Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
3969/07.0TBBCL.G1.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: TOMÉ GOMES
Descritores: ATROPELAMENTO
INFRACÇÃO ESTRADAL
INFRAÇÃO ESTRADAL
EXCESSO DE VELOCIDADE
CONCORRÊNCIA DE CULPAS
DANO BIOLÓGICO
DANOS PATRIMONIAIS
CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
ACIDENTE DE VIAÇÃO
RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL
Data do Acordão: 12/03/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA EM PARTE A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL - LEIS, SUA INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / FONTES DAS OBRIGAÇÕES / RESPONSABILIDADE CIVIL / RESPONSABILIDADE CIVIL POR FACTOS ILÍCITOS / MODALIDADES DAS OBRIGAÇÕES / OBRIGAÇÃO DE JUROS / OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAÇÃO.
DIREITO ESTRADAL - TRÂNSITO DE VEÍCULOS / VELOCIDADE / ILUMINAÇÃO / TRÂNSITO DE PEÕES.
Doutrina:
- Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. 1.º, 10.ª Edição, Almedina, p. 605, nota 4.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 8.º, N.º3, 483.º, N.º1, 487.º, 494.º, 496.º, N.º1, 559.º, N.º 1, 570.º, N.º1, 572.º, 805.º, N.º N.º3,
CÓDIGO DA ESTRADA (CE) APROVADO PELO DEC.-LEI N.º 114/94, DE 03-05, NA REDAÇÃO DADA PELO DEC.-LEI N.º 44/2005, DE 23-02: - ARTIGOS 13.º, 19.º, 24.º, 25.º, 60.º, 61.º, 99.º, 101.º, 103.º.
PORTARIA N.º 291/2003, 08-04.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 7-6-2011, PROCESSO N.º160/2002.P1.S1, EM WWW.DGSI.PT .
-DE 21-03-2013, NO PROCESSO N.º 565/10.9TBVL.S1, EM WWW.DGSI.PT .
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ASSENTO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA N.º 4/2002, DE 9-5-2002, EM WWW.STJ.PT .
Sumário :
1. Em sede de responsabilidade civil emergente de acidente de viação, ainda que se prove que o condutor circulava dentro do limite máximo legal estabelecido para o local da ocorrência, há que ponderar se circulava a uma velocidade adequada às circunstâncias envolventes, de modo a poder parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente, ou a uma velocidade especialmente moderada, respetivamente, nos termos dos artigos 24.º, n.º 1, e 25.º, n.º 1, do Código da Estrada. 

2. Em caso de acidente de viação com atropelamento de peão, ocorrerá concorrência de culpas entre o peão e o condutor, se aquele, ao atravessar a via, tiver infringido a prescrição do artigo 101.º, n.º 1, do CE, e este circular com velocidade excessiva nos termos dos artigos 24.º, n.º 1, e 25.º, n.º 1, do mesmo Código.  

3. Nesse caso, a repartição de responsabilidades será feita em função da gravidade das culpas de ambas as partes e das consequências que delas resultarem, nos termos do n.º 1 do art.º 570.º do Código Civil.

4. O dano biológico traduz-se em dano patrimonial, na vertente de lucros cessantes, na medida em que respeita a incapacidade funcional, ainda que esta não impeça o lesado de trabalhar e que dela não resulte perda de vencimento, uma vez que a força de trabalho humano sempre é fonte de rendimentos e que tal incapacidade obriga a um maior esforço para manter o nível de rendimento anteriormente produzido.

5. Mesmo nos casos em que o lesado não exerça uma atividade profissional remunerada, em sede de dano biológico, deverá atender-se à atividade que ele desempenhava ou podia desempenhar com tarefas de índole económica propiciadoras de rendimento, no quadro do seu modo de vida, e que fique afetada em virtude das sequelas sofridas. 

6. Nesse caso, a indemnização deverá ser arbitrada, equitativamente, de modo a corresponder a um capital produtor do rendimento que o lesado deixe de produzir, atenta a expectativa média de vida.

7. A atribuição pecuniária a título de danos não patrimoniais visa compensar o lesado pelo dano imaterial sofrido, em termos de lhes permitir satisfazer interesses que apaguem ou atenuem o sofrimento causado pela lesão, mas também, de algum modo, punir a conduta do agente.

8. Tal compensação não deverá confinar-se a uma dimensão puramente simbólica, mas assumir uma expressão significativa com relevo no quadro de vida do lesado e com repercussão sancionatória para o lesante

Decisão Texto Integral:
Acordam na 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça:



I – Relatório


1. AA (A.) instaurou, em 18/10/ 2007, junto do Tribunal Judicial de Barcelos, ação declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra BB (1.ª R.) e o Fundo de Garantia Automóvel (2.º R.), alegando, no essencial, que:

. Em 04/04/2006, pelas 21h00, na freguesia de Vila Seca, município de Barcelos, ocorreu um acidente de viação que se traduziu no atropelamento da A. pelo veículo automóvel, ligeiro de mercadorias, com a matrícula 20-40-..., conduzido pela sua proprietária, a 1.ª R.;

. A A. foi colhida pelo referido veículo, que circulava a uma velocidade superior ao limite máximo ali permitido, de 40 km/hora, quando atravessava a via, no sentido sul - norte, tendo já ultrapassado o respetivo eixo e encontrando-se a meio da hemi-faixa de rodagem do lado norte;

. Além do excesso de velocidade a que seguia, a 1.ª R. conduzia o veículo com manifesta falta de atenção à presença dos demais utentes da via, pelo que a ocorrência do acidente foi da sua exclusiva responsabilidade, a título de culpa;

. Em virtude das lesões sofridas, a A. suportou prejuízos patrimoniais e não patrimoniais no valor global de € 82.156,45.

. À data do acidente, a 1.ª R. não dispunha de seguro automóvel.

Concluiu a A. pedindo a condenação dos R.R. a pagar-lhe a quantia de € 82.156,45 acrescida de juros de mora desde a citação.

2. O “Fundo de Garantia Automóvel”, 2.º R. contestou ação, impugnando, por desconhecimento, os factos articulados pela A..

3. Por seu lado, a 1.ª R. também deduziu contestação, apresentando uma contraversão do acidente, segundo a qual imputou unicamente à A. a responsabilidade culposa pela eclosão do acidente, pugnando pela sua absolvição do pedido.

4. Findos os articulados, foi proferido despacho saneador tabelar e selecionada a matéria de facto tida por relevante com a organização da base instrutória (fls. 104-112).

5. Porém, já após a instrução da causa e outras vicissitudes, a A. requereu a intervenção da “CC - Comapnahia de Seguros, S.A.”, a qual foi admitida como associada das R.R., tendo também apresentado contestação, a sustentar a inexistência de contrato de seguro relativamente ao veículo …, por falta de pagamento, e a impugnar, por desconhecimento, os factos articulados pela A.

6. Realizada a audiência final e decidida a matéria de facto controvertida conforme despacho de fls. 553-561, foi proferida sentença a fls. 574-588, datada de 04/02/2014, a julgar a ação totalmente improcedente e, consequentemente, a absolver as R.R. do pedido, embora por diferentes fundamentos.

7. Inconformada com tal decisão, a A. recorreu para o Tribunal da Relação de Guimarães, que julgou a apelação improcedente, confirmando a sentença da 1.ª instância, conforme acórdão proferido a fls. 649-648, datado de 26/02/2015.    

8. Novamente inconformada, a A. recorreu de revista, pretensamente a título excecional, formulando as seguintes conclusões:

1.ª - Pretende a A. revista excecional com fundamento no disposto nas alíneas a), b) e c) do n.º 1 do art.º 672.º do CPC.

2.ª - Pretende a A. que seja apreciada a questão da concorrência de culpa do lesado com o risco próprio da circulação de veículos automóveis, questão de grande relevância e que tem dividido a doutrina e a jurisprudência, tornando-se necessária a sua apreciação para melhor aplicação do direito.

3.ª - A doutrina e jurisprudência tradicionais têm entendido que em matéria de acidentes de viação, a verificação de qualquer das circunstâncias referidas no art.º 505.º do CC, maxime, ser o acidente imputável a facto, culposo ou não, do lesado, exclui a responsabilidade objetiva do detentor do veículo, não se admitindo o concurso do perigo especial do veículo com o facto da vitima, de modo a conduzir a uma repartição de responsabilidade: a responsabilidade pelo risco é afastada pelo facto do lesado;

4.ª - Esta corrente doutrinal e jurisprudencial engloba as situações mais díspares e não distingue as condutas culposas das não culposas e dentro daquelas as de culpa mais grave das de culpa mais leve, conduzindo muitas vezes a resultados chocantes e injustos e mostra-se ainda insensível ao alargamento crescente, por influência do direito comunitário, do âmbito da responsabilidade pelo risco e da expressa consagração da hipótese da concorrência entre o risco da actividade do agente e um facto culposo do lesado, que tem tido tradução em recentes diplomas legais.

5.ª - Tem alguma/vária jurisprudência feito uma interpretação progressista e atualista do texto do artigo 505.º do CC, no sentido de nele se acolher a regra do concurso da culpa do lesado com o risco próprio do veículo.

