Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
5115/07.1TTLSB.L1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: FFERNANDES DA SILVA
Descritores: EXTINÇÃO DO POSTO DE TRABALHO
DESPEDIMENTO ILÍCITO
REQUISITOS
PRESTAÇÕES INTERCALARES
JUROS DE MORA
Data do Acordão: 06/18/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL - RELAÇÕES JURÍDICAS / PROVAS - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / CUMPRIMENTO E NÃO CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES.
DIREITO DO TRABALHO - CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO / DESPEDIMENTO POR EXTINÇÃO DO POSTO DE TRABALHO.
Doutrina:
- Bernardo Lobo Xavier, Mário Pinto/Furtado Martins e Maria do Rosário Palma Ramalho, nas obras e locais identificados no Acórdão de 9.9.2009, do Supremo Tribunal de Justiça.
- Maria do Rosário Palma Ramalho, Direito do Trabalho, Parte II, 3.ª Edição, p. 981.
- Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 13.ª Edição, p. 591.
- Pedro Furtado Martins, Cessação do Contrato de Trabalho, 3.ª Edição, 2012, pp. 280, 281.
- Pires de Lima/Antunes Varela, ‘Código Civil’, Anotado, 4.ªEdição, Coimbra Editora, 1997, nota 5 ao artigo 805.º.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 342.º, N.º 2, 804.º, 805.º, 806.º, N.º1.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (NCPC): - ARTIGO 682.º, N.º3.
CÓDIGO DO TRABALHO/2003: - ARTIGOS 269.º, N.º4, 397.º, N.º2, ALÍNEAS A) A C), 402.º, 403.º, N.º 1 AL. B) E N.º3, 404.º, 429.º, ALÍNEA C), 432.º, ALÍNEA A), 437.º, N.ºS1 E 2.

Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:
-N.º 64/91, EM WWW.DGSI.PT .
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ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 18.1.2006, PROC. N.º 2840/05, IN CJ/S.T.J., TOMO I/2006;
-DE 10.1.2007, IN WWW.DGSI.PT
-DE 18.4.2007, PROC. N.º 4556/06;
-DE 1.10.2008, PROC. N.º 8/08, IN WWW.DGSI.PT
-DE 1.4.2009, PROC. N.º 3048/08;
-DE 9.9.2009, IN WWW.DGSI.PT ;
-DE 15.3.2012, PROC. 554/07.0TTMTS.P1.S1, IN WWW.DGSI.PT ;
-DE 21.3.2013, PROC. N.º 391/07.2TTSTRE.E1.S1.
Sumário :

I – A extinção do posto de trabalho determina o despedimento justificado por motivos económicos, tanto de mercado como estruturais ou tecnológicos relativos à empresa.

II – A licitude do despedimento com tal fundamento demanda todavia a verificação cumulativa dos requisitos plasmados no art. 403.º, n.º 1, ex vi do art. 432.º, alínea a), ambos do Código do Trabalho/2003.

III – A impossibilidade prática da subsistência da relação de trabalho assenta na demonstração de factualidade que revele que, uma vez extinto o posto de trabalho, inexiste outro compatível com a categoria do trabalhador, competindo a prova dessa circunstância ao empregador.

Assim não (será) quando, extinto o posto de trabalho em que o trabalhador despedido se ocupava, é, de seguida, contratado outro trabalhador a quem são cometidas várias das funções nucleares antes desempenhadas por aquele, com a concomitante despistagem das demais tarefas do múnus do primeiro por outros trabalhadores da R.

IV – Dispondo o empregador de todos os elementos necessários à liquidação das retribuições ‘intercalares ou de tramitação’, a que alude o n.º 1 do art. 437.º do Código do Trabalho/2003, são devidos juros de mora desde o vencimento das componentes retributivas que integram a respectiva compensação.

Decisão Texto Integral:

       Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

                                                                       I.

1.

AA, residente na Urbanização ..., Lote …, ..., intentou, em 19.11.2007, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, a presente acção declarativa, com processo comum, contra “BB, S.A.”, com sede na Rua …, n.º …, ..., pedindo que seja declarado ilícito o seu despedimento por extinção de posto de trabalho.

Solicita, em consequência, a respectiva reintegração e pede que lhe sejam pagas todas as quantias vencidas e vincendas, a que contratualmente tem direito e vinha auferindo, desde a data do despedimento até à data da efectiva reintegração, no valor total de € 41.674,95, acrescida de juros legais.

Mais pede a condenação da Ré a pagar-lhe as quantias de € 650,00 que lhe deixaram de ser pagas em Março, Abril e Maio de 2007, no valor de € 1.950,00, acrescida de juros legais; também as quantias mensais no valor de € 200,00, que lhe deixaram de ser pagas desde Janeiro de 2006, no valor de € 3.400,00, acrescidas dos juros legais e, ainda, uma indemnização por danos morais, num montante mínimo de € 22.500,00.

Alegou para o efeito, em síntese, que foi admitido ao serviço da Ré em 2 de Novembro de 1995, mediante um contrato de trabalho sem termo, tendo ultimamente a categoria profissional de Director de Serviços do Departamento de Administração e Finanças.

Auferia como vencimento base a quantia de 7.480,00 euros, acrescida de um subsídio mensal para despesas no valor de 650,00 euros, 200,00 euros de ajudas de custo e 4,99 de diuturnidades.

Foi notificado, em 9 de Maio de 2007, da decisão de despedimento por extinção do posto de trabalho, cujo processo padeceu de nulidade por não ter cumprido o prazo de cinco dias para comunicação da decisão.

Mais impugna os fundamentos da decisão porque o seu posto de trabalho não foi extinto.

A Ré contestou, pugnando, em suma, pela manutenção da decisão de despedimento, porquanto o posto de trabalho em apreço foi regularmente eliminado.

Saneada, instruída e discutida a causa, proferiu-se sentença, julgando a acção parcialmente procedente e, em consequência (transcrição do dispositivo):

- Declara-se ilícito o despedimento de que o autor foi alvo;

- Condena-se a ré, “BB – Laboratório de ..., SA” a pagar ao autor as retribuições – no valor de € 7.480,00 acrescido das diuturnidades de € 4,99 – vencidas no período compreendido entre 19 de Outubro de 2007 e 22 de Setembro de 2010, incluindo-se as férias, subsídios de férias e de Natal, acrescidas tais quantias de juros de mora, à taxa legal, desde a data de vencimento de cada uma das prestações até integral e efectivo pagamento, deduzidas as importâncias que o autor tenha comprovadamente obtido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento, devendo o empregador entregar o subsídio de desemprego auferido pelo autor ser deduzido e entregue pela ré à Segurança Social;

- Condena-se a ré, a ré “BB – Laboratório de ..., SA” a pagar ao autor a quantia global de € 2.600,00 (dois mil e seiscentos euros) referente às ajudas de custo no valor de € 200,00 mensais no período compreendido entre Janeiro de 2006 e Janeiro de 2007 inclusive, acrescida tal quantia de juros de mora à taxa legal desde a data de vencimento até integral e efectivo pagamento.

- Absolve-se a ré “BB – Laboratório de ..., SA” do demais peticionado.

2.

Inconformada, a Ré recorreu.

O mesmo fez o A.

Um e outro, porém, sem sucesso, pois o Tribunal da Relação de Lisboa, pelo Acórdão prolatado a 20.11.2013 – fls. 819-964 –, julgou improcedentes, por unanimidade, ambas as impugnações.

É contra o assim ajuizado que a Ré, ainda irresignada, se rebela, mediante recurso de Revista, cuja motivação remata com esta síntese conclusiva:

A. Emerge o presente recurso do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que negou provimento ao recurso de apelação interposto pela Recorrente e que, por conseguinte, confirmou a sentença do Tribunal do Trabalho de Lisboa que declarou a ilicitude do despedimento do Recorrido e condenou a Recorrente a pagar ao Recorrido juros de mora sobre as retribuições referentes ao período compreendido ente 19.10.2007 e 22.09.2010.

B. De acordo com o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, a declaração da ilicitude do despedimento do Recorrido fundamentou-se quer na improcedência dos motivos invocados para justificar o despedimento por extinção do posto de trabalho, quer na não demonstração, pela Recorrente, da impossibilidade da subsistência da relação de trabalho.

C. No que toca ao primeiro fundamento, (improcedência dos motivos invocados para justificar o despedimento por extinção do posto de trabalho), refira-se que a Recorrente cumpriu o ónus de provar os motivos invocados na carta de despedimento, como, aliás, decorre dos factos provados sob os pontos 2.1.63 a 2.1.67, inclusive.

