Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
2565/16.6T8PTM.E1.S2
Nº Convencional: 1ª SECÇÃO
Relator: ALEXANDRE REIS
Descritores: PEDIDO DE INDEMNIZAÇÃO CIVIL
RESPONSABILIDADE CIVIL EMERGENTE DE CRIME
PROCEDIMENTO CRIMINAL
PRAZO DE PRESCRIÇÃO
ACUSAÇÃO
PRINCÍPIO DA ADESÃO
Data do Acordão: 05/22/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL – RELAÇÕES JURÍDICAS / FACTOS JURÍDICOS / PRESCRIÇÃO – DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / FONTES DAS OBRIGAÇÕES / RESPONSABILIDADE CIVIL / RESPONSABILIDADE POR FACTOS ILÍCITOS.
DIREITO PENAL – EXTINÇÃO DA RESPONSABILIDADE CRIMINAL / PRESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO CRIMINAL – CRIMES EM ESPECIAL / CRIMES CONTRA A INTEGRIDADE FÍSICA.
DIREITO PROCESSUAL PENAL – SUJEITOS DO PROCESSO / PARTES CIVIS.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 306.º, N.º 1 E 498.º, N.º 3.
CÓDIGO PENAL (CP): - ARTIGOS 118.º, N.º 1, ALÍNEA C) E 148.º, N.º 1.
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL (CPP): - ARTIGOS 71.º, 72.º E 77.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 22-01-2004, PROCESSO N.º 03B4084, IN WWW.DGSI.PT E CJSTJ 1º/36;
- DE 13-10-2009, PROCESSO N.º 206/09.7YFLSB;
- DE 15-10-1998, PROCESSO N.º 97B988;
- DE 31-01-2007, PROCESSO N.º 06A4620;
- DE 27-04-2011, PROCESSO N.º 712/00.9JFLSB.L1.S1;
- DE 18-12-2013, PROCESSO N.º 150/10.5TVPRT.P1.S1;
- DE 22-05-2013, PROCESSO N.º 2024/05.2TBAGD.C1.C1;


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ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA:


- DE 21-02-2017, PROCESSO N.º 520/16.5T8CBT-E.C1.


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ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA:


- DE 03-03-2005, PROCESSO N.º 1657/04-2.


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ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:


- DE 09-01-2012, PROCESSO N.º 113/11.3TBTND-A.C1.
Sumário :

I - No caso em apreço, uma vez iniciado o procedimento criminal com a notícia do crime (de ofensa à integridade física por negligência previsto no art. 148.º, n.º 1, do CP), o prazo de prescrição de 5 anos (aplicável por força das disposições conjugadas dos arts. 498.º, n.º 3, do CC, e 118.º, n.º 1, al. c), do CP) apenas começou a correr, nos termos do art. 306.º, n.º 1, do CC, com o desfecho do inquérito, portanto, com a dedução da acusação contra o arguido em tais autos, momento a partir do qual o direito pôde ser exercido na acção civil.
II - Com efeito, curando da responsabilidade civil conexa com a criminal, o art. 71.º do CPP consagra o princípio da adesão da acção civil à acção penal que, mais do que uma mera interdependência das acções, arrasta o pedido de indemnização civil de perdas e danos para a jurisdição penal.
III - Não obstante as diversas salvaguardas à obrigatoriedade de o direito à indemnização ser exercido no procedimento penal, plasmadas no art. 72.º do CPP, assiste ao lesado o direito de aguardar o termo do inquérito criminal, com o seu arquivamento ou com a dedução da acusação, se, perante qualquer das situações abarcadas em tais ressalvas, não quiser recorrer, logo, à acção cível em separado.
IV - Contudo, deduzida a acusação no inquérito, uma vez que o direito à indemnização tem de ser aí exercido nos prazos peremptórios cominados no art. 77.º do CPP, sob pena de ficar definitivamente encerrada a possibilidade do exercício da acção cível em conjunto com a penal, cessa o impedimento para o exercício do direito na instância cível e passa a verificar-se a inércia do respectivo titular, em que se funda a extinção inerente à prescrição, iniciando-se o cômputo do prazo desta a partir de então.
Decisão Texto Integral:
                                                                                             