6.ª - No caso dos autos, quer a 1.ª instância, quer a Relação de Guimarães consideraram culposa a atuação da A. e que a culpa na produção do acidente coube na totalidade à mesma e com base nesta conclusão a decisão da Relação arredou a possibilidade de aplicação da tese atualista ­ concorrência entre o risco e o facto do lesado;

7.ª - As decisões proferidas, quer da 1.ª instância, quer da Relação, deveriam ter apreciado a questão quer com base na culpa, quer com base no risco;

8.ª - "Se o autor pede em juízo a condenação do agente invocando a culpa deste, ele quer presuntivamente que o mesmo efeito seja judicialmente decretado à sombra da responsabilidade pelo risco, no caso da culpa se não provar. E assim, mesmo que não faça prova da culpa do demandado, o tribunal pode averiguar se o pedido procede à sombra da responsabilidade pelo risco, salvo se dos autos resultar que a vítima só pretende a reparação se houver culpa do réu"- Ac. STJ de 04/10/2007, Proc. 0781710. dgsi.net.

9.ª - A decisão recorrida, partindo da conclusão de que a A. teve culpa na produção do acidente, afastou logo a responsabilidade do condutor do veículo automóvel sem sequer ter apreciado a hipótese de este poder ser responsabilizado pelo risco.

10.ª - Face às decisões proferidas em sentido diferente, no tocante à concorrência da culpa do peão com o risco do veículo automóvel, pretende a A. a apreciação desta questão, por entender necessária para uma melhor aplicação do direito, devendo ter-se por verificado o requisito da revista excepcional da alínea a) do n.º 1 do art.º 672.º do CPC;  

11.ª - O recurso de revista excecional deve ainda ser admitido por na situação em apreço estarem em causa interesses de particular relevância social, trazendo-se à discussão a questão da proteção dos peões, vítimas de acidentes de viação, mesmo nos casos em que haja culpa da sua parte.

12.ª - Com o crescente e imparável aumento da circulação automóvel, que se tornou um bem ou meio essencial e imprescindível para toda e qualquer pessoa, integrando e fazendo já parte dos seus direitos fundamentais, como sejam o da liberdade de deslocação e movimentação, a circulação dos peões tornou-se cada mais perigosa e sujeita a riscos, constituindo muitas vezes, sobretudo nas cidades, uma verdadeira aventura na selva urbana.

13.ª - O acidente dos autos deve ser submetido à apreciação deste Tribunal, a fim de se apurar se a A., enquanto peão atropelado e mesmo considerando existir culpa na sua conduta, é merecedora de alguma protecção e em que medida.

14.ª - Com efeito, casos há em que mesmo havendo culpa do peão, é do mais elementar sentido de justiça social a sua proteção e o ressarcimento dos danos sofridos, como é o caso dos acidentes envolvendo menores (cheios de energia e genica muitas das vezes incontroláveis), pessoas portadoras de deficiência ou idosos (com menor capacidade de acção e reacção), a par de outras situações de comportamentos mecanizados, automatizados, involuntários ou quase inconscientes.

15.ª – Trata-se duma questão em que estão em causa interesses de particular relevância social, verificando-se, assim, o requisito da alínea b) do n.º 1 do art.º 672.º do CPC para a admissão da revista excecional.

16.ª - O acórdão recorrido, ao não ter equacionado nem apreciado a responsabilidade da condutora do veículo automóvel com base no risco, mesmo havendo culpa da A., encontra-se em contradição com outro acórdão do STJ já transitado em julgado no domínio da mesma legislação - artigos 503.º, 505.º e 570.º do CC - e sobre a mesma questão fundamental de direito - concorrência de culpa e risco em ação emergente de acidente de viação, designadamente o acórdão proferido em 04/01/2007 no Processo Ordinário n.º 2901/2001 do 3.º Juízo do Tribunal Judicial de Pombal, já transitado em julgado, conforme certidão que se junta;

17.ª - Porque na decisão recorrida nem sequer se apreciou a responsabilidade civil do condutor do veículo automóvel com base no risco, por se ter concluído pela culpa da lesada (A.), o acórdão recorrido incorre em contradição com o referido acórdão, no domínio da mesma legislação (artigos 503.º, 505.º e 570.º do CC) sobre a mesma questão fundamental de direito (concurso de culpa e risco em acidentes de viação);

18.ª - Sendo certo que não foi proferido acórdão de uniformização de jurisprudência sobre a matéria em questão.

19.ª - Apesar da diversidade da matéria de fado, pois que, como é natural, não existem acidentes iguais, o acórdão-fundamento, numa situação de fado equiparável à dos autos, decidiu atribuir indemnização ao menor atropelado por um veículo automóvel ligeiro de passageiros com base na concorrência entre a culpa do menor e o risco inerente à circulação do veículo automóvel, quando as instâncias tinham afastado a possibilidade de responsabilizar a condutora do veículo atropelante com base no risco, porque concluíram ser o acidente imputável a título de culpa ao menor sinistrado, sem se ter demonstrado qualquer parcela de culpa do condutor do veículo atropelante;

20.ª - No caso dos autos, as instâncias porque concluíram pela culpa do peão atropelado nem sequer apreciaram a possibilidade de responsabilidade da condutora do veículo automóvel nem pelo risco;

21.ª - Assim, a decisão em causa, ao entender que havendo culpa do lesado (A.) não existe responsabilidade do condutor do veículo automóvel, optou pela tese oposta à do acórdão fundamento, havendo, assim, oposição de julgados entre os dois acórdãos, verificando-se o requisito da alínea e) do n.º 1 do art.º 672.º do CPC, devendo ser admitida a revista excecional.

22.ª - Dos factos provados resulta que a culpa da A. não é exclusiva e que a condutora do veículo automóvel deve ser responsabilizada pelo risco, ou mesmo até a titulo de culpa;

23.ª - Deve entender-se que para o acidente concorreu também o risco do próprio veículo automóvel, uma vez que em causa está um acidente com intervenção de um peão com 73 anos à data do acidente e um veículo automóvel ligeiro de passageiros, cuja perigosidade, em abstracto, decorre da sua própria natureza, da maior ou menor dificuldade em o manobrar, da "máquina" enquanto engrenagem complexa e complicada;

24.ª - Acresce ainda o facto de o veículo automóvel ser conduzido por uma jovem de 22 anos à data do acidente (participação do acidente onde consta que a condutora BB nasceu em 4/9/1983) e com pouca experiência de condução, pois que tinha licença de condução há menos de 4 anos (participação do acidente de fls ... dos autos) de onde consta que a condutora tinha licença de condução de ligeiros desde 17/05/2002) .

25.ª - Dado que a A. tinha, à altura do acidente, 73 anos de idade e não caminharia a uma média superior a 1 metro por segundo, a mesma demoraria cerca de 5 segundos a percorrer a distância desde o local onde começou a travessia até ao local onde foi colhida, tempo que num veículo a menos de 40 kms/h equivale a uma distância percorrida de mais de 30 metros, devendo concluir-se que a condutora tinha a obrigatoriedade de ver o peão pelo menos a essa distância, distância que também teria sempre de ver, caso conduzisse com os médios ligados, como tinha obrigatoriamente de conduzir.

26.ª - Deste modo, a condução do veículo está indiscutivelmente ligada à ocorrência do acidente, pois que o automóvel, enquanto máquina de funcionamento complexo, domina-se e controla-se tanto melhor - diminuindo o seu perigo potencial para os utentes das vias - quanto mais experimentado e hábil for o condutor e a experiência ganha-se com a prática da condução ao longo dos anos e com esta vai-se aguçando a habilidade e vai-se ganhando capacidade de reação quase instintiva à situação do tráfego rodoviário que um condutor novato não detém, sem que, porém, tal lhe possa ser censurado, no plano da culpa;  

27.ª - Dentro dos riscos próprios do veículo, a que se refere o artigo 503.º do CC cabem “além dos acidentes provenientes de máquinas de transporte, os ligados ao outro termo do binómio que assegura a circulação desse veículo (o condutor)” - A. Varela "Das Obrigações em Geral", vol. I, 7.ª edição, pág. 664.

28.ª - Circulando a condutora a uma velocidade não excedente a 40 km/h e efetuando a A., com 73 anos de idade, a travessia da esquerda para a direita, atenta a circulação do veículo automóvel, um condutor mais diligente e mais experiente poderia ter evitado o acidente, pois que dispunha de tempo e espaço suficientes para evitar o embate ou para se desviar para a sua direita, por forma a evitar o embate, emergindo tal conclusão de um raciocínio lógico e coerente baseado no tempo que o peão levou a efetuar a travessia da via até ao momento em que foi colhido.

29.ª – Dos factos provados fica a ideia de que a condutora do veículo automóvel podia e devia ter atuado de forma diferente, quer seja com mudança da trajetória para a sua direita, quer travando e parando porque tinha tempo e espaço para o fazer, pois que a condutora tinha de avistar o peão a pelo menos 30 metros de distância.

30.ª - A falta de experiência da condutora do veículo no domínio da máquina condicionou indubitavelmente o total e absoluto domínio das "artes da condução", o que se refletiu em sede de causalidade no processo dinâmico que levou à eclosão do evento lesivo, para o qual contribuíram a condutora e o risco próprio do veículo automóvel.

31.ª - O que, de acordo com a interpretação atualista do preceituado no artigo 505.º do CC reclama a subsunção desta situação concursal de causas de dano à norma da repartição do dano que é o artigo 570.º do CC, repartição que deve ser efetuada em igual proporção de 50% para a autora e 50% para o risco do veículo.

32.ª - Sem prescindir,  dos factos provados é possível concluir também por concorrência de culpas entre a A. e a condutora do veículo automóvel.