D. Já quanto ao segundo (impossibilidade da subsistência da relação de trabalho), o mesmo concretiza-se na inexistência de posto de trabalho compatível com a categoria do trabalhador.

E. Sendo este um requisito negativo, impeditivo do exercício do direito pretendido pelo empregador - o de despedir o trabalhador por extinção do posto de trabalho - o ónus de prova dos factos integrantes de tal requisito, ou seja, a existência de um posto de trabalho compatível com a categoria do trabalhador, pertencia ao Recorrido.

F. Como tal, ao declarar a ilicitude do despedimento do Recorrido, quer com fundamento na improcedência dos motivos invocados para justificar o despedimento por extinção do posto de trabalho, quer na não demonstração, pela Recorrente, da impossibilidade da subsistência da relação de trabalho, o acórdão do Tribunal a quo violou o art. 402.º do Código do Trabalho/2003 e o art. 342.º/2 do CC, respectivamente.

G. Caso seja negado provimento ao presente recurso e, por conseguinte, seja confirmada a sentença no segmento que declarou a ilicitude do despedimento, o que se admite por mero dever de patrocínio sem contudo conceder, deverá de qualquer modo ser revogada tal decisão na parte em que condenou a Recorrente no pagamento de juros de mora sobre as retribuições referentes ao período compreendido entre 19.10.2007 e 22.09.2010.

H. Com efeito, tendo a Recorrente sido condenada a pagar ao Recorrido as retribuições referentes ao período compreendido ente 19.10.2007 e 22.09.20 1O, com as deduções previstas no art. 437.º/2 do CPT, incluindo subsídio de desemprego, e tendo ficado demonstrado que, durante tal período, o Recorrido recebeu, entre outras, aquela prestação social, faltando, no entanto, apurar os seus exactos montantes, conclui-se que a Recorrente foi condenada em quantia ilíquida, pelo que, enquanto tal quantia não for liquidada, não há lugar à contabilização de juros mora.

I. Como tal, ao condenar a Recorrente a pagar ao Recorrido juros de mora sobre as retribuições referentes ao período compreendido ente 19.10.2007 e 22.09.2010, quer a sentença do Tribunal do Trabalho de Lisboa, quer o acórdão da Relação de Lisboa que confirmou tal sentença neste segmento, violaram o disposto no art. 805.º/3 do CC.

Termina perorando que seja concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, seja revogado o acórdão da Relação de Lisboa e substituído por outro que declare a procedência dos motivos invocados pela Recorrente para o despedimento do Recorrido ou, em alternativa, que absolva a Recorrente do pedido de pagamento de juros de mora sobre as retribuições intercalares.

O recorrido não respondeu.

Já neste Supremo Tribunal, a Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer em que concluiu no sentido de que deve negar-se a revista, com manutenção do julgado.

Notificado às partes, reagiu a R./recorrente, no exercício do respectivo contraditório, reafirmando, a final, o sentido das conclusões oportunamente alinhadas no termo das suas alegações recursórias.

3.

O thema decidendum’.

Como flui das proposições conclusivas – por onde se afere e delimita o objecto e âmbito da impugnação, por via de regra, ressalvadas as temáticas de conhecimento oficioso –, são questões a dilucidar e resolver, atendíveis pela ordem da sua precedência lógica, as seguintes:

- Da (i)licitude do despedimento por extinção do posto de trabalho;

- Dos juros de mora sobre as retribuições intercalares. Momento da constituição em mora.

                                                                      __

Preparada a decisão, com prévia distribuição, pelos Exm.ºs Adjuntos, de cópia do projecto de Acórdão, cumpre ora analisar, ponderar e conhecer.

                                                                      II.

                                        Dos Fundamentos

1. De Facto.

Vem estabelecida a seguinte factualidade (que é, afinal, a fixada na sentença – com excepção para o consignado adiante, no ponto 27. – porquanto a impugnação parcial da matéria de facto deduzida pela Ré/recorrente foi julgada improcedente, ut fls. 888 do Aresto sub judicio):

1. O autor foi admitido ao serviço da ré em 2 de Novembro de 1995, mediante contrato de trabalho sem termo – (A);

2. Ultimamente o autor tinha a categoria profissional de Director de Serviços do Departamento de Administração e Finanças – (B);

3. No dia 23 de Março de 2007, o autor recebeu da ré a carta junta a fls. 48 – (C);

4. No dia 2 de Abril de 2007, o autor entregou à ré carta/resposta junta a fls. 54 – (D);

5. Posteriormente, em 9 de Maio de 2007, a ré entregou ao autor a carta de despedimento junta a fls. 71 que agora aqui se reproduz com o seguinte teor:

II. Motivos da extinção do posto de trabalho

1. Para efeitos do disposto no artigo 425.º, n.º 1, alínea a), do Código do Trabalho, informamos que os motivos que determinaram a extinção do posto de trabalho, implicando a cessação do contrato de trabalho em vigor, são os que a seguir se indicam.

2. A BB dedica-se à actividade de produção e comercialização.

3. Nos últimos 7 anos, os resultados de exploração da BB têm evidenciado uma quebra da respectiva actividade, conforme o atestam os resultados.

De facto, nos de 2000, 2001 e 2002, a BB apresentou resultados líquidos do exercício negativos, respectivamente, de € 632.084,98, € 1.424.017,72 e € 675.454,44.

Em 2003, assistiu-se a uma ligeira recuperação, a qual permitiu à empresa atingir um resultado positivo de € 374.255,14.

Todavia, nos últimos 3 anos, os resultados da BB revelam uma curva descendente, sendo previsível que o resultado de 2006 não ultrapasse os € 130.000,00, ou seja, cerca de um terço do verificado em 2003, quando a empresa aparentemente teria iniciado um processo de crescimento deste indicador.

Aliás, na oposição escrita deduzida à extinção do posto de trabalho, V. Ex.ª apresenta os resultados da empresa para o período 2003-2006.Tais resultados confirmam a curva descendente e a queda de cerca de um terço, verificada nos últimos 3 anos.

4. Por outro lado, pelo menos desde 1999 que o montante dos resultados anuais da BB se tem mantido em nível inferior aos dos seus concorrentes.

Diversamente do sustentado por V. Ex.ª na oposição escrita, essa realidade não resulta do facto de a Empresa afectar uma parcela relevante de recursos à promoção dos 3 produtos mais comercializados. Pelo contrário, é essa afectação que tem permitido um elevado nível de vendas desses produtos.

5. A nível das vendas, os resultados da BB estão fortemente dependentes do medicamento “B...”, dado que este representa cerca de 42% das vendas totais da empresa.

O preço de venda deste medicamento beneficiava da comparticipação do Estado.

Porém, em 09.01.2006, o “B...” foi excluído da comparticipação no preço.

Este facto acarretou um aumento de preço para os consumidores e a consequente quebra das respectivas vendas, reflectindo-se negativamente nos resultados da BB.

Assim, a exclusão do “B...” da comparticipação importou, logo no final de 2006, uma quebra de 14% das respectivas vendas.

Para o ano de 2007, estima-se que tal quebra de vendas se situe entre 15% e 20%, juntando-se a estes valores a quebra de 14% nas vendas do ano de 2006.

Acresce que o preço de venda ao público deste medicamento em Portugal é o mais baixo em comparação com os restantes países da Europa, nos quais o mesmo é comercializado, pelo que a diminuição das respectivas vendas no nosso país tem um impacto superior.

6. Por outro, o ano de 2006 acarretou um aumento do passivo da BB, para € 7.676.240,00, o que representa a inversão do verificado em 2005, ano no qual a empresa tinha conseguido reduzir o passivo para € 6.835.741,00.

Estes indicadores colocaram a BB numa situação estrutural de desequilíbrio económico-financeiro, que nem as sucessivas transferências da empresa-mãe, CC, têm atenuado.

7. De facto, verifica-se que tendo a BB um capital social de € 4.050.000,00, os respectivos fundos próprios cifram-se em € 2.604.000,00, o que representa uma perda significativa do capital social.

Sobre este ponto, refere V. Ex.ª na oposição escrita que em 2002 se verificava uma perda ainda maior do capital social daquela que se verificava em 2006, pelo que a menção à perda de parte significativa do capital social se afigura desprovida de sentido. Ora, dado que os indicadores referidos no parágrafo anterior correspondiam à realidade, é um facto que os mesmos traduzem uma situação financeira gravosa, traduzida, reitera-se, na perda de uma parte significativa do capital social.