AA intentou esta acção contra BB, SA, pedindo a condenação desta a indemnizá-la dos danos patrimoniais e não patrimoniais que alegou ter sofrido em consequência de ter sido atropelado, em 23-01-2005, por um veículo a cujo condutor atribui culpa na sua produção, encontrando-se transferida para a R a responsabilidade por tais danos.
 A R contestou, invocando a prescrição do direito do A e este respondeu sobre essa matéria.
Foi proferido despacho saneador, julgando procedente a excepção de prescrição e, em consequência, absolvendo a R do pedido.
A Relação julgou improcedente a apelação interposta pelo A, confirmando, sem voto de vencido, a decisão proferida em 1ª instância.
O A interpôs interpôs revista excepcional desse acórdão, admitida pela competente Formação, tendo delimitado o objecto do recurso com conclusões em que suscita as questões de saber se:
1. - a prescrição do direito de indemnização invocado pelo A esteve interrompida até 13/11/2008, data em que foi proferida sentença final no processo penal instaurado pelos factos em que aquele fundamenta tal direito, e se foi interrompida, de novo, com a citação da R (ocorrida entre Março e Maio de 2013) para os termos da acção proposta pelo A na jurisdição inglesa, começando então a correr novo prazo;
2. - com a referida sentença penal, passou a ser de 20 anos (art. 311º, nº 1, do CC) o prazo de prescrição de tal direito, uma vez que pela mesma a R foi condenada a ressarcir os danos causados pela condução do aí arguido e segurado da R a um outro lesado, que nesse processo reclamara a respectiva reparação.
*
Cumpre apreciar e decidir as questões enunciadas, para o que relevam os seguintes elementos factuais que se extraem da matéria considerada provada pela Relação, bem como da alegada pelo A, sem impugnação especificada da R:
a) O aludido acidente entre o A e o condutor do veículo segurado na R ocorreu no dia 23-01-2005.
b) Em 23-01-2007, no termo do inquérito penal entretanto instaurado, o Ministério Público deduziu acusação contra o referido condutor, pelos factos relativos a tal acidente.
c) No subsequente processo comum singular, foi proferida sentença em 13-11-2008, condenando esse condutor como autor, além do mais, de um crime de ofensa à integridade física por negligência, p. e p. pelo art. 148º, nº 1, do C. Penal, na pessoa do A,
d) e condenando a R a indemnizar o  Hospital CHBA, que, para o efeito, deduzira pedido cível.
e) Em 26-03-2013, o A propôs acção de indemnização em Tribunal inglês contra a R, para cujos termos esta foi citada (entre Março e Maio de 2013), a qual não chegou a ser apreciada devido à questão da “competência dos Tribunais ingleses”;
f) A presente ação foi proposta no dia 8-11-2016.
*
1. A interrupção da prescrição.
Não suscita controvérsia nos autos a aplicabilidade à prescrição invocada pela R do prazo de 5 anos, por força do disposto nas disposições conjugadas dos artigos 498º, nº 3, do CC e 148º, nº 1, e 118º, nº 1, c) do CP.
Segundo o recorrente, a prescrição do direito de indemnização por ele invocado esteve interrompida até 13/11/2008, data em que foi proferida sentença final no processo penal instaurado pelos factos em que aquele fundamenta tal direito, e foi interrompida, de novo, com a citação da R (ocorrida entre Março e Maio de 2013) para os termos da acção proposta pelo A na jurisdição inglesa, começando então a correr o novo prazo (de 5 anos).
Porém, no caso em apreço, uma vez iniciado o procedimento criminal com a notícia do crime (de ofensa à integridade física por negligência previsto no art. 148º, nº1, do CP), tal prazo começou a correr com o desfecho do inquérito, portanto, com a dedução, em 23-01-2007, da acusação contra o arguido em tais autos.
Concretizemos tal asserção.
Nos termos do art. 71º do CPP, «O pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é deduzido no processo penal respectivo, só o podendo ser em separado, perante o tribunal civil, nos casos previstos na lei», ou seja, tipificados nas várias alíneas do subsequente art. 72º.
Curando da responsabilidade civil conexa com a criminal, o preceito consagra no nosso ordenamento o princípio da chamada adesão da acção civil à acção penal, mais do que uma mera interdependência das acções: o princípio arrasta consigo o pedido de indemnização civil de perdas e danos para a jurisdição penal.
O acórdão deste Tribunal de 22-01-2004 ([1]), invocado pelo recorrente como fundamento para a admissão da revista a título excepcional, explicitou assim o alcance desse normativo: «O pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é deduzido no processo penal respectivo (princípio da adesão), só o podendo ser em separado, perante o tribunal civil, nos casos previstos na lei - artº 71º do CPP. Daí que, em princípio, se haja de admitir que o prazo de prescrição não corre enquanto pender a acção penal, nos termos do disposto no artigo 306º, nº 1, do C. Civil», cujo normativo estipula que «O prazo da prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido».
Esse aresto acrescentou (são nossos os realces):
«Poderia pensar-se, assim, que tal restrição não ocorreria, em princípio, se, não obstante a pendência da acção penal, não existisse obstáculo legal a que o pedido de indemnização pudesse ser apresentado no tribunal cível (em separado), nomeadamente nas hipóteses consideradas no artigo 72º do CPP. E, no caso «sub-specie», a acção cível podia (in abstracto) ser deduzida em separado, com base nas alíneas c) – o procedimento criminal dependia de queixa, f) – o pedido tinha obrigatoriamente de ser deduzido também contra pessoa com responsabilidade meramente civil (Seguradora ou FGA) (…).
Não é, contudo, de aceitar que a pendência do processo crime correspondente não assuma relevância como facto interruptivo da prescrição do direito de indemnizar.
O instituto da prescrição pressupõe que a parte possa opor-se ao exercício de um direito quando este não for exercitado durante o tempo fixado na lei. Trata-se, a um tempo, de punir a inércia do titular do direito em fazê-lo valer em tempo útil e de tutelar os valores da certeza e segurança das relações jurídicas pela respectiva consolidação operada em prazos razoáveis.