33.ª - Com a provecta idade que a A. tinha (73 anos) - ainda que admitindo (por provado) a sua desatenção na travessia da via - decerto que se movimentava com alguma dificuldade e lentidão, pelo que teria demorado um certo lapso de tempo entre a tomada da faixa de rodagem (inicio da travessia da via) e a transposição do seu meio - local onde foi embatida pelo lado esquerdo do veículo.

34.ª - A condutora do veículo poderia e teria de avistar o peão a pelo menos 30 metros de distância, quer pelo facto de se tratar de uma recta quer pelo facto de na ocasião do acidente ter de circular, pelo menos, com os médios ligados, os quais permitem a visibilidade numa distância até 30 metros, para além de o local ser dotado de iluminação pública, embora fraca.

35.ª - Sendo a marcha da A. lenta, a condutora do veículo automóvel, atento o local do embate (junto do eixo da via) teria tido oportunidade de se desviar para a sua direita (que tinha livre e disponível) em vez de continuar em frente e teria certamente tempo e espaço para parar o veículo sem embater na A.;

36.ª - Dos factos provados tem de se concluir que a condutora do veículo automóvel atuou com imperícia e falta de destreza, pois que tinha tempo e espaço, quer para parar no espaço livre e visível à sua frente, quer para se desviar para a sua direita, por forma a evitar o embate no peão.

37.ª - No caso em apreço, a condutora do veículo automóvel teria de avistar o peão a pelo menos 30 metros, pelo que ainda que inadvertida e imponderada a atitude do peão, teria tido a possibilidade de, caso conduzisse com atenção e perícia, tornear o peão, desviando-se para a sua direita ou parar.

38.ª - Do croquis e dos rastos de travagem nele constantes, bem como do facto de o embate ter ocorrido após a A. ter transposto a linha existente no eixo central da via e logo a seguir a esta, resulta a conclusão de que a condutora do veículo automóvel circulava em violação do disposto no n.º 1 do artigo 13.º do CE que impõe que “o trânsito de veículos deve fazer-se pelo lado direito da faixa de rodagem e o mais próximo possível das bermas ou passeios, conservando destes uma distância que permita evitar acidentes”.

39.ª - A condutora do veículo automóvel não circulava próximo da berma ou passeio, mas antes próximo do eixo da via, aí tendo embatido na A., pelo que, a condutora do veículo automóvel contribuiu, também ela, para a eclosão deste acidente.

40.ª - A condutora do veículo automóvel circulava na EN 205 e saiu desta via e passou a circular pela EN 205-1 que entronca na EN 205 pelo lado direito desta, atento o sentido de marcha da condutora do veículo automóvel, quando a A. estava a efetuar a travessia da faixa de rodagem dessa EN 205-1.

41.ª - Não obstante se ter dado como provado que a condutora do veículo automóvel vinda da EN 205, do lado de Barcelos, ao entrar na EN 205-1 seguiu em linha recta, sem qualquer mudança de direção, o certo é que entrou noutra via que entronca pela direita com a via por onde circulava.

42.ª - Configurando, no local, a EN 205 uma curva para a esquerda, atento o sentido do veículo automóvel e o facto de a EN 205-1 entroncar nessa via pelo lado direito, seguindo a condutora em linha reta, a condutora do veículo automóvel mudou de direção, pois que abandonou a via principal por onde seguia (EN 205) e passou a circular pela EN 205-1 que entronca pela direita na EN 205.

43.ª - A condutora do veículo automóvel deveria ter parado, a fim de deixar passar a A., que estava a atravessar a faixa de rodagem da via em que tinha entrado, o que não fez, violando o disposto no n.º 3 do artigo 103.º do CE.

44.ª - Atendendo ao modo inadvertido como o peão entrou e fez a travessia da via - sem se certificar de que nenhum veículo circulava por qualquer das metades da faixa de rodagem na qual pretendia entrar - e à falta de destreza, imperícia e falta de atenção da condutora do veículo, deve entender-se que a culpa deve ser distribuída em 50% para cada um dos intervenientes.

45.ª – Deve assim proceder-se a repartição de responsabilidades na proporção de 50% para a A. e 50% para a condutora do veículo automóvel, ou seja, para a R. seguradora, ou noutra proporção que se entenda melhor adequada ao caso concreto.

46.ª - Em danos materiais a A. sofreu o prejuízo de € 446,40, relativamente aos óculos e ao relógio.

47.ª - Tendo a A. ficado com uma IPP de 10%, esta deverá ser valorada não obstante a idade da A. (73 anos à data do acidente), uma vez que como se provou fazia as lides domésticas (cozinhava, passava a ferro), cuidava dos netos e dos animais domésticos, cuidava do jardim e agricultava o quintal, devendo-lhe atribuída, por equidade, a compensação de € 15.000,00, a titulo de indemnização pela perda da capacidade aquisitiva e dano biológico.

48.ª - Tendo em atenção o quadro fáctico apurado, nomeadamente as lesões sofridas, as sequelas, as dores, o facto de ter de ser submetida a intervenção para extracção do material de osteossintese, os vários internamentos, o tempo de repouso e internamento, entende-se que deve ser fixada, por equidade, uma indemnização de € 20.000,00, a titulo de danos morais.

49.ª - Pelo que, fazendo funcionar o critério da repartição previsto no artigo 570.º do CC deve ser atribuída à A. a quantia de € 17.723,20;  

50.ª - O acórdão recorrido violou por errada interpretação e aplicação o disposto nos artigos 503.º, 505.º e 570.º do CC, bem ainda o disposto nos artigos 13.º, n.º 1, e 103.º, n.º 3, do CE.


Pede a Recorrente que se revogue a decisão recorrida e se substitua por outra que condene a R. a pagar à A. a quantia de € 17.723,20, acrescida de juros de mora, desde a citação.

9. A interveniente CC apresentou contra-alegações, em que pugna pela confirmação do julgado, refutando, em particular, a tese da Recorrente do concurso entre culpa e risco.  

10. Uma vez que a revista fora interposta formalmente a título excecional, ao abrigo do disposto nas alíneas a), b) e c) do n.º 1 do art.º 672.º do CPC, os autos foram remetidos, para apreciação preliminar, à formação dos três juízes deste Supremo prevista no n.º 3 do indicado normativo, que deliberou não se colocar, no caso presente, a aplicação daquele regime, uma vez que, atenta a data da propositura da ação, não opera o impedimento da dupla conforme, conforme acórdão de fls. 905-907, de 25/06/2015.


Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.


II - Delimitação do objeto do recurso


Antes de mais, importa registar que, tratando-se de ação proposta em 2007, em que as decisões foram proferidas em 04/02/2014 (na 1.ª instância) e em 26/02/2015 (na Relação), é aplicável o regime recursal do CPC aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26-06, nos termos do art.º 7.º, n.º 1, desta Lei, salvo no que respeita ao valor da alçada para efeitos de recurso e à restrição da dupla conforme, em relação ao que se aplicam as disposições em vigor à data da propositura da ação.


Como é sabido, no que aqui releva, o objeto do recurso é definido em função das conclusões formuladas pelo recorrente, nos termos dos artigos 635.º, n.º 3 a 5, 639.º, n.º 1, do CPC.

Dentro desses parâmetros, o objeto dos presentes recursos incide sobre as seguintes questões:

(i) - Em primeira linha, a questão da repartição da responsabilidade pela ocorrência do acidente, a título de culpa, entre a A. e a 1.ª R., condutora do veículo atropelante;     

(ii) – Subsidiariamente, a questão da repartição da responsabilidade pelo acidente entre a culpa da A. e o risco inerente ao veículo;

(iii) – Na hipótese de procedência de qualquer dessas questões, a determinação do montante indemnizatório.


Convém referir que não tendo a presente revista sido admitia a título excecional, não se impõe aqui atentar, especificamente, na alegada contradição jurisprudencial, bastando que sejam sopesadas as orientações divergentes no âmbito da apreciação da questão suscitada sobre o eventual concurso entre culpa e risco, caso haja de se conhecer desta questão. 


III – Fundamentação   


1. Factualidade dada como provada pela na 1.ª Instância


Vem dada como provada pelas instâncias a factualidade que aqui, para melhor compreensão do circunstancialismo e da dinâmica do acidente, se reordena nos seguintes moldes:

1.1. Em 04 de abril de 2006, cerca das 21 horas, na freguesia de Vila Seca, concelho de Barcelos, a A. circulava a pé pela berma do lado poente da EN 205, no sentido Póvoa de Varzim – Barcelos – resposta ao art.º 1.º da base instrutória;  

1.2. A A. chegou ao Largo João Lobarinhas (Vila Seca), adjacente à EN 205, no lado poente, onde esta estrada faz uma curva à direita, tendo em conta o sentido Póvoa de Varzim – Barcelos – resposta ao art.º 2.º da base instrutória;   

1.3. O Largo João Lobarinhas serve, também, de entroncamento com a EN 205-1, a qual tem o seu início nesse Largo e se dirige para a freguesia de Fão, concelho de Esposende – resposta ao art.º 3.º da base instrutória;  

1.4. O Largo João Lobarinhas, no seu lado poente, que confina com a EN 205, tem um passeio – resposta ao art.º 4.º da base instrutória;   

1.5. O passeio reduz, na sua largura, junto ao alçado norte do prédio de esquina do Largo João Lobarinhas, com o início da Rua João Lobarinhas (EN 205- 1) – resposta ao art.º 5.º da base instrutória;  

