Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
267/14.7TTVIS.C1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: FERREIRA PINTO
Descritores: CONTROLO JUDICIAL
CATEGORIA PROFISSIONAL
CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO
Data do Acordão: 10/12/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – PROCESSO EM GERAL / ATOS PROCESSUAIS / ATOS DOS MAGISTRADOS – PROCESSO DE DECLARAÇÃO / SENTENÇA / RECURSOS / RECURSO DE REVISTA.
DIREITO DO TRABALHO – FONTES E APLICAÇÃO DO DIREITO DO TRABALHO – CONTRATO DE TRABALHO / FORMAÇÃO DO CONTRATO / ACTIVIDADE DO TRABALHADOR / DIREITOS, DEVERES E GARANTIAS DAS PARTES / CLÁUSULAS ACESSÓRIAS / CESSÃO DE CONTRATO DE TRABALHO / DESPEDIMENTO COLECTIVO.
Doutrina:
-Bernardo da Gama Lobo Xavier, Manual de Direito do Trabalho, 2.ª Edição revista e atualizada, Verbo, 2014, 491;
-José Lebre de Freitas, Código de Processo Civil, Anotado, Almedina, Volume II, 2017, 735 e736;
-Maria do Rosário Palma Ramalho, Tratado de Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais, 6.ª Edição, 2016, Almedina, 302 e ss.;
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 154.º, 607.º, N.ºS 3 E 4, 615.º, N.º 1, ALÍNEAS B) E C), 666.º, N.º 1 E 679.º.
CÓDIGO DO TRABALHO (CT): - ARTIGOS 5.º, 106.º, N.º 3, ALÍNEA C), 115.º, N.ºS 1 E 2, 116.º, 117.º, 118.º, N.ºS 1, 2 E 3, 119.º, N.º 1, ALÍNEA E), 120.º,N.º 5, 129.º, N.º 1, ALÍNEA E), 164.º, N.º 1, ALÍNEA A), 175.º, N.ºS 1 E 2 E 366.º.
CÓDIGO DE PROCESSO DO TRABALHO (CPT): - ARTIGO 77.º, N.º 1.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGO 205.º.
BOLETIM DO TRABALHO E EMPREGO, N.º 2, 1.ª SÉRIE, DE 15/01/2005, 151-174, COM ALTERAÇÃO PUBLICADA NO BTE, N.º 48, 1.ª SÉRIE, DE 29 DE DEZEMBRO DE 2007.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

- DE 15-12-2011, PROCESSO N.º 2/08.9TTLMG.P1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 09-10-2013, PROCESSO N.º 961/09.4TTVNG.P1.S1, IN WWW.DGSI,PT;
- DE 27-03-2014, PROCESSO N.º 184/11.2TTVVLG.P1.S1, IN WWW.DGSI,PT;
- DE 25-11-2014, PROCESSO N.º 4248/06.6TTLSB.L1.S1.
Sumário :
I. O controlo jurisdicional sobre a atividade do trabalhador tem como finalidade averiguar se existe discrepância entre a função por ele efetivamente exercida e a categoria normativa que lhe foi atribuída, ou que consta no seu contrato individual de trabalho, devendo prevalecer a função substancial sobre a função nominal.

II. Exercendo um trabalhador, desde o início do contrato de trabalho até à sua cessação, funções efetivas e diversas das que integram a categoria normativa ou categoria-estatuto constante do seu contrato de trabalho [empregado comercial ajudante], celebrado através de documento escrito, impõe-se reclassificá-lo, devendo ser-lhe atribuída a categoria que, entre as definidas na Convenção Coletiva de Trabalho aplicável, corresponda ou mais se aproxime das funções, real e efetivamente, sempre desempenhadas [empregado comercial grau I].
Decisão Texto Integral:
Processo n.º 267/14.7TTVIS.C1.S1 (Revista) – 4ª Secção[1][2]

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

I

            a. Relatório:

           

           AA e BB, instauraram, em 02 de maio de 2014, na Comarca de Viseu, Viseu, Instância Central - 1ª Secção do Trabalho, J2, a presente ação declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contra “CC Lda.”, pedindo que seja declarado que têm direito, desde a data da sua admissão ao serviço da Ré, à categoria de ..., ou, subsidiariamente, à categoria de técnico de vendas do grau II até 30.11.2011 e técnico de grau I a partir de então, ou subsidiariamente à categoria de delegado de informação, ou, subsidiariamente, a serem integrados nos termos da cláusula 8.ª do CCT aplicável, em categoria nunca inferior ao seu enquadramento no grupo V da tabela de retribuições do C.C.T.

           Consequentemente, pediram a condenação da ré a pagar-lhes diferenças salariais, trabalho suplementar, retribuição da cláusula 24ª, n.º 1, do CCT, e diferenças do subsídio de almoço por deslocação, nos montantes que discriminam, consoante a categoria em que venham a ser classificados.     

Alegaram, em síntese, que, não obstante terem sido contratados para exercerem as funções de Oficial-Ajudante do 1.º ano, na realidade sempre desempenharam tarefas correspondentes, pelo menos, às categorias de delegado de informação, técnico de vendas e ..., com maior relevância para esta última, daí justificar-se a pretensão de reclassificação peticionada, com direito às reclamadas diferenças salariais.

Invocaram, ainda, que sempre praticaram, sob as ordens e determinação expressas da ré e no interesse desta, trabalho suplementar que não lhes foi pago enquanto tal.

Consideram-se também titulares, nos termos da cláusula 24.ª, n.º 1, do CCT[3], do direito a 25% das duas mil horas de trabalho suplementar prestadas. Finalmente, alegaram encontrar--se parcialmente em dívida o valor que lhes é devido, nos termos da cláusula 30.ª, n.º 4, do CCT, pelo subsídio de almoço.

Realizada a audiência de partes, frustrou-se a conciliação.

A Ré contestou, impugnando o direito dos autores à pretendida reclassificação profissional.

Admitiu que ao longo da vigência da relação laboral, nem sempre procedeu às devidas atualizações salariais dos demandantes, porém, tais diferenças salariais foram tidas em conta aquando da cessação do contrato, nada sendo devido a tal título e referiu que, ao contrário do alegado pelos demandantes, nunca foi prestado qualquer trabalho suplementar, acrescentando que os autores só cumpriam 32,5 horas de trabalho semanal, ficando aquém do horário semanal contratado que era de 35 horas.

Negou, deste modo, a existência de qualquer valor em dívida, a título de subsídio de alimentação.

Os autores ofereceram resposta à contestação, afirmando ser falso que a ré lhes tenha pago todos os créditos laborais em dívida.

Foi apresentado articulado superveniente, justificado pelo posterior despedimento dos Autores por extinção do posto de trabalho.

Em função das quantias pagas pela Ré com a cessação do contrato de trabalho e tendo em consideração a pretensão de reclassificação profissional anteriormente deduzida, consideram os demandantes que a Ré devia ser condenada a pagar ao Autor AA a quantia de € 4.940,67, ou € 4.292,79 ou € 4.254,04 e à Autora DD, o montante de € 5.387,57 ou € 4.739,69 ou € 4.701,11, consoante fossem, respetivamente classificados como técnicos optometristas ou técnicos de vendas, ou delegados de informação ou, neste último caso, com uma categoria do mesmo grupo, acrescido dos juros à taxa legal desde a data do despedimento até integral pagamento.

A Ré veio pronunciar-se pela inadmissibilidade do articulado superveniente, alegando, à cautela, que nada mais é devido aos autores, a título de créditos laborais.

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Por despacho de fls. 103 e 104 (referência n.º 72325436), não se admitiu o articulado superveniente.
Foi fixado à ação, o valor de € 79.930,99.

Dispensou-se a identificação do litígio, bem como a enunciação dos temas de prova.

           Posteriormente,  foi ordenada a apensação aos presentes autos da ação n.º 957/15.7T8VIS, intentada pelos mesmos Autores contra a Ré, no âmbito da qual pediam as diferenças salariais devidas pela cessação do contrato de trabalho, verificada em 05/07/2014, decorrentes das categorias profissionais em que viessem a ser classificados e, ainda, a diferença entre o valor da compensação que lhes foi comunicado através das cartas que receberam a informar a cessação do contrato e a quantia efetivamente recebida a tal título, bem como o valor devido pela formação não ministrada, tudo num total de € 10.328,24.

           Após a realização da audiência de julgamento, foi proferida sentença, em 01 de fevereiro de 2016, que julgou a presente ação parcialmente provada e, nessa parte, procedente, e, em consequência, condenou a Ré, “CC Lda.” a pagar aos Autores, AA e DD, do que venha a apurar-se em liquidação relativamente a trabalho suplementar prestado, incluindo descanso compensatório, prestação a que acrescerão juros, à taxa legal, desde a instauração da ação e até integral pagamento”.

II

           

           Inconformados com esta decisão, os Autores interpuseram recurso de apelação, nomeadamente impugnando a decisão proferida sobre a matéria de facto.

            Por acórdão de 13 de julho de 2016, proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, foi julgada, parcialmente, procedente a impugnação da decisão sobre a matéria de facto e, em consequência, foi alterada nos seguintes pontos:

a) - Ordenou-se a eliminação do artigo 49º, por ter havido erro de julgamento.

b) - Mandou-se aditar aos factos assentes mais os seguintes:
50. “Para o que lhes forneceu um veículo correspondente a uma unidade Móvel de Rastreio, que podia ser conduzida alternadamente por cada um dos AA., a qual passou a estar dotada há cerca de três anos de um sistema GPS que registava entre outros elementos as horas de saída e de chegada aos locais e o número de quilómetros percorridos, em ordem a permitir à Ré o controlo da atividade dos AA.”.
51. “Esse sistema de GPS foi implantado na Unidade Móvel por uma empresa externa, que guardava os dados, podendo a Ré aceder-lhes através de uma “password”.
52. “A Ré nunca informou os AA. sobre os dados assim recolhidos e da possibilidade de estes reclamarem e ou discordarem dos mesmos.”
53. “À data do início do contrato dos AA. o Grupo EE tinha uma rede de 25 lojas e hoje tem 33 lojas”.
54. “Os autores enquanto ao serviço da ré nunca deram faltas injustificadas”;
55. “Por cartas datadas de 27 de fevereiro de 2014, dirigidas aos autores, a ré comunicou-lhes que os respetivos contratos de trabalho cessariam decorridos 60 dias sobre a assinatura do aviso de receção das cartas, por extinção dos postos de trabalho, o que sucedeu no dia 05.05.2014”;
56. Na carta dirigida ao autor AA, escreveu-se:
«Informa-se ainda Vª Ex.ª que, sem prejuízo dos créditos emergentes da sua prestação do trabalho, vencidos até à data da cessação do respetivo contrato, bem como os demais complementos que por Direito lhe couberem, será colocado nos escritórios da empresa à sua disposição, o montante de € 5.862,91 (cinco mil oitocentos e sessenta e dois euros e noventa e um cêntimos), até ao termo do prazo do aviso prévio, a ser satisfeito por meio de cheque endossado a V.ª Ex.ª, relativos à compensação que lhe é devida nos termos do disposto no art.º 366.º do Código do Trabalho.»
57. Na carta dirigida à autora DD, escreveu-se:
“Informa-se ainda Vª Ex.ª que, sem prejuízo dos créditos emergentes da sua prestação do trabalho, vencidos até à data da cessação do respetivo contrato, bem como os demais complementos que por Direito lhe couberem, será colocado nos escritórios da empresa à sua disposição, o montante de € 6.327,29 (seis mil trezentos e vinte e sete euros e vinte e nove cêntimos), até ao termo do prazo do aviso prévio, a ser satisfeito por meio de cheque endossado a V.ª Ex.ª, relativos à compensação que lhe é devida nos termos do disposto no artigo 366º, do Código do Trabalho.»

