Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
112/14.3T2AND.P1.S1
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO
Relator: JOÃO CURA MARIANO
Descritores: DESTITUIÇÃO DE GERENTE
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
REMUNERAÇÃO
RETRIBUIÇÃO
INDEMNIZAÇÃO
NULIDADE DE ACÓRDÃO
ARGUIÇÃO DE NULIDADES
OPOSIÇÃO ENTRE OS FUNDAMENTOS E A DECISÃO
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
DIREITO PROBATÓRIO MATERIAL
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
CASO JULGADO
ÂMBITO DO RECURSO
Data do Acordão: 03/30/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE
Sumário :
I - No artigo 257.º, n.º 7, do Código das Sociedades Comerciais, não se estabelece nenhum limite ao dever de indemnizar, apenas se ficcionando, para efeitos indemnizatórios, que se o gerente não tivesse sido destituído, se manteria nesse cargo por mais quatro anos ou pelo tempo que faltar para perfazer o prazo para que fora designado, estando esta ficção legal pensada para uma indemnização pela perda das remunerações que o gerente viria a receber caso não tivesse sido destituído.

II - A atribuição de uma indemnização nessas circunstâncias exige a prova de que a destituição como gerente o colocou numa situação económica pior do que aquela que teria, caso se mantivesse no exercício da gerência da Ré, auferindo a respetiva remuneração, devendo a medida da indemnização compensar a diferença patrimonial entre a situação real e a situação hipotética.

Decisão Texto Integral:

I – Relatório

O Autor propôs a presente ação declarativa, com processo comum, pedindo:

a) Seja declarado que a deliberação constante da ata de 28/3/2011 consubstancia uma destituição sem justa causa, quer pelo facto de não constar da referida ata as razões concretas e factuais dessa destituição, quer pelo facto das imputações constantes do relatório elaborado pelo sócio gerente, Dr. BB serem vagas, imprecisas e conclusivas, para além de falsas, com as legais consequências, e

b) Seja a Ré condenada a pagar ao autor uma indemnização a título de danos patrimoniais e não patrimoniais no valor de €122.000,00, a que acrescem os respetivos juros de mora, calculados à taxa legal, desde a citação, até integral e efetivo pagamento.

Alegou, para tanto, no essencial, o seguinte:

- foi por deliberação de 30 de Novembro de 2009 nomeado gerente da ré, auferindo remuneração mensal de € 2.000,00, e subsídio de férias e de Natal, não tendo sido estipulado prazo para o exercício do cargo.

- em 28/03/2011, foi destituído da gerência sem justa causa, por deliberação tomada por Assembleia Geral.

- sempre exerceu de forma diligente e com zelo o cargo.

- face a tal destituição, e da conjuntura económica que o país atravessava, não lhe foi possível encontrar outro emprego, a não ser noutra empresa, onde auferia a quantia de € 750,00 por mês, pelo que reclama o montante indemnizatório de € 112.000,00.

- sentiu-se, ainda, vexado, difamado, e humilhado, com a deliberação da Ré de destitui-lo sem justa causa, e de lhe ter sido retirada grande parte das suas funções durante o exercício de tal cargo até à sua destituição o que provocou nele enorme ansiedade e angústia, pelo que reclama, ainda, uma indemnização de € 10.000,00, por danos não patrimoniais.

Citada, a Ré contestou, no essencial, excecionando a incompetência material do tribunal e a prescrição do direito indemnizatório fundado na destituição, invocando as razões pelas quais o Autor foi destituído da gerência, que considera integrarem uma justa causa.

O Autor respondeu às exceções deduzidas pela Ré, pugnando pela sua improcedência.

Realizou-se a audiência prévia e foi proferido despacho saneador, julgando improcedentes as exceções de incompetência absoluta, em razão da matéria, e de prescrição, prosseguindo com a delimitação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova.

Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, que decidiu:

- julgar a ação improcedente, por não provada, e consequentemente absolveu a Ré do pedido.

- julgar o incidente de litigância de má-fé do Autor deduzido pela Ré improcedente e, consequentemente, absolvendo o Autor da pretensão incidental.

Inconformado, interpôs o Autor recurso de apelação, tendo o Tribunal da Relação decidido, julgar a apelação parcialmente procedente e revogar a sentença recorrida, condenando a Ré a pagar ao Autor quantia total de € 71.000,00 € (setenta e um mil euros), acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação até integral e efetivo pagamento.

A Ré recorreu desta decisão para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo concluído as suas alegações do seguinte modo:

I – A decisão do Tribunal tem de ancorar-se na factualidade dada por provada e não provada, sob pena de nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão, contemplada no artigo 615.º, n.º 1, al. c) do CPC.

II – Na sentença considerou-se não provado que (XVIII) “com a decisão da ré, o autor sentiu-se vexado, humilhado e difamado no seu bom nome, imagem e reputação porquanto e para além de lhe ter sido retirado grande parte das suas funções e afastado das tomadas de decisões, a deliberação social da sua destituição assente em factos inverdadeiros provocou nele angústia e ansiedade”,

III – O acórdão recorrido, no entanto, considerou provado que (59) “aquando da deliberação social da sua destituição o autor sentia-se angustiado, tendo necessitado de apoio psicológico, bem como de apoio familiar”.

IV – Na fundamentação do acórdão recorrido consta ainda o seguinte: “Que à época da destituição o autor se encontrava triste e angustiado, necessitado de apoio psicológico e de apoio familiar, parece inquestionável. No entanto, não é tão claro que tudo isso se devesse ao facto da destituição em si mesmo.”

V – E acrescentou-se: “Assim, afigurando-se que a matéria em questão colheu, em parte demonstração, que não quanto ao nexo de causalidade, transita, nessa parte para o elenco dos factos provados, nos seguintes termos: (59)” (cheio e sublinhado nossos).

VI – Ainda, por outro lado, referiu-se: “Atenta a modificação por esta Relação do ponto XVIII dos factos não provados, demonstra o autor que efetivamente os sofreu embora já não que os mesmos possam, pelo menos na totalidade, imputar-se causalmente à destituição. Havendo certamente a considerar angústias e aborrecimentos importantes, com necessidade de apoio psicológico e de apoio familiar, os quais, ainda que possam ter tido origem causa principal na situação conjugal, são suscetíveis de serem agravados pela situação da destituição.

VII – O acórdão recorrido, atento o que se transcreveu, sobretudo, em V, afasta, assim, o nexo de causalidade entre a destituição e a ocorrência de danos não patrimoniais na esfera do A., referindo, tão só, que as suas “angústias e aborrecimentos” são suscetíveis de serem agravados pela destituição.

VIII – Atenta a factualidade assente e a fundamentação constante da decisão recorrida, verifica-se, face à condenação da Recorrente ao pagamento de compensação por danos não patrimoniais, a nulidade do acórdão por contradição entre os fundamentos e a decisão, nos termos do art. 615.º, n.º 1, al. c) do CPC.

IX – Ou, quando assim não se entenda, impõe-se a revogação da sentença recorrida dado o erro de julgamento quanto à matéria de facto e quanto ao direito aplicável, atenta a aludida inexistência de nexo causal.

X – A falta de nexo causal obsta à condenação em indemnização, por falta de um dos pressupostos essenciais do instituto da responsabilidade civil.

XI – Não há, com efeito, responsabilidade se não houver um nexo entre o comportamento ilícito e o dano.

XII – Acresce que, ao dar como provado o facto nº 36 (“na acta da sessão da Assembleia Geral da ré de 28/03/2011, na qual foi aprovada a sua destituição, não consta que a sua comunicação escrita tenha sido discutida por parte dos sócios”), o acórdão recorrido ignorou o teor da ata notarial quanto a tal questão.

XIII –O abandono da assembleia em que foi deliberada a destituição, por parte do sócio CC, apenas pode ser equiparado à não comparência de tal sócio, sendo de realçar que os restantes sócios que permaneceram na reunião apreciaram e discutiram a resposta do A., o que expressamente consta de ata, elaborada por Notária.

XIV - São autênticos os documentos exarados, com as formalidades legais, pelas autoridades públicas nos limites da sua competência ou, dentro do círculo de actividade que lhe é atribuída, pelo notário ou outro oficial público provido de fé pública- artº 363º,2 do C. Civil.

XV - Os documentos autênticos fazem prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade ou oficial público respetivo, assim como dos factos que nele são atestados com base nas perceções da entidade documentadora – artº 371º,1 do CCivil.

XVI - Pela força probatória dos documentos autênticos estão, pois, abarcados os factos não praticados pelo documentador mas por ele atestados com base nas suas perceções.

XVII - Acresce, ainda, que os factos constantes de documentos autênticos não carecem de alegação e prova, salvo se aquele – documento – sofreu impugnação nos termos restritos que a lei determina( artº 372º do CCivil).

XVIII - Ou seja, salvo melhor opinião, ocorreu, assim, na apreciação da prova, errónea interpretação da matéria de facto subjacente, com o inevitável e consequente erro na aplicação do direito.

XIX – Ocorre, também quanto a este ponto, manifesto erro de julgamento de facto e de direito, tanto na sentença de primeira instância como no acórdão recorrido.

XX – Do teor da ata da assembleia destitutiva consta: “No que tange à resposta propriamente dita do aludido gerente, os únicos documentos ali referenciados são e-mails e extractos de atas, cujo teor é, neste momento, confirmado pelos declarantes. Quanto ao mais, por desvirtuar a verdade, é aqui rejeitado pelos declarantes que, por esta via, confirmam de novo o teor de todos os factos (…)”

XXI – Face ao teor da ata, transcrito supra, mal andou o Tribunal a quo ao dar como provado que a comunicação escrita apresentada pelo A. não foi discutida.

XXII – O Tribunal da Relação em harmonia com a primeira instância, considerou não provado (XXVI): “Em virtude do aludido em v) a ix), o gerente da ré BB teve uma reunião com o autor, em Julho de 2010 explicando-lhe a necessidade de maior apoio”

XXIII – Tal entendimento constitui violação o nº 1 do art. 358.º do Código Civil, porquanto tal matéria foi confessada pelo A., constando da assentada espelhada na ata de audiência de discussão e julgamento do dia 24-10-2016, em consonância com os temas da prova fixados no saneador (ata de audiência prévia de 8-09-2015).

