Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
397/03.0GEBNV.S1
Nº Convencional: 3ª SECÇÃO
Relator: RAUL BORGES
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA
OFENDIDO
MENOR
PARAPLEGIA
DANOS PATRIMONIAIS
DANOS FUTUROS
LUCRO CESSANTE
EQUIDADE
DESCONTO
DESPESAS PRÓPRIAS
FACTO NOTÓRIO
QUESTÃO NOVA
TRANSACÇÃO JUDICIAL
INCAPACIDADES
DIREITO À PROCRIAÇÃO
MORTE
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
INDEMNIZAÇÃO
COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
MATÉRIA DE DIREITO
Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 11/25/2009
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO EM PARTE
Sumário : I - Na génese do pedido de indemnização formulado nos autos está um dano corporal, resultante da violação ilícita e culposa do direito subjectivo à integridade física e à saúde do demandante, integrantes de direitos da personalidade – arts. 24.º e 25.º da CRP e 70.º do CC – sendo que tal dano corporal, emergente de acidente de viação, com extensão, incidências, consequências e reflexos diversos, não apenas no presente, mas também no futuro, merecedor de especial atenção, já que os efeitos danosos se projectam a longo prazo, face à circunstância de o lesado ser uma criança, que à data da lesão contava 8 anos de idade.
II - Há que ter em consideração uma perspectiva patrimonial, na vertente de dano futuro, lucro cessante, ou mais certeiramente, frustração de ganho (expressão mais apropriada quando está em causa perda ou diminuição de salários ou vencimentos), emergente de incapacitação para o trabalho e, para além deste, o aspecto de natureza não patrimonial.
III - Estamos perante a necessidade de adiantar uma prognose de uma situação de futuro a partir da situação de facto adquirida no presente. No dano patrimonial, o dano real – a perda in natura que o lesado sofre em consequência do acto lesivo – reflecte-se sobre a situação patrimonial do lesado, na modalidade de dano emergente ou de lucro cessante. Enquanto os danos emergentes consistem numa forma de diminuição do património já existente, consubstanciando prejuízo causado nos bens ou nos direitos já existentes na titularidade do lesado à data da lesão, os lucros cessantes consistem numa forma de não aumento do património já existente, isto é, os benefícios que o lesado deixou de obter por causa do facto, mas a que não tinha direito à data da lesão.
IV - Por dano futuro deve entender-se aquele prejuízo que o sujeito do direito ofendido ainda não sofreu no momento temporal que é considerado. O dano futuro é previsível quando se pode prognosticar, conjecturar com antecipação ao tempo em que acontecerá. No caso contrário, quando o homem medianamente prudente e avisado o não prognostica, o dano é imprevisível, não sendo indemnizável antecipadamente; o sujeito do direito ofendido só poderá pedir a correspondente indemnização depois de o dano acontecer.
V - O dano previsível certo é aquele cuja produção se apresenta, no momento de acerca dele formar juízo, como infalível. Dano futuro eventual é aquele cuja produção se apresenta, no momento de acerca dele formar juízo, como meramente possível, incerto, hipotético, podendo conhecer vários graus.
VI - O dano certo pode ser determinável quando pode ser fixado com precisão o seu montante, ou indeterminável, quando aquele valor não é possível de ser verificado antecipadamente à sua verificação.
VII - A doutrina e a jurisprudência estão de acordo em que pelo facto de o ofendido não exercer à data do acidente qualquer profissão, não está afastada a existência de dano patrimonial, compreendendo-se neste as utilidades futuras e as simples expectativas de aquisição de bens. Neste leque, cingindo-nos agora à capacidade para o trabalho, encontrar-se-ão os indivíduos lesados que se encontram fora do mercado do trabalho, da vida activa laboral, e considerando a duração cronológica de vida, seja a montante – caso das crianças e jovens, ainda estudantes, ou não, mas que ainda não ingressaram no mundo laboral –, seja, a jusante, com os reformados/aposentados, que dele já saíram, sem esquecer os que estando fora destes parâmetros temporais, situando-se pela sua idade no período de vida activa, estão porém fora daquele mercado, porque desempregados.
VIII - Na avaliação deste tipo de danos há que ter presente o princípio que impõe ao tribunal o dever de julgar equitativamente dentro dos limites que tiver por provados, quando não puder averiguar o valor exacto dos danos, ou mesmo a própria existência de danos. Face às dificuldades de prova segura dos danos não patrimoniais e dos montantes deles, formula a lei o princípio geral – aplicável também à indemnização de danos patrimoniais – de que, se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados – art. 566.º, n.º 3, do CC.
IX - A incapacidade permanente, por traduzir uma redução/limitação das capacidades funcionais/laborais, sendo uma afectação da integridade física, que se repercute no bem patrimonial força de trabalho, que perdura para toda a vida do lesado, tem de ser indemnizada.
X - Esta questão, ao nível dos lesados menores/crianças, em que os «lucros cessantes», ou com mais propriedade, os ganhos frustrados, são, numa previsão actual, dificilmente avaliáveis, atingindo maior grau de dificuldade a ponderação a efectuar, já que estará presente a necessidade de composição de uma situação com contornos virtuais. Mas há que partir do pressuposto de que o lesado tem sempre direito, por a sua força de trabalho constituir uma fonte produtiva, às suas potencialidades lucrativas, rectius, aquisitivas, e que, mais cedo ou mais tarde, terá uma profissão ou ocupação, ingressará no universo do trabalho, para muitos, única forma de angariação de rendimentos.
XI - Tais danos devem calcular-se segundo critérios de verosimilhança ou de probabilidade, de acordo com o que é normal e natural acontecer, com o que em cada caso concreto, poderá vir a acontecer, pressupondo que as coisas seguem o seu curso normal, estando-se perante cálculo feito de acordo com o id quod plerumque accidit; e se, mesmo assim, não puder apurar-se o seu valor exacto, o tribunal deve julgar, segundo a equidade.
XII - A indemnização do dano patrimonial futuro decorrente de incapacidade permanente deverá corresponder a um capital produtor de rendimento equivalente ao que a vítima irá perder (neste caso e equivalentes, não irá auferir), mas que se extinga no final da vida activa ou do período provável de vida da vítima e seja susceptível de garantir, durante essa vida ou período, as prestações periódicas correspondentes ao rendimento perdido, às perdas de ganho.
XIII - Como critérios de determinação do valor a capitalizar, produtor do montante de indemnização por redução de capacidade laboral e perda aquisitiva de ganho, a jurisprudência foi lançando mão de vários métodos de cálculo e tabelas matemáticas e financeiras; o STJ vem reiteradamente entendendo que no recurso a semelhantes fórmulas ou tabelas para a fixação dos cômputos indemnizatórios por danos futuros/lucros cessantes, têm estas de ser encaradas como meros referenciais ou indiciários, só revelando como meros elementos instrumentais, instrumentos de trabalho, com papel adjuvante, que não poderão substituir o prudente arbítrio do tribunal e a preponderante equidade.
XIV - Estando em causa a fixação de indemnização decorrente de danos futuros, que sejam o prolongamento necessário e directo do estado de coisas criado pelo acidente, abrangendo um longo período de previsão, devendo atender-se apenas aos ganhos fortemente prováveis e verosímeis, não meramente possíveis, a solução mais correcta é a de conseguir a sua quantificação no momento da avaliação, tentando compensar a inerente dificuldade de cálculo com o apelo a juízos de equidade.
XV - Partindo necessariamente da idade do lesado, tendo em conta a sua idade à data do acidente, ou à data da fixação da incapacidade, bem como a idade em que previsivelmente entrará(ia) no mercado de trabalho, há que projectar a previsível duração de vida, o tempo provável de vida, não só enquanto “trabalhador”, portador de força de trabalho, fonte produtiva de património, geradora de rendimentos, mas também enquanto “pessoa” e “cidadão”, que vive para lá do tempo da vida activa, além do tempo da reforma. A esperança de vida a considerar é a esperança média de vida e não o tempo provável de vida activa – a vida activa é mais longa que a laboral, prolongando-se em alguns casos para além dos 70 anos.
XVI - Na determinação do rendimento auferido (ou como no caso, a auferir) há que ter em conta o salário auferido pelo lesado e sua evolução, o que supõe que está a trabalhar; quando não há ainda uma profissão, em algumas decisões é invocado como parâmetro de avaliação do prejuízo o valor do salário mínimo nacional, mas noutros casos opta-se por soluções diversas, ponderando o chamado “salário médio previsível” ou “salário médio acessível”.
XVII - Um dos critérios de referência a ponderar na fixação dos valores de indemnização é a taxa de juro, a taxa de rentabilidade do capital a fixar como indemnização, uma taxa de rendimento previsível para as aplicações a médio e longo prazo, sendo que na aplicação deste critério há que atentar em que quanto mais baixa for a remuneração do capital, o que hoje é patente em face da continuada descida das taxas de juros, maior quantidade daquele será necessária para alcançar um montante que resista ao paulatino deste; essa dificuldade de rentabilização de uma indemnização, de modo a que a mesma se tenha por esgotada ao fim do período de tempo que for de considerar, é factor que joga desfavoravelmente para o devedor daquela, a ter em conta no recurso à equidade.
XVIII - Para além das consabidas dificuldades no ingresso no mercado de trabalho, mormente para os grandes traumatizados e para as pessoas com deficiências, na valoração do dano em questão deve ainda ter-se em conta os prejuízos que, com grande probabilidade ocorrerão e que se prendem com impedimento de progressão ou com dificuldades na progressão na carreira profissional, ou conduzindo mesmo a reforma antecipada, com as inerentes quebras de rendimento no futuro, não deixando de se reconhecer em geral a extrema dificuldade em calendarizar a previsível progressão profissional e determinar a sua quantificação.
XIX - Após determinação do capital, há que proceder ao “desconto”, “dedução” ou “acerto” porque o lesado perceberá a indemnização por junto, podendo o capital a receber ser rentabilizado, produzindo juros, sendo que se impõe que, no termo do prazo considerado, o capital se encontre esgotado; trata-se de subtrair o benefício respeitante à recepção antecipada de capital, de efectuar uma dedução correspondente à entrega imediata e integral do capital, sob pena de se verificar um enriquecimento sem causa do lesado à custa alheia. Na quantificação do desconto em equação a jurisprudência tem oscilado na consideração de uma redução entre os 10% e os 33%.
XX - Nos casos em que o lesado é uma criança ou menor numa faixa etária mais baixa justificar-se-á a consideração de uma maior margem de compressão ao efectuar o desconto/acerto em causa, uma vez que a antecipação do capital tem um sentido mais amplo, sendo percebido o valor da indemnização total, antes ainda de se verificar o termo inicial do que seria o período normal de vida activa; é que a incapacidade só relevará, para estes efeitos, a partir da entrada do lesado na vida activa, ocorrendo uma antecipação em duplo sentido. Acresce, por outra via, que existe um período temporal em que não haveria ganho, mas diversamente despesas feitas pelos pais do lesado, pois estaria a viver na dependência dos mesmos.
XXI - Estando em causa danos futuros de frustração de ganhos associados a IPP, em alguns acórdãos tem-se em conta dedução no cômputo da indemnização da importância que o próprio lesado gastará consigo mesmo durante a vida, o dispêndio relativo a necessidades próprias, às despesas que o lesado necessariamente teria com ele próprio mesmo que o acidente se não produzisse. Será de operar tal desconto no caso de morte, porque é dispêndio que não se efectivará, ao passo que o sobrevivente, com lesão gravemente incapacitante, grande traumatizado, continua a alimentar-se e eventualmente a ter outro tipo de necessidades e de dispêndio, pelo que não parece ser de fazer a dedução.
XXII - Ponderando, no caso concreto:
- que à data do acidente o lesado tinha 8 anos de idade;
- que em consequência do acidente ficou paraplégico, com uma incapacidade permanente geral de 80%, a que acresce 5% de dano futuro, estando a vida futura confinada a uma cadeira de rodas, com dependência de ajuda de terceiros;
- que o seu ingresso no mundo do trabalho poderia ocorrer por volta dos 20 anos;
- considerando o que é normal acontecer, suposto um percurso de vida, sem incidências estranhas, anómalas ou perturbadoras, não havendo razões para pensar que não pudesse obter uma formação profissional média, bem como a evolução do salário mínimo nacional, tem-se como verosímil um rendimento de € 1 100 mensais;
na avaliação concreta do dano, como ponto de partida, de forma a alcançar uma base mínima de trabalho, de modo a conseguir uma referência, uma plataforma inicial a partir da qual se façam operar elementos variáveis que têm a ver com introdução do juízo de equidade, procurando demonstrar/explicar como é alcançado o mínimo denominador e evitar soluções de pendor subjectivista, poderemos lançar mão da fórmula utilizada no Ac. do STJ, de 04-12-2007, no Proc. n.º 3836/07 - 1.ª, e retomada em Acs. posteriores. Trata-se do resultado da aplicação do programa Excell à fórmula utilizada pelo STJ, de 05-05-1994, CJSTJ 1994, Tomo 2, pág. 86, elaborada tendo como referência a atribuição de 3% ao factor aí indicado como taxa de juros previsível no médio e longo prazo.
XXIII - Tomando como parâmetros a idade que ainda falta à vítima para atingir a idade da reforma e aquela taxa de rendimento, para determinação do valor base há que multiplicar o factor índice da tabela (indicado por referência aos anos que ainda faltem para ser atingida a idade da reforma) pelo rendimento anual auferido/perdido à data do acidente e pela percentagem do grau de IPP, vezes a percentagem de responsabilidade do lesante na produção do acidente, obtendo-se o capital necessário, que entregue de uma só vez e diluído ao longo do tempo com os rendimentos que ele próprio for gerando, proporcione ao lesado, até à sua idade de reforma, o valor correspondente ao valor perdido.
XXIV - Na aplicação ao caso concreto não há a considerar qualquer contribuição de responsabilidade do demandante na produção do acidente, que se deveu a culpa única e exclusiva do arguido condutor, nem se fará o desconto da importância que o lesado gastaria consigo próprio, pelas razões apontadas.
XXV - Atenta a especificidade do caso, não tendo o lesado entrado ainda no mundo do trabalho, o número de anos até atingir a reforma – a idade normal de reforma – computar-se-á desde o projectado início da actividade profissional aos 20 anos, que será assim o termo do prazo a considerar.
XXVI - Tomando a entrada no mercado de trabalho, como verificando-se em 2015, com os 20 anos do demandante, atendendo, para este efeito, a reforma aos 65 anos, ao salário médio mensal ficcionado de € 1 100, a que acrescerá subsídio de férias e de Natal, no total de 14 meses, ou seja, um rendimento anual de € 15 400 e aplicando o factor de 24,51871, correspondente a 45 anos até atingir a reforma (dos 20 aos 65 anos) e a taxa de IPP de 85%, sem qualquer concorrência da vítima para as lesões sofridas, temos o seguinte: € 15 400 x 24,51871 x 85% = € 320 949,913.
XXVII - A partir daqui há que fazer funcionar a equidade como critério primordial e sempre corrector de outros critérios. Assim, haverá que atender à esperança média de vida do cidadão português, com o tempo provável de vida posterior ao termo da vida activa profissional aos 65 anos, podendo figurar-se o limite de 70 anos, o prolongamento da IPG para além da idade da reforma e o rebate no desempenho de outras tarefas que continuarão a supor a presença de ajudas de terceiros, a evolução profissional que teria, com progressão na carreira e reflexos a nível remuneratório, com melhorias de retribuições e aumentos salariais, a inflação e reflexos negativos no poder de compra, o facto de depender da ajuda permanente de terceiros, a muito elevada dimensão de incapacidade e do dano corporal traduzido na ofensa grave à saúde e integridade física, tendo-se em conta a gravidade da conduta que emergiu o acidente consubstanciadora de crime, o facto de para o acidente em nada ter contribuído o demandante e os padrões jurisprudenciais.

XXVIII - No que respeita ao desconto a efectuar pelo recebimento antecipado da totalidade do capital, há que ter em atenção no caso concreto uma antecipação de mais largo espectro.

XXIX - A IPG de que padece o lesado, até aos 20 anos, altura em que ingressaria no mercado de trabalho, não determina(ria) uma diminuição concreta e efectiva de rendimentos por mor da diminuição/limitação da capacidade de ganho, a qual só começa(ria) a ter efeitos, a reflectir-se no património do lesado, a partir dos 20 anos de idade. Nestes casos específicos, a não ter ocorrido o acidente, até à entrada do jovem no mundo do trabalho, impendia sobre os pais a responsabilidade de prover ao seu sustento.

XXX - Ponderando todos estes factores e efectuados os ajustamentos que se impõem, seria encontrado o montante indemnizatório de € 300 000.

XXXI - Sucede que os demandados aceitaram, conformaram-se com o valor fixado pela Relação; estando-se no domínio dos direitos disponíveis, será de ter em consideração tal valor, pelo que a título de indemnização pelo dano patrimonial futuro, lucro cessante, ganho frustrado, de perda de capacidade aquisitiva de ganho do demandante, fixa-se o montante de € 350 000 (que havia sido fixado pelo Tribunal da Relação).

XXXII - No que se refere a danos futuros previsíveis e determináveis, no caso concreto está em causa a redução de 15 anos do período em que o lesado terá necessidade de medicação, algaliação, uso de fraldas e bebegel, por força de uma intervenção cirúrgica a ter lugar no futuro, pelo que poderia operar uma reversão do estado clínico do demandante, o que foi considerado na decisão recorrida como facto notório. Dessa compressão do período temporal da necessidade de medicamentos e tratamentos, resultou uma diminuição da indemnização.

XXXIII - Não carecem de prova nem de alegação os factos notórios, devendo considerar-se como tais os factos que são do conhecimento geral – art. 514.º, n.º 1, do CPC. Por outro lado, como a notoriedade implica a ideia de publicidade, ele terá de ser conhecido de grande maioria dos cidadãos.

XXXIV - Mas do que resulta do processo, não se vê como a partir dos argumentos utilizados se pode concluir o que quer que seja, relativamente ao que se passará no futuro e muito menos, com a proclamada segurança, pelo que o segmento do acórdão recorrido, relativo à duração do período da necessidade destas despesas, não deverá subsistir, devendo ser revogado.

XXXV - Deverá, em substituição, ser considerado o período que vai de Abril de 2006, data da interposição do pedido de indemnização, até aos 65 anos do demandante, como expressamente pedido.

XXXVI - A este nível os demandados pretendem sindicar matéria de facto, fazendo-o pela primeira vez e perante o Supremo, imputando uma arreda valoração das provas. Suscitando os recorrentes pela primeira vez, aqui e agora, a questão em causa, estamos face a uma questão nova, que corresponde à colocação de um problema novo, que não puseram à consideração do Tribunal da Relação.

XXXV - Constitui jurisprudência uniforme a de que os recursos se destinam a reexaminar decisões proferidas por jurisdição inferior, visando apenas apurar a adequadação e legalidade das decisões sob recurso, e não a obter decisões sobre questões novas, não colocadas perante aquelas jurisdições. O Tribunal Superior, visando apenas a reapreciação de questões colocadas anteriormente e não a apreciação de outras novas, não pode conhecer de argumentos ou fundamentos que não forem presentes ao tribunal de que se recorre.

XXXVI - Em causa nos autos está também a questão de saber se ao montante global de indemnização fixado, haverá que deduzir apenas a quantia recebida pelo demandante na sequência do contrato de transacção celebrado aquando do julgamento, ou também as quantias respeitantes a despesas pagas anteriormente pela seguradora, entendendo-se que no montante indemnizatório global que vier a ser fixado será de abater apenas o quantitativo pago pela seguradora, efectivamente recebido pelo demandante por conta do pedido, na sequência do contrato de transacção celebrado aquando da audiência de julgamento e que foi homologado.

XXXVII - Não é de autonomizar a indemnização por dano resultante da violação do direito à sexualidade e à procriação, que radica no direito à integridade física, integrando uma das componentes de danos não patrimoniais.

XXXVIII - Danos não patrimoniais são os que afectam bens não patrimoniais (bens da personalidade), insusceptíveis de avaliação pecuniária ou medida monetária, porque atingem bens, como a vida, a saúde, a integridade física, a perfeição física, a liberdade, a honra, o bom nome, a reputação, a beleza, de que resultam o inerente sofrimento físico e psíquico, o desgosto pela perda, a angústia por ter de viver com uma deformidade ou deficiência, os vexames, a perda de prestígio ou reputação, tudo constituindo prejuízos que não se integram no património do lesado, apenas podendo ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo mais uma satisfação do que uma indemnização, assumindo o seu ressarcimento uma função essencialmente compensatória, de modo a atenuar os padecimentos derivados das lesões e a neutralizar a dor física e psíquica sofrida, embora sob a envolvência de uma certa vertente sancionatória ou de pena privada.

XXXIX - O dano não patrimonial não se reconduz a uma única figura, tendo vários componentes e assumindo variados modos de expressão, abrangendo o chamado quantum (pretium) doloris, que sintetiza as dores físicas e morais sofridas no período de doença e incapacidade temporária, com tratamentos, intervenções cirúrgicas, internamentos, a analisar através da extensão e gravidade das lesões e da complexidade do seu tratamento clínico; o “dano estético” (pretium pulchritudinis), que simboliza o prejuízo anátomo-funcional associado às deformidades e aleijões que resistiram ao processo de tratamento e recuperação da vítima; o “prejuízo de distracção ou passatempo”, caracterizado pela privação das satisfações e prazeres da vida, vg., com a renúncia a actividades extra-profissionais, desportivas ou artísticas; o “prejuízo de afirmação social”, dano indiferenciado, que respeita à inserção social do lesado, nas suas variadas vertentes (familiar, profissional, sexual, afectiva, recreativa, cultural, cívica), integrando este prejuízo a quebra na “alegria de viver”; o “prejuízo da saúde geral e da longevidade”, em que avultam o dano da dor e o défice de bem estar, e que valoriza as lesões muito graves, com funestas incidências na duração normal da vida; os danos irreversíveis na saúde e bem estar da vítima e o corte na expectativa de vida; o prejuízo juvenil “pretium juventutis, que realça a especificidade da frustração do viver em pleno a chamada primavera da vida, privando a criança das alegrias próprias da sua idade; o “prejuízo sexual”, consistente nas mutilações, impotência, resultantes de traumatismo nos órgãos sexuais; o “prejuízo da auto-suficiência”, caracterizado pela necessidade de assistência de uma terceira pessoa para os actos correntes da vida diária, decorrente da impossibilidade de caminhar, de se vestir, de se alimentar.

XL - No domínio da quantificação do dano não patrimonial, em que não entram considerações do “ter” ou “possuir”, “perder” ou “ganhar”, mas do “ser”, “sentir”, ou “sonhar”, não rege a teoria da diferença, nem faz sentido o apelo ao conceito de dano de cálculo, pois que a indemnização/compensação do dano não patrimonial não se propõe remover o dano real, nem dá lugar a reposição por equivalente.

XLI - A valoração dos danos não patrimoniais depende de uma apreciação sobre matéria de direito – o que ocorre sempre que se faça uso da equidade –, susceptível, portanto, de apreciação no STJ.

XLII - Só são indemnizáveis os danos não patrimoniais que afectem profundamente os valores ou interesses da personalidade física ou moral, medindo-se a gravidade do dano por um padrão objectivo, embora tendo em conta as circunstâncias do caso concreto, mas afastando-se os factores subjectivos, susceptíveis de sensibilidade exacerbada, particularmente embotada ou especialmente fria, aguçada, requintada, e apreciando-se a gravidade em função da tutela do direito.

XLIII - O montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção as circunstâncias referidas no art. 494.º, como decorre do n.º 3 do art. 496.º do CC, sendo de atender ao grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso.

XLIV - Com a cláusula de equidade, prevista em geral no art. 4.º e permitida, no que ora interessa, nos arts. 496.º e 566.º, n.º 3, do CC, o tribunal resolverá o litígio ex aequo et bono e não ex jure stricto. Em causa está conceito relacionado com justiça natural, igualdade, imparcialidade, justiça.

XLV - No que se refere à fixação do montante correspondente a compensação por danos não patrimoniais, é possível distinguir quatro soluções jurisprudenciais, a ter presentes:
- afastamento/desconsideração do critério de compensação do dano morte como padrão para compensação dos danos não patrimoniais de sobreviventes grandes traumatizados, argumentando-se que, sendo a vida o bem supremo, a valoração da sua perda não pode ser excedida pela resultante das dores e sofrimentos;
- estabelecimento do justo grau de compensação, havendo que ter em conta, como é entendimento praticamente unânime, que a indemnização por danos não patrimoniais tem de assumir um papel significativo, devendo o juiz, ao fixá-la segundo critérios de equidade, procurar um justo grau de “compensação”, não se compadecendo com a atribuição de valores meramente simbólicos, nem com miserabilismos indemnizatórios;
- da intervenção correctiva limitada por parte do Tribunal Superior, posto que alguma jurisprudência defende uma intervenção do tribunal de recurso limitada e restrita na fixação deste tipo de danos, não se justificando essa intervenção caso se entenda que a indemnização foi adequadamente fixada, sendo reveladora de bom senso;
- soluções de fixação de montantes relativamente ao dano em causa em situações paralelas, nas quais se tem em consideração o sentido das decisões sobre a matéria, os critérios jurisprudenciais vigentes e aplicáveis a situações semelhantes, fazendo-se a comparação do caso concreto com situações análogas equacionadas noutras situações judiciais, não se perdendo de vista a sua evolução e adaptação às especificidades do caso sujeito – os padrões de indemnização que vêm sendo adoptados pela jurisprudência, nomeadamente os mais recentes, constituem também circunstância a ter em conta no quadro das decisões que façam apelo à equidade.

XLVI - Revertendo ao caso concreto, e considerando que:
- o menor ficou paraplégico, sem sensibilidade abaixo da linha intermamilar, fazendo infecções urinárias, respiratórias e dermatológicas e úlcera na região occipital, sendo ventilado durante 15 dias;
- em consequência do acidente ficou internado mais de 8 meses;
- foi submetido a várias intervenções cirúrgicas, com anestesias gerais e sequente sujeição a programas de reabilitação física;
- a incapacidade temporária geral total foi de 765 dias, o que significa que durante os anos completos de 2004 e 2005, esteve impedido de realizar com razoável autonomia as actividades da vida diária, familiar e social, sendo do mesmo período a incapacidade temporária para a actividade ocupacional habitual de estudante;
- efectuou 197 deslocações ao Centro de Medicina de Reabilitação entre a data da alta deste e a data da propositura da acção cível enxertada, tendo efectuado outras 82 deslocações ao Hospital no mesmo período;
- foi submetido a tratamentos de acupunctura;
- padece de quantum doloris de grau 6, numa escala de 7, de dano estético de 5, numa escala de 7 graus;
- padece de ausência de controle de esfíncteres, obrigando a uso de fraldas e de bebegel, tendo a necessidade de fazer algaliação de 3 em 3 h, constituindo uma situação irreversível;
- tem necessidade de ter vigilância do foro urológico, tomando diariamente dois comprimidos para o funcionamento da bexiga;
- ficou na dependência de ajudas técnicas (cadeira de rodas, ortóteses e botas ortopédicas), médicas fisiátricas e medicamentosas, bem como do apoio de terceira pessoa;
- tem a perspectiva de viver numa cadeira de rodas até ao fim dos seus dias;
- necessita de fisioterapia e hidroterapia para não agravar o seu estado;
- acresce a perda do avô, com quem seguia no veículo embatido, estando encarcerado cerca de 40 m. ao lado do mesmo, já morto, só dele conseguindo falar e chorar a sua morte mais de dois meses transcorridos sobre o acidente,
afigura-se adequado fixar a indemnização por danos não patrimoniais em € 250 000.
Decisão Texto Integral:
No âmbito do processo comum com intervenção de tribunal singular n.º 397/03.0GEBNV do 2.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Benavente, foi submetido a julgamento o arguido AA, melhor identificado nos autos.
BB, a que posteriormente se associou, a convite do juiz do processo, a consorte CC, na qualidade de pais do menor DD, deduziram pedido de indemnização cível contra Companhia de Seguros A..., S.A., o arguido AA e T... F... R..., Lda., pedindo a condenação solidária destes a pagar a quantia global de 1.699.300,33 €, acrescida de juros desde a citação e a pagar ao A. as intervenções cirúrgicas e respectivos internamentos, exames e tratamentos, ajudas técnicas, que se revelem necessários em consequência da evolução da situação clínica do A. pelas lesões que sofreu em virtude do acidente, a liquidar em execução de sentença (fls. 209 a 226, 288 e 297 do 2.º volume).

Por sentença de 19 de Fevereiro de 2008, entregue no dia 21 seguinte após as 17 horas e depositada no dia 22, foi decidido:
Na parte criminal:
Condenar o arguido pela prática de:
I – Um crime de homicídio por negligência, p. p. pelo artigo 137º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 15 meses de prisão;
II - Um crime de ofensa à integridade física por negligência, p. p. pelo artigo 148º, n.º s 1 e 3, do Código Penal, na pena de 12 meses de prisão;
III - Um crime de ofensa à integridade física por negligência, p. p. pelo artigo 148º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 2 meses de prisão.
IV - Em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 22 meses de prisão, cuja execução foi suspensa por igual período.

Na parte cível:
I - Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização, homologando a transacção efectuada entre o demandante e a demandada Companhia de Seguros A..., condenando esta a pagar a quantia de 465.449,29 € e condenar solidariamente os demandados AA e T... F... R..., Lda. a pagar a quantia de € 173.000,00, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelo demandante em consequência do acidente de viação, acrescidas de juros de mora vencidos desde a data da sentença.
II - Relegar para execução de sentença o custo com eventuais intervenções cirúrgicas e internamentos e inerentes exames que se revelem necessários para curar as lesões do demandante civil, a pagar solidariamente pelos demandados AA e T... F... R..., Lda.

Inconformados, os demandados AA e T... F... R..., Lda., interpuseram recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, tendo o demandante apresentado recurso subordinado.

Por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 25 de Março de 2009 (processo n.º 10707/08-3ª Secção), foi deliberado:
Concedendo parcial provimento aos recursos:
a) Condenar os demandados AA e T... F... R..., Lda., a pagar solidariamente, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, o montante de € 198.331,29;
b) E corrigindo a parte da decisão no dispositivo:
Relegar para execução de sentença o custo com eventuais intervenções cirúrgicas e internamentos e inerentes exames e ajudas técnicas que se revelem necessários para curar as lesões do demandante civil, bem como os preços dos medicamentos, fraldas, algálias a partir dos período de 15 anos que se fixou como determináveis, a pagar, solidariamente pelos referidos demandados.
c) Confirmar, no mais, a decisão recorrida.

O acórdão do Tribunal da Relação antes do dispositivo explicitara de modo mais claro e concreto o decidido - segmento que aqui se incluirá, tendo em vista uma melhor percepção do alcance da decisão e do que está em equação no presente recurso - o que fez nos termos seguintes:
«Temos assim que:
1. O montante de indemnização a título de danos não patrimoniais se fixa em € 100.000 (cem mil euros);
2. O montante de indemnização por perda de capacidade aquisitiva se fixa em € 350.000,00 (trezentos e cinquenta mil euros);
3. O montante de indemnização a pagar a título de danos patrimoniais futuros previsíveis e determináveis nos próximos 15 anos, o montante de € 268.331,29;
4. Deverá relegar-se para execução de sentença o custo com eventuais intervenções cirúrgicas e internamentos e inerentes exames e ajudas técnicas, bem como os preços dos medicamentos, fraldas, algálias a partir do período de 15 anos que se fixou como determináveis, que se revelem necessários para curar as lesões do demandante civil DD, a pagar, solidariamente pelos demandados AA e T... F... R..., Lda..
Assim, teremos os montantes indemnizatórios: 350.000,00 a título de perda de capacidade aquisitiva, 100.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais, e a título de danos previsíveis e determináveis, o montante 268.331,29, o que perfaz € 718.331,29.
Ora, tendo a Companhia de Seguros A... pago já ao DD o montante de € 465.449,29 + € 54.550,00 = € 520.000,00 (quinhentos e vinte mil euros), e estando já esgotado o capital objecto do contrato de seguro, os demandados AA e T... F... R..., Lda., deverão ser condenados solidariamente a pagar ao Demandante DD o montante global de € 198.331,29, acrescido de juros de mora, bem como o que foi fixado a liquidar em execução de sentença».

Continuando inconformados, os demandados AA e T... F... R..., Lda. interpuseram recurso, apresentando a motivação de fls. 863 a 872 verso, que rematam com as seguintes conclusões (em transcrição integral, incluindo realces):
I- DANOS NÃO PATRIMONIAIS
1ª- Os demandados entendem que apesar do Tribunal da Relação ter baixado para 100.000,00 euros o montante indemnizatório fixado ao demandante DD, a titulo de danos não patrimoniais, o mesmo ainda está excessivamente valorado, devendo este Supremo Tribunal de Justiça reduzir nesta parte a indemnização fixada para 70.000,00 euros por ser este valor mais justo e equitativo.
2ª- De acordo com a jurisprudência dos nossos tribunais, na fixação da indemnização por danos não patrimoniais, designadamente pela reparação do direito à vida - o bem tido por supremo - tem vindo a ser fixada em não mais de 50.000,00 euros.
3ª- Atendendo à especificidade das lesões do DD, sobretudo à sua deformação física, com reflexos na sua saúde, também não significa que, neste caso, se tenha de ficar por esse limite, mas partindo desse valor, e de acordo com os valores fixados na nossa jurisprudência, os Recorrentes entendem ser justa e equilibrada a indemnização no valor de 70.000,00 euros por danos não patrimoniais.
II - DANOS PATRIMONIAIS
1ª - Nesta matéria os ora Recorrentes aceitam como justo o valor de 350.000,00 euros fixado pelo Tribunal da Relação, a título de perda da capacidade aquisitiva e da sua autonomia funcional.
2ª- Mas o valor atribuído a título de indemnização por danos futuros previsíveis e determináveis, nos próximos 15 anos, foi calculado com base num valor errado.
3ª- Com efeito, os pais do malogrado DD juntaram no início da audiência, vários documentos entre os quais, o documento n° 48, correspondente a uma factura em nome de CC, mão do menor DD, datada de 21/05/2007 e da qual consta o preço que pagou pelas sondas urológicas (vulgo algálias) no valor de 20 cêntimos a unidade e 20,00 euros uma caixa de 100 unidades - cfr. doc. n° 48 junto na audiência de julgamento.
4ª- Pelo que, quando se diz, no artigo 163 da matéria de facto que " O DD tem ainda de fazer auto algaliação de 3 em 3 horas, utilizando uma média diária de cinco algálias, ao preço unitário de 12,50 euros as infantis e 20,00 euros as de adulto" (itálico nosso), este valor não corresponde ao valor indicado quer no documento que lhe serviu de prova quer à realidade das coisas.
5ª- Pensamos que houve um lapso de escrita e que quereria dizer-se que o preço de cada algália é de 0,20 cêntimos, que rapidamente damos conta quanto somos confrontados com um valor anual de 22.812,50 euros de algálias infantis por ano, sendo que as de adultos importariam em 36.500,00 euros.
6ª - Estamos perante um facto notório - artigo 514°, n° 1 do CPC.
7ª - Com efeito, através do acesso aos meios comuns de informação ao dispor de todos os cidadãos deste país, obtemos o valor actual médio de uma sonda urológica para uso masculino, vulgo algália, de cerca de 1,00 euro por unidade.
8ª - Sendo que foi o valor incorrecto da decisão que determinou em concreto o valor a que o Tribunal da Relação chegou para efeitos de condenação quer do arguido quer da demandada civil.
9ª - O vício resulta do texto da decisão conjugada com as regras da experiência comum.
10ª - Sendo certo que na Ia instância os valores suportados pelos pais do DD não foram tidos em conta na condenação dos ora demandados civis, pelo que não ficaram vencidos nessa parte.
11ª - Tendo sempre presente o juízo de equidade, e partindo do mesmo raciocínio do Tribunal da Relação, obtemos o valor de 27.375,00 euros referentes aos danos futuros previsíveis e determináveis no próximos 15 anos, resultantes da necessidade diária do DD de medicamentos, fraldas e algálias, estas a razão de 5,00 euros diários (cinco fraldas a 1,00 euro) que após a redução de 1/4 se fixa em 20.531,25 euros.
12ª - Sendo que este o valor justo e equitativo correspondente ao efectivo dano patrimonial que se quer reparar.
13ª - Pois são danos futuros indemnizáveis, porque previsíveis, e que se podem concretizar por referência ao dinheiro - artigos 564°, n° 2 e 566, n° 1 do Código Civil.
14ª - Por isso entendemos que, no caso concreto, ser justa e equitativa a quantia de 20.531,25 euros a atribuir ao lesado DD pelos danos patrimoniais futuros com os custos dos medicamentos, fraldas e algálias.
15ª - Entendemos, pelo que ficou exposto, não haver fundamento legal para a condenação dos recorrentes no pagamento ao lesado da quantia de 268.331,29 euros, a título de danos patrimoniais futuros previsíveis e determináveis nos próximos 15 anos.
16ª - O exagero do valor das algálias é algo que perante as regras da experiência comum, se chega, sem necessidade de recorrermos a um homem especialmente conhecedor.
17ª - Houve, no douto Acórdão de que se recorre violação de regras de direito probatório e violação dos critérios legais previstos nos artigos 473°, 483°, 487°, n° 2, 562°, 564° e 566°, todos do Código Civil.
18ª - Sendo que o STJ deverá, pois, apreciar se as provas utilizadas foram avaliadas de acordo com as regras da experiência comum, na valorização dos danos futuros previsíveis, já que tal questão de direito é objecto de recurso.
19ª - Termos em que, alterando o douto Acórdão no sentido da fixação, no caso concreto, da quantia global de 370.531,25 euros a atribuir ao lesado DD pelos danos patrimoniais futuros, que incluem a incapacidade funcional e a diminuição da capacidade geral de ganho e ainda os custos com medicamentos, fraldas e algálias, acrescida da quantia de 70.000,00 euros, a título de indemnização por danos não patrimoniais, o que perfaz a quantia de 440.531,25 euros e relegando ainda para execução de sentença o custo com eventuais intervenções cirúrgicas e internamentos e inerentes exames e ajudas técnicas que se revelem necessários para curar as lesões do demandante civil, bem como os preços dos medicamentos, fraldas, algálias a partir do período de 15 anos fixado, far-se-á JUSTIÇA

O demandante interpôs recurso subordinado e apresentou contra alegações de fls. 882 a 897, sintetizando a sua posição nas seguintes conclusões:
1. Os recorrentes ao impugnarem a douta sentença proferida em primeira instância, não impugnaram os factos provados sob os números 160) a 168);
2. A convicção do Tribunal na decisão de considerar provados tais factos baseou-se na prova produzida em julgamento quer testemunhal quer documental;
3. Não constitui facto notório o preço das sondas urológicas;
4. Não resulta do texto da decisão recorrida nem por si, nem conjugada com as regras da experiência comum, o vício do erro notório na apreciação da prova pelo que o douto acórdão recorrido não violou, nesta medida, qualquer disposição legal;
5. Pela perda de capacidade aquisitiva, importa que se fixe ao demandante uma indemnização calculada sobre uma base salarial correspondente ao valor do salário à data em que faça os vinte anos de idade, ou seja daqui por oito anos;
6. Actualmente o salário de um motorista de longo curso cifra-se em cerca de 1.250,00 € mensais, nele se incluindo vencimento base, subsídios TIR, cláusula 74° (Contrato Colectivo de Trabalho para o Transporte Internacional de Mercadorias), retribuições em dias de descanso e ajudas de custo;
7. Deve fixar-se em 1.250,00 € o salário mensal para base de cálculo da indemnização por perda de capacidade aquisitiva por ser o valor ajustado, de acordo com a equidade e ponderados factores como a inflação, a progressão na carreira, o aumento de vida activa;
8. Ao decidir de modo diferente o douto acórdão recorrido violou o disposto nos artigos 564° e 566° n°3 do C.Civil, pelo que deve ser revogado e substituído por outro que fixe em 435.000,00 € a indemnização por perda de capacidade aquisitiva do demandante DD;
9. O douto acórdão recorrido fixou em quinze anos o tempo em que com segurança pode determinar os danos futuros previsíveis e já determináveis, uma vez que entende ser um facto notório que quando atingir a idade de 20-25 anos o DD será submetido a intervenção cirúrgica que poderá reverter alguns dos problemas com que se confronta actualmente;
10. Não constitui facto notório perceptível directamente pela generalidade das pessoas ou que o comum dos cidadãos possa atingir mediante raciocínios formados sobre factos observados pela generalidade dos cidadãos, que o transplante celular do epitélio olfactivo possa reverter a situação em que o DD se encontra;
11. Os factos provados nos autos e até mesmo as declarações médicas em que se baseia o douto acórdão contradizem a interpretação feita no douto acórdão, designadamente a interpretação que dá dos mesmos para concluir pela existência de facto notório;
12. Do texto do douto acórdão conjugado com as regras da experiência comum resulta o vício de erro notório da apreciação da prova, o que constitui fundamento deste recurso - artigo 410° do C.P.C.;
13. O douto acórdão viola o disposto nos artigos 564° e 566° do C.Civil, pelo que deve ser revogado e substituído por outro que, reconhecendo a existência de danos patrimoniais futuros determináveis os fixe pelo período de 56 anos e fixe a indemnização em 890.462,32 €;
14. Os danos morais sofridos pelo DD, paraplégico aos oito anos de idade, com a infância cortada, com uma adolescência comprometida e um homem impotente, são gravíssimos e perdurarão no tempo até ao resto dos seus dias;
15. Na produção do acidente que lhe causou tão graves lesões, o condutor, ele próprio motorista profissional e a conduzir um veículo pesado de grandes dimensões, propriedade da sociedade familiar de que ele é também sócio gerente, agiu com culpa exclusiva e muito grave;
16. A indemnização arbitrada no douto acórdão para ressarcimento dos danos morais que o DD sofre, não traduz ajusta medida de uma indemnização que respeite o disposto nos artigos 496° n°3 e 494° do C.Civil, disposições legais que por isso foram violadas;
17. Deve, pois, ser substituído por outro que fixe a indemnização por danos morais no valor peticionado pelo demandante, 300.000,00 €;
18. 0 douto acórdão depois de determinar o montante global da indemnização a atribuir ao demandante, deduz o valor pago pela R. Companhia de Seguros A... ao demandante, por conta do pedido de indemnização formulado e ainda, indevidamente, a quantia de 54.550,71 €;
19. 0 montante de 54.550,71 € despendido pela Companhia de Seguros A... não constitui pagamento de despesas exclusivamente do demandante DD, como consta do texto do douto acórdão - página 34 - e da documentação junta aos autos;
20. A quantia de 54.550,71 € refere-se a despesas hospitalares, com fisioterapia, com ajudas técnicas, com transportes e outras, e foi paga a quase totalidade directamente às instituições que prestaram os serviços respeitantes a despesas e, as que o não foram, em todo o caso respeitaram a despesas feitas antes da entrada em juízo do pedido de indemnização civil e por isso não peticionadas;
21. 0 douto acórdão apreciou os documentos, considerou que efectivamente o valor de 54.550,71 € respeita a valores pagos também a instituições, e referentes também a outros lesados, deu como assentes factos que revelam ter esses pagamentos sido feitos antes da propositura do pedido de indemnização, mas contraditoriamente abate-o na indemnização devida ao demandante DD;
22. Do texto do douto acórdão ressalta a contradição, o vício da decisão de descontar da indemnização os valores que o demandante não recebeu por conta da mesma, por erro notório na apreciação da prova - artigos 410° n°2 alínea c) do C.P.P.;
23. Deve pois reconhecer-se o vício em que labora o douto acórdão, substituindo--se por outro que ao fixar a indemnização a pagar ao demandante DD, lhe abata somente o valor de 465.449,29 € efectivamente recebido por conta do pedido, e não já os 54.550,71 €.

Os demandados apresentaram a resposta de fls. 903 /4, apresentando as seguintes conclusões:
1ª - Nos autos está em causa a responsabilidade civil conexa com a criminal, tendo a sua génese no crime.
2ª - Pelo que, na fixação do montante compensatório, a título de danos não patrimoniais, para além da gravidade danos concretos e da culpa danos tem de ser tido em conta a situação económica do lesante e do lesado.
3ª - No entanto nada de concreto se provou.
3ª (sic) - Salvo melhor opinião não se pode alcançar a fixação de um montante que seja equilibrado, adequado, justo e equitativo se não conhecermos qual a verdadeira situação económica quer do arguido quer do lesado.
4ª - Muito menos fixar essa quantia, como quer o assistente, no valor de 300.000,006.
5ª - Neste contexto, e tendo em atenção a factualidade dada como provada, para a justiça do caso concreto, torna-se evidente estarmos perante deficit de matéria de facto, o que constitui o vício previsto no artigo 410°, n° 2, alínea a) do CPP.
5ª - Vício que expressamente se invoca e que poderá determinar, nos termos do artigo 426°, n° 1 do CPP, o reenvio do processo para novo julgamento, não obstante a posição já manifestada pelo arguido e pela sociedade demandada no seu recurso, relativamente ao valor da indemnização por danos não patrimoniais.

O Exmo. Procurador-Geral Adjunto teve vista dos autos, dizendo nada ter a requerer ou promover, por os recursos respeitarem à indemnização civil arbitrada.

Como é jurisprudência assente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso – vícios decisórios e nulidades referidos no artigo 410.º, n.ºs 2 e 3, do Código de Processo Penal – é pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação apresentada, em que sintetiza as razões do pedido (artigo 412.º, n.º 1, do CPP), que se delimita o objecto do recurso e os poderes de cognição do Tribunal Superior.
O presente recurso foi interposto, como de resto, a decisão ora recorrida e mesmo a da primeira instância, já no domínio da nova redacção dada ao CPP pela Lei n.º 48/2007, de 29-08, entrada em vigor em 15 de Setembro de 2007, não tendo os recorrentes requerido a realização de audiência.
Passou a dispor o n.º 5 do artigo 411.º do Código de Processo Penal: “No requerimento de interposição de recurso o recorrente pode requerer que se realize audiência, especificando os pontos da motivação que pretende ver debatidos”.
Não tendo sido requerida audiência, o processo prossegue com julgamento em conferência, nos termos do artigo 419.º, n.º 3, alínea c), do CPP.


Questões a decidir.

Face às conclusões das motivações apresentadas pelos recorrentes, são as seguintes as questões a apreciar e decidir:

Recurso principal dos demandados

I – Indemnização por danos futuros previsíveis e determináveis nos próximos 15 anos - Cálculo com base em valor errado – Facto notório – Vício resultante do texto da decisão - Equidade – Conclusões II - Danos Patrimoniais – 2ª a 18ª;
II – Indemnização por danos não patrimoniais – Excesso de valoração - Redução - Conclusões I - Danos não patrimoniais – 1ª, 2ª, 3ª.

Recurso subordinado do demandante

I – Indemnização por danos patrimoniais - Danos futuros -_Lucros Cessantes – Frustração de ganhos - Perda da capacidade aquisitiva de ganho – Cálculo do dano - Deficiente valoração - Conclusões 5ª a 8ª.
II – Indemnização por danos patrimoniais - Danos futuros previsíveis e determináveis - Período de existência dos danos a fixar em 56 anos e não em 15 - Erro notório na apreciação da prova – Conclusões 9ª a 13ª.
III – Indemnização por danos não patrimoniais – Compensação deficiente - Conclusões 14ª a 17ª.
IV – Dedução ao montante global de indemnização do valor pago pela seguradora por despesas anteriores à propositura da acção cível enxertada - Erro notório na apreciação da prova - Conclusões 18ª a 23ª.

*

FACTOS PROVADOS

É a seguinte a matéria de facto dada por provada pelas instâncias e de ter por definitivamente assente, já que como se demonstrará infra, a decisão de facto não enferma de qualquer dos vícios decisórios assacados pelas partes, quer o vício “inominado” invocado pelos demandados, mas que se pode ter como erro notório na apreciação da prova, atento o contexto em que é formulada a questão, quer o mesmo vício, arguido agora de forma clara e expressa pelo demandante, a propósito das matérias de danos futuros previsíveis e já determináveis e da dedução operada pela Relação relativamente ao que havia sido pago pela seguradora, quer ainda o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, suscitada pelos demandados na resposta à motivação do demandante, a respeito da situação económica das partes, como fundamentadora da indemnização por danos não patrimoniais.
Na fixação da matéria de facto surpreende-se alguma repetição de factos provados, o que deriva do facto de a alegação de alguns deles na acusação ser repetida no pedido cível, embora com outro enquadramento (vg., factos n.º s 33, 60 e 101 e 33, 102, 111, 167 e 195).