           

            O Tribunal da Relação de Coimbra julgou, também, parcialmente procedente o recurso e atribuiu aos autores a categoria profissional de Empregado Comercial de grau I desde o início do vínculo – de 02.12.2008 até 02.12.2011 - e de grau II desde 03.12.2011 e até à cessação dos contratos de trabalho,

           Consequentemente, condenou a ré a pagar a cada um dos autores os montantes que discrimina a título de remunerações salariais desde 02.12.2011 até à cessação do contrato por se considerar terem sido apenas estas as que foram pedidas, não sendo de aplicar o artigo 74.º, do CPT, dado que não se estava perante direitos indisponíveis, uma vez que a ação tinha sido instaurada depois da cessação dos contratos; subsídio de almoço por deslocação em serviço; compensação pela cessação do contrato de trabalho e formação não ministrada; tudo acrescido de juros moratórios sobre as quantias em dívida, calculados à taxa legal, desde a propositura da ação e até integral pagamento.
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III

           

           Inconformada, a Ré “CC, Lda.” recorreu agora de revista pedindo seja declarado nulo o acórdão recorrido, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alíneas b) e c), do CPC,, e mantida a sentença da 1.ª instância, insurgindo-se relativamente à atribuição aos autores da categoria profissional de empregado comercial (alega a este propósito que antes de passar a empregado comercial deve ser-se empregado comercial ajudante durante dois anos, conforme cláusula 11.ª da CCT e que as partes acordaram por escrito nas categorias que lhes foram atribuídas) e relativamente às quantias em que foi condenada (com exceção das referentes a formação profissional, tendo, nesta parte, o acórdão transitado em julgado).

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            Recurso de revista:

A Ré concluiu a sua alegação da seguinte forma:


1) O presente recurso vem apresentado de douto acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra que decidiu revogar parcialmente a decisão proferida em 1ª Instância.
2) Refere expressamente a douta sentença proferida em 1ª Instância "Tudo devidamente ponderado, afigura-se-me que assiste razão à ré: eles são e desempenharam tarefas de oficial ajudante e de caixeira, candidatos a empregado comercial (.... ) Eles foram corretamente classificados, e a sua passagem à categoria de empregado comercial foi retroativamente assegurada, como demonstra a ré. Não há, portanto, a esse título, diferenças salariais a considerar."
3) Contudo, o douto acórdão proferido apresenta a breve explicação de que aos AA. deveria ser atribuída a categoria profissional de Empregado Comercial de Grau I desde o início do vínculo - 02.12.2008 - até 02.12.2011 e a categoria profissional de Empregado Comercial de Grau II desde 03.12.2011 até à cessação.
4) A verdade é que antes de ser empregado comercial, deve-se ser empregado comercial ajudante durante dois anos conforme refere a convenção.
5) Não se podendo deixar de realçar que ambos os trabalhadores, ora recorridos, foram contratados para a categoria de Ajudante, resultante expressamente do contrato Oficial-Ajudante de 1º ano, relativamente a um dos AA. e Caixeira Ajudante de 1º ano, relativamente ao outro.
6) Tais categorias resultam expressamente de documento escrito que não só não foi impugnado pelas partes, como foi junto pelos próprios trabalhadores, sendo que compete às partes determinar, por acordo, a atividade para que o trabalhador é contratado, podendo a sua determinação ser feita no próprio contrato através da enunciação das funções que lhe caberão, ou por remissão para uma categoria normativa cujo conteúdo funcional venha definido num instrumento de regulamentação coletiva ou no regulamento da empresa, conforme permite o nº 2 do mencionado preceito.
7) O certo é que, o douto Acórdão recorrido alterou a classificação da categoria profissional efetuada, sem ter apresentado a respetiva fundamentação, contrariando as normas legais e a CCT.
8) Por outro lado, o douto acórdão recorrido afirma: "Pelo exposto, tendo o Autor AA recebido desde 02.12.2011 até ao final do contrato de trabalho a remuneração mensal de € 558,25 e a autora DD recebido a retribuição mensal de € 550,00 (cf. ponto factual provado n.º 32), os mesmos tinham direito às seguintes diferenças salariais desde 02.12.2011 até à cessação do contrato de trabalho, que incluem as diuturnidades reclamadas: Autor AA: - a quantia de € 6.354,92 [(€ 166,48 x 14 meses) + (€ 201,21 x 20 meses)]; Autora DD: - a quantia de € 6.635,42 [(€ 174,73 x 14 meses) + (€ 209,46 x 20 meses)]. Pelos proporcionais de férias, subsídios de férias e de Natal relativos ao tempo de trabalho prestado no ano da cessação do contrato tinham direito a receber: Autor AA: - a quantia de € 759,46 [4/12 avos de € 759,46 por 3]; Autora DD: - a quantia de € 759,46”.
9) Ora, desde logo, a parte inicial do excerto anteriormente transcrito encontra-se em nítida contradição com o facto provado n.º 31 - devido certamente a um mero lapso - que dispõe: "Tendo-lhe pago as seguintes retribuições mensais: 1º A. - 550,00 euros, acrescido de € 110,50 euros a título de subsídio de alimentação até 30.04.2010 - 558,25 euros, até à presente data, acrescido de cerca [sic] de 117,74 euros de subsídio de alimentação, desde 01.05.2010 até 31.05.2013; 2 A. - 500,00 euros, acrescido de € 55,00 euros a título de subsídio de alimentação até 30-04-2010 - 507,50 euros a partir de 01.05.2010 e 55,83 euros a título de subsídio de alimentação até 31.12.2010.- 550,00 euros, até à presente data, acrescido de 110,50 euros de subsídio de alimentação a partir de 01-01- 2011 até 31-05-2013."
10) Ou seja, AA recebe a remuneração de € 558,25, de acordo com os factos provados, desde 30.04.2010, e não desde 02.12.2011, conforme refere aquele excerto transcrito.
11) Também, DD recebe a remuneração de € 550,00, de acordo com os factos provados, desde 31.12.2010, e não desde 02.12.2011, contrariamente ao referido no excerto transcrito.
12) Pelo que, certamente que estes lapsos se expressam nos cálculos efetuados pelo douto acórdão em prejuízo da recorrente, cálculos estes que, por sinal são impercetíveis, salvo o devido respeito.
13) Ainda, as diuturnidades não vêm fundamentadas no douto acórdão, nem de direito, nem de facto; nem tampouco as mesmas são legais já que não são esgotados os diversos graus existentes relativamente à categoria profissional de empregado comercial.
14) Por outro lado, não se concebe em que é que o douto acórdão baseia os valores de € 166,48, € 201,21, € 174,73 e € 209,46 para alcançar as diferenças salariais.
15) Desconhece-se se foi tido em conta o horário das 35 horas semanais que resultava do contrato dos AA. ora recorridos e do facto provado n.º 7.
16) Também, não se consegue balizar a contagem de tais valores no tempo, desconhecendo-se concretamente a que meses do calendário gregoriano se referem as menções de 14 e 20 meses.
17) Os factos n.ºs 31 e 37 resultam dos factos provados, separadamente e em complementaridade.
18) Ou seja, além do valor médio de € 8,00 diários pagos, a título de subsídio de alimentação, a recorrida, ora recorrente, ainda pagou, a esse mesmo título, ao 1° A. a quantia de € 110,50 até 30.04.2010, e € 117,74, de 01.05.2010 até 31.05.2013, e à 2ª A. € 55,00 até 30.04.2010, após o que passou a pagar € 55,83 até 31.12.2010 e € 110,50 a partir de 01.01.2011 até 31.05.2013 - valores estes que resultam dos recibos e que não foram tidos em conta certamente pelo douto Tribunal, já que na fundamentação nenhuma referência a estes valores contantes dos recibos e do facto provado n.º 31 é feita.
19) De qualquer modo, sempre se diga relativamente a este ponto: que a recorrente desconhece como é que o Tribunal a quo chegou à quantia de € 5.500,00 a ser paga a cada um deles, desconhecendo-se qual o período temporal contemplado em tal cálculo, e qual o valor considerado no mesmo (...).
20) Tanto mais que não se tendo provado o valor exato do montante que foi pago à exceção do que consta do recibo, não se concebe como é que se alcança tal valor.
21) A quantia média de € 8,00, refere-se a refeições que foram pagas mediante a apresentação da fatura, assim para a prova do valor realmente em dívida, os recorridos só tinham de apresentar tais faturas,
22) O que não aconteceu.
23) A indemnização no montante de € 2.852,48 concedida a cada um dos recorridos foi calculada de acordo com o disposto no art.º 366° do CT que estabelece: "Em caso de despedimento coletivo, o trabalhador tem direito a compensação correspondente a 12 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade'', e tendo em atenção o disposto no art.º 5º da Lei n.º 69/2013 que estatui o "Regime transitório em caso de cessação de contrato de trabalho sem termo", respeitando, assim, todos os trâmites legais.
24) Realça-se que, os valores comunicados na carta referiam-se aos créditos laborais que se tinham liquidados na data em que a mesma foi enviada.
25) Em face do exposto, a condenação da recorrente ao pagamento das quantias de € 3.010,43 ao Autor AA e € 3.474,81 à Autora DD, além do valor de € 2.852,48 já pago a cada um dos recomidos é ilegal, porquanto tal indemnização ultrapassa largamente o disposto na lei, violando-se o disposto no art.º 366º do CT e o art.º 5º da Lei n.º 69/2013 e carece de todo e qualquer fundamento.
26) O douto Acórdão recorrido violou ou deu errada interpretação ao disposto nas cláusulas 11ª, 30ª e 34ª da CCT celebrada entre a Associação Nacional dos Ópticos e a FEPCES - Federação Portuguesa dos Sindicatos do Comercio, Escritórios e Serviços e outra, ao previsto nos artº.s 115° e 366°, ambos do CT, 205° da CRP e 5° da Lei n.º 69/2013, sendo consequentemente nulo, salvo o devido respeito, nulidade essa que expressamente se invoca para os devidos efeitos legais.
27) Também, não existindo no douto Acórdão recorrido qualquer motivação para o afastamento da categoria profissional atribuída pelas partes, para a atribuição das diferenças salariais e do subsídio de alimentação, o mesmo peca por falta de fundamentação e é nulo nos termos do disposto no art.º 615º, n.º 1, alíneas b) e c) do CPC.


Termina pedindo que seja dado provimento ao recurso e. em consequência, declarada nula a decisão recorrida e confirmada a sentença proferida na 1ª instância.

            Os Autores contra-alegaram concluindo da seguinte forma:
I.  Não existe qualquer contradição na fixação dos salários desde a data 02.12.2001.
II. A Recorrente confunde subsídio de alimentação e abono para almoço quando deslocado em serviço.
III. Está fundamentada a atribuição da categoria desde o início do contrato.
IV. Os Recorridos não foram contratados em regime de trabalho a tempo parcial.
V. Está fundamentada a condenação no pagamento do valor de 5.500,00 euros, a cada um dos Recorridos, a título de abono de almoço quando deslocado em serviço.
VI. Ficou provado que a Recorrente não pagou aos Recorridos o valor da compensação constante das cartas de despedimento.

