Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
027972
Nº Convencional: JSTJ00002682
Relator: ROCHA FERREIRA
Descritores: PENA DE PRISÃO
FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: SJ195300702027972
Data do Acordão: 01/07/1953
Votação: MAIORIA COM 4 VOT VENC
Referência de Publicação: DR IªS DE 16-01-1953 ; BMJ 35, 89
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PARA O PLENO
Decisão: FIXADA JURISPRUDÊNCIA
Indicações Eventuais: ASSENTO 1/1953
Área Temática: DIR CRIM - TEORIA GERAL.
Legislação Nacional: CP886 ARTIGO 85 ARTIGO 355 ARTIGO 356.
D 26643 DE 1936/05/28 ARTIGO 56 ARTIGO 113 ARTIGO 139 ARTIGO 459 ARTIGO 460.
DL 32832 DE 1943/06/07.
DL 35015 DE 1945/10/15.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO STJ DE 1950/07/19 IN BMJ N20 PAG216.
ASSENTO STJ DE 1950/07/03 IN BMJ N20 PAG209.
Sumário :
Na vigencia da Organização Prisional, promulgada pelo DL n. 26643, de 28 de Maio de 1936, na metropole não pode, por crimes comuns, haver condenação discriminativa em prisão no lugar do degredo.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, em sessão plenaria:

Por acordão proferido a folhas 258 deste processo, foi a re A condenada, como autora do crime do artigo 356 do Codigo Penal, na pena de oito anos de prisão maior celular, seguida de degredo por vinte, com prisão no lugar de degredo ate dois anos, ou sem ela, conforme parecer ao juiz, ou, em alternativa, com a pena fixa de degredo por vinte e oito anos, com prisão no lugar de degredo por oito ou dez, declarando-se que aquela disposição do artigo 356, impondo a referida pena, não se acha alterada pelo assento de 3 de Julho de 1950, a qual, como outras do Codigo Penal, tem de ser observada, enquanto não forem expressamente modificadas.
Desse acordão recorre para este Tribunal o Excelentissimo Representante do Ministerio Publico, alegando que ele esta em oposição com o de 19 de Julho de 1950, publicado no Boletim do Ministerio da Justiça, n. 20, pagina 216, no qual, em caso em que era aplicavel pena semelhante, ou seja, a do artigo 355 do Codigo Penal, se decidiu não haver lugar a aplicação da pena de prisão no lugar do degredo, por, em face da actual Organização Prisional, ter deixado de existir, o que alias e orientação do referido assento.
Pelo acordão de folhas 273, foi o recurso mandado seguir, por, na verdade, haver oposição entre os dois mencionados acordãos.
O dito magistrado, na sua douta alegação de folhas 279 sobre o objecto do recurso, sustenta que deve tirar-se assento em que se reconheça a inaplicabilidade actual, na Metropole, da pena de prisão no lugar do degredo, deixando-se, no entretanto, expresso que a pena maior de que aquela medida, no regime do Codigo Penal, constituia parte integrante, so deve ser agravada, nos termos gerais, dada a concorrencia de circunstancias acessorias que tal justifiquem.
Cumpre, portanto, resolver o conflito, consistente em se determinar se a pena de prisão no lugar do degredo, estabelecida, entre outros, nos artigos 355 e 356 do Codigo Penal, ainda actualmente e de aplicar na Metropole, em face da Reforma Prisional, a que respeita o Decreto n. 26643, de 28 de Maio de 1936.
Para tanto, devera atender-se ao que judicialmente foi sustentado pelo Excelentissimo Conselheiro Procurador- -Geral da Republica e seu douto Ajudante.
Embora, ja depois da Reforma Prisional, tenham sido publicados diplomas mandando aplicar a prisão no lugar do degredo e este Supremo Tribunal não possa funcionar como orgão legislativo do Estado, o conflito de jurisprudencia em causa tem de ser solucionado, cabendo depois aos orgãos legislativos legislar em sentido diverso, se entenderem que o interesse publico exige solução diferente.
No acordão que fixou o assento de 3 de Julho de 1950, publicado no Boletim do Ministerio da Justiça, n. 20, pagina 209, pondera-se:
"Sucede, porem, que hoje, em consequencia dos artigos 56 e
459 da Reforma Prisional, o degredo cumpre-se nas penitenciarias da Metropole, como prisão maior, reduzida de um terço na duração, tornando-se, por isso, impossivel o seu agravamento atraves da imposição do cumprimento de parte dele em prisão, pois e neste regime que, na totalidade, e cumprido".
E certo que no caso desse acordão se discutia a agravação por virtude de reincidencia e que no caso que agora se discute e a agravação, ou, mais precisamente, a maior gravidade da pena constituida por prisão no lugar do degredo imposta como punição especifica dos crimes dos artigos 355 e 356 do Codigo Penal.
No entanto, em ambos os casos o motivo para se considerar prejudicada a prisão no lugar do degredo e o mesmo.
Por isso, seria desprestigiante para este Tribunal que na solução do presente conflito se adoptasse doutrina diferente.
Com efeito, o artigo 56 da Reforma Prisional determina que o degredo sera cumprido como prisão maior, nos estabelecimentos a esta pena destinados (penitenciarias da Metropole e colonias penais do Ultramar), reduzindo-se a sua duração de um terço, excepto quanto aos criminosos de dificil correcção, em que a pena não tera redução (artigo 113).
Deduz-se das disposições combinadas dos artigos 56, 113 e 139 da Reforma Prisional que o regime de cumprimento da pena nas colonias do Ultramar, para criminosos comuns, nunca e em regime de liberdade.
Como tambem notou o Excelentissimo Procurador-Geral da Republica, a isto não obsta o que se dispõe, transitoriamente, no artigo 460 da mesma Reforma, permitindo que, enquanto não houver estabelecimentos especiais com a capacidade suficiente, o cumprimento da prisão maior e de degredo se possa fazer em outros estabelecimentos designados pelo Conselho Superior dos Serviços Criminais, por ser de prever que nesses estabelecimentos, a designar, o regime para os presos seja semelhante, e nunca o de liberdade, unico que poderia tornar eficiente e compreensivel o agravamento da pena no lugar do degredo.
Constituindo a prisão no lugar do degredo parte integrante da pena ou punição especifica de certos crimes, entre os quais os dos referidos artigos 355 e 356 do Codigo Penal, essa agravação especial dara lugar a diminuição da punição, por a parte da pena assim eliminada não poder ser substituida por outra, conforme dispõe o artigo 85 do mesmo Codigo.
E, assim, a pena so podera ser agravada, nos termos gerais, quando ocorram circunstancias acessorias que tanto o justifiquem.
Prevalece, portanto, o doutrinado no invocado acordão de 19 de Julho de 1950.
Nestes termos, concedem provimento ao recurso, revogando o acordão recorrido na parte que condenou a re A em prisão no lugar do degredo, que fica sem efeito, firmando o seguinte Assento:
"Na vigencia da Organização Prisional promulgada pelo Decreto-Lei n. 26643, de 28 de Maio de 1936, na Metropole não pode, por crimes comuns, haver condenação discriminativa em prisão no lugar do degredo".
Não e devido imposto de justiça.