1) No dia 22 de Dezembro de 2003, pelas 14horas e 45 minutos, o arguido conduzia a viatura pesada de mercadoria, com a matrícula ...-...-..., pela Estrada Nacional n.º 118, no sentido Muge-Benfica do Ribatejo.
2) O veículo conduzido pelo arguido vinha carregado, pesando mais de oito toneladas.
3) Na ocasião, as condições atmosféricas eram boas e o asfalto encontrava-se seco e em bom estado.
4) O arguido imprimia à sua viatura uma velocidade de cerca de 60 quilómetros por hora.
5) A estrada por onde seguia o arguido configura uma recta plana.
6) A faixa de rodagem tem uma largura de sete metros.
7) Após a zona da recta, a estrada descreve uma ligeira curva para a direita, atento o sentido de marcha do arguido.
8) Sensivelmente a meio dessa curva, entronca no lado esquerdo da estrada nacional, atento o sentido de marcha do arguido, um caminho de terra batida.
9) Para os condutores das viaturas que levam a mesma direcção da do arguido, existem sinais verticais que anunciam o entroncamento à esquerda e de proibição de ultrapassagem.
10) Na eventualidade de se encontrar junto ao eixo da via uma viatura que leve o mesmo sentido do veículo do arguido e cujo condutor pretenda mudar de direcção à esquerda e entrar no dito entroncamento, aquela pode ser avistada a cerca de 100 metros por quem se aproxime do local e vá pelo mesmo sentido do arguido.
11) E ainda na eventualidade de se encontrar dentro da hemi-faixa de rodagem direita, atento o sentido de marcha do arguido, e cujo pretenda mudar de direcção à esquerda e entrar no dito entroncamento, aquela pode ser avistada seguramente a não menos que cinquenta metros.
12) Alguns metros à frente da viatura do arguido e pelo mesmo sentido, seguia uma viatura ligeira de mercadorias, usualmente designada por carrinha de caixa aberta, conduzida por EE e na qual também seguia, a seu lado e ao meio, o seu neto DD, nascido a 4 de Agosto de 1995, e junto à porta do lado direito, FF.
13) Pretendia EE mudar de direcção à esquerda e fazer entrar a sua viatura no mencionado entroncamento situado a meio da curva.
14) Ao aproximar-se das imediações do entroncamento, EE sinalizou visualmente a manobra que pretendia fazer com a respectiva luz, reduziu a velocidade e que imprimia à sua viatura e fê-la aproximar do eixo da via.
15) Verificando que seguiam duas viaturas automóveis pelo sentido contrário, ou seja Benfica do Ribatejo - Muge, aquele EE imobilizou entretanto a sua viatura perto do eixo da via e nas imediações do referido entroncamento, ficando à espera da ocasião propícia para contemplar a manobra.
16) Neste entretanto, aproximou-se do local onde estava parado o veículo conduzido por EE a viatura conduzida pelo arguido e apercebendo-se da presença daquele, travou.
17) Porém não foi capaz de imobilizar a sua viatura e evitar o embate, fazendo colidir a zona frontal da sua viatura, em especial o pára-choques, com a traseira da caixa aberta da viatura de EE.
18) Na sequência do embate, a carrinha de caixa aberta deslizou para a frente e embateu na carroceria dianteira, onde se encontravam as três pessoas, sendo estas atingidas pelo embate na zona das suas costas.
19) Ainda na sequência do embate, a mesma viatura foi projectada para a frente, saindo da estrada por onde se encontrava, pelo seu lado esquerdo.
20) Só se imobilizou a cerca de 80 metros do local de embate, quando embateu frontalmente com um poste de electricidade situado para além da berma esquerda da estrada, atento o sentido de marcha de ambos os condutores, e a cerca de 8,80 metros de um sinal de proibição de ultrapassar, situado na berma direita no sentido Benfica do Ribatejo - Muge.
21) Quanto à viatura do arguido, ficou a mesma parada na sua hemi-faixa, sensivelmente mais à frente do mencionado entroncamento.
22) No momento do embate entre as duas viaturas, vinha em sentido contrário um veiculo automóvel conduzido por GG, tendo sido ainda atingido por alguns destroços provenientes do embate.
23) Em consequência do descrito embate, EE sofreu diversas lesões toráxicas e abdominais, a saber, fractura do 70, 80 e 90 arcos tostais esquerdo anterior, hemotórax de 1200 cm3 à direita e 750 cm 3 à esquerda, hemopericardio de cerca de 150 cm3, laceração da aorta ascendente à saída do coração com 1,5 cm na parte anterior, infiltração sanguínea peri-aortica, contusões pleurais bilaterais, congestão e edema com saída de secreções sanguinolentas à expressão manual, hemoperitoneu de cerca de 250 cm3, fractura do fígado e fractura do baço, lesões estas que lhe causaram a morte.
24) Também em consequência do acidente descrito, FF sofreu diversas lesões físicas, nomeadamente traumatismo crâneo encefálico com perda de conhecimento, traumatismo da coluna dorsal lombar e hematoma associado, traumatismo da bacia e traumatismo do membro inferior direito, lesões estas que demandaram um período de trinta dias de doença, os primeiros quinze dos quais com incapacidade para o trabalho.
25) Igualmente em consequência do acidente, DD sofreu diversas lesões físicas, que lhe causaram prolongado período de sofrimento físico, designadamente traumatismo crâneo-encefálico, com perdas de conhecimento, traumatismo medular, contusão pulmonar e ferida na região occipital.
26) Esteve internado no serviço de pediatria e na unidade de neurologia do Hospital de Santa Maria desde a data do acidente até 15/3/2004, altura em que foi transferido para o Centro de Medicina de Recuperação de Alcoitão, onde permaneceu até 3/9/2004.
27) Enquanto esteve internado, efectuou diversos exames que revelaram atlectsia pulmonar bilateral, contusão em C7/D1, pelo que usou colar cervical até 19/1/2004, data em que foi operado por atrodese posterior de C7 e Dl.
28) Iniciou o programa de reabilitação a 22/1/2004.
29) Esteve ventilado de 27/12/2003 até 11/1/2004.
30) Fez várias fibroscopias.
31) Fez infecções urinárias, respiratórias e dermatológicas.
32) Foi-lhe observada uma úlcera da região occipital.
33) Vem sendo vigiado na consulta de pedo-psiquiatria e neurologia, por sofrer de depressão reactiva ao acidente, paraplegia, incontinência dos esfíncteres e ausência de sensibilidade 1 cm abaixo da linha intermamilar.
34) Necessita de argaliações de 3 em 3 horas.
35) Desloca-se regularmente ao Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão.
36) O arguido não teve o cuidado de circular naquela estrada em condições e velocidade tão lenta que permitisse parar a marcha do mesmo antes de embater no veículo ligeiro de mercadoria.
37) Daí que não avistou, com a necessária antecedência, conforme podia e era capaz, a viatura que se apresentava à sua frente, parada, a aguardar a oportunidade para mudar de direcção à esquerda.
38) O cuidado referido impunha-se de forma mais premente ainda atento o facto do arguido conduzir um veículo pesado de grandes dimensões.
39) A violação do dever de cuidado supra descrito foi determinante no acidente ocorrido e do qual que resultou a morte de EE e as lesões de DD e de FF.
40) O arguido na conduta que encetou actuou livre e conscientemente, não conduziu com a necessária atenção que a velocidade que fazia imprimir ao TC, as características do local, o tipo de veículo que conduzia e as regras de circulação estradai impunham, o que sabia não ser legalmente admissível e punido pelo direito.
41) O arguido agiu com falta de atenção e prudência, não teve em conta os cuidados necessários e devidos na situação concreta, bem como agiu com total falta de destreza na acção que empreendeu, que evitasse o embate ou que, não o evitando, minimizasse as suas consequências.
42) O arguido tinha capacidade para circular em velocidade inferior àquela em que circulava naquela data, hora e local e estava obrigado a fazê-lo em condições que não pusesse em risco os demais utilizadores da via.
43) O arguido não previu que da sua conduta resultasse a morte e as lesões supra descritas.
44) O arguido não tem quaisquer antecedentes criminais nem antecedentes contra - ordenacionais estradais.
45) É motorista de profissão há cerca de vinte anos.
46) É um condutor habitualmente prudente e cuidadoso.
47) O arguido entrou em depressão devido às consequências do acidente.
48) Ainda actualmente sente-se angustiado e manifesta sofrimento em relação aos resultados do acidente, tendo vindo a ser medicado com psicofármacos de tipo antidepressivo e ansiolítico.
49) Tem como habilitações literárias a 4.ª classe.
50) É sócio da sociedade demandada "F... R...".
51) Vive com a mulher.
52) Tem duas filhas, de 9 e 22 anos.
Mais se provou:
53) O veículo conduzido pelo arguido e demandado AA é propriedade da firma "T... F... R..., Ld.ª", com sede na Rua do ..., ..., Vila Flor.
54) A demandada T... F... R..., Ld.ª havia transferido a responsabilidade civil decorrente de danos causados pelo veículo seguro para a Companhia de Seguros A... P..., S.A., por contrato de seguro titulado pela apólice n.º .... .
55) O DD viajava com o cinto de segurança colocado, fixo em dois pontos.
56) Viajava no lugar central da carrinha de caixa aberta.
57) O DD ficou encarcerado cerca de 40 minutos, durante o qual houve um período curto de perda de conhecimento.
58) Do acidente resultou traumatismo crânio - encefálico, traumatismo vértebero-medular, contusão pulmonar e ferida na região occipital.
59) Foi transportado em helicóptero pelo INEM para o Hospital Santa Maria de Lisboa, na Unidade de Cuidados Intensivos de Pediatria.
60) À entrada na unidade estava vigil, orientado, com discurso coerente, pupilas isocóricas e reactivas, sem sensibilidade ou movimentos abaixo da linha intermamilar.
61) Fez ressonância magnética nuclear da coluna vertebral no mesmo dia 22 de Dezembro de 2003, que evidenciou foco de contusão adematosa em CD7 - Dl, com diâmetro antero-posterior da medula aumentado a esse nível, e em consequência foi-lhe colocado um colar cervical rígido.
62) Uma semana depois, repetiu o exame que revelou aumento do edema peri-lesional, pelo que efectuou terapêutica e.v. com dexametasona, sem qualquer melhoria clínica.
63) Manteve colar cervical rígido até ao dia 19/1/2004, altura em que realizou atrodese posterior de C7 e Dl.
64) No dia 22 de Janeiro de 2004, iniciou programa de reabilitação física.
65) No dia 22 de Dezembro de 2003, fez ecografia renal que revelou sinais de liquido peri-renal.
66) Repetiu o exame em 4 de Fevereiro de 2004, após uma infecção do tracto urinário por pseudomonas aeroginosa, que não revelou alteração das dimensões e morfologia renal, mas com ligeira e moderada ureterohidronefrose bilateral.
67) Os estudos urodinâmicos em 1 de Abril de 2004 revelaram existência de bexiga neurogénea, de pequena capacidade, hiperreflexa, e com deficiente compliance do detrusor e pressões endo- vesicais elevadas.
68) Em 30 de Abril de 2004, uma nova urografia revelou dilatação pielocalicial à direita.
69) Entre 22 e 26 Dezembro de 2003 mantinha respiração espontânea, necessitando de oxigénio por máscara por períodos, com muitas secreções e tosse pouco eficaz.
70) Realizou RX pulmonar, em 26 de Dezembro de 2003, que revelou atelectasia completa do pulmão esquerdo.
71) Realizou broncospia com desobstrução da árvore brônquica e resolução da atelectasia que no entanto se refez duas mais em cerca de 24 horas, necessitando de mais duas broncoscopias.
72) Foi sujeito a ventilação mecânica de 27 de Dezembro de 2003 a 11 de Janeiro de 2004.
73) Foi desconectado do ventilador a 11 de Janeiro de 2004, só tendo sido extubado a 20 de Janeiro após cirurgia à coluna.
74) Em 22 de Janeiro de 2004, fez a última fibroscopia, tendo-se conseguido reexpansão completa do pulmão.
75) Em 16 de Fevereiro de 2004, foi-lhe verificada pneumonia da base direita e iniciou medicação adequada.
76) Manteve necessidade de oxigénio suplementar e realizou reabilitação funcional respiratória.
77) A dificuldade respiratória agravou-se e a 20 de Fevereiro de 2004 fez RX toráxico que revelou atelectasia do lobo médio.
78) Realizou sessão de cinesioterapia mais agressiva e manteve oxigénio suplementar até ao dia 23 de Fevereiro de 2004.
79) Fez sucessivas infecções urinárias, respiratórias e ainda dermatológicas.
80) Durante o internamento surgiu lesão sacro-coccígea com sinais inflamatórios acentuados apesar da terapêutica tópica o que justificou antibioticoterapia durante dez dias.
81) Após esse período manteve terapêutica tópica com reforço da necessidade de alternância de decúbitos laterais CO m a posição sentada o que progressivamente levou à melhoria da escara.
82) Também a ferida na região occipital fez escara de pressão que não evoluiu com a terapêutica conservadora.
83) Em consequência, no dia 13 de Fevereiro de 2004, foi submetido a intervenção cirúrgica com anestesia geral, pela cirurgia plástica, para limpeza e enxerto na ferida com resolução de escara.
84) Em 28 de Janeiro de 2004, DD foi transferido da unidade de Cuidados Intensivos Pediátricos para a Unidade de Neurologia do Hospital de Santa Maria.
85) Após extubação verificou-se disfonia, pelo que em 27 de Fevereiro de 2004, foi submetido a laringoscopia rígida sem anestesia, tendo sido observada parésia da corda vocal direita.
86) Em 5 de Março de 2004, foi de novo submetido a laringoscopia rígida sob anestesia geral, tendo sido observada hemilaringe esquerda com paralisia, lesão que constitui sequela de carácter permanente.
87) Foi aconselhada observação em terapia de fala, que veio a fazer enquanto esteve internado no centro de Alcoitão.
88) Ainda durante o internamento no Hospital de Santa Maria, DD fói submetido a regime alimentar adequado ao seu estado por não tolerar dieta ligeira.
89) Iniciou alimentação por S.N.G. e posteriormente por S.N.D..
90) Fez intolerância à alimentação entérica pelo que iniciou alimentação parentérica total em 29 de Dezembro de 2003.
91) No dia 12 de Janeiro de 2004, parou a nutrição parentérica e voltou a alimentação por S.N.G..
92) No dia 23 de Janeiro de 2004, iniciou dieta oral de dia e nutrição por S.N.G. de noite, que manteve até 27 de Janeiro seguinte.
93) Ainda durante o internamento, DD sofreu depressão reactiva ao acidente.
94) O acidente em si e o tempo de encarceramento no veículo ao lado do avô traumatizou DD.
95) Só em princípios de Março de 2004, DD conseguiu falar do avô e chorar a sua morte.
96) De igual modo, a perda da capacidade de marcha provocou em DD um humor depressivo acentuado.
97) Só mais tarde, com o apoio da pedopsiquiatria conseguiu começar a verbalizar à mãe sentimentos de angústia por não poder andar.
98) O DD iniciou tratamento para a depressão com fluoxetina, 10 mg/ dia, que fez até Janeiro de 2005.
99) Manteve durante o internamento no Hospital de Santa Maria programa de reabilitação diária, terapia ocupacional, que o ajudaram a conviver com o trauma que sofreu.
100) Actualmente ainda continua a ser seguido na consulta pedopsiquiatria no Hospital de Santa Maria, onde se desloca anualmente.
101) Ainda em consequência do traumatismo vertebro-medular, o DD ficou paraplégico, sem sensibilidade abaixo da linha intermamilar.
102) E sofre de incontinência de esfíncteres.
103) No dia 3 de Fevereiro de 2004, retirou os pontos de sutura da intervenção cirúrgica para atrodese posterial de C7 e Dl.
104) Teve alta do Serviço de Neurocirurgia do Hospital de Santa Maria, em 9 de Março de 2004, com indicação de fazer fisioterapia em regime de internamento em centro de reabilitação especializado e encaminhado para a consulta externa de neurocirurgia daquele hospital.
105) Em 15 de Março de 2004, DD fói transferido para o Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão, onde permaneceu até 3 de Setembro seguinte.
106) À entrada daquele Centro de Medicina de Reabilitação, apresentava-se emagrecido e debilitado.
107) Os membros superiores apresentavam diminuição da força muscular por desuso.
108) Continuava sem movimentos activos dos membros inferiores, com tendência para o equinismo dos pés.
109) Apresentava um quadro de paraplegia espástica com motilidade e sensibilidade táctil e dolorosa abolidas abaixo de D2 bilateralmente, sensibilidade postural abolida em ambos os membros inferiores bilateralmente, sensibilidade vibratória abolida abaixo do externo.
110) Apresentava ainda espasticidade de grau 2 (escala de Ashworth modificada), com reflexos patelares e aquilianos vivos bilateralmente.
111) Continuava a não ter controle de esfíncteres.
112) Não tinha equilíbrio estático e dinâmico sentado.
113) Era completamente dependente nas actividades da vida diária, em concreto na higiene pessoal, no vestir, necessitava de supervisão na alimentação.
114) Também não tinha capacidade para deambular em cadeira de rodas.
115) Durante o internamento no Centro de Medicina de Reabilitação do Alcoitão foi submetido a exames, designadamente estudos urodinâmicos, em 1 de Abril e 31 de Maio, cistografia retrógrada em 31 de Março, urografia em 30 de Março, estudo do sono em 23 de Junho e provas da função respiratória.
116) Ainda durante o internamento no Centro sofreu dois episódios de infecções respiratórios e dois episódios de pielonefrite.
117) Durante o internamento em Alcoitão, DD foi submetido a um programa intensivo de reabilitação.
118) Em 3 de Setembro de 2004, à data da alta do Centro de Reabilitação, DD mantinha o quadro neuro-motor de paraplegia espástica compelta abaixo de de D2, que ainda mantém.
119) Apresentava um bom estado de nutrição e revestimento cutâneo cicatrizado.
120) Tinha treino vesical instituído por auto - algaliação de três em três horas, com controlo de líquidos ingeridos e eliminados, o que ainda agora acontece e se manterá o resto da sua vida.
121) Tinha e ainda hoje tem treino intestinal instituído com supositórios de glicerina infantil em dias alternados, situação que se manterá o resto da sua vida.
122) Melhorou o equilíbrio sentado e a força muscular dos membros superiores o que lhe permite deambular em cadeira de rodas.
123) Usa ortótese de tronco para evitar o seu colapso e também ortóteses longas com botas ortopédicas para os membros inferiores.
124) Mantinha medicação diária, a saber oxibutinina, fluoxetina, fenoxibenzamina, glicerina infantil e budenosido 200 mg.
125) Fazia e faz períodos de pé com ajuda técnica de Standing- frame para posição de pé, com ortóteses longas.
126) Actualmente, devido ao crescimento, as ortóteses do tronco e dos membros inferiores não serviram e já tiveram que ser substituídas.
127) Além das ajudas técnicas supra referidas, foram-lhe prescritas outras, a saber: almofada anti-escara, espirometro, câmara expansora, cadeira de banho, tábua de transferências.
128) A R.Companhia de Seguros A... P..., S.A., assumiu junto do Centro de Medicina de Reabilitação do Alcoitão, e pagou já algumas das despesas com aquisição das referidas ajudas técnicas.
129) Actualmente, DD desloca-se em cadeiras de rodas.
130) Os pais adaptaram já a casa de habitação com a construção de uma rampa, despesas que a R. seguradora assumiu.
131) DD apresenta uma cicatriz longitudinal desde a base do pescoço ao início da região dorsal com 11,5 cm por 1,2 cm.
132) Tem uma zona de alopecia oval na região occipital de 6,5 x 5 cm.
133) Depois que teve alta em Setembro de 2004, DD passou a deslocar-se à consulta ao centro de Medicina de Reabilitação do Alcoitão de três em três meses.
134) Também ali se desloca sempre que é necessário ajustar as próteses.
135) Desde Setembro de 2004 até à data da entrada do pedido de indemnização civil que o DD se deslocou àquele centro 197 vezes.
136) Estas deslocações foram, assumidas directamente pela demandada Companhia de Seguros.
137) O DD iniciou ainda um programa de fisioterapia em Janeiro de 2005, duas vezes por semana, na Therapia - Clínica de Medicina Física e Reabilitação, Ld.a, em Almeirim, que durou até Janeiro de 2006.
138) A conselho do médico fisiatra, passou agora a fazer hidroterapia e mais tarde voltará a repetir os tratamentos de fisioterapia.
139) Iniciou a hidroterapia nas piscinas de Salvaterra de Magos, em 14 de Março de 2006.
140) Os seus pais pagaram de inscrição € 6,86 e pagaram € 13,50.
141) Para se deslocar às piscinas, DD tem sido transportado de táxi, que a Companhia de Seguros pagou, e que ficará a cargo dos pais após a fixação da indemnização.
142) O DD continua a ser seguido nas consultas de neurocirurgia e de pedopsiquiatria no Hospital de Santa Maria.
143) Até à data da entrada do pic em juízo, DD dirigiu-se àquele hospital cerca de 82 vezes.
144) O menor DD não consegue tratar da sua higiene pessoal sem a ajuda de terceiros, designadamente para tomar banho.
145) Apesar de movimentar os membros superiores necessita de algum apoio para se vestir e calçar e também para sair e voltar à cadeira quando quer ir à casa de banho ou quando se deita.
146) A deambulação em cadeira de rodas manual é conduzida pelo próprio.
147) O DD necessita de fisioterapia e hidroterapia para não agravar o seu estado.
148) Os pais levaram o a uma consulta no Instituto de Cirurgia Reconstrutiva do Dr. A... N..., com vista a uma possível intervenção cirúrgica para resolução da paralesia dos membros inferiores.
149) Existe probabilidade do DD necessitar de tratamentos e/ou intervenções cirúrgicas para melhoria do seu estado clínico actual ou para resolução de complicações intestinais, respiratórias, urinárias ou para resolução de escaras cutâneas.
150) Numa perspectiva de verem o filho melhorar e deixar a cadeira de rodas, os pais do DD levaram-no a uma consulta de medicina tradicional chinesa do Dr. P... C... .
151) DD tem sido submetido a tratamentos de acupunctura, que os pais têm pago à razão de € 30,00 por tratamento, tendo despendido € 510,00.
152) Em duas câmaras de ar para a cadeira de rodas, os pais do DD despenderam € 18,00.
153) Despenderam ainda €103,50 e €104,40 em caixas de 90 cápsulas de Fenoxibenzamina 10 mg, de que DD necessita diariamente e que compram no Centro de Medicina de Reabilitação do Alcoitão.
154) Os pais do DD despenderam com a compra de um par de botas ortopédicas de modelo cirúrgico € 103,76 e com um par de ortóteses acima do joelho no valor e € 871,10 e com uma ortótese de tronco bivalve tipo TLSO no valor de € 413,23, tudo, no valor total de € 1.388,09.
155) Em consultas médicas e medicamentos adquiridos para o DD e não pagas pela Seguradora, gastaram os pais do DD € 388,68.
156) Logo após o acidente e durante todo o tempo em que o DD esteve internado, entre 22 de Dezembro de 2003 e 3 de Setembro de 2004, a mãe acompanhou-o diariamente.
157) O menino mostrava-se ansioso, angustiado não só em resultado da experiência vivenciada no dia do acidente, como ainda pelas consequências físicas que lhe resultaram das lesões.
158) A mãe do DD era trabalhadora rural à data do acidente nas campanhas de tomate, auferindo entre os meses de Abril de Outubro, € 120, por semana.
159) No ano de 2004, não fez a campanha de tomate para ficar à cabeceira do filho.
160) O DD tem necessidade de ter vigilância do foro urológico.
161) O DD toma diariamente um comprimido de Ditropan e um de Fenoxibenzamina 10 mg para o funcionamento da bexiga.
162) Cada caixa de Fenoxibenzamina 10 mg, com 90 cápsulas importa em € 104,40 e necessita de 4 por ano; cada caixa de Dtropan 5 mg , com 60 unidades importa em 6,58 € e necessita de 6 por ano; cada embalagem de Budenosido 200 mg importa em € 11,40, durando cerca de um mês.
163) O DD tem ainda de fazer auto algaliação de 3 em 3 horas, utilizando uma média diária de cinco algálias, ao preço unitário aproximado de € 12,50 as infantis e de € 20 as de adulto.
164) Para aplicação das algálias utiliza em média uma embalagem de Lindonostrum-gel, no valor unitário de € 4,24.
165) Dia sim dia não, utiliza bébégel, importando cada embalagem de 6 unidades em € 3,10, num total de 31 embalagens por ano, no valor de € 94,29.
166) Todos estes medicamentos e ajudas técnicas estão prescritos para o resto da vida de DD.
167) Também em consequência das lesões sofridas no acidente, o DD deixou de ter o controle dos esfíncteres e tem perdas de urina, o que o obriga a usar fraldas tanto de dia como de noite.
168) Esta situação é irreversível e obrigará a um gasto anual de cerca de € 300,00, à razão de dois pacotes de fraldas por mês no valor unitário de cerca de € 12,50.
169) Até à entrada do pic em juízo, os pais do DD gastaram € 123,34 em fraldas.
170) De futuro, o DD necessitará substituir as ajudas técnicas que agora usa e que tem de ser adaptadas ao seu crescimento, a saber a cadeira de rodas, as ortóteses, as botas ortopédicas.
171) DD vive numa zona rural, afastado de centros urbanos e de escolas superiores.
172) Os pais do DD são operários, não tendo disponibilidade financeiras para proporcionar ao seu filho um curso superior e deslocações longe de casa para o efeito.
173) O irmão mais velho do DD, com vinte anos, tem o 9º ano de escolaridade.
174) Com a perda de mobilidade decorrente das lesões sofridas pelo acidente, o DD não conseguirá exercer actividades profissionais que impliquem força ou movimento de andar, baixar-se ou levantar-se.
175) O DD sofre de uma incapacidade permanente geral de € 80%.
176) O dano futuro - correspondente ao agravamento das sequelas, que com elevada probabilidade se irá registar e que se pode traduzir num aumento de incapacidade permanente geral, - neste caso devido quer a um mais provável agravamento degenerativo osteo-muscular imposto pelas limitações posicionais, bem como complicações infecciosas condicionadas pela incontinência esfínteriana, é fixável em 5% - valor a adicionar aritmeticamente à incapacidade permanente geral.
177) A incapacidade supra tem rebate no seu desempenho profissional.
178) À data do acidente, o DD tinha 8 anos de idade.
179) Era uma criança saudável e não padecia de qualquer deficiência ou limitação física.
180) Era uma criança viva, forte e gozava de força anímica.
181) Era ainda comunicativa, alegre.
182) Praticava actividades ao ar livre, tais como andar de bicicleta, jogar à bola e era membro dos escuteiros.
183) O DD pretendia vir a ser motorista de pesados.
184) Depois do acidente, o DD tem vindo a sentir-se desanimado, com alterações e humor, chora com facilidade e sente-se irritado por estar confinado a uma cadeira de rodas.
185) Tem dificuldades e aceitar a sua situação, o que o faz sentir revoltado e envergonhado e complexado perante outras pessoas.
186) Existe prejuízo sexual, o que o impedirá de ter uma vida sexual normal e ter filhos.
187) O DD sente vergonha por não poder bastar-se por na sua higiene pessoal.
188) Sente desgosto pela perda de liberdade e não conseguir brincar na rua com outras crianças, como antes o fazia.
189) Quando esteve internado sentiu-se desgostoso.
190) Sente vergonha pelo seu aspecto, no que respeita à zona de alopecia na região occipital e à extensão da cicatriz no pescoço.
191) A incapacidade temporária geral total (correspondente à fase durante a qual a vítima esteve impedida de realizar com razoável autonomia as actividades da vida diária, familiar e social) foi de 765 dias, num período de 22/12/2003 a 24/01/2006.
192) A incapacidade temporária para a actividade ocupacional habitual total -estudante -foi igualmente de 765 dias, de 22/12/2003 a 24/01/2006.
193) O quantum doloris foi fixado num grau 6 numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta as lesões resultantes, o período recuperação funcional, o tipo de traumatismo e os tratamentos efectuados, bem como a sua idade à data do acidente e perda de um seu avô, no mesmo acidente.
194) Dano estético - correspondente à repercussão das sequelas, numa perspectiva estática e dinâmica, envolvendo uma avaliação personalizada da imagem em relação a si próprio e perante os outros) é de 5, numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta as cicatrizes atrás descritas e o uso da cadeira de rodas.
195) As perdas de urina e ausência de controle dos esfíncteres obrigará o DD a usar fraldas, constituindo uma situação irreversível.
196) Existe dependência de ajudas técnicas, médicas fisiátricas e medicamentosas, bem como apoio de terceira pessoa.
197) As perspectivas de DD são as de ter de viver numa cadeira de rodas, até ao fim dos seus dias.
198) O arguido conduzia o veículo pesado de mercadorias na qualidade de motorista profissional, ao serviço e por ordem da proprietária, com conhecimento da proprietária do veículo.
199) A demandada civil Companhia de Seguros pagou por conta do acidente ocorrido as seguintes quantias:
- € 60.000,00 aos herdeiros de EE, pelos danos sofridos por este.
- € 20.000,00 ao lesado FF;
- € 54.550,71, ao menor DD, por despesas hospitalares, transportes, fisioterapia e medicamentos;
200) Acordou com demandante civil liquidar-lhe, por conta do pedido, a quantia de € 465.449,29.

Apreciando.

Na apreciação das questões colocadas nos recursos seguir-se-á uma exposição tendo em conta a natureza das matérias em litígio, independentemente da ordem de inserção das mesmas nos recursos.

QUESTÃO I – DANOS PATRIMONIAIS - DANOS FUTUROS – LUCROS CESSANTES – FRUSTRAÇÃO DE GANHOS – PERDA DA CAPACIDADE AQUISITIVA DE GANHO – CÁLCULO DO DANO – FIXAÇÃO DO MONTANTE INDEMNIZATÓRIO

Neste particular o Tribunal da Relação de Lisboa fixou o montante indemnizatório em € 350.000,00, valor com que se conformaram os demandados, mas de que discorda o recorrente/demandante, que considera a verba escassa, pretendendo a sua fixação em € 435.000,00, pelas razões que sintetiza nas conclusões 5ª a 8ª.

Na génese do pedido de indemnização formulado nos autos está um dano corporal, resultante da violação ilícita e culposa do direito subjectivo à integridade física e à saúde do demandante, integrantes de direitos de personalidade, com inscrição na Lei Fundamental e ordinária - artigos 24.º e 25.º da Constituição da República e 70.º do Código Civil.
Estabelece o artigo 25.º, n.º 1, da Constituição da República, que a integridade moral e física das pessoas é inviolável.
Na Constituição da República Portuguesa Anotada, de Gomes Canotilho e Vital Moreira, volume I, 4.ª edição revista, Coimbra Editora, 2007, a págs. 454, pode ler-se: O direito à integridade pessoal abrange as duas componentes, a integridade moral e a integridade física, de cada pessoa. Consiste primeiro que tudo, num direito a não ser agredido ou ofendido, no corpo ou no espírito, por meios físicos ou morais.
Os direitos de personalidade têm tutela prevista na secção II do Capítulo I do Título II do Livro I, Parte Geral, do Código Civil, estabelecendo o artigo 70.º, n.º 1, que a lei protege os indivíduos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral, contendo tal preceito uma norma de tutela geral da personalidade, da qual se podem extrair o direito à vida, à integridade física, à liberdade, à honra.

No caso em apreciação estamos perante um dano corporal, emergente de acidente de viação, com extensão, incidências, consequências e reflexos diversos, não apenas no presente, mas também no futuro, merecedor de especial atenção, já que os efeitos danosos se projectam a longo prazo, dada a circunstância de o lesado ser uma criança, que à data da lesão, contava 8 anos de idade.

À responsabilidade civil por ofensas à personalidade física ou moral são aplicáveis os artigos 483.º e seguintes do Código Civil, sucedendo ao conjunto normativo constante do Código da Estrada de 1954, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 39672, de 20-05-1954, que então regia especificamente a responsabilidade civil emergente da eclosão de acidentes de viação, que atingisse “qualquer pessoa na sua integridade física ou no seu património”, sendo a parte substantiva no Título VI, Capítulo I, nos artigos 56º a 58º, com a adjectivação específica dos artigos 67º (acção cível conjunta com a penal) e 68º (acção especial).

No nosso caso, a conduta integradora de crime de ofensa à integridade física do demandante, por que respondeu e foi condenado o arguido condutor, igualmente demandado, é concomitantemente geradora de dano civil.

Rabindranath Capelo de Sousa, in O Direito Geral de Personalidade, 1995, págs. 458/9, diz: “Dado que a personalidade humana do lesado não integra propriamente o seu património, acontece que da violação da sua personalidade emergem directa e principalmente danos não patrimoniais ou morais”.(…)
“Todavia, das ofensas aos direitos e bens de personalidade também podem resultar, ao menos indirectamente, danos patrimoniais, isto é, prejuízos que recaem sobre interesses de natureza material ou económica, que se reflectem no património do lesado e são susceptíveis de avaliação pecuniária, pelo que podem ser estritamente reparados ou indemnizados”, sendo exemplos “a perda de salários, retribuições ou lucros e as despesas de tratamento emergentes de uma ofensa corporal causadora de doença e incapacidade para o trabalho ou a diminuição de clientela causada por uma injúria ou uma difamação”.

No que ao caso concreto importa, há que ter em consideração uma perspectiva patrimonial, na vertente de dano futuro, lucro cessante, ou mais certeiramente, frustração de ganho (expressão mais apropriada quando está em causa perda ou diminuição de salários ou vencimentos), emergente de incapacitação para o trabalho e, para além deste, o aspecto de natureza não patrimonial.

Como referia João Álvaro Dias, em Dano Corporal Uma realidade não subsumível à perda (ou diminuição) da capacidade de ganho, in Revista Portuguesa do Dano Corporal, Novembro 2000 - Ano IX - n.º 10, págs. 83 a 91, em repetição em Algumas considerações sobre o chamado dano corporal, na mesma Revista, Novembro 2001 – Ano X - n.º 11, págs. 45 a 56, o dano corporal, como entidade jurídica própria, não redutível a disjunções conceituais histórica e sociologicamente datadas, é uma realidade de angulatura plúrima.
O dano à saúde ou dano corporal, como componente central do dano à pessoa, configura-se como um tertium genus com a sua natureza específica que não se esgota nem num qualquer dano patrimonial em sentido estrito (v. g. casos de incapacidade permanente ou temporária mas com repercussões sobre a actividade laboral) nem num simples dano moral (bastante restritivo nos seus pressupostos de admissibilidade ressarcitória).
Propugna o Autor a afirmação do dano corporal ou dano à saúde como dano autónomo, tertium genus, com um lugar próprio que não se esgota nem é assimilado pelo dualismo patrimonial - não patrimonial.

Numa primeira configuração, tendo em conta a natureza dos bens jurídicos violados, distingue-se os danos patrimoniais e não patrimoniais, consoante sejam ou não susceptíveis de avaliação pecuniária; aqueles porque incidem sobre interesses de natureza material ou económica, reflectem-se no património do lesado; estes reportam-se a valores de ordem espiritual, ideal ou moral, afectando bens não patrimoniais.
Para Pereira Coelho, in O problema da causa virtual na responsabilidade civil, Coimbra Editora, 1955, nota 42, pág. 259, o dano (patrimonial) traduz-se sempre numa diminuição do património (em sentido económico), do valor do património.

Na questão que ora nos ocupa, releva a incapacitação para o trabalho - futuro - em resultado de ofensas corporais sofridas pelo demandante, que representa um dano patrimonial indirecto (dano patrimonial emergente da ofensa do bem não patrimonial saúde).

Começando, pois, pela perspectiva patrimonial, prescreve o artigo 562.º do Código Civil que “Quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação”, só existindo a obrigação de indemnização em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão, como decorre do artigo 563.º e estabelecendo o n.º 1 do artigo 564.º que «O dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão», prevendo expressamente o n.º 2 a possibilidade de o tribunal na fixação da indemnização atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis, mas «se não forem determináveis, a fixação da indemnização correspondente será remetida para decisão ulterior».
O artigo 566.º, após proclamar no n.º 1 o primado da reconstituição natural, ressalva que a indemnização deverá ser fixada em dinheiro, sempre que aquela não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor; no n.º 2 estabelece que a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e que teria nessa data se não existissem danos, e no n.º 3 prescreve que “Se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados”.

No caso presente estaremos perante a necessidade de adiantar uma prognose de uma situação de futuro a partir da situação de facto adquirida no presente.

O dano

O dano, sendo conceito fundamentalmente concreto, consiste na “privação dum ou mais benefícios, concretamente considerados (frustração dum ou mais fins em especial) ou de uma generalidade de benefícios (perda da utilidade dum bem), motivada pela colocação do bem, com o qual era lícito ao prejudicado atingir esse benefício, em situação de ele não o poder utilizar para tal fim” - Gomes da Silva, in O Dever de Prestar e o Dever de Indemnizar, Lisboa, 1944, volume I, pág. 80.
De acordo com Mário Júlio de Almeida Costa, Direito das Obrigações, 11.ª edição, Almedina, 2008, pág. 595, dano real é o prejuízo que o lesado sofreu em sentido naturalístico («in natura»), que pode analisar-se nas múltiplas formas possíveis de ofensa de interesses ou bens alheios juridicamente protegidos, de ordem patrimonial ou não patrimonial; o dano de cálculo consiste na expressão pecuniária de tal prejuízo, cabendo, neste domínio, uma avaliação abstracta ou uma avaliação concreta, sendo aquela uma ponderação objectiva do prejuízo sofrido e esta uma ponderação subjectiva desse mesmo prejuízo, em que se apura a diferença para menos produzida no património do lesado, operando-se com a teoria da diferença.
Para Pereira Coelho, in O problema da causa virtual na responsabilidade civil, Coimbra Editora, 1955, págs. 250/1, por dano pode entender-se, por um lado, o prejuízo real que o lesado sofreu in natura, em forma de destruição, subtracção ou deterioração de um certo bem corpóreo ou ideal, podendo aqui falar-se em dano real. Por outro lado, pode entender-se por dano o valor, expresso numa soma de dinheiro, do prejuízo sofrido, podendo falar-se agora em dano de cálculo. Trata-se de duas perspectivas diferentes diante do fenómeno do dano. E em nota (29), afirma: Dano real parece a melhor palavra para designar o dano efectivo, tal como o lesado na realidade o sofreu.
Na mesma obra, na nota 43, pág. 92, considera como dois momentos o dano real e o dano como abstracta diminuição patrimonial. O dano real é originariamente um certo resultado ou efeito concreto, embora a sua expressão pecuniária, para efeitos de cálculo, se venha a traduzir numa abstracta diminuição patrimonial.
Assinala ainda que a relação de causalidade a averiguar é uma relação entre o facto e o dano real, não é uma relação entre o facto e o dano como abstracta diminuição patrimonial.
Coincidente nesta asserção Almeida Costa, ibidem, pág. 596, afirma “é o conceito de dano real que se utiliza no problema da causalidade, mas ao invés, para a determinação da indemnização por equivalente, parte-se do dano de cálculo”.
Para Meneses Cordeiro, Direito das Obrigações, 1986, 2.º volume, pág. 285, o dano real é o prejuízo correspondente às efectivas vantagens – materiais ou espirituais – que foram desviadas do seu destinatário jurídico; o dano de cálculo é a expressão monetária do dano real.
Segundo Dario Martins de Almeida, in Manual de Acidentes de Viação, pág. 80, o dano real, concreto ou efectivo é caracterizado pelo prejuízo real sofrido num certo bem corpóreo ou ideal; noutra perspectiva pode ser encarado naquilo que representa como diminuição do património do lesado, de um ponto de vista abstracto, olhando-se então ao valor do prejuízo efectivo, traduzido por uma quantia em dinheiro, sendo esta realidade que se traduz no dano de cálculo ou abstracto.

No dano patrimonial o dano real - a perda «in natura» que o lesado sofre em consequência do acto lesivo - reflecte-se sobre a situação patrimonial do lesado, na modalidade de dano emergente ou de lucro cessante.
O dano indemnizável compreende tanto o dano emergente como o lucro cessante.
A distinção entre um e outro aparece formulada já nos textos romanos: «quantum mihi abest; quantumque lucrari potui».
Citando João de Castro Mendes, Do conceito jurídico de prejuízo, pág. 29, S. Tomás já observava que ao homem «o dano pode causar-se de dois modos: quer privando-o do que tem, quer impedindo-o de adquirir o que estava a caminho de ter».
Danos emergentes correspondem aos prejuízos sofridos, ou seja, à diminuição do património (já existente) do lesado e os lucros cessantes, aos ganhos que se frustraram, aos prejuízos que lhe advieram por não ter aumentado, em consequência da lesão, o seu património - Pires de Lima-Antunes Varela, Código Civil Anotado, 4.ª edição, volume I, pág. 579.
Quanto ao lucro cessante escrevem: «o lucro cessante, como compreende benefícios que o lesado não obteve, mas deveria ter obtido, tem de ser determinado segundo critérios de verosimilhança ou de probabilidade. São vantagens que, segundo o curso normal das coisas ou de harmonia com as circunstâncias especiais do caso, o lesado teria obtido, se não fora o facto lesivo».
Para Galvão Teles, Manual do Direito das Obrigações, pág. 187, danos emergentes traduzem-se numa perda sofrida, numa diminuição ou empobrecimento do património, enquanto os lucros cessantes consistem num ganho frustrado.
Enquanto os danos emergentes consistem numa forma de diminuição do património já existente, consubstanciando prejuízo causado nos bens ou nos direitos já existentes na titularidade do lesado à data da lesão, os lucros cessantes consistem numa forma de não aumento do património já existente, isto é, os benefícios que o lesado deixou de obter por causa do facto, mas a que ainda não tinha direito à data da lesão.
Pereira Coelho, in O problema da causa virtual na responsabilidade civil, Coimbra Editora, 1955, nota 43, págs. 91/2, na distinção entre as duas formas de dano afasta o critério económico (substancial), dando primazia a um critério jurídico (formal), pois o património em sentido económico abrange também as utilidades futuras e as simples expectativas de aquisição de bens, por forma que o lucro cessante se traduz, tal qual o dano emergente, numa diminuição do património em sentido económico.
Na definição de Moller, apud citada obra, nota 43, pág. 92, lucro cessante é uma destruição de uma “relação de expectativa”, figura incluída, ao lado dos direitos subjectivos, no património.
Gomes da Silva, op. cit., a fls. 74/5, distingue quatro classes de prejuízos patrimoniais, definindo os lucros cessantes como os que consistem em não entrarem no património do ofendido valores que nele deveriam ingressar se não se tivesse dado a lesão.
A págs. 66/67, adianta: “No caso de lucros cessantes admite-se a obrigação de indemnizar com o fundamento numa simples probabilidade, por forte que seja, de se adquirir um lucro; repara-se, portanto, um dano meramente provável. Outras hipóteses há, porém, em que a dúvida sobre a existência do dano é ainda maior: quando se repara uma diminuição da capacidade de trabalho sofrida por uma pessoa, ou quando se concede a uma viúva dum assassinado uma pensão vitalícia, admite-se implicitamente que a capacidade de trabalho, no primeiro caso, se teria mantido tal como era antes da ofensa, e que, na segunda hipótese, a vítima do homicídio, se não fora este, teria vivido e trabalhado para sustentar a mulher até à morte desta.
Em todos estes casos a obrigação de indemnizar baseia-se numa simples presunção; (…) Nestas hipóteses presume-se que o dano existe e considera-se suficiente tal presunção para impor a obrigação de indemnizar; no caso do dano moral procede-se de igual modo: não se pode verificar directamente a dor, mas, atendendo-se à experiência humana e às circunstâncias da ofensa, presume-se-lhe a existência”.
Segundo Pessoa Jorge, in Ensaio sobre os pressupostos da responsabilidade civil, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, 1968, pág. 377, enquanto o damnum emergens constitui uma diminuição efectiva do património, o lucrum cessans representa o não aumento deste, ou seja, a frustração de um ganho, adiantando que a distinção acha-se enunciada, embora em termos pouco felizes, no n.º 1 do artigo 564º.
Para Meneses Cordeiro, loc. cit., pág. 295, o dano emergente é o que resulta da frustração duma vantagem já existente; o lucro cessante advém da não concretização duma vantagem que, doutra forma, operaria.

Na ponderação de atribuição de uma indemnização poderemos estar perante danos presentes – danos emergentes e lucros cessantes – mas igualmente face a danos futuros, que tanto poderão representar-se por danos emergentes - como lesões corporais, a determinar de forma mais completa no futuro, despesas com tratamentos e intervenções cirúrgicas - como lucros cessantes, como os resultantes de incapacidade permanente parcial para o trabalho.
Um dos casos mais frequentes em que o tribunal tem de atender aos danos futuros é aquele em que o lesado perde, ou vê diminuída, definitiva ou temporariamente, em consequência do facto lesivo, a sua capacidade laboral e, em consequência, de angariação de rendimentos, sendo numerosos os casos em que a indemnização poderá ter lugar pela afectação da capacidade física (normalmente em menor intensidade), mas independentemente da quebra imediata de ganhos.

Dano futuro

Por dano futuro deve entender-se aquele prejuízo que o sujeito do direito ofendido ainda não sofreu no momento temporal que é considerado. Nesse tempo já existe um ofendido, mas não existe um lesado.
Os danos futuros podem dividir-se em previsíveis e imprevisíveis.
O dano é futuro e previsível quando se pode prognosticar, conjecturar com antecipação ao tempo em que acontecerá, a sua ocorrência.
No caso contrário, quando o homem medianamente prudente e avisado o não prognostica, o dano é imprevisível, não sendo indemnizável antecipadamente; o sujeito do direito ofendido só poderá pedir a correspondente indemnização depois do dano acontecer, depois de lesado.
Os danos previsíveis podem ser certos ou eventuais.
Certo é aquele cuja produção se apresenta, no momento de acerca dele formar juízo, como infalível. Dano futuro eventual é aquele cuja produção se apresenta, no momento de acerca dela formar juízo, como meramente possível, incerto, hipotético, podendo conhecer vários graus.
O dano certo pode ser determinável e indeterminável.
Determinável é aquele que pode ser fixado com precisão no seu montante.
Indeterminável é aquele cujo valor não é possível de ser fixado antecipadamente à sua verificação.
A propósito destas distinções, veja-se o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11-10-94, recurso n.º 84734, CJSTJ 1994, tomo 3, pág. 83 e BMJ n.º 440, pág. 437, que versa ainda sobre os vários graus que pode assumir o dano futuro eventual, e os de 27-09-2001 e de 11-12-2001, revistas n.ºs 1988/01 e 2290/01, ambas da 1ª secção e do mesmo relator, in STJSAC2001, págs. 260 e 366, e Almeida Costa, Direito das Obrigações, 11.ª edição, 2008, págs. 591/8.


Da ressarcibilidade do dano futuro, na vertente de lucro cessante – frustração de ganho
Danos resultantes de incapacidade permanente geral/parcial

A doutrina e a jurisprudência estão de acordo em que pelo facto de o ofendido não exercer à data do acidente qualquer profissão, não está afastada a existência de dano patrimonial, compreendendo-se neste as utilidades futuras e as simples expectativas de aquisição de bens.
Neste leque, cingindo-nos agora à incapacitação para o trabalho, encontrar-se-ão os indivíduos lesados que se encontram fora do mercado do trabalho, da vida activa laboral, e considerando a duração cronológica de vida, seja a montante – caso das crianças e dos jovens, ainda estudantes, ou não, mas que ainda não ingressaram no mundo laboral -, seja, a juzante, com os reformados/aposentados, que dele já saíram, sem esquecer os que estando fora destes parâmetros temporais, situando-se pela sua idade no período de vida activa, estão porém fora daquele mercado, porque desempregados, interessando-nos aqui e agora o primeiro grupo.

Na avaliação deste tipo de danos há que ter presente o princípio que impõe ao tribunal o dever de julgar equitativamente dentro dos limites que tiver por provados, quando não puder averiguar o valor exacto dos danos, ou mesmo a própria existência de danos.
Na verdade, em alguns casos é impossível uma prova segura dos danos não patrimoniais e do montante deles, por isso mandando a lei – artigo 496.º, n.º 3, do Código Civil - que se proceda a uma fixação equitativa do montante da indemnização.
Face a estas dificuldades formula a lei o princípio geral - aplicável também à indemnização de danos patrimoniais – de que, se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados – artigo 566.º, n.º 3, do mesmo Código.
Em comentário ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de Fevereiro de 1971, publicado no BMJ n.º 204, pág. 149, reportando-se ao segmento em que aí se refere que os factos objectivadores do dano não patrimonial, quando forem do consenso geral, dispensam alegação e prova, Vaz Serra, na Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 105º, n.º 3468, pág. 44, após fazer as considerações precedentes, defende que “Este princípio parece dever ter-se como abrangendo, com as necessárias adaptações, o caso de não poder ser averiguada a existência de danos (e não apenas o seu valor exacto), pois nesse caso, tal como no de se não poder averiguar o valor exacto dos danos seria violento que o titular do direito de indemnização, só por não poder averiguar-se com exactidão a existência do dano, ficasse privado da indemnização”.
De entre as possíveis, considera como a melhor solução a da Ordenança de Processo Civil alemã, que dispõe que, discutindo-se entre as partes se existe um dano e até onde ele ou um interesse reparável vai, decide o tribunal segundo a sua livre convicção, ponderando todas as circunstâncias.

O acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 05-02-1987, BMJ n.º 364, pág. 819, afirmando a ambivalência, a dualidade de natureza - não patrimonial e de índole patrimonial – do dano resultante das lesões físicas e sequelas originadas em acidente, conclui: “A indemnização por danos futuros resultantes de incapacidade física do lesado causada por acidente de viação não deve englobar-se nos danos não patrimoniais e é devido mesmo que não se prove ter dela resultado diminuição actual dos proventos profissionais do lesado”.
O acórdão do Supremo de 11-02-1999, proferido na revista n.º 1099/98-2ª, BMJ n.º 484, pág. 352, seguido no acórdão do mesmo relator de 24-02-1999, revista n.º 5/99, publicado no mesmo BMJ n.º 484, pág. 359, foca a doutrina uniforme do Supremo Tribunal de Justiça (cita o antecedente acórdão de 05-02-1987 e os acórdãos de 17-05-1994, CJSTJ 1994, tomo 2, pág. 101, de 04-12-1996, BMJ n.º 462, pág. 396 e de 07-10-1997, BMJ n.º 470, pág. 569) no sentido de que basta a alegação de incapacidade permanente parcial para fundamentar, uma vez provado, um pedido de indemnização por danos patrimoniais futuros.
Explicita: “Dito de outro modo, o ónus de afirmação esgota-se com a invocação da incapacidade permanente parcial, sendo irrelevante a invocação de perda de rendimento no futuro, o que diga-se, tratar-se de uma invocação que não passaria de uma invocação dada a impossibilidade de prova: caso de um menor em idade escolar, caso de estudante que é forçado a mudar de curso, mercê da advinda incapacidade permanente parcial” (realces nossos).
E conclui: “Basta, pois, a alegação da incapacidade parcial permanente para, uma vez provada, servir de base ao pedido de indemnização de dano patrimonial cujo valor não se prova, sendo certo que o valor desse dano terá de ser apreciado equitativamente” (…) “A doutrina que se conhece é toda no sentido de que a incapacidade permanente parcial é, de per si, um dano patrimonial cujo valor não se encontra apurado (Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, 9ª ed., pág. 942)
E no citado acórdão de 24-02-1999, partindo da consideração dos vários graus que pode conhecer o dano futuro eventual, sublinhados no supra citado acórdão de 11-10-1994, extrai que “ O autor/lesado apenas tem de alegar (e provar depois) que sofreu incapacidade permanente parcial para o trabalho para o Tribunal lhe atribuir indemnização por danos futuros”.
E explicita de seguida: “Para efeitos do artigo 564.º, n.º 2, do Código Civil, são indemnizáveis não só os danos futuros previsíveis certos, como os futuros eventuais cujo grau de incerteza seja de tal modo que possa prognosticar-se que o prejuízo venha a acontecer”.
Nesta linha, quanto ao ónus de mera alegação da incapacidade, de afirmação a cargo do autor, podem ver-se os acórdãos deste Supremo Tribunal, de 30-11-2000, revista n.º 2648/00-7ª, in Sumários de Acórdãos Cíveis, Edição Anual 2000 (doravante, STJSAC2000), pág. 353; de 15-03-2001, revista n.º 3876/00-7ª, de 10-05-2001, revista n.º 1140/01-7ª, de 27-09-2001, revista n.º 1979/01-7ª, de 13-11-2001, revista n.º 3307/01-6ª e de 06-12-2001, revista n.º 3707/01-6ª, STJSAC2001, págs.115, 178, 268, 329 e 361; de 04-04-2002, revista n.º 294/02-7ª, STJSAC2002, pág. 134; de 21-09-2004, 14-12-2004, 08-06-2006, 31-10-2006, 19-12-2006, 06-03-2007, 30-10-2007, 17-04-2008, 04-12-2008, 20-01-2009 e de 28-05-2009, proferidos nas revistas n.ºs 2327/04-6ª, 4070/04-6ª, 1435/06-6ª, 2988/06-6ª, 4204/06-2ª, 189/07-6ª, 3340/07-6ª, 949/08-2ª, 3728/08-2ª, 3825/08-6ª e 411/09-2ª.
E no que respeita à ambivalência deste dano futuro, à natureza híbrida, à dupla inserção categorial ou valoração - patrimonial/ não patrimonial - com que pode ser encarado o dano que emerge de incapacidade física (na dupla perspectiva, de afectativa de capacidade de trabalho, determinante de perda actual ou futura de rendimento, ou de incapacidade funcional potencial, futura, sem perda de réditos, demandando esforço suplementar), podem ver-se os acórdãos deste Supremo Tribunal, de 29-04-1999 e de 28-10-1999, revista n.º 717/99-7ª e revista n.º 218/99-2ª, do mesmo relator, STJSAC1999, págs. 163 e 341; de 22-05-2001, revista n.º 1114/01-6ª, STJSAC2001, pág. 168; de 23-05-2002, 04-07-2002, 18-05-2004, 27-05-2004, 07-10-2004, 09-12-2004, 13-01-2005, 03-03-2005, 22-06-2005, 22-09-2005, 03-11-2005, 17-11-2005, 22-01-2008 e de 27-03-2008, proferidos nas revistas n.ºs 1104/02-7ª (a IPP é sempre indemnizável, em sede não apenas de danos não patrimoniais, mas enquanto igualmente determinante de prováveis danos patrimoniais futuros), 1608/02-1ª, 861/04-1ª, 1720/04-2ª, 2970/04-7ª, 2990/04-7ª, in CJSTJ 2004, tomo 3, pág. 137 (a afectação da pessoa do ponto de vista funcional, na envolvência do que vem sendo designado dano biológico, determinante de consequências negativas a nível da sua actividade geral, justifica a indemnização no âmbito do dano patrimonial, para além da valoração que se imponha a título de dano não patrimonial), 4477/04-7ª, 4470/04-2ª, 1597/05-2ª, 2586/05-7ª, 3006/05-7ª, 3436/05-7ª, in CJSTJ 2005, tomo 3, pág. 127, 4338/07-1ª e 761/08-7ª.
Anote-se que em 1971 já se referia o duplo dano, como se vê do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07-05-1971, revista n.º 63499, BMJ n.º 207, pág. 149, ao dizer que: “A incapacidade permanente pressupõe sempre uma diminuição dos proventos do sinistrado na medida da percentagem que afectou a sua produtividade laboral normal e essa desvalorização física representa um dano patrimonial efectivo e não patrimonial e, portanto, um duplo dano, pois constitui, nessa medida, um lucro cessante indemnizável”.

Indubitável é que a incapacidade permanente, por traduzir uma redução/limitação das capacidades funcionais/laborais, sendo uma afectação da integridade física, que se repercute no bem patrimonial força de trabalho, que perdura para toda a vida do lesado, tem de ser indemnizada.
Não é fácil nem pacífica a questão da atribuição de indemnização com fundamento em lucros cessantes resultantes de incapacidade permanente.
No que ora nos interessa, há que versar a questão ao nível dos lesados menores/crianças, em que os «lucros cessantes», ou com mais propriedade, os ganhos frustrados, são, numa previsão actual, dificilmente avaliáveis, atingindo maior grau de dificuldade a ponderação a efectuar, já que estará presente a necessidade de composição de uma situação com contornos virtuais.
A prognose da situação de futuro esbarra com dificuldades acrescidas, já que tendo de partir-se da situação de facto adquirida no presente, esta apresenta-se com contornos muito ténues, opacos e pouco precisos, porque escasseiam os factores fixos, e porque no essencial, inexiste o exercício de qualquer actividade profissional ou geradora de rendimentos.
Mas há que partir do pressuposto de que o lesado tem sempre direito, por a sua força de trabalho constituir uma fonte produtiva, às suas potencialidades lucrativas, rectius, aquisitivas, e que, mais cedo ou mais tarde, terá uma profissão ou ocupação, ingressará no universo do trabalho, para muitos, única forma de angariação de rendimentos.

Uma das primeiras concretizações da atribuição deste tipo de indemnização surge ainda no domínio anterior ao Código Civil de 1966. (Vejam-se infra, várias outras).
No acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de Julho de 1968, processo n.º 62031, tirado em reunião conjunta das 3 secções, in BMJ n.º 179, pág. 159, versando danos resultantes de acidente de viação ocorrido em 09 de Julho de 1962 (regendo então o Código de Seabra e o artigo 56.º, n.º 2, do Código da Estrada de 1954) foi decidido: «Embora o lesado seja uma criança de quatro anos de idade, é de atender, na fixação da indemnização por danos materiais, à desvalorização física sofrida que irá afectar, em futuro próximo, a sua capacidade de ganho».
Pelo dano moral propriamente dito - «preço da dor que se sofre e da alegria que se perde» - manteve o acórdão a cifra de 30 000$00.
Quanto ao dano material (lucros cessantes), o acórdão, partindo da definição de dano, num sentido restrito, dada pelo Prof. José Tavares, em Princípios Fundamentais, vol. I, pág. 529, como sendo «apenas o sofrimento resultante duma perda total ou parcial do património ou das suas fontes produtivas», confirma a sentença recorrida quando, para arbitramento de tal dano, considerou que o autor era, ele mesmo, uma fonte de rendimento em potência, que foi afectada com a desvalorização física sofrida, a maior excitabilidade nervosa e falta de saúde, factores que – acentua - contribuirão num não distante amanhã para que essa fonte potencial produza menos do que produziria, se não fossem as consequências do acidente, nomeadamente a perda da substância óssea protectora da massa encefálica.
Vaz Serra, em comentário a tal acórdão na Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 102º, págs. 292 a 298, diz:
«A desvalorização física que afecte a capacidade aquisitiva do lesado constitui um dano (além de não patrimonial) patrimonial, pois traduz-se na redução da possibilidade de obtenção de valores patrimoniais, isto é, no não aumento do património do lesado (lucro cessante).
O mesmo facto pode produzir danos patrimoniais e não patrimoniais, e é isso que se verifica no caso do acórdão: as lesões que a vítima do acidente sofreu, além dos danos não patrimoniais que causaram, determinaram também o dano patrimonial da diminuição da capacidade aquisitiva do lesado.
Este dano reveste a forma de lucro cessante, que é aquele que tem lugar quando o lesado não tem um direito sobre o bem atingido, na data do facto danoso; e é indemnizável, tal como o dano emergente (…).
No caso do acórdão, tratava-se de dano futuro (dano consistente na falta de aquisição futura de valores patrimoniais), e também esse dano é reparável, quer segundo o direito anterior ao novo Código Civil, quer segundo este Código, desde que seja previsível com suficiente segurança.
A previsibilidade do dano pode assentar em probabilidades, mas estas têm de ser tão fortes que possa considerar-se certo o dano (…) se o dano futuro for já certo, pode ser desde logo reparado (é o caso do lesado na sua capacidade de trabalho, o qual pode exigir a reparação do dano que no futuro terá em consequência da perda ou da diminuição dessa capacidade, evitando-se, assim, que tenha de reclamar periodicamente indemnizações)».

O acórdão da Relação de Coimbra de 04 de Abril de 1995, in Colectânea de Jurisprudência 1995, tomo 2, pág. 23, seguindo de perto o aludido acórdão de 5 de Julho de 1968, reconheceu indemnização a ofendido com 13 anos de idade, estudante – a Relação concede 7.031. 913$00 por incapacidade de 25% - com o fundamento de que a incapacidade permanente que afecte, quer a criança, quer o jovem em formação escolar, configura um dano patrimonial futuro, e especificando que a circunstância do lesado não exercer qualquer profissão à data do acidente, não afasta a existência de um dano futuro indemnizável, compreendendo-se no dano as utilidades futuras e as simples expectativas de aquisição de bens.

Os lucros cessantes em geral, e neste caso com maior grau, sendo dificilmente avaliáveis, não são de fácil determinação, visto supor a sua avaliação, de harmonia com a denominada teoria da diferença, consagrada no artigo 566.º, n.º 2, do Código Civil, um cálculo hipotético acerca do estado em que o património do lesado se encontraria sem o facto danoso, devendo atender-se ao curso regular das coisas ou as circunstâncias especiais (cfr. Vaz Serra, RLJ, ano 112.º, pág. 329).

Ainda em pleno domínio do Código de Seabra e do Código da Estrada de 1954, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de Novembro de 1965, publicado no BMJ n.º 151, pág. 241, versou caso de jovens franceses em viagem de núpcias, recentemente licenciados, ainda sem qualquer profissão, emprego ou ofício remunerado e que em consequência do acidente verificado em 28-09-1960, ficaram com 10% e 8% de IPP e outras sequelas.
Sufragou-se o entendimento na Relação, a merecer o beneplácito do Supremo, de que a indemnização por acidentes de viação deve reparar também os lucros cessantes, ou seja, os que «segundo o curso regular das coisas ou circunstâncias especiais, podiam ser esperados com probabilidade, embora não ainda quando teve lugar o facto que dá origem à indemnização (Prof. Vaz Serra, no Boletim, n.ºs 84, pág. 125, e 90, pág. 196)».
Considerou-se no caso que, embora os lesados não exercessem ainda uma actividade remunerada, não obstava esse facto a que houvesse lucros cessantes, por terem direito a uma “compensação pelo atraso que inevitavelmente sofreram nos seus estudos complementares e estágios profissionais, com correspondentes reflexos nas suas entradas nas vidas profissionais”.
O acórdão em referência mereceu a concordância de Vaz Serra, in Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 99º, n.º 3322, págs. 195 a 203 e n.º 3323, págs. 212/3.
Comentando, aí refere que “O lucro cessante distingue-se do dano emergente pela circunstância de, naquele, o lesado não ter um direito ao ou sobre o bem atingido, na data do facto danoso; trata-se de um critério jurídico, pois um critério económico (segundo o qual o dano emergente seria aquele que se produz quando o facto suprime ou diminui uma utilidade actual ou um bem de que o lesado pudesse já dispor na data do facto danoso) levaria a resultados inadmissíveis, além de que o património, economicamente, compreende também as utilidades futuras e as expectativas de aquisição de bens”.

No acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23-05-1978, BMJ n.º 277, pág. 258 (264), escreveu-se: “Com referência aos lucros cessantes há que admitir – diz Enneccerus – a existência de nexo causal quando sem o facto que obriga à indemnização o demandante teria alcançado o ganho segundo o curso regular das coisas ou das circunstâncias, ganho esse de esperar com toda a probabilidade”.
Pessoa Jorge, in Ensaio sobre os pressupostos da responsabilidade civil, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, 1968, pág. 378, afirma que o lucro cessante pressupõe que o lesado tinha, no momento da lesão, um direito ao ganho que se frustrou, ou melhor, a titularidade duma situação jurídica que, mantendo-se, lhe daria direito a esse ganho».

A indemnização pela incapacidade parcial permanente tem lugar quando é afectada a capacidade de ganho, traduzindo-se a afectação numa perda ou diminuição (definitiva ou temporária) efectiva, imediata, actual de remuneração, como acontecerá com lesados no período de vida profissionalmente activo e com lesões corporais e sequelas mais intensas, gravemente incapacitantes, a determinar um mais elevado grau de desvalorização; quando a repercussão sobre a capacidade de ganho é potencial e futura, mas previsível, porque o lesado ainda não entrou no mercado de trabalho (crianças e jovens em formação escolar, ou mesmo jovens licenciados que não lograram ainda obter ocupação); quando a afectação dessa mesma capacidade de ganho não determina perda ou diminuição de rendimentos, ou porque o lesado está desempregado, ou já não é possível, porque as lesões e sequelas se verificam num quadro de vida pós exercício da actividade profissional, como acontece com os reformados (suposta, obviamente, a ausência de outra ocupação remunerada), ou ainda porque, não se traduzindo numa imediata, efectiva e actual perda ou redução de rendimentos, continuando o lesado a percebê-los, vai implicar um esforço físico e psíquico acrescido para manter os mesmos níveis de ganho.
Na verdade, para além da consideração do reflexo da lesão corporal na capacidade de ganho, com repercussão no património (actual ou previsivelmente futuro), olhando, pois, para a incapacidade para o trabalho, haverá a ter em conta a ressarcibilidade do dano corporal, considerado em si mesmo, como categoria “a se”, de forma autónoma, independentemente de influir ou se repercutir na capacidade de ganho, o que ocorre nos casos em que a incapacidade implica apenas uma sobrecarga, um esforço suplementar para obter o mesmo resultado, manter os mesmos níveis de proventos profissionais presentes ou previsivelmente futuros.
Nestes casos o lesado continua a trabalhar e a auferir os mesmos rendimentos, não havendo quebra no efectivo ganho, sendo visível a repercussão do dano – o “deficit” físico ou psíquico - na diminuição da capacidade física e necessidade de esforço acrescido para obtenção do mesmo resultado, ou limitação para algumas tarefas, podendo vir a retardar ou impedir progressão profissional, conduzir a reforma antecipada ou contribuir mesmo para diminuição de esperança de vida.
Em causa nessas situações está o chamado dano biológico, incapacidade funcional ou fisiológica, “deficiência”, ou “handicap”, sendo o dano de per si indemnizável.

Como dá conta João Álvaro Dias, no trabalho citado in RPDC, Novembro 2001, Ano X, n.º 11, págs. 51/2, “O dano à saúde ou dano corporal (por vezes impropriamente designado de dano biológico) fez a sua aparição no Direito Civil italiano, no dealbar dos anos oitenta, apesar de algumas antevisões ou assomos anteriores, pela mão da doutrina e jurisprudência”.
A sentença do Tribunal de Génova de 25-05-1974 é referida como tendo sido aquela em que “se focaliza pela primeira vez, (…) um ressarcimento do dano completamente desvinculado do requisito da patrimonialidade: a lesão ao indivíduo é ressarcida em si e por si, sem qualquer dependência do lucro cessante”. Dito por outras palavras: em tal sentença surge a afirmação do chamado dano biológico como entidade bem distinta do elemento patrimonial (lucro cessante), por contraposição ao qual o primeiro se afirma.
Por decisão de 6-06-1981, considerou o Tribunal da Cassação italiano que “O dano dito biológico, enquanto lesivo do direito à saúde, que por explícito ditame constitucional é direito fundamental do indivíduo, deve ser ressarcível mesmo que não incidindo sobre a capacidade de produzir ganhos e mesmo independentemente desta última”.
Das decisões referidas e outras, ressalta como tópico aglutinador o de que a lesão corporal sofrida merece ser apreciada e reparado o respectivo dano independentemente das repercussões sobre a capacidade de ganho, considerando-se a saúde e integridade físico-psíquica como uma realidade que vale por si.

Dissentindo destas qualificações veja-se Maria Manuel Veloso, Danos não patrimoniais, trabalho inserto no volume III, Direito das Obrigações, da obra Comemorações dos 35 anos do Código Civil e dos 25 anos da Reforma de 1977, Coimbra Editora, 2007, págs. 512 a 523, defendendo que a lesão corporal em si, porque atinge um bem não patrimonial, deve ser vista como um dano não patrimonial, revelando-se forçada a qualificação do dano corporal como patrimonial, e após referenciar a autonomização do dano corporal, relevando a contribuição para a mesma de Álvaro Dias, e o surgimento e evolução do dano biológico, afirma que onde o sistema redondamente falha ou mostra as suas debilidades é na compensação do dano corporal de pessoas reformadas ou sem rendimentos (por exemplo, crianças e jovens).

Na jurisprudência deste Supremo são vários os casos em que é atribuída indemnização mesmo que a incapacidade não tenha reflexo imediato na capacidade aquisitiva e de ganho, não se cingindo claramente a casos paralelos ao que ora nos ocupa, sendo variadíssimos aqueles em que se tem presente a reparação da incapacidade funcional ou dano biológico.

No acórdão de 05-12-1975, BMJ n.º 252, pág. 129, em situação em que o lesado ficou com uma IPP de 30%, mas que após o acidente continuou a fazer a sua vida normal, inclusive laboral, é fixada em 160 contos “a indemnização pelos prejuízos emergentes para o autor da diminuição da capacidade geral de ganho”.
No acórdão de 06-02-1976, BMJ n.º 254, pág. 202, em situação em que o lesado ficou com IPP de 24,32%, depois de se afirmar que “A força do trabalho é um bem patrimonial muito importante. Nesta medida, representa um dano patrimonial, ainda que possa ter projecção no plano dos danos não patrimoniais”, conclui-se “A circunstância de a vítima não ter sofrido, aparentemente, diminuição do salário não equivale à verificação da inexistência do dano”.
Para o acórdão de 17-05-1994, CJSTJ 1994, tomo 2, pág. 101, em situação de lesado com 31 anos, afirma-se que a incapacidade permanente parcial de cerca de 17%, mesmo que se não tenha provado diminuição actual da remuneração, diminuição efectiva da capacidade de ganho, implica uma indemnização por danos patrimoniais, constituindo um dano físico efectivamente sofrido pelo lesado, que exige dele um esforço suplementar, que forçosamente o virá a afectar no futuro.
De acordo com os acórdãos de 06-05-1999 e de 18-05-1999, revistas n.º 222/99 e n.º 156/99, ambas da 2ª secção e do mesmo relator, STJSAC 1999, págs. 185 e 191, o dano patrimonial não se esgota na perda ou na diminuição da capacidade de ganho, pois que, a ser assim, ficaria sem justificação a indemnização dos lesados sem profissão ou aguardando colocação no mercado de emprego.
É manifesto que uma redução mais ou menos drástica da capacidade física acarretará para o lesado, por ela afectado, o dispêndio de maior esforço e energia para conseguir os mesmos resultados, ou seja, os mesmos proventos ou ganhos. E este “dano biológico” é também ressarcível.
Segundo o acórdão de 20-01-2000, revista n.º 889/99-7ª, STJSAC2000, pág. 40, o dano futuro existe ainda que o lesado, à data do acidente, não exerça actividade remunerada.
Nos acórdãos de 11-05 (dois), 09-11 e 30-11-2000, revistas n.ºs 260/00, 274/00, 2394/00 e 3254/00, todos da 7ª secção e do mesmo relator, in STJSAC2000, págs. 180, 338 e 350, afirmou-se: A IPP para o trabalho dá lugar a indemnização por danos patrimoniais, mesmo que dela não resulte diminuição actual da remuneração do lesado, considerando que o dano físico determinante da incapacidade exige do lesado um esforço suplementar físico e psíquico para obter o mesmo resultado do trabalho.
No acórdão de 13-12-2000, revista n.º 2891/00-2ª, afirmou-se que a incapacidade permanente parcial é um dano patrimonial, que obriga o lesado a um maior esforço para manter o nível dos rendimentos auferidos antes da lesão.
Segundo o acórdão de 11-01-2001, revista n.º 3659/00-7ª, STJSAC2001, pág. 32, a IPP para o trabalho sem perda de rendimentos dá direito a indemnização por dano patrimonial. A IPP exprime o grau de lesão da integridade física e da saúde, elementos estruturantes da personalidade jurídica, o que constitui um prejuízo, autónomo em relação ao dano não patrimonial das dores sofridas, repercutindo-se na exigência de um maior esforço físico e psíquico no trabalho profissional e na actividade em geral.
Na mesma linha os acórdãos de 15-03-2001, 29-03-2001, 05-07-2001, 27-09-2001 e 22-11-2001, nas revistas n.ºs 3876/00-7ª, 277/01-7ª, 723/01-6ª, 1988/01-1ª e 2860/01-2ª, STJSAC2001, págs. 115, 121, 232, 260 e 346.
No acórdão de 07-02-2002, revista n.º 3985/01 - 2.ª, ponderou-se : Nos casos em que a percentagem de IPP se não traduz, na prática, numa efectiva perda de ganhos ou de capacidade de ganho proporcional ao montante dos vencimentos previsivelmente a auferir no futuro, a repercussão negativa da IPP centra-se apenas numa diminuição de condição física, resistência, e capacidade de esforços por parte do lesado, o que se traduzirá numa deficiente ou imperfeita capacidade de utilização do corpo no desenvolvimento das actividades pessoais em geral, e numa consequente e igualmente previsível maior penosidade na execução das suas diversas tarefas.
É neste agravamento da penosidade (de carácter fisiológico) para a execução, com regularidade e normalidade, das tarefas próprias e habituais do respectivo múnus que deve radicar-se o arbitramento da indemnização por danos patrimoniais futuros. Neste sentido, do mesmo relator, o acórdão de 15-01-2004, revista n.º 3926/03. E o de 21-09-2004, revista n.º 2327/04, da 6ª secção.
Por seu turno, diz-se nos acórdãos de 19-02-2002, revista n.º 4397/01-1ª, STJSAC2002, pág. 57 e de 05-03-2002, revista n.º 4177/01-1ª, ambos do mesmo relator: a incapacidade parcial permanente é, de per se, um dano patrimonial indemnizável, independentemente da prova de um prejuízo pecuniário concreto dela resultante, dada a inferioridade em que o lesado se encontra na sua condição física, quanto a resistência e capacidade de esforços.
Como se extrai dos acórdãos de 27-02-2003 e de 23-09-2003, proferidos nas revistas n.ºs 80/03 e 2259/03, ambas da 2.ª Secção e do mesmo relator, bem como os de 07-02-2002 e de 15-01-2004 (citando acórdãos de 16-12-1999, revista n.º 808/99-1ª; de 27-09-2001, revista n.º 1979/01-7ª e de 15-05-2001, revista n.º1365/01-6ª e reflectindo sentido comummente seguido pelo Supremo), o lesado tem direito a ser indemnizado por danos patrimoniais futuros resultantes de incapacidade permanente resultante de acidente de viação, prove-se ou não que, em consequência dessa incapacidade, haja resultado diminuição dos seus proventos do trabalho (v.g. se porventura for ainda menor, como nos casos julgados nos dois arestos, com lesados com 5 e 16 anos de idade), adiantando que as sequelas certificadas não deixarão de repercutir-se negativamente na própria inserção no mercado de trabalho e na obtenção de ocupações mais bem remuneradas.
No acórdão de 27-05-2003, revista n.º 1127/03-1ª, diz-se que a indemnização por danos futuros resultantes da incapacidade física do lesado causada por acidente de viação é devida mesmo que se não prove ter dela resultado diminuição actual dos proventos profissionais do lesado. Tendo este continuado a auferir os mesmos réditos, tem direito a ser indemnizado a esse título.
O acórdão de 21-10-2003, revista n.º 2528/03-1ª, versa sobre lesada desempregada, a receber subsídio de desemprego, afectada com IPP de 29,08%, afirmando-se ser de prever um dano patrimonial futuro, mesmo que de imediato não se tenha apurado uma perda de rendimentos. A afectação da capacidade de ganho é vista na perspectiva de acréscimo de esforço, quer na dificuldade ou impossibilidade de obtenção de nova ocupação, actuando a incapacidade parcial como se fosse uma incapacidade quase total.
No acórdão de 30-10-2003, revista n.º 2818/03 - 2ª, afirma-se: “Mesmo não exercendo o lesado que ficou incapacitado, uma profissão à data do acidente, deve ser indemnizado, já que a incapacidade de que ficou afectado constitui um dano futuro; as sequelas obrigá-lo-ão no seu trabalho no futuro, a um maior e doloroso esforço, que em regra agravar-se-ão com a idade”. (Lesado com 43 anos, que não auferia vencimento certo mensal, por trabalhar em contratos por períodos determinados, auferindo vencimento diário).
No acórdão de 19-02-2004, revista n.º 4282/03-6ª, pondera-se caso em que o lesado, pedreiro de profissão à data do acidente, atinge 65 anos - idade normal de reforma - antes de obter a alta definitiva, decidindo-se que a inexistência de actividade profissional após a reforma não implica necessariamente a inexistência de danos futuros a partir de então, atendendo ao maior esforço que terá que despender para levar a cabo todas as tarefas indispensáveis à sua sobrevivência.
No acórdão de 27-05-2004, revista n.º 1720/04-2ª, afirma-se que a indemnização por perda de lucros cessantes justifica-se, ou porque a incapacidade parcial permanente provoca uma diminuição concreta de proventos ao lesado, ou porque provoca uma sobrecarga de esforço físico daquele, que se reflecte na sua capacidade de ente produtivo.
No acórdão de 06-07-2004, revista n.º 2084/04-2ª, do mesmo relator dos de 07-02-2002 e 15-01-2004, consta que face a incapacidades funcionais várias, consubstanciadoras do denominado “dano corporal” ou “dano biológico”, justifica-se a atribuição de indemnização por danos patrimoniais futuros, ainda que as lesões não acarretem diminuição da respectiva capacidade geral de ganho; na chamada incapacidade funcional ou fisiológica, vulgarmente designada por “handicap”, trata-se de indemnizar «a se» o dano corporal sofrido, e não qualquer perda efectiva de rendimento ou de concreta privação da capacidade de angariação de réditos.
Nos termos do acórdão de 03-11-2005, revista n.º 2568/05-7ª, na IPP a força de trabalho diminuída deve ser indemnizada, em virtude de não ser possível a restauração natural, independentemente de haver ou não perda de ganho por parte da vítima.
No acórdão de 12-01-2006, revista n.º 3548/05-7ª, consta: “mesmo se não perspectivada de imediato diminuição dos seus conjecturais proventos futuros, o dano corporal ou biológico importa, de per si, prejuízo indemnizável, consoante art.ºs 564º, n.º 2 e 566º, n.º 3, do CC, a título de dano patrimonial futuro, independentemente da perda efectiva, actual, de rendimento - com os mesmos dizeres, os acórdãos de 18-05-2006, revista n.º 3755/05-2ª e de 14-09-2006, revista n.º 2594/06-7ª.
No acórdão de 14-09-2006, revista n.º 982/06-2ª, em caso de lesado com IPP de 15%, é reparada a perda da capacidade de ganho, não obstante ser reformado, ter 57 anos à data do acidente e não exercer qualquer actividade remunerada com carácter regular e duradouro.
Segundo o acórdão de 19-12-2006, revista n.º 3567/06 - 7ª, não afasta o dever de indemnização por incapacidade permanente o facto de esta não implicar, no imediato, qualquer diminuição dos rendimentos do trabalho do lesado.
Segundo o acórdão de 2-10-2007, revista n.º 1657/07-1ª, in CJSTJ 2007, tomo 3, pág. 68, não estando demonstrada a repercussão da IPP na efectiva quebra de ganho do lesado, ou mesmo capacidade de ganho profissional aos salários auferidos, ela sempre se traduzirá, residualmente, numa diminuição da condição e capacidade física, da resistência, da capacidade de certos esforços e/ou necessidade de esforço suplementar para obtenção dos mesmos resultados, em suma, numa deficiente ou imperfeita capacidade de utilização do corpo no desenvolvimento das actividades humanas em geral e maior penosidade das tarefas laborais, e, por isso, deve ser indemnizada como uma incapacidade funcional geral dissociada das concretas profissões dos lesados.
(Este acórdão figura na listagem relativa a danos futuros de lesados menores, versando-se no mesmo os pedidos do menor e dos pais, igualmente lesados).
Como se extrai do acórdão de 16-09-2008, revista n.º 939/08 - 7ª, mesmo que a vítima não exerça ou não exerça ainda qualquer actividade remunerada nem por isso o dano deixará de ser ressarcido, já que nesta última hipótese foi precisamente o evento danoso a frustrar a aquisição futura de ganhos.
No acórdão de 13-01-2009, revista n.º 3734/08-1ª, decidiu-se haver lugar ao arbitramento de indemnização por danos patrimoniais, independentemente de não se ter provado que o autor, por força de uma IPP de 5%, que sofreu, tenha vindo ou venha a suportar qualquer diminuição dos seus proventos conjecturais futuros, isto é, uma diminuição da sua capacidade geral de ganho.
E no de 17-02-2009, revista n.º 4099/08-1ª, refere-se: a indemnização por danos patrimoniais futuros decorrentes da incapacidade permanente do lesado deve ter lugar mesmo que não haja propriamente perda do rendimento laboral, designadamente por o ofendido não exercer qualquer profissão, como sucederá com as crianças e os estudantes.
No acórdão de 18-06-2009, processo n.º 81/04.8PBBGC.S1-3.ª, afirma-se que “Pode considerar-se um dado assente ao nível da jurisprudência e doutrina que o facto de se não exercer, à data do acidente, uma profissão não obsta ao cálculo da indemnização por dano patrimonial futuro, compreendendo-se neste as utilidades futuras e as simples expectativas de aquisição de bens”.
No mesmo sentido vejam-se os acórdãos de 07-02-2002, revista n.º 3878/01-2ª, STJSAC2002, pág. 62; de 05-03-2002, revista n.º 73/02-6ª, STJSAC, pág. 83; de 28-02-2002, revista n.º 4395/01, de 05-03-2002, revista n.º 195/02 e de 12-03-2002, revista n.º 398/02, todos da 1ª secção e do mesmo relator, in STJSAC, págs. 60, 88 e 95 (a diminuição da capacidade de ganho é distinta da diminuição da capacidade salarial (podendo mesmo vir a obter resultados idênticos), e traduz-se em a incapacidade exigir do lesado -actualmente ou, com toda a probabilidade, no futuro – um esforço suplementar quer físico quer psíquico, para obter o mesmo resultado de trabalho); de 23-05-2002, revista n.º 1104/02-7ª; de 27-05-2003, revista n.º 1127/03-1ª; de 08-07-2003, revista n.º 1928/03-1ª; de 20-11-2003, revista n.º 3528/03-2ª; de 08-01-2004, revista n.º 4083/03-7ª; de 09-12-2004, revista n.º 2990/04-7ª, CJSTJ 2004, tomo 3, pág. 137; de 14-12-2004, revista n.º 4070/04-6ª; de 03-03-2005, revista n.º 4470/04-2ª; de 12-05-2005, revista n.º 943/05-7ª (lesada com 77 anos de idade); de 22-06-2005, revista n.º 1597/05-2ª; de 08-11-2005, revista n.º 3053/05-6ª; de 17-11-2005, revista n.º 3167/05-2ª; de 27-04-2006, revista n.º 872/06-6ª; de 12-09-2006, revista n.º 2145/06-1ª; de 14-09-2006, revista n.º 982/06-2ª (lesado vítima de acidente de viação, reformado, com 57 anos à data do acidente, ficando a padecer de uma IPP de 15%, não exercendo qualquer actividade remunerada com carácter regular e duradouro - tem o direito de ver reparada a perda da sua capacidade de ganho); de 19-12-2006, revista n.º 4204/06-2ª; de 08-03-2007, revista n.º 4320/06-2ª; de 17-04-2007, revista n.º 2122/06-2ª; de 25-09-2007, revista n.º 2159/07-1ª; de 04-10-2007, revista n.º 3454/06-2ª e n.º 2957/07-7ª; de 22-01-2008, revista n.º 4338/07-1ª; de 28-02-2008, revista n.º 4596/07-2ª; de 17-04-2008, revista n.º 949/08-2ª; de 09-10-2008, revista n.º 2686/08-7ª; de 04-12-2008, revista n.º 3234/08-2ª; de 02-06-2009, revista n.º 1507/03.3TBPBL.C1.S1-1ª; de 19-05-2009, revista n.º 298/06.0TBSJM.S1-6ª (caso de lesada aposentada - o que há a considerar como dano patrimonial futuro é o dano biológico, já que a afectação da sua potencialidade física determina uma irreversível perda de faculdades físicas e intelectuais que a idade agravará. A incapacidade parcial permanente, afectando ou não, a actividade laboral, representa em si mesmo, um dano patrimonial futuro, nunca podendo reduzir-se à categoria de meros danos não patrimoniais); de 04-06-2009, revista n.º 339/09-2ª; de 09-06-2009, revista n.º 285/09.7YFLSB-6ª e n.º 385/07.8TVPRT.S1-6ª; de 18-06-2009, revista n.º 268/09-2ª; de 30-06-2009, revista n.º 11325/03.3TBVNG.S1-1ª; de 02-07-2009, revista n.º 179/04.2TBMTR.S1-7ª; de 08-10-2009, revista n.º 28/02.6TJPRT.S1-7ª.

Nos casos analisados que infra se referenciam, elencados no quadro das soluções jurisprudenciais a propósito dos danos futuros, mormente nos casos em que foram versadas situações de lesados crianças, menores e jovens estudantes ou não, a incapacidade é encarada geralmente na perspectiva de perda de capacidade de ganho, constando tal referência de forma expressa em muitos deles, ou projectando-se uma profissão plausível para o lesado, ou indagando-se de níveis possíveis de remunerações, como salários mínimos, ou salários médios previsíveis, acessíveis, ou outros, mais concretizados.
A perspectiva de enquadramento de situações como a que nos ocupa, é, pois, preferencialmente a da repercutibilidade da incapacidade física na capacidade de ganho, de reflexo futuro no património do lesado, sendo que no acórdão de 16-09-2008, revista n.º 2117/08-1ª, sendo lesada uma criança, considera-se que a incapacidade de que ficou a padecer equivale a uma “perda de ganho total”, a que acresce o prejuízo fisiológico até à idade de 80 anos.
Fora deste quadro de perspectivação como “perda de ganho”, na listagem infra, apenas no acórdão de 07-04-2005, revista n.º 280/05-6ª, em que era lesado menor, com 12 anos à data da sentença, com IPP de 7,5%, como se explicita no texto, não se tratava de uma indemnização por perda de rendimentos, mas de uma compensação pelo esforço suplementar para os conseguir obter, e daí considerar-se no período efectivo de trabalho apenas 11 meses de trabalho; no acórdão de 18-12-2007, revista n.º 4165/07-6ª, com lesado com 16 anos à data do acidente, teve-se igualmente em vista que a incapacidade parcial permanente para o trabalho de 20% implicaria esforços suplementares no trabalho que o lesado, entretanto, iniciara aos 21 anos.
No caso do acórdão de 09-11-2006, revista n.º 3798/08-7ª, com lesado de 19 anos, estudante, ponderou-se que quando a afectação da pessoa do ponto de vista funcional antecede a profissionalização, deve relevar para o efeito o dano biológico, porque determinante de consequências negativas a nível da actividade geral do lesado.
No acórdão de 20-09-2007, revista n.º 4172/06-2ª, com lesado de 15 anos, a IPP de 5%, é encarada apenas como a dificultar a obtenção de emprego, qualquer que seja a ocupação.

No sentido de que a incapacidade permanente que afecte, quer a criança, quer o jovem em formação escolar, configura-se como um dano patrimonial futuro, veja-se ainda “ Dano patrimonial e não patrimonial - Avaliação dos danos no tribunal em grandes traumatizados, crianças e idosos”, a págs. 31 a 46, na Revista Portuguesa de Dano Corporal, Novembro 2000 - Ano IX - n.º 10.

Cálculo da indemnização

Como se aludia no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04-12-1996, processo n.º 406/96, BMJ n.º 462, pág. 396 (retomado no acórdão do mesmo relator, de 18-03-1997, recurso n.º 793/96, CJSTJ 1997, tomo 2, pág. 24), «No concernente a danos patrimoniais futuros está-se, obviamente, em presença de humana futurologia, tornando-se evidente que qualquer resultado é sempre discutível».
No dizer do acórdão de 06-07-2004, revista n.º 2318/04 - 6ª, a avaliação pelo juiz do dano futuro causado pela incapacidade permanente é tanto mais difícil quanto o trabalho futuro se distancia do sinistro, entrando-se no campo da profecia, e em registo similar, no acórdão de 04-10-2005, revista n.º 2167/05-6ª, dizia-se que a determinação dos danos patrimoniais futuros causados por incapacidade permanente envolve sempre uma profecia e tanto maior quanto menor é a idade do lesado.
No acórdão de 06-07-2006, revista n.º 1909/06-6ª, reconhecendo-se a mesma dificuldade, dizia-se: «a determinação dos danos patrimoniais futuros causados por incapacidade permanente envolve sempre uma profecia, tanto maior quanto menor é a idade do lesado».
No acórdão de 21-09-2006, revista n.º 2016/06-2ª, dando conta das mesmas dificuldades, refere-se a humana incapacidade de adivinhar o futuro.

Como acentuam a doutrina e a jurisprudência, o cálculo dos danos futuros é sempre uma operação delicada, de solução difícil, porque obriga a ter em conta a situação hipotética em que o lesado estaria se não houvesse sofrido a lesão, o que implica uma previsão, pouco segura, sobre dados verificáveis no futuro. E por isso é que tais danos devem calcular-se segundo critérios de verosimilhança ou de probabilidade, de acordo com o que é normal e natural acontecer, com o que em cada caso concreto, poderá vir a acontecer, pressupondo que as coisas seguem o seu curso normal, estando-se perante cálculo feito de acordo com o “id quod plerumque accidit”; e se, mesmo assim, não puder apurar-se o seu valor exacto, o tribunal deve julgar, segundo a equidade - cfr. acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, do mesmo relator, de 26-05-1993, CJSTJ 1993, tomo 2, pág. 130 e de 10-02-1998, CJSTJ 1998, tomo 1, pág. 65, (ambos citando Dario Martins de Almeida, Manual de acidentes de viação, pág. 114, Vaz Serra, RLJ, ano 112º, 329 e ano 114º, 287 ; Pires de Lima-Antunes Varela, Código Civil Anotado, volume 1, 4ª edição, pág. 584), sendo o segundo acórdão citado por Sousa Dinis, em Dano corporal em acidentes de viação, CJSTJ 2001, tomo 1, pág. 8 ; e acórdão de 15-12-1998, CJSTJ 1998, tomo 3, pág. 155.

O cálculo da indemnização devida é sempre difícil, mas se houver que proceder ao cálculo de indemnização por danos futuros, na vertente de lucros cessantes, resultantes da incapacidade funcional ou de incapacidade permanente para o trabalho com reflexo na capacidade aquisitiva de ganho – no caso obviamente futura - do ofendido/lesado, quando este é um bebé, uma criança, um adolescente, ou um jovem estudante, ou um jovem, mesmo que licenciado, que ainda não entrou no mercado de trabalho, à espera do primeiro emprego (o que é uma realidade que cada vez mais vê aumentar o leque dos inscritos, colocando em crise o critério subjacente à conformação da cláusula de exigibilidade inscrita no artigo 1880.º do Código Civil, assente em pressupostos sociológicos que se mostram ultrapassados), tal tarefa revestir-se-á de especiais e acrescidas dificuldades, ainda mais arriscado sendo o prognóstico.

Nestas situações estão presentes casos particulares, mas nem por isso, infelizmente, de rara verificação, de incapacidade ou desvalorização física do lesado em que a vítima, na data da produção do facto danoso, não exerce sequer qualquer actividade profissional ou geradora de rendimentos, situação em que se encontram as crianças e jovens ainda fora do mercado de trabalho, assim como os idosos, embora no nosso caso interessem apenas aqueles.
A incapacidade permanente que afecte, quer a criança, quer o jovem em formação escolar, configura-se como um dano patrimonial futuro, constituindo a lesão um dano real e actual a considerar, como factor que vai incidir negativamente na sua formação, afectando desfavoravelmente o desempenho profissional futuro do menor, independentemente de se não saber exactamente qual vai ser a profissão ou ocupação de quem agora não pode estar, pela idade, no mercado de trabalho.
Nestes casos não se está perante uma concreta profissão, definitivamente adoptada, nem perante uma concreta, imediata, actual e efectiva perda ou diminuição de ganho no seu exercício, mas perante um quadro de frustração de ganhos a projectar no futuro.

As consabidas dificuldades na determinação da extensão do dano resultantes da consideração de factores aleatórios e de verificação de factos previsíveis por vezes muito distantes do tempo da decisão, com realce desde logo para o imponderável da provável duração da vida do lesado, não viabilizam que à luz da lei constituída fiquemos por um cómodo non liquet.
Como se acentua no acórdão de 11-10-1994, recurso n.º 85.848, CJSTJ 1994, tomo 3, pág. 89 (92) e BMJ n.º 440, pág. 448 “Assumindo a falibilidade da capacidade humana para prever, mas tendo em conta o que já aconteceu, as regras da experiência comum, e o que é natural e normal que venha a acontecer, há que decidir com a segurança possível e a temperança própria da equidade (cfr. n.º 3 do art. 566.º do Cód. Civil); isto é, há que optar por um modo de aplicação e cumprimento da lei constituída”.
Reconhecida a falibilidade das projecções feitas para o futuro, face a danos futuros previsíveis e determináveis, ponderando uma situação hipotética, que é por definição uma situação imaginária, irreal, virtual, há que proceder a uma quantificação do dano futuro, plausível, e fundamentada a partir de parâmetros actuais e tendo em conta uma natural evolução dos dados em equação.

Entre os factores a ter em consideração na análise tendente a uma quantificação do dano futuro, na componente lucro cessante/ganho frustrado, emergente de incapacidade/desvalorização permanente para o trabalho, há que atender à natureza da responsabilidade na eclosão do acidente, se objectiva, se fundada na mera culpa, na culpa grave ou no dolo, à eventual responsabilidade partilhada, com concorrência de culpas, eventual grau de concorrência da vítima para a lesão; a idade da vítima ao tempo do acidente; a idade normal de reforma e a ponderação de prolongamento da vida activa para além da reforma; a duração do tempo provável de vida ou expectativa de vida do cidadão médio; o aumento da própria longevidade; a consideração de que a longevidade profissional será maior para quem trabalha por conta própria; o grau/percentagem de incapacidade para o trabalho; a natureza do trabalho; o salário auferido pelo lesado; a expectativa de aumento da retribuição e o rendimento anual perdido ou frustrado (suposto o exercício de profissão, actividade ou ocupação e consequentes remunerações); a perenidade ou transitoriedade do emprego; a progressão (e não congelamento) profissional na carreira; a possibilidade de exercício de outra actividade profissional; a taxa referencial de juros remuneratórios do capital atribuído; o desconto/dedução/acerto devido pelo benefício da antecipação, da entrega do capital de uma só vez, com vista a impedir enriquecimento indevido; o crescente aumento do nível dos salários, a evolução do custo de vida e da inflação; a flutuação do valor do dinheiro; a carga fiscal, bem como as indemnizações atribuídas precedentemente em casos semelhantes.


Da quantificação/valoração do dano patrimonial futuro, na componente de lucros cessantes, mais especificamente por redução da capacidade de trabalho.

Vejamos os factores com influência na determinação em causa e seu tratamento nas soluções jurisprudenciais.

Determinação do capital produtor de rendimentos

Nestes casos o que está em causa é o ressarcimento do prejuízo económico que o lesado irá sofrer por virtude da permanente incapacidade geral ou parcial para o trabalho, que lhe resultou do acidente, estando em causa frustração de ganhos futuros.
Pretende-se em tais situações encontrar o capital que permita realizar o quantitativo, a “pensão” anual correspondente à perda de vencimento sofrido pelo lesado, a atribuição de uma quantia que produza, no período que houver de ser considerado, o rendimento correspondente à perda económica que o lesado sofreu (ou irá sofrer ou deixar de auferir), mas de tal modo que, no fim desse período, essa quantia se ache esgotada.