No final de 2006, o montante da dívida da BB à CC ascendia a cerca de € 3.732.884,00, o que representa praticamente 50% do total do passivo da primeira.

Por outro lado, a dívida a fornecedores mais do que duplicou de 2005 para 2006, passando de € 370.035,00 para € 735.468,00.

Acresce que a BB não reduziu o nível de endividamento junto das instituições de crédito, o qual se manteve em cerca de € 2.000.000,00.

Este montante é, aliás, confirmado por V. Ex.ª na oposição escrita que deduziu.

Num plano global, a taxa de endividamento da BB – resultante do rácio entre o total das dívidas e o total dos activos – ascendia em 2006 a um nível preocupante de 75%, tendo aumentado 2% face a 2005.

Por fim, e apesar destes indicadores, os custos com salários aumentaram de 2005 para 2006, tendo o acréscimo se cifrado no final deste último ano em € 547.541,00, o que é, de todo em todo, insuportável para a BB.

A este respeito, refira-se que em 2006 o custo com a retribuição do Director de Administração e Finanças (excluindo encargos com a segurança social) excedeu € 109.000,00, um valor ligeiramente inferior aos resultados líquidos da BB em 2006 e bastante superior a idêntico custo com as restantes direcções da empresa.

8. Pelos motivos acima descritos se conclui que o aumento dos custos e do passivo da BB não tem sido acompanhado por um aumento dos proveitos, bem pelo contrário, o que agudizará em 2007 em virtude da continuação da quebra das vendas do “B...”.

Por outro lado, a crescente dependência financeira da BB perante a CC é uma realidade que V. Ex.ª confirma na oposição escrita.

De facto, parte dos resultados da CC, sem a qual os resultados daquela já teriam sido negativos em 2006, conforme concretizado por V. Ex.ª. ao apontar que 77% das compras da primeira foram realizadas à segunda.

9. A dependência financeira da BB face à CC gera ainda a dependência a nível da própria gestão financeira.

Este aspecto, a par da situação económico-financeira acima descrita, é essencial na compreensão dos motivos de ordem estrutural que determinaram a necessidade de extinguir o posto de trabalho de V. Ex.ª.

Com efeito, o orçamento anual da BB é elaborado pela direcção financeira da CC, que procede igualmente à monitorização da respectiva execução, através das necessárias análises financeiras.

Sendo que o Director de Administração e Finanças da BB, na vertente financeira, funciona apenas como um compilador de elementos para a Direcção Financeira da CC. Donde, não corresponde à realidade que o planeamento e a execução financeira da Empresa seja efectuado por V. Ex.ª.

Ora, o posto de trabalho que era ocupado por V. Ex.ª compreendia, precisamente, as funções de vertente financeira, relativamente às quais se verificou um progressivo esvaziamento, em virtude dos motivos acima expostos.

Na verdade, como bem refere V. Ex.ª na oposição escrita, a autonomização dos restantes departamentos que integram a Direcção de Administração e Finanças da BB conduziu à necessidade de reestruturação organizativa da Empresa, porquanto, do ponto de vista funcional e de racionalidade económica, deixou de fazer sentido manter em Portugal o seu posto de trabalho.

Donde, é falso que as funções que integram actualmente o posto de trabalho de V. Ex.ª vão continuar a ser exercidas, dado que as mesmas se encontram esvaziadas de conteúdo útil, facto que é confirmado na oposição escrita, ainda que os motivos aí invocados não correspondam à realidade, dado que tal esvaziamento não resultou de decisões hostis da Empresa para com o Director de Administração e Finanças.

A título de exemplo, como bem refere V. Ex.ª na oposição escrita, desde 2004 que a área de Recursos Humanos não integra o conteúdo das suas funções.

Igualmente tem competido à responsável da Contabilidade, DD, o acompanhamento operacional do desenvolvimento em Portugal da nova aplicação informática de gestão integrada do Grupo CC, sem qualquer intervenção por parte do Director de Administração e Finanças.

(…).” – (E);

6. Ainda por carta datada de 09.05.2007 a BB enviou à Inspecção-‑Geral do Trabalho cópia da decisão final, nos termos da parte final do n.º 2 do artigo 425.º do Código do Trabalho – (F);

7. A BB transferiu, no dia 05.07.2007, o montante de € 99.795,44 para a conta bancária do autor – (G);

8. No dia 08 de Maio de 2007, o então Director da ré, Senhor EE, enviou uma comunicação interna via correio electrónico, a vários colaboradores, com o assunto “reestruturação do departamento financeiro”, nos termos da qual na sequência da reorganização decidida pelo Conselho de Administração da empresa, as tarefas e os relatórios anteriormente da responsabilidade do autor ficariam repartidos da seguinte forma:

- Estabelecimento dos balanços mensais, reporting financeiro para a gerência ficam até nova ordem a cargo de Dr.ª DD (a.i.);

- Planos de tesouraria, estatísticas de tesouraria, reporting de tesouraria ficam sob a responsabilidade de FF;

- Estatísticas de vendas mensais (unidades e valores, acumulado móvel a 2 meses) para divulgação interna e externa (licenciadores, Sr. GG) ficam a cargo da Eng.ª HH;

- Os custos directos serão directamente controlados pelo Sr. II;

- A revisão dos preços de venda, as declarações sobre os mesmos ao Infarmed, à Direcção Geral da Empresa, à JJ, etc., serão da responsabilidade da Dr.ª DD (a.i.);

- Todas as pastas de correspondência com os licenciadores ficarão a cargo de KK;

- As declarações mensais de impostos sobre medicamentos serão da responsabilidade Dr.ª DD (a.i.);

- O reembolso do empréstimo ao BPI ficará a cargo de FF;

- As relações com os bancos ficarão a cargo de FF no que se refere à parte financeira e a cargo de FF;

- As relações com os bancos ficarão a cargo de FF no que se refere à parte financeira e a cargo da Dr.ª LL no que se refere à parte administrativa.

Cabe a cada um dos intervenientes organizar com o Dr. AA a transferência da informação e dos dados de que a partir de agora fica responsável. – (H);

9. Em 2000 a ré começou a fabricar para a CC produtos de baixa tecnologia – supositórios -, obrigando à utilização intensiva de mão-de-obra – (I);

10. Após um ano de intenso fabrico de supositórios, em 2001 e 2002 o fabrico caiu para metade e, em 2003, a CC (e a ré também) abandonou a comercialização de supositórios – (J);

11. Em 2001, o autor teve a actualização salarial média da Empresa – 4%, ou seja, a remuneração desse ano foi de € 103.785 - (K);

12. Em 2005, o autor teve nova actualização salarial (de 3%, como a generalidade dos trabalhadores da empresa), tendo o salário anual ficado estabelecido em € 106.927 – (L);

13. O autor devolveu à ré o montante indemnizatório que esta lhe havia transferido para a sua conta bancária, no montante de € 94.343,86 – (M);

14. A BB dedica-se à actividade de produção e comercialização de produtos farmacêuticos – (N);

15. Em 2003, a empresa atingiu um resultado positivo de € 374.255,14 – (O);

16. O autor auferia vencimento base mensal de € 7.480,00, acrescido de diuturnidades no valor de € 4,99 – (P);

17. Do documento junto a fls. 84 dos autos resulta que o Conselho de Administração, composto por três elementos, e do Director Geral (na altura o Senhor EE), encontra-se a Directora dos Recursos Humanos, Ex.ma. Senhora Dr.ª LL e um “controlling”, a preencher – (Q);

18. Passados poucos dias do despedimento do autor foi contratada a Dr.ª MM para assumir as funções de “controller”, tendo iniciado as suas funções em 1 de Julho de 2007 – (R;

19. Em 1995, a ré teve resultados negativos de 29.841.543$00 (€ 148.848,99) – (S);

20. Nos anos seguintes a ré continuou com resultados positivos, de fraca expressão, e em 1999 voltou a apresentar resultados negativos – (T);

21. O período 1995-2001 foi marcado pela construção duma nova unidade fabril em que a BB investiu cerca de € 10.000,00 – (U);

22. Desde o início do desempenho de funções na BB, teve o autor direito a viatura de serviço para utilização plena a expensas totais da ré – (V);

23. Em Maio de 2005, essa viatura era um ... 2.0i, de 1999 – (W);

24. Autor e ré assinaram um acordo em que esta lhe cedeu, a título gratuito, a referida viatura e substituiu a viatura de serviço por uma compensação mensal de € 650,00, a documentar com mapas de quilómetros, a qual deixou de ser paga, sem qualquer justificação ou explicação, em Fevereiro de 2007 – (X);

25. O Director Geral comprometeu-se a complementar esta compensação com o pagamento de três dias de ajudas de custo mensais, ou seja, mais de cerca de € 200,00 mensais – (Y);

26. A BB tinha um capital social de € 4.050.000,00 – (Z);

27. Dá-se por integralmente reproduzido o documento de fls. 83 – (AA).

[Cabe neste particular fazer um parêntesis[1] para salientar que este ponto de facto tem que ser dado como não escrito, mais que não seja ao abrigo do disposto no artigo 646.º, nº 4, do CPC, ex vi da al a) do n.º 2 do artigo 1.º do CPT, visto que – como é bem sabido - um documento não é um facto (nem equivale a um facto), mas um meio de prova. 