Terminam pedindo que não deve ser dado provimento ao recurso da ré.

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          Parecer do Ministério Público:

         Neste Supremo Tribunal, o Ex. º Sr. Procurador-Geral Adjunto, nos termos do artigo 87º, n.º 3, do Código de Processo do Trabalho [CPT], emitiu douto parecer no sentido da inexistência das arguidas nulidades e da improcedência do recurso.   

          Para o efeito, refere que inexistem as nulidades arguidas e que a cláusula 11.ª, n.º 1, alínea b), do CCT aplicável, dispõe que os empregados comerciais de grau I serão promovidos às categorias superiores logo que completem três anos de permanência na sua categoria.

          Assim, deve ser atribuída aos Autores a categoria de grau I a partir de 02.12.2008 até 02.12.2011, data em que completaram três anos de permanência na mesma categoria.

         A partir dessa data deve-lhes ser reconhecida a categoria de 'Empregado Comercial do Grau II" até à data da cessação dos contratos de trabalho.

            Por fim, refere que tendo resultado provado que os Autores, desde o início do contrato sempre prestaram a sua atividade para a ré, fora do local convencionado para a prestação da mesma, o que obrigava aqueles a tomarem a refeição do almoço fora e, tendo em conta o n.º 4 da cláusula 30ª do CCT aplicável, na redação introduzida pela alteração publicada no B.T.E. n.º 48, 1ª Série, de 29.12.2007, os recorridos têm direito ao recebimento do montante referente à diferença entre os € 8,00 que a Ré lhes pagava, para despesas de almoço e o montante previsto na cláusula ora referida.

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      - Revista:

         A presente ação foi instaurada em 02 de maio de 2014, e o acórdão recorrido foi proferido em 13 de julho de 2016.

          Assim sendo, são aplicáveis:
- O Código de Processo Civil (CPC) na versão conferida pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho.
- O Código de Processo do Trabalho (CPT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 480/99, de 9 de novembro, e alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 323/2001, de 17 de dezembro, 38/2003, de 8 de março, 295/2009, de 13 de outubro, que o republicou, e Lei n.º 63/2013, de 27 de agosto.
- Outrossim, decorre dos autos que às relações laborais celebradas entre os autores e a ré é aplicável o CTT celebrado entre a Associação Nacional de Ópticos e a Federação Portuguesa dos Sindicatos do Comércio, Escritórios e Serviços e outra, publicado no BTE, 1ª Série, n.º 2 de 15/01/2005, por força da sua extensão, conforme Portaria 637/2006 de 23 de junho (facto provado sob o n.º 33).
O referido CCT foi, entretanto, objeto das alterações publicadas no BTE, 1.ª Série, n.º 48, de 29/12/2007.

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              Estão colocadas as seguintes questões:


- Nulidade do acórdão recorrido nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alíneas b) e c), do CPC [conclusões 8ª, 9ª 13ª a 16ª, 19ª e 27ª];
- Se aos autores não podia ter sido atribuída a categoria profissional de Empregado Comercial de grau I desde o início do vínculo (02.12.2008) até 02.12.2011, e de grau II desde 03.12.2011 [conclusões 3ª a 7ª];
- Se aos autores não são devidas as quantias fixadas a título de diferenças salariais, subsídio de almoço por deslocação em serviço e diferenças na compensação pela cessação do contrato de trabalho [conclusões 10ª, 11ª, 17ª, 18ª e 20ª a 25ª].

               Cumpre, pois, julgar o objeto do recurso.

IV

               Da matéria de facto:

             As instâncias deram como provada a seguinte factualidade[4]:


1. Os AA. celebraram em 2 de dezembro de 2008, cada um, um contrato de trabalho a termo certo com a Ré nos termos dos documentos cujo teor – que aqui [se dá] por integralmente reproduzido – é o que consta das folhas 20 e 21 do processo.
2. Nele se consignando que seriam contratados com as categorias profissionais de Oficial e de Caixeira Ajudante do 1º ano.
3. Devendo cada um exercer as funções próprias de categoria profissional com que é contratado e todas as outras que lhe fossem cometidas por motivos imperiosos do funcionamento da empresa.
4. O local de trabalho situar-se-ia em regra na Rua ..., Lote …, n.º …, … ....
5. Mediante a remuneração mensal de 550,00 euros a receber pelo 1º A. e 500,00 euros a receber pela 2ª A.
6. O contrato teria a duração de seis meses, renovável por prazo igual se não fosse denunciado.
7. E o horário de trabalho, correspondente a 35 horas semanais, seria cumprido de Segunda a Sexta-Feira, das 09:30h às 19:00h, com intervalo para almoço entre as 12:30h e as 15:00h.
8. A Ré tem por objeto a indústria e comércio de óptica e aparelhos de precisão.
9. Integrando-se no Grupo EE, que abarca a sociedade Ré, bem como entre outras a EE, S.A., a OBA, Lda. e a GG, Lda., grupo que, no seu sítio da internet, apresenta como suas as lojas em nome da Ré e das outras sociedades que se dedicam ao comércio de artigos de óptica.
10. O GG tem por objeto a prestação de serviços clínicos, técnicos e de consultadoria no domínio da oftalmologia.
11. A EE, S.A., tem por objeto a indústria e comércio de artigos de óptica.
12. A FF, Lda. tem por objeto o comércio a retalho de artigos de óptica.
13. Todas as sociedades do grupo EE, incluindo a Ré, à exceção do Instituto, dedicam-se, de facto, e principalmente, ao comércio a retalho de artigos de óptica.
14. Todas têm como gerentes ou administradores, comuns, o Sr. HH e II.
15. Todas trabalham em comum e coordenação de esforços com o mesmo objetivo, a venda lucrativa de artigos ópticos.
16. As pessoas carecentes de correção visual, como se descreverá adiante, eram encaminhadas, por instruções da Ré, indiferentemente, para as lojas do Grupo EE, quer pertencessem a uma ou outra sociedade, dependendo unicamente da menor distância a percorrer pelo rastreado pelos AA.
17. O A. nasceu em … de … de 19… e a A. em … de … de 19….
18. Antes do início do contrato, mais propriamente nas três últimas semanas de novembro de 2008, a Ré deu formação aos AA. para o exercício de funções, com vista à execução por estes do rastreio gratuito de populações, previamente selecionadas pela Ré, tendo por objetivo a deteção de anomalias visuais e a sensibilização daquelas para a importância da visão e sua consequente correção.
19. Para tanto, os AA. foram preparados pela Ré para efetuar junto dessas populações testes optométricos de avaliação de acuidade visual de longe e de perto.
20.   Finda a formação, e iniciado o contrato de trabalho em 2 de dezembro de 2008, a Ré determinou que os AA., segundo programação mensal, se dirigissem diariamente às localidades das populações eleitas, situadas na área geográfica de influência e ligação com a autoestrada A …, desde … até … e A … da … até à …, e A … de … a fim de exercer as funções correspondentes à formação obtida, como passaram de facto a exercer.
21. Para o que lhes forneceu um veículo correspondente a uma unidade Móvel de Rastreio, que podia ser conduzida alternadamente por cada um dos AA.
22. A Ré autorizou que o 1º A. conduzisse aquela Unidade Móvel para junto da sua habitação, donde diariamente partia com a 2ª A. em direção às localidades constantes da programação.
23. A hora da saída teria de corresponder à necessária para deverem estacionar às 9 h 30 m a Unidade Móvel nas localidades escolhidas.
24. Os AA. demoravam determinado lapso de tempo que não foi possível fixar com extremo rigor, entre as suas residências e as localidades a visitar.
25. O rastreio era efetuado por ordens da Ré entre as 9 horas 30 m e as 17 horas e 30 minutos, com intervalo para almoço.
26. Para tanto, e previamente, o responsável da Ré, JJ, dirigia, por vezes, ao Presidente da Junta da Freguesia da localidade eleita uma missiva, informando que o GG: a) tinha um departamento que se dedicava a promover rastreios visuais em instituições várias; b) com vista à deteção de anomalias visuais e à sensibilização da população para a importância da visão; c) para tanto possuía uma unidade móvel, com aparelhos de alta tecnologia, acompanhada de dois profissionais do sector e d) que tal Unidade Móvel se encontrava no local escolhido no dia que fixara, pedindo ao destinatário que divulgasse tal ação.
27. Tratava-se de uma ação de prevenção gratuita.
28. O que se visava era atrair interessados para de seguida, diagnosticada alguma deficiência visual pelos AA., encaminhá-los para as lojas da EE, incluindo as da Ré, onde podiam adquirir as próteses adequadas.
29. Posteriormente ao envio da missiva, por vezes, a Ré remetia, através dos CTT, panfletos que estes serviços distribuíam pelos fogos das localidades a visitar, onde se indicava o local, o horário do rastreio e os testes optométricos a efetuar pelos AA.
30. A Ré classificou os AA. do seguinte modo: 1º A. sempre como oficial ajudante do 1º ano até à presente data e a 2ª A. como caixeira ajudante. do 1º ano até 30.11.2009, empregada comercial ajudante até 30.04.2010 e estagiária do 1º ano até à presente data.
31. Tendo-lhe pago as seguintes retribuições mensais:
­ 1º A – 550,00 euros, acrescido de 110,50 euros a título de subsídio de alimentação até 30.04.2010 - 558,25 euros, até à presente data, acrescido de cerca de 117,74 euros de subsídio de alimentação, desde 01.05.2010 até 3.05.2013[5].
­ 2ª A. – 500,00 euros, acrescido de 55,00 euros a título de subsídio de alimentação até 30.04.2010. - 507,50 euros a partir de 01.05.2010 e 55,83 euros a título de subsídio de alimentação até 31.12.2010 - 550,00 euros, até à presente data, acrescido de 110,50 euros a título de subsídio de alimentação a partir de 01.01.2011 até 31.05.2013[6].
32. A Ré nunca deu formação certificada aos AA.
33. Às relações de trabalho celebradas entre AA. e Ré aplica-se o CTT celebrado entre a Associação Nacional de Ópticos e a Federação Portuguesa dos Sindicatos do Comércio, Escritórios e Serviços e outra, publicado no BTE, 1ª Série, nº 2 de 15/01/2005, por força da sua extensão, conforme Portaria 637/2006 de 23 de junho.
34. Os AA. trabalharam, sob as ordens e direção da Ré, mais algumas horas, em alguns dias, em quantidade que não foi possível apurar.
35. A Ré não lhes pagou qualquer remuneração em função desse trabalho suplementar.
36. Mercê da sua deslocação diária para fora do local de trabalho, os AA. não podiam tomar as suas refeições nas suas habitações ou perto do seu local convencional de trabalho.
37. A Ré pagou aos AA. até à data de 01.07.2013, a esse título, e em média, por dia, a quantia de 8,00 euros.
38. A Ré nunca concedeu aos AA. qualquer descanso compensatório pelo trabalho suplementar por estes efetuado.
39. A formação dada aos autores em novembro de 2008 teve por base o manuseamento do equipamento que deteta as anomalias visuais, sendo com base nos resultados que o equipamento desse que as pessoas eram encaminhadas.
40. Os AA. foram, desta forma, preparados pela R. para manusear aparelhos de alta tecnologia, ergovisions.
41. Na sequência dos resultados fornecidos por tais equipamentos tecnológicos, os utentes que carecessem de correção visual eram reencaminhados para técnicos especializados, designadamente optometristas e/ou oftalmologista, com vista a efetuarem uma consulta qualificada e precisa, por especialistas da área,
42. Para o trabalhador ser classificado de Optico-optometrista é necessário que tenha habilitações literárias, designadamente o grau de licenciaturas.
43. As funções desempenhadas por ambos os trabalhadores se reconduziam ao seguinte: - Manuseamento do equipamento já referido; - Leitura dos resultados dos exames dados por essas máquinas e transcrição dos mesmos; - Encaminhamento dos possíveis necessitados de correção visual.
44. A R encetou diversas diligências, junto da ACT e da ANO, no sentido de ter o parecer de pessoas especializadas na matéria quanto à determinação da categoria profissional dos AA.
45. A resposta destas entidades não foi conclusiva, acometendo tal tarefa à R.
46. O 1º A. recebeu, aquando da cessação da relação laboral, a quantia de € 4.576,93, que se discrimina da seguinte forma: a) € 2.852,48, referente à indemnização pelo despedimento; b) € 219,55, a título de proporcionais de subsídio de férias; c) € 219,55, a título de proporcionais de férias; d) € 168,18, a título de diferenças salariais (€ 0,88 [Dez. 2010] + € 30,80 [€ 0,88*35 [sic]: Jan 2011 a Nov. 2013] + € 136,50 [€ 45,50*3: Dez. 2013 a Fev. 2014]); e) € 387,09, a título de formação (35h*3 = € 129,03*3); f) € 63,30, a título de diferença de subsídio de natal (€ 2,64 [0,88*3: 2010 a 2012] + € 45,50 (2013) + € 15,16 [€3,79*4: Jan. a Abr. 2014]); g) € 0,88, a título de diferença de subsídio de férias de 2011; h) € 0,88, a título de diferença de subsídio de férias de 2012; i) € 0,88, a título de diferença de subsídio de férias de 2013; j) € 603,75, a título de subsídio de férias, vencido a 01.01.2014; k) € 60,39, a título de férias gozadas em Maio de 2014.
47. A 2ª A. recebeu, aquando da cessação da relação laboral, a quantia de € 5.044,19, que se discrimina da seguinte forma: a) € 2.852,48, referente à indemnização pelo despedimento; b) € 219,55, a título de proporcionais de subsídio de férias; c) € 219,55, a título de proporcionais de férias; d) € 532,43, a título de diferenças salariais (€ 51,63 [Dez. 2010] + € 319,55 [€ 9,13*35: Jan. 2011 a Nov. 2013] + € 161,25 [€ 53,75* 3: Dez. 2013 a Fev. 2014]); e) € 387,09, a título de formação (35h*3 = € 129,03*3); f) € 141,56, a título de diferença de subsídio de natal (€ 51,63 (2010) + € 18,26 [9,13*2: 2012 e 2013] + € 53,75 (2013) + € 17,92 [€ 4,48*4: Jan. a Abr. 2014]); g) € 9,13, a título de diferença de subsídio de férias de 2011; h) € 9,13, a título de diferença de subsídio de férias de 2012; i) € 9,13, a título de diferença de subsídio de férias de 2013; j) € 603,75, a título de subsídio de férias, vencido a 01.01.2014; k) € 60,39, a título de férias gozadas em Maio de 2014.
48. A Unidade Móvel era diariamente levada para junto da habitação do 1º [sic].
49. Os AA. não tinham quaisquer conhecimentos técnicos que lhes permitissem vender ou demonstrar vantagens numa certa venda, por força de desconhecerem o artigo/produto que os eventuais utentes pudessem necessitar [eliminado pelo Tribunal da Relação].
50. Para o que lhes forneceu um veículo correspondente a uma unidade Móvel de Rastreio, que podia ser conduzida alternadamente por cada um dos AA., a qual passou a estar dotada há cerca de três anos de um sistema GPS que registava entre outros elementos as horas de saída e de chegada aos locais e o número de quilómetros percorridos, em ordem a permitir à Ré o controlo da atividade dos AA.[7]
51. Esse sistema de GPS foi implantado na Unidade Móvel por uma empresa externa, que guardava os dados, podendo a Ré aceder-lhes através de uma “password”.
52. A Ré nunca informou os AA. sobre os dados assim recolhidos e da possibilidade de estes reclamarem e ou discordarem dos mesmos.
53. À data do início do contrato dos AA. o Grupo EE tinha uma rede de 25 lojas e hoje tem 33 lojas.
54. Os autores enquanto ao serviço da ré nunca deram faltas injustificadas.
55. Por cartas datadas de 27 de fevereiro de 2014, dirigidas aos autores, a ré comunicou‑lhes que os respetivos contratos de trabalho cessariam decorridos 60 dias sobre a assinatura do aviso de receção das cartas, por extinção dos postos de trabalho, o que sucedeu no dia 05.05.2014.
56. Na carta dirigida ao autor AA, escreveu-se:
«Informa-se ainda Vª Ex.ª que, sem prejuízo dos créditos emergentes da sua prestação do trabalho, vencidos até à data da cessação do respetivo contrato, bem como os demais complementos que por Direito lhe couberem, será colocado nos escritórios da empresa à sua disposição, o montante de € 5.862,91 (cinco mil oitocentos e sessenta e dois euros e noventa e um cêntimos), até ao termo do prazo do aviso prévio, a ser satisfeito por meio de cheque endossado a V.ª Ex.ª, relativos à compensação que lhe é devida nos termos do disposto no art.º 366.º do Código do Trabalho.»
57. Na carta dirigida à autora DD, escreveu-se:
“Informa-se ainda Vª Ex.ª que, sem prejuízo dos créditos emergentes da sua prestação do trabalho, vencidos até à data da cessação do respetivo contrato, bem como os demais complementos que por Direito lhe couberem, será colocado nos escritórios da empresa à sua disposição, o montante de € 6.327,29 (seis mil trezentos e vinte e sete euros e vinte e nove cêntimos), até ao termo do prazo do aviso prévio, a ser satisfeito por meio de cheque endossado a V.ª Ex.ª, relativos à compensação que lhe é devida nos termos do disposto no artigo 366º, do Código do Trabalho.»