Após uma primeira aproximação pelo acórdão de 09-01-1976, BMJ, n.º 253, pág. 157, onde se definiu que a indemnização destinada a reparar o dano resultante duma actividade deve ser fixada numa importância que renda o quantitativo em dinheiro sensivelmente aproximado ao que o sinistrado auferia em resultado da sua actividade profissional, a partir do acórdão de 10 de Maio de 1977, BMJ n.º 267, pág. 144, a jurisprudência acolheu a solução de que indemnização em dinheiro do dano futuro de incapacidade permanente a pagar ao lesado, deve “representar um capital que se extinga no fim da sua vida activa e seja susceptível de garantir, durante esta, as prestações periódicas correspondentes à sua perda de ganho”.
A ideia da necessidade de ponderação do desgaste do capital ao longo do período de vida considerado na fixação da indemnização foi realçada no acórdão de 14-06-1978, BMJ n.º 278, pág. 182.
A doutrina do acórdão de 10-05-1977 foi adoptada de forma expressa no acórdão de 09-01-1979, processo n.º 67452, e no de 18-01-1979, processo n.º 67539, ambos publicados in BMJ n.º 283, págs. 260 e 275, sendo que em muitos arestos subsequentes, e em trabalhos ou obras referentes a esta matéria, aquele acórdão de 9 de Janeiro de 1979 é apontado como tendo sido o pioneiro na definição/formulação supra indicada, quando na realidade o percursor data de Maio de 1977!..., estabelecendo o segundo acórdão que “Em relação ao futuro, a indemnização deve ser calculada em atenção ao tempo provável de vida activa da vítima, de forma a representar um capital produtor do rendimento que cubra a diferença entre a situação anterior e a actual até final desse período, segundo as tabelas financeiras usadas para determinação do capital necessário à formação de uma renda periódica correspondente, ao juro anual de 9%”.
A partir de então, é jurisprudência corrente a de que a indemnização do dano patrimonial futuro decorrente de incapacidade permanente deverá corresponder a um capital produtor de rendimento equivalente ao que a vítima irá perder (no nosso caso e equivalentes, não irá auferir), mas que se extinga no final da vida activa ou do período provável de vida da vítima e que seja susceptível de garantir, durante essa vida ou período, as prestações periódicas correspondentes ao rendimento perdido, às perdas de ganho.
Assim, nos acórdãos de 19-05-1981, BMJ n.º 307, pág. 342; de 08-05-1986 e de 15-05-1996, BMJ n.º 357, págs. 396 e 412; de 04-11-1986, Tribuna da Justiça, n.º 24, pág. 18; de 13-10-1992 e de 28-10-1992, BMJ n.º 420, págs. 507 e 544; de 17-11-1992, BMJ n.º 421, pág. 414; de 04-02-1993, CJSTJ 1993, tomo 1, pág. 128; de 31-03-1993, BMJ n.º 425, pág. 544; de 08-06-1993, CJSTJ 1993, tomo 2, pág. 138; de 11-10-1994, CJSTJ 1994, tomo 2, pág. 86; de 07-12-1994, BMJ n.º 442, pág. 176; de 04-06-1998, BMJ n.º 478, pág. 344; de 15-12-1998, CJSTJ 1998, tomo 3, pág. 155; de 16-03-1999, CJSTJ 1999, tomo 1, pág. 167; de 08-06-1999, BMJ n.º 488, pág. 323; de 06-07-2000, revista n.º 1861/00-2ª, CJSTJ 2000, tomo 2, pág. 144 e BMJ n.º 499, pág. 309; de 28-02-2002, revista n.º 4399/01-1ª; de 19-03-2002, revista n.º 4183/01-1ª; de 28-05-2002, revista n.º 1038/02-2ª; de 25-06-2002, revista n.º 1321/02-1ª, CJSTJ 2002, tomo 2, pág. 128; de 24-10-2002, revista n.º 1721/02-7ª; de 30-10-2002, revista n.º 3031/02-7ª; de 03-06-2003, revista n.º 1270/03 - 1ª; de 17-06-2003, revista n.º 1564/03 - 6ª; de 09-10-2003, revista n.º 1567/03-7ª; de 23-10-2003, revista n.º 3075/03-7ª, CJSTJ 2003, tomo 3, pág. 111; de 30-10-2003, revista n.º 2818/03 - 2ª; de 20-11-2003, revista n.º 3528/03 - 2ª; de 20-11-2003, revista n.º 3441/03 - 6ª; de 20-11-2003, revista n.º 3450/03, CJSTJ 2003, tomo 3, pág. 149; de 27-11-2003, revista n.º 3064/03 - 2ª; de 18-12-2003, revista n.º 4120/03 - 7ª; de 05-02-2004, revista n.º 83/04 - 7ª; de 19-02-2004, revista n.º 4271/03-2ª; de 19-10-2004, revista n.º 2897/04 - 6ª; de 16-12-2004, revista n.º 3839/04 - 2ª; de 27-01-2005, revista n.º 4135/04 - 2ª; de 03-02-2005, revista n.º 4478/04 - 7ª; de 03-03-2005, revista n.º 4470/04 - 2ª; de 22-06-2005, revista n.º 1597/05 - 2ª; de 22-09-2005, revista n.º 2277/05-2ª, CJSTJ 2005, tomo 3, pág. 38; de 11-10-2005, revista n.º 2587/05 - 7ª; de 07-12-2005, revista n.º 3297/05-7ª; de 07-12-2005, revista n.º 3028/05-2ª; de 07-12-2005, revista n.º 3437/05 - 7ª; de 09-03-2006, revista n.º 312/06 - 7ª; de 08-06-2006, revista n.º 1331/06 - 2ª; de 07-11-2006, revista n.º 3349/06 - 1ª; de 09-11-2006, revista n.º 2849/06 - 2ª; de 30-11-2006, revista n.º 3898/06 - 2ª; de 14-12-2006, revista n.º 3974/06 - 1ª; de 17-04-2007, revista n.º 2122/06 - 2ª; de 12-07-2007, revista n.º 2406/07 - 1ª; de 13-09-2007, revista n.º 2382/07 - 7ª; de 02-10-2007, revista n.º 2763/07 - 6ª; de 02-10-2007, revista n.º 2657/07 - 1ª, CJSTJ 2007, tomo 3, pág. 68; de 04-10-2007, revista n.º 3454/06 - 2ª; de 25-10-2007, revista n.º 3026/07 - 2ª; de 18-12-2007, revista n.º 3715/07 - 7ª; de 07-02-2008, revista n.º 4598/07 - 1ª; de 17-06-2008, revista n.º 1266/08-6ª; de 03-07-2008, revista n.º 1833/08 - 7ª; de 16-09-2008, revista n.º 939/08 - 7ª; de 25-09-2008, processo n.º 2860/08 – 3.ª; de 29-10-2008, processos n.º s 3373/08 e 3379/08, ambos da 3.ª secção; de 22-01-2009, processo n.º 2499/08 - 5ª; de 11-02-2009, processo n.º 3980/08 - 3ª; de 17-02-2009, revista n.º 4099/08 - 1ª; de 19-03-2009, revista n.º 3745/08 - 2ª; de 14-05-2009, processo n.º 271/09.7YFLSB-3ª; de 24-05-2009, revista n.º 3413/03.2TBVCT.S1-1ª; de 02-06-2009, revista n.º 1507/03.3TBPBL.C1.S1-1ª; de 18-06-2009, processo n.º 81/04.8PBBGC.S1-3ª; de 02-07-2009, revistas n.ºs 179/04.2TBMRT.S1-7ª e 2759/08-7ª; de 10-09-2009, processo n.º 4129/08 - 5ª; de 22-09-2009, revista n.º 156/05.6TBVPA.S1-6ª; de 24-09-2009, revista n.º 37/09 - 7ª.

Como critérios de determinação do valor a capitalizar, produtor do montante de indemnização por redução de capacidade laboral e perda aquisitiva de ganho, a jurisprudência foi lançando mão de vários métodos de cálculo e tabelas matemáticas e financeiras, que após uma inicial aceitação, embora sempre sem perder de vista que elas não representam mais do que métodos de cálculo, vem anotando que apesar da sua reconhecida utilidade, assumem uma natureza de meros indicadores, não dispensando a intervenção do prudente arbítrio do julgador com recurso à equidade, afirmando-se em alguns acórdãos a prescindibilidade de tais fórmulas ou tabelas.
Numa primeira fase foram consideradas aplicáveis as regras técnicas do direito laboral, sendo adoptadas regras próprias para o cálculo das pensões devidas por incapacidade para o trabalho e sua remição, como nos acórdãos de 10-05-1977, BMJ n.º 267, pág. 144, de 08-03-1979, BMJ n.º 285, pág. 290 e de 02-02-1982, BMJ n.º 314, pág. 284 (mais recentemente, no acórdão de 29-10-2008, processo n.º 3379/08-3ª, em caso de homicídio tentado, foi tomada como elemento de referência a fórmula utilizada nos tribunais de trabalho nos cálculos respeitantes à remição das pensões) e tabelas financeiras, como, v. g., nos acórdãos de 19-05-1981, BMJ n.º 307, pág. 242; de 08-05-1986 e de 15-05-1986, BMJ n.º 357, págs. 396 e 412.
O Supremo Tribunal de Justiça vem reiteradamente entendendo que no recurso às fórmulas matemáticas ou tabelas financeiras para a fixação dos cômputos indemnizatórios por danos futuros/lucros cessantes, têm estas de ser encaradas como meros referenciais ou indiciários, só relevando como meros elementos instrumentais, instrumentos de trabalho, com papel adjuvante, que não poderão substituir o prudente arbítrio do tribunal e a preponderante equidade.
Como se dizia no acórdão de 04-02-1993, CJSTJ 1993, tomo 1, pág. 129, «… na avaliação dos prejuízos verificados, o juiz tem de atender, sempre, à multiplicidade e à especificidade das circunstâncias que concorram no caso e que o tornarão sempre único, diferente. Por isso as tabelas ou regras financeiras não são garantia segura da justa medida do ressarcimento».
No acórdão de 26-05-1993, CJSTJ 1993, tomo 2, pág. 130, considera-se que o critério assente em bases técnicas, apoiado em tabelas financeiras, regras aplicáveis aos acidentes de trabalho, é pouco seguro, dada a incerteza a respeito dos dados com que jogam, defendendo como mais aconselhável um critério mais flexível e feito das realidades, como será o de fazer corresponder o lucro cessante à capitalização da quantia perdida pelo lesado ao longo da vida futura, sem deixar de reconhecer que a incerteza sobre certos dados continua.
E no de 8-06-93, CJSTJ 1993, tomo 2, pág. 138, sublinhava-se que “o recurso a tabelas para cálculo do dano, tabelas para formação de rendas vitalícias, acidentes de trabalho e remição de pensões, tabelas financeiras, juros passivos da banca comercial, ou tabelas baseadas em avaliação de usufruto, é sempre aleatório; não sendo possível averiguar o valor exacto dos danos deve-se recorrer à equidade”.
Como referiu o acórdão de 28-09-1995, recurso n.º 87092-2ª secção, in CJSTJ 1995, tomo 3, pág. 36 e BMJ n.º 449, pág. 344, «depois de um período de entusiasmo por, ao que julgámos, ter encontrado um método certo, seguro e justo para o cálculo da indemnização a arbitrar pelos danos futuros, inclinámo-nos para por de parte as respectivas tabelas e confiarmos preferentemente no prudente arbítrio do tribunal, com recurso à equidade».
A partir de então a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem acentuado o valor relativo, meramente indicativo, auxiliar, que assumem as fórmulas, os cálculos, ou tabelas financeiras, defendendo impor-se essencialmente a valorização (o recurso à) do critério da equidade, tomando-o como critério adjuvante, orientador, mas também olhado como essencial, primordial, preferencial, preponderante, fundamental, se não mesmo exclusivo, de que são exemplos os acórdãos de 11-03-97, BMJ n.º 465, pág. 537 (os tribunais não estão sujeitos ao uso de fórmulas matemáticas, nomeadamente as que constam de tabelas financeiras, antes devendo socorrer-se de critérios de equidade); de 11-11-97, BMJ n.º 471, pág. 369 (refere as regras do direito do trabalho ou tabelas financeiras, como critérios que a lei civil não prevê, os quais são extremamente falíveis e apenas poderão servir de orientação geral, adaptada às circunstâncias de cada caso); de 15-12-1998, revista n.º 827/98, (os critérios das tabelas são meramente referenciais e indiciários: não podem olvidar-se todos os imponderáveis e variáveis económicas, tais como a perenidade do emprego, a progressão na carreira profissional, a evolução dos salários, o desenvolvimento tecnológico, os índices de produtividade, a alteração das taxas de juro do mercado financeiro, a inflação); de 27-06-2000, revista n.º 1937/00, BMJ n.º 498, pág. 222 (o valor do dano por incapacidade para o trabalho, em particular o dano futuro, deve ser determinado com recurso essencial à equidade); de 25-06-2002, CJSTJ 2002, tomo 2, pág.128 (intervenção temperadora da equidade); de 8-05-2003, revista n.º 810/03, CJSTJ 2003, tomo 2, pág. 42 (as fórmulas de cálculo do dano não dispensam a emissão de juízos de equidade); de 8-07-2003, CJSTJ 2003, tomo 2, pág. 145 (citando o acórdão de 28-9-1995, são encaradas como instrumentos úteis à formulação do juízo de equidade, mas confiando preferentemente no prudente arbítrio do tribunal, com recurso à equidade, sem embargo de se reconhecer o papel adjuvante que o recurso às tabelas possa ter); de 23-09-2003, revista n.º 2259/03-2ª; de 30-10-2003, revista n.º 2818/03 - 2ª (na avaliação do dano futuro cada caso tem as suas especificidades próprias); de 20-11-2003, revista n.º 3441/03 - 6ª; de 02-11-2004, revista n.º 2628/04 - 1ª (o recurso a critérios estritamente matemáticos, como são os das tabelas financeiras, para a fixação da quantia indemnizatória por lucros cessantes não pode substituir o prudente arbítrio do julgador, ou seja, a utilização de critérios de equidade); de 09-12-2004, revista n.º 2990/04 - 7ª; de 27-01-2005, revista n.º 4135/04-2ª; de 03-03-2005, revista n.º 4470/04-2ª; de 22-06-2005, revista n.º 1597/05-2ª; de 06-07-2005, revista n.º 1602/05-2ª (a equidade não é critério subsidiário das fórmulas, antes primordial); de 22-09-2005, revistas n.º 2470/05 e 2586/05 -7ª; de 04-10-2005, revista n.º 2167/05 - 6ª (declara preferência pela avaliação equitativa no cálculo dos danos patrimoniais futuros causados por IPP); de 11-10-2005 revista n.º 2587/05 - 7ª e de 07-12-2005, revista n.º 3297/05-7ª do mesmo relator (o critério orientador na determinação do valor da indemnização relativa aos danos patrimoniais decorrentes da incapacidade para o trabalho é o da equidade); de 03-11-2005, revista n.º 2698/05 - 2ª (a imprecisão própria do cálculo dos danos patrimoniais futuros, em caso de IPP, é agravada quando o lesado é jovem, dado que o período a avaliar abarca a totalidade de um normal período de vida activa, mais se justificando o recurso à equidade como critério primordial na fixação da respectiva indemnização); de 09-03-2006, revista n.º 312/06-7ª (o critério orientador na determinação do valor da indemnização relativa aos danos patrimoniais decorrentes da incapacidade para o trabalho é o da equidade); de 15-02-2007, revista n.º 302/07 - 7ª; de 08-03-2007, revista n.º 4320/06 - 2ª (destacando papel preponderante da equidade); de 12-06-2008, revista n.º 1266/08-6ª (no cálculo do capital interfere necessariamente, e de forma decisiva, a equidade, o que implica que deve conferir-se relevo às regras da experiência e àquilo que, segundo o curso normal das coisas, é razoável); de 25-09-2008, processo n.º 2860/08 - 3ª; de 22-01-2009, revista n.º 4242/07 - 7ª (quando não é possível averiguar o valor exacto dos danos, como tipicamente sucede quando estão em causa danos futuros, o tribunal recorrerá à equidade para julgar); de 22-01-2009, processo n.º 2499/08 - 5ª (o critério fundamental, no caso de danos futuros, concretiza-se pelo recurso à equidade, mais do que pela utilização de critérios financeiros e fórmulas matemáticas); de 11-02-2009, processo n.º 3980/08-3ª; de 17-02-2009, revista n.º 4099/08-1ª; de 23-04-2009, revista n.º 544/09 - 2ª (no cálculo do dano de incapacidade permanente parcial - preferência pelos juízos de equidade em relação a tabelas financeiras ou cálculos matemáticos); de 14-05-2009, processo n.º 271/09.7YFLSB - 3ª; de 18-06-2009, processo n.º 81/04.8PBBGC.S1-3ª (impõe-se antes e essencialmente a valorização do critério da equidade); de 14-07-2009, revista n.º 310/98.C1.S1-6ª.
Mais radical, defendendo em exclusivo o recurso à equidade, o sentido expresso nos acórdãos de 18-03-1997, CJSTJ 1997, tomo 2, pág. 24 (os danos patrimoniais futuros não determináveis serão fixados com a segurança possível e a temperança própria da equidade, sem aderir a critérios ou tabelas puramente matemáticas); de 19-03-2002, revista n.º 646/02-6ª, do mesmo Colectivo do anterior, in STJSAC2002, pág. 98 (o dano corporal ou dano à saúde, de que resulta perda de capacidade para o trabalho, deve ser avaliado segundo um juízo de equidade); de 27-05-2004, revista n.º 19/04-7ª (não se preconizando a adopção de fórmulas matemáticas); de 08-06-2006, revista n.º 1435/06-6ª e de 02-10-2007, revista n.º 2763/07 - 6ª (tais danos futuros devem ser fixados com a segurança possível e o recurso à equidade, sem se aderir a critérios ou tabelas puramente matemáticas).

*
É de optar por uma quantificação imediata do montante indemnizatório, não relegando o cálculo para execução de sentença, para as calendas gregas.
Estando em causa a fixação de indemnização decorrente de danos futuros, que sejam o prolongamento necessário e directo do estado de coisas criado pelo acidente, abrangendo um longo período de previsão, devendo atender-se apenas aos ganhos fortemente prováveis e verosímeis, não meramente possíveis, a solução mais correcta é a de conseguir a sua quantificação no momento da avaliação, tentando compensar a inerente dificuldade de cálculo com o apelo a juízos de equidade.
Neste sentido, os acórdãos de 11-10-1994, CJSTJ 1994, tomo 3, pág. 89 (há que decidir com a segurança possível e a temperança própria da equidade, optando por um modo de aplicação); de 02-11-1995, CJSTJ 1995, tomo 3, pág. 220 e BMJ n.º 451, pág. 49 (sendo a fixação (dos danos futuros) de efectuar com recurso apenas a critérios de equidade, correspondendo assim a uma determinação jurídica do seu valor, não respeitando, pois, a julgamento de matéria de facto, não é possível que o apuramento se processe em execução de sentença); de 10-07-1997, BMJ n.º 469, pág. 524 (só cabe a liquidação em execução do quantum da condenação nos casos em que a lei não imponha ou não permita ao julgador o recurso à equidade para fixar a quantidade da condenação ou quando nem mesmo com recurso à equidade for possível a condenação em quantia certa); de 07-10-1997, BMJ n.º 470, pág. 569 (em caso de estudante de curso superior que não o conclui e é levado a optar por outro, pondera-se que sendo incerta e meramente hipotética a vantagem de relegar fixação da indemnização para execução de sentença, tendo presente a vantagem do não retardamento da aplicação da justiça, dever-se-á recorrer à equidade, fixando de imediato a indemnização); de 25-11-1998, revista n.º 865/98, BMJ n.º 481, pág. 470 (os danos previsíveis são os referidos e quer agora, quer mais tarde, os factores da sua determinabilidade, enquanto danos futuros, serão os mesmos; não há razão para relegar para momento posterior, havendo tão só que recorrer à equidade); de 01-02-2000, revista n.º 1034/99-1ª, STJSAC, Edição Anual - 2000, pág. 51; de 23-10-2003, revista n.º 3075/03, CJSTJ 2003, tomo 3, pág. 111; de 09-12-2004, revista n.º 2990/04-7ª, CJSTJ 2004, tomo 3, pág. 137; de 17-11-2005, revista n.º 3436/05, CJSTJ 2005, tomo 3, pág. 127; de 13-09-2007, revista n.º 2382/07 e no de 09-10-2008, revista n.º 2686/08, sendo os últimos cinco todos da 7ª secção e do mesmo relator, aí se referindo que como se trata de dano futuro no âmbito de um longo período de funcionamento da previsão, a solução mais ajustada é a de conseguir a sua quantificação imediata, embora com a inerente dificuldade de cálculo, naturalmente com a utilização intensa de juízos de equidade. Devem utilizar-se juízos lógicos de probabilidade ou de verosimilhança, segundo o princípio id quod plerumque accidit, com a equidade a impor a correcção, em regra por defeito, dos valores resultantes do cálculo baseado nas fórmulas de cariz instrumental.
Nesta linha, vejam-se também os acórdãos de 25-09-2008, processo n.º 2860/08 e de 14-05-2009, processo n.º 271/09.7YFLSB, ambos da 3ª secção.
A este propósito, já Manuel de Oliveira Matos no Código da Estrada Anotado, 3ª edição, 1979, pág. 437, referindo-se às dificuldades que poderiam surgir, podendo algumas ser removidas relegando para liquidação em execução de sentença a fixação do quantitativo, afirmava: “É claro que as dificuldades actuais podem verificar-se em qualquer ocasião e assim vale mais o juiz recorrer imediatamente à equidade para decretar a indemnização em quantia líquida, evitando futuras e dispendiosas demandas”.

Período de vida a considerar

Partindo necessariamente da idade do lesado, tendo em conta a sua idade à data do acidente, ou à data da fixação da incapacidade, bem como a idade em que previsivelmente entrará (ia) no mercado de trabalho, há que projectar a previsível duração de vida, o tempo provável da vida, não só enquanto “trabalhador”, portador de força de trabalho, fonte produtiva de património, geradora de rendimentos, mas também enquanto “pessoa” e “cidadão”, que vive para lá do tempo da vida activa, além do tempo da reforma.
O recurso a determinados factores de cálculo tem vindo a sofrer inflexões, o que se verifica igualmente em torno da consideração do termo do período de vida activa do lesado.
Neste aspecto tem sido discutida a prevalência da “idade de reforma”, a estrita observância do limite de vida activa, ou diversamente, a esperança média de vida dos cidadãos deste País.
Tudo se reconduz a distinguir expectativa de vida activa e expectativa de vida, que acresce (valor acrescido) para além daquela.
A consideração dos 65 anos de idade, como limite etário da vida activa, rigidamente considerado durante muito tempo, passou a ser questionada pela jurisprudência.
Considerando redução da capacidade laboral até aos 70 anos, num caso em que o lesado tinha 11 anos de idade, pronunciou-se o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10-05-1977, BMJ n.º 267, pág. 144; opondo alguma reserva à consideração dos 65 anos como limite da vida activa, veja-se o acórdão de 08-06-1999, BMJ n.º 488, pág. 323; no acórdão de 14-03-2000, revista n.º 53/00-6ª,STJSAC, Edição anual 2000, pág. 103, afirma-se que o limite da vida activa profissional não tem de reportar-se à idade de 65 anos; afastando tal limite, de forma clara, o acórdão de 27-06-2000, processo n.º 1937/00, BMJ n.º 498, pág. 222.
Como se extrai do acórdão de 19-10-2004, revista n.º 2897/04-6ª, “Deve ter-se em conta, não exactamente a esperança média de vida activa da vítima, mas sim a esperança média de vida, uma vez que as necessidades básicas do lesado não cessam no dia em que deixa de trabalhar por virtude da reforma (em Portugal a esperança média de vida dos homens já é de, sensivelmente, 73 anos e tem tendência para aumentar e a das mulheres acaba de ultrapassar a barreira dos 80 anos)”
E no de 16-12-2004, revista n.º 3839/04 - 2ª, diz-se: Na aferição dos danos patrimoniais resultantes de diminuição da capacidade de trabalho do titular da indemnização, o Supremo Tribunal de Justiça tem encarado com especial reserva a consideração de determinada idade como limite da vida activa, ponderando topicamente que «atingida a mesma, isso não significa que a pessoa não possa continuar a trabalhar» e que a «reforma não é sinónimo de inutilidade»; atende ao crescimento da taxa de longevidade e da capacidade de permanecer activo (a média de vida activa do homem em Portugal ultrapassa os 70 anos).
Na determinação da indemnização não deve ficcionar-se que a vida física do lesado corresponde à sua vida activa.
Neste sentido se pronunciara já nove anos antes o acórdão de 28-09-95, CJSTJ 1995, tomo 3, pág. 36 e BMJ n.º 449, pág. 344, considerando que “finda a vida activa do lesado, não é razoável ficcionar que também a vida física desaparece no mesmo momento e com ela todas as necessidades do lesado e, por outro lado, geralmente, continua a receber remunerações, ou como pensão de aposentação da própria profissão, ou como prestação da assistência social”.
Como se extrai dos acórdãos de 16-03-1999, revista n.º 22/99-2ª, BMJ n.º 485, pág. 386 (394) e de 8-06-1999, revista n.º 391/99, BMJ n.º 488, pág. 323 (331) “No cálculo da indemnização por danos futuros (perda de rendimentos), é prática corrente ficcionar-se um limite de idade para a vida activa (supondo que no curso normal de vida o lesado atingirá o patamar de reformado) e quando este limite é ultrapassado, urge ficcionar um outro por forma a permitir a obtenção de um valor que se não reconduza a uma equidade completamente abstracta; isto porque não se pode ficcionar que finda a vida activa do lesado também a vida física desaparece nesse momento e com ela todas as necessidades daquele”.

No acórdão de 04-02-1993, recurso n.º 82206, CJSTJ 1993, tomo 1, pág. 128, quanto à duração da vida activa do lesado, afirmava-se estar tranquilamente aceite que a vida activa das pessoas se mantinha até aos 65 anos; no acórdão de 08-06-1993, CJSTJ 1993, tomo 2, pág. 138, em que era lesada uma menor de 10 anos, teve-se em conta “o prazo de vida activa previsível” e no de 05-05-1994, recurso n.º 84952, CJSTJ 1994, tomo 2, pág. 86, do mesmo relator do primeiro, considerava-se os 65 anos como o limite da vida activa (idem no acórdão de 7-10-1997, BMJ n.º 470, pág. 569).
Os 65 anos como limite do período da vida activa são ainda tidos em consideração em alguns acórdãos mais recentes, como os de 27-09-2001, revista n.º 1979/01 - 7ª; de 09-04-2002, revista n.º 519/02-1ª, STJSAC2002, pág. 117 (não serão muitos os empregados de café que continuem a exercer a sua profissão para além dos 65 anos de idade); de 27-05-2003, revista n.º 1127/03-1ª; de 07-10-2003, revista n.º 2556/03 - 1ª; de 27-05-2004, revista n.º 19/04-7ª; de 09-12-2004, revista n.º2990/04-7ª; de 29-06-2005, revista n.º 1336/05-1ª; de 01-06-2006, revista n.º 1266/06 - 7ª; de 03-10-2006, revista n.º 2625/06 - 6ª; de 31-10-2006, revista n.º 2988/06 - 6ª; de 14-12-2006, revista n.º 3998/06 - 6ª; de 05-06-2007, revista n.º 1280/07 - 1ª; de 28-06-2007, revista n.º 1330/07 - 2ª; de 25-09-2007, revista n.º 2159/07 - 1ª; de 25-10-2007, revista n.º 3579/07 - 2ª; de 22-11-2007, revista n.º 3829/07 - 7ª; de 17-01-2008, revista n.º 4527/07 - 7ª; de 09-10-2008, revista n.º 2607/08 - 7ª; de 04-12-2008, revista n.º 3728/08 - 2ª (sinistro em consequência de queda do elevador); de 22-01-2209, revista n.º 3360/08 - 7ª (a esperança média de vida activa laboral prolonga-se até aos 65 anos); de 02-07-2009, revista n.º 2759/08 - 7ª.
No acórdão de 30-06-2009, revista n.º 11325/03.3TBVNG.S1-1ª, considera-se o limite de vida activa entre os 65 e os 70 anos.
A esperança de vida a considerar é a esperança média de vida e não o tempo provável de vida activa – a vida activa é mais longa que a laboral, prolongando-se em alguns casos para além dos 70 anos.
O acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28-11-1991, processo n.º 42294, secção criminal, BMJ n.º 411, pág. 471, versou caso de lesado com 60 anos à data do acidente (e 65 à data do recurso) com incapacidade permanente parcial para o trabalho de 48,4%, considerando-se aí que a vitalidade do ofendido - antes do acidente – faria supor que trabalharia até aos 70 anos.
Exemplos de aplicação do critério que privilegia a consideração da esperança média de vida ou um limite de 70 anos, podem ver-se nos acórdãos de 02-11-1995, recurso n.º 46783, secção criminal, CJSTJ 1995, tomo 3, pág. 220; de 25-11-1998, BMJ n.º 481, pág. 470; de 15-12-1998, CJSTJ 1998, tomo 3, pág. 155; de 16-03-1999, CJSTJ 1999, tomo 1, pág. 169; de 13-01-2000, Revista n.º 1028/99-7ª, STJSAC2000, pág. 34; de 03-02-2000, Processo n.º 1111/99 - 5ª; de 28-03-2000, Revista n.º 222/00-1ª STJSAC2000, pág. 111; de 03-05-2000, revistas n.ºs 311/00-1ª e 25/00-6ª, STJSAC, págs. 157 e 158; de 06-07-2000, CJSTJ 2000, tomo 2, pág. 144; de 28-11-2000, revista n.º 2622/00-1ª, STJSAC 2000, pág. 331; de 01-03-2001, Revista n.º 3851/00-6ª; de 15-03-2001, revista n.º 303/01-2ª; de 20-11-2001, Revista n.º 3384/01; de 25-06-2002, CJSTJ 2002, tomo 2, pág. 128; de 05-12-2002, revista n.º 3564/02-7ª; de 13-11-2003, Revista n.º 2961/03 - 7.ª Secção; de 18-03-2004, Revista n.º 32/04-2ª; de 31-03-2004, Revista n.º 497/04-2ª; de 13-05-2004, Revista n.º 1845/03-2ª; de 27-05-2004, Revista n.º 1694/04-2ª Secção; de 17-06-2004, Revista n.º 1844/04-7ª; de 02-11-2004, Revista n.º 2628/04-1ª; de 16-12-2004, Revista n.º 3839/04-2ª; de 15-02-2005, Revista 4509/04-1ª; de 3-11-2005, Revista n.º 2568/07-7ª; de 08-11-2005, Revista n.º 3053/05-6ª (já que os efeitos patrimoniais da IPP e as necessidades do lesado não desaparecem com o fim da sua vida activa e antes o acompanham até ao termo da sua vida física); de 17-11-2005, Revista n.º 3167/05 - 2ª; de 26-01-2006, Revista n.º 4051/05-7ª; de 09-03-2006, Revista n.º 312/06 - 7ª; de 12-10-2006, Revista n.º 2581/06 - 2ª; de 02-11-2006 Revista n.º 3559/06 - 7ª; de 19-12-2006, Revista n.º 4204/06-2ª; de 23-01-2007, Revista n.º 3741/05-6ª-CJSTJ 2007, tomo 1, pág. 30; de 31-01-2007, Revista n.º 4301/06-6ª (o aumento da esperança de vida e a consequente e previsível falência do sistema de segurança social actual são circunstâncias que vão levar a subir a idade geral da reforma, estando já em execução medidas a fomentar a manutenção voluntária do trabalhador ao serviço após atingir a idade mínima da reforma; por isso e numa previsibilidade a médio ou a longo prazo é de considerar que a idade de reforma de 65 anos é pouco consentânea com a realidade); de 13-02-2007, Revista n.º 4761/06-6ª; de 22-02-2007, Revista n.º 100/07-7ª; de 01-03-2007, Revista n.º 126/07-1ª; de 08-03-2007, Revista n.º 4320/06-2ª (não deve ficcionar-se que a vida física do lesado corresponde à sua vida activa, antes deve ter-se presente a esperança média de vida em Portugal); de 02-10-2007, Revista n.º 2657/07-1ª, CJSTJ 2007, tomo 3, pág. 68; de 13-11-2007, Revista n.º 3583/07-6ª; de 22-11-2007, Revista n.º 3620/07-1ª e Revista n.º 3688/07-1ª; de 10-01-2008, Revista n.º 4606/07-7ª; de 22-01-2008, Revista n.º 4499/07-1ª; de 07-02-2008, Revista n.º 4598/07-1ª; de 14-02-2008, Revista n.º 4508/07-2ª; de 17-06-2008, Revista n.º 1266/08-6ª; de 03-07-2008, Revista n.º 1811/08-7ª (deve atender-se ao limite de 70 anos como a idade previsível da reforma, sendo em face dela que se deve capitalizar a indemnização devida a título de danos futuros); de 03-09-2008, Processo n.º 2386/08 - 3ª ; de 14-10-2008, Revista n.º 2945/08-6ª; de 16-10-2008, Revista n.º 3114/08-7ª; de 29-10-2008, Processos n.º 3373/08 e n.º 3379/08, ambos da 3ª secção; de 02-12-2008, Revista n.º 2096/08- CJSTJ 2008, tomo 3, pág. 172; de 18-12-2008, Revista n.º 2661/08-7ª; de 22-01-2009, Processo n.º 2499/08 - 5ª; de 11-02-2009, Processo n.º 3980/08 - 3ª; de 17-02-2009, Revista n.º 4099/08 - 1ª; de 19-02-2009, Revista n.º 3652/08-2ª (deve ser considerada a esperança média de vida); de 09-06-2009, Revista n.º 285/09.7YFLSB-6ª; de 18-06-2009, Revista n.º 268/09-2ª; de 25-06-2009, Revista n.º 2409/09.1TBCBR.C1.S1-6ª; de 30-06-2009, Revista n.º 1995/05.3TBVCD.S1-1ª; de 17-09-2009, revista n.º 292/1999-09.S1-6ª; de 24-09-2009, Revista n.º 37/09 - 7ª (a relevância da lesão não pode ser avaliada apenas com referência à vida activa provável do lesado; antes se há-de considerar também o período posterior à normal cessação de actividade laboral, com referência à esperança média de vida).
Com outras concretizações quanto ao limite de idade, ultrapassando a barreira dos 70 anos, pronunciaram-se os seguintes:
Acórdãos de 30-04-2002, Revista n.º 403/02-1ª e de 15-10-2002, Revista n.º 1640/02-1ª (72 anos para os homens); de 01-07-2003, Revista n.º 1739/03-6ª (73 anos para homens e ultrapassando os 80 anos para as mulheres); de 27-02-2003, Revista n.º 80/03 e de 23-09-2003, Revista n.º 2259/03, ambos da 2ª secção e do mesmo relator (distinguindo entre a expectativa de vida útil e a duração cronológica, ambas com tendência crescente, apontando aquela para idade a rondar os 70 anos, tendendo a esperança média de vida a atingir os 78 e os 82 anos para os homens e mulheres, respectivamente); de 22-09-2005, Revista n.º 2277/05-2ª, CJSTJ 2005, tomo 3, pág. 38 (assenta em esperança de vida para autora de 79 anos); de 17-11-2005, Revista n.º 3050/05-2ª e de 30-05-2006, Revista n.º 1333/06-1ª (considerando expectativa de vida activa até aos 71 anos); de 27-04-2005, Revista n.º 2086/03-2ª (72/73 anos); de 19-10-2004, Revista n.º 2897/04-6ª; de 22-01-2008, Revista n.º 4338/07-1ª e de 27-05-2009, Revista n.º 3413/03.2TBVCT.S1-1ª (73 anos); de 08-11-2005, Revista n.º 3053/05-6ª e de 27-11-2007, Revista n.º 3926/07-6ª (74 anos); de 05-12-2006, Revista n.º 3728/06-6ª; de 4-12-2007, Revista 3836/07; de 13-12-2007, Revista n.º 4312/07-2ª; de 18-12-2007, Revista n.º 4244/07-6ª e de 14-07-2009, Revista n.º 310/1998.C1.S1-6ª (75 anos); de 06-07-2004, Revista n.º 1674/04-1ª (75 anos para homens e mulheres); de 28-10-2008, Revista n.º 2663/08-6ª (75,2 anos para os homens e 81,8 anos para as mulheres); de 30-10-2008, Revista n.º 3237/08-2ª (70/75 anos); de 05-07-2007, Revista n.º 1724/07-6ª; de 29-04-2008, Revista n.º 651/08-6ª; de 16-09-2008, Revista n.º 2117/08-1ª e de 12-03-2009, Revista n.º 277/09-1ª (80 anos - mulheres); de 28-10-2008, Revista n.º 2663/08-6ª (81,8 anos – mulheres); de 02-07-2009, Revista n.º 179/04.2TBMTR.S1-7ª (esperança média de vida de 78 anos para homens); de 07-07-2009, Revista n.º 3306/08 - 7ª (73 anos); de 22-09-2009, revista n.º 156/05.6TBVPA.S1-6ª (previsível o desempenho como agricultor até aos 73 anos).

Uma outra indicação neste plano é dada por via legislativa, como decorre do artigo 7º, n.º 1, alínea b), da Portaria n.º 377/2008, de 26-05; ao estabelecer as regras e critérios a que deve obedecer a proposta razoável para indemnização dos danos patrimoniais futuros nas situações de incapacidade permanente absoluta, prescreve que para cálculo do tempo durante o qual a prestação se considera devida, presume-se que o lesado se reformaria aos 70 anos de idade.

Segundo as “Estatísticas Demográficas” de 1997, do Instituto Nacional de Estatística, a esperança de vida era para os homens de 71,40 anos e para as mulheres de 78, 65 anos.
De acordo com estatísticas produzidas pela ONU - informação apud acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07-11-2006, na revista 3349/06-1ª - a expectativa de vida para os nascidos em Portugal entre 2000 e 2005 era de 73 anos para os homens e 80 para as mulheres.
A esperança de vida da população portuguesa residente, segundo os resultados do censo de 2001, “Estatísticas Demográficas” de 2001 do Instituto Nacional de Estatística, era de 73,47 anos para os homens e de 80,30 anos para as mulheres.


Determinação do rendimento auferido (ou como no caso, a auferir)

Neste segmento há que ter em conta o salário auferido pelo lesado e sua evolução, o que supõe que o lesado está a trabalhar, revestindo esta tarefa maiores dificuldades quando não há ainda uma profissão, pois fica por saber como ponderar o rendimento, necessariamente futuro, nos casos de não exercício actual de actividade profissional em virtude da menoridade do lesado, ou por ser estudante, ou não ter ainda uma profissão definida.
Em algumas decisões é invocado como parâmetro de avaliação do prejuízo o valor do salário mínimo nacional.
Assim, nos acórdãos de 10-05-1977, BMJ, n.º 267, pág. 144 (apelando ao salário mínimo actual em caso de início de profissionalização aos 14 anos); de 15-05-1986, BMJ, n.º 357, pág. 412 (necessário atender às sucessivas alterações do salário mínimo nacional); de 11-10-1994, CJSTJ 1994, tomo 3, pág. 89 (92), no caso não aplicando o critério, mas para significar que a verba atribuída, a pecar, seria por defeito, tendo em conta as remunerações mínimas nacionais; de 25-11-1998, BMJ, nº 481, pág. 470; de 25-05-1999, revista n.º 335/99-1ª; de 29-06-1999, revista n.º 569/99-1ª (critério para o desempregado e estudante); de 15-03-2001, revista n.º 303/01-2ª; de 30-10-2003, revista n.º 2818/03-2ª (lesado com 43 anos, que não auferia vencimento certo mensal, por trabalhar em contratos por períodos determinados, auferindo vencimento diário); de 09-12-2004, revista n.º 3743/04 - 6ª; de 12-05-2005, revista n.º 2342/03-2ª; de 21-09-2006, revista n.º 2016/06 - 2ª; de 02-11-2006, revista n.º 3559/06 - 7ª; de 16-11-2006, revista n.º 3708/06-7ª; de 15-02-2007, revista n.º 302/07-7ª; de 22-03-2007, revista n.º 481/07-6ª; de 25-09-2007, revista n.º 2205/07 - 6ª; de 25-10-2007, revista n.º 3026/07 - 2ª; de 17-01-2008, revista n.º 4527/07 - 7ª; de 07-02-2008, revista n.º 4521/07-6ª, CJSTJ 2008, tomo 1, pág. 91 (tendo o autor, à data do acidente, 19 anos de idade, frequentando o 2º ano de um curso médio profissional com a duração de 3 anos e ficando a padecer de uma IPP de 45%, o ponto de partida para o cálculo da indemnização é o salário mínimo nacional vigente na data do acidente); de 16-09-2008, revista n.º 2117/08 - 1ª (pondera o salário mínimo vigente à data da propositura da acção); de 16-09-2008, revista n.º 939/08 - 7ª; de 16-10-2008, revista n.º 3114/08 - 7ª; de 30-10-2008, revista n.º 3237/08 - 2ª; de 04-12-2008, revista n.º 3728/08 - 2ª (sinistro em consequência de queda do elevador); de 18-12-2008, revista n.º 2661/08 - 7ª; de 19-03-2009, revista n.º 274/09 - 6ª; de 02-07-2009, revista n.º 2759/08 - 7ª (salário mínimo em vigor à data do acidente).
No acórdão de 31-01-2007, revista n.º 4301/06-6ª, considera-se para o efeito o valor de uma vez e meia do salário mínimo nacional.
Afasta o salário mínimo o acórdão de 18-11-2008, revista n.º 3345/08-2ª.
De igual modo, o acórdão de 25-06-2009, revista n.º 3234/08-7ª, afasta o salário mínimo português como ponto de referência para o cálculo dos danos patrimoniais futuros, relativamente a um lesado jovem residente em França.

Noutros casos opta-se por soluções diversas, ponderando-se o chamado “salário médio previsível” ou “salário médio acessível”.
Assim, nos seguintes acórdãos:
Acórdão de 27-02-2003, Revista n.º 80/03 - 2.ª Secção
Em caso de lesado com 5 anos de idade, pondera-se: “desconhecendo-se embora o seu futuro profissional e remuneratório, não será exagerado lidar com um rendimento previsível mínimo (por referência aos valores actuais) de 100.000$00, a título de salário mensal x14 meses”.
Acórdão de 03-06-2003, Revista n.º 1270/03 - 1ª Secção
“Trata-se de um dado da experiência que um jovem, quando adulto, virá a adquirir uma remuneração capaz de assegurar o mínimo de dignidade, remuneração essa que deve rondar, por agora, os 100 contos. Não é nada que se não imponha em termos de normalidade e dentro do requisito previsibilidade; o salário mínimo, prevenindo um mínimo para a subsistência de quem trabalha, não é a regra nem corresponde às expectativas de quem, dotado de mediana capacidade e aptidão, está em condições de entrar no mundo do trabalho. Será aquele o «salário médio acessível» a um jovem robusto e saudável, ultrapassada que seja a fase de aprendizagem”.
Acórdão de 23-09-2003, Revista n.º 2259/03 - 2.ª Secção
Em caso de lesado com 16 anos de idade, pondera-se: “desconhecendo-se embora o seu futuro profissional e remuneratório, não será exagerado lidar com um rendimento previsível mínimo (por referência aos valores actuais) de 100.000$00, a título de salário mensal x14 meses” (com o mesmo relator do acórdão de 27-02-2003).
Acórdão de 14-12-2004, Revista n.º 3810/04 - 1.ª Secção
Em caso de lesado com 10 anos de idade pondera-se salário médio previsível para qualquer profissão acessível àquele.
Acórdão de 02-10-2007, revista n.º 2657/07 - 1ª, CJSTJ 2007, tomo 3, pág. 68
O cálculo dos danos futuros deve considerar a possibilidade de ingresso do lesado (com 2 anos à data do acidente) no mercado do trabalho aos 21 anos e auferir um rendimento de 600,00 € mensais.
Acórdão de 07-02-2008, revista n.º 4598/07-1ª Secção
Em termos de normalidade e previsibilidade, o salário médio acessível a um jovem (16 anos - operário), dotado de mediana capacidade e aptidão, após a fase de aprendizagem profissional, não deve situar-se abaixo de € 500,00 mensais.
Acórdão de 16-10-2008, revista n.º 2362/08 - 1ª Secção
Para efeito de determinação de indemnização pela perda de capacidade de ganho de um jovem de 18 anos de idade, em início de exercício de uma profissão, deve considerar-se, como impõem critérios de normalidade e previsibilidade, o valor do salário médio acessível a um jovem dotado de uma mediana capacidade e aptidão, após a fase de aprendizagem, no exercício da concreta profissão, valor esse desligado do do salário mínimo nacional.
Acórdão de 13-01-2009, revista n.º 3747/08 - 1ª Secção
Para efeito de determinação de indemnização por danos patrimoniais futuros (a lesado com 8 anos) será de atender ao salário médio acessível a um jovem dotado de formação profissional média, a partir dos 21 anos, salário que, em termos de normalidade e previsibilidade, é de situar em não menos de 650/700 euros mensais, tendendo a subir ao longo da vida.
(Este acórdão, o segundo e os precedentes quatro são todos do mesmo relator).

Outras soluções com quantificações mais concretizadas:

Acórdão de 05-07-2001, revista n.º 1523/01-7.ª Secção, STJSAC, Edição anual 2001, pág. 245
Face a situação de lesada com 21 anos de idade, frequentando o 1º ano do Curso de Estudos Portugueses da Faculdade de Letras, que ficou com IPP de 40%, admitindo-se estar ao alcance daquela a carreira de professora do ensino secundário, projecta-se o vencimento mensal médio de 200.000$00.
Acórdão de 06-11-2001, revista n.º 2592/01-1.ª Secção, STJSAC, Edição anual 2001, pág. 328
Em caso de lesada com 17 anos de idade à data do acidente, ocorrido em 1993, que entretanto se licenciou em Direito, projecta-se que teria uma remuneração mensal de 150.000$00, 14 vezes por ano.
Acórdão de 12-12-2002, revista n.º 3627/02 – 6.ª Secção, STJSAC, Edição anual 2002, pág. 373
Em caso de lesado com 20 anos de idade, estudante, a frequentar o curso de Direito, é projectada como razoável senão mesmo modesta, no início de carreira, uma remuneração mensal de 250.000$00.
Acórdão de 23-09-2004, revista n.º 2209/04 - 2.ª Secção
Pondera na profissão de serralheiro (da qual o lesado era aprendiz), um salário nunca inferior a 100.000$00 mensais.
Acórdão de 07-04-2005, revista n.º 280/05 - 6.ª Secção
Vítima de atropelamento com 12 anos de idade à data da sentença da 1ª instância, em indemnização pelo esforço suplementar, pondera-se um rendimento de € 600,00 mensais.
Acórdão de 17-11-2005, revista n.º 3050/05 - 2ª Secção
Pondera para o lesado (criança de 11 anos) o ingresso no mundo do trabalho por volta dos 21 anos, e o percebimento da quantia aproximada de 750,00 € por mês.
Acórdão de 29-03-2007, revista n.º 110/07 - 7ª Secção
Lesado com 17 anos de idade, frequentando o 12.º ano, na opção de Desporto, resultando do acidente lesões (perda de força no braço direito) que acarretam uma IPP de 50% - faz-se projecção da possibilidade de exercício no futuro de uma actividade através da qual poderia auferir o rendimento mensal de 1.250,00 €.
Acórdão de 14-06-2007, revista n.º 947/07 - 7ª Secção
Não se tendo apurado o rendimento mensal exacto do lesado, mecânico, parte-se de um rendimento base de € 600,00.
Acórdão de 18-10-2007, revista n.º 2734/07 - 1.ª Secção
O facto de o contrato do lesado com 17 anos à data do acidente, de que resultou incapacidade parcial geral fixável em 15%, e pelo qual auferia 65.000.$00, não ter sido renovado após o acidente, não impede a valorização da perda de capacidade de ganho, tendo-se em conta para o cálculo equitativo o vencimento que auferia à data do acidente.
Acórdão de 22-11-2007, revista n.º 3829/07 - 7ª Secção
Para lesado com 17 anos de idade à data do acidente, frequentando o 11.º ano de escolaridade e posteriormente o 1.º ano de engenharia civil, é considerado um salário próximo do dobro do salário mínimo nacional.
Acórdão de 08-05-2008, revista n.º 3818/07 - 7ª Secção
Para lesada estudante, com 19 anos, projecta-se que iria auferir uma remuneração mensal de, aproximadamente, dois salários mínimos nacionais.
Acórdão de 19-03-2009, revista n.º 56/09 - 7ª Secção
Para lesada com 13 anos de idade à data do acidente, entretanto no 2.º ano do curso de matemática, considera-se o salário previsível de 750,00 € mensais.
Acórdão de 01-10-2009, processo n.º 1311/05.4TAFUN.S1 - 5ª Secção
Para lesada com 11 anos de idade à data do acidente, considerando que iria estudar até obter licenciatura num curso superior, teve-se em consideração vencimento médio previsível de € 850,00.

Nestas situações haverá que ter em atenção a evolução do salário mínimo nacional, actualmente designado de “retribuição mínima mensal garantida”, neste sentido se consignando que para os anos de 2003 (data do acidente), 2004, 2005, 2006, 2007, 2008 e 2009, tais retribuições foram, respectivamente, de 356,60 €, 365,60 €, 374,70 €, 385,90 €, 403,00 €, 426,00 € e 450,00 €, conforme o disposto nos Decretos-Lei n.º 320-C/02, de 30-12; n.º 19/2004, de 20-01; n.º 242/2004, de 31-12; n.º 238/2005, de 30-12; n.º 2/2007, de 03-01; n.º 397/2007, de 31-12; n.º 246/08, de 31-12.