Todavia sempre pode substituir-se tal redacção pela seguinte:

27. – Em 8 de Maio de 2007, pelas 11h01m, a Ré enviou ao Autor um mail, intitulado de reestruturação de departamento financeiro, com o teor constante de fls. 83 dos autos que aqui se dá por integralmente reproduzida].                                                                       

28. A compensação mensal de € 650,00 por deslocações, e as ajudas de custo de cerca de € 200,00, só não foram pagas ao autor a partir de Fevereiro de 2007 por este não ter apresentado à BB os mapas de quilómetros que justificariam a atribuição daquela quantia – (AB);

29. O autor requereu a pensão de velhice, a qual teve início em 22 de Setembro de 2010, sendo o seu valor, àquela data, de € 3.300,28 – (AC);

30. A pensão de velhice foi concedida ao autor ao abrigo do disposto nos artigos 57.º e 58.º do Decreto-Lei n.º 220/2006 – (AD);

31. a.i.”, referido na comunicação junta como documento de fls. 83 significa ‘interinamente’ (1.º);

32. Ao “controller” incumbe preparar os orçamentos da ré, fazer o respectivo seguimento e elaborar o “reporting” para a “casa-mãe” – (3.º);

33. A Dr.ª MM foi contratada através de um contrato sem termo e com a antiguidade que tinha na sua anterior empresa – (4.º);

34. Estas funções estavam cometidas ao autor – (5.º);

35. Estas funções continuaram a ser exercidas na empresa local (BB) – (6.º);

36. O autor desempenhava e/ou coordenava as tarefas que passaram a ser exercidas pelos seguintes trabalhadores:

(i) A elaboração dos balanços mensais, o “reporting” financeiro para a gerência/direcção geral, a preparação dos orçamentos, respectivo seguimento e elaboração do “reporting” para a “casa-mãe” – a nova controller, Dr.ª MM;

(ii) Os planos de tesouraria e “reporting” de tesouraria, D.ª FF;

(iii) As estatísticas de vendas mensais (unidades e valores), para divulgação interna e externa, (licenciadores, Sr. GG) – Eng.ª HH e posteriormente pela Dr.ª MM;

(iv) Os custos directos – Dr.ª DD e posteriormente Dr.ª MM;

(v) A revisão de preços de venda, declarações sobre os mesmos ao Infarmed, à Direcção Geral da Empresa, à “JJ”, etc. – Dr.ª DD;

(vi) Pastas de correspondência com os licenciadores – D. KK;

(vii) As declarações mensais de impostos sobre medicamentos – Dr.ª DD;

(viii) O reembolso do empréstimo BPI –FF;

(x) As relações com os bancos, na parte administrativa – Dr.ª LL;

(xi) Recursos Humanos (departamento este que foi da responsabilidade do autor até Setembro de 2004) – Dr.ª LL – (art. 7.º);

37. Algumas das tarefas citadas passaram, tal como acontecia com o autor antes da sua saída, a ser coordenadas e planeadas pela Dr.ª MM – (8.º e 9.º);

38. A evolução negativa dos resultados da empresa não é exclusiva do período mencionado na carta do despedimento – (10.º);

39. O investimento da BB na nova unidade fabril foi financiado por fundos do PEDIP II (em cujo projecto o autor participou muito activamente, quer ao nível da elaboração e apresentação, quer ao nível da gestão e organização) no montante de € 838.961,00, a fundo perdido, e € 2.493.989,00 sob a forma de subsídio reembolsável, transformado em empréstimo bancário – (12.º);

40. O accionista maioritário da BB contribuiu para o financiamento em montante não concretamente apurado – (13.º);

41. Foi utilizado um empréstimo bancário e libertados fundos EFTA em montante não concretamente apurado – (14.º);

42. Um dos pressupostos da viabilidade deste investimento era a transferência do fabrico de vários medicamentos de Genebra para a BB – (15.º);

43. Houve recrutamento de pessoas para trabalhar – (16.º);

44. As vendas da ré sempre estiveram condicionadas pelos produtos oriundos da CC, sendo estes a prioridade do esforço comercial – (17.º);

45. De facto, em 2006, dos 1.151.883 € que custou a promoção directa, 27% foram gastos com B..., 13% com D… e 9% com U… – (24.º);

46. Estes três produtos são os mais importantes da CC – (25.º);

47. O princípio activo incorporado no B... adulto representa, ao preço de compra à CC, 79% do preço de venda líquido de descontos e taxas – (29.º);

48. Numa representação dum produto de outro fornecedor, o custo do princípio activo está fixado contratualmente em 40% do valor líquido das vendas – (30.º);

49. Na prática tem sido, desde há pelo menos dez anos, 30% (por sucessivos acordos entre as partes), tendo a Direcção-Geral da Empresa, em conversas com o autor, expressado o sentimento de que haveria que negociar a baixa dessa percentagem, em relação a terceiros, por ser demasiado elevada – (31.º);

41. O U…é comprado à CC em cápsulas “bulk”, ao preço de 0,42336 € por cápsula, sendo cada unidade de venda ao público de trinta cápsulas, ou seja, o custo das trinta cápsulas é de € 12,70 – (32.º);

2.1.42. (É esta a numeração sequencial constante do alinhamento da matéria de facto feito no Acórdão em análise, que se respeita).

Mas como a BB vende este produto, líquido de descontos e taxas, a € 15,20 significa que as cápsulas custam 83,6% do preço de venda – (33.º);

2.1.43. A ré perdia dinheiro na comercialização da U... – (34.º);

2.1.44. Acresce que o valor total das compras da ré foi, em 2006, de € 8.111.411,00, dos quais € 6.218.861,00 à CC – (35.º);

2.1.45. Uma parte destas compras refere-se a produtos acabados de terceiros que a BB poderia comprar directamente aos licenciadores/fornecedores dos mesmos, mas que, por decisão da Administração da CC/BB, são comprados à CC, por um valor superior ao que esta adquiriu ou que a ré poderia adquirir directamente – (36.º);

2.1.46. Os referidos produtos são enviados pelos licenciadores/fornecedores directamente para a ré, conforme as ordens de compra à CC – (37.º);

2.1.47. O princípio activo usado no fabrico de B... é comprado à CC – (38.º);

2.1.48. A CC “obriga” a ré a comprar-lhe e revender ao preço de compras, à NN–México - (41.º);

2.1.49. Pelo menos desde 2002, em ano nenhum as vendas do B... representaram 42% do total – (45.º);

2.1.49. Esta perda de importância relativa consta do documento a que internamente se chamou “reflexão estratégica”, entregue no Infarmed no início de 2005, junto como documento n.º 7 à petição inicial – (46.º);

2.1.50. As vendas de 2006 de B... ascenderam a € 4.022.454,00 e a previsão para 2007, saída da reunião de Novembro da Administração com a Direcção da empresa, é de € 4.631.741,00 – (47.º);

2.1.51. A previsão de crescimento de vendas de B... para 2007, elaborada pelo então Director Geral da BB, previa um crescimento de 7,2% para € 4.312.114,00 – (48.º);

2.1.52. O aumento do passivo de € 840.499,00, foi compensado por um aumento de maior expressão do activo de € 966.037,00 – (49.º);

2.1.53. A autonomia financeira da ré subiu para pelo menos 25% do ano de 2006 – (50.º);

2.1.54. O endividamento junto dos outros fornecedores era, em 31 de Dezembro de 2005 e de 2006, o decorrente da actividade normal da empresa e correspondia ao período de pagamento que os fornecedores de bens e serviços concedem, sendo no âmbito das compras que a evolução do saldo deve ser justificada – (51.º);

2.1.55. O endividamento diminuiu entre 1 de Janeiro e 31 de Dezembro de 2006 de € 3.000.000,00 para € 2.000.000,00 – (53.º);