V

Do direito:

- Das nulidades:

            Tendo a recorrente dado cumprimento ao disposto no artigo 77º, n.º 1, do CPT, o Tribunal recorrido pronunciou-se sobre a arguição e, por acórdão de 24 de novembro de 2016, deliberou julgá-las improcedentes.

            Há, pois, que as conhecer.

~~~~~~~~~~~~

            a. Nulidade do artigo 615º, n.º 1, alínea c, do CPC:

            Estipula o artigo 615º, n, º 1, alínea c), “ex vi” dos artigos 666º, n.º 1, e 679º, ambos do CPC, que é nulo o acórdão quando os fundamentos estão em oposição com a decisão ou quando ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.

           A nulidade da decisão por contradição entre os fundamentos e a decisão ocorre quando a fundamentação adotada conduz a uma conclusão e a decisão extrai outra, oposta ou divergente.

           Esta nulidade (a do artigo 615º n.º 1, alínea c), do CPC), está relacionada, por um lado, com a obrigação imposta pelos artigos 154º e 607º nºs. 3 e 4, também do CPC, de o Juiz fundamentar os despachos e as sentenças e, por outro, pelo facto de a sentença dever constituir um silogismo lógico-jurídico, em que a decisão deverá ser a conclusão lógica da norma legal (premissa maior) com os factos (premissa menor).

           Contudo, se o julgador tiver errado na subsunção que fez dos factos à norma jurídica aplicada ou se errou na sua interpretação não ocorre qualquer nulidade, pois trata--se de erro de julgamento e não de nulidade.