Taxa de juro

Um dos critérios de referência a ponderar na fixação dos valores de indemnização é a taxa de juro, a taxa de rentabilidade do capital a fixar como indemnização, uma taxa de rendimento previsível para as aplicações a médio e longo prazo.
Inicialmente foi utilizada a taxa de juro máxima das operações bancárias passivas e depois considerada uma taxa de 9% - acórdãos de 10-05-1977, BMJ, n.º 267, pág. 144; de 18-01-1979, BMJ, n.º 283, pág. 275; de 19-05-1981, BMJ, n.º 307, pág. 242 e de 08-05-1986, BMJ, n.º 357, pág. 396 - e no acórdão de 04-02-1993, recurso n.º 82206, CJSTJ 1993, tomo 1, pág. 128, referia-se ainda ser “usual e normal a aceitação de uma taxa de juro (líquida) de 9%”.
No acórdão de 05-05-1994, CJSTJ 1994, tomo 2, pág. 86, do mesmo relator do anterior, de 4-02-1993, face a uma tendência de descida das taxas de juro, é utilizada uma taxa de referência de 7%. De igual modo, no acórdão de 08-06-1999, BMJ, n.º 488, pág. 323 e no de 28-03-2000, revista n.º 222/00-1ª STJSAC2000, pág. 111.
No acórdão de 02-11-1995, recurso n.º 46783, secção criminal, CJSTJ 1995, tomo 3, pág. 220 (223), referia-se o juro tendencial de 8% preconizado pela Comunidade Europeia.
No acórdão de 15-02-2005, revista n.º 4363/04-1ª, pondera-se uma taxa de juro entre 4% a 5 %.
Sousa Dinis, in Dano corporal em acidentes de viação, CJSTJ 2001, tomo 1, pág. 9, defendia então uma taxa de 4,5% ou 5%. E em acórdão por si relatado em 25-11-1999, revista n.º 827/99-7ª, “trabalha” com uma taxa de 4,6%, a mais alta praticada dos certificados de aforro.
Encontra-se a aceitação de uma taxa de 5% nos acórdãos de 28-05-2002, revista n.º 1038/02-2ª; de 22-11-2007, revistas n.ºs 3620/07 e 3688/07, ambas da 1ª secção; de 22-01-2008, revista n.º 4499/07-1ª; de 25-09-2008, no processo n.º 2860/08-3ª; de 15-12-1998, revista n.º 827/98-2ª; de 16-03-1999, BMJ, n.º 485, pág. 386.
No acórdão de 15-12-1998, revista n.º 972/98, CJSTJ 1998, tomo 3, pág. 155, assinala-se a tendência bem definida de as taxas seguirem uma trajectória descendente, que então, já as colocavam abaixo dos 4% ao ano.
O acórdão de 16-03-1999, CJSTJ 1999, tomo 1, pág. 167, afirma a tendência para a descida, considerando como mais justa e adequada uma taxa referencial de 4%.
“Trabalha-se” com uma taxa de 4% nos acórdãos de 11-07-00, revista n.º 427/00-1ª, STJSAC2000, pág. 237; de 27-09-2001, revista n.º 1979/01-7ª; de 27-05-2004, revista n.º 19/04-7ª; de 06-07-2004, revista n.º 1674/04 -1ª; de 14-10-2008, revista n.º 2945/08 - 6ª; de 04-12-2008, revista n.º 3234/08 - 2ª; de 12-03-2009, revista n.º 277/09 - 1ª; de 3,5%, no acórdão de 29-11-2005, revista n.º 3299/05 - 1ª, e nos acórdãos de 05-06-2007, revista n.º 1280/07-1ª e de 07-02-2008, revista n.º 4598/07-1ª, pondera-se uma taxa entre 3% a 4 %.
Tem-se em vista uma taxa de 3% nos seguintes acórdãos: de 19-03-2002, revista n.º 4183/01 - 1.ª (é adequada a taxa de juro de 3% para efeitos de determinação da indemnização, ainda que o acidente tenha ocorrido em 1997); de 27-02-2003, revista n.º 80/03 - 2ª (mas assinalando a tendência decrescente); de 20-11-2003, revista n.º 3441/03 - 6ª; de 01-07-2004, revista n.º 296/04 - 7ª; de 09-12-2004, revista n.º 3743/04 - 6.ª; de 14-12-2004, revista n.º 4039/04 - 6ª; de 27-01-2005, revista n.º 4135/04; de 29-06-2005, revista n.º 1336/05 - 1ª; de 22-09-2005, revista n.º 2277/05 - 2ª , CJSTJ 2005, tomo 3, pág. 38; de 28-03-2006, revista n.º 447/06 - 6ª; de 18-05-2006, revista n.º 1144/06-; de 23-01-2007, revista n.º 3741/05 - 6ª; de 06-02-2007, revista n.º 4436/06 - 1ª; de 22-02-2007, revista n.º 100/07 - 7ª; de 22-11-2007, revista n.º 3620/07 - 1ª e n.º 3829/07-7ª; de 04-12-2007, revista n.º 3836/07 - 1ª; de 15-01-2008, revista n.º 4057/07 - 1ª; de 03-07-2008, revista n.º 1339/08 - 7ª; de 27-05-2009, revista n.º 3413/03.2TBVCT.S1-1ª; de 30-06-2009, revista n.º 11325/03.3TBVNG.S1-1ª; de 02-07-2009, revista n.º 179/04.2TBMRT.S1-7ª.
Aplicando uma taxa de 2%, que era a taxa de juro líquida dos depósitos a prazo de ano e dia, o acórdão de 01-03-2001, revista n.º 3851/00 - 6ª.
Pela consideração de uma taxa entre 2% e 3% pronunciou-se o acórdão de 31-03-2009, revista n.º 287/09 - 6ª.
E de 2,5%, o acórdão de 12-10-2006, revista n.º 2581/06 - 2ª.

Na aplicação deste critério há que atentar em que quanto mais baixa for a remuneração do capital, o que hoje é patente em face da continuada descida das taxas de juros, maior quantidade daquele será necessária para alcançar um montante que resista ao paulatino desgaste.
Essa dificuldade de rentabilização de uma indemnização, de modo a que a mesma se tenha por esgotada ao fim do período de tempo que for de considerar, é factor que joga desfavoravelmente para o devedor daquela, a ter em conta no recurso à equidade, como se acentuava já em 1997, no acórdão de 07-10-97, BMJ, n.º 470, pág. 574, sendo renovado o alerta, nos mesmos termos, no acórdão de 07-06-2001, revista n.º 1225/01-2ª, STJSAC2001, pág. 219.

Progressão profissional

Para além das consabidas dificuldades no ingresso no mercado de trabalho, mormente para os grandes traumatizados e para as pessoas com deficiências, na valoração do dano em equação deve ainda ter-se em conta os prejuízos que, com grande probabilidade, ocorrerão e que se prendem com impedimento de progressão ou com dificuldades na progressão na carreira profissional, ou conduzindo mesmo a reforma antecipada, com as inerentes quebras de rendimento no futuro, não deixando de se reconhecer em geral a extrema dificuldade em calendarizar a previsível progressão profissional e determinar a sua quantificação.
Fazendo-se eco da ponderação deste factor e da sua relevância na determinação da extensão do dano, não só quando há perda da capacidade aquisitiva e de ganho, mas também nos casos de demanda de maior esforço, vejam-se os acórdãos de 28-09-95, CJSTJ 1995, tomo 3, pág. 36 e BMJ, n.º 449, pág. 344; de 15-12-1998, revista n.º 827/98; de 15-12-1998, revista n.º 972/98, CJSTJ 1998, tomo 3, pág. 155; de 16-03-1999, CJSTJ 1999, tomo 1, pág. 167; de 06-07-2000, BMJ, n.º 499, pág. 309 e CJSTJ 2000, tomo 2, pág. 144; de 11-07-00, revista n.º 427/00-1ª, STJSAC2000, pág. 237; de 01-03-2001, revista n.º 3851/00-6ª; de 28-02-2002, revista n.º 4399/01-1ª; de 25-06-2002, CJSTJ 2002, tomo 2, pág. 128; de 19-09-2002, revista n.º 2298/02-2ª; de 27-02-2003, revista n.º 80/03-2ª; de 08-07-2003, revista n.º 1928/03-1ª; de 23-10-2003, revista n.º 3075/03-7ª, CJSTJ 2003, tomo 3, pág. 114; de 21-09-2004, revista n.º 2327/04-6ª; de 29-06-2005, revista n.º 1336/05-1ª (ponderando a subida de categoria profissional); de 12-09-2006, revista n.º 2145/06-1ª; de 05-12-2006, revista n.º 3728/06-6ª; de 30-10-2007, revista n.º 3340/07-6ª; de 28-02-2008, revista n.º 4391/07-1ª; de 25-09-2008, processo n.º 2860/08-3ª; de 14-05-2009, processo n.º 271/09.7YFLSB-3ª; de 30-06-2009, revista n.º 11325/03.3TBVNG.S1-1ª; de 07-07-2009, revista n.º 362/09.4YFLSB-1ª.
No acórdão de 04-12-1996, revista n.º 406/96, BMJ, n.º 462, pág. 396, presume-se que o lesado (agente da PSP) iria prosseguir a sua carreira com normalidade e iria atingir um posto mais elevado na hierarquia, senão fora o acidente; considera tratar-se de dano futuro previsível com segurança bastante, com grau mínimo de incerteza, a equiparar, por previsível, ao dano certo, e, pois, indemnizável.


Desconto/Dedução /Acerto por antecipação da totalidade do capital

Tratando-se de operação a efectuar após determinação do capital, a razão para operar este “desconto” está em que o lesado perceberá a indemnização por junto, que o capital a receber pode ser rentabilizado, produzindo juros, e que se impõe que, no termo do prazo considerado, o capital se encontre esgotado.
Trata-se de subtrair o benefício respeitante à recepção antecipada de capital, de efectuar uma dedução correspondente à entrega imediata e integral do capital, sob pena de se verificar um enriquecimento sem causa do lesado à custa alheia.
Como se refere nos acórdãos de 13-10-1992 e de 28-10-1992, BMJ, n.º 420, págs. 507 e 544, e de 02-11-1995, recurso n.º 46783, secção criminal, CJSTJ 1995, tomo 3, pág. 220, ao montante encontrado deve abater-se uma importância que traduza o benefício que representa o recebimento imediato e integral do capital, devendo proceder-se, para evitar um enriquecimento injusto, a uma redução equitativa pela entrega imediata.
O acórdão de 16-03-99, revista n.º 30/99-1ª, CJSTJ 1999, tomo 1, pág. 167, pondera que “o recebimento imediato da totalidade do capital indemnizatório poderá, se não for corrigido, propiciar um enriquecimento injustificado à custa do lesante”.
No mesmo sentido, o acórdão da mesma data, na revista n.º 22/99-2ª, in BMJ, n.º 485, pág. 386, afirmando que ao valor apurado é necessário retirar algo, para evitar enriquecimento indevido, por a lesada receber de uma vez o que lhe levaria uma vida inteira a ganhar.
Como se refere no acórdão de 19-10-2004, revista n.º 2897/04-6ª, na matéria dos danos futuros associados à IPP deve ponderar-se a circunstância de a indemnização ser paga de uma só vez, o que permitirá ao seu beneficiário rentabilizá-la em termos financeiros; logo, haverá que considerar esses proveitos, introduzindo um desconto no valor achado, sob pena de se verificar um enriquecimento sem causa do lesado à custa alheia.
De acordo com o acórdão de 20-11-2003, revista 3441/03-6ª, justifica-se nada descontar ao valor encontrado porquanto, não obstante a vantagem para o A. em receber de uma só vez o que auferiria ao longo da vida, não se levou em conta os normais e futuros aumentos dos salários.
E conforme o acórdão de 13-05-2004, revista n.º 1845/03-2ª, não se justifica qualquer dedução para obviar a um “enriquecimento sem causa” devido ao recebimento imediato e de uma só vez do capital global.
Afirmando a necessidade de efectuar o desconto, mas sem apontar em quanto, os acórdãos de 29-04-1999, revista n.º 218/99-2ª, de 06-05-1999, revista n.º 22/99-2ª e de 18-05-1999, revista n.º 156/99-2ª, in STJSAC1999, págs., 163, 186 e 191; de 02-05-2002, revista n.º 4186/01-2ª, STJSAC2002, pág. 172 (sendo baixa a taxa de juros, mais pequena é a contribuição dos juros para o rendimento mensal dos beneficiários e mais pequena deve ser a dedução no montante global da indemnização por lucros cessantes); de 01-07-2003, revista n.º 1739/03-6ª; de 19-10-2004, revista n.º 2897/04-6ª; de 24-01-2006, revista n.º 4038/05-6ª; de 09-11-2006, revista n.º 2849/06- 2ª; de 14-07-2009, revista n.º 310/1998.C1.S1-6ª; de 22-09-2009, revista n.º 156/05.6TBVPA.S1-6ª (no cálculo da indemnização há que ponderar o facto do lesado ir receber de uma só vez e imediatamente, todo o capital da indemnização, beneficiando também dos respectivos juros); de 08-10-2009, revista n.º 28/02.6TJPRT.S1-7ª.
Na quantificação do desconto em equação a jurisprudência tem oscilado na consideração de uma redução entre os 10% e os 33%.
Assim:
1/3 ou ¼ - acórdão de 06-07-2000, BMJ n.º 499, pág. 309 e CJSTJ 2000, tomo 2, pág. 144.
¼ - acórdãos de 25-05-1993, recurso n.º 83.505, CJSTJ 1993, tomo 2, pág. 130, em que se defendeu, citando Manuel de Oliveira Matos, Código da Estrada, 4ª ed., pág. 94, que feita a capitalização, preciso é ainda diminui-la de ¼, à semelhança de certa jurisprudência francesa, dado o lesado receber o capital de uma só vez; de 25-11-1999, revista n.º 827/99-7ª, in STJSAC1999, pág. 385, invocando igualmente a jurisprudência francesa; de 27-09-2001, revista n.º 1979/01 - 7ª; de 28-05-2002, revista n.º 1038/02 - 2ª; de 25-06-2002, CJSTJ 2002, tomo 2, pág.128; de 22-11-2007, revista n.º 3829/07 - 7ª; de 14-02-2008, revista 4508/07-2ª; de 23-09-2008, revista n.º 1857/08 - 2ª; de 29-10-2008, processo n.º 3373/08 - 3ª; de 04-12-2008, revista n.º 3728/08 - 2ª (sinistro em consequência de queda do elevador); de 22-01-2009, revista n.º 3360/08 - 7ª; de 11-02-2009, processo n.º 3980/08 - 3ª; de 18-06-2009, processo n.º 81/04.8PBBGC.S1-3ª.
1/5 - acórdãos de 15-03-2001, revista n.º 303/01-2ª; de 17-11-2005, revista n.º 3050/05-2ª e de 30-10-2008, revista n.º 3237/08-2ª.
30% - acórdãos de 06-02-2007, revista n.º 4436/06-1ª; de 07-07-2009, processo n.º 1145/05.6TAMAI.C1-3ª.
10% - acórdão de 27-05-2009, revista n.º 3413/03.2TBVCT.S1-1ª – (valor reputado mais adequado dada a actual rigidez das aplicações de capital em valores muito baixos).
No acórdão de 17-11-1992, BMJ n.º 421, pág. 414, o capital encontrado de 13.500.000$00 é reduzido a 7.500.000$00.
No sentido de dever operar-se este acerto resultante da entrega do capital de uma só vez, o acórdão de 24-09-2009, revista n.º 37/09-7ª.

O desconto em causa, estando presente situação em que o lesado é uma criança ou menor numa faixa etária mais baixa, tem de ter em consideração especificidade própria destes casos.
Justificando-se esta dedução nos casos mais comuns, em que o lesado já trabalhava e em que há uma perda efectiva de ganho, a antecipação operada em benefício de menores será de mais longo alcance, tanto maior quanto mais baixa for a idade do ofendido.
Justificando-se o acerto relativamente a lesados, para quem o dano corporal, a afectação da sua força de trabalho, da capacidade de produção de rendimentos, significa uma perda ou diminuição concreta, efectiva, imediata e actual de réditos e se efectivamente há uma antecipação de capital que urge corrigir, nos casos em que os lesados são crianças ou menores, em que a IPG/IPP não é causal de perda imediata, actual, de rendimentos, em que o dano tem repercussão diferida, verificando-se o não percebimento de salário apenas a partir do momento em que aos 18, 19, 20, 21, 22 ou mais anos entrassem no mercado de trabalho, a antecipação do capital tem um sentido mais amplo, sendo então percebido o valor da indemnização total, antes ainda de se verificar o termo inicial do que seria o período normal de vida activa, o que conduzirá a que a dedução tenha maior amplitude (por exemplo, o menor de 10 anos de idade recebe logo o correspondente (majorado), por referência ao que passaria a auferir, mês a mês, anualmente, ano após ano, com a força do seu trabalho, a partir, por exemplo, dos seus 20 anos).
É que a incapacidade só relevará, para estes efeitos, a partir da entrada do lesado na vida activa, ocorrendo uma antecipação em duplo sentido.
Acresce por outra via, que existe um período temporal em que não haveria ganho, mas diversamente despesas feitas pelos pais do lesado, pois estaria a viver na dependência dos mesmos.
O lesado vai desfrutar assim de uma quantia global de que apenas começaria a alcançar uma ínfima parte a partir dos 20 anos; irá perceber, de uma única vez, sendo ainda menor, quando ainda não tem direito a um salário, a título de perda de capacidade de angariação de rendimentos, aquilo que em princípio receberia em mensalidades, uma a uma, ao vencer-se cada mês, ao longo de toda a sua vida activa, cujo início se aponta para 2015; no caso receberá, sendo ainda menor, sem profissão, sem capacidade aquisitiva actuante, de uma só vez, o equivalente a 45 prestações anuais, ou 630 mensais, se considerarmos apenas o limite de reforma aos 65 anos.
Por estas razões justificar-se-á, nestes casos, a consideração de uma maior margem de compressão ao efectuar-se o desconto/acerto em causa.


Desconto da importância que o lesado gastaria com ele próprio não havendo acidente (dispêndio consigo próprio)

Estando em causa danos futuros de frustração de ganhos associados a IPP, em alguns acórdãos tem-se em conta dedução no cômputo da indemnização da importância que o próprio lesado gastará consigo mesmo durante a sua vida, o dispêndio relativo a necessidades próprias, as despesas que o lesado necessariamente teria com ele próprio mesmo que o acidente se não produzisse, apontando-se, em alguns deles, em média, para 1/3 dos proventos auferidos – neste sentido, acórdãos de 01-07-2003, revista n.º 1739/03-6ª; de 19-10-2004, revista n.º 2897/04-6ª; de 03-02-2005, revista n.º4478/04-7ª; de 11-10-2005, revista n.º 2587/05-7ª; de 03-11-2005, revista n.º 2503/05-7ª; de 07-12-2005, revista n.º 3297/05-7ª e n.º 3437/05-7ª; de 12-01-2006, revista n.º 4269/04-7ª; de 04-12-2007, revista n.º 3836/07-1ª; de 07-02-2008, revista n.º 4521/07-6ª, CJSTJ 2008, tomo 1, pág. 91; de 29-10-2008, processo n.º 3379/08-3ª; de 07-07-2009, revista n.º 362/09.4YFLSB -1ª.
Com a restrição de que esta consideração somente vale no caso de morte, o acórdão de 17-06-2008, revista n.º 1266/08 - 6ª. Já o acórdão de 25-11-1999, revista n.º 827/99-7ª, clarificara que aqui, diversamente do que ocorre para o caso de morte, era de por de lado o desconto de 1/3 que a vítima gastaria com ela.
Será efectivamente de operar o desconto em causa no caso de morte, porque é dispêndio que obviamente não se efectivará, ao passo que o sobrevivente, com lesão gravemente incapacitante, grande traumatizado, continua a alimentar-se e eventualmente a ter outro tipo de necessidades e de dispêndio, por carecer, por exemplo, de dieta especial, não nos parecendo ser de fazer a dedução.


Soluções jurisprudenciais

Para além dos já citados no texto, como o de 5 de Julho de 1968, segue-se indicação de acórdãos em que foi fixada indemnização por danos futuros a favor de crianças e menores, incluindo-se em alguns deles referência a parcela correspondente a compensação por dano não patrimonial.

13-01-1970, BMJ n.º 193, pág. 349

Lesado menor em acidente de viação em Manica em 13-12-1963 (no domínio do Código de Seabra e do artigo 56º, n.º 2, do CE), de que resultou a perda do antebraço esquerdo, com uma desvalorização profissional de 60% - consideradas razoáveis as quantias de 50.000$00 e de 100.000$00 atribuídas pela Relação de Lourenço Marques, a título de indemnização por danos morais e materiais, respectivamente.
Comentado por Vaz Serra na RLJ, ano 104, págs. 12 a 16.

09-06-1970, BMJ n.º 198, pág. 112

Lesado com 11 anos de idade, definitiva e relativamente impossibilitado, sem possibilidade de readquirir a sua capacidade intelectiva, com perturbações mentais caracterizadas por falta de memória e dificuldade de raciocínio, privação de sensibilidade nos dedos das mãos e sujeição a dores na região cervical – considerado que a indemnização - de 200.000$00 - a pecar não é por excesso, só não sendo de pensar em elevar o quantitativo porque o autor não recorreu.
06-07-1971, BMJ, n.º 209, pág. 102

Lesado com 14 anos de idade à data do acidente (29-08-1967), que se preparava para ingressar num emprego em que auferiria 600$00 mensais, que ficou com paralisia dos membros inferiores, incontinência esfincteriana, paralisia do membro superior direito, diminuído na sua capacidade para o trabalho, definitivamente incapaz para angariar o indispensável à sua própria subsistência – teve-se por ajustada indemnização de 230 000$00 por danos materiais e não patrimoniais.

10-05-1977, BMJ n.º 267, pág. 144


Lesado com 11 anos de idade, com amputação do membro inferior esquerdo, prevendo-se o ingresso no mercado de trabalho aos 14 anos, apelando ao salário mínimo e ponderando a vida activa até aos 70 anos - atribuída pela redução da capacidade laboral a quantia de 220 contos, e por danos não patrimoniais, face a várias intervenções cirúrgicas e múltiplos tratamentos, a de 200 contos.

22-11-1977, BMJ n.º 271, pág. 212

Lesada com 9 anos de idade, frequentando a 3.ª classe de instrução primária, que em consequência do acidente, ficou logo com o pé esquerdo esfacelado e separado do resto do corpo, vindo a sofrer, por amputação, ausência do pé e perna esquerdos, pelo terço médio. Pela desvalorização física, que constitui um dano não patrimonial e dano patrimonial e pelo dano estético, foi atribuída por aquele a indemnização de 200 000$00 e pelo dano patrimonial 400 000$00, atendendo quanto a este ao grave defeito físico sofrido pela lesada, que integra autonomamente um prejuízo, às despesas que no decurso da sua vida teria de suportar com a substituição do aparelho de prótese e por afectação da capacidade aquisitiva determinada pela desvalorização física.

08-03-1979, BMJ n.º 285, pág. 290


Lesada com 16 anos de idade, “activa operária com salário de 100$00 por dia”, com incapacidade para o trabalho durante 200 dias e incapacidade permanente para o trabalho de 15% - fixada a indemnização por danos futuros em 80 contos e por danos não patrimoniais, incluindo dano estético, em 30 contos.


08-06-1993, recurso n.º 83236, CJSTJ 1993, tomo 2, pág. 138

Versa caso em que é lesada uma criança de 10 anos de idade, à data do acidente, que frequentava, quando da sentença de 1.ª instância, o 9.º ano de escolaridade e que ficou a padecer de uma incapacidade parcial permanente de 22,5%, reputando-se adequada, para a frustração parcial dos lucros cessantes correspondentes à perda de ganho, a quantia de 2.500.000$00. Considerou-se ainda: “Embora possa aspirar a uma remuneração profissional sensivelmente superior ao salário mínimo nacional, ela ainda não existe, desconhece-se o período de vida activa, como se desconhece a actividade profissional que virá a exercer”.


02-11-1995, recurso criminal n.º 46783, CJSTJ 1995, tomo 3, pág. 220 e BMJ n.º 451, pág. 39

Menor de 7 anos de idade atingido a tiro por outro de 16, ficando com perda definitiva e completa da visão do olho esquerdo e com projéctil de chumbo no interior da caixa craniana - pela perda da capacidade, futura e incerta, de ganho do menor, foi confirmada a quantia de 4.000.000$00, fixada com recurso a critérios de equidade, apenas rectificando o enquadramento da indemnização de lucros cessantes para danos futuros, devendo proceder-se à sua fixação com recurso unicamente a critérios de equidade, porque a sua determinação não respeita a um julgamento de matéria de facto, antes corresponde a uma determinação jurídica do valor dos danos, a um julgamento de direito, elaborado a partir de conceitos de justiça e de equidade.

25-11-1998, Revista n.º 865/98, BMJ n.º 481, pág. 470


Caso de prejuízos irreversíveis sofridos por bébé de 7 meses de idade, em infantário, na sequência de incêndio, resultantes de aleijões nas mãos e da desfiguração da face, implicando privação de uma parte importante da futura capacidade de ganho. Considerados tais prejuízos como susceptíveis de indemnização, não valendo contra argumentar que face à tenra idade do lesado, dar como assente o lucro cessante ou o respectivo montante constitui um exercício de futurologia. “O previsível é o normal e dentro dessa normalidade não cabe nem o génio nem o tolo”. Como indemnização por danos patrimoniais futuros, um futuro lucro cessante previsível, confirmados os 15.000.000$00 atribuídos em 1ª instância (que a Relação não considerara atendível) como correspondendo grosso modo à capitalização de uma renda anual, para 50 anos, correspondente ao salário mínimo nacional.
(A compensação do dano não patrimonial sofrido pelo bébé é fixada em 20.000.000$00.
O acórdão, neste aspecto apresentando-se como vanguardista, fixa ainda em 1.000.000$00, para cada um, a compensação pelos danos não patrimoniais sofridos pelos progenitores).

22-04-1999, Revista n.º 194/99 – 2.ª Secção, STJSAC, Edição anual 1999, p. 150

Lesado com 7 anos de idade - considera-se que a não exercitação anterior da capacidade de ganho não significa que não haja um prejuízo previsível ou provável de tal exercício, não fosse a lesão sofrida, constituindo portanto, uma lesão de natureza patrimonial e, como tal, reparável. Com recurso à equidade é fixado o montante de 3.000.000$00 para reparação da perda da capacidade aquisitiva.

25-05-1999, Revista n.º 335/99 – 1.ª Secção, STJSAC, Edição anual 1999, pág. 182

Lesado com 17 anos de idade, matriculado no 9.º ano do 3.º Ciclo do Ensino Básico, com sequelas que determinaram uma IPP de 22,5%, que o impede de exercer as funções de servente em que trabalhava em férias escolares e sábados, considerando o salário mínimo nacional, tem por ajustado o montante de 6.800.000$00 como indemnização pela perda da capacidade de ganho.

27-05-1999, Revista n.º 339/99 – 2.ª Secção, STJSAC, Edição anual 1999, pág. 197

Lesado com 20 anos de idade, sofrendo de um grau de IPP de 40% - considerando que o recurso à equidade mostra-se mais imperioso quando o lesado à data do acidente é estudante universitário, não exercendo qualquer profissão, atribui o montante de 9.000.000$00 como indemnização por danos futuros emergentes daquela incapacidade.
27-05-1999, Revista n.º 339/99 – 2.ª Secção, STJSAC, Edição anual 1999, pág. 197

Lesado com 17 anos de idade, estudante do 10.º ano, que em resultado do acidente ficou com uma IPP de 20%, claudicando ligeiramente da perna esquerda e que gostaria de ingressar em carreiras como o Exército, a Marinha, a Força Aérea ou as Forças de Segurança, o que lhe passou a ser vedado – considerada ajustada a indemnização pela reparação dos danos futuros em 5.000.000$00.

24-02-2000, Revista n.º 2/00-7ª Secção-STJSAC, Edição anual 2000, pág. 94

Lesado com 17 anos de idade, aprendiz de carpinteiro, no que auferia 50.000$00, padecendo de IPP de 65%, totalmente incapacitado para aquela profissão e dificilmente conseguindo novo emprego – confirmada a indemnização por danos patrimoniais futuros em 14.000.000$00.

05-07-2001, Revista n.º 1523/01-7.ª Secção-STJSAC, Edição anual 2001, pág. 245

Lesada com 21 anos de idade, frequentando o 1º ano do Curso de Estudos Portugueses da Faculdade de Letras, que ficou com IPP de 40%, tendo por ponto assente que não é o facto de o lesado não exercer, ao tempo, qualquer profissão, e de não se poder saber com certeza qual a que irá, afinal, exercer no futuro que prejudica a atribuição de indemnização pela diminuição da capacidade de ganho, necessariamente resultante de IPP de que fique afectado e projectando um vencimento médio mensal de 200.000$00, tem por equitativa, quando não mesmo moderada, a solução de atribuir 12.000.000$00 como parcela indemnizatória correspondente à perda da capacidade de ganho.

06-11-2001, Revista n.º 2592/01-1.ª Secção-STJSAC, Edição anual 2001, pág. 328

Lesada com 17 anos de idade à data do acidente ocorrido em 1993, que entretanto se licenciou em Direito, resultando daquele uma IPP de 10%, projectando-se que teria uma remuneração mensal de 150.000$00, 14 vezes por ano - fixada a indemnização pela IPP em 7.500.000$00.

12-12-2002, Revista n.º 3627/02 – 6.ª Secção, STJSAC, Edição anual 2002, pág. 373

Lesado com 20 anos de idade, estudante, a frequentar o curso de Direito, na altura do acidente em consequência do qual ficou a padecer de uma incapacidade geral para o trabalho (IGT) de 27, 325%, projectando uma remuneração inicial mensal de 250.000$00 - considerado equitativo fixar em 20.048.200$00 (100,000,00 €) a indemnização pela perda de rendimentos futuros.

27-02-2003, Revista n.º 80/03 - 2.ª Secção

Lesado com 5 anos de idade, com traumatismo craniano-encefálico, cirurgia ao pé direito, internamento de 2 meses, sequelas nos dedos do pé direito, com IPP de 15%, ficando com marcha claudicante - considerando que só entrará no mercado de trabalho em 2009, quando perfizer 18 anos, que as sequelas não deixarão de repercutir-se negativamente na inserção no mercado de trabalho e na obtenção de ocupações mais bem remuneradas e tendo por base um rendimento previsível mínimo de 100.000$00, como salário mensal x 14, é fixada a indemnização a título de danos patrimoniais futuros em € 6.500.000$00.

30-04-2003, Revista n.º 4489/02 - 7.ª Secção

Lesada com 9 anos de idade, que ficou a padecer de uma IPP de 65%, com afectação de quase todas as suas capacidades mentais, que era uma das melhores alunas da sua classe e que após o acidente apresenta grandes dificuldades em aprender, reter e memorizar e que vai necessitar de uma terceira pessoa que cuide de si até ao fim da sua vida – fixada, pelas regras de um prudente arbítrio, a cifra de 225.000,00 euros


03-06-2003, Revista n.º 1270/03 - 1ª Secção


Lesado com 17 anos, com IPP geral de 85% e profissional de 95% - apenas completou os primeiros 4 anos de escolaridade obrigatória, ajudando os pais desde os 13 anos nos trabalhos das feiras, recebendo gratificações de 50.000$00 mensais. Não provado o exercício de qualquer profissão. Ponderando-se uma remuneração de 100 contos como “salário médio acessível”, é fixada a indemnização pelos danos patrimoniais futuros em € 120.000,00.

17-06-2003, Revista n.º 1564/03 - 6.ª Secção


Lesado com 10 anos de idade, que em consequência do acidente ficou a padecer de uma IPP de 90%, vive na cama e numa cadeira de rodas, ficou com dificuldades de entendimento, fala por monossílabos, só consegue escrever o seu nome e meia dúzia de palavras - é fixada a indemnização pelo dano patrimonial da perda da capacidade laboral em 40.000.000$00 (€ 199.519.15).

23-09-2003, Revista n.º 2259/03 - 2.ª Secção

Lesado com 16 anos que fica a padecer de IPP de 50,8% - frisando que há que lidar com perda da “capacidade de ganho” proporcional ao montante dos vencimentos previsivelmente a auferir no futuro e não com o de uma actual e efectiva “perda de ganhos”, havendo que recorrer a um critério de normalidade ou probabilidade, em atenção ao que provavelmente acontecerá se as coisas seguirem o seu curso normal, tendo em atenção o elevado grau de IPP versus a juventude do lesado e recorrendo à equidade, fixa a indemnização a título de danos patrimoniais futuros em 20.000.000$00.

27-05-2004, Revista n.º 1694/04 - 2.ª Secção

Tendo o menor, na altura do acidente (explosão de bomba de Carnaval nas mãos), a idade de 16 anos, sofrendo de uma IPP de 30% e ganhando 80.000$00, por mês, é adequada a indemnização por danos patrimoniais futuros de 12.768.000$00.
Não é excessiva a indemnização fixada a título de danos não patrimoniais, em 2.500.000$00, tendo, em consequência do acidente, o lesado sofrido um esfacelo grave da mão direita.


23-09-2004, Revista n.º 2209/04 - 2.ª Secção

Tendo em conta a idade do lesado à data do acidente (16 anos), o limite da vida activa que se aceita, na profissão de serralheiro (da qual era aprendiz), de 70 anos, um salário nunca inferior a 100.000$00 mensais e considerando que ficou com uma IPP de 7,5%, considera-se adequada a fixação da indemnização pelo dano patrimonial futuro resultante dessa incapacidade, em 3.000.000$00 (14.963,94 €).

09-12-2004, Revista n.º 3743/04 - 6.ª Secção

Lesado com 17 anos de idade à data do acidente, exercendo a profissão de isolador, auferindo salário de montante não apurado, tendo ficado com uma incapacidade absoluta para o trabalho que executava e a que pode aspirar, em função das escassas habilitações académicas (apenas frequentou a escola até ao 5.º ano de escolaridade), e ponderando o valor do salário mínimo, os cerca de 50 anos prováveis de vida e a taxa de juro de 3% - adequado fixar o valor da indemnização pelos danos patrimoniais futuros decorrentes da perda da capacidade de ganho em 125.000 Euros.

14-12-2004, Revista n.º 3810/04 - 1.ª Secção

Face a lesado com 10 anos de idade à data do acidente, pondera-se: “Não se está perante uma concreta profissão, nem perante uma concreta e efectiva perda de ganho no seu exercício, mas perante uma IPP geral, a confrontar com um salário médio previsível para qualquer profissão acessível ao Autor perante a qual a sua capacidade de ganho, por via das deficiências funcionais que o afectam, está diminuída de 60%, tendo-se por justa e adequada, porque equitativa, a valoração deste dano em 100.000 Euros (…)”.

14-12-2004, Revista n.º 2672/04 - 1.ª Secção

Sinistrado com 20 anos de idade, auferindo por ano 1.660.000$00 como fiel de armazém e ajudante de motorista e 928.000$00 como pedreiro, tendo ficado na situação de tetraplégico incontinente, que manterá sempre, com uma incapacidade geral permanente parcial de 95% - fixada a indemnização por danos futuros provenientes da incapacidade física em 50.000.000$00.
13-01-2005, Revista n.º 4069/04 - 2.ª Secção

É adequada a indemnização de € 109.740,00 para ressarcir os danos patrimoniais futuros do lesado em acidente de viação que, tendo 17 anos de idade, auferia, como trolha, um vencimento anual de € 6.600,00 e que, em consequência das lesões sofridas, ficou com uma incapacidade total para todo o tipo de trabalho (tetraplégico) desde a data do acidente.

03-02-2005, Revista n.º 4377/04 - 2ª Secção

Lesado com 16 anos de idade, auferindo remuneração mensal de 54.600$00 e que passou a sofrer de uma IPP de 9, 75% - atribuída a indemnização de 12.469,95 €, a título de perda da capacidade de ganho.

15-02-2005, Revista n.º 4509/04 - 1ª Secção

Lesado com 22 anos de idade, estudante, com IPP de 22%, fixada a indemnização a título de danos patrimoniais futuros em 42.397,82 € (8.500.000$00)

08-03-2005, Revista n.º 395/05 - 1ª Secção

Lesada com 18 anos de idade, estudante de curso superior, tendo sofrido lesões que determinaram incapacidade total para qualquer tipo de actividade, ocupação ou trabalho e que requerem necessariamente um acompanhamento permanente e continuado por toda a vida (o quadro traçado é de irreversibilidade) - fixada indemnização em 550.000,00 € (450.000 € pelos danos patrimoniais e 100.000 € pelos não patrimoniais).

07-04-2005, Revista n.º 280/05 - 6.ª Secção

Vítima de atropelamento, com 12 anos de idade, à data da prolação da sentença em 1ª instância, com uma IPP de 7,5% não impeditiva de concorrer no mercado de trabalho; atribuída compensação apenas pelo esforço complementar para conseguir obter rendimentos de trabalho, no montante de 20.000,00 €.

07-04-2005, Revista n.º 305/05 - 6.ª Secção

Lesada com 24 anos de idade, estudante à data do acidente, frequentando o 4.º ano da Licenciatura em Relações Internacionais, tendo perdido o ano lectivo de 1997/8, por virtude das lesão e internamentos subsequentes, afectada de uma IPG de 40%, que implica dificuldade no exercício da sua actividade profissional habitual - adequada a fixação de uma indemnização de 30.000 contos, a título de danos materiais futuros.

07-06-2005, Revista n.º 1713/05 – 6.ª Secção

Lesado que tinha 16 anos de idade à data do acidente e que era um bom estudante, prestes a finalizar o ensino secundário, tendo ficado com uma IPP de 45%, por causa do acidente, para o qual em nada contribuiu - fixado o montante da indemnização para ressarcimento dos seus danos patrimoniais futuros em 20.000.000$00.

22-09-2005, Revista n.º 2277/05-2ª Secção - CJSTJ 2005, tomo 3, pág. 38

Para indemnizar jovem de 18 anos de idade que havia iniciado a sua actividade profissional de brunideira, que ficou paraplégica, com uma IPP de 80%, pelo dano da perda de rendimentos futuros, adequado o montante de 180.000,00 €.

11-10-2005, Revista n.º 2342/05 - 1.ª Secção

Provando-se que o Autor, à data do acidente tinha 18 anos de idade, frequentava o 12.º ano de escolaridade e ficou a padecer de uma IPP de 32,5%, é adequado fixar a indemnização devida a título de danos patrimoniais futuros em 44.891,81 Euros (9.000.000$00).

20-10-2005 Revista n.º 2382/05 - 7.ª Secção

Lesado com 10 anos de idade que em consequência das lesões sofridas num atropelamento ficou a padecer de uma IPP de 7% - fixado o valor de 12.000 € por danos patrimoniais futuros.

17-11-2005, Revista n.º 3050/05 - 2.ª Secção

Lesado com 11 anos de idade que sofre acidente por ter saltado para o comboio em andamento.
“Pressupondo que, em condições normais e quando ingressasse no mundo do trabalho por volta dos 21 anos o autor auferisse normalmente a quantia aproximada de 750 € por mês (e sem levar em conta sequer qualquer actualização salarial ao longo de toda a sua vida), teríamos um rendimento anual de 9000 euros/ano; ainda aqui tomamos como ponto de partida um ano de 12 meses e não de 14 meses como normalmente sucede.
Com uma expectativa de vida de mais 50 anos (ou seja, até aos 71 anos) o rendimento global do autor cifrar-se-ia em 450.000 €; o autor ficou com uma incapacidade parcial permanente de 60%; o que significa que tal incapacidade reflectir-se-á obviamente no montante dos danos futuros, ainda por cima numa época e numa civilização onde tudo se quantifica económica e monetariamente.
Assim, o cômputo indemnizatório correspondente à desvalorização por incapacidade ascende a 270.000 € (450.000 € menos 180.000 € relativos aos 40% de capacidade); se àquele montante se subtrair o benefício respeitante à recepção antecipada de capital (computado em 20%) teremos a indemnização final aproximada de 216.000 € (270.000 - 54.000)”.

17-01-2006, Revista n.º 3170/05 - 1.ª Secção

Lesada na altura do acidente tinha 17 anos de idade e era estudante; em consequência das lesões sofridas ficou a padecer de uma IPP de 15%; frequentava então o 11.º ano com aproveitamento escolar, perdeu o ano como resultado da incapacidade decorrente do acidente; à data da decisão exercia a profissão de operadora ajudante auferindo um valor equivalente ao salário mínimo nacional, afigura-se justa a verba de 27.400 €, para indemnizar os prejuízos que lhe advirão da perda de rendimento que a irá afectar devido às graves lesões sofridas.

07-02-2006, Revista n.º 4179/05 - 1.ª Secção

Lesado com 17 anos de idade, nascido no dia 23-06-1980, vítima de acidente de viação ocorrido em 31-10-1997, data em que trabalhava como operário da construção civil, auferindo a quantia mensal de 115.000$00, e que em consequência do acidente ficou a padecer de uma IPG e profissional de 15% - adequada e equitativa a indemnização de € 27.433 pelos respectivos danos futuros.

28-03-2006, Revista n.º 447/06 - 6ª Secção


Lesada estudante, frequentando o 2.º ano de curso superior, entretanto concluído, afectada com IPP de 20%, fazendo as contas a 750 euros por mês, fixado o valor de € 70.000,00 € para compensar os danos patrimoniais futuros (por danos não patrimoniais a compensação de € 35.000).

01-06-2006, Revista n.º 1266/06 - 7.ª Secção

Lesado que à data do acidente auferia 80.000$00 por mês, equivalente a um rendimento anual de 1.120.000$00; tinha 19 anos de idade, à data da alta médica (embora tivesse 17 anos de idade à data do acidente, o período de tempo entre o acidente e a alta foi considerado com a atribuição dos salários perdidos), prevendo-se ainda uma vida activa de 46 anos, considerando como limite de vida activa os 65 anos; ficou com uma IPP para o trabalho de 35% - entendido, como adequado e equitativo, fixar, como perda da capacidade de ganho, resultante daquela IPP, o montante de € 70.000,00.

12-09-2006, Revista n.º 2369/06 - 1.ª Secção

Perante uma diminuição ligeira de mobilidade do tornozelo direito da Autora, geradora de uma IPP de 5%, e sabido que as lesões do tornozelo provocam uma não eficiente locomoção, e considerando que, à data do acidente, ocorrido em 05-06-2000, a Autora era uma criança com 6 anos de idade, tendo actualmente 12 anos, com previsíveis longos anos de vida activa, afigura-se adequada a quantia de 13.500 € como indemnização pelo dano patrimonial decorrente dessa incapacidade.

21-09-2006, Revista n.º 2016/06 - 2ª Secção

Lesado com 15 anos, que ficou, em consequência do acidente, seriamente afectado, física e psiquicamente, de que sobressai o ter-lhe sido amputada a perna direita, sem qualquer formação profissional e na ausência de informação sobre a orientação que ele tomaria nesse âmbitoatribuída indemnização por danos futuros por perda da capacidade de ganho decorrente de 70% de incapacidade permanente parcial, assentando o cálculo no facto de auferir pelo menos o equivalente ao salário mínimo nacional x 14 meses –– fixada a indemnização em € 133.000, correspondente a 70% de € 190.000, capital necessário para produzir durante a vida activa do lesado o rendimento correspondente à sua perda de ganho e que se mostre extinto no fim desse limite temporal.

02-11-2006, Revista n.º 3326/06 - 2.ª Secção

Lesada que, à data do acidente de viação tinha 15 anos de idade e ficou com uma IPP de 20%, que se traduz em sérios problemas funcionais numa coxa, sendo que antes era uma pessoa normal, afectando de forma séria a capacidade de ganho - adequado o montante indemnizatório de 75.000,00 €.

02-11-2006, Revista n.º 3559/06 - 7.ª Secção

Lesada com 9 anos de idade quando foi vítima do sinistro ocorrido em 16-01-2001; em consequência do embate, sofreu esfacelo grave da perna e pé direito com destruição musculo-esquelética marcada, lesões essas que lhe determinaram a amputação da perna direita pelo 1/3 proximal.
A privação do membro inferior direito determina-lhe uma IPP de 55%; foi submetida a cirurgias de remodelação e regularização do coto destinadas a futura utilização de prótese; desde Novembro de 2001 a Fevereiro de 2002 foi submetida a programa de reabilitação com treino protético.
Posteriormente, foi-lhe aplicada a prótese, que tem vindo a ser corrigida regularmente face ao crescimento da autora, o que determina a sua submissão a programa clínico de reabilitação.
Considerou-se que a menor trabalharia até aos 70 anos, cerca de 50 a 55 anos; teve-se em atenção o salário mínimo nacional; sempre seria previsível que a menor, pela vida fora conseguisse, com toda a probabilidade, um vencimento superior ao salário mínimo nacional.
Fixados os montantes de 110.000,00 € e 60.000,00 €, respectivamente, a título de danos patrimoniais e danos não patrimoniais, acrescendo ainda a quantia relativa ao custo de substituição das próteses, necessárias em virtude do desenvolvimento físico da autora, a liquidar em execução de sentença.

09-11-2006, Revista n.º 3798/06 - 7.ª Secção

Lesado com 19 anos de idade, estudante do 2.º ano do curso de engenharia, afectado de IPP de 25%, traduzida na diminuição funcional de uma perna, de dificuldades na marcha e na corrida e no exercício da futura profissão de engenheiro civil; considera-se que quando a afectação da pessoa do ponto de vista funcional antecede a profissionalização do lesado, deve relevar para o efeito o designado dano biológico, porque determinante de consequências negativas a nível da actividade geral do lesado, que deve ser perspectivada face ao circunstancialismo de facto envolvente e segundo juízos de equidade - fixa no montante de 55.000,00 € a indemnização por danos futuros.

23-01-2007, Revista n.º 3741/05-6ª Secção - CJSTJ 2007, tomo 1, pág. 30

Caso de criança, então com 13 anos, que em 28-01-1983, foi atingido com uma pedra enviada por outro aluno, de 16 anos, à saída da escola, sofrendo traumatismo craniano com esmagamento da placa óssea, com corte da artéria, perda da fala e hematoma subdural, lesões que obrigaram a duas intervenções cirúrgicas onde lhe foi extraído osso craniano e implantada uma prótese artificial na estrutura óssea, com incapacidade permanente de 50%. Tendo arranjado o primeiro emprego aos 24 anos, considera-se adequada a pedida quantia de 17.500,00 para ressarcir os danos resultantes da IPP de que ficou a padecer.


31-01-2007, Revista n.º 4301/06 - 6.ª Secção

Lesado com 9 anos de idade, ficando a padecer de uma IPP de 50%, agravada de 25%. Entende-se relevar para o efeito de indemnização de danos futuros a consideração da idade provável de cessação da vida activa de 70 anos e o valor de uma vez e meia do salário mínimo nacional relativamente ao lesado (nascido em 05-02-1990), que ainda não entrou no mercado de trabalho e que, aquando do acidente de viação de que foi vítima (em 14-06-1999), frequentava o 3.º ano da escolaridade. (Da leitura do acórdão retira-se que houve condenação em € 150.092,00, mas abrangendo igualmente, pelo que se colhe do texto, compensação por danos não patrimoniais).

01-03-2007, Revista n.º 4025/06 - 7.ª Secção

O autor S - com 15 anos - sofreu edema cerebral, hemorragias, sofreu dores e ficou com sequelas na coluna vertebral, perturbação na memória, redução da capacidade de atenção, cefaleias, o que traduz uma incapacidade permanente para o trabalho de 19%; à data do acidente era saudável, alegre e bom aluno.
“Considerando que, por tal incapacidade laboral, foi determinado o montante de 32.340,00 € como o adequado à reposição da perda da capacidade de ganho e a quantia de 20.000,00 € pelos danos não patrimoniais, onde foram levadas em conta as sequelas reveladoras de menor capacidade de ganho, entende-se adequado e equitativo, no respeito do estabelecido no art. 566.º, n.º 3, do CC, este montante global”.

15-03-2007, Revista n.º 4770/06 - 7.ª Secção

Lesado com 14 anos de idade, que sofreu ferimentos que lhe afectaram a perna esquerda, resultando sequelas acarretando uma limitação e privação que se prolongarão para toda a vida; pelo dano patrimonial futuro, por redução da capacidade funcional, resultante de incapacidade permanente de 10%, fixado o montante de 45.000,00 €, e por danos não patrimoniais, o de 15.000,00 €.

29-03-2007, Revista n.º 110/07 - 7ª Secção

Lesado com 17 anos de idade, estudante, frequentando o 12.º ano, na opção de Desporto, resultando do acidente lesões (perda de força no braço direito) que acarretam uma IPP de 50% - com projecção da possibilidade de exercício no futuro de uma actividade através da qual poderia auferir o rendimento mensal de 1.250,00 €, é atribuída a quantia de 150.000,00 €, destinada ao ressarcimento do dano (funcional) patrimonial futuro resultante de tal incapacidade.

05-07-2007, Revista n.º 1191/07 - 2.ª Secção

Considera pecar por defeito a indemnização fixada em 300.000,00 € destinada ao ressarcimento da perda de capacidade de ganho da vítima de acidente de viação então com 17 anos de idade, estudante, que ficou definitivamente incapacitado, quer física quer intelectualmente, para gerir a sua pessoa.

20-09-2007, Revista n.º 4172/06 - 2.ª Secção

Lesada com 15 anos de idade, estudante, padecendo de uma IPP de 5%, a qual dificultar-lhe-á a obtenção de emprego, qualquer que seja a ocupação - fixada a quantia de 30.000,00 € destinada a ressarcir os danos futuros.

02-10-2007, Revista n.º 2657/07 - 1.ª Secção - CJ STJ, 2007, tomo 3, pág. 68

Lesado com dois anos de idade à data do acidente, que vai ficar, para o resto da vida com dificuldade em eructar acompanhada de disfunção gástrica e abdominal.
Considera-se que não há qualquer profissão a considerar nem é determinável, face aos elementos disponíveis, a repercutibilidade das lesões no exercício das tarefas laborais e de utilização do corpo em geral.
“Por isso, à míngua de melhores elementos, haverá que considerar para uma qualquer profissão acessível ao autor, nenhuma sendo de excluir, que as deficiências funcionais de que ficou a padecer tornam a sua capacidade de ganho diminuída de 25%.
Trata-se de um dado da experiência que, com a evolução do ensino obrigatório e da formação escolar, profissional e académica, um jovem, quando adulto, tende a obter uma remuneração capaz de assegurar um mínimo de dignidade, remuneração essa que deve situar-se, agora, nos 600 euros, abertas que estão ainda, porque de uma criança se trata, todas as portas da vida.
Julga adequado o critério utilizado pelo julgador de 1.ª instância ao considerar que o menor poderia ingressar no mercado de trabalho aos 21 anos e auferir um rendimento de € 600,00 mensais, devendo a perda de capacidade decorrente da IPP de 25% ser compensada com € 55.000,00”.

04-10-2007, Revista n.º 3454/06-2ª Secção

Sinistrado, atropelado, com 13 anos de idade, que ficou a padecer de enorme limitação do membro superior esquerdo e de uma IPP de 22% - é atribuída a quantia de 75.000,00 €, a título de indemnização por danos patrimoniais.

18-10-2007, Revista n.º 2734/07 - 1.ª Secção

Lesado com 17 anos de idade (nascido em 06-03-1980), em consequência do acidente, ocorrido no dia 26-12-1997, sofrendo traumatismo crânio-encefálico, do tórax e da coluna cervical e fractura do ângulo direito da mandíbula, ficando portador de síndrome pós-concussional, traduzido por défices cognitivos e mnésicos (lentificação e erros no cálculo aritmético; memória de fixação perturbada), associadas à intolerância à luz e ao ruído, ficando portador de incapacidade parcial geral fixável em 15%, sequelas essas que lhe exigem esforços acrescidos no exercício da sua actividade profissional, pela qual auferia, à data do acidente, 65.000$00 - fixado o valor de 20.000 € para ressarcir o dano futuro consistente na perda da capacidade de ganho em função da IPP.