2.1.56. O salário do autor foi fixado em 20.000.000$00 anuais/€ 99.759,58 – (57.º);

2.1.57. Este salário representou um aumento de 30% face ao auferido no ano anterior, com o esclarecimento de que ficou a dever-se à incorporação dos prémios no salário – (58º);

2.1.58. A construção da nova fábrica estava nessa altura em fase de finalização e o autor teve papel decisivo na elaboração da 2.ª versão submetida ao IAPMEI para apoios do PEDIP II – (59.º);

2.1.59. Por acção directa do então Administrador e Director-Geral da BB, Sr. OO, assessorado pelo autor, conseguiu-se fazer inverter a decisão do IAPMEI e obter o acordo para apresentar uma nova versão do projecto de investimento, tendo sido mobilizada para o projecto toda a equipa directiva da empresa, mas a maior carga de trabalho e responsabilidade recaiu sobre o autor – (61.º);

2.1.60. O autor possuía uma pós-graduação em Sistemas de Informação e era o único portador de tal habilitação na BB – (66.º);

2.1.61. No ano de 2004, a ré autonomizou o departamento de recursos humanos, tendo sido criado novo cargo de Direcção e contratada uma pessoa para tal cargo – (72.º);

2.1.62. O autor ficou triste com o seu despedimento – (77.º);

2.1.63. Nos anos de 2000, 2001 e 2002, a BB apresentou resultados líquidos do exercício negativos, respectivamente, de € 632.084, € 1.424.017,72 e € 675.454,44 – (83.º);

2.1.64. O preço de venda do “B...” beneficiava de comparticipação do Estado – (87.º);

2.1.65. Em data não concretamente apurada, mas no ano de 2006, o “B...” foi excluído da comparticipação no preço – (88.º);

2.1.66. O facto referido no número anterior acarretou aumento de preço para alguns dos consumidores, tendo existido quebra nas vendas – (89.º);

2.1.67. Em 2006, houve um aumento de passivo – (93.º);

2.1.68. Em 2006, os respectivos fundos próprios cifravam-se em € 2.604.000,00 – (95.º);

2.1.69. Competiu à responsável da contabilidade, DD, o acompanhamento operacional do desenvolvimento em Portugal da nova aplicação informática de gestão integrada do Grupo CC, sem qualquer intervenção por parte do Director de Administração e Finanças – (108.º);

2.1.70. O organograma junto a fls. 84 não foi aprovado – (119.º);

2.1.71. O organograma que foi aprovado foi o de fls. 150 – (120.º);

2.1.72. A Dr.ª MM foi admitida ao serviço da ré com a categoria profissional de chefe de serviços, a fim de desempenhar funções essencialmente de “controlling” e controle de gestão – (121.º);

2.1.73. Após a saída do autor, FF participou na elaboração de planos de tesouraria com o esclarecimento que esta, antes, era tarefa do autor – (124.º);

2.1.74. KK esteve sempre responsável pelo arquivo da Direcção Geral – (125.º);

2.1.75. O autor sempre actuou na dependência directa apenas do Director-Geral da BB, responsável máximo da ré – (132.º).

                                  ___

A matéria de facto vinda de reeditar não se mostra questionada, nem se vislumbra qualquer das situações previstas no n.º 3 do art. 682.º do NCPC, pelo que será com base nos factos estabelecidos que hão-de resolver-se as questões suscitadas no presente recurso.

                                                                    ___

2. - Os Factos e o Direito.

2.1

A equação do caso sujeito.

Como se constata, as Instâncias coincidiram no juízo alcançado, ambas concluindo pela ilicitude do despedimento do A., promovido pela Ré, por …não se considerar demonstrado o requisito da impossibilidade prática da subsistência da relação de trabalho e os motivos alegados para a extinção do posto de trabalho.

Suporta-se a deliberação sub specie, basicamente, – …para além do convocado quadro legal definido nos arts. 402.º, 403.º, 404.º, 423.º a 425.º do Código do Trabalho/2003[2] e dos factos provados com relevância directa para o efeito -, na fundamentação jurídica da sentença que sindicou, cujas proposições mais impressivas (transcreveu e) subscreveu.

O parametrizado quadro de subsunção, identificado nos seus traços gerais e densificado com pertinentes referências doutrinais e jurisprudenciais, não sofre concreta controvérsia, fundando-se a Revista na pretensa violação de lei substantiva, seja na forma de erro de interpretação ou de aplicação, seja na de erro de determinação da norma aplicável.

Cumpre-nos ora a tarefa de surpreender e eleger – no contextualizado circunstancialismo e à luz da normatividade ínsita nas previsões legais atinentes – a solução certa.

                                                                      __

2.2

- Da extinção do posto de trabalho vs. (i)licitude do despedimento.

A R. procedeu ao despedimento do A. enquanto resultado da extinção do seu posto de trabalho.

Licitamente?

Relembramos – em complemento das aduzidas premissas jurídicas basilares da questão primeira – as seguintes considerações, expendidas oportunamente[3], num contexto com estreitas afinidades com a situação que ora nos (pre)ocupa.

Esta modalidade de despedimento – cessação do contrato de trabalho por iniciativa do empregador com fundamento em causa objectiva/motivada - foi introduzida no nosso ordenamento jurídico pelo art. 26.º e seguintes da LCCT – como nos lembra Maria do Rosário Palma Ramalho[4] –, visando cobrir as situações de inexigibilidade do vínculo ao empregador por razões atinentes ao funcionamento da empresa.

A sua configuração originária, constitucionalmente legitimada[5], manteve-se na estrutura do Código do Trabalho de 2003[6], com pequenas modificações de pormenor.

Pode dizer-se, em termos embora algo simplistas, que o despedimento por extinção do posto de trabalho se perfila como uma variante individual do despedimento colectivo[7], já que a sua motivação económica é essencialmente coincidente, achando-se a única diferença no número de trabalhadores abrangidos por uma e outra das medidas.

É a própria Lei, aliás, que confere ao primeiro feição subsidiária relativamente ao segundo – cfr. art. 398.º e seguintes, ex vi do art. 404.º

A extinção do posto de trabalho determina, pois, o despedimento justificado por motivos económicos que, consoante a noção do art. 402.º, tanto podem ser de mercado, como estruturais ou tecnológicos, relativos à empresa, nos termos previstos para o despedimento colectivo, e será a alternativa a seguir quando se não verifique o regime definido para aplicação deste – art. 403.º, n.º 1, d).

Assim, na caracterização dos motivos, diz-nos o n.º 2, alíneas a) a c), do art. 397.º, que constituem motivos de mercado a redução da actividade da empresa provocada pela diminuição previsível da procura de bens ou serviços ou impossibilidade superveniente, prática ou legal, de colocar esses bens ou serviços no mercado; prefiguram motivos estruturais o desequilíbrio económico-financeiro, mudança de actividade, reestruturação da organização produtiva ou substituição de produtos dominantes, enquanto os motivos tecnológicos consistem em alterações nas técnicas ou processos de fabrico, automatização dos instrumentos de produção, de controlo ou de movimentação de cargas, bem como a informatização de serviços ou automatização de meios de comunicação.

O despedimento por extinção do posto de trabalho só pode ter lugar desde que, cumulativamente, se verifiquem os requisitos elencados no art. 403.º, e será ilícito, v.g., nas situações previstas nos arts. 429.º, alínea c) e 432.º, alínea a), reportada ao n.º 1, b) e n.º 3 do art. 403.º (nas duas circunstâncias que concretamente importa reter): se forem declarados improcedentes os motivos justificativos invocados para o despedimento e se não for praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho, impossibilidade só havida como tal se/desde que, extinto o posto de trabalho, o empregador não disponha de outro que seja compatível com a categoria do trabalhador.

Importa assinalar, por outro lado, que, ante um cenário de facto que se subsuma numa das situações previstas neste quadro normativo de fundo, a sindicabilidade jurisdicional da actuação gestionária do empregador é bastante limitada, como é jurisprudencialmente entendido, de modo pacífico e reiterado.

[Lembramos, inter alia, os Acórdãos de 10.1.2007, in www.dgsi.pt, e de 1.10.2008, (este tirado na Revista n.º 8/08, desta 4.ª Secção), invocados no Acórdão deste Supremo Tribunal de 9.9.2009, acima identificado, em cujos termos há que ter presente, aquando da apreciação acerca da verificação ou não do motivo justificativo invocado para a cessação, que as decisões técnico-económicas ou gestionárias a montante da extinção do posto de trabalho estão cobertas pela liberdade de iniciativa dos órgãos dirigentes da empresa.