~~~~~~~~

           No caso concreto, para a Ré, existe contradição entre o decidido no 1.º parágrafo da pág. 39 do acórdão e o facto provado no ponto n.º 31, e entre a fundamentação do acórdão e os factos provados sob os n.ºs 31 e 37.

~~~~~~~~


1. Contradição entre o decidido no 1º parágrafo da página 39 do acórdão recorrido e o facto provado sob o n.º 31:

             Diz a recorrente que o tribunal afirmou, na página 49, 1º §, que «[t]endo o autor AA recebido desde 02.12.2011 até ao final do contrato de trabalho a remuneração mensal de € 558,25 e a autora DD recebido a retribuição mensal de € 550,00 (cf. ponto factual provado n.º 32 [sic]), os mesmos tinham direito às seguintes diferenças salariais desde 02.12.2011 até à cessação do contrato de trabalho, que incluem as diuturnidades reclamadas:
               Autor AA: - a quantia de € 6.354,92 [(€ 166, 48 x 14 meses) + (€ 201,21 x 20 meses)]
                Autora DD: - a quantia de € 6.635,42 [(€ 174,73 x 14 meses) + (€ 209,46 x 20 meses)]
               Pelos proporcionais de férias, subsídios de férias e de Natal relativos ao tempo de trabalho prestado no ano da cessação do contrato tinham direito a receber:
               Autor AA: - a quantia de € 759,46 [4/12 avos de € 759,46 x 3]
                Autora DD: - a quantia de € 759,46.»

           No seu entender, estas afirmações contrariam o facto provado do artigo 31º, que tem a seguinte redação:
31º
                «Tendo-lhe pago as seguintes retribuições mensais:
                1º A. – 550,00 euros, acrescido de 110,50 euros a título de subsídio de alimentação até 30.04.2010. - 558,25 euros, até à presente data, acrescido de cerca de 117,74 euros de subsídio de alimentação, desde 01.05.2010 até 31.05.2013.
                2ª A. – 500,00 euros, acrescido de 55,00 euros a título de subsídio de alimentação até 30.04.2010. - 507,50 euros a partir de 01.05.2010 e 55,83 euros a título de subsídio de alimentação até 31.12.2010 - 550,00 euros, até à presente data, acrescido de 110,50 euros a título de subsídio de alimentação a partir de 01.01.2011 até 31.05.2013.»

               Conclui, pois, que de acordo com os factos provados, os autores AA e DD receberam, respetivamente, € 558,25 e € 550,00, desde 31.12.2010 e não desde 02.12.2011, como se refere no acórdão.

            No acórdão recorrido, lê-se o seguinte:
                «O que se nos afigura é que tendo em consideração as funções exercidas pelos autores, apuradas nos autos, a classificação profissional que se lhes aplica é a de Empregado Comercial («É o trabalhador que atende os clientes com vista à satisfação das suas necessidades; processa a venda de produtos ou serviços e recebe as correspondentes quantias; participa na exposição e reposição dos produtos e informação sobre os serviços, no controlo quantitativo e qualitativo de produtos e nos serviços pós-venda. Pode ser designado por empregado comercial, grau I, II e III.»).

                No fundo, os autores numa “loja móvel” que ia até aos clientes, atendiam as pessoas que apareciam e satisfaziam a sua necessidade de conhecer o estado da sua visão ao longe e ao perto, pois seguramente era esse o objetivo de quem procura fazer um rastreio visual, tendo a noção dos limites inerentes a tal análise breve e imediata, mas procurando saber geralmente se necessitam de óculos/lentes de contacto ou se as lentes que utilizam ainda são ou não adequadas.

               Do circunstancialismo factual assente, depreende-se que os autores sempre exerceram as mesmas funções desde o início da relação laboral.

               Deste modo, desde o início do vínculo laboral (02.12.2008) que deveria ter sido atribuída aos autores a categoria profissional e “Empregado Comercial”, do Grau I até 02.12.2011 [cf. cláusula 11.ª, n.º 1, I, alínea b) do CCT] e do Grau II, até à cessação dos contratos de trabalho.

               Considerando, porém, a factualidade descrita no ponto 30.º dos factos assentes, conclui-se que tal enquadramento profissional não foi respeitado pela empregadora.

               O grau II da categoria de “Empregado Comercial”, integra-se no Grupo V, pelo que se mostra abrangido pelo pedido formulado («desde a data da admissão (…) no mínimo serem classificados com uma categoria grau V da tabela de retribuições certas do C.C.T. aplicável»). O que já não acontece em relação ao grau I da categoria que se insere no grupo VI do anexo I do CCT.

               Logo, os autores têm direito às diferenças salariais devidas desde 02.12.2011 até à cessação do contrato de trabalho, uma vez que apenas estas foram pedidas, não estando em causa direitos indisponíveis dos trabalhadores que justifiquem a aplicação do artigo 74.º do Código de Processo do Trabalho, uma vez que, pelo menos quando foi apresentada a petição inicial da ação apensada, o contrato de trabalho já havia cessado, pelo que os direitos remuneratórios dos autores passaram a estar disponíveis.

               Pelo exposto, tendo o autor AA recebido desde 02.12.2011 até ao final do contrato de trabalho a remuneração mensal de € 558,25 e a autora DD recebido a retribuição mensal de € 550,00 (cf. ponto factual provado n.º 32 [sic]), os mesmos tinham direitos às seguintes diferenças salariais desde 02.12.2011 até à cessação do contrato de trabalho, que incluem as diuturnidades reclamadas:
                Autor AA: - a quantia de € 6.354,92 [( € 166, 48 x 14 meses) + (€ 201,21 x 20 meses)];
                Autora DD: - a quantia de € 6.635,42 [( € 174,73 x 14 meses) + (€ 209,46 x 20 meses)].

               Pelos proporcionais de férias, subsídios de férias e de Natal relativos ao tempo de trabalho prestado no ano da cessação do contrato tinham direito a receber:
               Autor AA: - a quantia de € 759,46 [4/12 avos de € 759,46 x 3];
                Autora DD: - a quantia de € 759,46.
               Tendo resultado provado que o autor AA recebeu aquando da cessação do contrato de trabalho, por conta de diferenças salariais, proporcionais de férias e de subsídio de férias, subsídio de férias vencido em 01.01.2014 e férias gozadas em maio de 2014, o montante de € 1.337,36, há que deduzir tal montante. Concluindo, está em dívida a quantia de € 5.777,02, relativa a remunerações salariais.
                Quanto à autora DD, tendo ficado demonstrado que no final do contrato de trabalho, por conta de diferenças salariais, proporcionais de férias e de subsídio de férias, subsídio de férias vencido em 01.01.2014 e férias gozadas em maio de 2014, lhe foi pago o montante de € 1.804,62, há que deduzir tal montante. Concluindo, está em dívida a quantia de € 5.590,26, relativa a remunerações salariais.»

               

               Ora, lendo-se este trecho do acórdão recorrido, conclui-se que inexiste a invocada nulidade de oposição com a decisão tomada.

           Na verdade, os fundamentos aduzidos no acórdão conduzem logicamente à decisão tomada, ou seja, de que só a partir de 02.12.2011 [data em que devia ter sido atribuído aos Autores o Grau II] é que releva a retribuição por eles auferida, uma vez que na sua petição inicial só a partir dessa data é que pediram as diferenças salariais.

           Logo, a retribuição auferida pelos Autores até essa data é irrelevante, porque, relativamente a esse período, não se vai calcular as diferenças salariais que, porventura, tenham existido, por não terem sido pedidas.

           Deste modo, só interessa apurar o montante das retribuições auferidas desde a data sobredita para se calcular as diferenças salariais peticionadas,

            Não se verifica aqui a arguida nulidade.

~~~~~~~~


2. Contradição entre a fundamentação do acórdão e os factos provados sob os n.ºs 31 e 37 – subsídio de alimentação e abono para almoço por deslocação em serviço:
           

            O facto provado sob o n.º 31º tem a seguinte redação:

                        Tendo-lhe pago as seguintes retribuições mensais:
­ 1º A – 550,00 euros, acrescido de 110,50 euros a título de subsídio de alimentação até 30.04.2010 - 558,25 euros, até à presente data, acrescido de cerca de 117,74 euros de subsídio de alimentação, desde 01.05.2010 até 3.05.2013.
­ 2ª A. – 500,00 euros, acrescido de 55,00 euros a título de subsídio de alimentação até 30.04.2010 - 507,50 euros a partir de 01.05.2010 e 55,83 euros a título de subsídio de alimentação até 31.12.2010 - 550,00 euros, até à presente data, acrescido de 110,50 euros a título de subsídio de alimentação a partir de 01.01.2011 até 31.05.2013.

            Por sua vez no facto provado sob o n.º 37º consta o seguinte:
- A Ré pagou aos AA. até à data de 01.07.2013, a esse título, e em média, por dia, a quantia de 8,00 euros.

            No acórdão recorrido, a este respeito, refere-se:

            “Em sede de recurso, os apelantes solicitam a revogação da decisão recorrida no que concerne à questão do peticionado subsídio de almoço.

                No essencial, argumentam que o Meritíssimo Juiz a quo considerou erradamente que nada era devido aos apelantes por a ré lhes ter pago, em média, a quantia diária de € 8,00, a título de subsídio de refeição. Sucede que pediram que a ré fosse condenada a pagar-lhes a diferença diária de € 8,00 para € 13,00, até 01.07.2013, de harmonia com o disposto no n.º 4 da cláusula 30.ª do CCT aplicável, na redação introduzida pela alteração publicada no B.T.E. n.º 48, de 02.12.2007 – Iª série, que se reporta ao subsídio de alimentação em deslocação de serviço e não ao subsídio de refeição que integra o conceito de retribuição e que é pago a todos os trabalhadores que prestem, pelo menos, cinco horas de trabalho por dia e que consta dos recibos de vencimento dos autores juntos aos autos.

                Tendo o tribunal de 1.ª instância considerado que a ré pagou aos autores € 8,00 para despesas de almoço, quando deslocados e que nada mais havia a liquidar, mostra-se violada a mencionada cláusula 30.º, n.º 4.

                A questão a deslindar passa, pois, por saber se o subsídio de refeição previsto na cláusula indicada e que foi peticionado com o valor de € 13,00 diários, é devido e, em caso afirmativo, se foi pago.

                De harmonia com a referida cláusula 30.ª, sempre que o trabalhador se desloque em serviço, ou seja, realize temporariamente trabalho fora do seu local habitual de trabalho e a deslocação não implique uma diária completa, o mesmo tem direito a auferir ao almoço ou ao jantar a quantia diária de € 13,00, na redação introduzida pela alteração publicada no B.T.E. n.º 48, de 29.12.2007 – Iª série.

               Na situação que se aprecia nos autos, resultou demonstrado que os autores, desde a sua admissão, não obstante terem como local convencional de trabalho a Rua ..., Lote …, n.º …, … ..., sempre se deslocaram diariamente para fora do seu local de trabalho, o que os obrigava a tomarem a refeição do almoço fora. Como tal tinham direito ao pagamento do almoço, nos termos previstos pelo n.º 4 da cláusula 30.ª.

               Igualmente ficou demonstrado que a ré pagou aos autores até à data de 01.07.2013, em média, a quantia diária de € 8,00 para a refeição em causa.

               Por conseguinte, a ré não pagou ao autor tudo o que lhes era devido.”
           Também, nesta decisão. inexiste a arguida nulidade de oposição entre os fundamentos e a decisão tomada.

           Para o efeito, importa analisar conjugadamente os factos ínsitos nos nºs 36º e 37º.
            Vejamos:
36) Mercê da sua deslocação diária para fora do seu local de trabalho, os AA. não podiam tomar as suas refeições nas suas habitações ou perto do seu local convencional de trabalho.
37) A Ré pagou aos AA. até à data de 01.07.2013, a esse título, e em média, por dia, a quantia de 8,00 euros-.
           Daqui resulta, claramente, que a Ré pagou diariamente, em média e a título do abono para o almoço, a quantia de € 8.00 (previsto na Cláusula 36ª, n, º 4, do CCT), por os Autores se deslocarem, diariamente, em serviço para fora do seu local habitual de trabalho.
           O que significa que o montante referido no artigo 31º dos factos provados não respeitam a este abono, mas sim ao subsídio de alimentação, previsto na cláusula 28ª, n.º 10[8].
            Assim sendo, pode o julgador ter errado na subsunção que fez dos factos à norma jurídica aplicável ou ter errado na sua interpretação, mas se assim for, está-se no âmbito do erro de julgamento e não no âmbito das nulidades.

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            b. Nulidade do artigo 615º, n.º 1, alínea b, do CPC:

            Estipula o artigo 615º, n.º 1, alínea b), “ex vi” dos artigos 666º, n.º 1, e 679º, ambos do CPC, que é nulo o acórdão quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.

            Para a Ré, o acórdão recorrido, de 13 de julho de 2016, é nulo por falta de fundamentação:
- No que concerne à classificação dos autores na categoria de Empregado Comercial, sem passar pela categoria de Empregado Comercial Ajudante;
- Quanto à condenação no pagamento das diferenças salariais nos valores de € 166,48, € 201,21, € 174,73 e € 209,46 e das diuturnidades;
- Sobre a quantia de € 5.500,00 a que se chegou a título de abono para almoço por deslocação em serviço para cada um dos autores;
- Relativamente ao valor da compensação pela cessação do contrato de trabalho em que a ré foi condenada,

Para se verificar esta nulidade, a doutrina e a jurisprudência têm sido unânimes em afirmar que ela só se verifica se faltar, em absoluto, a indicação dos fundamentos de facto e de direito.

            Segundo José Lebre de Freitas[9], "ao juiz cabe especificar os fundamentos de facto e de direito da decisão (art.º 607-3). Há nulidade (no sentido lato de invalidade, usado pela lei) quando falte em absoluto a indicação dos fundamentos de facto ou a indicação dos fundamentos de direito da decisão […]”.
           
            “A nulidade da sentença por falta de fundamentação não se verifica quando apenas tenha havido uma justificação deficiente ou pouco persuasiva, antes se impondo, para a verificação da nulidade, a ausência de motivação que impossibilite o anúncio das razões que conduziram à decisão proferida a final” - acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2011.12.15, proferido no processo n.º 2/08.9TTLMG.P1.S1, em www.dgsi.pt/jst/.
           
           No caso concreto, a Ré arguiu a nulidade de falta de fundamentação de várias decisões parcelares proferidas no acórdão recorrido.
           Assim sendo, analisemos cada uma dessas faltas de fundamentação.