22-11-2007, Revista n.º 3829/07 - 7.ª Secção

Lesado com 17 anos de idade, frequentando o 11º ano de escolaridade e posteriormente ingressado no superior. Fixado o valor de 75.000,00 €, a título de indemnização respeitante a incapacidade permanente geral, com rebate profissional, de 20%, acrescida de mais 5% a título de dano futuro.

18-12-2007, revista n.º 4165/07 - 6ª Secção

Lesado com 16 anos de idade, frequentando o curso de tecnologia informática, que sofreu traumatismo crânio-encefálico com perda de conhecimento, fracturas do fémur esquerdo e punho direito, internamento por 3 meses, sujeição a duas intervenções cirúrgicas, ficando com IPP para o trabalho de 20%, que implica esforços suplementares no trabalho, que começou a trabalhar em Abril de 2004, quando tinha 21 anos, auferindo em Março de 2006, 451€/mês - fixada a indemnização por danos futuros em 50.000,00 €. (Por danos não patrimoniais, fixada a verba de 20.000 €).

10-01-2008, Revista n.º 4518/07 - 2.ª Secção

Lesado, atropelado, com 4 anos de idade, que em consequência das lesões, ficou a padecer de uma incapacidade permanente geral de 25%, à qual acresce, a título de dano futuro, mais 5%.
“Sofreu várias lesões, nomeadamente fractura craniana, fractura e perda de três dentes, fractura do externo da clavícula esquerda, fractura do ramo isquiopúbico; esteve internado em hospitais, registando um coma profundo durante vários dias; foi submetido a diversas e delicadas intervenções cirúrgicas; ficou com cicatrizes que constituem defeito estético notório e apreciável; sofreu dores com as lesões e com os tratamentos”.
Fixados os montantes de 120.000,00 € e 100.000,00 €, respectivamente, a título de danos futuros e danos não patrimoniais”.

17-01-2008, Revista n.º 4527/07 - 7.ª Secção

Lesada com 15 anos de idade, que na sequência de embate entre dois velocípedes, ficou a padecer, de extensas e visíveis cicatrizes e dificuldades de locomoção e flexão do joelho esquerdo, e que atendendo à sua idade, entraria no mercado de trabalho aos 18 anos, auferiria (pelo menos) o salário mínimo nacional e ficou a padecer de uma IPP de 30 %, cifrando-se nos 65 anos de idade a expectativa da sua vida activa, tem-se por adequada a indemnização de 50.000,00 € destinada ao ressarcimento dos danos patrimoniais futuros.
22-01-2008, Revista n.º 4499/07 - 1.ª Secção

Lesado com 17 anos de idade, que em consequência de acidente de viação sofrido, apresentava uma incapacidade permanente geral fixável em 70%, à qual acresce, a título de dano futuro mais 5%; as sequelas referidas são impeditivas do exercício da actividade profissional habitual do autor; à data do acidente o autor auferia o salário anual de € 6.298.46; ponderando como limite da vida activa, até ao qual deve ser compensada a perda de capacidade de ganho, a idade de 70 anos, e sabendo-se, no tocante às taxas de juro, situadas hoje à volta dos 3% a 4% ilíquidos, que tendem a subir e a fixar-se próximo dos 5%, sobretudo quando esteja em causa a remuneração de quantias mais elevadas, crê-se ser adequada e conforme à equidade a verba de 125.000,00, a título de dano patrimonial futuro.

07-02-2008, Revista n.º 4598/07 - 1.ª Secção

Lesado com 16 anos de idade, aprendiz de calceteiro, com incapacidade na ordem dos 60% para a generalidade das profissões.
“Não se estando perante uma concreta profissão definitivamente adoptada, nem perante uma efectiva perda de ganho no seu exercício, deve considerar-se um salário médio previsível, confrontando-o com a IPP geral, só assim se harmonizando os dois elementos, ambos referentes a qualquer profissão acessível ao lesado.
Em termos de normalidade e previsibilidade, o salário médio acessível a um jovem (operário), dotado de mediana capacidade e aptidão, após a fase de aprendizagem profissional, não deve situar-se abaixo de € 500,00 mensais”.
Pelo dano patrimonial futuro correspondente à perda da capacidade de ganho, considerando o referido salário, fixada a verba de € 125.000,00.

07-02-2008, Revista n.º 4521/07 - 6ª Secção, CJSTJ 2008, tomo 1, pág. 91

Lesado com 19 anos de idade, frequentando o 2.º ano de um curso médio profissional com a duração de 3 anos, tornando-se difícil e incerto que o venha a completar e ficando com uma IPP de 45% - confirmado o valor da indemnização pelos danos futuros em 17.000.000$00.
08-05-2008, Revista n.º 3818/07 - 7.ª Secção

Lesada com 19 anos de idade, estudante, quando foi vítima de acidente de viação, que ficou afectada com uma IPP de 70%; “não sendo dependente de terceira pessoa para a execução das actividades da vida diária, necessita de acompanhamento e supervisão de terceira pessoa para todas elas; apresenta perturbações de memória, abaixamento de rendimento intelectual e da atenção, lentificação psicomotora, instabilidade emocional e irritabilidade.
Ficou com uma cicatriz no queixo com cerca de 3 cm, que a desfeia, tendo movimentos do corpo hesitantes e descoordenados; sofreu traumatismo crâneo-encefálico grave e coma, com prolongado internamento hospitalar; suportou dores intensas; fez tratamentos de fisioterapia e programa de reabilitação física.
A título de danos patrimoniais (futuros) e não patrimoniais, são adequados, respectivamente, os montantes de 250.000,00 € e 100.000,00 €”.

16-09-2008, Revista n.º 2117/08 - 1.ª Secção

Lesada que à data do acidente era uma criança, ficando com sequelas que envolvem uma incapacidade permanente geral de 80%.
“No cálculo da indemnização devida por danos patrimoniais futuros da Autora, e uma vez que esta ainda não trabalhava, há que ponderar o salário mínimo vigente à data da propositura da acção (cf. art. 566.º, n.º 2, do CC)”
Atribuída a indemnização de 50.000.000$00 por danos patrimoniais “perda de ganho total” e “prejuízo fisiológico até à idade de 80 anos”. E por danos não patrimoniais - 30.000.000$00.

16-09-2008, Revista n.º 939/08 - 7.ª Secção

Sendo lesada uma menor, que à data do acidente frequentava o 6º ano de escolaridade, tinha o sonho de tirar o curso de medicina, e que ficou com incapacidade permanente total para o trabalho, sendo dado por assente que seria razoável supor que a mesma viria a tirar tal curso, pondera-se: “O curso de medicina apresenta-se apenas como uma possibilidade a alcançar pela menor, constituindo uma sua expectativa, mas de concretização incerta.
Por isso e à falta de outros dados, dever-se-á lançar mão do salário mínimo nacional como elemento objectivo de cálculo da indemnização deste dano futuro”.
Fixado em 250.000,00 € o dano patrimonial futuro pela ITP.

16-10-2008, Revista n.º 3114/08 -7ª Secção

Lesado que à data do acidente tinha 16 anos de idade, não tinha profissão, ficando afectado por uma IPP de 18%.
Considerando uma vida activa até aos 70 anos e o salário mínimo nacional de 375,00 €, é fixada a indemnização de 40.000,00 €, a título de danos futuros, julgando-se adequado o valor de 15.000,00 €, vindo das instâncias, a título de danos não patrimoniais.

30-10-2008, Revista n.º 3237/08 - 2.ª Secção

No cálculo da indemnização por danos patrimoniais futuros decorrentes da IPP de que ficou a padecer o sinistrado, então menor com 15 anos de idade, e na falta de outros elementos, deve recorrer-se a valores próximos do salário mínimo nacional, dado que se trata de um valor mínimo seguro que, na ausência de mais factores, deve ser adoptado, em detrimento de outros possíveis, como o rendimento médio nacional.
Actualmente, a vida activa profissional vai até aos 70-75 anos de idade do trabalhador.
Ao cálculo do capital necessário para produzir o rendimento perdido há que efectuar um desconto imediato, destinado a evitar que o lesado receba juros sem dispêndio do capital, já que ficaria intacto no termo do período para que foi estimado. Esse desconto, calculado segundo o critério da equidade e dependente fundamentalmente do custo de vida, cifra-se em 20%.
Atendendo ao grau de incapacidade de que o lesado ficou a padecer (10%), reputa-se de justa e equitativa a quantia de 20.000,00 € destinada a reparar os danos patrimoniais derivados da perda da capacidade de ganho que o sinistrado sofreu em consequência do acidente.

04-12-2008, Revista n.º 3234/08 - 2ª Secção

Lesado com 19 anos de idade à data do acidente, estudante, no 2.º ano do curso de artes gráficas, que abandonou entretanto os estudos e ficou a padecer de uma IPP de 45% - fixada a indemnização de 135.000,00 € destinada ao ressarcimento dos danos patrimoniais futuros sofridos pelo sinistrado.

09-12-2008, Revista n.º 3606/08 - 6.ª Secção

Lesado com 17 anos de idade, estagiário de estampador, afectado de IPP de 20%, acrescida de mais 5%, a título de dano futuro - fixado o montante de 50.000,00 € por perda de capacidade de ganho.

13-01-2009, Revista n.º 3747/08 - 1.ª Secção

Lesado com 8 anos de idade à data do acidente, frequentando o 3.º ano do ensino básico, ficando a padecer de IPP de 5%, sendo previsível que até aos 18 anos acresça IPP de 5%.
Em causa a perda de réditos futuros pela privação da respectiva fonte; não há qualquer profissão a considerar nem é determinável, face aos elementos disponíveis, a repercutibilidade das lesões no exercício das tarefas laborais e de utilização do corpo em geral, restando a incapacidade para o exercício da generalidade das profissões, a incapacidade genérica para utilizar o corpo enquanto prestador de trabalho e produtor de rendimentos; à míngua de melhores elementos, haverá que considerar essa incapacidade como incidente sobre qualquer profissão acessível ao lesado, sem nenhuma excluir.
Para efeito de determinação de indemnização por danos patrimoniais futuros será de atender ao salário médio acessível a um jovem dotado de formação profissional média, a partir dos 21 anos de idade, salário que, em termos de normalidade e previsibilidade, é de situar em não menos de 650/700 euros mensais, tendendo a subir ao longo da vida”.
Atribuída a indemnização pelos danos patrimoniais futuros de € 12.000,00 (80% de 15.000,00) e de € 14.000,00 (80% de 17.500,00) pelos danos não patrimoniais .

19-03-2009, Revista n.º 56/09 - 7.ª Secção

Lesada que à data do acidente tinha 13 anos de idade, matriculada no 11.º ano, área de Ciências; entretanto, frequenta o 2.º ano do Curso de Matemática na Universidade de Lisboa e que ficou com uma IPP de 30%; considerando o salário previsível de 750,00 € mensais, julgado adequado o montante de 90.000,00 € fixado na 1ª instância a título de danos patrimoniais futuros.


25-03-2009, Revista n.º 421/09 - 6.ª Secção

“Considerando a idade do autor à data do acidente (16 anos), o previsível longo período de vida activa que tem à sua frente, que já trabalhava, auferindo 365 € mensais como empregado de balcão, que o valor da remuneração mínima garantida já se encontra actualmente fixado em 450 € mensais, a taxa da inflação e o constante aumento do nível dos salários, julga-se razoável e conforme à equidade o valor indemnizatório de 39.002,50 €, a título de dano futuro pela IPP de 25% de que o A. ficou a padecer.
Tendo ainda em conta as lesões sofridas pelo A. (feridas múltiplas na face à direita e fractura da mandíbula), os tratamentos prolongados a que foi submetido (ingeriu apenas alimentos líquidos durante meses, fez cinco cirurgias e fisioterapia), o período decorrente até ser considerado clinicamente curado, as várias intervenções cirúrgicas a que foi submetido, o prejuízo estético (fixável no grau 5/7 - ficou com várias cicatrizes profundas na face esquerda, e no pescoço e paralisia parcial do lábio esquerdo), as dores e os incómodos suportados, julga-se adequado, equitativo e proporcionado o montante indemnizatório de 20.000,00 €, pelos danos não patrimoniais sofridos.

01-10-2009, Processo n.º 1311/05.4TAFUN.S1 - 5ª Secção

Para lesada com 11 anos à data do acidente, que ficou paraplégica, deslocando-se em cadeira de rodas e fazendo algaliação, com IPP de 70%, considerando que iria estudar até obter licenciatura num curso superior, fazendo aplicação do factor constante da Portaria n.º 377/2008, tendo em consideração vencimento médio previsível de € 850, é atribuída indemnização de 220.000 €.



Revertendo ao caso concreto.

Começando pela posição das instâncias.

Embora não esteja em reapreciação a decisão da 1ª instância, passar-se-á em revista os seus fundamentos, a fim de se ter um pano de fundo do decidido e perceber as alterações feitas entretanto.
Assim, na apreciação do pedido referente à perda da capacidade aquisitiva ponderou a Exma. Juíza na sentença, a fls. 700/1:
«Porém, e sempre considerando qualquer critério a usar como meramente orientador e não puramente matemático - artigo 562.°, 564.° e 566.º, n.°s 1 e 2-, seguiremos agora um outro critério que foi utilizado pela Relação de Coimbra, em Acórdão de 4/4/95, publicado na C.J., Ano XX, tomo II, pag 23, e que representa um desenvolvimento e ajustamento do critério que vinha sendo utilizado pelo S.T.J. em alguns arestos (cfr. por exemplo os Ac. S.T.J. de 4/2/93, in CJ, Acórdãos do S.T.J., Ano I, Tomo I, pag 128 e ss, e de 5/5/94, in CJ, Acórdãos do S.T.J., Ano II, Tomo II, pag 86 e ss.).
Tal critério a que nos vimos referindo pretende também determinar o montante da indemnização devida pelos prejuízos sofridos em virtude do rendimento perdido, atribuindo ao lesado uma quantia que elimine tal perda, alcançando tal objectivo com a atribuição de uma quantia em dinheiro que produza o rendimento mensal perdido mas que, ao mesmo tempo, lhe não propicie um enriquecimento ilegítimo, sendo necessário para tal que na data final do período considerado se ache esgotada a quantia atribuída, mas que tem em conta o facto de os salários futuros tenderem a subir em função não só da inflação como também em virtude de ganhos de produtividade e progressões na carreira.
É certo que, e como se diz no Acórdão da Relação de Coimbra citado, os valores futuros da inflação, ganhos de produtividade e evolução salarial por progressão na carreira são difíceis de prever com exactidão, mas considerar que eles são nulos leva a uma solução manifestamente irrealista e geradora de erros grosseiros, como são os que se nos deparam quando analisamos decisões judiciais relativas a indemnizações pela perda da capacidade aquisitiva proferidos há uns anos atrás.
Dispensamo-nos aqui de reproduzir quer a fórmula utilizada quer as operações matemáticas por ela implicadas, até porque, mais uma vez o dizemos, o critério é meramente orientador do juízo de equidade que, nos termos da lei, deve presidir à decisão (e seguimos esta orientação não só para poder explicar os juízos de equidade que presidem à decisão, sendo assim tal juízo mais facilmente sindicável pelos destinatários desta sentença e até pelo tribunal superior, em caso de recurso, mas também porque pensamos que os critérios da equidade justificam o recurso a tal orientação, sem perder de vista a temperança própria da equidade.
Assim, considerando que o autor à data do acidente tinha oito anos.
Não existe uma base segura em termos de rendimento médio mensal previsível, dada a idade do demandante.
Mas, face à evolução, seguramente, que o rendimento não irá ser inferior a € 1.250,00.
O DD manifestava que gostaria de ser motorista. Trata-se uma afirmação de uma criança que vale o que vale. Em todo o caso, com o apoio dos pais, que não obstante serem trabalhadores rurais, é de admitir que o menor DD pudesse concretizar a ambicionada profissão ou outra idêntica, podendo subsequentemente vir a conseguir rendimentos de trabalho naquela ordem, compatível com um curso médio e de natureza profissional.
Assim, partindo daquele vencimento médio de € 1250,00, atendendo aos demais índices, tais como os relativos ao inicio da actividade profissional desenvolvida, que não se verificaria antes dos vinte anos, a duração previsível da sua vida activa, - poderemos perspectivar que se prolongará até aos 65 anos de idade -correspondente à expectativa média para os homens, e entendendo que os limites da condenação estabelecidos no artigo 661.°, n.º 1, do C.P.C., dizem respeito ao pedido global e não às parcelas em que o mesmo se decompõe (cfr. nesse sentido Acórdão S.T.J. de 18-11-1975, 11-06-1976, 14-10-1997, 28-02-1980 e 02-03-1983, in B.M.J. 251.°-107, 258.º - 208, 292.º - 248, 294.° - 283 e 325.° - 365), julgamos justo, equitativo e adequado fixar a sua perda de ganho em 543.000,00 (quinhentos e quarenta e três mil euros), para ressarcir ao menor DD os danos futuros, relativos à redução da sua capacidade de ganho futuro».

O acórdão da Relação de Lisboa começa por entender como exagerado o montante de € 1.250,00 mensais encontrado pela 1ª instância para o salário-base para efeitos de cálculo de perda da capacidade aquisitiva.
Diz o acórdão: «Entendemos assim, com margem de erro que em si mesmo supõe, que o vencimento futuro mensal, à data da efectivação de 20 anos de idade do DD deverá ser fixado em € 1.000,00 (mil Euros)» (realce a negrito na origem).
E mais abaixo, a fls. 830, reiterando esse valor, acrescenta: “Não se esqueça que estamos a fixar um salário líquido, livre de impostos e taxas”.

O acórdão da Relação após ter entendido como exagerado o montante adiantado pela primeira instância, avança com um outro valor, mas sem explicar como lá chegou, do mesmo modo, não justificando minimamente a escolha.

O acórdão recorrido segue a par e passo os critérios para a determinação da indemnização por perda da capacidade aquisitiva estabelecidos pelo acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 4 de Dezembro de 2007, no processo 07A3836.
Concretizando e aplicando tais critérios no caso em apreciação, discorre o acórdão recorrido nos termos seguintes (os realces continuam a ser do texto da Relação):
«Aplicando aquela jurisprudência ao caso sub judice, teremos:
Que é de atender à idade de reforma de um motorista aos 65 anos de idade. (Desde logo não se pode aceitar que a idade da reforma de um motorista de pesados para o qual a “força física” e “capacidade de reacção e reflexos” são indispensáveis, seja o mesmo de um trabalhador intelectual e que por esse facto ocorrerá com 65 anos de idade.)
Teremos assim como base de trabalho a seguinte formulação: salário anual de 14.000,00 Euros x 24,51871 x 85% = 291.772,64 Euros.
Assim, entendemos com recurso à equidade, e pela fórmula acima referida, ponderando todas as outras variáveis, que a título de indemnização por perda de capacidade aquisitiva, tendo em consideração o montante de € 1.000,00 (mil euros) mensais e média de vida activa de 65 anos, descontando-se uma parcela pelo recebimento imediato, ser de arbitrar o montante de € 350.000,00 (trezentos e cinquenta mil euros)».

Passando para a posição das partes.

Os demandados no presente recurso expressaram a sua aceitação, como justo, do montante de 350.000 euros, fixado pela Relação a título de indemnização por perda da capacidade aquisitiva e autonomia funcional do demandante – conclusão II - Danos Patrimoniais -1ª (fls. 871 v.º).
(Note-se que a este título, no recurso interposto para a Relação, os demandados entendiam por justa a indemnização de 250.000,00 €, como ressalta da conclusão 9.ª, a fls. 748, do 4º volume e ainda conclusões 6.ª e 7.ª).

Por seu turno, o demandante no recurso ora interposto, a fls. 885/6, sem discordar dos critérios utilizados no acórdão recorrido (os do citado acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04-12-2007), entende que a base em que os mesmos assentam não é consentânea com a realidade.
Desde logo por o salário base encontrado de 1.000,00 € ser nesta data desajustado e mais será daqui por sete ou oito anos, quando o DD atingir a idade em que presumivelmente iniciaria a sua actividade profissional.
Invoca para tanto o vencimento mensal de um motorista profissional de longo curso, profissão que não poderá exercer, mas que pretendia vir a seguir, defendendo a fixação/consideração do valor de 1.250,00 € no cálculo da indemnização por perda de capacidade aquisitiva.
(Anote-se que aquando da formulação do pedido no enxerto em Abril de 2006, alegara-se no artigo 183º que quando o DD atingisse os 20 anos de idade (ou seja, em 2015), o salário de um operário médio, de um camionista, como pretendia vir a ser, não seria inferior a 800,00 € mensais, 11.200 € anuais).
E assim, com base naquele montante e usando o critério defendido no acórdão recorrido, o valor encontrado seria:
Salário anual de 17.500,00 € x 24,51871 x 85% = 364.715,80 €.
Termina dizendo “Ponderadas todas as outras variáveis enunciadas no douto acórdão, inflação, aumento da vida activa, a progressão na carreira, é de entender, com recurso à equidade, que a título de indemnização por perda de capacidade aquisitiva, considerando o montante de um salário mensal de 1.250,00 € e média de vida activa de 65 anos, descontando-se uma parcela de recebimento imediato, seja de arbitrar um montante não inferior a 435.000,00 €”.
Esta posição veio a ser condensada nas conclusões 5.ª, 6.ª, 7.ª e 8.ª.

Apreciando.

Aceitando os demandados o valor fixado pelo acórdão do Tribunal da Relação e pretendendo o recorrente demandante fixação em valor mais elevado, há que decidir qual o montante a fixar dentro das balizas de 350.000 e 435.000 euros.
Far-se-á aplicação aqui dos princípios expostos supra, em geral, tendo em conta o caso específico presente, estando-se perante lesado criança - com 8 anos – e grande traumatizado - paraplégico.
À data do acidente, ocorrido em 22-12-2003, o lesado DD, nascido em 4 de Agosto de 1995, tinha 8 anos, 4 meses e 17 dias.
Em consequência do acidente ficou paraplégico, com uma incapacidade permanente geral de 80%, a que acresce 5%, a título de dano futuro, estando na vida futura confinado a uma cadeira de rodas, com dependência de ajuda de terceiros.
O ingresso do demandante no mundo do trabalho poderia ocorrer por volta dos vinte anos, como ponderaram as instâncias e é aceite pelas partes, não se vendo razões para afastar a consideração de tal idade, que aliás, se insere no comum do decidido neste Supremo, que, ressalvados os casos de frequência de cursos universitários, projecta a entrada no mercado do trabalho na faixa que se situa entre os 18 e os 21 anos.
Ora, contando o DD actualmente 14 anos de idade, esse ingresso verificar-se-ia daqui por cerca de 6 anos, em 2015.

Nestes casos em que o ofendido é uma criança, no que respeita a profissão futura, não se pode avançar com qualquer prognóstico com foros de viabilidade forte, não se podendo tomar por base uma manifestação de um mero desejo formulado aos 8 anos de idade.
Foi dado como assente no ponto n.º 183 dos factos provados que “O DD pretendia vir a ser motorista de pesados”.
A primeira instância, começando por reconhecer não existir uma base segura em termos de rendimento médio mensal previsível, dada a idade do demandante, afirmando de seguida que face à evolução, seguramente, o rendimento não seria inferior a € 1250,00, tomando em consideração aquela “afirmação de uma criança que vale o que vale”, projectando depois o alcance efectivo daquela declarada ambicionada profissão ou outra idêntica, podendo o lesado vir a conseguir rendimentos compatíveis com um curso médio e de natureza profissional, partindo de um vencimento médio de 1250.00 euros, situando o início da actividade profissional, que não se verificaria antes dos 20 anos e se prolongaria até aos 65 anos, e finalmente, tomando por base o critério utilizado no acórdão da Relação de Coimbra de 04-04-1995, temperado com equidade, fixa a perda de ganho em 543.000 €, não explicando, porém, como deveria, após a enunciação de todos esses considerandos, as operações a que procedeu para chegar a tal valor.
O acórdão recorrido considerou exagerado o montante de 1 250,00 €, entendendo que o vencimento futuro mensal, à data da efectivação de 20 anos de idade do demandante, deve ser fixado em 1 000,00 €, salário líquido, livre de impostos e taxas.
Tomando o critério do referido acórdão de 4-12-2007, assentou o acórdão recorrido na consideração da futura profissão de motorista, com reforma aos 65 anos, e no salário anual de 14.000 euros, e aplicando a fórmula, alcançou o resultado de 291.772, 64 €, depois corrigido “com recurso à equidade”, “ponderando todas as outras variáveis” - não especificadas - e “descontando-se um parcela pelo recebimento imediato” - que se não concretiza - arbitra o montante de 350.000,00 €.

Seria de todo estulto não ter noção da extrema dificuldade em quantificar uma indemnização a um lesado que por força da idade não tem força de trabalho, fonte produtiva de património actual, mas apenas em potência, quando está em causa a cobertura de um longo período, as variáveis a ter em conta (no caso como factores fixos apenas a idade do lesado, o limite da vida activa profissional aos 65 anos e a taxa de IPG, sendo o mais aleatório) se situam nos terrenos da imprevisibilidade, incerteza e contingência, assumindo alguns factores influentes a ponderar contornos com carácter aleatório, presuntivo, inapreensível, imponderável, havendo que conjecturar uma profissão, possível, acessível, previsível, calendarizar o ingresso no mundo do trabalho e ficcionar um rendimento de uma eventual ocupação.
Nestes casos, em que o cálculo tem de assentar em dados problemáticos, numa viagem ao futuro com horizontes incertos e nebulosos, ponderando a propósito de uma situação hipotética, imaginária, irreal, reconhecendo a falibilidade das projecções no futuro, o único amparo advirá da utilização de considerações do que é normal acontecer, suposto um normal percurso de vida, sem incidências estranhas, anómalas ou perturbadoras, conferindo relevo às regras da experiência e ao que, segundo o curso normal das coisas, é razoável acontecer.
As instâncias deram como certa a profissão de motorista, a partir da expressão da pretensão do demandante de vir a ser motorista de pesados.
Trata-se de um dado fluido, assente na formulação de um desejo expresso por uma criança aos 8 anos e que pode perfeitamente mudar aos 10, 11, ou 12 anos, sendo que no entanto, nenhum juízo de verosimilhança ou de probabilidade impede de sufragar tal profissão, que se apresenta apenas como uma possibilidade a ponderar, uma expectativa de vida profissional de concretização possível, viável, como será a de várias outras, a não descartar.
Assim sendo, dentro de critérios de normalidade e previsibilidade, o demandante ingressaria (poderia ingressar) no mercado de trabalho, aos 20 anos de idade, desenvolvendo actividade por conta de outrem, como motorista ou com qualquer outra profissão acessível, para a qual estivesse devidamente habilitado, já que não há à partida razões para pensar que não pudesse obter uma formação profissional média e nem tão pouco que fosse desprovido de capacidade e aptidão para o alcançar - o irmão mais velho do DD com 20 anos tem o 9.º ano de escolaridade (facto provado n.º 173), nada impedindo à partida que o demandante fosse mais além.
Feito este prognóstico, que poderá sem esforço considerar-se como contendo-se dentro de limites de razoabilidade e do que é expectável em jovens sadios e comunicativos, como certamente seria o demandante face aos antecedentes, há que conjecturar um salário compatível com tal tipo de inserção no mundo laboral e tal género de desempenho profissional, que não terá de passar necessariamente pelo salário mínimo mensal, que assegura níveis de subsistência, conferindo aquela projectada ocupação um padrão de vida necessariamente acima deste patamar.
Mas mesmo a este nível, poderá dizer-se que a evolução do salário mínimo no período a atender no caso, abrangendo os anos de 2003 a 2009, cujos montantes foram consignados supra, foi no sentido de aumento gradual, sendo de € 9,00 de 2003 para 2004, e nos anos seguintes de 9, 10, 11,20, 17,10, 23 e 24 euros, apontando nos dois últimos anos para um crescimento de cerca de 5, 7%, em cada ano, pelo que poderá projectar-se, seguindo este ritmo de crescimento, alcançar em 2015, altura em que o demandante perfará 20 anos, no mínimo, os 600,00 euros.
Dentro destes parâmetros e do referido tipo de actividade profissional, ter-se-á por verosímil um rendimento de 1.100,00 € mensais.
Na avaliação concreta do dano, como ponto de partida, de forma a alcançar uma base mínima de trabalho, de modo a conseguir uma referência, uma plataforma inicial a partir da qual se façam operar elementos variáveis que têm a ver com introdução do juízo de equidade, procurando demonstrar/explicar como é alcançado o mínimo denominador e evitar soluções com pendor subjectivista, poderemos lançar mão da fórmula utilizada no referido acórdão deste Supremo de 04-12-2007, no processo n.º 3836/07-1ª, retomado nos acórdãos de 15-01-2008, revista n.º4057/07; de 28-02-2008, revista n.º 4391/07 e de 07-07-2009, revista n.º 362/09.4YFLSB, todos da 1ª secção e prolatados pelo mesmo relator e igualmente no acórdão de 07-02-2008, revista n.º 4521/07-6ª, CJSTJ 2008, tomo 1, pág. 91.
Trata-se, como exposto no último, do resultado da aplicação do programa Excell à fórmula utilizada pelo Supremo no acórdão de 05-05-1994, CJSTJ 1994, tomo 2, pág. 86, elaborada tendo como referência a atribuição de 3% ao factor aí indicado como taxa de juro previsível no médio e longo prazo.
Tomando como parâmetros a idade que ainda falta à vítima para atingir a idade de reforma e aquela taxa de rendimento, para determinação do valor base há que multiplicar o factor índice da tabela (indicado por referência aos anos que ainda faltem para ser atingida a idade da reforma) pelo rendimento anual auferido/perdido à data do acidente e pela percentagem do grau de IPP, vezes a percentagem de responsabilidade do lesante na produção do acidente, obtendo-se o capital necessário, que entregue de uma só vez e diluído ao longo do tempo com os rendimentos que ele próprio for gerando, proporcione ao lesado, até à sua idade de reforma, o valor correspondente ao valor perdido.
Na aplicação ao caso concreto não há a considerar qualquer contribuição de responsabilidade do demandante na produção do acidente, que se deveu a culpa única e exclusiva do arguido condutor, nem se fará o desconto da importância que o lesado gastaria consigo próprio pelas razões supra apontadas.
Atenta a especificidade do caso, não tendo o lesado entrado ainda no mundo do trabalho, o número de anos até atingir a reforma – a idade normal de reforma - computar-se-á desde o projectado início de actividade profissional aos 20 anos, que será assim o termo inicial do prazo a considerar.
Tomando a entrada no mercado de trabalho, como verificando-se em 2015, com os 20 anos do demandante, atendendo, para este efeito, a reforma aos 65 anos, ao salário médio mensal ficcionado de 1.100,00 €, a que acresce subsídio de férias e de Natal, no total de 14 meses, ou seja, um rendimento anual de 15.400,00 € e aplicando o factor de 24,51871, correspondente a 45 anos até atingir a reforma (dos 20 aos 65) e a taxa de IPP de 85%, sem qualquer concorrência da vítima para as lesões sofridas, temos o seguinte:
15.400,00 € x 24,51871 x 85% = 320.949,913 €.

A partir daqui há que fazer funcionar a equidade como critério primordial e sempre corrector de outros critérios.
E assim haverá que atender à esperança média de vida do cidadão português, com o tempo provável de vida posterior ao termo da vida activa profissional aos 65 anos, podendo figurar-se o limite de 70 anos, aspecto não considerado no acórdão recorrido, o prolongamento da IPG para além da idade da reforma e o rebate no desempenho de outras tarefas, que continuarão a supor a presença de ajudas de terceiros, a evolução profissional que teria, com progressão na carreira e reflexos a nível remuneratório, com melhorias de retribuições e aumentos salariais, a inflação e reflexos negativos no poder de compra, o facto de depender de ajuda permanente de terceiros, função agora desempenhada pela mãe, que poderá ser por outra pessoa a contratar para o efeito e a quem terá de se pagar, sendo certo que esta componente não foi ventilada nem pedido qualquer valor a respeito, a muito elevada dimensão de incapacidade e do dano corporal traduzido em ofensa grave à saúde e integridade física, tendo-se em conta a gravidade da conduta de que emergiu o acidente consubstanciadora de crime, o facto de para o acidente em nada ter contribuído o demandante, já que se ficou a dever a culpa exclusiva do condutor demandado e ainda os padrões jurisprudenciais.
No que respeita ao desconto a efectuar pelo recebimento antecipado da totalidade do capital, há que ter em atenção no caso concreto uma antecipação de mais largo espectro, remetendo-se neste particular para o que acima se disse a propósito da dedução/desconto/acerto a efectuar por antecipação do capital.

Entronca com esta uma outra questão a ter igualmente em conta.
A IPG de que padece o lesado, até aos 20 anos, altura em que ingressaria no mercado de trabalho, não determina (ria) uma diminuição concreta e efectiva de rendimentos por mor da diminuição/limitação da capacidade de ganho, a qual só começa (ria) a ter efeitos, a reflectir-se no património do lesado, a partir dos 20 anos de idade.
O rebate que a incapacidade terá no desempenho profissional do demandante, dado por assente no ponto de facto provado n.º 177, só se efectivará a partir dos 20 anos, começando então, a partir daí, a repercutir-se realmente na obtenção de rendimentos.
Não se pode olvidar que nestes casos específicos, a não ter ocorrido o acidente, até à entrada do jovem no mundo do trabalho, impendia sobre os pais a responsabilidade de prover ao seu sustento e no âmbito do dever de assistência incumbe-lhes a obrigação de prestar alimentos, como decorre dos artigos 122º, 123º, 1874º, 1878º, n.º 1, 1879º, 1880º, 1885º, 2003º e 2009º, n.º 1, alínea c), todos do Código Civil.
Enquanto menor o demandante viveria, pois, na dependência dos pais, enquanto estudasse estaria financeiramente dependente daqueles.
Como acima se concluiu, por todas as apontadas razões justificar-se-á, nestes casos, a consideração de uma maior margem de compressão ao efectuar-se o desconto/acerto em causa.
Ponderando todos estes factores e efectuados os ajustamentos que se impõem, seria encontrado o montante indemnizatório de € 300.000,00.
Porém, acontece que os demandados aceitaram, conformaram-se com o valor fixado pela Relação; estando-se no domínio dos direitos disponíveis, será de ter em consideração tal valor, assim improcedendo a pretensão do demandante e se confirmando nesta parte, embora com outros fundamentos e face à referida aceitação, a decisão recorrida.

Concluindo: a título de indemnização pelo dano patrimonial futuro, lucro cessante, ganho frustrado, de perda da capacidade aquisitiva de ganho do demandante, fixa-se o montante de € 350.000,00 (trezentos cinquenta mil euros).

QUESTÃO II – DANOS FUTUROS PREVISÍVEIS E DETERMINÁVEIS

A discordância de demandados e demandante, versando a mesma matéria, mas sob perspectivas diversas, focando pontos específicos diferenciados, encontra síntese nas conclusões 2ª a 18ª (danos patrimoniais) do recurso daqueles, alegando cálculo com base em valor errado, e conclusões 9ª a 13ª do recurso deste, divergindo do encurtamento do período de incapacidade operado pela Relação.

Em causa no presente recurso, no que concerne a esta componente, está apenas o pedido de condenação dos demandados no pagamento de medicamentos, sondas de algaliação, bebegel e fraldas, de que o demandante necessitará até atingir os 65 anos, conforme alegado nos artigos 157.º a 168.º do pedido de indemnização, computados no total de € 890.462,32, correspondente a 56 anos (dos 9 aos 65 – conforme referenciado nos artigos 167.º e 168.º da mesma peça processual).
É fora de dúvida que a sentença de Benavente a este propósito nada disse.
Para além destas despesas, o demandante invocou a necessidade de substituição das ajudas técnicas a adaptar ao seu crescimento, como cadeira de rodas, ortóteses e botas ortopédicas, pedindo a liquidação em execução de sentença das ajudas que se vierem a revelar necessárias - artigo 169º.
Sobre este aspecto nada disse igualmente a sentença, mas a questão ficou resolvida com a correcção operada pela Relação ao abrigo do artigo 380.º do Código de Processo Penal.
No recurso (subordinado) então interposto para a Relação, o demandante invocou exactamente a omissão de pronúncia sobre esses outros danos futuros previsíveis alegados e já determináveis, referentes a necessidade de medicamentos, algálias e fraldas, invocando nulidade da sentença por omissão de pronúncia, nos termos do artigo 379º, n.º 1, alínea c), do C P P – fls. 765/6 e conclusões 12ª, 13ª e 14ª.
Conhecendo da arguida nulidade de sentença, assim discorreu o acórdão recorrido, de fls. 847 a 849, que se transcreve integralmente, incluindo realces, esclarecendo-se para melhor percepção que a parte inicial, onde são referenciados factos provados, corresponde ao que alegara o demandante no recurso:
«5.2.4. Recurso do demandante DD relativa aos danos futuros previsíveis e determináveis, a sentença recorrida é omissa quanto ao ressarcimento de danos alegados e provados pelo demandante, determináveis já nesta data.
Com efeito, provou-se que o DD “tinha treino vesical instituído por auto-algaliação de três em três horas, ..., o que ainda agora acontece e se manterá o resto da sua vida” – nº 120 e 160 dos factos provados.
Provou-se a quantidade média de algálias necessárias por dia, e a quantidade de medicamentos necessários para aplicação das algálias, e os respectivos preços – nºs 163 e 164 dos factos provados.
Ficou ainda provado que o DD tinha, e continuará a ter para o resto da sua vida, treino intestinal instituído com supositórios de glicerina em dias alternados – nºs 121 e 166 dos factos provados.
E mais se provou as quantidades e custos do medicamento para esse efeito – nº 165 dos factos provados.
Também ficou provado que o DD deixou de ter o controle dos esfíncteres e tem perdas de urina o que o obriga a usar fraldas de dia e de noite, situação que é irreversível e obrigará a um gasto anual de cerca de € 300,00, nesta data – factos provados nºs 167, 168 e 169.
Também se demonstrou que o DD está obrigado para o resto da sua vida a tomar medicação, designadamente do foro urológico, tendo-se provado as quantidades e preços – factos provados nºs 160, 161 e 162.
Ora, esta necessidade de viver o resto dos seus dias com a toma diária de medicamentos, a obrigação de se auto-algaliar diariamente e de fazer treino intestinal instituído, o uso de fraldas de dia e de noite, constituem dano futuro mais que previsível e nesta data já determinável em face dos factos provados.
A título de danos futuros previsíveis e determináveis o demandante pediu a condenação dos demandados civis no pagamento de € 890.462,32 – artºs 157º a 168º do pedido de indemnização cível.
Valor que ficará muito aquém do que o DD terá que despender ao longo de toda a sua vida, uma vez que os preços dos medicamentos, fraldas, algálias, não se manterá o mesmo, e nem o DD deixará de necessitar destas ajudas quando perfizer os 65 anos de idade. E tudo já sem contabilizar o apoio de terceiros a que também estará sujeito para o resto da vida – factos provados nºs 144, 145 e 196.
Daí que o ressarcimento imediato destes valores não deva sofrer qualquer redução pelo pagamento imediato, compensando-se com o que a inflação se encarregará de agravar nos custos.
A sentença recorrida é absolutamente omissa quanto a estes danos que o demandante alegou e provou, uma vez que sobre os mesmos não se pronuncia, limitando-se a referir os danos futuros previsíveis respeitantes às intervenções cirúrgicas e ajudas técnicas e relega-os para execução de sentença.
Vejamos.
É um facto notório - de acordo com os conhecimentos da Medicina – que quando atingir a idade de 20-25 anos o menor DD será submetido a intervenção cirúrgica que poderá reverter alguns dos problemas com que actualmente se confronta.
Do relatório do Instituto de Medicina Legal a fls. 482 consta que:
Foi observado nos serviços clínicos da companhia de seguros Alianz em meados de Janeiro de 2005, pelo Dr. R... de C..., sendo enviado ao serviço de Neurocirurgia do Hospital Egas Moniz onde se encontra em lista de espera para cirurgia que será efectuada quando tiver 20/25 anos.
Também consultou o Dr. A... do N..., neurocirurgião em Coimbra, que também informou que poderia ter alguma melhoria se fizesse uma cirurgia aos 20/25 anos.
Também a Companhia de Seguros Allianz veio indicar que a “incapacidade parcial permanente possa ser substancialmente diminuída se aos 18 anos se submeter com êxito a um transplante celular do epitélio olfactivo”.
Pelo que, com segurança, apenas se pode considerar que o DD nos próximos 15 anos terá de precisar das actuais medicações e fraldas, algalias, etc. pelo o montante indemnizatório será de fixar em € 23.851,67 x 15 anos = € 357.775,05 e que pelo pagamento imediato deverá ser reduzido em1/4, pelo se fixa em € 268.331,29 o montante de indemnização, a título de danos patrimoniais futuros e determináveis.
Assim, altera-se a sentença recorrida que, ao não atender aos danos futuros provados viola o disposto nos artºs 564º nºs 1 e 2 primeira parte, e 566º do C. Civil, fixando-se como danos patrimoniais futuros determináveis o montante de € 268.331,29 (duzentos e sessenta e oito mil trezentos e trinta e um euros e vinte e nove cêntimos), a pagar, solidariamente pelos demandados AA e T... F... R..., Lda.».

Esta decisão da Relação de Lisboa concitou a reacção dos demandados e do demandante, obviamente por razões diversas.
Os recorrentes demandados impugnam este segmento do acórdão recorrido, discordando apenas do montante de indemnização atribuído a título de danos patrimoniais futuros previsíveis e determináveis, fixados para os próximos 15 anos, no valor de 268.331,29 euros, calculado em seu entender com base num valor errado, invocando lapso de escrita no que toca ao preço das algálias, defendendo ser facto notório o seu preço, pretendendo a redução da indemnização para 20.531,25 euros – cfr. fls. 870 v.º e 871 e conclusões II - Danos Patrimoniais - 2ª a 19ª.
O demandante respondeu, alegando que os demandados ao impugnarem a sentença de 1ª instância não impugnaram os factos provados sob os n.º s 160 a 168, defendendo não constituir facto notório o preço das sondas urológicas, nem existir erro notório na apreciação da prova – cfr. fls. 882/4 das “contra alegações” e conclusões 1.ª a 4.ª.

Por seu turno, o demandante, no recurso subordinado, quanto à indemnização por danos futuros previsíveis determináveis, na motivação, a fls. 886/8, discorda da redução temporal operada, dizendo não constituir facto notório que o transplante celular do epitélio olfactivo possa reverter a situação em que se encontra; invoca factos provados nos pontos 197, 195, 160 a 166 da sentença e a contradição da interpretação da Relação com tais factos provados e considera que o acórdão até excede em optimismo os relatórios médicos que aconselham a intervenção cirúrgica, defendendo resultar vício de erro notório na apreciação da prova, pedindo, a final, a revogação do acórdão e sua substituição por outro que, reconhecendo estes danos, os fixe por 56 anos, e fixe a indemnização no montante peticionado - conclusões 9ª a 13ª.

Vistas as reacções das partes, facilmente ressalta do exposto serem dois os problemas a resolver, a saber:

- o da redução do período de indemnização relativa a estes danos, circunscrevendo-os a decisão recorrida aos “próximos 15 anos”;
- e a sua quantificação, sendo esta questão a colocar em qualquer dos casos, ou seja, independentemente da resposta àquele primeiro problema.

Primeira questão

Em causa a redução a 15 anos do período em que o lesado terá necessidade de medicamentação, algaliação, uso de fraldas e bebegel, por força de uma intervenção cirúrgica a ter lugar no futuro, que poderia operar uma reversão do estado clínico do demandante.
Desta compressão do período temporal de necessidade de medicamentos e tratamentos, resultou uma diminuição da indemnização.
Lembremos os termos exactos do prognóstico da Relação de Lisboa.
«É um facto notório - de acordo com os conhecimentos da Medicina – que quando atingir a idade de 20-25 anos o menor DD será submetido a intervenção cirúrgica que poderá reverter alguns dos problemas com que actualmente se confronta». (…)
«Pelo que, com segurança, apenas se pode considerar que o DD nos próximos 15 anos terá de precisar das actuais medicações e fraldas, algalias…».

Que dizer deste prognóstico, sem dúvida, eivado de optimismo?

Pressupostos da interpretação feita no acórdão são apenas duas informações retiradas de fls. 482 do relatório de uma “Perícia de avaliação do dano corporal”, realizada no Instituto Nacional de Medicina Legal em 08-05-2006, contidas no capítulo de “Informação - História do evento”, a qual contém apenas conclusões preliminares e de um relatório da seguradora demandada.

Há que analisar a questão em dois planos.

Primeiro a notoriedade. Depois, a conclusão retirada, ultrapassando as premissas.

I - Começando pela notoriedade.

Não carecem de prova nem de alegação os factos notórios, devendo considerar-se como tais os factos que são do conhecimento geral – artigo 514º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
Não basta qualquer conhecimento, pois como dizia Alberto dos Reis, CPC Anotado, vol. III, págs. 259/260 “é indispensável um conhecimento de tal modo extenso, isto é, elevado a tal grau de difusão que o facto apareça, por assim dizer, revestido do carácter de certeza”.
Por outro lado, como a notoriedade implica a ideia de publicidade, ele terá de ser conhecido de grande maioria dos cidadãos.
Manuel de Andrade, Teoria Geral, vol. II., pág. 89, tinha por notório “tanto aquilo que é geralmente sabido, como aquilo que é de per si evidente”, pois o que se “evidencia” torna-se susceptível de ser notado por qualquer pessoa de normal diligência, independentemente do seu “generalizado conhecimento”.
Como se extrai do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28-05-2002, revista n.º 1163/02-2ª, STJSAC2002, pág. 192, um facto é notório quando o juiz o conhece como tal, colocado na posição do cidadão comum, regularmente informado, sem necessitar de recorrer a operações lógicas e cognitivas, nem a juízos presuntivos.
A informação de que o DD “se encontra em lista de espera para cirurgia que será efectuada quando tiver 20/25 anos” e as opiniões médicas referidas constam de documentos juntos aos autos, que apenas serão conhecidos de, ou cognoscíveis por, um círculo muito restrito de pessoas com acesso aos mesmos.
Não se vê como possa constituir facto notório o saber-se se um paraplégico, que ficou nesse estado aos 8 anos, pode ter melhoria do seu estado se fizer uma cirurgia aos 20-25 anos e se a submissão, com êxito, a um transplante celular do epitélio olfactivo, aos 18 anos, pode diminuir substancialmente a incapacidade parcial permanente.
Acontece que nenhuma das referidas declarações documentais foi vertida nos factos provados, nem aliás, em rigor, o poderiam ser, pois não foi alegada tal matéria pelo demandante no enxerto cível, nem consta qualquer referência da contestação da seguradora, desconhecendo-se se foram alvo de discussão na audiência, de forma a entender-se o seu exacto sentido e alcance.
O acórdão recorrido assenta tão só nas declarações médicas, fazendo tábua rasa do que ficou provado - como se disse supra, a referência aos factos provados que antecedem a decisão recorrida neste segmento corresponde tão só ao que alegara o recorrente na motivação.
Muito diversamente, os factos dados por provados apontam para a irreversibilidade da situação clínica do demandante, como resulta dos seguintes pontos de factos provados: n.º 166 (medicamentos e ajudas técnicas prescritos para o resto da vida); n.ºs 120, 168 e 195 (situação irreversível de ausência de controle dos esfíncteres, obrigando a uso de fraldas) e n.º 197 (as perspectivas são as de ter de viver numa cadeira de rodas até ao fim dos seus dias).
Acresce que o acórdão recorrido louva-se em dois documentos que inclusive se desconhece se foram tidos em conta pela Exma. Julgadora, uma vez que nada se concretiza na motivação da decisão sobre a matéria de facto em sede de referência a documentos probatórios, ou seja, assenta a decisão recorrida a interpretação que faz em dois documentos, com carácter narrativo/informativo, que não chegam eles próprios sequer a ter visibilidade no texto da decisão, não sendo notórios tão pouco por esta via, pois que não chegam sequer a ser notados na sentença de Benavente, onde não se enxerga qualquer referência expressa a tais documentos.
Do documento do INML em que se baseia a decisão recorrida apenas consta que o demandante “se encontra em lista de espera para cirurgia que será efectuada quando tiver 20/25 anos” e que o demandante também consultou o Dr. A... do N..., neurocirurgião em Coimbra, que também informou que poderia ter alguma melhoria se fizesse uma cirurgia aos 20/25 anos.
A este nível, o que ficou provado - note-se que o acórdão recorrido baseia-se em declarações documentadas e não em matéria de facto provada - foi que os pais do DD levaram-no a uma consulta no Instituto de Cirurgia Reconstrutiva do Dr. A... N..., com vista a uma possível intervenção cirúrgica da parestesia dos membros inferiores (facto provado n.º 148) e que existe probabilidade do DD necessitar de tratamentos e/ou intervenções cirúrgicas para melhoria do seu estado clínico actual ou para resolução de complicações intestinais, respiratórias, urinárias ou para resolução de escaras cutâneas (facto provado n.º 149), sendo que estes factos foram extractados do alegado nos artigos 142º e 143º do pedido de indemnização.