XXIV - No que concerne aos danos patrimoniais peticionados pelo A., o único facto provado com relação a tal questão foi (52): “Após a sua destituição, o Autor continuou a exercer o cargo de gerente da empresa C... que desempenhava, à data em que foi nomeado gerente da Ré e até à sua destituição do cargo de gerente da Ré, na qual (C...) auferia e auferiu uma retribuição mensal liquida de €750,00 (resposta explicativa e restritiva ao item xxxii) do ponto 1) dos temas da prova/arts. 206º e 207º da petição inicial).”

XXV – Este facto, decidido pela primeira instância, e mantido pela relação, constitui “resposta explicativa e restritiva ao item xxxii) do ponto 1) dos temas da prova”, cujo teor é: “Face à conjuntura económica que o país atravessa, o Autor apenas obteve um emprego na empresa C..., na qual aufere um vencimento mensal de €750,00?””

XXVI – Ou seja, o facto dado por provado arreda, de forma voluntária e sem qualquer explicação, que o A. apenas tenha obtido emprego na empresa C..., após a destituição, face à conjuntura económica que o país atravessava”.

XXVII – É inequívoco que não se encontra dado como provado que, em virtude do aludido facto provado (52), tenham ocorrido quaisquer quaisquer danos patrimoniais na esfera do A.

XXVIII – Ora, é doutrina e jurisprudência pacíficas que, para a concessão de indemnização por danos patrimoniais, na sequência da destituição sem justa causa do gerente, o mesmo tem de “alegar e provar ter sofrido prejuízos com a destituição”.

XXIX – “Da simples invocação da perda da remuneração pelo exercício da gerência não se pode concluir que o Autor tenha sofrido necessariamente prejuízos. Estes só se terão verificado se ele não teve a oportunidade de exercer outra actividade, remunerada a idêntico nível económico, social e profissional, o que, in casu, se ignora” (cfr. Ac. desse Alto Tribunal de 04.05.1998 aqui identificado).

XXX – A decisão recorrida, muito embora proceda à citação de jurisprudência consentânea com a acabada de transcrever, decide, a final, pela concessão de indemnização ao A., ignorando – interpretando erroneamente - por completo a matéria de facto assente.

XXXI – Também nesta sede se verifica a nulidade da sentença por contradição entre os fundamentos e a decisão, constante do 615.º nº1 al. c) do CPC.

XXXII – Ou, caso assim não se entenda, verifica-se um claro erro de julgamento de facto e direito, porquanto o acórdão recorrido determinou a condenação, sem qualquer suporte factual e jurídico, dado o A. não ter logrado provar os factos – se, assim, se podem considerar - por si alegados e constitutivos do seu eventual direito.

XXXIII – O A. é gerente da empresa C... desde 1998 até à data de hoje- vide a certidão permanente da C..., Ldª, agora, atualizada, pois a constante dos autos caducou.

XXXIV – O que demonstra a irrelevância de tal facto para a questão em apreciação.

XXXV – A atribuição in casu de uma indemnização por danos patrimoniais e imateriais ao A. comporta a violação do nº 7 do art.º 257.º do CSC e do art.º 483.º do CC.

XXXVI – A atribuição de uma indemnização por danos patrimoniais ao A. contraria frontalmente a doutrina e jurisprudência maioritárias sobre o tema, consistindo num autêntico premeio da inércia.

XXXVII - Aquele que, por culpa sua, não encontra alternativa em termos profissionais, por não ter procurado, não deve ser bonificado, pois não deve transformar-se em dano a perda de remunerações, o que ocorre no acórdão recorrido.

XXXVIII – Atento o exposto, procedendo a revista, impõe-se a revogação do Acórdão recorrido, mantendo-se inalterada a sentença da 1ª instância, por terem sido violados os artigos 607º,4 e 5 do CPC; 363º,2; 358º,1;371º,1; 372ª; 483º,566º,2 do CCivil e 63º e 257º do Código das Sociedades Comerciais.

O Autor respondeu, pronunciando-se pela improcedência do recurso e manutenção do acórdão recorrido.

                                               *

II – O objeto do recurso

Nas suas alegações de recurso, a Ré invoca o erro de julgamento do facto provado n.º 36 e do facto não provado n.º XXVI, por violação de regras de direito probatório material.

Na verdade, a Ré vem colocar em causa o facto de se ter considerado provado o facto n.º 36 - na acta da sessão da Assembleia Geral da ré de 28/03/2011, na qual foi aprovada a sua destituição, não consta que a sua comunicação escrita tenha sido discutida por parte dos sócios e de se ter julgado não provado o facto XXVI - em virtude do aludido em v) a ix), o gerente da ré BB teve uma reunião com o autor, em Julho de 2010 explicando-lhe a necessidade de maior apoio - alegando que foram violadas regras relativas à força probatória de um documento autêntico no primeiro caso e de uma confissão judicial escrita no segundo caso.

O Supremo Tribunal de Justiça tem competência par apreciar estes fundamentos do recurso, nos termos do artigo 674.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.

No entanto, neste recurso de revista apenas se questiona o dever de indemnizar da Ré, em resultado de ter destituído o Autor sem justa causa.

A inexistência de justa causa é uma questão sobre a qual já se formou caso julgado, uma vez que não foi interposto recurso pela Ré da sentença proferida pela 1.ª instância que concluiu não se ter feito prova de uma justa causa da destituição do Autor do cargo de gerente da Ré.

Respeitando aqueles factos ao apuramento da justa causa na destituição do Autor, os mesmos estão abrangidos pelo referido caso julgado, pelo que não pode neste recurso de revista verificar-se o cumprimento das regras de direito probatório material no seu julgamento, não podendo estes fundamentos integrarem o objeto do recurso.

  Assim, tendo em consideração as restantes conclusões das alegações de recurso e o conteúdo do acórdão recorrido, são as seguintes as questões que cumpre apreciar:

- o acórdão recorrido é nulo, por contradições entre a fundamentação e a decisão ?

- dos factos provados não resulta um nexo de causalidade entre a destituição do Autor e o facto deste se sentir angustiado, tendo necessitado de apoio psicológico, bem como de apoio familiar ?

- o Autor não tem direito a ser indemnizado pela diferença entre a remuneração que recebia da Ré e a remuneração que recebe atualmente pelo trabalho que desenvolve ?

                                               *

III – Da nulidade do acórdão recorrido

A Ré vem arguir que o acórdão recorrido é nulo por contradição entre os fundamentos e a decisão, no que respeita à condenação no pagamento da indemnização por danos não patrimoniais,  uma vez que na fundamentação da matéria de facto provada se diz não existir nexo de causalidade entre os danos morais sofridos pelo Autor e a sua destituição de gerente da Ré.

A fundamentação da decisão sobre a impugnação da matéria de facto apenas explica essa decisão parcelar e não a decisão final sobre o mérito do recurso.

Lê-se na fundamentação da decisão recorrida:

Atenta a modificação por esta Relação do ponto XVIII dos factos não provados, demonstra o autor que efetivamente os sofreu embora já não que os mesmos possam, pelo menos na totalidade, imputar-se causalmente à destituição. Havendo certamente a considerar angústias e aborrecimentos importantes, com necessidade de apoio psicológico e de apoio familiar, os quais, ainda que possam ter tido origem causa principal na situação conjugal, são suscetíveis de serem agravados pela situação da destituição....

Tudo visto, impõe-se fixar um valor indemnizatório para os danos não patrimoniais, que tomando em consideração o quadro danoso e a proporção em que deve haver-se ter a ré para ele concorrido, não deverá exceder os 1.000,00 euros.

Na fundamentação do acórdão recorrido entendeu-se, pois, que a destituição do Autor agravou os danos psicológicos por este sofridos com a sua situação conjugal, devendo esse agravamento ser compensado com o pagamento de uma indemnização de € 1000,00. Tendo a indemnização arbitrada contemplado este valor, não se verifica qualquer contradição entre os fundamentos do acórdão e a sua parte decisória, pelo que não se verifica a nulidade invocada. Se os factos considerados provados, mesmo após a sua alteração pelo Tribunal da Relação permitem ou não concluir pela existência de um dano indemnizável, não é um problema de validade da decisão recorrida, mas sim de acerto da mesma.

A Ré também aponta a existência de contradição entre a fundamentação e a decisão, relativamente à condenação no pagamento de uma indemnização pelos prejuízos patrimoniais que resultaram para o Autor da sua destituição, uma vez que após se citar jurisprudência cuja aplicação resultaria na não atribuição de qualquer indemnização, condena-se a Ré a pagar 70.000,00 €.

Consta da fundamentação do acórdão recorrido:

Conforme vem provado sob 53), o autor, após a destituição continuou a exercer actividade profissional remunerada, mas de nível remuneratório inferior ao que auferia pela ré, pelo que é fixar em € 70.000 o montante indemnizatório, correspondente à diferença do rendimento auferido num período de 4 que seguiu ao momento da destituição (€ 2.000-750 X 14 X 4). Tal solução colhe fundamento e mostra-se conforme à doutrina da 2.ª parte do n.º 1 do artigo 815.º do CC, que determina que, se o devedor tiver tido algum benefício com a desoneração da sua obrigação, deve o valor do benefício ser descontado na contraprestação. Benefício com a exoneração é a vantagem que o devedor obteve em consequência da desoneração, como a disponibilidade para angariar outros rendimentos, que foi possibilitada ou facilitada em virtude de ter deixado de cumprir as obrigações inerentes ao cargo de gerente por recusa do credor.

Independentemente da jurisprudência citada no acórdão recorrido, permitir ou não esta conclusão, ela encontra-se de acordo com a condenação no pagamento na referida indemnização, pelo que também aqui não se verifica qualquer contradição entre a decisão e a sua fundamentação.

Não se verificam, pois, as alegadas nulidades do acórdão recorrido.

                                               *

III – Os factos

Neste processo provaram-se os seguintes factos:

1 - Conforme resulta da ata junta como doc. nº 1, junto com a petição inicial, o Autor, em 30/10/2009, por deliberação da Assembleia Geral Extraordinária da Ré, foi nomeado gerente, com efeitos a partir de 1 de Novembro de 2009.