1.6. Junto ao alçado norte do prédio de esquina do Largo João Lobarinhas, a A. iniciou o atravessamento da Rua João Lobarinhas (EN 205-1), no sentido sul – norte, pretendendo seguir pela Rua da Bemposta – resposta ao art.º 6.º da base instrutória;  

1.7. A A. decidiu atravessar a estrada num local sem passadeira para peões – resposta ao art.º 67.º da base instrutória;   

1.8. Ao chegar ao local onde ocorreu o embate a A. não parou, iniciando a travessia da EN 205-1 sem se certificar de que nenhum veículo circulava por qualquer das metades da faixa de rodagem na qual pretendia entrar – resposta ao art.º 69.º da base instrutória;

1.9. A R. BB circulava na EN 205, no sentido norte / sul, no sentido Barcelos – Vila Seca – resposta ao art.º 11.º da base instrutória;   

1.10. A R., vinda da EN 205, do lado de Barcelos, ao entrar na EN 205-1, seguiu em linha reta, sem qualquer mudança de direção – resposta ao art.º 14.º da base instrutória;

1.11. Atento o sentido de marcha da R., o entroncamento da EN 205 com a EN 205-1 tem a configuração de uma reta – resposta ao art.º 13.º da base instrutória;   

1.12. A R. continuou a sua marcha, entrando na EN 205-1, no sentido Vila Seca – Fão – resposta ao art.º 12.º da base instrutória;   

1.13. A EN 205, no sentido Barcelos – Vila Seca, atento o sentido de marcha da R., apresenta sinalização vertical de limitação de velocidade máxima de 40 km/h – resposta restritiva ao art.º 15.º da base instrutória;  

1.14. Bem como sinalização vertical de aproximação a passadeira de peões - resposta restritiva ao art.º 16.º da base instrutória;  

1.15. E sinalização vertical de aproximação a local utilizado por crianças – resposta restritiva ao art.º 17.º da base instrutória;   

1.16. E, ainda, sinalização vertical de aproximação de curva à esquerda, curva esta para quem continuar na EN 205, no sentido Barcelos – Póvoa de Varzim – resposta restritiva ao art.º 18.º da base instrutória;   

1.17. E também sinalização horizontal, constituída por lombas pintadas de branco – resposta restritiva ao art.º 19.º da base instrutória;  

1.18. Os sinais verticais de limitação de velocidade a 40 km/h e de aproximação de passadeira para peões situam-se a 250 metros do entroncamento da EN 205 com a EN 205-1 – resposta ao art.º 74.º da base instrutória;     

1.19. Os sinais verticais de aproximação de local utilizado por crianças e de aproximação de curva à esquerda localizam-se a cerca de 200 metros do entroncamento da EN 205 com a EN 205-1 – resposta ao art.º 75.º da base instrutória;     

1.20. Os sinais verticais visam regular o trânsito que circula na EN 205 – resposta ao art.º 76.º da base instrutória;  

1.21. A R. BB conduzia a velocidade não superior a 50 km/h (resposta ao art.º 66.º da base instrutória) e que não excedia os 40 km/h – (resposta ao art.º 70.º da base instrutória);     

1.22. Quando se apercebe da A., a R. BB acionou os travões do veículo – resposta ao art.º 68.º da base instrutória;

1.23. O veículo com a matrícula 20-40-... embateu com a sua frente esquerda no lado direito da A. – resposta ao art.º 8.º da base instrutória;

1.24. O embate entre o veículo conduzido pela R. e a A. ocorreu logo após a A. ter transposto a linha existente no eixo central da via e logo a seguir a esta – resposta ao art.º 71.º da base instrutória;   

1.25. Quando ocorreu o embate, a A. encontrava-se sensivelmente a meio da faixa de rodagem da Rua João Lobarinhas, no enfiamento do prédio de esquina do Largo João Lobarinhas com a Rua João Lobarinhas e o prédio de esquina da Rua João Lobarinhas com a Rua da Bemposta – resposta ao art.º 9.º da base instrutória;   

1.26. Quando ocorreu o embate, a A. encontrava-se muito perto de umas tampas de saneamento / águas pluviais existentes na faixa de rodagem da Rua João Lobarinhas – resposta restritiva ao art.º 10.º da base instrutória;   

1.27. A R. imobilizou o veículo a cerca de 8,6 metros do local de embate – resposta ao art.º 73.º da base instrutória;      

1.28. Com o embate a A. foi projetada pelo ar, cerca de 8 metros, indo estatelar-se no chão, junto à parede da berma esquerda da Rua João Lobarinhas, tendo em conta o sentido Vila Seca – Fão – resposta ao art.º 21.º da base instrutória;   

1.29. No local em que a A. foi embatida existe iluminação pública, porém fraca – resposta ao art.º 22.º da base instrutória, com o esclarecimento final;

1.30. No momento em que ocorreu o embate já não havia luz natural – resposta ao art.º 63.º da base instrutória;     

1.31. Quando ocorreu o embate, a A. vestia roupa escura – resposta ao art.º 64.º da base instrutória;     

1.32. No momento do embate o tempo encontrava-se chuvoso – resposta ao art.º 65.º da base instrutória;     

1.33. Em virtude do embate, a A. sofreu lesões que determinaram a sua imediata evacuação para o Hospital de Viana do Castelo – resposta ao art.º 23.º da base instrutória;   

1.34. Foram detetadas à A. fratura dos ossos da perna direita, fratura do olecrâneo direito e traumatismo do hemitorax esquerdo, com fratura de 8 costelas – resposta restritiva ao art.º 24.º da base instrutória;   

1.35. As lesões, após completado o período de tratamento, deixaram como sequelas fratura da tíbia consolidada com ligeiro desvio axial, fratura do olecrâneo com rigidez do cotovelo (5.º de extensão) e ligeiro edema do membro inferior por insuficiência venosa, pós-traumática – resposta, com esclarecimento, ao art.º 25.º da base instrutória;    

1.36. As sequelas provocam à A. uma IPP de 10% – resposta restritiva ao art.º 26.º da base instrutória;    

1.37. A A. terá de ser submetida a intervenção cirúrgica para extração de materiais de osteossintese – resposta ao art.º 28.º da base instrutória;

1.38. A A. nasceu em 18 de julho de 1933 – aliena A) e única da base instrutória;    

1.39. A A. era doméstica – resposta ao art.º 29.º da base instrutória;    

1.40. O agregado familiar da A. era composto pelo marido, filho, nora, dois netos e cunhada – resposta ao art.º 30.º da base instrutória;    

1.41. Era a A. quem preparava as refeições do dia para os membros do seu agregado familiar – resposta ao art.º 31.º da base instrutória;    

1.42. Era a A. quem tratava das roupas, lavando-as e passando-as a ferro – resposta ao art.º 32.º da base instrutória;    

1.43. Era a A. quem cuidava dos netos, então com 4 e 1 anos – resposta ao art.º 33.º da base instrutória;    

1.44. Era a A. quem cuidava e alimentava os animais domésticos - galinhas, porcos, coelhos, pássaros, cães e gatos – resposta ao art.º 34.º da base instrutória;    

1.45. Era a A. quem cuidava do jardim e que agricultava o quintal, assegurando o amanho da terra – resposta ao art.º 35.º da base instrutória;    

1.46. Por via do embate e das lesões sofridas, a A. esteve, após o tratamento hospitalar, primeiro, no Centro Hospitalar do Alto Minho, em Viana do Castelo, depois, no Hospital de S. João, no Porto, e finalmente no Hospital de Santa Maria maior, em Barcelos – resposta ao art.º 36.º da base instrutória;    

1.47. A A. esteve imobilizada em casa, retida na cama, durante 3 meses – resposta ao art.º 37.º da base instrutória;    

1.48. De inícios de julho de 2006 até finais de janeiro de 2007, a A. esteve obrigada a utilizar uma cadeira de rodas sempre que precisava de se locomover, cadeira essa que tinha de ser empurrada por outra pessoa, já que a A., limitada pelas lesões sofridas, não conseguia accioná-la autonomamente – resposta ao art.º 38.º da base instrutória;    

1.49. Durante cerca de 6 meses a A. necessitou do auxílio de canadianas para se locomover – resposta restritiva ao art.º 39.º da base instrutória;  

1.50. Em consequência do embate e do facto de ter sido projetada, indo estatelar-se no chão, a A. ficou com os óculos, que então usava, totalmente destruídos, sendo a sua substituição orçada em € 246,40 – resposta ao art.º 46.º da base instrutória;     

1.51. O vestuário e calçado que a A. usava, aquando do embate, ficou destruído – resposta restritiva ao art.º 48.º da base instrutória;      

1.52. O relógio que a A. usava ficou totalmente destruído, ascendendo o seu valor a € 200,00 – resposta ao art.º 26.º da base instrutória;     

1.53. O embate provocou à A., naquele momento, dores em consequência das fraturas múltiplas e dos tratamentos sofridos – resposta ao art.º 50.º da base instrutória;     

1.54. A A. sofreu dores e padecimentos com os curativos e tratamentos feitos – resposta ao art.º 53.º da base instrutória;     

1.55. Após o internamento hospitalar, a A. sofreu dores – resposta restritiva ao art.º 54.º da base instrutória;   

1.57. A proposta de seguro relativamente ao … entrou nos serviços da CC – Companhia de Seguros, S.A., em 20/12/2005 – resposta ao art.º 86.º da base instrutória;

1.58. A R. BB não procedeu a qualquer pagamento do prémio de seguro relativo ao veículo 20-40-... – resposta ao art.º 85º da base instrutória.     


