C.;
3. O Tribunal a quo, Tribunal de Benavente, é plenamente competente, em razão da matéria, da hierarquia e do território para julgar e decidir os pedidos formulados pelos Autores;
4. O que se pede nesta acção está fora do âmbito e da competência das Conservatórias e Cartórios;
5. Devido a errada e deficiente interpretação, violaram as Instâncias, tribunal da Comarca de Benavente e Tribunal da Relação de Lisboa, o disposto nos arts. 1287° e sgs. do C.C. e os arts.2°, 3°, 4°, 101°, 102°, 105°, 234°A, n°1, 288°, n°1 a), 460°; 493° e 494°, a) do C.P.C.;
6. Deve dar-se provimento ao recurso, revogando-se o douto Acórdão recorrido do Tribunal da Relação de Lisboa, substituindo-o por Acórdão que declare o Tribunal a quo da Comarca de Benavente territorialmente e materialmente competente em razão da matéria, ordenando-se o prosseguimento da acção até final.
2. Entendeu o acórdão recorrido que "Atentos (os) factos invocados pelos agravantes sobre a causa de aquisição dos seus direitos e as razões que impossibilitam a sua comprovação pelos meios normais e as transmissões operadas a partir do titular inscrito e as circunstâncias em que se baseia a aquisição originária, está-se perante um processo de justificação cuja competência, atentas razões que constam do Decreto-Lei n°273/2001 e o disposto no artigo 116° (do Código de Registo Predial) é deferida ao conservador e não já em alternativa aos tribunais judiciais em primeira instância, tanto mais que não há litígio entre as partes envolvidas".
Concorda-se com o assim decidido e respectiva fundamentação. Com efeito, resulta claro do preâmbulo do mencionado Decreto-Lei que a competência para apreciar processos de carácter "eminentemente registral" pertence hoje aos conservadores de registo, o que é imposto por razões de "desburocratização e simplificação processual" e se insere numa "estratégia de desjudicialização de matérias que não consubstanciam verdadeiro litígio". Tal é o caso do presente processo pelas razões invocadas no acórdão recorrido e para as quais se remete (artigos 713°, n°5 e 726° do Código de Processo Civil).
Nega-se, pois, provimento ao agravo.
Custas pelos Recorrentes.
Lisboa, 25 de Novembro de 2004
Moitinho de Almeida
Noronha de Nascimento
Ferreira de Almeida