2 - Através de tal deliberação, foi aprovado que o exercício do cargo de gerente por parte do Autor era remunerado.

3 - Sendo essa remuneração composta pelas seguintes verbas: - Vencimento: 2.000,00€x14

- Subsídio de almoço: 5,25€/dia - Cartão SIM de telemóvel

- Despesas de deslocação (combustível e portagens) e estadia (refeições e dormida) mediante apresentação de fatura/recibo.

4 - Conforme resulta do teor da ata da Assembleia Geral Extraordinária de 30/10/2009, a nomeação do Autor como gerente da Ré teve por objetivo “uma maior agilização da gerência e assegurar o seu funcionamento em caso de impedimento de algum dos gerentes”.

5 - O Autor, para além das funções inerentes ao cargo de gerente, tinha a seu cargo todas as funções/tarefas relacionadas com a área financeira da Ré.

6 - O Autor ficou obrigado a comparecer na Ré 2 a 3 dias por semana, sem prejuízo de comparecer noutros dias sempre que fosse para esse efeito convocado ou sempre que se mostrasse necessário ao cabal desempenho das suas funções.

7 - Conforme resulta do teor da ata junta como doc. nº 12 com a petição inicial, em 15/11/2010, foi realizada uma Assembleia Geral da Ré, na qual foi deliberado nomear como gerente o sócio DD

8 - Durante a referida Assembleia, o sócio-gerente BB, em resposta às questões colocadas pelo sócio CC, esclareceu o seguinte, como se passa a transcrever:

“(…) O gerente em causa (o Autor) tem exercido a sua função em termos idênticos àqueles que o nortearam desde a sua nomeação.(…)”.

9 - Com data de 4 de Março de 2011, foi enviada convocatória para Assembleia Geral, a realizar no dia 21 de Março, do referido ano, com a seguinte ordem de trabalhos:

“Ponto 1: Análise da situação do gerente Senhor Dr. AA, no que concerne a comportamentos que tem assumido e em prejuízo da sociedade.

Ponto 2: Análise das medidas a adotar:

Ponto 2.1: Destituição com justa causa do gerente Dr. AA; ou Ponto 2.2: propositura de ação judicial visando a sua suspensão e destituição, bem como da pertinente providência cautelar.”

10 – Através da carta datada de 22 de Março de 2011, a Ré enviou ao Autor um Relatório junto como doc. nº 14 com a petição inicial onde constava o seguinte:

“1.º A eleição do Senhor Dr. AA visou reforçar a gerência da Nedina, com a sua presença efetiva na empresa;

2.º No início de Janeiro de 2010, na sequência da renúncia à gerência do sócio Senhor CC, ocorreu uma reunião com a presença dos actuais gerentes Dr. BB e Dr. AA e do sócio Dr. EE. Nessa reunião foi comunicado ao gerente Dr. AA que teria de estar mais tempo na Nedina;

3.º O Dr. AA respondeu que naquele momento não podia dar mais, pois tinha as empresas do pai e que não lhe restava mais tempo, tendo-lhe sido comunicado que teria de encontrar esse tempo, por se revelar absolutamente necessário;

4.º Em finais de Março/início de Abril de 2010, o Senhor Dr. AA disse que pretendia sair da Nedina, invocando razões do seu foro pessoal;

5.º Nessa ocasião foi-lhe dito que deveria repensar a sua situação;

6.º Em julho de 2010, em virtude da situação do Dr. AA ter-se agravado, pois antes vinha três dias por semana e a partir dessa data vinha apenas um dia ou dois por semana e houve semanas que nem apareceu, o gerente Dr. BB teve uma reunião com o Dr. AA, explicando-lhe da necessidade de mais apoio;

7.º Nessa ocasião o Dr. AA respondeu que era melhor contratar outra pessoa e que iria sair da empresa, pois não tinha condições emocionais para continuar em consequência do agravamento da sua situação pessoal;

8.º Foi-lhe então solicitado que ficasse mais dois ou três meses, de modo a ser assegurada a contratação de uma pessoa para o substituir;

9.º A partir desta altura, finais de Julho, foram contactadas diversas empresas de recrutamento de recursos humanos para apresentarem um orçamento e uma shortlist com pessoas possíveis para contratar;

10.º No início de Agosto, foi definida a empresa que iria efectuar a shortlist e, início de Setembro, após as férias, essa empresa apresentou a shortlist;

11.º Em finais de Setembro, efectuaram-se as entrevistas aos diversos candidatos;

12.º Em finais de Outubro, foi contratada a pessoa que iria substituir o Dr. AA que, de imediato, comunicou que só estaria disponível para entrar na empresa no início de 2011;

13.º Todo este processo foi concretizado com o conhecimento do Dr. AA, pois as reuniões com as diversas empresas de recursos humanos tiveram lugar na empresa e só as entrevistas se realizaram fora da empresa por motivos de confidencialidade;

14.º Logo após ter sido contratado essa pessoa, em finais de Outubro, foram convocadas duas Assembleias Gerais;

15.º Foi neste momento que agravaram os problemas com o Dr. AA que disse que não assinava as convocatórias para as Assembleias Gerais por existir uma dívida da sua mulher e também sócia da Nedina para com o pai dele;

16.º Foi-lhe dito que não deveria misturar assuntos da empresa com assuntos pessoais;

17.º Nesta altura, surgiu outro problema que foi a acta da Assembleia Geral de aprovação de contas. O Dr. AA negou-se a assinar a acta, pois invocou que estava mal redigida, uma vez que as afirmações que lhe eram imputadas, por ter estado presente nessa reunião de 31 de março de 2010, não deviam referir o seu nome mas o de outro sócio, esquecendo em absoluto que havia confirmado o teor da minuta que havia sido preparada pelo advogado;

18.º Numa reunião havida com o Dr. AA, para ultrapassar o impasse narrado anteriormente, o gerente Dr. BB aceitou que essas afirmações lhe fossem imputada tendo o gerente Dr. AA referido, de novo, que queria sair da Nedina, pois ir-se-ia divorciar da mulher;

19.º O imbróglio criado pelo Dr. AA na assinatura da acta deu origem a aplicação judicial de uma multa à sociedade;

20.º Em resposta ao referido no ponto 18, o gerente Dr. BB informou o gerente Dr. AA de que a pessoa que iria substituí-lo só iria entrar no início do ano e, por isso, que no início de Dezembro apresentaria a carta de renúncia;

21.º Após o registo da nomeação do Dr. EE como gerente em meados de Dezembro, o gerente Dr. BB abordou o Dr. AA, referindo que em Janeiro deveria, então, renunciar à gerência, dado que o colaborador contratado iniciaria funções;

22.º Em resposta o Dr. AA referiu que só “abandonaria” a Nedina desde que lhe fosse paga uma indemnização correspondente a 4 anos de mandato e que a sua mulher, irmã do gerente Dr. BB, pagasse uma dívida que tinha para com o seu pai, dele Dr. AA;

23.º Em síntese:

O gerente Dr. AA tem vindo a exercer a sua gerência de modo reprovável, pois:

- Aparecia na empresa por períodos curtíssimos e em muitas semanas nem sequer comparecia; -Em termos da área financeira, apenas falava com os bancos, mas quando os bancos apresentavam uma proposta nova, ignorava o assunto, “passando-o” ao gerente Dr. BB;

- Na negociação com os clientes tinha que ser o gerente Dr. BB a tratar, dadas as ausências do visado ou desconhecimento sobre a situação;

- Cheques de clientes datados para mais de 200 dias e sem controlo, só no final do ano quando foi solicitada essa relação foi possível conhecer a realidade;

- As empresas que ficaram insolventes não foram objecto de estudo prévio por parte do Dr. AA, ficando a cargo do gerente Dr. BB a tentativa de recuperação de créditos;

- Até um simples financiamento automóvel passou a ser tratado pelo gerente Dr. BB, dado que o gerente Dr. AA não estudava as propostas, afirmando ser mais favorável a do ..., sem atentar nos custos do IVA

- Tudo, no que concerne à área funcional do gerente Dr. AA é tratado pelas funcionárias da empresa com a exclusiva supervisão do gerente Dr. BB;

- Em termos jurídicos, nunca acompanhou nenhum processo que a empresa tem, pois neste último ano e quatro meses nunca teve uma reunião com o Dr. FF. Disse que tinha alguma incompatibilidade com o Dr. FF por não lhe ter respondido a um e-mail;

- Recusou-se a assinar a acta da Assembleia Geral de aprovação de contas, conforme resulta do presente relatório, só o tendo feito depois de satisfeitas as exigências infundadas que determinou, com a consequente aplicação judicial de uma multa;

- Não obstante ter solicitado a sua renúncia à gerência aceitou manter-se até à contratação de um técnico superior nessa área;

- Efetivada a contratação de uma colaboradora a tempo integral e dos serviços de um auditor, em regime de prestação de serviços, recusa-se agora, a renunciar, exigindo o pagamento de uma indemnização correspondente a quatro anos e o pagamento de uma pretensa dívida do seu cônjuge para com o seu pai.”

12 - Conforme resulta do teor do doc. nº 15 junto com a petição inicial, no dia 27 de Março de 2011, o Autor respondeu ao relatório que lhe foi remetido pela Ré nos termos a saber:

“Exmos. Senhores,

No passado dia 23 de Março de 2011 recebi uma comunicação em papel timbrado da NEDINA, que é subscrita pelo Dr. BB.

Nesta comunicação consta o carimbo de “os gerentes”. Por esta razão, estendo esta resposta ao Dr. EE.

Apesar de desconhecer o teor da deliberação da Assembleia Geral que é aí referida, trata-se de uma comunicação sem qualquer sustentação jurídica não se descortinando qual o seu alcance.

Na verdade, se, como V.Exas. referem, a deliberação da Assembleia Geral foi no sentido de proceder à minha destituição, então a obrigação de V.Exas. teria sido avançar com essa destituição, sujeitando-se às consequências legais. Não vejo, pois, qual a razão para este relatório e para que eu seja ouvido a factos que são falsos.