O entendimento constante das decisões destes Arestos é, aliás, conforme à compreensão da doutrina[8] traduzida, por exemplo, nas palavras exactas de Monteiro Fernandes[9]:

‘O “momento” decisivo, sob o ponto de vista do regime do despedimento – isto é, da sua motivação relevante – parece localizar-se, não no feixe de ponderações técnico‑económicas ou gestionárias a que alude o art. 397.º/2 (e que são cobertas pela liberdade de iniciativa do titular da empresa), mas a jusante daquele, no facto da extinção do posto de trabalho, produto de uma decisão do empregador, e nesse outro facto que é a constatação da inexistência de função alternativa para o trabalhador que o ocupava – constatação essa também suportada, em certa medida, pelo critério organizacional do empregador.

Está-se, pois, perante uma forma de despedimento que culmina uma cadeia de decisões do empregador situadas em diferentes níveis mas causalmente interligadas: esquematicamente, uma decisão gestionária inicial, uma decisão organizativa intermédia (a da extinção do posto) e uma decisão ‘contratual’ terminal (a do despedimento’)].

Cuidando-se, como in casu, de ajuizar acerca do despedimento por extinção do posto de trabalho, a operação centrar-se-á na apreciação da genuinidade dos motivos alegadamente determinantes, na falada dimensão, ou seja, não tanto – nem decisivamente – na perspectiva da bondade/oportunidade da decisão gestionária do empregador, mas fundamentalmente na análise do juízo de consequencialidade[10] entre os motivos pretextados pelo empregador para o despedimento e a decisão de fazer cessar, concretamente, o posto de trabalho em causa, juízo esse que sempre implicita, naturalmente, uma actuação empresarial razoável e séria.

Com efeito, se é certo, como convimos, que, numa economia aberta ou de mercado, a redução/eliminação de emprego inere ao direito de livre iniciativa económica – …não sendo o despedimento (colectivo ou por extinção do posto de trabalho) solução apenas equacionável para situações terminais de iminente inviabilidade económica/insolvência, como flui da heterogeneidade dos motivos legitimadores –, igualmente seguro é que se exige que os motivos adrede invocados pelo empregador sejam reais e congruentes, sobre si impendendo a respectiva alegação e demonstração.

A razão de ser desta exigência é óbvia: nas palavras certas de Monteiro Fernandes[11], a mesma - …sabido que não são legalmente consentidos os despedimentos imotivados/‘ad nutum’ ou fundados na mera oportunidade ou conveniência empresarial - prende-se com a necessidade de assegurar a possibilidade de ‘verificação externa’ de que não se pretende encapotar, sob a aparência de um expediente legalmente admitido, um despedimento irregular.  

                                                                      __

Delineadas as coordenadas cardeais que enquadram a apreciação que nos demanda o caso presente, prossigamos.

Como vimos, a deliberação sob protesto acompanhou e ratificou integralmente a sentença apelada, concluindo que a R. não demonstrou os motivos alegados para a extinção do posto de trabalho nem o requisito da impossibilidade prática da subsistência da relação de trabalho.

Importa relembrar a factualidade relevante.

A R. comunicou ao A., em 9 de Maio de 2007, por escrito, a extinção do seu posto de trabalho e o seu consequente despedimento.

Reportados a tal comunicação (doc. de fls. 71, ut ponto 5. da FF), vê-se que a R. aduziu então basicamente os motivos seguintes, que se resumem:

- Os resultados de exploração da R. têm evidenciado, nos últimos 7 anos, uma quebra da sua actividade, com resultados líquidos de exercício negativos nos anos de 2000, 2001 e 2002, de respectivamente € 632.084,98, 1.424.017,72 e € 675.454,44;

- Em 2003 houve uma ligeira recuperação, permitindo à empresa alcançar um resultado positivo;

- Porém, nos últimos 3 anos, os seus resultados revelam uma curva descendente, sendo previsível que o resultado de 2006 não ultrapasse os e 130.000,00…

(…)

- A nível de vendas, os resultados da R. ‘BB’, estão fortemente dependentes do medicamento ‘B...’, dado que este representa cerca de 42% das vendas totais da empresa e cujo preço de venda era comparticipado pelo Estado, deixando de o ser a partir de Janeiro de 2006;

- Este facto acarretou um aumento de preço para os consumidores e a consequente quebra de vendas, com reflexo nos resultados negativos da R.

- Para o ano de 2007 estima-se que tal quebra se situe entre os 15% e os 20%, juntando-se a estes valores a quebra de 14% nas vendas do ano de 2006;

- Estes indicadores colocaram a ‘BB’ numa situação estrutural de desequilíbrio económico-financeiro, que nem sucessivas transferências da empresa-‑mãe ‘CC’ têm atenuado;

(…)

- Por fim, e apesar destes indicadores, os custos com salários aumentaram de 2005 para 2006…o que é, de todo em todo, insuportável para a R., referindo-se que em 2006 o custo com a retribuição do Director de Administração e Finanças (excluindo encargos com a Segurança Social) excedeu € 109.000,00…

- Pelos motivos acima descritos se conclui que o aumento dos custos e do passivo da ‘BB’ não tem sido acompanhado por um aumento de proveitos, bem pelo contrário, o que se agudizará em 2007 em virtude da continuação da quebra das vendas do ‘B...’;

- Por outro lado, a crescente dependência financeira da ‘BB perante a ‘CC’ é uma realidade que V. Exc.ª confirma na oposição escrita, aspecto que, a par da situação económico-financeira descrita, é essencial na compreensão dos motivos de ordem estrutural que determinam a necessidade de extinguir o posto de trabalho de V. Ex.ª.

- Com efeito, o orçamento anual da BB é elaborado pela direcção financeira da CC, que procede igualmente à monitorização da respectiva execução, através das necessárias análises financeiras, sendo por isso que o Director de Administração e Finanças da BB, na vertente financeira, funciona apenas como um compilador de elementos para a Direcção Financeira da CC. Donde, não corresponde à realidade que o planeamento e a execução financeira da Empresa seja efectuado por V. Exc.ª.

- Ora, o posto de trabalho que era ocupado por V. Exc.ª compreendia precisamente as funções de vertente financeira relativamente às quais se verificou um progressivo esvaziamento, em virtude dos motivos acima expostos, deixando de fazer sentido, do ponto de vista funcional e da racionalidade económica, manter em Portugal o seu posto de trabalho;

(…)

- Passados poucos dias do despedimento do A., foi contratada a Dr.ª MM, mediante contrato sem termo e com a antiguidade que tinha na sua anterior empresa, para assumir as funções de controller, tendo iniciado as suas funções em 1 de Julho de 2007, funções essas que antes estavam cometidas ao A. ...e que continuaram a ser exercidas na empresa local (‘BB’);

- Ao controller incumbe preparar os orçamentos da R. e fazer o respectivo seguimento e elaborar o ‘repporting’ para a ‘casa-mãe’;

- O A. desempenhava e/ou coordenava, além disso, as tarefas que passaram a ser exercidas por outros trabalhadores, (sublinhados agora), a saber:

. A elaboração dos balanços mensais, o ‘repporting’ financeiro para a gerência/direcção geral, a preparação dos orçamentos, respectivo seguimento e elaboração do ‘repporting’ para a casa-mãe – a nova controller Dr.ª MM;

. Os planos de tesouraria e ‘repporting’ de tesouraria – Dr.ª FF;

. As estatísticas de vendas mensais (unidades e valores), para divulgação interna e externa (licenciadores, Sr. GG) – Eng.ª HH e, posteriormente, Dr.ª MM;

. A revisão de preços de venda, declarações sobre as mesmas ao Infarmed, à Direcção Geral da Empresa, à JJ, etc. – Dr.ª DD;

. Pastas de correspondência com os licenciadores – D. KK;

. As declarações mensais de impostos sobre medicamentos – Dr.ª DD;

. O reembolso do empréstimo ao BPI – FF;

. As relações com os Bancos, na parte administrativa – Dr.ª LL;

. Recursos Humanos (departamento este que foi da responsabilidade do A. até Setembro de 2004) – Dr.ª LL;

 - Algumas das tarefas citadas passaram a ser coordenadas e planeadas, tal como acontecia com o A. antes da sua saída, pela Dr.ª MM;

- A evolução negativa dos resultados da empresa não é exclusiva do período mencionado na carta do despedimento;