Lisboa, 07 de Janeiro de 1953

Rocha Ferreira (Relator) - Bordalo e Sa - Lencastre da Veiga - Jaime de Almeida Ribeiro - Beça de Aragão - Jose de Abreu Coutinho - A. Bartolo - Jaime Tome (Assinei e votei o acordão por existir o assento de 3 de Julho de 1950, com o qual alias não concordo, pelos fundamentos dos votos de vencido do mesmo assento). - Julio M. de Lemos (Vencido, por entender que o Decreto n. 26643, sendo essencialmente destinado a regular a execução das penas, não contem disposição expressa que revogue os preceitos penais em que se estabelece como parte integrante da pena a aplicar a pena de prisão no lugar do degredo, nem esta foi abolida pelas suas disposições, antes prevista para determinadas especies de delinquentes, para o que são criadas colonias no Ultramar, cujo regime e, na medida do possivel, semelhante ao das cadeias e penitenciarias destinadas a presos de dificil correcção, o que não exclui que para os condenados a prisão no lugar do degredo se estabeleça regime especial, tanto mais constando do relatorio do referido decreto que certos criminosos podem ser enviados para o degredo em relativa liberdade e depois de cumprirem a pena de prisão. Alem do que, posteriormente a este decreto, foram publicados outros diplomas que estabelecem a prisão no lugar do degredo, como os Decretos ns. 33252 (artigos 136 e 142), 32832 e 35015, nada havendo tambem na Reforma Prisional que admita ter sido pensamento do legislador suavizar essas penas) - Raul Duque (Vencido, pelos mesmos fundamentos). - Piedade Rebelo (Vencido. A Organização Prisional não modificou as penas estabelecidas no Codigo Penal, tendo-se limitado a regulamentar a sua execução, e tanto assim que leis posteriores, como o Decreto- Lei n. 32832, de 7 de Junho de 1943, e o Decreto-Lei n. 35015, de 15 de Outubro de 1945, mandam aplicar a pena de prisão no lugar do degredo.
O actual Codigo Penal e Disciplinar da Marinha Mercante determina ate expressamente, nos artigos 136 e 142, que aos autores dos crimes neles previstos sera aplicada a pena fixa de degredo por vinte e oito anos, com prisão no lugar do degredo por oito a dez anos. Não se consignou, e certo, na referida Organização a forma de ser executada a aludida prisão, mas esta omissão so pode ser corrigida pelo legislador. Não so por isso, mas tambem porque do assento resulta, sem qualquer razão justificativa, a supressão de uma pena sem substituição por qualquer outra e, portanto, a alteração da propria sanção penal, que fica, assim, muito atenuada, votei que fosse negado provimento) - A. Cruz Alvura (Vencido, pelos fundamentos dos votos que antecedem) - (Tem votos de conformidade dos Excelentissimos Conselheiros Roberto Martins e Campelo de Andrade, que não assinam por não estarem presentes) -

- Rocha Ferreira.