Face à gravidade do que é aí apontado, decidi responder a alguns dos factos, os mais relevantes, sem prejuízo de neste momento não tomar posição quanto ao mais que é aí insinuado.

Gostaria de deixar claro que a gravidade do que me é imputado leva a que V.Exas., na qualidade de gerentes (mas também de sócios), tenham colocado seriamente em crise o exercício do meu cargo de gerente, por factos que são, única e exclusivamente, imputáveis a V.Exas. com as legais consequências.

Como a comunicação de V.Exas. versa e tem por assunto uma deliberação da Assembleia Geral, reservo-me no direito de entregar cópia desta comunicação ao Presidente da Mesa da Assembleia Geral.

Relativamente aos que de mais relevante é insinuado, tenho a esclarecer o seguinte:

1 – Antes de mais, impõe-se salientar que, no âmbito do meu casamento com a filha do Dr. EE, conheço a empresa Nedina desde os anos 90, tendo, por via do que sempre me foi transmitido pelo Dr. EE e família, acompanhado o seu desenvolvimento e funcionamento. Sempre tive conhecimento da maior parte das questões de maior importância relacionadas com a família e com a empresa, sempre de acordo com relatos que me foram sendo transmitidos pelo Dr. EE. Era do meu conhecimento a posição do Sócio gerente Sr. CC perante a empresa, perante o gerente Sr. GG e perante o funcionário Dr. BB, com a aprovação e aval do sócio gerente Dr. EE.

Tomei conhecimento, sempre de acordo com o que me era transmitido pelo Dr. EE que, a determinada altura, as relações com o sócio Sr. CC (titular de 49% do capital social) e o sócio Dr. EE (51%) passaram a ser de hostilidade. É, conforme me relataram, nessa altura que é feita a transmissão da quota comum do casal Dr. EE e Dr.ª HH para os seus filhos, Dr. BB e Dr.ª II, ficando estes sócios da empresa sendo o usufruto da quota pertencente ao Dr. EE.

Em 1-08-2009 recebi um email do Dr. EE, reencaminhado pelo Dr. FF (advogado da empresa e amigo pessoal do Dr. EE) com a minuta da carta de representação da Sr.ª II e do Dr. BB dirigida ao seu pai, o sócio gerente Dr. EE, para uma Assembleia Geral a realizar a 7 de Agosto de 2009, onde o Dr. EE renunciava à gerência da empresa e nomeava seu filho Dr. BB para gerente.

Posteriormente, o Dr. EE convocou-me para uma reunião em ..., a realizar no gabinete do Dr. FF, onde também estaria presente o Dr. BB e um colega do Dr. FF e que iria representar e aconselhar, o Dr. JJ. Nesta reunião, o Dr. EE e o Dr. BB apresentaram os factos graves que a seu ver estavam a condicionar a gestão e o futuro da empresa, que nesta carta não interessa relatar, e fizeram-me ver que seria benéfico a minha vinda para a empresa como trabalhador. Foi assim que fui convidado para começar a trabalhar na empresa, de modo a assegurar a componente de gestão económico-financeira.

Depois disso fui convocado para comparecer noutra reunião com o Dr. EE, que se realizou nos escritórios da B.... Nesta reunião o Dr. EE anunciou que a solução para a Nedina passaria pela minha nomeação como gerente pois a empresa obriga-se, segundo os estatutos, com a intervenção de dois gerentes, pelo que, passando a gerência a ser composta pelo Sr. CC, pelo Dr. BB e por mim, tal facto iria enfraquecer a posição do Sr. CC o que poderia levar a que este fosse forçado a renunciar à gerência ou a comprar ou a vender as quotas. O Dr. EE propôs-me a remuneração de € 2.000,00 brutos, acrescido de despesas de estadia, de deslocações e de representação, mais telemóvel, mais almoço e com a obrigação de me deslocar á empresa no mínimo de 2 dias e no máximo de 3 dias por semana.

Nesta reunião – e já anteriormente – o Dr. EE comunicou-se saber e estar consciente que o Dr. BB não queria ficar a trabalhar na Nedina, que não tinha capacidade e perfil para esse efeito e, para além disso, estava a começar um novo projecto em ..., a B... que seria para o Dr. BB gerir. Inclusivamente, o Dr. EE até me convidou para director geral da filial da B... que iriam abrir em ....

O Dr. EE tinha - e tem – integral conhecimento da minha situação profissional. Foi com esse conhecimento que me foi apresentada a proposta de exercer actividade na Nedina no mínimo de 2 dias e no máximo de 3 dias por semana.

Aceitei a proposta nos exactos moldes em que me foi apresentada pela Nedina, tendo acrescentado que iria fazer um esforço inicial nos primeiros dois meses para estar o máximo tempo possível na Nedina de modo a inteirar-me dos assuntos.

Em 03-10-2009 recebo um email do Dr. EE com a minuta da convocatória que o Dr. BB devia enviar ao Sr. CC para a Assembleia Geral de 30-10-2009 onde se iria por em prática a estratégia delineada.

Em 26-10-2009 recebo email do Dr. BB com a minuta da carta de representação da sócia Dr.ª II para a referida reunião da Assembleia Geral.

A Assembleia Geral realizou-se em 30-10-2009 e onde a respectiva acta deveria ser lida novamente por todos os sócios. Gostaria de referir em relação às mesmas os seguintes parágrafos

«Desde o dia da minha nomeação como gerente até à presente data, deparei-me com inúmeros entraves colocados pelo Sr. CC.

Desde recusar a debater assuntos fundamentais ao bom funcionamento da empresa – só aceitou realizar uma reunião após oficialização do meu cargo como gerente, apesar da Assembleia Geral realizada no dia 07/08/2009 me nomear como gerente e ser um órgão soberano;

Nas reuniões que tivemos debatemos algumas vezes sobre as minhas actuais funções como Director de Produção. Na minha opinião, é fulcral para o bom desempenho das minhas funções como gerente desta firma, não esteja a acumular funções de director de produção e de gerente em simultâneo, visto que a produção é muito exigente e pouco tempo sobra do dia para me colocar a par das situações referentes à gestão da firma.

Foi dito pelo Sr. CC que eu não riscava nada. Diversas vezes eu contrapus, dizendo que as decisões devem ser analisadas, discutidas e tomadas em conjunto.

Foi-me entregue um orçamento de uma máquina de corte italiana no dia 07/10/2009.

A firma italiana enviou o orçamento no dia 24/09/2009 com as características da máquina e condições de pagamento. Ou seja, pressupõe-se que o Sr. CC já estava em conversações algum tempo e pretendia que desse uma resposta particamente nesse dia. A minha resposta é que iria analisar e só depois é que dava a minha resposta.

Sei que teve diversas reuniões com alguns fornecedores, onde nada me foi dito nem comunicado. Na nossa primeira reunião, comuniquei ao Sr. CC que pretendia estar presente nas reuniões com fornecedores, clientes e instituições bancárias e que o agendamento teria de ser combinado entre os gerentes.

Como também, deparei-me com algumas situações de agressão verbal para com a minha pessoa à frente de diversos funcionários. É fundamental para o bom funcionamento da firma que haja entre os gerentes uma certa cordialidade e respeito e trabalho de equipa, o que se verifica é simplesmente o inverso.

Posto isto, a marcação desta Assembleia Geral tem como objectivo dar a conhecer aos sócios todos estes acontecimentos atrás descritos, assim como definir regras básicas a observar pelos Gerentes no desempenho das suas funções para fomentar o bom funcionamento desta firma.”»

«sócio EE que propôs seja votado o seguinte: “tendo em vista uma maior agilização da gerência e assegurar o seu funcionamento em caso de impedimento de algum dos gerentes proponho o Dr. AA, já acima identificado, para o lugar de gerente, cargo que passará a assumir a partir de um de Novembro de dois mil e nove.”».

Em 9-03-2010 recebo um email do Dr. EE em que o conteúdo é o email enviado ao Advogado Dr. JJ, em 20-12-2009, em resposta ao fax de 16-12-2009 do Sr. CC do qual gostaria de transcrever as seguintes palavras do Dr. EE

«Quero também referir-lhe que a nomeação do Dr. AA para o cargo de gerente não foi pelos motivos que na altura pressupôs mas antes porque já sabíamos qual seria o movimento seguinte do Sr. CC, que seria abandonar a gerência para nos deixar em dificuldades, ameaça que aliás não era virgem, pois já a tinha formulado noutras ocasiões. Assim tal nomeação foi apenas para prevenir o futuro e para a empresa não ficar em grandes dificuldades e inclusive com problemas financeiros com uma saída abrupta do Sr. CC que demoraria sempre algum tempo a colmatar. Desta maneira foi muito mais simples anular os efeitos da sua saída».

2. No final do mês de Novembro de 2009 o sócio gerente Sr. CC renunciou à gerência da Nedina criando uma enorme situação de stress à empresa, deixando todos em sobressalto, em especial aos trabalhadores, clientes, fornecedores e instituições de crédito. Foi um período onde foi necessário visitar os principais clientes, receber os fornecedores e instituições de crédito, bem como responder a telefonemas e emails todos os dias sobre o que seria o futuro da empresa. Esta situação prolongou-se por vários meses após a saída do gerente CC. Desde a primeira reunião que tive com o Dr. EE e o Sr. BB para vir para a Nedina, muitas se seguiram em diversos locais, sendo que a Nedina sempre contou com a minha total disponibilidade, como facilmente se poderá verificar. Fui contratado para exercer as minhas funções num mínimo de 2 dias e no máximo de 3 dias por semana.

Porém, nunca me foi solicitado para estar mais tempo na Nedina. Tudo o que fiz, e sempre estive disponível para o fazer e efectivamente fiz, foi por minha iniciativa.