(…) No fundo, a pendência do processo crime (inquérito) como que representa uma interrupção contínua ou continuada («ex vi», do artº 323, nºs 1 e 4, do C. Civil), quer para o lesante, quer para aqueles que (...) com ele são solidariamente responsáveis pela reparação dos danos, interrupção esta que cessará naturalmente quando o lesado for notificado do arquivamento (ou desfecho final) do processo crime adrede instaurado.
Não é, ademais, razoável que o início da contagem prescricional para o exercício do direito de indemnização possa ocorrer durante a pendência do inquérito. Admitir o contrário, representaria, em certos casos, negar, na prática, o exercício da acção cível ao lesado que visse o processo crime ser arquivado decorridos que fossem mais de três anos sobre a verificação dos factos danosos, apesar desse processo (penal) ter estado sempre em andamento “normal” durante aquele período de tempo.
Poderia mesmo (e sob outro prisma) coarctar-se ao lesado o exercício do direito de queixa ou de acusação, na medida em que, dependendo o procedimento criminal de queixa do ofendido, a dedução à parte do pedido de indemnização perante o tribunal cível implicaria, de per si, a renúncia ao direito de queixa - nº 2 do artº 72º do CP 82.».
Como logo se vê, a tese do recorrente nenhum apoio colhe do entendimento perfilhado em tal acórdão, cuja invocação é, pois, espúria, sendo certo, aliás, que aquele condiz com o que tem sido persistentemente reiterado em decisões publicitadas deste Tribunal, com especial destaque para a proferida em 13-10-2009 ([2]), assim sumariada:
«O pedido de indemnização civil em separado, admissível quando verificados os casos contemplados no art. 72.º do CPP, constitui uma faculdade concedida ao lesado que ele pode exercer verificada qualquer das situações a que alude o art. 72.º do CPP; essa opção ficaria inviabilizada em muitos casos se a pendência do inquérito não impedisse o início do decurso do prazo de prescrição (art. 306.º, n.º 1, do CC) implicando entendimento contrário desrespeito do princípio da adesão contemplado no art. 71.º do CPP.
Assim sendo, com o desfecho do inquérito, ou por arquivamento ou por acusação, inicia-se o prazo de prescrição, pois, a partir desse momento, o não exercício da acção cível em separado ou conjuntamente, conforme os casos, é da responsabilidade do lesado, não existindo, assim, razão para não se considerar terminado o impedimento posto ao decurso do prazo prescricional.
Do exposto decorre que, iniciado o inquérito com o acidente ocorrido em 10-07-1998, inquérito que findou com acusação deduzida em 21-06-2001, a prescrição passou a correr contra o lesado decorridos os prazos a que alude o art. 77.º do CPP (…)».
Com efeito, uma vez que a prescrição se funda na inércia do titular do direito, deve contar-se o respectivo prazo, logicamente, a partir do momento em que o direito pode ser exercido: «O instituto da prescrição pressupõe que a parte possa opor-se ao exercício de um direito quando este não for exercitado durante o tempo fixado na lei. Trata-se, a um tempo, de punir a inércia do titular do direito em fazê-lo valer em tempo útil e de tutelar os valores da certeza e segurança das relações jurídicas pela respectiva consolidação operada em prazos razoáveis, o que implica que a prescrição não corra ou não opere enquanto o direito não puder ser exercido pelo respectivo titular.» ([3]).
Contudo, não obstante as diversas salvaguardas à obrigatoriedade de o direito à indemnização ser exercido no procedimento penal, plasmadas no art. 72º do CPP, concluímos que assiste ao lesado o direito de aguardar o termo do inquérito criminal, com o seu arquivamento ou com a dedução da acusação, se, perante qualquer das situações abarcadas em tais ressalvas, não quiser recorrer, logo, à acção cível em separado, «não se podendo considerar que o direito à indemnização tem de ser exercido apenas porque se lhe abriu a faculdade de accionar civilmente em separado». Acompanhamos, pois, a doutrina daquele acórdão de 13-10-2009: «A não ser assim, converter-se-ia uma faculdade num ónus, impondo-se, por via interpretativa, uma sanção que a lei não quis impor, não se vislumbrando na lei que o efeito interruptivo decorrente do procedimento criminal instaurado cesse logo que ocorra a possibilidade de ser demandado o responsável civil em separado» ([4]).
Ora, postula o art. 75º, nº 2, do CPP que quem tiver legitimidade para deduzir pedido de indemnização cível deve manifestar no processo, até ao encerramento do inquérito, o propósito de o fazer e o subsequente art. 77º estabelece o momento para essa dedução (depois da acusação ou da pronúncia ou, se não tiver manifestado o propósito a que se refere aquele nº 2 até 20 dias depois da notificação ao arguido da acusação ou se não a houver do despacho de pronúncia).
 Portanto, deduzida a acusação no inquérito, o direito à indemnização tem de ser exercido nos prazos peremptórios assim cominados, sob pena de ficar definitivamente encerrada a possibilidade do exercício da acção cível em conjunto com a acção penal.
Se assim é, passada essa fase processual, não só deixa de ser já possível o exercício do direito no processo penal, como, logicamente, deixa de operar o obstáculo a que o titular do mesmo o concretize na acção civil, pelo que se deve fixar em tal etapa o início do cômputo do prazo da prescrição do direito, por se verificar, a partir de então, a inércia do seu titular em que a inerente extinção do direito se funda. Donde, o prazo de prescrição do direito inicia-se quando ao respectivo titular for exigível que o exerça, por estar em condições objectivas de o poder fazer, nos termos do citado art. 306º do CC.
Em suma, neste caso, tendo o Ministério Público exercido a acção penal, deduzindo acusação, o A estava em condição de formular o pedido de indemnização cível no processo penal. Não o tendo feito e não estando, desde então, impedido de exercer o direito a que se arroga na instância cível, o prazo de prescrição conta-se a partir do momento em que poderia deduzir tal pedido no processo crime, de acordo com o princípio da adesão ([5]).
Portanto, na data (26-03-2013) em que o A propôs contra a R acção de indemnização no Tribunal inglês, já se tinha completado o mencionado prazo de (5 anos) de prescrição, mostrando-se, por isso, extinto o direito que aquele pretendeu exercer na presente acção. Não tem, pois, cabimento aferir se essa demanda em país estrangeiro poderia ter tido o efeito interruptivo almejado pelo A.