É esta a matéria de facto que se tem por fixada, nos termos e para os efeitos do n.º 2 do art.º 682.º do CPC.


2. Do mérito do recurso


2.1. Enquadramento preliminar


Estamos no âmbito de uma ação declarativa cuja pretensão tem por objeto a condenação, solidária, dos primitivos R.R. e/ou da interveniente CC – Companhia de Seguros, S.A., na indemnização global de € 82.156,45 acrescida de juros de mora desde a citação, por danos patrimoniais e não patrimoniais, a título de responsabilidade civil emergente de um acidente de viação, cuja ocorrência, em 04 de abril de 2006, a A. imputou à 1.ª R., a título de culpa exclusiva, mas demandando também o Fundo de Garantia Automóvel, 2.º R., sob a alegação de inexistência de contrato de seguro válido.  

Posteriormente, foi requerida e admitida a intervenção CC – Companhia de Seguros, S.A., com fundamento na existência de seguro relativo ao veículo atropelante firmado com esta seguradora.

A ação foi julgada totalmente improcedente em 1.ª instância com a consequente absolvição do pedido dos primitivos R.R. e da interveniente, aqueles por se entender que existia, à data do acidente, seguro válido e eficaz relativo ao veículo em referência, celebrado com a mesma interveniente, e esta por se concluir que da factualidade provada não resulta que a condutora do veículo tenha agido com culpa, mas sim que o acidente se deu por culpa exclusiva da A..


Interposto recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães, fundado não só na impugnação da decisão de facto, mas também na de direito, a apelação foi julgada improcedente por se considerar não existirem “razões decisivas” para alterar aquela decisão de facto e porque, passando o êxito do recurso pela procedência da impugnação da matéria de facto, teria de se manter a decisão recorrida que se ali se afirma: “faz uma correcta interpretação e aplicação do Direito aos factos julgados provados”. 

Em suma, o Tribunal da Relação tomou, genericamente, por boa a decisão de direito, sem analisar especificamente as questões jurídicas suscitadas pela Recorrente, quando, salvo o devido respeito, tais questões não dependiam exclusivamente da pretendida alteração da decisão de facto, em especial, no que respeita à pretendida repartição da culpa, que vinha ainda colocada ante a própria factualidade dada como provada em 1.ª instância.

É, pois, esta vertente da decisão de direito, no tocante à repartição de responsabilidade pela ocorrência do acidente, seja em sede de culpa dos respetivos intervenientes, seja em sede de eventual concurso entre a culpa da A. e o risco inerente ao veículo, que se coloca no presente recurso, nos termos acima enunciados.         


2.2. Quanto à repartição da responsabilidade a título de culpa da A. e da 1.ª R.


Antes de mais, importa referir que, na fundamentação da sentença, depois de um enquadramento teórico sobre a violação do dever objetivo de cuidado e sobre a culpa, no quadro dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual previstos no n.º 1 do art.º 483.º do CC e sem convocar qualquer norma do direito estradal, já em sede de análise da factualidade provada relativa à dinâmica do acidente, o tribunal da 1.ª instância alinhou as seguintes considerações:

 «Vejamos os factos mais relevantes para esta operação de subsunção.

 O … circulava a uma velocidade não superior a 50 Km/h (toda a sinalização referida na matéria de facto supra respeita à circulação na EN 205 e não à circulação na EN 205-1), o que em qualquer caso respeita o limite de velocidade em vigor, à data, para circulação nas localidades, o tempo atmosférico estava chuvoso, era noite, a A. envergava roupa escura e a iluminação pública existente era fraca cfr. factos sob os n°s. 47, 46, 44, 45 e 21, respectivamente. Para além disso, a A. atravessa em local sem passadeira e sem se certificar se circulava algum veículo nas proximidades, sendo que o embate entre o … e o corpo da A. se dá a meio da faixa de rodagem e com a parte do lado esquerdo do … - cfr. factos sob os n°s. 48, 50, 9, 52 e 8, respectivamente.

É consensual que os peões, que também são utentes da via pública, devem merecer especial atenção por parte dos automobilistas no processo de condução. Mas os peões, no uso da via pública, designadamente no seu atravessamento, estão sujeitos a determinados cuidados ou regras de conduta – mormente quando usam as vias fora dos locais que lhes são especialmente destinados.

 Salvo o devido respeito por visão diferente, não descortinamos qualquer violação de regra estradal por parte da condutora do … no caso concreto. Não circulava em excesso de velocidade, não tinha sinalização, vertical ou horizontal, que lhe impusesse especiais cuidados (para além dos gerais), não executou manobra súbita ou imprevista. Estamos em crer que reveste especial importância, neste caso concreto, o chamado "princípio da confiança", segundo o qual, comportando-se um determinado utente da via de acordo com as normas de cuidado impostas na concreta situação, ou seja, "in casu", a condutora do … circulando na sua hemi-faixa de rodagem, a velocidade reduzida, e na ausência de qualquer sinalização em contrário ou de obstáculos visíveis, deve poder confiar que o mesmo sucederá com os restantes utentes da via, partindo do princípio que as outras pessoas são seres igualmente responsáveis. Com efeito, o princípio da confiança encontra o seu fundamento material no princípio da auto-responsabilidade de terceiros: se as outras pessoas são também seres responsáveis; se se comportam descuidadamente, tal só poderá afectar, antes de tudo, a sua própria responsabilidade.

Ou seja, de acordo com a matéria de facto supra, parece-nos ser de concluir que se alguém violou o falado “princípio da confiança” esse alguém terá sido a A.; com efeito, a A. atravessou uma via de trânsito (e as vias de tráfego são primacialmente destinados ao tráfego de veículos) em local que não era próprio para tal, de noite, trajando roupa escura e com tempo chuvoso, sendo que no ponto usado pela A. para tal objectivo a iluminação pública existente era fraca Por outro lado, será ainda de concluir que a A., tendo em conta a largura da via a atravessar e o ponto da mesma onde foi embatida pelo …, bem como a distância da EN 205 ao referido ponto de embate já na EN 205-1, executou a dita travessia de forma súbita e inopinada, perfeitamente distraída ao fluir do trânsito (recorde-se que a A. vinha da missa e provavelmente estaria em estado de meditação de recolhimento). Os 8,6 metros de rastos de travagem, sendo certo que contados a partir do ponto de embate, indiciam uma velocidade absolutamente moderada e, além do mais, que a condutora do … se viu subitamente confrontada com um obstáculo na via (obstáculo esse em movimento e que se apresenta da sua esquerda para a sua direita).

   Portanto, podemos dizer que a A., no caso concreto e enquanto peão, assumiu um comportamento distinto daquele que lhe era objectivamente devido, tendo em conta as exigências postas a um homem médio, pertencente à sua categoria intelectual e social e ao seu círculo de vida, colocado naquela situação concreta. Mesmo dando de barato que por ali perto não havia qualquer local destinado ao atravessamento de peões, a A., principalmente atendendo ao facto de ser noite, de trajar roupa escura, de estar tempo chuvoso, etc., estava adstrita à observância de especiais cuidados no atravessamento da via.

   Não é possível assacar, do nosso ponto de vista, à condutora do …, qualquer violação de exigências impostas pelo dever objectivo de cuidado. Não se vislumbra que ela seguisse desatenta no que respeita às condições do local ou que pudesse ou devesse ter tido outro comportamento que obstasse ou contribuísse para obstar ao embate. A A., pela sua capacidade e em face das circunstâncias concretas da situação, podia e devia ter agido de outro modo. Em conclusão: a condutora do … não agiu com culpa, ainda que, negligente, pelo que, assim sendo, não estão verificados os requisitos ou pressupostos enunciados no art.° 483.° do CCivil. Logo, falece a razão de ser para a presente acção e, consequentemente, deve a R. "CC" ser absolvida do pedido.»


E, como já se referiu, esta decisão foi tida por acertada pelo Tribunal da Relação.


Porém, a Recorrente vem impugnar a mesma com fundamento em erro de interpretação e aplicação do disposto nos artigos 503.º, 505.º e 570.º do CC, bem ainda do disposto nos artigos 13.º, n.º 1, e 103.º, n.º 3, do CE.


Vejamos, em primeira linha, a questão respeitante à alegada repartição de culpas entre os intervenientes no acidente – a A., como lesada, e a 1.ª R., na qualidade de condutora do veículo.


Ora, segundo o disposto na cláusula geral do n.º 1 do art.º 483.º, em conjugação com o disposto nos artigos 562.º a 566.º, todos do CC, a responsabilidade civil extracontratual ali estabelecida depende da verificação dos seguintes pressupostos: a ocorrência de um facto ilícito, a imputação do mesmo, a título de dolo ou mera culpa, ao agente, a existência de danos por parte do lesado e a imputação destes, em termos de causalidade adequada, ao evento lesivo.    

E, no que aqui releva em sede de culpa, o art.º 487.º do mesmo Código faz recair sobre o lesado o ónus de provar a culpa do autor da lesão, salvo havendo presunção legal da mesma, determinando que seja apreciada, na falta de outro critério legal, pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias do caso.

Por seu lado, o art.º 570.º daquele diploma, sob a epígrafe “Culpa do lesado”, prescreve que:

1 – Quando um facto culposo do lesado tiver concorrido para a produção ou agravamento dos danos, cabe ao tribunal determinar, com base na gravidade das culpas de ambas as partes e nas consequências que delas resultaram, se a indemnização deve ser concedida, reduzida ou mesmo excluída.