3. É totalmente falso que em Janeiro de 2010, ou em data anterior ou posterior, me foi proposto ou exigido uma presença com maior assiduidade na Nedina, para além do que estava contratado: mínimo de 2 dias e no máximo de 3 dias por semana. Não respondi a quaisquer factos de Janeiro de 2010 simplesmente porque nunca fui abordado para estar mais tempo na Nedina. Em 8-03-2010 recebi um email do Dr. EE que aqui transcrevo apenas a parte relevante: «AA é necessário rapidamente dar inicio ao processo de preparação dos documentos…Assim sugeria-te que amanhã e de uma maneira informal perguntasses ao TOC que eu também vou fazer o mesmo aqui com o Dr. KK se conhece alguém ou algum gabinete a quem se possa encomendar rapidamente um estudo económico da empresa. É também necessário pedir aos vários bancos, propostas e quais os limites do financiamento proposto dizendo que se pretende fazer um investimento na ordem dos 1.250… E em instalações e equipamentos. Todo este processo deverá ser posto em marcha rapidamente pois não vai haver muito tempo para o fazermos. Se te lembrares de alguma coisa mais diz-me. Vai também ser necessário oficializar as propostas das máquinas e de mais algo que achem importante, bem como contactar de novo o construtor para saber se os orçamentos se mantem ainda válidos ou se é necessário fazer uma reavaliação Um abraço e vamos falando mas é muito importante que mantenhas agora muito atento EE».

Ora, o teor deste email é um bom exemplo, um mero exemplo, da falsidade agora inovada, quando se alega que haveria falta de disponibilidade da minha parte.

4. Os problemas do foro pessoal em nada influíram na relação com a Nedina nem podem ser invocados como factos para o que agora se pretende com a descrição dos factos que me foi apresentada.

5. Como sempre aconteceu, mantive conversas informais com o Dr. EE e sempre mostrei total disponibilidade para continuar a prestar os meus serviços e trabalho à Nedina.

6. Sempre me desloquei dois dias por semana à empresa, nos termos que sempre estiveram acordados. É totalmente falso que tenha estado semanas sem aparecer, como é facilmente demonstrável. É totalmente falso vir invocar que não me preocupava com os deveres e responsabilidade da empresa. O número de dias em que me encontrava presente na empresa foram reduzindo nos exactos termos que foram acordados com o Dr. EE com conhecimento do Dr. BB, mas continuando a desenvolver o meu trabalho de forma zelosa e em benefício da empresa. Mesmo estando ausente do espaço física da Nedina, sempre dei inteira e pronta resposta às necessidades da empresa, falando e trocando emails com os funcionários, clientes, fornecedores, instituições bancárias bem como com os advogados, Dr. FF e Dr. LL. Foram várias as ocasiões em que se realizaram conferências telefónicas, em alta voz, entre mim, o Dr. BB juntamente com trabalhadores, tendo por objectivo a resolução de problemas ou aquisições de material. Fui diversas vezes a ... para a compra de uma máquina extrusora, reuni com fornecedores, instituição bancárias e advogados, visitei clientes pois estava a chegar a altura da venda de sacos de vindima e celhas, e dentro das minhas responsabilidades assegurei o funcionamento da empresa.

Aliás, é possível contabilizar que cumpri muito mais que os dois a três dias por semana, o correspondente ao mínimo e máximo de dias semanais que tinham sido acordados aquando da minha contratação.

7. O agravamento da situação do foro pessoal registou-se no dia 30-09-2010, sem qualquer relevância para o que me pretendem agora imputar, porque nunca afectou a prestação dos meus serviços e trabalho à Nedina, sendo que, mesmo nesta situação, em nada alterei o meu comportamento, atitude e responsabilidade para com a Nedina.

8. A principal razão pela qual foi sempre exigida a minha inserção, primeiro como trabalhador e depois como gerente, era realizar parte da gestão da Nedina, em especial a nível das questões económico-financeiras. Não fui contratado como trabalhador a prazo. Não fui nomeado como gerente para alguns meses, em que o meu “despedimento” poderia ser decidido em qualquer momento. A minha nomeação como gerente também se ficou a dever à necessidade de haver dois gerentes para obrigar a empresa e a manter em funcionamento, sendo que, como me foi várias vezes transmitido, o advogado informou o Dr. EE que não era nada conveniente à data nomear o Dr. EE. A minha permanência na Nedina nunca teve nada a ver com a futura contratação de um novo funcionário.

No dia 15-12-2010 comuniquei ao sócio gerente Dr. BB que o sócio recém-nomeado gerente, o Dr. EE, já estava registado na conservatória do registo comercial e constava da certidão permanente. Ficou espantado por eu estar a afirmar esse facto pois não tinha recebido o novo código da certidão permanente do advogado, Dr. FF, pessoa responsável pelo registo. Expliquei que um código tem uma validade temporal e todas as alterações que ocorram desde que esteja válida constam lá. A data da contratação da nova funcionária é posterior a este dia e é assinada pelo sócio gerente Dr. BB e pelo sócio gerente Dr. EE. Neste dia 15-12-2010, o sócio gerente Dr. BB exigiu-me a minha saída imediata da empresa, pretendendo que eu apresentasse a minha carta de renúncia à gerência. Respondi que não o faria. Desde então o sócio gerente Dr. BB não manteve para comigo qualquer tipo de diálogo, de relação ou de educação, arredando-me das compras de material e de todas as decisões da empresa como é fácil de comprovar. Continuei a estar presente na empresa os dois a três dias por semana. Nos demais dias da semana continuei, como sempre fiz, a responder às necessidades da empresa. O Dr. BB retirou-me grande parte das funções, tendo-as reduzido ao controlo de pagamentos de clientes e fornecedores bem como dar a minha assinatura. Esta redução das minhas competências foi propositada e surgiu como reacção ao facto de não ter aceite um despedimento sumário, o que é fácil de comprovar pela mudança de atitude de fornecedores, instituições bancárias e alguns procedimentos de trabalhadores.

9.10.11.12.13. A certa altura, e por interpostas pessoas, tive conhecimento que o sócio gerente Dr. BB, numa altura em que já tinha deixado de contactar comigo como retaliação ao facto de eu não aceitar a minha imediata saída, tinha a intenção de contratar alguém, mas somente isso. Na forma como me foi relatado, tratava-se de mais um trabalhador para a empresa, e nada mais.

Nunca tive conhecimento das empresas contactadas, do orçamento, da short list, das entrevistas nem das reuniões tidas na empresa. Nunca participei em nenhuma reunião. Nunca tive conhecimento das reuniões fora da empresa e nem entendo quais foram os motivos de confidencialidade. Tudo isto é totalmente falso. Aliás, durante o período de gestão desta gerência foram contratados vários novos trabalhadores e o procedimento nunca foi este. Nem percebo qual a razão, de que agora tomei conhecimento, para que “as entrevistas se realizaram fora da empresa por motivos de confidencialidade”.

Confidencialidade para com quem? Verifico agora que foi para comigo, precisamente para que não tivesse conhecimento desta contratação., o que é bem revelador da falsidade quando se invoca que tive conhecimento desta contratação. Sendo eu gerente, este tipo de procedimento é revelador do incumprimento que os outros dois gerentes tiveram para comigo, ao decidirem admitir um novo trabalhador sem que nada me fosse revelado. O único facto de que tive conhecimento foi, a posteriori, o seguinte: no controlo de factura de fornecedores a que procedo, detectei a existência de uma factura de uma empresa de recursos humanos, e questionando a chefe administrativa sobre o assunto disse-me que era um assunto do sócio gerente Dr. BB e que este daria, na altura certa, ordem de pagamento.

14. A data do contrato assinado com a nova funcionária é em 17-12-2010 posterior a Outubro e assinado pelo sócio gerente Dr. BB e pelo sócio gerente Dr. EE, sendo que estes dois sócios gerentes nunca me deram conhecimento desta contratação;

15.16. Não tive conhecimento das convocatórias para as Assembleias Gerais.

Recordo que sou somente gerente, sem ser sócio. Estava em ... e era véspera da partida para a Feira Internacional K, em .... De salientar que, mais tarde, em Novembro, acabei por ter conhecimento de que se iriam realizar em 15 de Novembro de 2010, duas assembleias gerais, o que me foi dado a conhecer por uma carta do sócio Sr. CC. Tratava-se duma comunicação dirigida à Nedina em que aquele sócio exigia documentos à empresa para poder tomar a decisão de voto nas Assembleias Gerais. O sócio gerente Dr. BB nunca me informou sobre quaisquer destas assembleias gerais. Nesta altura percebi que os comportamentos do sócio gerente Dr. BB e do sócio Dr. EE continuavam, de forma evidente e propositada, a estar substancialmente alterados. Para terminar confirmo que existe uma dívida da sócia II aos Pais de AA sendo a mesma reconhecida pela sócia Dr.ª II em sms enviado aos Pais de AA. Porém este facto não tem qualquer relevância para o objectivo e o intuito da comunicação que me foi enviada.

17.18.19. Em 31-03-2010 realizou-se a AG para aprovação das contas de 2010.

Estavam presentes todos os sócios ou os seus representantes bem como os dois advogados que assessoravam as duas partes. Em 12-07-2010 enviei um email ao Dr. LL dizendo que dia 15-07-2010 era a data limite do envio do IES e que o TOC e o ROC da Nedina apenas o enviariam se houvesse acordo das duas partes em relação à assinatura da acta da AG de 31-03-2010.

Em 13-07-2010 o Dr. LL envia email dizendo que está de acordo com o envio e que a acta terá sempre data de 31-03-2010. Nesse mesmo dia volto a enviar email ao Dr. LL por estar a ser pressionado pelo TOC e pergunto se há acordo.

Também ainda nesse dia o Dr. LL responde o que passo a citar «Caro Dr. AA

Acredite que para mim só considerarei ter havido acordo quando a acta for assinada. Penso, no entanto, que o acordo é viável, em face da referida reunião.

Cptos, do LL»

Em 17-11-2010 recebo email do sócio gerente Dr. BB com a acta corrigida da AG de 31-03-2010.