           1 - Classificação dos autores na categoria de Empregado Comercial, sem passar pela categoria de Empregado Comercial Ajudante:

            O acórdão recorrido relativamente a esta decisão fundamenta do seguinte modo:

           “Estipula a cláusula 8.ª, n.º 1 do aludido CCT que os trabalhadores abrangidos por este instrumento de regulamentação coletiva serão obrigatoriamente classificados de acordo com as suas funções numa das categorias que se enumeram e definem no anexo I.
              Na eventualidade dos trabalhadores desempenharem funções a que correspondam diversas categorias, ser-lhes-á atribuída a mais qualificada e correspondente retribuição, nos termos previstos no n.º 3 da cláusula.
                […]
            No fundo, os autores limitavam-se a receber as pessoas na Unidade Móvel e com o auxílio de um equipamento específico, faziam uma análise imediata sobre a acuidade visual de longe e de perto, informando-as em conformidade e promoviam informação de sensibilização para a importância da visão. As suas funções, de extrema importância, não se nega, para as populações locais, constituíam apenas uma ação de prevenção/informação, gratuita, esperando a ré que tal proceder pudesse trazer potenciais clientes para as lojas EE, incluindo as da ré.
            […]
               O que se nos afigura é que tendo em consideração as funções exercidas pelos autores, apuradas nos autos, a classificação profissional que se lhes aplica é a de Empregado Comercial («É o trabalhador que atende os clientes com vista à satisfação das suas necessidades; processa a venda de produtos ou serviços e recebe as correspondentes quantias; participa na exposição e reposição dos produtos e informação sobre os serviços, no controlo quantitativo e qualitativo de produtos e nos serviços pós-venda. Pode ser designado por empregado comercial, grau I, II e III.»).
                No fundo, os autores numa “loja móvel” que ia até aos clientes, atendiam as pessoas que apareciam e satisfaziam a sua necessidade de conhecer o estado da sua visão ao longe e ao perto, pois seguramente era esse o objetivo de quem procura fazer um rastreio visual, tendo a noção dos limites inerentes a tal análise breve e imediata, mas procurando saber geralmente se necessitam de óculos/lentes de contacto ou se as lentes que utilizam ainda são ou não adequadas.
               Do circunstancialismo factual assente, depreende-se que os autores sempre exerceram as mesmas funções desde o início da relação laboral.
               Deste modo, desde o início do vínculo laboral (02.12.2008) que deveria ter sido atribuída aos autores a categoria profissional e “Empregado Comercial”, do Grau I até 02.12-2011 [cf. cláusula 11.ª, n.º 1, I, alínea b) do CCT] e do Grau II, até à cessação dos contratos de trabalho.        
                Considerando, porém, a factualidade descrita no ponto 30.º dos factos assentes, conclui-se que tal enquadramento profissional não foi respeitado pela empregadora.

           Do exposto resulta que, no acórdão recorrido, está fundamentada a decisão de reclassificar os Autores, atribuindo-lhes a categoria deEmpregado Comercial”, desde o início de funções para a R, e de desconsiderar as de “Oficial-Ajudante de 1º ano” e de “Caixeira Ajudante de 1º ano”, apesar de constarem dos contratos celebrados entre as partes [facto provado sob o n.º 2], porque aqueles nunca exerceram as funções que lhes correspondiam.

           Com efeito, resultando da factualidade assente que os autores sempre exerceram as mesmas funções desde o início da relação laboral até à data da sua cessação, tinham  que ser enquadrados na categoria correspondente às funções que efetivamente exerceram.

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           2. Quanto à condenação no pagamento das diferenças salariais nos valores de € 166,48, € 201,21, € 174,73 e € 209,46 e das diuturnidades:

                Consta no acórdão recorrido:
           “O grau II da categoria de “Empregado Comercial”, integra-se no Grupo V, pelo que se mostra abrangido pelo pedido formulado («desde a data da admissão (…) no mínimo serem classificados com uma categoria grau V da tabela de retribuições certas do C.C.T. aplicável»). O que já não acontece em relação ao grau I da categoria que se insere no grupo VI do anexo I do CCT. Logo, os autores têm direito às diferenças salariais devidas desde 02.12.2011 até à cessação do contrato de trabalho, uma vez que apenas estas foram pedidas, não estando em causa direitos indisponíveis dos trabalhadores que justifiquem a aplicação do artigo 74.º do Código de Processo do Trabalho, uma vez que, pelo menos quando foi apresentada a petição inicial da ação apensada, o contrato de trabalho já havia cessado, pelo que os direitos remuneratórios dos autores passaram a estar disponíveis.
              Pelo exposto, tendo o autor AA recebido desde 02.12.2011 até ao final do contrato de trabalho a remuneração mensal de 558,25 e a autora DD recebido a retribuição mensal de € 550,00 (cf. ponto factual provado n.º 32 [sic]), os mesmos tinham direitos às seguintes diferenças salariais desde 02-12-2011 até à cessação do contrato de trabalho, que incluem as diuturnidades reclamadas:
- Autor AA: - a quantia de € 6.354,92 [(€ 166, 48 x 14 meses) + (€ 201,21 x 20 meses)]
- Autora DD: - a quantia de € 6.635,42 [(€ 174,73 x 14 meses) + (€ 209,46 x 20 meses)]
- Pelos proporcionais de férias, subsídios de férias e de natal relativos ao tempo de trabalho prestado no ano da cessação do contrato tinham direito a receber:
- Autor AA: - a quantia de € 759,46 [4/12 avos de € 759,46 x 3]
- Autora DD: - a quantia de € 759,46.”

            Estas diferenças estão fundamentadas.
                Tais diferenças de valores, a que os Autores têm direito, deveu-se ao facto de os valores constantes do CCT aplicável serem superiores aos montantes que a Ré efetivamente lhes pagou, como consta, aliás, do acórdão recorrido.

             VEJAMOS:      
            Está provado que é aplicável ao caso, por força da Portaria n.º 637/2006, de 23 de junho, o CCT celebrado entre a Associação Nacional de Ópticas e a Federação. Portuguesa dos Sindicatos do Comércio, Escritórios e Serviços e outra, cuja revisão geral foi publicada no BTE n.º 2, 1ª Série, de 15 de janeiro de 2005, páginas 151/174, com alteração publicada no BTE, n.º 48, 1ª Série, de 29 de dezembro de 2007 [facto provado sob o n.º 33].
               Está, também, provado que a Ré pagou ao Autor AA a retribuição mensal de € 558,25 desde 01.05.2010 e à Autora DD a retribuição mensal de € 505,75 desde 30.04.2010.
           Ora, no CCT aplicável, consta que a retribuição mensal para a categoria atribuída aos Autores devia ser, nesse período, a de € 690,00 [tabela salarial do grupo V, resultante da alteração efetuada e publicada no BTE, n.º 48, de 29 de dezembro de 2007].
                Também está provado que a recorrente nunca pagou aos recorridos qualquer diuturnidade [facto provado sob o n.º 31].
            De acordo com a cláusula 34ª, n.º 1[10], do CCT aplicável, os Autores tinham direito a duas diuturnidades.    
           Tinham, pois, e uma vez que os contratos de trabalho se iniciaram em 02.02.2008, direito a receber a primeira diuturnidade de 02.12.2010 até 02.12.2012, e a segunda desde esta data e até 05.07.2014, data da cessação dos seus contratos de trabalho.
            Assim sendo, a Ré tem que pagar:      
- Ao Autor AA:
· A diferença salarial mensal: com uma diuturnidade o montante de € 166,48[11] [(€ 690,00 - € 558,25 = € 131,75) + 34,73 (valor da diuturnidade[12]) = € 166,48] e com duas diuturnidades a quantia de € 201,21[13].


- À Autora DD:
· A diferença salarial mensal: com uma diuturnidade o montante de € 174,73[14] [(€ 690,00 - € 558,25 = € 174,73) + 34,73 = € 174,73] e com duas diuturnidades a quantia de € 209,46[15].
            Como se viu, a decisão está convenientemente fundamentada e é compreensível quanto à origem e aos montantes mencionados pela recorrente.  
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            3. Falta de fundamentação sobre a quantia de € 5.500, 00 a que se chegou a título de abono para almoço por deslocação em serviço para cada um dos autores:

            Quanto a esta parte, diz o acórdão o acórdão recorrido:
            «Em sede de recurso, os apelantes solicitam a revogação da decisão recorrida no que concerne à questão do peticionado subsídio de almoço.
                No essencial, argumentam que o Meritíssimo Juiz a quo considerou erradamente que nada era devido aos apelantes por a ré lhes ter pago, em média, a quantia diária de € 8,00, a título de subsídio de refeição. Sucede que pediram que a ré fosse condenada a pagar-lhes a diferença diária de € 8,00 para € 13,00, até 01.07.2013, de harmonia com o disposto no n.º 4 da cláusula 30.ª do CCT aplicável, na redação introduzida pela alteração publicada no B.T.E. n.º 48, de 29-12-2007 – I série, que se reporta ao subsídio de alimentação em deslocação de serviço e não ao subsídio de refeição que integra o conceito de retribuição e que é pago a todos os trabalhadores que prestem, pelo menos, cinco horas de trabalho por dia e que consta dos recibos de vencimento dos autores juntos aos autos.
                Tendo o tribunal de 1.ª instância considerado que a ré pagou aos autores € 8,00 para despesas de almoço, quando deslocados e que nada mais havia a liquidar, mostra-se violada a mencionada cláusula 30.º, n.º 4.
               A questão a deslindar passa, pois, por saber se o subsídio de refeição previsto na cláusula indicada e que foi peticionado com o valor de € 13,00 diários, é devido e, em caso afirmativo, se foi pago.
                De harmonia com a referida cláusula 30.ª, sempre que o trabalhador se desloque em serviço, ou seja, realize temporariamente trabalho fora do seu local habitual de trabalho e a deslocação não implique uma diária completa, o mesmo tem direito a auferir ao almoço ou ao jantar a quantia diária de € 13,00, na redação introduzida pela alteração publicada no B.T.E. n.º 48, de 29-12-2007 – Iª série.
               Na situação que se aprecia nos autos, resultou demonstrado que os autores, desde a sua admissão, não obstante terem como local convencional de trabalho a Rua ..., Lote …, n.º …, … ..., sempre se deslocaram diariamente para fora do seu local de trabalho, o que os obrigava a tomarem a refeição do almoço fora. Como tal tinham direito ao pagamento do almoço, nos termos previstos pelo n.º 4 da cláusula 30.ª.
               Igualmente ficou demonstrado que a ré pagou aos autores até à data de 01.07.2013, em média, a quantia diária de € 8,00 para a refeição em causa.
               Por conseguinte, a ré não pagou ao autor tudo o que lhes era devido.
                Concluindo, o recurso mostra-se procedente quanto ao fundamento agora analisado pelo que se impõe a revogação da sentença recorrida neste aspeto, devendo a ré ser condenada a pagar a cada um dos apelantes a quantia de € 5.500,00, a título de subsídio de alimentação por deslocação em serviço, de harmonia com o disposto na referida cláusula 30.º, n.º 4.»

            Ora, estando provado que a Ré pagou € 8,00, por dia, a título de abono para o almoço e tendo os Autores direito a € 13,00 diários, conforme decorre da cláusula 30ª, n.º 4, do CCT, há uma diferença, para menos, de € 5,00/dia.
           Alegando, os Autores, na petição inicial. que estiveram deslocados 1.100 dias, a quantia que a Ré tem de lhes pagar, a título de diferenças, quanto a este abono, é a de € 5.500,00 [1.100 dias x € 5.00 = € 5.500,00].
           