2 – Se a responsabilidade se basear numa simples presunção de culpa, a culpa do lesado, na falta de disposição em contrário, exclui o dever de indemnizar.

     E o art.º 572.º determina que:

       Àquele que alega a culpa do lesado incumbe a prova da sua verificação, mas o tribunal conhecerá dela, ainda que não seja alegada.


     Além deste quadro normativo, no concernente à disciplina sobre a circulação estradal, no que aqui pode relevar, o Código da Estrada (CE) aprovado pelo Dec.-Lei n.º 114/94, de 03-05, na redação dada pelo Dec.-Lei n.º 44/2005, de 23-02, estabelece o seguinte:


         Quanto ao trânsito de veículos automóveis:


Art.º 13.º

(Posição de marcha)



1 – O trânsito de veículos deve fazer-se pelo lado direito da faixa de rodagem e o mais próximo possível das bermas ou passeio, conservando destes uma distância que permita evitar acidentes.



Art.º 19.º

(Velocidade reduzida ou insuficiente)



Para efeitos deste Código e legislação complementar, considera-se que a visibilidade é reduzida ou insuficiente sempre que o condutor não possa avistar a faixa de rodagem em toda a sua largura numa extensão de, pelo menos, 50 metros.

Art.º 24.º

(Princípios gerais)



1 – O condutor deve regular a velocidade de modo que, atendendo às características e estado da via e do veículo, à carga transportada, às condições meteorológicas ou ambientais, à intensidade do transito e a quaisquer outras circunstâncias relevantes, possa, em condições de segurança, executar as manobras cuja necessidade seja de prever e, especialmente, fazer parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente.

Art.º 25.º

(Velocidade moderada)



Sem prejuízo dos limites máximos de velocidade fixados, o condutor deve moderar especialmente a velocidade:  

c) – Nas localidades ou vias marginadas por edificações;

f) – Nas curvas, cruzamentos, entroncamentos, rotundas, lombas e outros locais de visibilidade reduzida.


Art.º 60.º

(Utilização de luzes)



1 – Os dispositivos de iluminação a utilizar pelos condutores são os seguintes:

  a) – Luz de estrada (máximos), destinada a iluminar a via para a frente do veículo numa distância não inferior a 100 metros;

 b) – Luz de cruzamento (médios), destinada a iluminar a via para a frente do veículo numa distância até 30 metros.


Art.º 61.º

(Condições de utilização das luzes)



1 – Desde o anoitecer ao amanhecer e, ainda, durante o dia sempre que existam condições meteorológicas ou ambientais que tornem a visibilidade insuficiente, nomeadamente em caso de nevoeiro, chuva intensa, queda de neve, nuvens de fumo ou pó, os condutores devem utilizar as seguintes luzes:

b) – De cruzamento, em locais cuja iluminação permita ao condutor uma visibilidade não inferior a 100 metros, no cruzamento com outros veículos, pessoas ou animais, quando o veículo transite a menos de 100 metros daquele que o precede, na aproximação de passagem de nível fechada ou durante a paragem ou detenção da marcha do veículo;

c) – De estrada, nos restantes casos.


        E quanto ao trânsito de peões:


Art.º 99.º

(Lugares em que podem transitar)



1 – Os peões devem transitar pelos passeios, pistas ou passagens a eles destinados ou, na sua falta, pelas bermas.

2 – Os peões podem, no entanto, transitar pela faixa de rodagem, com prudência e por forma a não prejudicar o trânsito de veículos, nos seguintes casos:

a) – Quando efectuem o seu atravessamento;

b) – Na falta dos locais referidos no n.º 1 ou na impossibilidade de os utilizar.


Art.º 101.º

(Atravessamento da faixa de rodagem)



1 – Os peões não podem atravessar a faixa de rodagem sem previamente se certificarem de que, tendo em conta a distância que os separa dos veículos que nela transitam e a respectiva velocidade, o podem fazer sem perigo de acidente.

2 – O atravessamento da faixa de rodagem deve fazer-se o mais rapidamente possível.

3 – Os peões só podem atravessar a faixa de rodagem nas passagens especialmente sinalizadas para esse efeito ou, quando nenhuma exista, a uma distância inferior a 50 metros, perpendicularmente ao eixo da via.



Art.º 103.º

(Cuidados a observar pelos condutores)



1 – Ao aproximar-se de uma passagem de peões assinalada, o condutor, mesmo que a sinalização lhe permita avançar, deve deixar passar os peões que já tenham iniciado a travessia da faixa de rodagem.

2 – Ao aproximar-se de uma passagem para peões, junto da qual a circulação não está regulada nem por sinalização luminosa nem por agente, o condutor deve reduzir a velocidade e, se necessário, parar para deixar passar os peões que já tenham iniciado a travessia da faixa de rodagem. 

3 – Ao mudar de direcção, o condutor, mesmo não existindo passagem assinalada para a travessia de peões, deve reduzir a sua velocidade e, se necessário, parar a fim de deixar passar os peões que estejam a atravessar a faixa de rodagem da via em que vai entrar. 


No que respeita ao local em que ocorreu o acidente, da factualidade provada acima descrita extrai-se que o mesmo teve lugar na EN 205-1, logo no início da Rua João Lobarinhas, na freguesia de Vila Seca, no troço em que esta rua entronca, a norte, com a Rua da Bemposta, aí formando o Largo João Lobarinhas, por sua vez, adjacente à EN 205 que, no sentido de Póvoa de Varzim – Barcelos, no lado poente daquele Largo, faz uma curva à direita – pontos 1.1 a 1.6 da factualidade provada. Porém, na confluência da EN 205 com a EN 205-1, no sentido Barcelos - Vila Seca, tem a configuração de uma reta – pontos 1.10 e 1.11 da factualidade provada. O troço da via em que ocorreu o embate fica no enfiamento de um prédio urbano de esquina do lado sul do Largo João Lobarinhas com a Rua João Lobarinhas, e de outro prédio de esquina do lado norte desta mesma Rua com a Rua da Bemposta – pontos 1.4 a 1.6 e 1.25 da factualidade provada. 

As sinalizações verticais de limitação de velocidade ao máximo de 40 km/hora e de aproximação de passadeira para peões referidas nos pontos 1.13 a 1.19 localizam-se na EN 205, a 250 metros do entroncamento da EN 205 com a EN 205-1, destinando-se a regular o trânsito que circula da EN 205 (pontos 1.18 e 1.20 da factualidade assente), não respeitando, portanto, à via em que ocorreu o acidente.

O acidente em causa ocorreu no dia 4 de abril de 2006, cerca da 21h00, existindo no local iluminação pública fraca e estando um tempo chuvoso – pontos 1.1, 1.30 e 1.32 da factualidade provada.

 O embate ocorreu quando a A. AA circulava a pé, provindo do passeio junto ao alçado do prédio de esquina do Largo João Lobarinhas, atravessando, no sentido norte / sul, a Rua João Lobarinhas (EN 205-1), em direção à Rua da Bemposta, ainda no enfiamento com o prédio de esquina da Rua João Lobarinhas com a Rua da Bemposta, e se encontrava sensivelmente a meio da faixa de rodagem da Rua João Lobarinhas, logo após ter transposto a linha existente no eixo central desta via e logo a seguir a esta linha, muito perto de umas tampas de saneamento / águas pluviais existentes naquela faixa de rodagem – pontos 1.1 a 1.6, 1.24 a 1.26.

Foi nessa posição que a A., que então vestia roupa escura, foi colhida no seu lado direito pela frente esquerda do veículo 20-40-..., conduzido pela sua proprietária, a 1.ª R. BB, que, provindo da EN 205, no sentido Barcelos – Vila Seca/Fão, entrou na EN 205-1, em trajetória retilínea, a uma velocidade não excedente a 40 km/h – pontos 1.10, a 1.12, 1.21, 1.23 e a 1.25 da factualidade provada.

A R. BB só acionou os travões quando se apercebeu da presença da A., imobilizando o veículo a cerca de 8,6 metros para além do ponto de embate, tendo a mesma A. sido projetada pelo ar, cerca de 8 metros, indo estatelar-se no chão, junto à parede da berma esquerda da Rua João Lobarinhas, atento o sentido Vila Seca – Fão – pontos 1.22, 1.27, 1.28 e 1.31 da factualidade provada.

A A. decidira atravessar a estrada num local sem passadeira e ao chegar ali não parou, iniciando a travessia da EN 205-1 sem se certificar de que nenhum veículo circulava por qualquer das metades da faixa de rodagem em que pretendia entrar – pontos 1.7 e 1.8 da factualidade provada.         

          

Relativamente à conduta da 1.ª R., na qualidade de condutora do veículo …, constata-se que ela só acionou os travões já em cima do ponto de embate, já que o espaço de imobilização do veículo se estendeu por 8,6 metros além desse ponto, o que significa também que só então se apercebeu da presença da A. sobre o eixo da via. De resto, assim foi considerado também pelo tribunal da 1.ª instância com base nos rastos de travagem deixados no local, numa extensão de 8,6 metros a partir do ponto de embate.