A razão pela qual demorou tanto tempo a chegar à versão final foi por pura estratégia dos sócios gerentes Dr. EE e Dr. BB, estratégia que desconheço e à qual sou totalmente alheio. Em 17-11-2010 respondi a todos por email fazendo os meus comentários à acta, pois o Dr. LL tinha falado em nome de todos e estava na acta a seguinte menção: “tendo o “sócio” AA dito; o “sócio” AA referiu. Ora, não percebia o porquê de assinatura estar, primeiro porque não sou sócio (nem nunca fui) e depois porque foi o Dr. LL que falou naquela reunião em nome de todos e somente usou a referência ao meu nome, nunca tendo referido o nome dos outros sócios, esses sim sócios. Foram trocados emails com o sócio Dr. EE e alguns telefonemas com o sócio gerente Dr. BB mas nunca explicaram o porquê da referência ao “sócio AA”, em vez de constar a referência a qualquer um dos outros, esses sim sócios. Em 20-11-2010, Sábado, recebi um email do Dr. LL com a acta em que trocaram o nome de AA por BB nos pontos em que se referia o meu nome. Em 22-11-2010, segunda-feira, enviei um email ao Dr. LL com a minha aprovação em relação à acta da AG de 31-03-2010.

Esta decisão não sei quando foi nem em que moldes foi tomada. Apenas tive conhecimento da mesma através de email do Dr. LL. O sócio CC assinou a acta no dia 25-11-2010.

Face ao exposto, não existe, nem nunca existiu, qualquer fundamento para me imputarem a culpa na aplicação de uma coima à sociedade. De acordo com os emails que possuo e com os comentários do sócio Sr. CC e do seu advogado Dr. HH, podemos presumir que se tratou de uma estratégia do sócio gerente Dr. BB, do sócio Dr. EE e dos respectivos advogados para promoverem o arrastamento da situação. Desconheço com que finalidades.

20. Não mantive com o Dr. BB qualquer tipo de reunião ou conversa com este teor.

21. Como acima referi, no dia 15-12-2010 o sócio gerente Dr. BB tomou conhecimento de que o Dr. EE já constava da certidão permanente como sócio gerente da empresa. Ora, tendo tomado conhecimento disto, o sócio gerente Dr. BB exigiu-me que apresentasse a minha carta de renúncia, o que recusei fazer.

22. Se o sócio gerente Dr. BB e o sócio gerente Dr. EE não querem nem precisam mais que eu exerça funções e pretendem a minha saída deverão levar a que a Nedina assuma as normas legais imperativas.

23. A Nedina nunca parou ou teve prejuízos que me possam ser imputados.

Cumpri com o acordo que foi estabelecido com a empresa. Sempre estive inteiramente disponível, estivesse onde estivesse, para resolver os assuntos da empresa. Abstenho-me aqui de relatar o que fiz, os contributos que dei para a empresa, o que implementei e o que continuo a fazer, porque o conhecimento destes factos é uma obrigação dos demais gerentes da sociedade.

São ainda apontados outros factos a que, de forma sumária, passo a responder.

É caricato, e totalmente falso, que se invoque que a negociação com clientes é feita pelo sócio gerente Dr. BB por causa das minhas ausências. Até Dezembro de 2010 sempre estive presente nas negociações.

É irrisória a referência a cheques datados a mais de 200 dias e sem controlo e que o sócio gerente Dr. BB só teve conhecimento no final do ano. A ser assim, tal facto só demonstra que o sócio gerente Dr. BB não quis saber sobre o que acontecia na empresa durante um ano, que as funcionárias administrativas, incluindo a competente e dedicada chefe administrativa MM, não fez o seu trabalho. Isto quer dizer que os indicadores da qualidade que são da responsabilidade do sócio gerente Dr. BB não eram dada a importância que era exigida a este gerente.

Concluo então que quando da auditoria da APCER, para obter a certificação ISO9001/2008, que se falou sobre o prazo de pagamentos muito dilatado o sócio gerente Dr. BB não fazia a mínima ideia do que isso é. Os objectivos da qualidade são da competência do gerente Dr. BB que nada fez durante mais de um ano, conforme reconhece de forma expressa.

É de fácil demonstração que o saldo dos cheques datados pouco se alterou durante o tempo em que sou gerente. São factos concretos. Sempre foi e continua a ser um problema os prazos de pagamento na Nedina e que a saída de bons clientes que faziam os seus pagamentos por transferências bancárias em prazos inferiores aos 100 dias, foram colmatados pelo incremento de volume de clientes que pagam por cheque e com prazos muito dilatados. Desenvolvi um grande esforço para se alterar isso. Para combater isto até cheguei, entre outras diligências, criei um campo novo nas tabelas de cheques datados, o que sempre foi usado para emitir um aviso para cheques com mais de 100 dias.

Sempre mantive um acompanhamento próximo sobre os processos de cobrança.

Em 10-02-2010 tive uma reunião no escritório do Dr. FF para ficar a par dos processos que envolviam a Nedina. O processo mais importante era o da CCAM que acompanhou e a Nedina ganhou. Durante este espaço temporal continuei a acompanhar os processos antigos bem como alguns novos, como se pode comprovar todos os emails trocados. Em relação ao sócio gerente Dr. BB estar envolvido em recuperação de créditos apenas sabia em relação a empresas/funcionários ou pessoas que deviam dinheiro à Nedina e ao Sr. GG ou só a este com acompanhamento do Dr. FF. Este ano tive conhecimento que foi entregue à empresa A... mercadoria já com a empresa em insolvência e que o sócio gerente Dr. BB tentou recuperar a mercadoria indo lá à empresa. Após ter tido conhecimento desta situação liguei de diversos números de telemóvel diferentes para o gerente e dei ordem à funcionária MM para sugerir ao Dr. FF uma operação para recuperação da mercadoria.

O financiamento automóvel foi tratado em grande parte por mim, como se pode comprovar pelos emails e factos existentes. A decisão final acabou por ser tomada em conjunto pelos dois outros gerentes, os quais optaram pela opção do Banco Millenium, precisamente quando esta não era a proposta financeiramente mais vantajosa, tendo em conta outros factores sendo totalmente descabida a referência ao IVA e ao BES.

As referências à “área funcional” são totalmente incompreensíveis, desconhecendo-se do que se trata.

É totalmente falso que nunca tenha acompanhado os processos judiciais da empresa assim como tenha criado qualquer incompatibilidade com o Dr. FF.

São inúmeras as provas de que disponho, que contrariam mais esta falsidade.

Cumpre ainda salientar o seguinte facto: o sócio gerente Dr. BB na AG de 15-11-2010, intervindo em representação de 51% do capital da Nedina fez a seguinte declaração: «o gerente Dr. AA tem exercido a sua função em termos idênticos àqueles que o nortearam desde a sua nomeação.»

(…)” .

13 - Conforme decorre do teor da ata junta como doc. nº 16 com a petição inicial, no dia 28 de Março de 2011, a Ré reuniu-se em Assembleia Geral, na qual se deliberou a destituição do Autor, com justa causa e com efeitos imediatos, constando aí o seguinte:

“(…) Este pôs então à discussão o ponto um da ordem de trabalhos e deu a palavra ao sócio gerente BB que, no seu uso, referiu, até por economia procedimental, considerar reproduzido in totum o teor do relatório que fundamenta os comportamentos por acção e omissão, imputados ao gerente Dr. AA. Pelo sócio Dr. BB, nas qualidades em que participa na presente, foi dito, por ter conhecimento cabal daqueles factos, considerando a sua gravidade, sufraga também a declaração do sócio BB.

Seguidamente e por iniciativa do presidente passou-se à discussão do ponto dois um, tendo referido que as condutas imputadas ao gerente AA são muito graves e revelam a violação inequívoca dos deveres de cuidado, diligência e lealdade, consagrados no artigo 64 do CSC, porquanto o mesmo gerente praticou esses comportamentos e omitiu acções, que põem em causa o interesse da sociedade e dos sócios, revelando, sobretudo nos últimos meses, absoluta indisponibilidade, falta de comparência e de zelo, bem como negligência pelas situações prementes que a gestão da empresa impõe diariamente. Por tudo isto, entende que o mesmo deve ser destituído da gerência, atentos os motivos justos invocados e que são assim causa directa e necessária da proposta sancionatória que suscita. Dada a palavra ao sócio gerente BB, por este foi dito acompanhar na íntegra a argumentação suscitada pelo seu consócio. Posta a questão à votação foi deliberado, com os votos favoráveis dos sócios presentes e representada, a destituição, assente em justos motivos/justa causa do gerente Dr. AA. Mais foi ainda decidido pelos sócios que a gerência deve, de imediato, notificar o gerente em apreço, dando-lhe notícia de que a presente deliberação produz efeitos a partir deste momento.

(…)”.

14 - Conforme resulta do teor da ata junta como doc. nº16 com a petição inicial, durante a Assembleia Geral de destituição do Autor como gerente, o sócio CC e na qualidade de Presidente da Mesa da Assembleia Geral considerou que, face à resposta apresentada pelo Autor, e de forma a que a sociedade tomasse uma deliberação consciente, apresentou como proposta a suspensão dos trabalhos nos termos do disposto no art. 387º do CSC de forma a que o Autor fosse convocado para comparecer na Assembleia, a fim de esclarecer vários pontos da sua resposta, sendo que os sócios Dr. EE e Dr. BB não concordaram com a proposta, invocando a ilegalidade da decisão por falta de legitimidade e por que a norma não tem aplicação directa às sociedades por quotas, acrescentando que as suspensões para serem válidas e legais dependiam da deliberação dos sócios (arts. 17º, 18º, 27º, 28º, 29º da petição inicial)

15 - Nesta data, o Autor, já estava separado de facto da sua esposa, sócia da Ré, Dra. II (art. 19º da petição inicial).

16 - Conforme resulta do teor da acta junta como doc. nº 16 com a petição inicial, apesar da posição dos outros dois sócios aludida em 14), o sócio CC, e simultaneamente, Presidente da Mesa da Assembleia Geral, decidiu suspender a sessão nos termos do disposto no art. 387º, nº1, do CPC, e designar o dia 07 de Abril de 2011 para a sua continuação, e após se ter ausentado da referida Assembleia, os outros dois sócios, e em representação da sócia NN, retomaram os trabalhos, assumindo a Presidência da Mesa, o sócio EE, e aprovaram a destituição do Autor (arts. 20º, 31º e 32º da petição inicial)

17 - Conforme resulta do teor dos docs. nºs 17 e 18 juntos com a petição inicial, no dia 29/3/2011, a Ré enviou ao Autor, quer através de carta, quer através de e-mail, a comunicação da decisão de destituição com justa causa e informou-o de que deveria comparecer nas instalações daquela, no dia 4/4/2011, a fim de proceder à entrega dos bens e equipamentos da empresa. (arts. 21º e 22º da petição inicial).