II - A conclusão retirada “com segurança”

Não se vê como a partir dos argumentos utilizados se pode concluir o que quer que seja, relativamente ao que se passará no futuro, e muito menos, com a proclamada segurança.
Afirmar-se que a submissão a intervenção cirúrgica “poderá reverter alguns dos problemas com que actualmente se confronta” acaba por ser uma afirmação anódina, ficando por saber até que ponto operará a reversão da situação, qual a sua extensão e profundidade e efeitos práticos e, por outro lado, operando a reversão apenas em “alguns dos problemas”, perguntar-se-á quais seriam os ultrapassados e quais os que permaneceriam.
Se o neurocirurgião de Coimbra foi de opinião que se o demandante fizesse a cirurgia aos 20-25 anos, poderia ter alguma melhoria, dando assim parecer com alguma parcimónia e cuidado, evidente se torna que estamos perante uma afirmação do acórdão prenhe de optimismo, a ultrapassar o que o especialista diz, colocando no terreno da certeza o que para o expert foi tido como uma mera possibilidade (poderia ter) e mesmo assim de modo relativo (alguma melhoria), mas, perguntar-se-á, melhoria, como? em quê? com que grau de cumprimento de objectivos?
Apoia-se ainda o acórdão num documento da Companhia de Seguros A... onde se refere que a “incapacidade parcial permanente possa ser substancialmente diminuída se aos 18 anos se submeter com êxito a um transplante celular do epitélio olfactivo”.
Igualmente a indicação encerra mera informação, em si mesma com carácter dubitativo, em primeiro lugar, porque é preciso que o transplante se processe com êxito, e depois, porque tendo sido um êxito, não se seguirá a certeza de ser alcançado bom resultado, apenas se indicando que poderá a incapacidade ser substancialmente diminuída, isto é, não se dá por adquirido o conseguir um bom resultado, que só o seria se a redução fosse substancial, ficando ainda por saber que limite atingiria a incapacidade no final, em caso de sucesso, na melhor das hipóteses - redução a 40%?, a 20%?, a 10%?.
Mas conferindo bondade ao afirmado, dando de barato que assim seria, sempre se colocaria então a questão de saber se na hipótese de o transplante correr bem aos 18 anos, seguir-se-ia ou não ainda a intervenção aos 20-25 anos.
Daqui que não possa afirmar-se que, com segurança, o DD apenas nos próximos 15 anos necessitará das actuais medicações, fraldas, algálias e bebegel.
Invocar-se-á a este propósito, acórdão de 15-07-1966, BMJ, n.º 159, pág. 383, ainda no domínio do Código de Seabra, onde se escreveu: “No cálculo das consequências do facto danoso, o juiz obedecerá ao critério da normalidade, procurando determiná-las segundo o curso ordinário dos acontecimentos. Nesse ponto o ónus da prova funciona a favor do demandante, cumprindo ao demandado demonstrar que essas consequências se não verificariam. Por isso não deve atender-se a meras possibilidades de recuperação do ofendido que podem ou não concretizar-se”.

Resulta do exposto que este segmento do acórdão recorrido, relativo à duração do período da necessidade destas despesas, não deverá subsistir, devendo ser revogado.
Deverá, em substituição, ser considerado o período que vai de Abril de 2006, data da interposição do pedido de indemnização, até aos 65 anos do demandante, como expressamente pedido (artigo168.º do pedido de indemnização).
Justificando-se a opção do indicado termo inicial pela circunstância de resultar dos autos que até então estas despesas foram suportadas pela seguradora e quando deixaram de estar a cargo desta, passaram a ser suportadas pelos pais do demandante, que as incluíram – mal – no pedido formulado e que foram desconsideradas - bem - com absolvição por falta de legitimidade.
Será de considerar, assim, o período de 55 anos (o demandante à data do pedido tinha 10 anos de idade e não 9, como por lapso dali consta, nos artigos 167.º e 189.º).

Segunda questão

Em causa neste aspecto está a quantificação dos danos futuros previsíveis e determináveis, restringindo-se, porém, o desacordo relativamente ao preço das algálias, defendendo os demandados que o valor global foi calculado com base num valor errado, exagerado daquelas, sendo facto notório o seu preço, com um valor mais baixo, tratando-se de lapso de escrita, existindo uma evidente violação de uma regra de direito probatório, pretendendo a redução do montante da indemnização (restrita aos 15 anos) para € 20.531,25 – cfr. fls. 870 v.º e 871 e conclusões II - Danos Patrimoniais - 2ª a 19ª.
O demandante respondeu, alegando que os demandados ao impugnarem a sentença de 1ª instância não impugnaram os factos provados sob os n.º s 160 a 168, defendendo não constituir facto notório o preço das sondas urológicas, nem existir erro notório na apreciação da prova – cfr. fls. 882/4 das “contra alegações” e conclusões 1ª a 4ª do recurso.

Apreciando.

Como já se referiu, a sentença de Benavente omitiu por completo pronúncia sobre esta parte do pedido (não colhe a posição dos demandados - expressa na motivação, no item M), a fls. 871 - de virem agora dizer que não foram vencidos relativamente a absolvição de pagamentos de medicamentos, algálias e fraldas, pois se certo é que foram efectivamente absolvidos, a verdade é que então em causa estavam despesas já efectuadas e pagas pelos pais do demandante DD, que por isso mesmo, por ilegitimidade daqueles, determinou a absolvição dos demandados quanto a tais parcelas, estando aqui e agora em causa apenas despesas futuras, realizadas pós Abril de 2006, que igualmente integravam a causa de pedir).
Face à omissão de pronúncia da sentença de Benavente, o demandante, no recurso interposto, arguiu a nulidade correspondente.
E notificados do recurso, em dupla via, os demandados, assim alertados da posição da parte contrária, nada disseram.
Na verdade, o recorrente procedeu à notificação do recurso à Mandatária dos demandados, nos termos do artigo 229.º-A, do CPC em 7-4-2008 (fls. 776) e procedeu o tribunal a essa notificação por carta de 27-08-2008 (fls. 781).
Os demandados interpuseram recurso da sentença de Benavente, circunscrito apenas a matéria de direito e à parte civil, como inclusive proclamam no intróito da motivação, como consta de fls. 739.

Na fundamentação da sua divergência, no presente recurso, os demandados socorrem-se de diversas qualificações, que arrancando da afirmação de que o cálculo do valor das algálias teve por base um valor errado, passam por estar-se perante um lapso de escrita, um facto notório (quanto ao preço), errada avaliação das provas - “divergência entre a verdade dos factos e o que é afirmado na decisão” -, violação de uma regra de direito probatório e “um vício resultante do texto da decisão conjugada com as regras da experiência comum” - conclusão 9ª – não especificado, mas que só pode ser, atento o contexto da arguição, o da alínea c) do n.º 2 do artigo 410º do Código de Processo Penal – erro notório na apreciação da prova.

Vejamos a questão à luz dos vícios decisórios, maxime o da referida alínea c) do n.º 2 do artigo 410º do C.P.P. e da errada valoração das provas.

Como decorre do artigo 26.º da LOFTJ e do artigo 434.º do Código de Processo Penal, que estabelece que “Sem prejuízo do disposto nos n.ºs 2 e 3 do artigo 410º, o recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça visa exclusivamente o reexame de matéria de direito”, os poderes de cognição deste Supremo Tribunal encontram-se limitados ao reexame da matéria de direito, razão pela qual não se pode intrometer na decisão proferida sobre a matéria de facto, tendo de ter por assente a facticidade dada por provada pelas instâncias.
O Supremo Tribunal de Justiça conhece apenas de direito, não podendo o recurso ter como fundamento a invocação de qualquer dos vícios decisórios do artigo 410º, n.º 2, do Código de Processo Penal, sem prejuízo de, oficiosamente, poder indagar da existência de algum deles, mas sempre dentro dos limites estreitos de cognição de tais vícios.
Ora, a Relação confirmou o decidido - sobre a eventual verificação dos vícios se debruçou o acórdão recorrido, no ponto 4, a fls. 833/4, concluindo pela inexistência de qualquer deles.
Como é sabido, a partir de 01-01-1999, na sequência da reforma do Código de Processo Penal, operada pela Lei nº 59/98, de 25-08, deixou de ser possível interpor recurso para o STJ com fundamento na verificação dos vícios previstos no artigo 410º, nº 2, do CPP, isto é, a incursão do STJ no plano fáctico da forma restrita consentida pelo artigo 410º não é já possível face a questão colocada pelo interessado, a pedido do recorrente, mas por iniciativa própria deste Supremo Tribunal, para evitar que a decisão de direito se apoie em matéria de facto ostensivamente insuficiente, fundada em erro de apreciação, ou assente em premissas contraditórias detectadas por iniciativa do STJ, conforme é jurisprudência corrente - cfr. acórdãos deste Supremo Tribunal, de 17-01-2001, de 25-01-2001, de 22-03-2001, in CJSTJ 2001, tomo 1, págs. 210, 222 e 257; de 04-10-2001, CJSTJ2001, tomo 3, pág. 182 (aqui se declarando que o Tribunal de recurso tem o poder-dever de fundar a “boa decisão de direito” numa “boa decisão de facto”), de 30-01-2002, processo 3739/01-3ª; de 16-05-2002, CJSTJ 2002, tomo 2, pág. 202; de 24-03-2003, CJSTJ 2003, tomo I, pág. 236; de 27-05-2004, in CJSTJ 2004, tomo II, 209 (o STJ só pode/deve conhecer dos vícios se concluir que, por força da existência de qualquer deles, não pode chegar a uma correcta solução de direito); de 30-03-2005, no processo nº 136/05-3ª; de 03-05-2006, nos processos n.ºs 557/06 e 1047/06, ambos da 3ª secção; de 18-05-2006, nos processos n.ºs 800/06 e 1293/06, ambos da 3ª secção; de 20-12-2006, in CJSTJ 2006, tomo 3, pág. 248; de 04-01-2007 no processo n.º 2675/06-3ª; de 08-02-2007, no processo n.º 159/07-5ª; de 15-02-2007, nos processos n.ºs 15/07 e 513/07 (defendendo-se neste o conhecimento oficioso dos vícios como preâmbulo do conhecimento do direito), ambos da 5ª secção; de 21-02-2007 no processo n.º 260/07-3ª; de 02-05-2007, nos processos n.ºs 1017/07, 1029/07 e 1238/07; de 10-10-2007, processo n.º 3315/07, todos da 3ª secção e ainda Simas Santos e Leal Henriques, Código de Processo Penal Anotado, 2ª edição, II volume, p. 967, citado no referido acórdão de 25 de Janeiro de 2001, onde se pondera: “O considerar-se que não podem invocar-se os vícios do nº 2 do art. 410º como fundamento do recurso directo para o STJ de decisão final do tribunal colectivo, não significa que este Supremo Tribunal não os possa conhecer oficiosamente, como ocorre no processo civil, e é jurisprudência fixada pelo STJ (…).
E como mais recentes, podem ver-se os acórdãos de 26-03-2008, processo n.º 4833/07-3ª; de 21-05-2008, processo n.º 678/08-3ª; de 05-06-2008, processo n.º 1226/08-5ª; de 02-07-2008, processo n.º 3861/07-3ª; de 22-10-2008, processo n.º 215/08-3ª; de 29-10-2008, processo n.º 1016/07-5ª; de 27-01-2009, processo n.º 3978/08-3ª; de 26-02-2009, processo n.º 3547/08-5ª; de 12-03-2009, processo n.º 3173/08-5ª; de 30-04-2009, processo n.º 273/04.0JAPRT.S1-5ª; de 18-06-2009, processos n.ºs 81/04.8PBBGC.S1-3ª e 1248/07.2PAALM-3ª.

Ao afirmar “estarmos claramente perante uma divergência entre a verdade dos factos e o que é afirmado na decisão” os demandados pretendem sindicar matéria de facto, fazendo-o pela primeira vez e perante o Supremo, imputando uma errada valoração das provas, invocação que não tem cabimento em recurso para o Supremo de acórdão confirmativo da Relação.
Há que ter em conta que a fixação da matéria de facto teve na sua base uma apreciação da prova segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador, nos termos do artigo 127.º do Código de Processo Penal.
Como esclareceu o acórdão de 21-05-1992, BMJ n.º 417, pág. 404, “O STJ, como tribunal de revista, não dispõe de poderes de crítica ou censura sobre o concreto desempenho do princípio da livre apreciação da prova exercitada pelo tribunal a quo”, e mais recentemente, o acórdão de 08-02-2006, processo n.º 98/06-3ª, no sentido de que “a deficiente apreciação da prova produzida é matéria que escapa aos poderes do STJ”.
É jurisprudência corrente a de que são totalmente irrelevantes as considerações do recorrente quanto à pretensão de ver discutida a prova feita no julgamento e de solicitar que o STJ modifique tal prova e passe a aceitar como realidade aquilo que o interessado pretende corresponder ao sentido do que teria resultado do julgamento e a que o Tribunal passasse a aceitar como definitiva a factualidade que invoca – acórdãos do STJ, de 12-01-1994, de 29-06-1994, de 12-01-1995, de 06-03-1996, de 04-06-1996, de 04-07-1996, de 10-07-1996, de 18-09-1996, de 08-01-1997, de 15-01-1997, de 13-01-1998, de 13-01-1999, in, respectivamente, BMJ n.º 433, pág. 231; CJSTJ 1994, tomo 2, pág. 258; CJSTJ 1995, tomo 1, pág. 181; CJSTJ 1996, tomo 2, pág. 165; BMJ n.º 458, pág.169; CJSTJ 1996, tomo 2, pág. 243; BMJ n.º 459, págs. 178 e 283; n.º 463, págs. 189 e 429; n.º 473, pág. 307 e n.º 483, pág. 49.

Os vícios previstos no artigo 410.º, n.º 2, do CPP, nomeadamente, o erro notório na apreciação da prova, não podem ser confundidos com a insuficiência de prova para a decisão de facto proferida ou com a divergência entre a convicção pessoal do recorrente sobre a prova produzida em audiência e a convicção que o tribunal firme sobre os factos, questões do âmbito da livre apreciação da prova, princípio inscrito no citado normativo - artigo 127.º do Código de Processo Penal – e não se estando perante prova legal ou tarifada, não pode o tribunal superior sindicar a boa ou má valoração daquela, e querer discutir, nessas condições, a valoração da prova produzida é afinal querer impugnar a convicção do tribunal, olvidando a citada regra.
Neste aspecto, o que releva, necessariamente, é essa convicção formada pelo tribunal, sendo irrelevante, no âmbito da ponderação exigida pela função de controlo ínsita na identificação dos vícios do artigo 410.º, n.º 2, do CPP, a convicção pessoalmente alcançada pelo recorrente sobre os factos.
Os recorrentes esquecem que decisão recorrida é o acórdão da Relação e não a sentença de Benavente.

Não tendo os demandados oportunamente colocado a questão de matéria de facto, em seu entender indevidamente dada por assente, corresponderá a invocação agora feita ao lançar mão de uma questão nova sobre a qual não se debruçou a apreciação da Relação.
Suscitando os recorrentes pela primeira vez, aqui e agora, a questão em causa sem dúvida estamos face a uma questão nova, que corresponde à colocação de um problema novo, em primeira mão, que não foi exposto no primeiro recurso, que não propuseram à consideração do Tribunal da Relação.
Os recursos ordinários visam o reexame da decisão proferida dentro dos mesmos pressupostos em que se encontrava o tribunal recorrido no momento em que a proferiu.
Sendo os recursos meios de impugnação e de correcção de decisões judiciais e não meio de obter decisões novas, não pode o tribunal de recurso ser chamado a pronunciar-se sobre questões não suscitadas ao tribunal recorrido.
Constitui jurisprudência uniforme a de que os recursos se destinam a reexaminar decisões proferidas por jurisdição inferior, visando apenas apurar a adequação e legalidade das decisões sob recurso, e não a obter decisões sobre questões novas, não colocadas perante aquelas jurisdições.

O Tribunal Superior, visando apenas a reapreciação de questões colocadas anteriormente e não a apreciação de outras novas, não pode conhecer de argumentos ou fundamentos que não foram presentes ao tribunal de que se recorre – neste sentido, vejam-se os acórdãos do STJ de 27-07-1965, BMJ n.º 149, pág. 297; de 26-03-1985, BMJ n.º 345, pág. 362; de 05-02-1987, BMJ n.º 364, pág. 787 (os recursos visam modificar as decisões impugnadas e não a criar decisões sobre matéria nova, como resulta dos artigos 676º-1 e 684º-2 do CPC); de 02-12-1998, BMJ n.º 482, pág. 150; de 12-07-1989, BMJ n.º 389, pág. 510; de 09-03-1994, processo n.º 43402; de 01-03-2000, processo n.º 43/00, SASTJ, nº 39, pág. 55; de 05-04-2000, processo n.º 160/00; de 06-06-2001, processo n.º 1874/02-5ª (não pode o STJ conhecer em recurso trazido da Relação de questões não colocadas perante este Tribunal Superior, mesmo que resolvidas na decisão da 1ª instância); de 28-06-2001, processo n.º 1293/01-5ª; de 26-09-2001, processo n.º 1287/01-3ª; de 16-01-2002, processo n.º 3649/01-3ª; de 22-10-2003, processo n.º 2446/03-3ª, SASTJ, nº 74, pág. 147; de 30-10-2003, processo n.º 3281/03-5ª (os recursos, como remédios jurídicos que são, não se destinam a obter decisões ex novo sobre questões não colocadas ao tribunal a quo, mas sim a obter o reexame das decisões tomadas sobre pontos questionados, procurando obter o cumprimento da lei); de 27-05-2004, CJSTJ 2004, tomo 2, pág. 209; de 20-07-2006, processo n.º 2316/06-3ª; de 02-05-2007, processo n.º 1238/07-3ª; de 10-10-2007, processo n.º 3634/07-3ª; de 17-10-2007, processo n.º 3878/07-3ª; de 30-04-2008, processo n.º 4723/07-3ª; de 12-06-2008, processo n.º 4375/08-3ª; de 11-02-2009, processo n.º 4132/08-3ª; de 07-05-2009, processo n.º 352/02.8TAETR.C1.S1-3ª; de 27-05-2009, processo n.º 484/09-3ª.

Não cabe aqui e agora analisar documento particular junto em audiência para ajuizar do acerto da fixação da matéria de facto apurada no ponto 163 dos factos provados.
Por último, remetendo-se para o que acima se disse a propósito de facto notório, evidente se torna que o preço das algálias não é facto notório, qualquer que seja a noção que se tenha presente.
De qualquer forma sempre se adiantará que lido o texto de Benavente confirmado pela Relação, não se vislumbra a existência de qualquer vício, maxime, o do erro notório na apreciação da prova, não o comportando o texto de per si considerado ou em conjugação com a s regras da experiência comum
Conclui-se não se verificar qualquer vício, mantendo-se a matéria de facto dada por provada.
Mas, considerando o período de 55 anos nos termos supra expostos, ao longo do qual terão lugar estas despesas, a circunstância de algumas delas se irem processando, de forma regular, mas espaçadamente, como acontece com os comprimidos, o Lindonostrum - gel e mesmo as fraldas, tendo em conta que o demandante receberá de uma vez a soma em causa, com os ganhos que com esse recebimento global antecipado poderá obter, mas por outro lado, não podendo deixar de se atender à provável evolução no sentido de subida dos preços dos bens em causa, mas sendo conveniente proceder a uma quantificação imediata, recorrendo por isso a um juízo de equidade, tendo em atenção a eventualidade versada nos pontos de factos provados n.ºs 148 e 149, fixar-se-á o valor destes danos futuros previsíveis determináveis em 120.000 euros, assim se julgando improcedente o recurso dos demandados e parcialmente procedente o do demandante.

QUESTAO III – ERRO NOTÓRIO NA APRECIAÇÃO DA PROVA - (DEDUÇÃO DO MONTANTE JÁ PAGO PELA SEGURADORA)

Analisemos agora a divergência do demandante com o decidido pela Relação, que ao montante global encontrado como indemnização a atribuir àquele, deduziu, por conta do pedido, a quantia de 54.550,71 €, já paga pela seguradora.
Em causa a questão de saber se ao montante global de indemnização fixado, haverá que deduzir apenas a quantia recebida pelo demandante na sequência do contrato de transacção celebrado aquando do julgamento, ou também as quantias respeitantes a despesas pagas anteriormente pela seguradora.
Na motivação de recurso, a fls. 891 a 893, o demandante invoca erro notório na apreciação da prova por o acórdão recorrido, após ter determinado o montante global da indemnização a atribuir ao demandante, ter deduzido não apenas o montante de 465.449,29 euros acertado na transacção e que recebeu da seguradora por conta do pedido de indemnização formulado, mas também o valor de 54.550, 71 €, pago por despesas anteriores a hospitais e instituições que prestaram serviços, como fisioterapia e ajudas técnicas, pagamento de medicamentos, ou transportes pagos antes da entrada em juízo do pedido cível e não peticionados - conclusões 18ª a 23ª.
Esclarece que quando deduziu o pedido peticionou somente as despesas que ainda não tinham sido pagas, que não foram recebidas por conta do pedido.
Ao abater na indemnização devida os valores das despesas pagas pela seguradora, não peticionadas no pedido e nem recebidas por si o acórdão lavra em erro que o próprio texto da decisão demonstra, invocando o artigo 410º, n.º 2, alínea c), do Código de Processo Penal.

Apreciando.

Não há qualquer vício decisório, maxime, o invocado erro notório na apreciação da prova, pois que não se está claramente no plano da fixação da matéria de facto, feita na sentença da primeira instância, ou apreciação do acerto dessa mesma fixação, quando a Relação determina essa dedução, antes se tratando de eventual erro de julgamento.
Relativamente a esses vícios, trata-se de vícios de lógica jurídica ao nível da matéria de facto, que tornam impossível uma decisão logicamente correcta e conforme à lei. Vícios da decisão, não do julgamento, como se exprime Maria João Antunes, RPCC, Janeiro-Março 1994, pág. 125.
O montante pago pela seguradora de € 54.550,71 refere-se a despesas hospitalares, assistência médica e medicamentosa, transportes, fisioterapia, pagas às instituições, respectivas credoras, antes da dedução do pedido, não peticionadas pelo demandante, que não entraram no património do lesado, não tendo sido recebidas por conta do pedido, que as não contemplava sequer, porque saldadas.
Sendo certo que a seguradora assegurou medicamentos e serviços, desconhecendo-se o momento exacto até ao qual assim procedeu, certo é que a partir de determinada altura deixou de o fazer, passando os pais do DD a efectuar esses pagamentos, como consta dos factos provados n.ºs 140, 151, 152, 153, 154 e 155, de modo que vieram eles próprios pedir o reembolso de tais despesas.
Aliás, os recorrentes demandados no recurso interposto para a Relação, assim o haviam entendido, ou seja, estar em causa apenas a dedução do montante recebido em virtude da transacção, como se mostra pelas conclusões então apresentadas:
15. Além disso, o montante já pago pela demandada civil A...- 465 449,29 euros – (…) deverá ser tido em conta, … .
19. Pelo que, face ao pagamento da quantia de 465.449.29 pela demandada Allianz (…).

Não há qualquer erro na apreciação da prova nem qualquer contradição, antes mero equívoco, que urge corrigir.
Assim, no montante indemnizatório global que vier a ser fixado, será de abater apenas o montante de 465.449, 29 €, quantitativo pago pela seguradora, efectivamente recebido pelo demandante por conta do pedido, na sequência do contrato de transacção celebrado aquando da audiência de julgamento e que homologado foi.
Nestes termos, procede a pretensão do demandante, mas por razões diversas das invocadas.


QUESTÃO IV - DANOS NÃO PATRIMONIAIS


Neste segmento, o demandante distinguiu dois aspectos.
Num primeiro, expresso nos artigos 192.º a 195.º do pedido de indemnização, foca a impotência e a impossibilidade de procriação resultantes das lesões sofridas em consequência do acidente consubstanciadoras de dano que resulta da violação do direito à integridade física e à sexualidade, computando a violação deste direito de personalidade em 100.000,00 €.
Num outro, ao longo dos artigos 196.º a 222.º da mesma peça processual, alega factos integrantes de danos morais cuja compensação computa em 300.000,00 €.
Daqui decorre que, não sendo de autonomizar a indemnização por dano resultante da violação do direito à sexualidade e à procriação, que radica no direito à integridade física, integrando uma das componentes de danos não patrimoniais, o pedido global de indemnização por tais danos atinge o montante de 400.000,00 €.
A decisão de primeira instância, atendendo àqueles dois aspectos, fixou a indemnização por danos não patrimoniais em 150.000,00 €.
Os demandados no recurso interposto para a Relação defenderam como justa e equilibrada uma indemnização de 70.000,00 €.
O demandante, por seu turno, manteve a posição assumida no pedido.

O acórdão recorrido, de fls. 849 a 854, após transcrever o teor da sentença recorrida neste segmento e expor as posições de demandante e demandados no recurso, apôs apenas o seguinte, a fls. 854 (realces do texto):
«A indemnização civil deve ser fixada equitativamente, conforme dispõe o n.º 3 do art.º 496.º do C.P.Penal, tendo em conta em qualquer caso as circunstâncias referidas no art.º 494.º do C.Civil (vd. Ac.STJ.de 22.11.1977,BMJ.271,212; Ac. RC de 3.7.1979,BMJ.291,545; Ac.RE de 27.11.1979CJ1979, Tomo 5; Ac STJ de 22.1.1980,BMJ.293,327).
Não é comparável o dano morte ou perda do direito à vida, com o dano não patrimonial aqui em análise. Trata-se além do mais de um sofrimento que perdurará por muitos anos.
Assim, afigura-se justa e equilibrada a indemnização para pagamento dos danos morais peticionada no pedido de indemnização civil, porque adequada ao previsto nos artºs 496º e 494º do C.Civil, fixar o montante de € 100.000 (cem mil euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais».

Vejamos as posições de ambas as partes expressas no presente recurso.

Os demandados, não obstante o Tribunal da Relação ter baixado a indemnização para 100.000,00 euros, continuam a achar excessivo o montante encontrado, pretendendo a sua redução para 70.000,00 € - conclusões I - Danos Não Patrimoniais - 1ª, 2ª e 3ª - fls. 871vº.
Por seu turno, o demandante, a fls. 888 a 891, invoca desde logo o lapso manifesto em que terá incorrido o acórdão recorrido ao mencionar como pedido o montante arbitrado de 100.000,00 €, quando pedira 300.000,00 €, defendendo como justa e equilibrada a fixação no valor peticionado – conclusões 14ª a 17ª.
Os demandados vieram responder apresentando a peça de fls. 903/4, alegando que quanto à situação económica do arguido, da demandada civil e do lesado, nada de concreto se provou, havendo um deficit de matéria de facto, o que constitui o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada previsto no artigo 410º, n.º2, alínea a), do Código de Processo Penal com possível reenvio do processo para novo julgamento.


Apreciando.

Em primeiro lugar, há que anotar que o recorrente demandante pede a fixação da indemnização em 300.000,00 €, sem ter aqui em consideração a verba de 100.000,00 €, pedida a título de indemnização pelo dano de violação do direito de personalidade de integridade física, na vertente de dano sexual e de impossibilidade de procriação.
O recorrente cinge-se aqui ao valor de 300.000,00 €, respeitante àquilo que considerou estritamente como danos não patrimoniais no artigo 222º do pedido de indemnização por si deduzido, com exclusão daquela outra parcela, o que não significa que aquele dano seja desconsiderado na apreciação que se segue.

Convém desde já clarificar que no que respeita ao alegado manifesto lapso em que terá incorrido o acórdão recorrido quanto a referir como peticionada apenas a quantia de cem mil euros, não nos parece que se possa retirar do texto do acórdão que se tenha tido em conta como pedida a quantia de 100 mil euros.
Diversamente, em relação à indemnização peticionada, e sem precisar o seu valor, o acórdão recorrido considerou justa e equilibrada a fixação naquela quantia e apenas isso.

Estabelece o artigo 496.º, n.º 1, do Código Civil, que na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.

Estatui a primeira parte do n.º 3 do mesmo preceito legal, que “o montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º”.
Os critérios para fixação/composição do montante indemnizatório/compensatório, as circunstâncias mencionadas no citado artigo 494.º, são o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso.

No domínio do Código de Seabra era discutida a questão de saber se o mesmo consagrara a possibilidade de reparação dos danos morais, defendendo Guilherme Moreira e Dias da Silva a insusceptibilidade dessa reparação do dano moral e José Tavares e Cunha Gonçalves, o reconhecimento em termos amplos do direito à indemnização por prejuízos civis, sem excluir os danos morais – cfr. a este propósito e da conexão da questão com o § 2.º do artigo 34.º do Código de Processo Penal de 1929, Manuel Gomes da Silva, in O dever de prestar e de o dever de indemnizar, Lisboa, 1944, volume I, págs. 65 a 74; ainda a este propósito, cfr. Inocêncio Galvão Telles, Direito das Obrigações, 4ª edição, 1982, Coimbra Editora, Lda., págs. 296 a 302; Fernando Pessoa Jorge, Ensaio…, págs. 374 a 376; Almeida Costa, Direito das Obrigações, 11ª edição, 2008, pág. 599; Jorge Ribeiro de Faria, Direito das Obrigações, 2003, vol. I, págs. 488 a 491; António Meneses Cordeiro, Da Responsabilidade Civil dos Administradores das Sociedades Comerciais, Lex, 1997, págs. 476 a 480, com indicação da evolução da jurisprudência desde 1947; Maria Manuel Veloso, Danos não patrimoniais, trabalho inserto no volume III, Direito das Obrigações, da obra Comemorações dos 35 anos do Código Civil e dos 25 anos da Reforma de 1977, Coimbra Editora, 2007, pág. 496.
O Código Civil de 1966 introduziu uma cláusula geral de ressarcibilidade dos danos não patrimoniais no artigo 496.º, consagrando essa ressarcibilidade com alcance geral, “em termos generosos”, segundo Pessoa Jorge, Ensaio…, pág. 376, para quem “a reparação dos danos não patrimoniais escapa, em larga medida, às coordenadas legais do sistema da responsabilidade civil”, mas para Meneses Cordeiro, Da Responsabilidade Civil …, pág. 478, em termos “um tanto deprimidos”, com “circunspecção” que “levou a jurisprudência a grande parcimónia, num primeiro momento”, pronunciando-se o mesmo Autor no Tratado de Direito Civil Português, 1999, I volume, pág. 167, no sentido de que “não oferece dúvidas o alargamento deste preceito menos conseguido”.
Como se pode ler no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16-04-1991, BMJ n.º 406, pág. 618, com este preceito fixou-se definitivamente, não uma concepção materialista da vida, mas um critério que consiste que se conceda ao ofendido uma quantia em dinheiro considerada adequada a proporcionar-lhe alegrias ou satisfações que, de algum modo, contrabalancem as dores, desilusões, desgostos ou outros sofrimentos que o ofensor lhe tenha provocado.
O legislador não fornece uma definição de danos não patrimoniais, mas indica os requisitos de ressarcibilidade deste tipo de dano, regula a legitimidade no caso de morte e os específicos critérios de avaliação do dano.
Danos não patrimoniais são os que afectam bens não patrimoniais (bens da personalidade), insusceptíveis de avaliação pecuniária ou medida monetária, porque atingem bens, como a vida, a saúde, a integridade física, a perfeição física, a liberdade, a honra, o bom nome, a reputação, a beleza, de que resultam o inerente sofrimento físico e psíquico, o desgosto pela perda, a angústia por ter de viver com uma deformidade ou deficiência, os vexames, a perda de prestígio ou reputação, tudo constituindo prejuízos que não se integram no património do lesado, apenas podendo ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo mais uma satisfação do que uma indemnização, assumindo o seu ressarcimento uma função essencialmente compensatória, de modo a atenuar os padecimentos derivados das lesões e a neutralizar a dor física e psíquica sofrida, embora sob a envolvência de uma certa vertente sancionatória ou de pena privada.
Para Manuel Gomes da Silva, loc. cit., pág. 65, dano moral em sentido rigoroso é somente o que atinge bens imateriais e que, portanto, não pode ser apreendido pelos sentidos; mas é preferível tomar aquela expressão num alcance mais amplo, considerando dano moral todo aquele que não for avaliável em dinheiro, ou seja, todo aquele que não for patrimonial, porque os problemas que se levantam acerca do dano moral em sentido estrito suscitam-se de igual modo a respeito de todos os danos insusceptíveis de apreciação pecuniária.
Na definição de Vaz Serra, in BMJ, n.º 83, pág. 69, «dano não patrimonial é o que tem por objecto um interesse não patrimonial, isto é, um interesse não avaliável em dinheiro».
Para Galvão Telles, loc cit. pág. 296, nos danos não patrimoniais há a ofensa de bens de carácter imaterial – desprovidos de conteúdo económico, insusceptíveis verdadeiramente de avaliação em dinheiro. São bens como a integridade física, a saúde, a correcção estética, a liberdade, a honra, a reputação. A ofensa objectiva desses bens tem em regra um reflexo subjectivo na vítima, traduzido na dor ou no sofrimento, de natureza física ou de natureza moral.
O Prof. Antunes Varela, in Das Obrigações em Geral, 3ª edição, volume I, pág. 496, identifica os danos não patrimoniais com “os prejuízos (como as dores físicas, os desgostos morais, os vexames, a perda de prestígio ou de reputação, os complexos de ordem estética) que, sendo insusceptíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens (como a saúde, o bem estar, a liberdade, a beleza, a perfeição física, a honra ou o bom nome) que não integram o património do lesado, apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo esta mais uma satisfação do que uma indemnização”.
Segundo Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3ª edição, pág. 115, os interesses cuja lesão desencadeia um dano não patrimonial são infungíveis; não podem ser reintegrados mesmo por equivalente. Mas é possível, em certa medida, contrabalançar o dano, compensá-lo mediante satisfações derivadas da utilização do dinheiro, em virtude da sua aptidão para propiciar a realização de uma ampla gama de interesses, na qual se podem incluir mesmo interesses de ordem refinadamente ideal.
Como expendia Figueiredo Dias, em “Sobre a reparação de perdas e danos arbitrada em Processo Penal”, Almedina, 1972, em publicação autónoma e reimpressão de trabalho publicado, pela primeira vez, como contribuição do Autor para os Estudos «in memoriam» do Professor Beleza dos Santos que, em 1963, formaram o volume XVI do Suplemento ao Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra, a págs. 38/39, “quanto aos chamados danos morais costuma acentuar-se que eles não comportam, por sua natureza, uma indemnização verdadeira e própria, mas tão só uma satisfação, daí provindo a inaplicabilidade, quanto a eles, dos critérios propostos pela teoria de diferença. Todavia, quando não se queira ver aquela satisfação como um corpo estranho ao instituto da responsabilidade civil, no qual se incrusta, há que atribuir-lhe, também a ela, a única função de colocar, quanto possível, o lesado na situação anterior ao facto lesivo; pelo que o critério de avaliação há-de ser o de procurar rigorosamente determinar uma quantia capaz de possibilitar ao lesado prazeres e alegrias que compensem os danos morais causados. Em suma, pois, quer se trate de danos patrimoniais quer morais a obrigação civil de indemnizar tem como critério determinante da sua extensão, fundamentalmente, - para não dizermos unicamente – o critério do dano”.
No sentido de a indemnização constituir apenas uma satisfação, podendo a dor sofrida ser contrabalançada mediante uma soma capaz de proporcionar prazeres ou satisfações à vítima que de algum modo atenuem ou compensem esse dano, veja-se Pinto Monteiro, Sobre a reparação dos danos morais, in Revista Portuguesa do Dano Corporal, Setembro de 1992, n.º 1, 1º Ano, págs. 17 a 25.
E para Dario Martins de Almeida, in Manual de Acidentes de Viação, Almedina, 1980, 2ª edição, pág. 267, «dano não patrimonial é todo aquele que afecta a personalidade moral, nos seus valores específicos».
E acrescentava, a seguir: “Caprichosamente, a vida empenha-se em fornecer muitos exemplos desta figura jurídica – além da dor física, da humilhação, da angústia de ver um filho entre a vida e a morte, vem a dor moral relacionada com uma alteração estética tanto na mulher como no homem, com a perda da potência sexual, com a diminuição do prestígio, com o forçado e prolongado internamento num hospital».

Em casos como o presente, de responsabilidade civil conexa com a criminal, em que o exercício da pretensão ressarcitória se processa no âmbito do processo de adesão, aquela tem a sua génese num facto ilícito, sendo um crime a sua fonte, a sua causa, o seu facto constitutivo, uma das componentes da complexa causa de pedir.
No caso em apreciação, a partir da decisão da 1ª instância, a acção cível conexa, exercida em conjunto com a penal, face ao esgotamento do capital do seguro e consequente afastamento da demandada seguradora, prossegue apenas contra o arguido/demandado e a co-demandada civil proprietária do veículo por aquele conduzido.

Segundo se extrai do acórdão de 28-02-1969, BMJ n.º 184, pág. 267, e RLJ, ano 103, págs. 176 e ss., ainda, pois, no domínio do Código de Seabra, o dano não patrimonial ou dano moral é insusceptível de avaliação em dinheiro, e representa a dor corporal sofrida, bem como o prejuízo de equilíbrio anímico ou espiritual, a perdida alegria de viver.
Como referia o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25-11-1998, BMJ n.º 481, pág. 470, na noção geral de dano não patrimonial cabem a dor física e moral, o prejuízo estético, o prejuízo de afirmação social, a perda do sentimento de auto-estima, a amputação da alegria de viver.

O dano não patrimonial não se reconduz a uma única figura, tendo vários componentes e assumindo variados modos de expressão, abrangendo o chamado quantum (pretium) doloris, que sintetiza as dores físicas e morais sofridas no período de doença e de incapacidade temporária, com tratamentos, intervenções cirúrgicas, internamentos, a analisar através da extensão e gravidade das lesões e da complexidade do seu tratamento clínico; o “dano estético” (pretium pulchritudinis), que simboliza o prejuízo anátomo-funcional associado às deformidades e aleijões que resistiram ao processo de tratamento e recuperação da vítima; o “prejuízo de distracção ou passatempo”, caracterizado pela privação das satisfações e prazeres da vida, vg., com renúncia a actividades extra-profissionais, desportivas ou artísticas; o “prejuízo de afirmação social”, dano indiferenciado, que respeita à inserção social do lesado, nas suas variadas vertentes (familiar, profissional, sexual, afectiva, recreativa, cultural, cívica), integrando este prejuízo a quebra na “alegria de viver”; o prejuízo da “saúde geral e da longevidade”, em que avultam o dano da dor e o défice de bem estar, e que valoriza as lesões muito graves, com funestas incidências na duração normal da vida; os danos irreversíveis na saúde e bem estar da vítima e o corte na expectativa de vida; o prejuízo juvenilpretium juventutis”, que realça a especificidade da frustração do viver em pleno a chamada primavera da vida, privando a criança das alegrias próprias da sua idade; o “prejuízo sexual”, consistente nas mutilações, impotência, resultantes de traumatismo nos órgãos sexuais; o “prejuízo da auto-suficiência”, caracterizado pela necessidade de assistência duma terceira pessoa para os actos correntes da vida diária, decorrente da impossibilidade caminhar, de se vestir, de se alimentar – acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 15-12-1998, recurso n.º 972/98, CJSTJ 1998, tomo 3, pág. 155; de 29-04-1999, revista n.º 218/99-2ª, STJSAC1999, pág. 163; de 06-07-2000, revista n.º 1861/00, CJSTJ 2000, tomo 2, pág.144 e BMJ n.º 499, pág. 309, de 17-01-2002, revista n.º 4181/01-7ª, STJSAC2002, pág. 37, todos do mesmo relator; de 19-10-2004, revista n.º 2897/04 - 6ª; de 19-01-2006, revista n.º 3500/05-6ª; de 18-06-2009, processo n.º 1632/01.5SILSB.S1-3ª – cfr. Dário Martins de Almeida, loc. cit., págs. 129 e 130, que encara estes prejuízos como “sequelas de lesões corporais”, com reflexos não patrimoniais, embora ligadas, nalguns casos, à incapacidade permanente e, por conseguinte, com certas conexões de carácter patrimonial.
Quanto ao dano estético, afirma Duarte Nuno Vieira, A “missão” de avaliação do dano corporal em direito civil, in Sub Júdice, n.º 17, Janeiro/Março 2000, págs. 23 e ss., que sempre que existe um qualquer prejuízo na estética de que a vítima era portadora previamente ao evento causador do dano, terá de ser avaliado o dano estético de que ficou afectada.
Na avaliação deste dano, esclarece, tem sido defendida entre nós a sua personalização, isto é, uma avaliação individualizada, que levará a que danos similares possam ter uma valorização distinta em função da pessoa em causa, em função do impacto que têm para ela, pois que com a excepção dos casos em que assume as virtualidades de dano patrimonial, o dano estético é essencialmente o sofrimento psíquico que as sequelas estéticas comportam para a vítima.
Na sua avaliação o perito está a perspectivar o sofrimento psicológico que determinada sequela com implicações estéticas comporta para aquela vítima, tentando penetrar no impacto psicológico que o dano estético tem para a vítima, procurando não conferir demasiada relevância às tabelas, representando apenas valor indicativo em termos de harmonização de procedimentos.
A propósito deste dano (ressarcível igualmente enquanto dano patrimonial se tiver reflexo económico na vida da pessoa afectada), dizia-se no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27-01-1976, BMJ n.º 253, pág. 174 “O prejuízo estético, representando uma alteração morfológica da vítima de acidente de viação, traduz-se numa diminuição da sua integridade física, havendo nesse caso uma clara lesão de interesses de ordem material e de ordem espiritual, que impõe se reconheça o direito a indemnização, com autonomia em relação ao valor atribuído ao pretium doloris”. Seguindo esta definição e enquadramento, vejam-se os acórdãos de 23-09-1998, processo n.º 553/98; de 08-06-1999, revista n.º 391/99, BMJ n.º 488, pág. 323 e de 20-06-2000, revista n.º 408/00-1ª, STJSAC2000, pág. 205, e com consideração deste dano, os acórdãos de 22-11-1977, BMJ 271/212 (frisando igualmente a autonomia do dano); de 08-03-1979, BMJ 285/290; de 25-11-1998, BMJ 481/470; de 09-11-1999, revista n.º 759/99-6ª; STJSAC1999, pág. 349 (considerando apenas dano estético); de 16-05-2000, revista n.º 328/00-2ª, STJSAC2000, pág. 186; de 08-02-2001, revista n.º 3940/00-7.ª Secção, STJSAC 2001, pág. 71 (atribuindo cifra própria para o dano estético); de 17-12-2002, revista n.º 3898/02-1.ª, STJSAC, 2002, pág. 377 (cfr. listagem infra); de 30-10-2003, revista n.º 2818/03-2ª; de 29-10-2008, processo n.º 3380/08-5ª; de 25-03-2009, revista n.º 421/09-6ª.
Sobre a caracterização e critérios de avaliação deste prejuízo ver Pedro Branquinho Ferreira Dias, O Dano Moral na Doutrina e na Jurisprudência, Almedina, 2001, págs. 40 a 44.
E com referência ao pretium juventutis, podem ver-se aplicações desta componente do dano nos acórdãos de 03-11-2005, revista n.º 2698705-2ª; de 19-01-2006, revista n.º 3500/05-2ª; de 02-11-2006, revista n.º 3326/06-2ª.

Na prática jurisprudencial tem-se assistido a uma valorização mais acentuada dos bens da personalidade física, espiritual e moral atingidos pelo acto lesivo, bens ligados à afirmação pessoal, social e profissional, actualmente com maior visibilidade, que hoje são objecto de maior consideração, conduzindo a uma interpretação actualista e extensiva das normas que tutelam direitos da personalidade com consagração constitucional, estando-se longe do tempo da discussão acerca da ressarcibilidade do dano moral (Gomes da Silva, Pessoa Jorge, Almeida Costa, Ribeiro de Faria, Maria Manuel Veloso, loc. citados supra) e as conquistas e progressos da sociedade moderna, a conferirem uma maior amplitude e abrangência da tutela compensatória a este nível.
O fenómeno da extensão da responsabilidade civil, a contribuição dos danos não patrimoniais para a transformação em curso e o acréscimo de tutela dos direitos de personalidade são realidades que se entrecruzam, como dá conta Maria Manuel Veloso, loc. cit., págs. 506/8.
Sobre o alargamento geral da responsabilidade civil, nomeadamente usada para tutela das pessoas, veja-se António Meneses Cordeiro, Da Responsabilidade Civil dos Administradores das Sociedades Comerciais, Lex, 1997, págs. 471 a 481.
A extensão da tutela não se coloca apenas ao nível de cobertura de bens afectados, antes de pessoas atingidas, com o alargamento do círculo dos destinatários ou beneficiários da indemnização por dano não patrimonial, com maior projecção nos direitos de personalidade, contemplando os danos morais indirectos, o chamado “dommage par ricochet”.
Sobre a ressarcibilidade, no âmbito da responsabilidade civil extra-contratual dos danos de natureza não patrimonial suportados por pessoas diversas do lesado directo, do ofendido atingido directamente por lesões de natureza física ou psíquica graves, veja-se o estudo de António Santos Abrantes Geraldes, em “Ressarcibilidade dos danos não patrimoniais de terceiro em caso de lesão corporal” em Estudos em Homenagem do Professor Inocêncio Galvão Telles, Almedina, Novembro de 2003, volume IV, págs. 263 a 289.
O mesmo Autor aborda ainda esta problemática em Temas da Responsabilidade Civil, II volume, Indemnização dos danos reflexos, Almedina, 2ª edição, págs. 35 a 94.
Jorge Ribeiro de Faria, Direito das Obrigações, 2003, vol. I, pág. 491, nota 2, defende que o facto de não ter ocorrido a morte da vítima não impede que os parentes do lesado se vejam sem indemnização pelos danos morais que tenham sofrido, pois, sendo o artigo 496º, n.º 2, uma disposição excepcional, ela não é insusceptível de interpretação extensiva, e, portanto, de ser alargada a casos que caibam no espírito da lei.
Neste sentido se pronunciava já Vaz Serra, na RLJ, ano 104.º, págs. 15/6, em anotação a acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13-01-1970, BMJ n.º 193, pág. 349, supra citado, que negara indemnização a pai de menor pelo desgosto pelo aleijão que resultara para aquele do acidente.
Não concordando com a solução, escreveu: “embora sejam excepcionais as disposições que reconhecem a certos parentes do lesado imediato um direito de indemnização, elas são susceptíveis de interpretação extensiva (Cód. Civil, art. 11º), e, por conseguinte, de extensão a outros casos compreendidos no espírito da lei”.
Sousa Dinis, in Dano corporal em acidentes de viação, CJSTJ 2001, tomo 1, págs. 11 e 12, dá conta de no Congresso de Bilbau, em Junho de 2000, ter defendido a possibilidade de a mulher do lesado ter direito a uma indemnização por danos não patrimoniais pela impotência do marido, buscando fundamento na consideração de a sexualidade poder ser encarada como um direito de personalidade.

Pronunciando-se contra e defendendo um sentido restritivo da norma, Antunes Varela, em comentário ao acórdão do STJ, de 25-05-1985, BMJ nº 347, pág. 398, na RLJ, ano 123.º, págs. 185 a 192, 251/6 e 278 a 281.
Estando em causa saber se os cônjuges tinham direito à indemnização dos danos não patrimoniais sofridos com a morte de filho nascituro provocada pelo acidente de viação, em que foi atingida a mulher, grávida de nove meses, e tendo esse direito sido reconhecido pelas instâncias, discordou da atribuída ao marido, dizendo:
“Em regra só tem direito a indemnização o titular do direito violado ou do interesse legalmente protegido que tenha sido ofendido com a prática do facto ilícito.
No caso concreto do acórdão, não há nenhum direito subjectivo do autor ou queixoso que tenha sido violado, pois assim como não há qualquer direito subjectivo à integridade do património em geral, nenhum direito à integridade da esfera sentimental ou do património afectivo ou emocional (passe a expressão) de cada um é consagrado na lei”.
E depois de afirmar existir um interesse afectivo ou emocional dos familiares da vítima da agressão excepcionalmente protegido nos n.º s 2 e 3 do artigo 496º do Código Civil, conclui: “Todavia, desde que o acórdão, recusando (e bem) a equiparação do nascituro à pessoa já nascida com vida, retirou o tapete dos n.º s 2 e 3 do artigo 496º do Código Civil debaixo dos pés dos demandantes, como progenitores do feto que se perdeu, nenhuma base legal se encontra para justificar o direito à indemnização que os tribunais por onde correu a acção unanimemente reconheceram ao autor”.