Sucede que, circulando aquela R. a uma velocidade não excedente a 40 km/h e dispondo de uma visibilidade à sua frente de, pelo menos, 30 metros, que é quanto alcançam os médios, nos termos previstos nos artigos 60.º, n.º 1, alínea b), e 61.º, n.º 1, alínea b), do CE, não podia deixar de se aperceber, a tal distância, do percurso da A. desde a berma do lado esquerdo da condutora até ao eixo da via. Em tais circunstâncias, se tivesse acionado os travões sensivelmente a essa distância poderia ter reduzido em muito o impacto, senão mesmo evitado o próprio embate, tanto mais que conseguiu, depois, imobilizar o veículo numa extensão de 8,6 metros para além do ponto de embate. Nem se afigura sequer que a R. pudesse confiar em que a A. suspendesse a marcha – o que nem tão pouco vem alegado -, porquanto se prova que esta prosseguiu na travessia da estrada sem parar (ponto 1.8 da factualidade provada) e, portanto, sem dar qualquer sinal de suspensão da sua marcha.

É certo que, à hora do acidente, era noite (21h00 de 4 de abril), o local tinha fraca iluminação pública, estava um tempo chuvoso e a A. vestia roupa escura, mas, mesmo assim, os médios possibilitar-lhe-iam uma visão da estrada numa extensão de, pelo menos 30 metros, exigindo-se ainda, em especial, que a condutora do veículo ajustasse a velocidade àquelas condições de visibilidade, nos termos dos artigos 24.º, n.º 1, e 25.º, n.º 1, alínea f), do CE.

Acresce que, nessas condições, considerando a existência de um entroncamento e que a via era marginada por edificações, de um lado e outro, impunha-se à condutora do veículo que, embora sem exceder o limite legal máximo permitido no local, moderasse especialmente a velocidade, de modo a poder parar no espaço livre e visível à sua frente, nos termos conjugados dos já citados artigos 24.º, n.º 1, e 25.º, n.º 1, alíneas c) e f), do CE. 

  Afora isso, do factualismo provado não decorre que a condutora do veículo tenha infringido as prescrições dos artigos 13.º, n.º 1, e 103.º, n.º 3, do CE, convocadas pela Recorrente, respetivamente, por se desconhecer, com precisão, a posição em que o veículo circulava na hemi-faixa a ele destinada nem se estar no quadro de uma manobra de mudança de direção.  

Por outro lado, apesar de não se afigurar que tivesse vedada à A. a travessia da faixa de rodagem, por não se provar a existência de passadeira para peões a menos de 50 metros, nos termos previstos nos artigos 99.º, n.º 2, alínea a), e 101.º, n.º 3, parte final, a contrario sensu, do CE, a mesma contribuiu também, de forma negligente, para a produção do acidente, ao ter empreendido tal travessia sem se certificar de que nenhum veículo circulava pela faixa de rodagem em que pretendia entrar, violando, desse modo, o preceituado no n.º 1 do art.º 101.º daquele Código. 

Embora, em termos de consciência da ilicitude, seja de ponderar uma maior exigência para o condutor legalmente habilitado e, portanto, com melhor assimilação da prescrições estradais do que para um peão leigo em direito estradal, no caso presente, a A. infringiu uma prescrição legal que também constitui uma regra elementar da experiência comum, como é a de não atravessar uma estrada, para mais de noite, sem se assegurar da eventual aproximação de veículos que por ela circulem.  

Nessa conformidade, sendo de exigir à A. um padrão de comportamento pautado pela prescrição do n.º 1 do art.º 101.º do CE em linha com a regra da experiência comum que lhe é correspondente, à condutora é, por sua vez, exigível um nível de cumprimento das prescrições dos artigos 24.º, n.º 1, e 25.º, n.º 1, alíneas c) e f), do mesmo diploma, em consonância com a sua habilitação legal para a condução automóvel.

Em suma, conclui-se pelo concorrência de culpas para a produção do acidente entre a A. e a 1.ª R. e, sopesando a gravidade dessas culpas, bem como as consequências delas resultantes, nos termos do n.º 1 do art.º 570.º do CC, fixa-se a sua proporção em 30% para a condutora, a 1.ª R., e 70% para a A.

Termos em que procedem, em parte, as razões da Recorrente com o que fica prejudicada a questão subsidiária sobre a eventualidade de concurso entre a culpa da A. e o risco próprio do veículo.

             

 2.3. Determinação dos montantes indemnizatórios


Determinada que ficou a responsabilidade pela produção do acidente, atribuída, em partes iguais, à A. e à 1.ª R. resta agora fixar os montantes indemnizatórios devidos.

Nas suas alegações de recurso, a A. invoca um prejuízo material de € 446,40, relativamente à perda dos óculos e do relógio, de € 15.000,00, a título de dano biológico, e de € 20.000,00, a título de danos não patrimoniais pelo sofrimento com os tratamentos e sequelas derivados das lesões provocadas em virtude do acidente, cujo total ascendendo a € 35.446,40, ficaria reduzido, em 50%, à quantia de € 17.723,20, acrescida de juros de mora desde a citação.   


Vejamos cada uma dessas espécies de danos.


a) – Danos patrimoniais pela perda dos objetos


Quanto ao prejuízo relativo à perda dos óculos e do relógio, dos factos colhe-se que:

(i) - Em consequência do embate e do facto de ter sido projetada, indo estatelar-se no chão, a A. ficou com os óculos, que então usava, totalmente destruídos, sendo a sua substituição orçada em € 246,40 – resposta ao art.º 46.º da base instrutória correspondente ao ponto 1.50

(ii) - O relógio que a A. usava ficou totalmente destruído, ascendendo o seu valor a € 200,00 – resposta ao art.º 26.º da base instrutória correspondente ao ponto 1.52.

Assim, o valor total da perda de tais objetos perfaz o montante de € 446,40.


b) – Quanto ao dano biológico


No âmbito da responsabilidade civil extracontratual emergente de acidente de viação, no leque dos danos patrimoniais, destacam-se, no que aqui releva, os resultantes das sequelas sofridas que impliquem perda de capacidade de ganho.

Com efeito, a lesão corporal sofrida em consequência de um acidente de viação constitui em si um dano real ou dano-evento, designado por dano biológico, na medida em que afeta a integridade físico-psíquica do lesado, traduzindo-se em ofensa do seu bem saúde. Trata-se de um “dano primário”, do qual, podem derivar, além de incidências negativas não suscetíveis de avaliação pecuniária, a perda ou diminuição da capacidade do lesado para o exercício de atividades económicas, como tal suscetíveis de avaliação pecuniária[1]

Ora, como é sabido, os nossos tribunais, com particular destaque para a jurisprudência do STJ, têm vindo a reconhecer o dano biológico como dano patrimonial, na vertente de lucros cessantes, na medida em que respeita a incapacidade funcional, ainda que esta não impeça o lesado de trabalhar e que dela não resulte perda de vencimento, uma vez que a força de trabalho humano sempre é fonte de rendimentos, sendo que tal incapacidade obriga a um maior esforço para manter o nível de rendimento anteriormente produzido. E que, em sede de rendimentos frustrados, a indemnização deverá ser arbitrada equitativamente, de modo a corresponder a um capital produtor do rendimento que o lesado deixou de poder produzir, atenta a sua expectativa média de vida[2].    

Portanto, mesmo nos casos em que o lesado não exerça uma atividade profissional remunerada, em sede de dano biológico, deverá atender-se à atividade que ele desempenhava ou podia desempenhar com tarefas de índole económica propiciadoras de rendimento, no quadro do seu modo de vida, e que fique afetada em virtude das sequelas derivadas das lesões sofridas. 


No que aqui releva, dos factos provados extrai-se que:

(i) - As sequelas provocam à A. uma IPP de 10% – resposta restritiva ao art.º 26.º da base instrutória correspondente ao ponto 1.36:     

(ii) - A A. nasceu em 18 de julho de 1933 – aliena A) e única da base instrutória correspondente ao ponto 1.38;   

(iii) - A A. era doméstica – resposta ao art.º 29.º da base instrutória correspondente ao ponto 1.39;   

(iv) - O agregado familiar da A. era composto pelo marido, filho, nora, dois netos e cunhada – resposta ao art.º 30.º da base instrutória correspondente ao ponto 1.40;

(v) - Era a A. quem preparava as refeições do dia para os membros do seu agregado familiar – resposta ao art.º 31.º da base instrutória correspondente ao ponto 1.41;   

(vi) - Era a A. quem tratava das roupas, lavando-as e passando-as a ferro – resposta ao art.º 32.º da base instrutória correspondente ao ponto 1.42;   

(vii) - Era a A. quem cuidava dos netos, então com 4 e 1 anos – resposta ao art.º 33.º da base instrutória correspondente ao ponto 1.43;

(viii) - Era a A. quem cuidava e alimentava os animais domésticos - galinhas, porcos, coelhos, pássaros, cães e gatos – resposta ao art.º 34.º da base instrutória correspondente ao ponto 1.44;   

(ix) - Era a A. quem cuidava do jardim e que agricultava o quintal, assegurando o amanho da terra – resposta ao art.º 35.º da base instrutória correspondente ao ponto 1.45.

No caso presente, a A. não exercia uma atividade profissional remunerada, mas ainda assim, com quase 73 anos de idade, à data do acidente, ocupava-se das lides domésticas do seu agregado familiar, ficando afetada nesta atividade com uma incapacidade de 10% resultante das sequelas sofridas.  