18 - O Autor, em face da receção do e-mail da Ré, respondeu, pela mesma via, no dia 30/3/2011, que, perante aquela comunicação, não iria no dia seguinte à empresa como sempre acontecia, conforme decorre do teor do doc. nº18 junto com a petição inicial (art. 23º da petição inicial).

19 - Conforme decorre do teor do doc. nº 19 junto com a petição inicial, no dia 1 de Abril de 2011, quer através de carta registada com AR, quer através de email, o Autor enviou à Ré a seguinte missiva, que se passa a transcrever:

“(…)

Na passada 4ª feira, 30.03.2011, recebi uma carta de V.Exas. (datada de 29.03.2011), em que V.Exas. comunicam a minha “destituição com justos motivos/justa causa, com efeitos imediatos”.

Nos termos que constam desta comunicação, esta decisão terá sido adoptada na reunião da Assembleia Geral realizada em 28 de março de 2011

Apesar de não constar desta comunicação, parto do princípio de que se trata da destituição como gerente. E isto porque, na anterior comunicação (a que respondi) V.Exas. imputavam-me um conjunto de factos que alegadamente seriam motivo para a minha destituição como gerente.

Uma vez tomada a decisão dessa destituição, desconheço quais foram os motivos para a mesma, já que não me foi enviada qualquer outra comunicação ou qualquer anexo àquela carta de V.Exas. de 29 de março de 2011.

Por outro lado, e como é do inteiro conhecimento de V.Exas., sou trabalhador da NEDINA, assim sendo efectuados os competentes descontos e contribuições para a segurança social.

Face a isto, agradeço que me informem se poderei retomar as minhas funções como trabalhador da NEDINA ou se V.Exas. procederam à minha “destituição com justos motivos/justa causa, com efeitos imediatos” relativamente à minha condição de trabalhador.

Fico a aguardar pela resposta de V.Exas. a esta questão.

Conforme exigido por V.Exas., estou totalmente disponível “para proceder à entrega dos bens e equipamentos da empresa que estão em meu poder”. Estes bens e equipamentos resumem-se ao seguinte:

-cartão de telemóvel:

- chaves das instalações da NEDINA; - Comando do portão da NEDINA;

- Cartões de acesso aos bancos, senhas e matrizes;

Como alguns destes bens e equipamentos são necessários para continuar a exercer as minhas funções de trabalhador, agradeço que V.Exas. me confirmem se deverei entregar a totalidade do aqui indicado, também em função da resposta à questão acima colocada.

Fico a aguardar pela resposta de V.Exas. a esta questão até às 12 horas de 2ª feira, dia 04.04., data limite que me foi conferida “para proceder à entrega dos bens e equipamentos da empresa que estão em meu poder”. Na falta de qualquer resposta a esta questão, procederei, conforme me foi ordenado na carta de V.Exas. de 29.03., à entrega de tudo o que está acima relacionado.

Aproveito para informar que também irei proceder à entrega das despesas referentes ao mês de Março de 2011

20 - O Autor não obteve qualquer resposta por parte da Ré, pelo que, no dia 4/4/2011, deslocou-se às instalações da Ré, entregando os bens e equipamentos da empresa em seu poder (arts. 25º e 26º da petição inicial).

21 - Conforme resulta do teor do doc. nº 20 junto com a petição inicial, em 9/03/2010, o Autor recebeu um email do Dr. EE no qual respondeu ao fax de 16/12/2009 do sócio CC, no qual refere:

«Quero também referir-lhe que a nomeação do Dr. AA para o cargo de gerente não foi pelos motivos que na altura pressupôs mas antes porque já sabíamos qual seria o movimento seguinte do Sr. CC, que seria abandonar a gerência para nos deixar em dificuldades, ameaça que aliás não era virgem, pois já a tinha formulado noutras ocasiões. Assim tal nomeação foi apenas para prevenir o futuro e para a empresa não ficar em grandes dificuldades e inclusive com problemas financeiros com uma saída abrupta do Sr. CC que demoraria sempre algum tempo a colmatar. Desta maneira foi muito mais simples anular os efeitos da sua saída».

22 - Em 08/03/2010, o Autor recebeu e-mail do sócio Dr. EE no qual referia que:

“AA é necessário rapidamente dar inicio ao processo de preparação dos documentos…Assim sugeria-te que amanhã e de uma maneira informal perguntasses ao TOC que eu também vou fazer o mesmo aqui com o Dr. KK se conhece alguém ou algum gabinete a quem se possa encomendar rapidamente um estudo económico da empresa. É também necessário pedir aos vários bancos propostas e quais os limites do financiamento proposto dizendo que se pretende fazer um investimento na ordem dos 1.250… E em instalações e equipamentos. Todo este processo deverá ser posto em marcha rapidamente pois não vai haver muito tempo para o fazermos. Se te lembrares de alguma coisa mais diz-me. Vai também ser necessário oficializar as propostas das máquinas e de mais algo que achem importante, bem como contactar de novo o construtor para saber se os orçamentos se mantem ainda válidos ou se é necessário fazer uma reavaliação. Um abraço e vamos falando mas é muito importante que mantenhas agora muito atento EE”.

23 - Em 31/03/2010, realizou-se a Assembleia Geral para aprovação das contas de 2010, no qual estiveram presentes todos os sócios ou seus representantes e dois advogados que assessoravam as duas partes.

24 - Em 12/07/2010, o autor enviou um email ao Dr. LL, advogado, no qual o alertou que o dia 15/07/2010 era a data limite do envio do IES, e informou de que o TOC e o ROC apenas o enviariam se houvesse acordo das duas partes em relação à assinatura da acta da AG de 31/03/2010.

25 - Em 13/07/2010, Dr. LL enviou um email através do qual referiu que estava de acordo com o envio e que a ata teria sempre a data de 31/03/2010.

26 - Nesse mesmo dia, o autor enviou o email ao Dr. LL em virtude de estar pressionado pelo TOC a perguntar se havia acordo.

27 - E nesse mesmo dia, o Dr. LL respondeu, referindo:

“Caro Dr. AA

Acredite que para mim só considerarei ter havido acordo quando a ata for assinada. Penso, no entanto, que o acordo é viável, em face da referida reunião.

Cptos, do LL”.

28 - Em 17/11/2010, o autor recebeu o email do sócio-gerente Dr. BB com a acta corrigida da AG de31/03/2010.

29 - Em 20/11/2010, Sábado, o autor recebeu um email do Dr. LL acompanhado da ata, na qual estava trocado o nome de AA por BB nos pontos em que se referia ao nome do Autor.

30 - Em 22/11/2010, Segunda-Feira, o autor enviou um email ao Dr. LL, com a sua aprovação em relação à ata da AG de 31/03/2010.

31 - O contrato com a nova funcionária que foi assinado em 17/12/2010 e assinado por parte da Ré através dos sócios gerentes EE e BB e que assumiu funções, em Janeiro de 2011.

32 - Era o gerente BB que assumia desde o final de 2009 o sector das compras

33 - O autor estava incumbido de negociar preços da matéria-prima.

34 - Pertencia ao outro gerente ao tempo, BB, a definição dos materiais, quantidades e fornecedores.

35 - Ulteriormente, a área da produção foi delegada no Engº OO.

36 - Na ata da sessão da Assembleia Geral da ré de 28/03/2011, na qual foi aprovada a sua destituição, não consta que a sua comunicação escrita tenha sido discutida por parte dos sócios.

37 - O Autor deslocou-se pelos menos, dois/três dias, por semana, desde o início das suas funções, até à data da sua destituição, à empresa

38 - Durante a ausência do espaço físico da Ré, o Autor dava pontualmente resposta a algumas das necessidades da empresa, falando ao telefone ou trocando e-mails com os funcionários, clientes, fornecedores, instituições bancárias e os advogados da Ré, Dr. FF e Dr. LL.

39 - Pelo menos, em duas ocasiões realizaram-se conferências telefónicas, em alta voz, entre Autor, o gerente BB e o trabalhador/responsável pela secção de extrusão, PP, tendo por objectivo a resolução de problemas ou aquisições de material.

40 - Pelo menos, em fins de Agosto/princípios de Setembro de 2010, o Autor esteve, por duas ocasiões, em ..., com o gerente BB e o trabalhador PP para a compra de uma máquina extrusora.

41 – (Eliminado pelo Tribunal da Relação).

42 - Os objetivos da qualidade eram da competência do gerente Dr. BB.

43 - O Autor desenvolveu um esforço para proceder à alteração desta situação, nomeadamente, criou um campo novo nas tabelas de cheques datados, para emitir um aviso para cheques com mais de 100 dias, e que sempre foi usado.

44 - No ano de 2011, o Autor teve conhecimento que foi entregue à empresa A..., empresa já, em insolvência, a mercadoria

45 - E teve conhecimento que o sócio gerente Dr. BB deslocou-se a essa empresa para tentar recuperar a mercadoria.

46 - O Autor acompanhou alguns processos de cobrança.

47 - A decisão final quanto ao financiamento automóvel foi tomada em conjunto pelos dois outros gerentes, Drs. EE e BB.

48 - O Autor acompanhou alguns processos judiciais da Ré, nomeadamente, trocado e-mails com o advogado FF.

49 - O Autor respondeu através de e-mails a todos os intervenientes, fazendo os seus comentários à ata corrigida de 31/03/2010, pois o Dr. LL tinha falado em nome de todos e estava na ata a seguinte menção: «tendo o sócio AA dito; o sócio AA referiu».

50 - Por não entender o motivo pelo qual existia, na acta, a referência à sua pessoa, porque, em primeiro lugar, o Autor não era, nem nunca foi sócio, e, em segundo lugar, quem tinha usado da palavra em nome de todos tinha sido o Dr. LL, foram trocados e-mail com o sócio Dr. EE e havido uma reunião com o sócio gerente Dr. BB.