            Igualmente, em relação a esta parte, falece razão à recorrente porque está ela devidamente fundamentada.

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           4. Falta de fundamentação relativamente ao valor da compensação pela cessação do contrato de trabalho em que a ré foi condenada:

            Escreveu-se no acórdão recorrido:

            «Na petição inicial do processo apenso, os demandantes pediram a condenação da ré a pagar-lhes a diferença entre o montante que esta declarou estar disponível a título de compensação nas cartas em que comunicou a cessação do contrato por extinção do posto de trabalho e o montante que efetivamente lhes foi pago a tal título.
                […].
                Resulta da factualidade provada que, nas cartas de 27 de fevereiro de 2014, dirigidas aos autores, a ré comunicou-lhes que os respetivos contratos terminariam 60 dias sobre a assinatura do aviso de receção das cartas, por extinção dos seus postos de trabalho. Para além disso, informou-os que sem prejuízo dos créditos emergentes da prestação do trabalho, vencidos até à data da cessação do contrato, bem como os demais complementos que por direito lhes coubessem, seria colocado nos escritórios da empresa à disposição dos demandantes, a título de compensação prevista no artigo 366.º do Código do Trabalho, a quantia de € 5.862,91 para o autor AA e o montante de € 6.327,29 para a autora DD.
                Veio a provar-se, porém, que a título de “indemnização pelo despedimento”, ao autor AA apenas foi paga a quantia de € 2.852,48 e à autora DD, o valor de € 2.852,48.
                É precisamente a diferença entre os valores recebidos e os valores anunciados nas mencionadas cartas que são reclamados pelos autores.
               Ou seja, o que está em causa é um crédito laboral assumido pela empregadora e que se mostra vencido, mas não integralmente pago e que é efetivamente devido, não competindo nesta ação apreciar se o valor comunicado pela empregadora é ou não o correto.
                Pelo exposto, há que condenar a ré no pagamento aos autores, a título do valor da compensação prevista no artigo 366.º do Código do Trabalho, dos seguintes montantes:
                Ao autor AA: a quantia de € 3.010,43;
                À autora DD: a quantia de € 3.474,81.»
           
           Ora, igualmente, esta decisão está fundamentada e é compreensível.
            Esta questão, aliás como as demais, está colocada como sendo uma nulidade.
           Poderá, quando muito, haver erros de julgamento, mas não nulidades, pois trata-se de questões de mérito e não de questões processuais.

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           Por tudo o que se acabou de dizer, e estando o acórdão recorrido concretamente fundamentado, o tribunal “a quo” não violou o disposto no artigo 205º, da Constituição da República Portuguesa, como alegado pela Ré [dever dos tribunais fundamentarem as suas decisões que não sejam de mero expediente].
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            - DO RECURSO:

      a. Se aos autores não podia ter sido atribuída a categoria profissional de Empregado Comercial de grau I desde o início do vínculo (02.12.2008) até 02.12.2011, e de grau II desde 03.12.2011:

         A atividade do trabalhador está regulada nos artigos 115º a 120º do Código do Trabalho de 2009[16].
            O artigo 115º, n.º 1, refere que cabe às partes determinar por acordo a atividade para que o trabalhador é contratado.     
           Por sua vez, o artigo 118º, n.º 1, estabelece que “[o] trabalhador deve, em princípio, exercer funções correspondentes à atividade para que se encontra contratado, devendo o empregador atribuir-lhe, no âmbito. da referida atividade, as funções mais adequadas às suas aptidões e qualificação profissional”.
           De acordo com o artigo 129º, n.º 1, alínea e), é proibido ao empregador mudar o trabalhador para categoria inferior, salvo nos casos previstos neste Código.
           Atualmente, a categoria não tem uma função delimitadora das funções exigíveis ao trabalhador, pois, o legislador quis deixar para as partes a possibilidade de combinar tarefas constantes de várias categorias, de modo a ajustar da forma mais racional as qualificações do trabalhador às necessidades da empresa.
           A categoria assume, agora, fundamentalmente, o papel de conexão do trabalhador com um certo estatuto profissional na empresa.

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           Como ensina a Professora Maria do Rosário Palma Ramalho[17]o legislador socorre-se, por vezes indistintamente, a vários termos para se referir à atividade laboral.

São eles:

- Categoria: o termo categoria é referido pela lei a propósito da atividade concretamente exercida pelo trabalhador (artigos 115º, n.º 2, e 118º, n.º 2, bem como 106º, n.º 3c)), mas também a propósito do seu estatuto na organização do empregado [---]; por outro lado, a manutenção da categoria é configurada como um direito do trabalhador, que só pode descer de categoria em determinadas condições (artigos 129º, n.º 1e), e 119º);

- Função: “o termo função é referido pela lei a propósito da integração do conteúdo da prestação de trabalho do empregador (artigo 118º, n.º 1), da delimitação do conceito de funções acessórias (artigo 118º, nºs 2 e 3) e da mobilidade funcional (artigo 120º)”;

[…]

- Carreira: “este termo é referido a propósito da delimitação das funções acessórias (artigo 118º, n.º 3).”

Segundo a mesma Professora, o conceito de função tem a ver com a delimitação horizontal do conteúdo da atividade laboral devida pelo trabalhador e pode ser vista por dois prismas[18]:

- “Num sentido formal, a função corresponde ao cargo, lugar ou posto de trabalho ocupado pelo trabalhador:

- Num sentido substancial, a função corresponde ao conjunto de tarefas, mais ou menos definidas, que cada posto de trabalho inclui no seio da organização do empregador”.

Conclui que “[o] princípio básico no que toca à função do trabalhador é um princípio de substancialidade ou efetividade: a função corresponde ao conjunto de tarefas que, de facto, o trabalhador realiza e não a uma determinada designação formal; em caso de discrepância entre esta e aquela, é a função efetiva e não a função nominal que prevalece, designadamente para efeitos de determinação do regime aplicável ao trabalhador”.

No conceito de categoria salienta, também, três valências essenciais:

- “Categoria profissional: a que se reporta às qualificações e aptidões profissionais do trabalhador.”

- Categoria normativa (também designada categoria-estatuto”): a que corresponde à designação formal dada pela lei ou pelos instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho a determinado conjunto de tarefas, com vista à aplicação do regime laboral previsto para essa situação;

- Categoria interna à empresa: a que se reporta à posição do trabalhador no seio da hierarquia empresarial. Nesta aceção vertical, a categoria é fixada no momento da celebração do contrato de trabalho ou no início da execução do trabalho.”

Termina afirmando que “[o] conceito de categoria tem também a maior importância para delimitar a posição jurídica do trabalhador no contrato e no seio da organização do empregador, uma vez que é através da categoria que se determina o regime aplicável a esse trabalhador, do ponto de vista do tratamento remuneratório e dos demais direitos e garantias inerentes à sua posição na empresa”.

Na verdade, a lei reconhece a importância do conceito “categoria” ao consagrar, no artigo 129º, n.º 1, alínea e), a sua irreversibilidade como garantia do trabalhador, ou seja, ao proibir o empregador de mudar, em princípio, o trabalhador para categoria inferior.

Diz-se, em princípio, porque o CT prevê exceções, como as que constam nos artigos 119º, 120º, n.º 5, e 164º, n.º 1, alínea a).

Para o Supremo Tribunal de Justiça [no seu acórdão de 2013.10.09[19]] “a posição do trabalhador, na organização da empresa, define-se através de um conjunto de serviços e tarefas que formam o objeto da prestação laboral, pelo que a sua categoria profissional se determina por referência à classificação normativa, no quadro das funções efetivamente exercidas” e “a categoria-função corresponde ao essencial das funções que o trabalhador se obrigou a desempenhar pelo contrato de trabalho, podendo a categoria profissional ser entendida na aceção de “categoria-estatuto” ou normativa, como aquela que define a posição do trabalhador na empresa, cujas tarefas típicas se encontram descritas na lei ou em instrumento de regulamentação coletiva”.

Assim sendo, para que se tenha a possibilidade de enquadrar e integrar o trabalhador numa determinada categoria profissional, ou seja, para que se possa classificá-lo profissionalmente torna-se necessário apelar à essencialidade das funções por ele exercidas.

Contudo, para esse enquadramento não se torna imperioso que o trabalhador exerça todas as funções correspondentes a determinada categoria – tal como ela decorre da lei ou de instrumento de regulamentação coletiva – sendo suficiente que nela se enquadre o núcleo essencial das funções efetivamente por ele desempenhadas.

 Mas, em caso de discrepância entre a categoria normativa e a função efetivamente exercida pelo trabalhador, é a função efetiva e não a função nominal que prevalece, designadamente para efeitos de determinação do regime aplicável ao trabalhador.

Bernardo da Gama Lobo Xavier[20] afirma que “[t]endo presente as funções que o trabalhador se comprometeu a prestar e aquelas funções que ele efetivamente exerce, a entidade empregadora terá de o classificar na categoria normativa correspondente, isto é, terá de lhe atribuir o tratamento da categoria normativa que corresponde às funções desempenhadas”.

[…]

[O] controlo jurisdicional destina-se a verificar desconformidades entre a posição efetiva do trabalhador no seu posto de trabalho e a categoria normativa atribuída”.

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Também a jurisprudência da Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça tem sido no mesmo sentido.

O acórdão de 27.03.2014, proferido no processo n.º 184/11.2TTVVLG.P1.S1[21], decidiu que “[n]a sua essencialidade, o conceito “categoria profissional” compreende tanto a atividade que, em concreto, o trabalhador desenvolve para a entidade empregadora, como a posição hierárquica que ocupa na estrutura da empresa, caracterizando, aquela e esta, o respetivo estatuto profissional.

Sob a ideia reitora de que existe uma relação de necessidade jurídica entre o exercício de certa função e a titularidade de certa categoria, valem, na caraterização da categoria profissional, os princípios da efetividade e do reconhecimento”.

O mesmo se decidiu no acórdão de 25.11.2014, proferido no processo n.º 4248/06.6TTLSB.L1.S1:


- “A categoria profissional do trabalhador afere-se em razão das funções por ele exercidas, tendo em conta a norma ou convenção que para a respetiva atividade indique as funções próprias de cada uma, sendo o núcleo fundamental das funções efetivamente desempenhadas o elemento decisivo na determinação da categoria em questão;
- Exercendo o trabalhador diversas atividades enquadráveis em diferentes categorias profissionais, a sua classificação deve fazer-se em função do núcleo essencial das atividades por ele prosseguidas ou da atividade predominante e, sendo tal diversidade indistinta, deve o trabalhador ser classificado na categoria mais elevada.