2. O prazo da prescrição (de 20 anos).
Por fim, o recorrente sustenta que com a referida sentença penal, passou a ser de 20 anos (art. 311º, nº 1, do CC) o prazo de prescrição do direito a que se arroga, uma vez que, por tal decisão judicial, a R foi condenada a ressarcir os danos causados pela condução do aí arguido e segurado da R a um outro lesado, que nesse processo reclamara a respectiva reparação.
Para patentear o equívoco dessa tese, basta relembrar que a norma invocada determina, a esse respeito, que o direito para cuja prescrição, a lei estabelecer um prazo mais curto do que o prazo ordinário fica sujeito a este último, «se sobrevier sentença passada em julgado que o reconheça, ou outro título executivo».
Ora, o próprio recorrente elucida que na sentença proferida no falado processo comum singular apenas foi reconhecido o direito de um terceiro (hospital), demandante cível naquele processo penal, e não o direito que o mesmo aqui pretenderia exercer, o que, aliás, a ter ocorrido, tornaria inútil esta acção declarativa.

Por conseguinte, improcede o recurso.
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Síntese conclusiva:
1. No caso em apreço, uma vez iniciado o procedimento criminal com a notícia do crime (de ofensa à integridade física por negligência previsto no art. 148º, nº1, do CP), o prazo de prescrição de 5 anos (aplicável por força das disposições conjugadas dos arts. 498º, nº 3, do CC e e 118º, nº 1, c) do CP) apenas começou a correr, nos termos do artigo 306º, nº 1, do CC, com o desfecho do inquérito, portanto, com a dedução da acusação contra o arguido em tais autos, momento a partir do qual o direito pôde ser exercido na acção civil.
2. Com efeito, curando da responsabilidade civil conexa com a criminal, o art. 71º do CPP consagra o princípio da adesão da acção civil à acção penal que, mais do que uma mera interdependência das acções, arrasta o pedido de indemnização civil de perdas e danos para a jurisdição penal.
3. Não obstante as diversas salvaguardas à obrigatoriedade de o direito à indemnização ser exercido no procedimento penal, plasmadas no art. 72º do CPP, assiste ao lesado o direito de aguardar o termo do inquérito criminal, com o seu arquivamento ou com a dedução da acusação, se, perante qualquer das situações abarcadas em tais ressalvas, não quiser recorrer, logo, à acção cível em separado.
4. Contudo, deduzida a acusação no inquérito, uma vez que o direito à indemnização tem de ser aí exercido nos prazos peremptórios cominados no art. 77º do CPP, sob pena de ficar definitivamente encerrada a possibilidade do exercício da acção cível em conjunto com a penal, cessa o impedimento para o exercício do direito na instância cível e passa a verificar-se a inércia do respectivo titular, em que se funda a extinção inerente à prescrição, iniciando-se o cômputo do prazo desta a partir de então.
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Decisão:
Nos termos expostos, negando a revista, confirma-se a decisão recorrida.