- O investimento da BB na nova unidade fabril foi financiado por Fundos do PEDIP II (em cujo projecto o A. participou activamente, quer ao nível da elaboração e apresentação, quer ao nível da gestão e organização), no montante de € 838.961,00, a fundo perdido e € 2.493.989,00 sob a forma de subsídio reembolsável, transformado em empréstimo bancário;

- O accionista maioritário da BB contribuiu para o financiamento em montante não concretamente apurado;

- Foi utilizado um empréstimo bancário e libertados Fundos EFTA em montante não concretamente apurado;

- Um dos pressupostos da viabilidade deste investimento era a transferência do fabrico de vários medicamentos de Genebra para a BB;

- Houve recrutamento de pessoas para trabalhar;

- As vendas da Re sempre estiveram condicionadas pelos produtos oriundos da CC, sendo estes a prioridade do esforço comercial;

- A CC ‘obriga’ a R. a comprar-lhe e a revender ao preço de compra, à ‘NN-México’;

- Pelo menos desde 2002, em ano algum as vendas do B... representaram 42% do total;

- Esta perda de importância relativa consta do documento a que internamente se chamou ‘reflexão estratégica’, entregue no Infarmed no início de 2005, junto com a P.I. como documento n.º 7;

- As vendas de 2006 de B... ascenderam a € 4.022.454,00 e a previsão para 2007, saída da reunião de Novembro da Administração da empresa, é de € 4.631.741,00;

- A previsão de crescimento de vendas de B... para 2007, elaborada pelo então Director-Geral da BB, estimava um crescimento de 7,2%, para € 4.312.114,00;

O aumento do passivo de € 840.499,00 foi compensado por um aumento de maior expressão no activo, de € 966.037,00;

- A autonomia financeira da R. subiu para pelo menos 25% do ano de 2006;

- O endividamento junto de outros fornecedores era, em 31 de Dezembro de 2005 e de 2006, o decorrente da actividade normal da empresa e correspondia ao período de pagamento que os fornecedores de bens e serviços concedem, sendo no âmbito das compras que a evolução do saldo deve ser justificada;

- O endividamento diminuiu entre 1 de Janeiro e 31 de Dezembro de 2006 de € 3.000.000,00 para € 2.000.000,00;

- O A. possuía uma pós-graduação em Sistemas de Informação e era o único portador de tal habilitação na BB;

- No ano de 2004, a R. autonomizou o departamento de recursos humanos, tendo sido criado novo cargo de Direcção e contratada uma pessoa para o mesmo;

- Em data não concretamente apurada do ano de 2006, o B... foi excluído da comparticipação no preço, o que acarretou aumento do preço para alguns consumidores, com quebra nas vendas;

- Em 2006 houve um aumento do passivo;

- Competiu à responsável da contabilidade, DD, o acompanhamento operacional do desenvolvimento em Portugal da nova aplicação informática de gestão integrada do Grupo CC, sem qualquer intervenção por pate do Director de Administração e Finanças;

- A Dr.ª MM foi admitida ao serviço da R. com a categoria profissional de chefe de serviços, a fim de desempenhar funções essencialmente de ‘controlling’ e controle de gestão;

- Após a saída do A., FF participou na elaboração de planos de tesouraria, com o esclarecimento de que esta era, antes, uma tarefa do A.

- O A. sempre actuou na dependência directa apenas do Director-Geral da BB, responsável máximo da Ré.

                                                                      ___

Tudo visto.

Refira-se, neste plano de consideração, que não se questiona, logicamente, em qualquer perspectiva, a dimensão formal do procedimento que conduziu ao despedimento.

Não bulindo (…) sequer nas motivações gestionárias – …antes centrando a nossa análise jurisdicional na averiguação da exactidão dos fundamentos económicos invocados e na sua relação causal/juízo de consequencialidade  com o determinado despedimento, concretamente sob o ângulo da impossibilidade prática da subsistência da relação de trabalho, como acima equacionado –, podemos adiantar, desde já, que bem andou o Tribunal recorrido na percepção/interpretação dos contornos da situação sujeita e no juízo alcançado.

Com efeito – …admitido que, no caso, os motivos invocados como justificativos da extinção do posto de trabalho/despedimento não são imputáveis a actuação culposa do empregador e assente, como antedito, que o empregador não está impedido de racionalizar, redimensionando-a, a estrutura produtiva, eliminando mesmo postos de trabalho excedentários -, a factualidade provada não caracteriza, de modo inequívoco bastante, os motivos de mercado ou estruturais, oportunamente anunciados, susceptíveis de conduzir à eliminação do posto de trabalho concretamente ocupado pelo A.

Na verdade, no que tange aos motivos de mercado (= redução actividade da empresa), não é, por exemplo, a quebra da procura pontual de um dos medicamentos produzidos (o B...), decorrente da sua exclusão, em 2006, de comparticipação do Estado no respectivo preço, que a demonstra e/ou explica; como também a não objectivam as demais circunstâncias aduzidas (v.g., dentre outras, a perda de dinheiro na comercialização deste ou daquele medicamento; ou as oscilações no endividamento, no activo/passivo; ou no investimento numa nova unidade fabril; ou ainda as vendas condicionadas pelos produtos oriundos da casa-mãe, a CC) …

…Como assim também no concernente aos motivos estruturais, maxime quanto à pretensa degradação/desequilíbrio económico-financeiro, onde não se vislumbra qualquer relação imediata de causa-efeito com a determinada eliminação do posto de trabalho do A., tanto mais que só aparentemente as funções respectivas foram ‘dispensadas’.

Em boa verdade, como vem factualizado, as funções até então cometidas ao A. não só não foram eliminadas, como não passaram, contra o adiantado, a ser realizadas (apenas) a partir da CC.

A seguir ao despedimento do A. (passados poucos dias, e com início de funções em 1 de Julho de 2007), foi admitida ao serviço da R. a Dr.ª MM, com a categoria profissional de Chefe de Serviços, a fim de desempenhar funções essencialmente de ‘controller’ e controle de gestão, incumbindo ao ‘controller’, além do mais, preparar os orçamentos da R. e fazer o respectivo seguimento e elaborar o ‘repporting’ para a casa-mãe, funções que, cometidas antes ao A., continuaram a ser exercidas na empresa local (BB, a aqui Ré) …

…E as demais tarefas que o A. desempenhava e/ou coordenava, como acima discriminado, (v.g. elaboração de balanços mensais; ‘repporting’ financeiro; preparação e seguimento dos orçamentos; planos de tesouraria; estatísticas de vendas mensais; custos directos; revisão de preços de venda; declarações sobre os mesmos à Infarmed, à Direcção geral da empresa, à JJ; declarações mensais de impostos sobre os medicamentos; relações com Bancos, etc.) passaram a ser exercidas por outros trabalhadores.

Em resumo deste ponto:

Sem menoscabo pela tese sustentada, diremos que a falada ‘extinção’ do posto de trabalho - …imediatamente seguida da contratação de um novo trabalhador para o exercício de um conjunto significativo de funções integrantes do posto de trabalho ‘extinto’ e da concomitante despistagem das demais tarefas correspondentes àquele múnus por outros tantos trabalhadores da R. – não deixa de configurar mera aparência, inexistindo, no caso, o perscrutado elo de consequencialidade entre os alegados motivos da extinção do posto de trabalho e a pretextada decisão de despedimento, não podendo concluir‑se, como se antolha evidente, pela verificação do requisito previsto na alínea b) do n.º 1, conjugada com o n.º 3 do art. 403.º do Código do Trabalho.

Isto dito, fica fatalmente neutralizado, não demandando refutação, o invocado argumento final de que a existência de posto de trabalho compatível constituiria - enquanto requisito negativo, impeditivo do exercício do direito pretendido pelo empregador - ónus de prova do recorrido (art. 342.º/2 do Cód. Civil).

Soçobram, pois, as correspondentes asserções conclusivas alinhadas de A. a F.

                                                                      ___

2.3

A segunda questão:

Dos juros de mora devidos nas prestações intercalares.

Insurge-se a Recorrente (conclusões G. a I.do respectivo rol), na hipótese de improvimento do recurso quanto à questão da (i)licitude do despedimento, contra a sua condenação no pagamento de juros de mora sobre as retribuições referentes ao período compreendido entre 19.10.2007 e 22.9.2010, porquanto – havendo que proceder ainda às deduções previstas no art. 437.º/2 do Código do Trabalho, incluindo subsídio de desemprego, e tendo ficado demonstrado que, durante tal período, o Recorrido recebeu, entre outras, aquela prestação social, mas faltando apurar os seus exactos montantes – a condenação foi em quantia ilíquida, pelo que, enquanto tal quantia não for liquidada, não há lugar à contabilização de juros de mora.