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Tendo em conta estes princípios, legislação, CCT aplicável, e jurisprudência relativos à categoria e às funções do trabalhador, vejamos o caso concreto:


           O acórdão recorrido atribuiu aos Autores a categoria de “Empregado Comercial”, de Grau I, desde o início de funções, ou seja, de 02.12.2008 a 02.12.2011, e de Grau II, desde esta data até à cessação dos seus contratos de trabalho.
            E foram-lhes atribuídas face às funções efetivamente por eles executadas, tendo em conta a factualidade provada, e as categorias definidas no CCT celebrado entre a Associação Nacional de Ópticos e a Federação Portuguesa dos Sindicatos do Comércio, Escritórios e Serviços e outra, publicado no BTE, 1ª Série, n.º 2 de 15/01/2005, aqui aplicável, por força da sua extensão, conforme Portaria 637/2006 de 23 de junho.
A este respeito provou-se que os AA. celebraram, por escrito, em 2 de Dezembro de 2008, um contrato de trabalho a termo certo com a Ré, que nesses contratos consta que os Autores eram contratados com as categorias profissionais de Oficial e de Caixeira Ajudante do 1º ano e que deviam exercer, cada um, as funções próprias de categoria profissional com que eram contratados e todas as outras que lhe fossem cometidas por motivos imperiosos do funcionamento da empresa [factos n.ºs 1 a 3].              
Ficou, também, provado que a Ré classificou os AA. do seguinte modo: O 1º A. sempre como oficial ajudante do 1º ano, desde o início e até à data da cessação do seu contrato de trabalho e a 2ª A. como caixeira ajudante, do 1º ano até 30.11.2009, empregada comercial ajudante até 30.04.2010 e estagiária do 1º ano até à data da cessação [facto n.º 30].

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Ora, a função substancial corresponde ao conjunto de tarefas que, de facto e efetivamente, o trabalhador realiza.

As funções real e efetivamente exercidas pelos Autores, desde o início do seu contrato até à sua cessação, nunca corresponderam às que constam na definição das suas categorias-estatuto.

Ou seja, a categoria contratada dos Autores está mal definida na relação contratual porque não correspondia à atividade por eles desenvolvida.

Ora, em caso de discrepância entre a função substancial desenvolvida pelo trabalhador e a categoria nominal ou contratada, é a função efetiva e não a função nominal que prevalece, designadamente para efeitos de determinação do regime aplicável ao trabalhador.

Nestes casos, os trabalhadores devem ser reclassificados em função da atividade desenvolvida.


Foi o que se fez no acórdão recorrido, ao decidir-se reclassificar os Autores, atribuindo-lhe a categoria de Empregado Comercial, face às funções efetivamente por eles desenvolvidas.

           No ANEXO I ao CCT aplicável, estão definidas funcionalmente as categorias dos “Trabalhadores do comércio, armazém e vendas”, onde se incluem os Autores.
           Define-se.
· “Oficial-ajudante” ou “empregado comercial-ajudante” como sendo “o trabalhador que, terminado o período de aprendizagem, estagia para empregado comercial, grau I ou terceiro-oficial de óptica”.
· “Empregado comercial” como sendo “o trabalhador que atende os clientes com vista à satisfação das suas necessidades; processa a venda de produtos ou serviços e recebe as correspondentes quantias; participa na exposição e reposição dos produtos e informação sobre os serviços, no controlo quantitativo e qualitativo de produtos e nos serviços pós-venda. Pode ser designado por empregado comercial, grau I, II e III”.

Considerando a materialidade que foi dada como provada sob os números 18º, 19º, 20º. 21º, 39º, 40º e 43º, conclui-se que os Autores nunca exerceram, mesmo no início dos seus contratos de trabalho, as funções correspondentes à categoria contratada.
          Assim sendo, o tribunal “a quo” ao reclassificar os Autores apenas lhes atribuiu a categoria, efetiva, verdadeira e real, cujas funções sempre exerceram.
           Essa decisão não viola o disposto no artigo 175º, n.ºs 1 e 2, do CT[22], como alega a Ré.
          Na verdade, os contratos são o que são e não o que as partes dizem que são”, ou seja, a lei concede  às partes a liberdade de determinação, por acordo, da categoria do trabalhador, desde que essa determinação corresponda à sua vontade real e não apenas à sua vontade declarada.

          Por fim, alega a Ré que o CCT aplicável, na 11ª cláusula, exige, para se ser “Empregado Comercial”, que se tenha sido, previamente e durante dois anos, “Empregado Comercial Ajudante[23].
           Ora, essa cláusula, referente ao acesso/promoção, no seu número 1, alíneas b) e c), estabelece que “constitui promoção ou acesso a passagem do trabalhador a categoria superior” e que os ajudantes, logo que completem dois anos de permanência na categoria, são imediatamente promovidos a empregados comerciais do grau I.
          
          Daqui resulta que admissão do trabalhador (contratação) e progressão na carreira são duas realidades distintas.
          
          Essa cláusula só é aplicável quando se contrata um “Ajudante” e não quando se contrata um Empregado Comercial, como foi o caso dos autos.
           Ou seja, só os trabalhadores contratados inicialmente como Ajudante, e que exerçam efetivamente essas funções, é que precisam de permanecer dois anos nessa categoria para serem promovidos a empregado comercial de grau I.

           Não foi violada a cláusula 11ª do CCT aplicável, como defende a Ré.
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         b. Se aos autores não são devidas as quantias fixadas a título de diferenças salariais, subsídio de almoço por deslocação em serviço e diferenças na compensação pela cessação do contrato de trabalho:

          Já nos pronunciamos sobre esta questão, quando conhecemos das nulidades arguidas pela recorrente.
           Ao contrário do alegado, estas quantias são devidas aos Autores.

            1. As quantias fixadas a título de diferenças salariais são devidas porque a Ré pagou aos Autores uma retribuição inferior à estabelecida no CCT aplicável e porque nunca lhes pagou qualquer diuturnidade a que eles tinham direito (tabela salarial do grupo V, resultante da alteração efetuada ao CCT aplicável, e publicada no BTE, n.º 48, de 29 de dezembro de 2007, cláusula 64ª, n.º 1, do mesmo CCT e factos provados sob os n.ºs 30, 31 e 33).

           2. As quantias fixadas a título de diferenças do abono para almoço por deslocação em serviço são devidas porque a Ré apenas lhes pagou € 8,00 por dia, quando o CCT, referido, consagra que esse valor é o de € 13,00 por dia.
           O que dá uma diferença, para menos, de € 5,00/dia.
          Multiplicando essa diferença pelo número de dias em que o montante pago é inferior, dá a quantia fixada (cláusulas 36ª, n.º 4, e 28ª, n.º 10, e factos nºs 36 e 37).
 
          3. As quantias devidas a título de diferenças na compensação pela cessação dos contratos de trabalho dos Autores são devidas porque a Ré pagou aos Autores quantias inferiores às que anunciou, ou seja às que declarou estarem disponíveis, a título de compensação, nas cartas que enviou a comunicar-lhes a cessação dos respetivos contratos de trabalho, por extinção dos seus postos de trabalho (factos provados sob os nºs 55 a 57, aditados pelo Tribunal da Relação).
          A Ré, entidade empregadora dos trabalhadores Autores, nas cartas em que lhes comunicava a cessação dos seus contratos e por que motivo, assumiu a existência de um crédito que eles passaram a ter sobre ela.
          Esse crédito venceu-se e não foi integralmente pago.
           Diz a Ré que a indemnização que pagou é a que está correta pois foi fixada de acordo com o artigo 366º, do CT, e com o artigo 5º, da Lei n.º 69/2013[24], de 30 de agosto.
         Contudo, como se diz no acórdão recorrido “o que está em causa é um crédito laboral assumido pela empregadora e que se mostra vencido, mas não integralmente pago e que é efetivamente devido, não competindo nesta ação apreciar se o valor comunicado pela empregadora é ou não o correto”.
VI

            - Deliberação:

           

           Pelo exposto delibera-se negar a revista e, em consequência, manter o acórdão recorrido.

            Custas pela Recorrente.

            Anexa-se o sumário do Acórdão.

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Lisboa, 12 de outubro de 2017

Ferreira Pinto (Relator)

Chambel Mourisco

Pinto Hespanhol

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[1] - N.º 003/2017 – (FP) – CM/PH
[2] - Por acórdão, proferido em conferência, de 18 de maio de 2017, constante de fls. 885/896, não foi admitido o recurso subordinado.
Consequentemente, só será conhecido e julgado o recurso principal.
[3] - Às relações de trabalho celebradas entre AA. e Ré aplica-se o CTT celebrado entre a Associação Nacional de Ópticos e a Federação Portuguesa dos Sindicatos do Comércio, Escritórios e Serviços e outra, publicado no BTE, 1ª Série, nº 2 de 15/01/2005, por força da sua extensão, conforme Portaria 637/2006, de 23 de junho. – Facto provado sob o n.º 33.
[4] - As alterações efetuadas pelo Tribunal da Relação ficarão em itálico.
[5] - Esta data é a que consta na petição inicial.
Na ação apensada pedem-se as diferenças salariais até à cessação dos contratos.
As diferenças salariais a calcular serão até esta última data.
Esta nota é válida para todas as referências a este facto.
[6] - Verifica-se o mesmo da nota anterior.
[7] - Os factos n.ºs 50º a 57º foram aditados pelo Tribunal da Relação.
[8] - Estabelece que as entidades empregadoras obrigam-se a pagar aos trabalhadores ao seu serviço um subsídio de refeição de € 3, a partir de 1 de Janeiro de 2007, por cada dia de trabalho efetivamente prestado, entendendo-se como tal a prestação de pelo menos cinco horas normais de trabalho (redação dada pela alteração publicada no BTE n.º 48, Iª Série, de 28.12.2007).
Este valor é muito inferior ao que a recorrente diz ter pago.
[9] - Código de Processo Civil, anotado, Almedina, Volume II, 2017, páginas 735/736.
[10] - Às retribuições mínimas da tabela serão acrescidas diuturnidades de valor igual a 4,7% sobre a tabela do grupo IV, com arredondamento para a dezena de cêntimos mais próxima, por cada dois anos de permanência na empresa e em categoria sem acesso obrigatório, até ao limite de quatro diuturnidades.
[11] - Durante 14 meses: de 02.12.2011 a 02.12.2012, mais os Subsídios de férias e de Natal.
[12] - Sendo o valor constante do grupo IV o de € 739.00 e o da diuturnidade de 4,7% sobre aquele, cada diuturnidade é de € 34,73.
[13] - Durante 20 meses: de 02.12.2012 até à cessação do contrato, mais os subsídios de férias e de Natal.
[14] -Durante 14 meses: de 02.12.2011 a 02.12.2012, mais os Subsídios de férias e de Natal.
[15] - Durante 20 meses: de 02.12.2012 até à cessação do contrato, mais os subsídios de férias e de Natal.
[16] - Doravante CT2009 e dele são todos os artigos que não tenham menção de origem.
[17] - Tratado de Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais, 6ª edição - 2016, Almedina, páginas 302 e seguintes.
[18] - Mesma obra, página 305.
[19] http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/25ce25b6f74798c480257c0b00319f9f?OpenDocument
- Revista n.º 961/09.4TTVNG.P1.S1.
[20] - Manual de Direito do Trabalho, 2ª edição revista e atualizada, Verbo, 2014, página 491.
[21] -Todos os acórdãos que se mencionarem são da 4ª Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça, e encontram-se no sítio www.dgsi,pt/jst/nsf.
[22] - Estabelece competir às partes determinar, por acordo, a atividade para que o trabalhador é contratado, e da sua determinação ser feita no próprio contrato através da enunciação das funções que lhe caberão, ou por remissão para uma categoria normativa cujo conteúdo funcional venha definido num instrumento de regulamentação coletiva ou no regulamento da empresa.
[23] - A cláusula 75ª reclassificou o “Caixeiro-ajudante” em “empregado comercial-ajudante”.
[24] - Regula o regime transitório em caso de cessação de contrato de trabalho celebrado antes de 01 de novembro de 2011 e cessado depois dessa data.