Custas pela recorrente.          

Lisboa, 22/5/2018

Alexandre Reis

Lima Gonçalves

Cabral Tavares

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[1] P. 03B4084, in www.dgsi.pt e na CJSTJ 1º/36.
[2] No p. 206/09.7YFLSB. No mesmo sentido, p. ex., os acórdãos de 15-10-1998 (p. 97B988) e 31-01-2007 (p. 06A4620).
[3] Acórdão do STJ de 27-04-2011 (p. 712/00.9JFLSB.L1.S1), em cujo sumário se lê, ainda: «Com efeito, a interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto de interrupção, ficando a nova prescrição sujeita ao primitivo prazo de prescrição (art. 326.º do CC) (…). Se, no caso dos autos, o MP determinou a instauração de inquérito em (…), não podia o tempo decorrido em inquérito ser utilizado na contagem do prazo de prescrição, uma vez que só depois de apurada jurídico criminalmente a conduta da arguido, (que delimitada, conduziria, findo o inquérito, a um despacho de acusação ou de arquivamento, nomeadamente pela verificação ou não do ilícito criminal, fonte do pedido de indemnização civil e independentemente dos termos da qualificação da conduta criminal do arguido), é que poderia saber-se se deveria ser formulado o pedido cível nos termos do princípio da adesão ou em separado.».
[4] No mesmo sentido, p. ex., os acórdãos deste Tribunal de 18-12-2013 (p. 150/10.5TVPRT.P1.S1) e de 22-05-2013 (p. 2024/05.2TBAGD.C1.C1). Também a RC, no acórdão de 21-02-2017 (p. 520/16.5T8CBT-E.C1), formulou a seguinte lapidar conclusão: «enquanto pender o inquérito, (…) enquanto o lesado civil ou titular do direito de indemnização puder usar a adesão ao processo penal esse seu direito não deve ser separadamente exercido e o prazo de prescrição não pode começar a contar-se».
[5] Nesses termos se pronunciaram, também, a RE no acórdão de 3-03-2005 (p. 1657/04-2) e a RC no acórdão de 9-01-2012 (p. 113/11.3TBTND-A.C1).