Deve, por isso, como clama, revogar-se o Acórdão, nesse segmento.

Vejamos.

A sentença, enfrentando o correspondente pedido, decidiu condenar a R., ‘BB, S.A.’, a pagar ao A. …’as retribuições - no valor de € 7.480,00, acrescido das diuturnidades de € 4,99 – vencidas no período compreendido entre 19 de Outubro de 2007 e 22 de Setembro de 2010, incluindo as férias, subsídios de férias e de Natal, acrescidas tais quantias de juros de mora à taxa legal desde a data de vencimento de cada uma das prestações até integral e efectivo pagamento, deduzidas as importâncias que o autor tenha comprovadamente obtido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento, devendo o empregador entregar o subsídio de desemprego auferido pelo autor ser deduzido e entregue pela ré à Segurança Social.’  - Sic, com bold agora.

Ante a reacção da Ré, recorrente na apelação, o Acórdão ora sub judicio acolheu a fundamentação adrede expendida na 1.ª Instância sobre a questão e, sublinhando que estão em causa valores salariais (…que não um montante indemnizatório), considerou que, tal como se salientou na sentença recorrida, …”decorre do disposto no n.º 4 do art. 269.º do CT/2003 que sobre os montantes em dívida são devidos juros de mora, à taxa legal, desde a data do respectivo vencimento até integral pagamento, ainda que parte deles devam ser liquidados em sede de incidente de liquidação.”

 Como é consabido, o devedor constitui-se em mora quando, por causa que lhe seja imputável, a prestação, ainda possível, não foi efectuada no tempo devido, ficando por isso obrigado a indemnizar o credor.

Nas obrigações pecuniárias, como in casu, a indemnização corresponde aos juros a contar do dia da constituição em mora – arts. 804.º e 806.º/1 do Cód. Civil.

Sobre o momento da constituição em mora dispõe o art. 805.º do mesmo Código.

Por regra, o devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir.

Há, porém, mora, independentemente da interpelação - excepção que nos importa reter – se a obrigação tiver prazo certo.

 Todavia, se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto não se tornar líquido (in illiquidis non fit mora), salvo se a falta de liquidez for imputável ao devedor.

[Nos casos de responsabilidade por facto ilícito (extracontratual) ou pelo risco, o devedor constitui-se em mora, por norma, desde a citação – cfr. n.º 3 do referido art. 805.º].

É perfeitamente compreensível a etiologia da regra constante do n.º 3 do art. 805.º: nas autorizadas palavras de Pires de Lima/Antunes Varela (nota 5. ao art. 805.º - ‘Código Civil Anotado’, 4.ªEdição, Coimbra Editora, 1997), a justificação do preceito baseia-se …na circunstância de não ser razoável exigir do devedor que ele cumpra enquanto não souber o montante ou o objecto exacto da prestação que lhe cumpre realizar.

(Estaremos perante a iliquidez da obrigação quando é incerto o seu quantitativo, ou, mais prosaicamente, quando a obrigação é certa mas não está ainda fixado o seu montante).

Isto posto.

Como se constata, a R./recorrente foi condenada no pagamento ao A. das retribuições vencidas no período compreendido entre 19 de Outubro de 2007 e 22 de Setembro de 2010, incluindo as férias e os subsídios de férias e de Natal - retribuições essas de valor desde logo fixado: € 7.480,00/mês, somado das diuturnidades de € 4,99 –, acrescidas tais quantias de juros de mora à taxa legal desde a data de vencimento de cada uma das prestações até integral e efectivo pagamento.

Mais se determinou que (o valor global dessas retribuições) fosse deduzido das importâncias que o A. tenha comprovadamente obtido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento, bem como do subsídio de desemprego por aquele recebido, devendo o empregador entregar o montante deste na Segurança Social.

Aqui chegados, ocorre questionar – hoc opus hic labor est! – se, ante a equação precedente, estaremos ou não perante a prefigurada situação de iliquidez da obrigação.

Este Supremo Tribunal (e Secção) tem vindo a decidir, sem discrepância conhecida, no sentido de que, nestes casos, a iliquidez é meramente aparente, não se aplicando, por isso, a regra do n.º 3 do art. 805.º do Cód. Civil, mas sim a do n.º 2, a), do mesmo inciso, uma vez que as retribuições (a que alude o art. 437.º/1 do CT) são obrigações de prazo certo, como consta do n.º 4 do art. 269.º do mesmo Compêndio.

Tudo ponderado, não vemos razão bastante para não perseverar na bondade deste juízo, que vemos proclamado, num passado mais recente, inter alia nos Acórdãos desta Secção, de 1.4.2009, tirado na Rev./Proc. n.º 3048/08, e de 21.3.2013, prolatado na Rev./Proc. n.º 391/07.2TTSTRE.E1.S1. E, mais recuadamente, v.g., nos Acórdãos de 18.1.2006, lavrado no Proc. n.º 2840/05, in CJ/S.T.J., Tomo I/2006, e de 18.4.2007, proferido na Revista n.º 4556/06.

No caso, o empregador conhecia e dispunha de todos os elementos necessários à liquidação da compensação devida.

Como se escreveu no acima citado Aresto de 21.3.2013, versando questão afim, …a R. tem forma de conhecer e liquidar os quantitativos peticionados e já vencidos (…), pelo que se encontra em mora desde o vencimento das componentes que integram a compensação.

A pretensa/aparente iliquidez resulta (mais) do entendimento da R. de que não deve, do que propriamente da falta de meios para a determinação do respectivo montante.

Isto porque à quantia final (meramente aritmética e resultante do valor da retribuição mensal certa vezes o período temporal estabelecido por que é devida, acrescida dos juros de mora), apenas há que (…tem a R. o direito de, no que concretamente tange às quantias que o A. tenha comprovadamente obtido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento) deduzir as importâncias aludidas (as eventualmente recebidas a título de subsídio de desemprego…e as que não teria recebido se não fosse o despedimento - …dedução de rendimentos abatíveis cuja existência/quantitativos cumpre ao empregador demonstrar, é seu o ónus da prova, ut art. 342.º/2 do CC).

Em suma:

Esta aparente iliquidez não pode, pois, ser eficazmente invocada para impedir o pagamento da indemnização correspondente à mora.

(Cfr. a desenvolvida explicitação desta asserção na fundamentação jurídica do Aresto desta Secção, de 18.1.2006, atrás citado, para onde se remete, com vénia).

Soçobram as correspondentes conclusões da motivação recursória.

E, mostrando-se tratado tudo quanto, de essencial, nos cumpria conhecer, vamos terminar.

  III.

                                                 DECISÃO

Nos termos e com os fundamentos expostos delibera-se negar a Revista.

A R./recorrente suporta as custas.

                                              ***   

(Anexa-se sumário do acórdão).

                                                                                                Lisboa,18 de Junho de 2014

Fernandes da Silva (Relator)

Gonçalves Rocha

António Leones Dantas

_____________________
[1] - Texto constante, expressis verbis, da Fundamentação de Facto do Acórdão revidendo.
[2] - Diploma aqui aplicável, a que pertencem as normas adiante invocadas sem menção de origem.
[3] - Cfr. o Acórdão, com data de 15.3.2012, proferido no Proc. 554/07.0TTMTS.P1.S1, desta 4.ª Secção, in dgsi.pt.
[4]  - In ‘Direito do Trabalho’, Parte II, 3.ª Edição, pg. 981.
[5]  - Cfr. Acórdão do T.C. n.º 64/91, de 4 de Abril
[6]  - A esta Codificação, que contém o regime legal aqui aplicável, pertencem as normas adiante referidas sem menção de origem.
[7] - Vide Acórdão deste Supremo Tribunal de 9.9.2009, in www.dgsi.pt, cujo desenvolvimento expositivo e fundamentação correspondem ao entendimento que se mantém.
[8]  - Vide, em uníssono, Bernardo Lobo Xavier, Mário Pinto/Furtado Martins e Maria do Rosário Palma Ramalho, nas obras e locais identificados no já citado Acórdão deste Supremo Tribunal de 9.9.2009.
[9] - Cfr. ‘Direito do Trabalho’, 13.ª Edição, pg. 591.
[10]  - Usando, com vénia, as expressivas palavras de Pedro Furtado Martins, ‘Cessação do Contrato de Trabalho’, 3.ª Edição, 2012, pg. 281.
[11] - Citado por Furtado Martins, ob. cit., pg. 280.