Assim, tendo em conta o desempenho económico da A. no seu agregado familiar, conforme o acima descrito, o grau de incapacidade permanente de 10%, uma expectativa de vida média até aos 80 anos e um fator de capitalização da ordem dos 3% a 4%, tem-se por ajustada uma indemnização de base no valor de € 15.000,00, atentos os padrões atuais.


c) – Quanto aos danos não patrimoniais


Segundo o artigo 496º, nº 1, do CC prescreve que “na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.”

Por sua vez, o n.º 3 do mesmo normativo determina que o montante de indemnização seja fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso, nos termos estatuídos no art.º 494.° do referido Código. Como ensina o Sr. Prof. Antunes Varela, e como vem sendo seguido pela jurisprudência dos nossos tribunais, o juízo de equidade requer do julgador que tome «em conta todas as regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida», sem esquecer que sobredita “indemnização” tem natureza mista, já que visa não só reparar, de algum modo, o dano, mas também reprovar a conduta lesiva[3].

Com efeito, ante a imaterialidade dos interesses em jogo, a indemnização dos danos não patrimoniais não pode ter por escopo a sua reparação económica. Visa sim, por um lado, compensar o lesado pelo dano sofrido, em termos de lhes proporcionar uma quantia pecuniária que permita satisfazer interesses que apaguem ou atenuem o sofrimento causado pela lesão; e, por outro lado, punir a conduta do agente.

Nessa perspetiva, tal indemnização não deverá confinar-se a uma dimensão puramente simbólica, mas assumir uma expressão significativa com relevo no quadro de vida do lesado e com repercussão sancionatória para o lesante, importando ainda considerar o alargamento dos limites de cobertura do seguro obrigatório a que se tem assistido.

Todavia, no critério a adotar, não se devem perder de vista os padrões indemnizatórios decorrentes da prática jurisprudencial, procurando - até por uma questão de justiça relativa - uma aplicação tendencialmente uniformizadora ainda que evolutiva do direito, como aliás impõe o n.º 3 do artigo 8.º do CC, por forma a evitar exacerbações subjetivas.


Nesta sede, provou-se que:

(i) - Em virtude do embate, a A. sofreu lesões que determinaram a sua imediata evacuação para o Hospital de Viana do Castelo – resposta ao art.º 23.º da base instrutória correspondente a ponto 1.33;  

(ii) - Foram detetadas à A. fratura dos ossos da perna direita, fratura do olecrâneo direito e traumatismo do hemitorax esquerdo, com fratura de 8 costelas – resposta restritiva ao art.º 24.º da base instrutória correspondente a ponto 1.34;  

(iii) - As lesões, após completado o período de tratamento, deixaram como sequelas fratura da tíbia consolidada com ligeiro desvio axial, fratura do olecrâneo com rigidez do cotovelo (5.º de extensão) e ligeiro edema do membro inferior por insuficiência venosa, pós-traumática – resposta ao art.º 25.º da base instrutória correspondente a ponto 1.35;   

(iv) - A A. terá de ser submetida a intervenção cirúrgica para extração de materiais de osteossintese – resposta ao art.º 28.º da base instrutória correspondente a ponto 1.37;

(v) – Por via do embate e das lesões sofridas, a A. esteve, após o tratamento hospitalar, primeiro, no Centro Hospitalar do Alto Minho, em Viana do Castelo, depois, no Hospital de S. João, no Porto, e finalmente no Hospital de Santa Maria Maior, em Barcelos – resposta ao art.º 36.º da base instrutória correspondente a ponto 1.46;  

(vi) - A A. esteve imobilizada em casa, retida na cama, durante 3 meses – resposta ao art.º 37.º da base instrutória correspondente a ponto 1.47

(vii) De inícios de julho de 2006 até finais de janeiro de 2007, a A. esteve obrigada a utilizar uma cadeira de rodas sempre que precisava de se locomover, cadeira essa que tinha de ser empurrada por outra pessoa, já que a A., limitada pelas lesões sofridas, não conseguia accioná-la autonomamente – resposta ao art.º 38.º da base instrutória correspondente a ponto 1.48;  

(viii) - Durante cerca de 6 meses a A. necessitou do auxílio de canadianas para se locomover – resposta restritiva ao art.º 39.º da base instrutória correspondente a ponto 1.49;  

(ix) - O embate provocou à A., naquele momento, dores em consequência das fraturas múltiplas e dos tratamentos sofridos – resposta ao art.º 50.º da base instrutória correspondente a ponto 1.53;  

(x) - A A. sofreu dores e padecimentos com os curativos e tratamentos feitos – resposta ao art.º 53.º da base instrutória correspondente a ponto 1.54.  


Tendo em conta, pois, a espécie das lesões sofridas, o quadro de intervenções cirúrgicas e de tratamentos a que a A. foi sujeita, as sequelas por que passou e o facto de, à data do acidente, manter uma vida ativa, nas lides domésticas do seu agregado familiar, e considerando, em particular, os sofrimentos que, segundo as regras da experiência comum, aquelas sequelas são suscetíveis de produzir numa pessoa de idade já avançada, como a A. com quase 73 anos à data do acidente, tem-se por adequada uma compensação na ordem de € 30.000,00, atentos os padrões de vida atuais.


d) – Do apuramento final da indemnização


Em face dos valores parcelarmente apurados, operando agora a redução de 30%, correspondente à quota de responsabilidade atribuída à 1.ª R., fixam-se os montantes indemnizatórios devidos à A. em;

a) - € 133,92 (€ 446,40 x 30%), a título de danos patrimoniais pela perda de objetos;   

b) - € 4.500,00 (€ 15.000,00 x 30%), a título de dano patrimonial pelo dano biológico;

c) - € 9.000,00 (€ 30.000,00 x 30%), a título de compensação pelo dano não patrimonial.

         Tais valores perfazem a soma de € 13.633,92.  


e) - Quanto aos juros de mora


A Recorrente pede juros de mora a contar da citação.

Ora, o n.º 3 do artigo 805.º do CC, na redação dada pelo Dec.-Lei n.º 262/83, de 16/6, estabelece que “se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto se não tornar líquido, salvo se a falta de liquidez for imputável ao devedor; tratando-se, porém, de responsabilidade por facto ilícito ou pelo risco, o devedor constitui-se em mora desde a citação, a menos que haja então mora, nos termos da primeira parte deste número”.

Porém, segundo a doutrina firmada no Assento do Supremo Tribunal de Justiça n.º 4/2002, de 9-5-2002, hoje com valor de acórdão uniformizador, “sempre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo actualizado, nos termos do nº 2 do artigo 566.º do CC, vence juros de mora, por efeito do disposto nos artigos 805.º, n.º 3 (interpretado restritivamente), e 806.º, n.º 1, também do Código Civil, a partir da decisão actualizadora e não a partir da citação.”  

Sucede que os valores considerados a título de dano biológico e de dano não patrimonial tiveram em conta os padrões de vida à presente data, pelo que se têm já por atualizados a esta data.

Assim, só os danos patrimoniais pela perda dos objetos serão passíveis de juros de mora desde a citação, à taxa anual de 4%, nos termos do artigo 559.º, n.º 1, do CC, e da Portaria n.º 291/2003, 08-04. Os restantes só vencerão juros, à mesma taxa, desde a presente data.


2.4. Conclusão final


Não vindo questionadas no âmbito da presente revista, as decisões das instâncias sobre a responsabilidade da Interveniente Lusitânia, na qualidade de seguradora em relação ao veículo … e a absolvição do pedido dos primitivos R.R., pelo facto de existir seguro válido e eficaz, tem-se aquela interveniente por responsável pela indemnização em referência.     

          

IV - Decisão


Por todo o exposto, acorda-se em conceder, em parte, a revista e decide-se revogar o acórdão recorrido e, em sua substituição, julgar ação, na parte aqui em apreço, parcialmente procedente e, por consequência:

a) - Condena-se a Interveniente CC – Companhia de Seguros, S.A., a pagar à A. a indemnização global no valor de € 13.633,92 (treze mil seiscentos e trinta e três euros e noventa e dois cêntimos), acrescido dos juros de mora, à taxa anual de 4%, sobre a parcela de € 133,92, desde a citação, e sobre as demais parcelas desde a presente data;

b) – Absolve-se a Interveniente da parte restante do pedido inicialmente formulado pela A.

As custas da ação ficam a cargo da Interveniente na proporção do seu decaimento sobre ½ do total das custas devidas, ficando, na parte sobrante, a cargo da A., sem prejuízo da dispensa do seu pagamento em virtude do apoio judiciário de que beneficia.

As custas do recurso ficam a cargo da A./Recorrente e da Interveniente, na proporção do seu decaimento no mesmo, também com dispensa, por parte da A., do seu pagamento em virtude do apoio judiciário.

Lisboa, 3 de dezembro de 2015

Manuel Tomé Soares Gomes (Relator)

Carlos Alberto Andrade Bettencourt de Faria 

João Luís Marques Bernardo

 
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[1] Vide, a este propósito, as considerações do ac. do STJ, de 21-03-2013, relatado pelo Exm.º Juiz Conselheiro Salazar Casanova, no processo n.º 565/10.9TBVL.S1, acessível na Internet - http://www. dgsi.pt/jstj.
[2] Entre muitos outros, vide, a título de exemplo, o ac. do STJ, de 7-6-2011, relatado pelo Exm.º Juiz Cons. Granja da Fonseca, no âmbito do processo 160/2002.P1.S1, publicado na Internet, http://www.dgsi.pt/jstj.
[3] Vide Prof. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. 1.º, 10.ª Edição, Almedina, pag. 605, nota 4.