51 - O Autor teve conhecimento da decisão de corrigir a acta nos termos apontados no art. 157º da petição inicial através do “email” aí mencionado do Dr. LL.

52 - Após a sua destituição, o Autor continuou a exercer o cargo de gerente da empresa C... que desempenhava, à data em que foi nomeado gerente da Ré e até à sua destituição do cargo de gerente da Ré, na qual (C...) auferia e auferiu uma retribuição mensal líquida de €750,00.

53 - No dia 28/03/2011, o Autor esteve na “sede” da Ré, tendo ali chegado pelas 17,30 horas, limitando-se a entregar à gerência a sua resposta, através de uma trabalhadora da empresa

54 - Em final de Março/princípio de Abril de 2010, o Autor disse ao sócios EE e BB que pretendia afastar-se da gerência, invocando razões de foro pessoal.

55 - Em Março de 2010 na preparação dos documentos da prestação de contas do exercício de 2009, o Autor entrou em colisão com o TOC da Ré, QQ, por pretender “abandonar” a reunião onde se ultimavam todos esses documentos, com o argumento que era muito tarde.

56 - O processo de contratação de uma pessoa para o substituir finalizou-se, em Outubro de 2010, cujas reuniões da Ré com as diversas empresas de recursos humanos tiveram lugar na empresa e as entrevistas foram realizadas fora da empresa por motivos de confidencialidade.

57 - Após o registo da nomeação de EE como gerente, em meados de Dezembro 2010, o gerente BB abordou o Autor, referindo-lhe que, em Janeiro de 2011, deveria renunciar à gerência, dado que o colaborador contratado iniciaria funções

58 - Em resposta, o Autor referiu que só abandonaria a Ré desde que lhe fosse paga uma indemnização correspondente a quatro anos de mandato e a sua ex-mulher, irmã do gerente RR, pagasse uma dívida que tinha para com o seu pai, dele Autor.

59 - Aquando da deliberação social da sua destituição o autor sentia-se angustiado, tendo necessitado de apoio psicológico, bem como de apoio familiar.

60 - Na sequência da vontade manifestada pelo A. no sentido de abandonar imediatamente a gerência, foi-lhe solicitado pelos sócios EE e BB que se mantivesse no exercício das funções durante cerca de 2/3 meses de modo a permitir assegurar a transição de funções, o Autor, através de email de 23 de Setembro de 2010 remetido pelo Autor à sua então mulher II, disse anuir, por respeito pelos trabalhadores da empresa e a imagem dos avós da sua mulher, fundadores da empresa Ré.

                                               *

IV – O direito aplicável

1. Os danos morais

O Autor alegou que em consequência da destituição de gerente da Ré sofreu danos morais.

Após alteração da matéria de facto efetuada pelo acórdão recorrido, julgou-se apenas provado que, aquando da deliberação social da sua destituição, o Autor sentia-se angustiado, tendo necessitado de apoio psicológico, bem como de apoio familiar.

Deste facto apenas resulta uma coincidência temporal entre o momento em que o Autor foi destituído e um período de sofrimento psicológico, sem que se tenha demonstrado a existência de um nexo de causalidade entre as duas realidades.

Apesar da ausência deste requisito da responsabilidade civil, o acórdão recorrido atribuiu ao Autor uma indemnização por estes danos, no valor de € 1.000,00, com a seguinte fundamentação:

A sentença recorrida não fixou qualquer indemnização por danos não patrimoniais ao autor por ter considerado que o autor “ao arrepio do “onus probandi” que sobre si impendia não provou que lhe advieram quaisquer dos invocados danos não patrimoniais alegadamente sofridos, em resultado da destituição sem justa causa de gerente”. Atenta a modificação por esta Relação do ponto XVIII dos factos não provados, demonstra o autor que efetivamente os sofreu embora já não que os mesmos possam, pelo menos na totalidade, imputar-se causalmente à destituição. Havendo certamente a considerar angústias e aborrecimentos importantes, com necessidade de apoio psicológico e de apoio familiar, os quais, ainda que possam ter tido origem, causa principal na situação conjugal, são suscetíveis de serem agravados pela situação da destituição.

O acórdão recorrido baseou, pois, a atribuição desta indemnização por ter entendido que atenta a coincidência temporal entre os dois eventos, poderia a destituição do Autor ter agravado o sofrimento psicológico em que este já se encontrava devido à situação conjugal que atravessava.

Os juízos de prova não só devem ser efetuados aquando da fixação da matéria de facto provada e não quando se expõe o direito aplicável, o que constitui apenas uma incorreção formal, mas, sobretudo, e é isso que importa, eles têm de ser juízos de probabilidade e não de uma mera possibilidade.

Não se encontrando, pois, demonstrado que o sofrimento psicológico de que o Autor padeceu nessa altura tenha sido causado ou agravado pela sua destituição, não incide sobre a Ré um dever de indemnizar esse dano moral, pelo que, nesta parte, o recurso merece provimento.

2. O dano da perda de rendimento

O Autor pretende que a Ré seja condenada a pagar-lhe o valor das remunerações que auferiria como seu gerente durante o período de 4 anos subsequente à sua destituição, ou seja 112.000,00 €.

A sentença da 1.ª instância absolveu a Ré deste pedido com o fundamento que a prova feita não é reveladora de que a situação económica real do gerente é, após a destituição, pior do que aquela em que se encontrava, se ela não tivesse ocorrido, não bastando a prova da perda da remuneração devida pelo exercício da gerência, pelo que o gerente não os alegou, ou se não os provou, não há que fixar indemnização.

O Tribunal da Relação revogou esta decisão, condenando a Ré a pagar a quantia equivalente ao valor das remunerações que o Autor auferiria nos 4 anos seguintes a ter sido destituído, subtraído do valor da retribuição que passou a receber de uma outra empresa, ou seja 70.000,00 €.

Quanto à indemnização por danos patrimoniais devida pela destituição do gerente de sociedade por quotas, sem que se tenha provado uma justa causa, estabelece o artigo 257.º, n.º 7, do Código das Sociedades Comerciais, que, se não houver indemnização contratual estipulada, o gerente destituído sem justa causa tem direito a ser indemnizado pelos prejuízos sofridos, entendendo-se, porém, que ele não se manteria no cargo ainda por mais de quatro anos ou do tempo que faltar para perfazer o prazo por que fora designado.

Não se estabelece neste preceito legal nenhum limite ao dever de indemnizar, apenas se ficcionando, para efeitos indemnizatórios, que se o gerente não tivesse sido destituído, se manteria nesse cargo por mais quatro anos ou pelo tempo que faltar para perfazer o prazo para que fora designado.

Esta ficção legal está pensada para uma indemnização pela perda das remunerações que o gerente viria a receber, caso não tivesse sido destituído (lucros cessantes).

É esse precisamente o dano que o Autor alega na presente ação, pedindo que lhe seja paga uma indemnização equivalente às remunerações que teria auferido nos quatro anos em que se teria mantido no exercício da gerência da Ré, segundo a ficção legal inserida no artigo 257.º, n.º 2, do Código das Sociedades Comerciais.

Provou-se que o Autor foi destituído do cargo de gerente da Ré na reunião da Assembleia Geral desta realizada em 20.03.2011 e que, após a sua destituição, o Autor continuou a exercer o cargo de gerente da empresa C... que desempenhava, à data em que foi nomeado gerente da Ré e até à sua destituição do cargo de gerente da Ré, na qual (C...) auferia e auferiu uma retribuição mensal líquida de € 750,00.

A demonstração do dano alegado, impunha a prova de que o facto de o Autor ter deixado de auferir a remuneração como gerente o tinha colocado numa situação económica pior do que aquela que teria caso se mantivesse no exercício da gerência da Ré, auferindo a respetiva remuneração, devendo a medida da indemnização compensar a diferença patrimonial entre a situação real e a situação hipotética (artigos 562.º e 564.º, n.º 2, do Código Civil).

Ora, para além de sabermos que o Autor após ter sido destituído de gerente da Ré deixou de auferir a respetiva remuneração e que continuou a auferir a remuneração de gerente da C..., que acumulava com aquela, desconhecemos se o Autor passou ou não a auferir outros rendimentos, pelo que não temos provados os dados suficiente que nos permitam concluir se a situação económica do Autor piorou com a sua destituição, competindo a este o respetivo ónus de prova, nos termos do artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil.

Contudo, o Autor alegou na petição inicial, nos artigos 206.º e 207.º que em face da conjuntura económica que o país atravessa, não lhe foi possível encontrar outro emprego que lhe possibilitasse recuperar o rendimento perdido, ficando assim apenas a exercer funções na empresa C....

Estes factos não constam da lista dos factos provados, nem da lista dos factos não provados, apesar de serem essenciais para que se possa apurar se o Autor sofreu um dano patrimonial suscetível de ser indemnizado, nos termos do artigo 257.º, n.º 2, do Código das Sociedades Comerciais.

Esta insuficiência factual justifica a utilização do disposto no artigo 682.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, determinando-se a baixa do processo ao tribunal recorrido de modo a ser ampliada a matéria de facto sujeita a julgamento, em ordem a constituir base suficiente para ser proferida a nova decisão quanto a este pedido, tendo em consideração o direito definido por este acórdão.

                                               *

Decisão

Pelas razões expostas, acorda-se em:

- julgar procedente o recurso quanto à condenação da Ré no pagamento de uma indemnização por danos morais, revogando-se nessa parte o acórdão recorrido e absolvendo-se a Ré deste pedido indemnizatório.

-  anular o acórdão recorrido, na parte em que condenou a Ré no pagamento de uma indemnização por danos patrimoniais, para se proceder à ampliação da matéria de facto nos termos acima referidos, determinando-se o reenvio do processo para o Tribunal da Relação, com vista a apurarem-se os factos constantes dos artigos 206.º e 207.º da petição inicial, proferindo-se nova decisão, tendo em consideração o direito definido por este acórdão.

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Custas do recurso pelo Autor.

                                               *

Notifique.

                                               *

Lisboa 30 de março de 2023

João Cura Mariano (Relator)

Fernando Baptista

Vieira e Cunha