Como aplicação prática de construção actualista, com base no artigo 68º da CRP, contrariando o carácter fortemente restritivo da previsão legal, temos o exemplo do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25-11-1998, revista n.º 865/98-2ª secção, BMJ n.º 481, pág. 470, em caso de prejuízos irreversíveis resultantes de aleijões nas mãos e da desfiguração da face, sofridos por bébé de 7 meses de idade, em infantário, na sequência de incêndio.
Para além de indemnização por danos futuros e compensação do dano não patrimonial sofrido pelo bebé, fixada em 20.000.000$00, o acórdão fixou ainda em 1.000.000$00, para cada um, a compensação pelos danos não patrimoniais a favor dos progenitores.
No acórdão de 08-03-2005, revista n.º 4486/04-6ª, em caso de lesado de 27 anos de idade, que ficou na situação de tetraparésia, é fixada a indemnização por danos não patrimoniais em 250.000 euros.
Pondera-se em tal aresto: “O facto de a mulher do Autor, por causa da impotência que o ficou a afectar, ter ficado privada de manter com ele relações sexuais constitui um trauma cuja intensidade e continuidade justificam uma interpretação extensiva do normativo civil onde se contempla o ressarcimento dos danos não patrimoniais –art.ºs 11º e 496º, n.º 1, do CC. Se a violação injustificada do dever de coabitação (art.º 1672 do CC), de que um dos elementos é o débito conjugal, constitui facto idóneo como fundamento para a dissolução do vínculo conjugal (art.ºs 1779, n.º 1, e 1788 do CC), há que concluir que o mesmo reveste a natureza de um verdadeiro direito de personalidade de cada um dos cônjuges, pelo que a sua privação resultante de acto de terceiro é geradora de responsabilidade civil a cargo do respectivo lesante – art.ºs 70 e 496, n.ºs 1 e 2, do CC”.
No acórdão de 30-05-2006, revista n.º 1259/06-6ª, do mesmo relator do anterior e com um voto de vencido, foi reconhecido direito a indemnização à mulher de lesado em acidente de viação, que estava numa cama, sem ver, falar, ouvir e circular, incontinente, em estado comatoso, sendo necessário auxiliá-lo 24 horas por dia, vindo a falecer cerca de 4 anos após o acidente, sendo a autora que estava ao seu serviço.
Seguindo de perto a opinião de Santos Geraldes em “Estudos…” e o acórdão precedente, conclui que “a irreversível situação gerada pelo estado clínico do A. constitui um trauma, que, pela sua intensidade e continuidade, se mostra justificativo da aplicabilidade, em tais circunstâncias, de uma interpretação extensiva do normativo civil onde se contempla o ressarcimento dos danos não patrimoniais - arts. 11º e 496º, n.º 1 do CC e anotação do Prof. Vaz Serra in RLJ 104º/14 e segs.”, tendo em vista igualmente, com a argumentação do anterior, a limitação do direito à liberdade sexual da pessoa casada, bem como a limitação ou privação da liberdade de deslocação da A, resultante das sequelas de que padeceu o marido e da qualidade de enfermeira daquele, que assumiu naquele período. Estamos assim perante a atribuição de um direito de indemnização por danos não patrimoniais reflexos decorrentes de dano corporal sofrido pelo autor marido.
No acórdão de 26-05-2009, revista n.º 3413/03.2TBVCT.S1-1ª, defende-se que não se deve interpretar restritivamente o n.º 1 do artigo 496º do C. Civil por via do seu n.º 2. Por isso, considerando que a qualidade de vida da autora, mulher do lesado, ficou profundamente afectada, os seus direitos conjugais amputados numa parte importante para uma mulher jovem e o seu projecto de ter mais filhos irremediavelmente comprometido, assiste-lhe o direito a indemnização, a título de danos não patrimoniais equitativamente fixado em € 50.000,00.
E mais recentemente, o acórdão deste Supremo de 08-09-2009, na revista n.º 2733/06.9TBBCL.S1-6ª, abordando caso de indemnização por danos não patrimoniais invocados pelo marido da lesada, com fundamento no facto provado de que a vida sexual do casal terminou com o acidente.
Daí se colhe que “São concretamente ressarcíveis os danos morais sofridos pelo autor em consequência do acidente de viação que vitimou a autora, sua mulher, e do qual resultaram para esta lesões e sequelas várias que comprometeram gravemente os direitos de coabitação (no qual se inclui o débito conjugal), cooperação e assistência de que o autor é titular enquanto membro da sociedade conjugal formada com a autora. Nesta perspectiva, tais danos são directos, e não reflexos ou causados a terceiros, na medida em que atingem concomitantemente ambos os autores, enquanto pessoas casadas entre si”.

Ao invés, é afastada a possibilidade desse alargamento, defendendo-se não ser possível uma interpretação extensiva ou actualista, sendo a indemnização limitada aos danos sofridos pelo próprio lesado, por serem direitos de carácter estritamente pessoal, nos acórdãos de 13-01-1970, BMJ n.º 193, pág. 349, comentado negativamente por Vaz Serra, RLJ ano 104, pág. 14; de 02-11-1995, recurso (crime) n.º 46783, CJSTJ 1995, tomo 3, pág. 220 e BMJ n.º 451, pág. 49 (cfr. mais especificações na listagem infra).
O acórdão de 18-03-1997, revista n.º 893/96, citado como exemplo de abertura, de admissão de ressarcibilidade, na Revista Portuguesa do Dano Corporal, Novembro 2000, n.º 10, pág. 36, não o é efectivamente, muito embora toda a exposição anterior fizesse crer nessa solução, maxime, quando afirma que “Pode acontecer que as gravíssimas e permanentes consequências suportadas pela vítima e a suportar para o resto da sua vida, sejam fortemente sentidas e percutidas pelo seu consorte. Em ordem até não menos inferior à perda de vida da vítima. O Direito não lhe poderá ficar indiferente”.
No caso concreto ficara provado que “A mulher do A. teve forte receio que o A. marido morresse ou ficasse imobilizado em consequência das lesões sofridas no acidente”.
No acórdão fez-se accionar o “travão” da exigência de gravidade do dano para estancar “o perigo de extensão da obrigação de indemnizar”, acabando por acompanhar o acórdão recorrido ao denegar tal indemnização, por se considerar que o dano provado “não tem aquela gravidade mínima que mereça a tutela do direito”.
Ainda neste mesmo sentido, os acórdãos
de 21-03-2000, revista n.º 1027/00-1ª, CJSTJ 2000, tomo 1, pág. 138, denegando aos pais do lesado o direito a serem indemnizados a título de danos não patrimoniais sofridos por causa de acidente com mota de água em que foi lesado o filho;
de 30-04-2003, revista n.º 4489/02-7ª – denegando aos pais de menor de 9 anos lesada em acidente de viação, indemnização por danos não patrimoniais decorrentes das lesões sofridas pela filha. Argumenta-se que o crédito de indemnização, tanto do dano patrimonial como não patrimonial entronca no titular do direito ou do interesse imediatamente violados, só excepcionalmente se estendendo a terceiros, como nas hipóteses consideradas nos diferentes números do artigo 495º e no n.º 2 e na segunda parte do n.º 3 do artigo 496º, ambos do Código Civil. E depois remata: “Estender, por argumento de analogia, o comando do n.º 2 do art. 496º a situações como a dos autos carece de validade, visto que não procede neste a razão justificativa da extensão a terceiros do direito de indemnização pelo dano não patrimonial, e que é, precisamente, a morte da vítima; como norma excepcional ela seria, aliás, insusceptível de aplicação analógica, nos termos do art. 11º do Cód. Civ.” Após o que se afirma: “Por mais intensas e atrozes que tenham sido as dores morais dos pais, elas não deixam de ser uma consequência indirecta, reflexa, do acto lesivo da integridade física do menor”.
de 26-02-2004, revista n.º 4298/03 - 2ª - denegando a indemnização a mulher casada com vítima de acidente de viação causador de lesões que provocaram disfunção eréctil;
de 31-10-2006, revista n.º 3244/06 - 6ª - denegando indemnização aos pais do menor lesado com explosão de engenho explosivo;
de 01-03-2007, revista n.º 4025/06-7ª - denega indemnização por danos não patrimoniais reflexamente sofridos pelo marido e filhos, decorrentes dos danos causados à lesada que em consequência do acidente ficou paralisada e com perturbações mentais, considerando que a ofensa a um membro da família não acarreta nem confere direito a indemnização a outro membro da família, sendo inaplicável o disposto no n.º 2 do art. 496º do CC, norma legal que não pode ser objecto de interpretação extensiva;
de 17-09-2009, revista n.º 292/1999-09.S1-6ª - seguindo de perto o citado acórdão de 21-03-2000, repristina decisão negatória da 1ª instância, denegando indemnização por dano familiar, sofrido pela mulher e filhos do lesado (tem dois votos de vencido, sendo um deles por subscritor dos acórdãos de 08-03-2005 e de 08-09-2009).
de 08-10-2009, revista n.º 28/02.6TJPRT.S1-7ª – caso de lesado, médico, que sofreu em consequência de acidente de viação ocorrido em 19-11-1996, lesão traumática medular, ficando com incapacidade permanente parcial de 50%, incontinência parcial dos esfíncteres anal e vesical, perda de equilíbrio, dificuldades na marcha, tropeçando com facilidade, que deixou de ajudar o filho que padece de grande deficiência, para além do mais, pedira indemnização pelas despesas que passou a fazer com a contratação de terceira pessoa para auxiliar o filho paraplégico.
Com a mesma argumentação “os danos sofridos por terceiros, danos que são apenas um reflexo dos danos sofridos pela vítima, danos que são uma consequência indirecta ou mediata da conduta daquele que violou directamente os direitos ou interesses da vítima, não são, em princípio, indemnizáveis” é denegada esta indemnização, esclarecendo-se que “Como o invocado dano não é um dano directo do evento danoso, mas apenas uma consequência indirecta do facto lesante, em que o lesado é o filho do A. e não o próprio A., não há lugar a esta pretendida indemnização”.

A “Quantificação” do dano


Presente neste domínio deverá estar a consideração do melindre que a “quantificação”/valoração de tais danos sempre acarreta, procurando traduzir-se em quantia certa de coisa fungível (a mais fungível das coisas), o que por natureza é insusceptível de mensuração e de redução a uma expressão numérica, não tendo cabimento uma reparação por equivalente, encerrando óbvias dificuldades a tradução em números do que por definição não tem tradução matemática, procurando ter-se em conta todo o cortejo de dores e sofrimentos padecidos, por vezes, o corte abrupto dos sonhos e das ambições, dos projectos de vida, bem como o reflexo, o rebate da perda de autonomia de vida em diversos aspectos, com todas as consequentes limitações, sob múltiplas formas, da vivência do demandante e os efeitos imediatos e mediatos de todas as sequelas das lesões sofridas.
Neste domínio, em que não entram considerações do “ter” ou “possuir”, “perder”, ou “ganhar”, mas do “ser”, “sentir”, ou “sonhar”, não rege a teoria da diferença, nem faz sentido o apelo ao conceito de dano de cálculo, pois que a indemnização/compensação do dano não patrimonial não se propõe remover o dano real, nem há lugar a reposição por equivalente.
Como referia Vaz Serra, in BMJ n.º 83, pág. 83, “a satisfação ou compensação dos danos morais não é uma verdadeira indemnização, no sentido de um equivalente do dano, isto é, de um valor que reponha as coisas no seu estado anterior à lesão. Trata-se apenas de dar ao lesado uma satisfação ou compensação do dano sofrido, uma vez que este, sendo apenas moral, não é susceptível de equivalente”.
Como a propósito diz Maria Manuel Veloso, loc cit., pág. 499, a “falsa” equivalência com um dado valor pecuniário é assim um constructo, uma ficção e não, como ocorre nos danos patrimoniais, um sucedâneo, um equivalente pecuniário.
Antunes Varela, Das obrigações em Geral, Almedina, 9.ª edição, 1998, págs. 627/8, expende que “da restrição do art. 496 extrai-se indirectamente uma outra lição: a de que o montante da reparação deve ser proporcionado à gravidade do dano, devendo ter-se em conta na sua fixação todas as regras da boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida. É este, como já foi observado por alguns autores, um dos domínios onde mais necessários se tornam o bom senso, o equilíbrio e a noção das proporções com que o julgador deve decidir”.
E como assinala na mesma obra, pág. 502 «A indemnização reveste, no caso dos danos não patrimoniais, uma natureza acentuadamente mista: por um lado, visa compensar de algum modo, mais do que indemnizar, os danos sofridos pela pessoa lesada; por outro lado, não lhe é estranha a ideia de reprovar ou castigar, no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado, a conduta do agente».
Para Galvão Telles, em Direito das Obrigações, Coimbra Editora, 4.ª edição, 1982, págs. 304/5 e nota 1, o montante da reparação pecuniária dos danos não patrimoniais é fixado mediante o cômputo equitativo de uma compensação, em que se atenderá, não só e antes de mais à própria extensão e gravidade dos prejuízos, mas também ao grau de culpabilidade do agente, à situação económica deste e do lesado e demais circunstâncias do caso, defendendo este Autor que a reparação dos danos morais não reveste puro carácter indemnizatório, mas também, de certo modo, carácter punitivo. É indemnização, se bem que indirecta, na medida em que se apresenta como uma compensação em cuja fixação se atende à gravidade dos danos. É pena - pena privada, estabelecida no interesse da vítima – na medida em que se apresenta como um castigo em cuja fixação se atende ainda ao grau de culpabilidade e à situação económica do lesante e lesado, estando-se perante uma providência mista, que participa da natureza de indemnização e da natureza de pena.
Segundo Almeida Costa, Direito das Obrigações, 11.ª edição, 2008, págs. 604/5, a determinação do montante indemnizatório ou compensatório que corresponde aos danos não patrimoniais calcula-se segundo critérios de equidade, devendo atender-se, não só à extensão e gravidade dos danos, mas também ao grau de culpa do agente, à situação económica deste e do lesado, assim como a todas as outras circunstâncias que contribuam para uma solução equitativa.
Meneses Cordeiro, Da Responsabilidade Civil dos Administradores das Sociedades Comerciais, Lex, 1997, pág. 481, refere que a indemnização por danos morais no domínio dos acidentes tem o escopo duma pena, sendo sublinhado o seu papel retributivo, o seu escopo preventivo. “Trata-se de aspectos marcantes, na prática do nosso sistema de responsabilidade: o funcionamento lento dos tribunais e a depreciação monetária dão, muitas vezes, às indemnizações, mais o sentido duma retribuição, pelo mal feito, do que, propriamente, um conteúdo compensatório efectivo”.
A valoração dos danos não patrimoniais depende de uma apreciação sobre matéria de direito.
Como ensinava Vaz Serra, BMJ n.º 90, pág. 201, sempre que na sentença se faça uso da equidade, isso constitui matéria de direito, susceptível, portanto, de apreciação no STJ, constituindo jurisprudência pacífica - vg., acórdãos de 28-04-1977, BMJ n.º 266, pág. 165 e de 20-01-2001 e de 19-11-2002, revistas n.ºs 2014/01-6ª e 3289/02-6ª.

É consensual a ideia de que só são indemnizáveis os danos não patrimoniais que afectem profundamente os valores ou interesses da personalidade física ou moral, medindo-se a gravidade do dano por um padrão objectivo, embora tendo em conta as circunstâncias do caso concreto, mas afastando-se os factores subjectivos, susceptíveis de sensibilidade exacerbada, particularmente embotada ou especialmente fria, aguçada, requintada, e apreciando-se a gravidade em função da tutela do direito; o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado – Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, 7.ª edição, volume I, pág. 600; Vaz Serra, RLJ, ano 109º, pág. 115; Rabindranath Capelo de Sousa, O Direito Geral de Personalidade, Coimbra Editora, 1995, pág. 459, Jorge Ribeiro de Faria, Direito das Obrigações, 2003, vol. I, pág. 491; e Dário Martins de Almeida, loc. cit., pág. 268, referindo: “São as circunstâncias que acompanham o caso concreto - normalmente circunstâncias de carácter objectivo - que hão-de trazer à superfície essa gravidade, ajudando também a distinguir a dor real da dor fingida”.
A propósito da indagação da existência de uma componente subjectiva no apuramento da gravidade dos danos e da contemporização do critério dominante, revelando-se forte tendência para valorar o dano não patrimonial à luz de factores atinentes à especial sensibilidade do lesado em casos de danos causados por lesão dos direitos de personalidade e no âmbito das relações de vizinhança, cfr. Maria Manuel Veloso, loc. cit. págs. 505/7.

Como se extrai do acórdão de 17-11-2005, revista n.º 3436/05-7ª, CJSTJ 2005, tomo 3, pág. 127, “A apreciação da gravidade do dano embora tenha de assentar, como é natural, no circunstancialismo concreto envolvente, deve operar sob um critério objectivo, num quadro de exclusão, tanto quanto possível, da subjectividade inerente a alguma particular sensibilidade humana”.
A este propósito podem ver-se os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 22-11-1977, BMJ n.º 271, pág. 212 (o valor dos danos não patrimoniais para efeitos de indemnização por lesões resultantes de acidente de viação deve ser medido por um padrão objectivo e realista, tendo em conta as circunstâncias do caso); de 25-05-1985, BMJ n.º 347, pág. 398; de 15-01-1987, BMJ n.º 363, pág. 501; de 26-06-1991, BMJ n.º 408, pág. 538; de 04-03-2004, revista n.º 4439/03-2ª; de 9-12-2004, CJSTJ 2004, tomo 3, pág. 137; de 13-01-2005, revista n.º 4477/04-7ª; de 22-09-2005, revista n.º 2586/05-7ª; de 17-11-2005, CJSTJ 2005, tomo 3, pág. 127; de 25-05-2006, revista n.º 1686/06-7ª; de 11-07-2007, processo n.º 1583/07-3ª; de 18-12-2007, revista n.º 3715/07-7ª; de 26-06-2008, revista n.º 628/08, CJSTJ 2008, tomo 2, pág. 131, de 22-10-2008, processo n.º 3265/08-3ª; de 29-10-2008, processo n.º 3380/08-5ª; de 25-02-2009, processo n.º 3459/08-3ª; de 15-04-2009, processo n.º 3704/08-3ª; de 23-04-2009, revista n.º 292/04-7ª.

Determinação do montante compensatório - Factores a ter em conta na fixação do montante correspondente a compensação por danos não patrimoniais.

O montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção as circunstâncias referidas no artigo 494.º, como decorre do n.º 3 do artigo 496º do Código Civil, sendo de atender ao grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso.
Este normativo “sucede” ao artigo 56º, n.º 2, do Código da Estrada de 1954, que estabelecia que “a indemnização consistirá no pagamento de uma quantia fixada pelo prudente arbítrio do julgador, que deverá atender ao grau de culpabilidade do agente, ao dano material e moral causado pelo acidente, à situação económica e à condição social do lesado e do responsável”.

Critérios para compensação dos danos não patrimoniais.

Neste aspecto, para além da equidade, como guia do julgador, presente no n.º 3 do artigo 496.º do Código Civil e dos critérios estabelecidos no artigo 494.º do mesmo Código, ter-se-ão em conta as soluções jurisprudenciais.

Equidade

Com a cláusula de equidade, prevista em geral no artigo 4.º e permitida, no que ora interessa, nos artigos 496.º, n.º 3 e 566.º, n.º 3, do Código Civil, o tribunal resolverá o litígio ex aequo et bono e não ex jure stricto.
O juízo ou critério equitativo corresponde ao “prudente arbítrio do julgador” presente no artigo 56º, n.º 2, do Código da Estrada de 1954 e artigo 34º, § 2º, do Código de Processo Penal de 1929.
José Tavares, Princípios Fundamentais do Direito Civil, vol. I, pág. 50, ensinava que a função característica da equidade era “tomar na devida consideração as circunstâncias especiais do caso concreto, e não aplicar a norma geral na sua rigidez”. “A equidade é, pois, a expressão da justiça num dado caso concreto”.
Observa Castanheira Neves, Questão de Facto - Questão de Direito, 1967, pág. 351, que a “equidade”, exactamente entendida, não traduz uma intenção distinta da intenção jurídica, é antes um momento essencial da juridicidade”.
Aí se cita, a pág. 317, juízo de Aristóteles: “ O equitativo, sendo embora justo, não o é em conformidade com a lei, mas antes como aperfeiçoamento do justo legal”.
Como ensinam Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, volume I, pág. 54, ao decidir segundo a equidade, o julgador não está subordinado aos critérios normativos fixados na lei. E a fls. 501, referem: “O montante da indemnização correspondente aos danos não patrimoniais deve ser calculado em qualquer caso (haja dolo ou mera culpa do lesante) segundo critérios de equidade, atendendo ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e às do lesado e do titular da indemnização, às flutuações do valor da moeda, etc.
E deve ser proporcionado à gravidade do dano, tomando em conta na sua fixação todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida”.
Como se pode ler em Dario Martins de Almeida, Manual de Acidentes de Viação, Almedina, 1980, 2ª edição, págs. 103 a 105, “ quando se faz apelo a critérios de equidade, pretende-se encontrar somente aquilo que, no caso concreto, pode ser a solução mais justa: a equidade está assim limitada sempre pelos imperativos da justiça real (a justiça ajustada às circunstâncias) em oposição à justiça meramente formal. Por isso se entende que a equidade é sempre uma forma de justiça. A equidade é a resposta àquelas perguntas em que está em causa o que é justo ou o que é mais justo. E funciona em casos muito restritos, algumas vezes para colmatar as incertezas do material probatório; noutras, para corrigir as arestas de uma pura subsunção legal, quando encarada em abstracto. (…) A equidade é uma justiça de proporção, de adequação às circunstâncias, de equilíbrio”. Conclui: “Em síntese, a proporção, a adaptação às circunstâncias, a objectividade, a razoabilidade e a certeza são as linhas de força da equidade quando opera, com os ditames da lei, na análise e compreensão e solução do caso concreto”.
Antunes Varela, em anotação na RLJ, ano 129º, pág. 210, refere-se à equidade, a par da intuição e do sentimento de justiça, como situando-se no leito de um rio (em que o julgador pretende atingir a foz), que corre entre as margens da matéria de facto e da matéria de direito.
Ana Prata, no Dicionário Jurídico, 4ª edição, 2005, pág. 499, refere “Julgar segundo a equidade significa dar a um conflito a solução que parecer mais justa, atendendo apenas às características de situação e sem recurso à lei eventualmente aplicável. A equidade tem, consequentemente, conteúdo indeterminado, variável de acordo com as concepções de justiça dominantes em cada sociedade e em cada momento histórico”.
Em causa está conceito relacionado com justiça natural, igualdade, imparcialidade, justiça.
Na definição da Lexicoteca, Moderna Enciclopédia Universal, Círculo de Leitores, tomo VII, pág. 170, equidade é critério de aplicação do direito a um caso concreto fundamentado em razões de justiça e não em norma legal preestabelecida.
Na Polis, Enciclopédia Verbo da Sociedade e do Estado, edição da Universidade Católica Portuguesa, 1984, volume 2 - D. F, de págs. 988 a 997, Mário Bigotte Chorão na aproximação ao conceito, salienta a concepção de equidade como justiça do caso concreto, i. é, uma forma de justiça que, superando a mera justiça legal, se adequa às circunstâncias da situação singular, podendo dizer-se que é a justiça enquanto concretizada na solução de cada caso; é uma realidade essencialmente jurídica, embora translegal, que serve para a mais plena realização da justiça (e do direito). Por meio dela se consegue sortir de la legalité pour rentrer dans le droit.
No Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, edição da Academia de Ciências de Lisboa, Verbo, Volume I, pág. 1470, de que foi coordenador João Malaca Casteleiro, após citar-se um excerto de Eurico, o Presbítero, de Alexandre Herculano, fornece-se uma noção popular de equidade, como sendo “abatimento voluntário no preço de venda de bens; baixa de preço”.
Noutro âmbito, do Direito e Filosofia, é definida como “Justiça natural, não sujeita aos critérios normativos da lei, mas adaptada às circunstâncias concretas e particulares do caso a julgar, moderando a lei no que ela apresenta de impessoal e abstracto”.
No acórdão de 28-10-1980, BMJ n.º 300, pág. 386, referia-se que ao exercício da aequitas associa-se sempre a prática dum “prudente arbítrio” atentas as circunstâncias do caso.
Outras abordagens em acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça:
28-04-1993, recurso criminal n.º 43918, BMJ n.º 426, pág. 267: a fórmula “equitativamente”deve ser interpretada segundo o critério de um “bom pai de família”.
04-12-1996, revista n.º 406/96 e de 18-03-1997, revista n.º 793/96, do mesmo relator, in BMJ n.º 462, pág. 396 e CJSTJ 1997, tomo 2, pág. 24, diz-se: o apelo a critérios de equidade tem em vista o encontrar no caso concreto uma solução mais justa – aquela é sempre uma forma de justiça. Ainda do mesmo relator o acórdão de 26-11-2002, revista n.º 3567/02-6ª.
10-02-1998, revista n.º 847/97, in CJSTJ 1998, tomo 1, pág. 65 - “A equidade é a justiça do caso concreto, flexível, humana, independente dos critérios normativos fixados na lei”.
15-12-1998, revista n.º 972/98, in CJSTJ 1998, tomo 3, pág. 155 - Trata-se de processo de acomodação dos valores legais às características do caso concreto, não podendo prescindir do que é normal acontecer (do id quod plerumque accidit), tendo em conta os componentes do dano, como as suas consequências, o grau de lesão, a culpa na produção do acidente, a situação económica do lesado, o valor do dinheiro e os critérios jurisprudenciais pregressos – cfr. do mesmo relator o acórdão de 06-07-2000, revista n.º 1861/00, CJSTJ 2000, tomo 2, pág. 144 e BMJ n.º 499, pág.309.
14-04-1999, recurso criminal n.º 1409/08, CJSTJ 1999, tomo 2, pág. 174 - a equidade é vista como cláusula geral, critério valorativo de apreciação e definida como um dos institutos previstos no Código Civil, a par da boa fé, abuso de direito, bons costumes, que permitem ao julgador evitar decisões menos rectas mas formalmente rigorosas, ficando a cargo da jurisprudência a adaptação da lei à realidade das situações concretas, procurando-se obter a conciliação da certeza e da segurança do direito com a justiça para todos os casos concretos
23-04-2008, processo n.º 303/08-3ª, de 21-05-2008, processo n.º 1616/08-3ª e de 29-10-2008, processo n.º 3373/08-3ª, todos do mesmo relator - Equidade é a justiça do caso concreto, humano, pelo que o julgador deverá ter presente as regras de boa prudência, do bom senso, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida, tendo presentes os padrões de indemnização geralmente adoptados pela jurisprudência.
03-09-2008, processo n.º 2389/08-3ª - Equidade não é sinónimo de arbitrariedade, mas sim dum critério para correcção do direito, em ordem a que se tenham em consideração fundamentalmente, as circunstâncias do caso concreto.
05-11-2008, processo n.º 3266/08 -3ª - Equidade é a expressão da justiça no caso concreto, consistindo em atender ao condicionalismo de cada caso concreto, com vista a alcançar a solução equilibrada e justa, havendo que ter presentes as regras da boa prudência, do bom senso, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida, bem como os padrões de indemnização adoptados pela jurisprudência.
Outras aplicações do conceito podem ver-se nos acórdãos de 04-03-2008, revista n.º 183/08-6ª, in CJSTJ 2008, tomo 1, pág. 142; de 24-04-2008, processo n.º 907/08-5ª; de 06-05-2008, revista n.º 1042/08-6ª e n.º 1279/08, in CJSTJ 2008, tomo 2, pág. 44 e 50.
Referenciando as duas acepções fundamentais de equidade, a noção “fraca” e a noção “forte”, veja-se o acórdão de 10-09-2009, processo n.º 341/04.8GTTVD-3ª.

Soluções jurisprudenciais

No que respeita a soluções jurisprudenciais, distinguir-se-ão neste plano quatro vertentes:
– Entendimento de possibilidade de distanciamento em relação aos montantes fixados pelo dano morte;
- Necessidade ou não de intervenção correctiva por parte do Tribunal Superior;
- Estabelecimento do justo grau de compensação;
- Soluções de fixação de montantes relativamente ao dano em causa em situações paralelas.

Afastamento/desconsideração do critério de compensação do dano morte como padrão para compensação dos danos não patrimoniais de sobreviventes grandes traumatizados

A “avaliação” do dano não patrimonial associado a incapacidade funcional, em caso de lesado gravemente incapacitado - sobrevivente, grande traumatizado - não deve ser parametrizada em função dos montantes fixados para compensação do dano morte, não havendo lugar a uma correspondência entre uns e outro.
Um argumento utilizado por quem aponta excessividade na indemnização arbitrada pelos danos não patrimoniais decorrentes de ofensa corporal consiste no cotejo com o montante indemnizatório correspondente ao dano não patrimonial respeitante a “morte”, com o argumento de que, sendo a vida o bem supremo, a valoração da sua perda não pode ser excedida pela resultante das dores e sofrimentos.
Em acórdão de 15-03-2006, processo n.º 656/06 - 3ª Secção, aponta-se a contradição que resulta de fixar um montante relativo à perda do bem supremo que é a vida inferior ao que vem sendo fixado por outros danos não patrimoniais em que o lesado fica vivo.
No acórdão de 18-03-1997, revista n.º 893/96, afirma-se “Mas não se acompanha a premissa que os danos não patrimoniais são sempre indemnizáveis de modo inferior ao dano morte”.
No acórdão de 08-06-1999, BMJ n.º 488, pág. 323, considera-se como redutor aquele argumento, pois há casos de lesões corporais da maior gravidade, geradoras de grande sofrimento, cujas consequências as respectivas vítimas se vêem obrigadas a suportar até ao fim da vida.
Acórdão de 13-01-2000, Revista n.º 1027/99 - 7ª Secção, STJSAC2000, pág. 38
Em caso de lesado com 28 anos de idade, que ficou irremediavelmente tetraplégico, defende-se que a indemnização por danos não patrimoniais devida ao próprio sinistrado pode ser de montante superior à que deveria ser atribuída aos seus familiares caso ele tivesse falecido no acidente. Aquela não conhece o eventual montante desta como seu limite, nem se trata de termos comparáveis.
Acórdão de 23-10-2001, Revista n.º 2873/01 - 6ª Secção, STJSAC2001,pág. 292
As indemnizações arbitradas pela perda do direito à vida não constituem necessariamente parâmetros das indemnizações devidas por outros danos não patrimoniais.
Acórdão de 13-11-2003, Revista n.º 2961/03 - 7ª Secção – Pese embora a jurisprudência recente tenha como referência o valor de 10.000.000$00 na compensação pelo dano morte, mostra-se ajustada a indemnização de 25.000.000$00 a título de danos não patrimoniais sofridos por um jovem de 17 anos de idade, vítima de acidente de viação que o deixou tetraplégico, portador de uma IPP de 95%, impedido de ter actividade sexual, permanentemente algaliado, só podendo deslocar-se em cadeira de rodas, vivendo em permanente depressão e angústia.
Acórdão de 08-03-2005, revista n.º 395/05 – 1.ª Secção - Embora o bem “vida” seja o bem supremo tal não significa que necessariamente tenha de ser maior a compensação a atribuir pela sua perda nem que ela constitua o limite máximo da que possa ser atribuído por outro dano não patrimonial. Se bem que, por regra, a compensação pela perda da vida deva merecer uma expressão maior há casos que oferecem um cunho de especialidade requerendo que haja um desvio a fazer. Para autora com 18 anos à data do acidente, estudante de curso superior com incapacidade total para qualquer tipo de actividade, ocupação ou trabalho, com um quadro de irreversibilidade, é fixada a indemnização em 550.000 € (450.000 pelos danos patrimoniais e 100.000 pelos não patrimoniais).
Acórdão de 08-03-2005, revista n.º 4486/04 – 6.ª Secção – Em causa lesado com 27 anos que ficou numa situação de tetraparésia, fixando-se a compensação em 250.000 €, “porque se a vida humana é o bem supremo, a situação do autor pode considerar-se uma contínua e diária perda daquele bem, prolongando-se tal calvário por toda a sua vida”.
Acórdão de 05-07-2007, revista n.º 1734/07 - 6.ª Secção - Não vigora no nosso ordenamento jurídico nenhuma norma positiva ou princípio jurídico que no âmbito dos danos não patrimoniais impeça a atribuição duma compensação ao lesado sobrevivente superior ao máximo daquela que habitualmente tem sido atribuída pelo Supremo Tribunal de Justiça para indemnizar o dano morte (entre 50 e 60 mil euros).
Isso pode suceder quando, tendo em conta o art. 496.º, n.º 1, do CC, a perda da qualidade de vida do lesado atinja um patamar excepcionalmente elevado, expresso nas dores, sofrimentos físicos e morais e limitações de vária natureza a que tiver ficado sujeito para o resto da vida em consequência do acto lesivo.
Acórdão de 04-03-2008, revista n.º 183/08 – 6ª Secção – citando o anterior, afirma que a diversidade das situações e, sobretudo, não sendo comparáveis a intensidade dos danos e o grau de culpa dos lesantes, que só casuisticamente podem ser avaliados, não é legítimo invocar as compensações que são arbitradas, por exemplo, em caso de lesão mortal, com aqueloutras que afectam distintos direitos de personalidade.
Acórdão de 10-07-2008, revista n.º 1940/08 – 6.ª Secção - O valor fixado nas instâncias de 150.000 € para compensar os danos não patrimoniais não se pode considerar excessivo, ainda que seja superior ao montante habitualmente considerado pela jurisprudência (50.000 €) para compensar a perda do direito à vida.
Acórdão de 03-09-2008, processo n.º 2389/08 - 3.ª Secção - citando acórdão de 28-02-2008 (in www.dgsi.pt) diz “nada impede que … se arbitre uma indemnização por danos não patrimoniais, a vítima sobrevivente de um acidente de viação, superior ao montante médio atribuído pela jurisprudência ao dano da morte”.
Acórdão de 23-09-2008, revista n.º 1857/08 – 2.ª Secção - Não existe nenhuma norma no ordenamento jurídico nacional que impeça a atribuição a título de danos não patrimoniais, para compensação das graves lesões, dores e sequelas de que a autora ficou a padecer em consequência do acidente para o qual em nada contribuiu, de uma indemnização superior à que se atribuiria ao dano morte.
Acórdão de 23-10-2008, revista 2318/08 – 2.ª Secção - do mesmo relator do anterior – As quantias usualmente atribuídas para compensar o dano vida não podem funcionar como limite à indemnização dos danos não patrimoniais, revestindo estes no caso concreto impressionante gravidade.
Acórdão de 12-03-2009, processo n.º 3635/08 – 5.ª Secção – Em situação em que se fixa a indemnização em € 100.000,00, “ultrapassando” os quantitativos fixados por este Tribunal para o dano morte, que se situam entre € 50.000 e € 60.000, refere-se: “Não vigora no nosso ordenamento jurídico nenhuma norma positiva ou princípio jurídico que, no âmbito dos danos não patrimoniais, impeça a atribuição duma compensação ao lesado sobrevivente superior ao máximo daquela que habitualmente tem sido atribuída pelo Supremo Tribunal de Justiça para indemnizar o dano morte.
Isso pode suceder quando, tendo em conta o art. 496.º, n.º 1, do CC, a perda da qualidade de vida do lesado atinja um patamar excepcionalmente elevado, expresso nas dores, sofrimentos físicos e morais e limitações de vária natureza a que tiver ficado sujeito para o resto da vida em consequência do acto lesivo”.

Acórdão de 18-06-2009, processo n.º 81/04.8PBBGC.S1 – 3.ª Secção – “Não temos como certa a limitação, no domínio do direito não patrimonial, do quantum indemnizatório ao fixado para o dano da morte, porque em certos casos, sobretudo naqueles em que o lesado está condenado a permanecer numa situação irreversível enquanto for vivo, em estádio vegetativo, totalmente dependente de terceiros, em sofrimento permanente, tanto para si como para familiares, sem expectativa de recuperação, manda a justa avaliação das coisas, um justo critério de bom senso e de percepção da realidade, que serve de padrão, de guia no recurso à equidade para fixação do dano não patrimonial, que possa exceder-se esse quantitativo, em nome de uma justa e adequada tutela da integridade física e moral.
O resultado morte funciona apenas como um ponto de referência, mas não inultrapassável. Sem se cair no exagero, nada impede que se arbitre uma indemnização por danos não patrimoniais superior ao montante fixado pelo dano da morte, ao nível jurisprudencial, e sem quebra da sua matriz uniformizadora, sublinhou-se no Ac. deste Supremo Tribunal de 03-09-2008, Proc. n.º 2389/08 - 3.ª”
Acórdão de 24-09-2009, revista n.º 37/09 – 7.ª Secção - A compensação pela perda do direito à vida assenta em razões manifestamente diversas daquelas que justificam uma indemnização por outros danos não patrimoniais, o que torna inadequada a comparação entre os montantes arbitrados.


Justo grau de compensação

Por outro lado, há que ter em conta, como é entendimento praticamente unânime, que a indemnização por danos não patrimoniais tem de assumir um papel significativo, devendo o juiz, ao fixá-la segundo critérios de equidade, procurar um justo grau de “compensação”, não se compadecendo com atribuição de valores meramente simbólicos, nem com miserabilismos indemnizatórios.
Trata-se de posição jurisprudencial assumida nove anos antes de o País ter entrado na zona euro e em que se chamava a atenção para a necessidade de também neste domínio se procurar acompanhar o ritmo da Europa e seguir as indicações dos sucessivos aumentos dos prémios de seguros.
No entanto, a questão não é nova, suscitando já alguma atenção há mais de 40 anos, quando o Supremo Tribunal de Justiça perante a graduação da indemnização por danos morais aos pais de uma jovem de 18 anos, que trabalhava (ganhando 20$00 por dia), e vítima de acidente de viação, dizia: “Quanto, porém, aos danos morais, vem este Tribunal sustentando que se torna necessário elevar o nível dos seus montantes, perante o condicionalismo económico de momento e o maior valor sentimental que hoje se atribui, felizmente, à vida humana” - acórdão de 10-01-1968, processo n.º 32589, in BMJ n.º 173, pág. 161, sendo então atribuída a tal título a quantia de 50 000$00.
Como então dizia o acórdão do STJ, de 16-12-1993, CJSTJ 1993, tomo 3, pág. 181 «É mais que tempo, conforme jurisprudência que hoje vai prevalecendo, de se acabar com miserabilismos indemnizatórios. A indemnização por danos patrimoniais deve ser correcta, e a compensação por danos não patrimoniais deve tender, efectivamente, a viabilizar um lenitivo ao lesado, já que tirar-lhe o mal que lhe foi causado, isto, neste âmbito, já ninguém nem nada consegue! Mas – et pour cause – a compensação por danos não patrimoniais deve ter um alcance significativo, e não meramente simbólico. Aliás, é nesta linha que se encontra, como é do conhecimento geral, o contínuo aumento dos seguros obrigatórios estradais e dos respectivos prémios (vejam-se as repetidas e sucessivas alterações ao art. 6º do DL 522/95, de 31-12, a última através do DL n.º 18/93, de 23 de Janeiro, no seguimento da directiva n.º 84/5/CEE, de 1983-12-30).
Esta posição tem vindo a ser citada e acolhida, ou sendo anotado o seu sentido útil ao longo dos anos, como, inter altera, nos acórdãos do STJ, de 11-10-1994, do mesmo relator do anterior, in CJSTJ 1994, tomo 3, pág. 89 e BMJ n.º 440, pág. 448; de 06-02-1996, BMJ n.º 454, pág. 690; de 18-06-1996, BMJ n.º 458, pág. 287; de 11-11-1997, CJSTJ 1997, tomo 3, pág. 362 e BMJ n.º 471, pág. 369; de 10-02-1998, CJSTJ 1998, tomo 1, pág. 65; de 23-04-1998, CJSTJ 1998, tomo 2, pág. 49; de 07-07-1999, CJSTJ 1999, tomo 3, pág. 16; de 28-03-2000, revista n.º 222/00 - 1ª; de 21-09-2000, revista n.º 2033/00 - 6ª; de 25-01-2002, revista n.º 3952/01-6ª, CJSTJ 2002, tomo 1, pág. 61; de 25-06-2002, revista n.º 1321/02-1ª, CJSTJ 2002, tomo 2, pág. 128; de 19-11-2002, revista n.º 2852/02-1ª; de 20-11-2003, revista n.º 3528/03-2ª; de 25-03-2004, revista n.º 4193/03-7ª, CJSTJ 2004, tomo 1, pág. 140; de 02-10-2007, CJSTJ 2007, tomo 3, pág. 68.
Como se refere no acórdão do STJ de 23-04-2008, processo n.º 303/08 - 3.ª, “Certo é que a indemnização por danos não patrimoniais deverá constituir uma efectiva e adequada compensação, tendo em vista o quantum doloris causado, oferecendo ao lesado uma justa contrapartida que contrabalance o mal sofrido, pelo que não pode assumir feição meramente simbólica” – cfr., entre outros, os acórdãos de 20-11-2003, 28-06-2007, 25-10-2007, 18-12-2007, 17-01-2008 e 29-01-2008, proferidos nas revistas n.º s 3528/03-2ª; 1543/07 - 2.ª, 3026/07 - 2.ª, 3715/07 - 7.ª, 4538/07 - 2.ª, 4492/07 - 1.ª; de 23-04-2008, processo n.º 303/08-3ª; de 21-05-2008, processo n.º 1616/08 - 3.ª; de 25-09-2008, processo n.º 2860/08-3ª; de 22-10-2008, processo n.º 3265/08 - 3ª; de 29-10-2008, processo n.º 3373/08 - 3ª; de 29-10-2008, processo n.º 3380/08-5ª “o juiz deve procurar um justo grau de compensação, sendo fundamental, pois, a determinação do mal efectivamente sofrido por cada lesado, as suas dores e o seu sofrimento psicológico”; de 13-01-2009, revista n.º 08A3747-1ª; de 22-01-2009, revista n.º 3360/08 - 7ª; de 17-02-2009, revista n.º 4099/08 - 1ª; de 25-02-2009, processo n.º 3459/08 - 3ª; de 15-04-2009, processo n.º 3704/08-3ª; de 18-06-2009, processo n.º 1632/01.5SILSB.S1-3ª.


Da intervenção limitada do Tribunal Superior


Alguma jurisprudência defende uma intervenção do tribunal de recurso limitada e restrita na fixação deste tipo de danos, não se justificando essa intervenção caso se entenda que a indemnização foi adequadamente fixada, sendo reveladora de bom senso.
Estando em causa a fixação do valor da indemnização por danos não patrimoniais com apelo a um julgamento segundo a equidade, em que os critérios que «os tribunais devem seguir não são fixos» – Antunes Varela/Henrique Mesquita, Código Civil Anotado, 1.º vol., anotação ao art. 494.º - «devem os tribunais de recurso limitar a sua intervenção às hipóteses em que o tribunal recorrido afronte, manifestamente, “as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das realidades da vida”» – só se justificando uma intervenção correctiva se a indemnização se mostrar exagerada por desconforme a esses elementos.
Neste sentido podem ver-se os acórdãos deste Supremo Tribunal de Justiça de 16-10-2000, processo n.º 2747/00-5ª; de 29-11-2001, processo n.º 3434/01-5ª; de 16-05-2002, processo n.º 585/02-5ª; de 14-11-2002, processo n.º 3316/02-5ª; de 08-05-2003, processo n.º 4520/02-5ª; de 17-06-2004, processo n.º 2364/04-5ª; de 09-12-2004, processo n.º 4118/04-5ª; de 24-11-2005, processo n.º 2831/05-5ª; de 13-07-2006, processo n.º 2172/06-5ª; de 07-12-2006, processo n.º 3053/06-5ª; de 27-11-2007, processo n.º 3310/07 -5ª; de 06-12-2007, processo n.º 3160/07-5ª; de13-12-2007, processo n.º 2307/07-5ª; de 13-03-2008, processo n.º 2589/07-5ª; de 03-07-2008, processo n.º 1226/08-5ª; de 11-09-2008, processo n.º 587/08-5ª; de 11-02-2009, processo n.º 313/09-3ª; de 25-02-2009, processo n.º 390/09-3ª; de 12-03-2009, processo n.º 611/09-3ª; de 15-04-2009, processo n.º 3704/08-3ª; de 07-07-2009, processo n.º 1145/05.6TAMAI.C1-3ª; de 15-07-09, processo n.º 496/03.9PESNT.S1-3ª; de 10-09-2009, processo n.º 341/04.8GTTVD-3ª.
Nos acórdãos de 15-01-2002, revista n.º 4048/01 e de 11-07-2006, revista n.º 1749/06, ambos da 6ª secção, consignou-se que salvo em caso de manifesto arbítrio na fixação da indemnização o Supremo não deve sobrepor-se à Relação na apreciação do quantum indemnizatório por esta julgado equitativo.


Soluções jurisprudenciais relativas a montante compensatório

Por último, ter-se-ão em consideração o sentido das decisões sobre a matéria, os critérios jurisprudenciais vigentes e aplicáveis a situações semelhantes, fazendo-se a comparação do caso concreto com situações análogas equacionadas noutras decisões judiciais, não se perdendo de vista a sua evolução e adaptação às especificidades do caso sujeito.
Os padrões de indemnização que vêm sendo adoptados pela jurisprudência, nomeadamente os mais recentes, constituem também circunstância a ter em conta no quadro das decisões que façam apelo à equidade.
Na verdade, devendo o quantitativo da indemnização correspondente aos danos não patrimoniais ser apurado, sempre, segundo critérios de equidade, deverá atender-se, conforme Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, pág. 629, para além do grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e às do lesado e do titular da indemnização, e ainda aos padrões de indemnização geralmente adoptados na jurisprudência.
O recurso à equidade, exigido pela necessidade de adequação da indemnização às circunstâncias do caso, não dispensa a necessidade de observância das exigências do princípio da igualdade, o que implica a procura de uniformização de critérios e a necessidade de atender, por razões de justiça relativa e para evitar soluções demasiadamente marcadas por subjectivismo, aos padrões geralmente adoptados na jurisprudência, importando ter sempre em atenção as circunstâncias de cada caso, bem como as datas em que as decisões foram proferidas e o consequente decurso do tempo relativamente à decisão confrontada.
No acórdão de 23-10-1979, BMJ n.º 290, pág. 390, citando acórdão de 25-07-1978, que defendera o critério de comparar o montante indemnizatório a situações análogas, já apreciadas noutras decisões judiciais, afirmou “não se entrevê nenhum outro critério susceptível de garantir maior objectividade na fixação da compensação devida por danos não patrimoniais”, lançando mão de seguida da solução paralela do acórdão de 09-01-1979, BMJ n.º 283, pág. 260.
Vaz Serra, em comentário àquele acórdão na RLJ, ano 113º, págs. 91 a 96 e 104/5, opina que o recurso aos “padrões de indemnização geralmente adoptados na jurisprudência” não é o único elemento a ter em atenção, não sendo senão um dos que podem contribuir para uma equitativa avaliação da indemnização, sendo razoável que no seu cálculo, se tenham em atenção além da gravidade da lesão, da natureza e intensidade do dano causado, as outras circunstâncias do caso concreto que a equidade aconselhe sejam tomadas em consideração e, em especial, a situação patrimonial das partes e o grau de culpa do lesante.
Antunes Varela, RLJ, ano 123, pág. 280, considera que o Tribunal deve também atender aos valores anteriormente fixados pelos outros tribunais para a indemnização de danos de igual natureza.
Defendendo o recurso a tais padrões, podem ver-se os acórdãos de 26-05-1993, CJSTJ 1993, tomo 2, pág. 130; de 30-10-1996, BMJ n.º 460, pág. 444; de 18-03-1997, CJSTJ 1997, tomo 1, pág. 163; de 17-04-1997, SASTJ, n.º 10, Abril, pág. 52; de 11-11-1997, processo n.º 177/97-1ª, BMJ nº 471, pág. 369 e CJSTJ 1997, tomo 3, pág.132; de 15-12-1998, CJSTJ 1998, tomo 3, pág. 155 (159); de 08-06-1999, BMJ n.º 488, pág. 323; de 14-03-2000, revista n.º 53/00-6ª, SASTJ2000, pág. 103; de 25-06-2002, CJSTJ 2002, tomo 2, pág. 128; de 21-03-2006, revista n.º 324/06-1ª; de 02-11-2006, revista n.º 3326/06-2ª; de 04-03-2008, revista n.º 183/08-6ª,CJSTJ 2008, tomo 1, pág. 142; de 25-02-2009, processo n.º 3459/08-3ª; de 15-04-2009, processo n.º 3704/08-3ª; de 23-09-2008, revista n.º 2469/07-7ª; de 09-06-2009, revista n.º 497/03.7TBALB.C1.S1-6ª; de 24-09-2009 revista n.º 37/09-7ª.

Convirá passar em revista situações objecto de decisão e reapreciação pelo Supremo Tribunal de Justiça, em que estavam em causa casos similares ou lugares paralelos ao dos autos, com sequelas graves de lesões emergentes de acidentes de viação, ou outros, como incapacidade permanente total ou parcial, paraplegia e tetraplegia, dependência de acompanhamento ou ajuda de terceiros, incluindo ofendidos crianças e jovens.
Para além dos já enunciados acima a propósito dos danos futuros, constantes da respectiva listagem inserta supra (acórdãos de 13-01-1970, 06-07-1971, 10-05-1977, 22-11-1977, 08-03-1979, in BMJ, n.ºs 193/348, 209/102, 267/144, 271/212, 285/290 e de 27-05-2004, 28-03-2006, 16-10-2008, 13-01-2009 e 25-03-2009, revistas n.ºs 1694/04-2ª; 447/06-6ª; 3114/08-7ª, 3747/08-1ª e 421/09-6ª), podem ver-se ainda os seguintes acórdãos:

02-11-1995, recurso criminal n.º 46783, CJSTJ 1995, tomo 3, pág. 220 e BMJ n.º 451, pág. 49

Menor de 7 anos de idade atingido a tiro por outro de 16, ficando com perda definitiva e completa da visão do olho esquerdo e com projéctil de chumbo no interior da caixa craniana, tendo de suportar fortes dores, angústia (sofrimentos físicos e morais) e de passar algum tempo fechado num quarto escuro, em situação de desespero e de sofrimento – confirmada a indemnização de 3.000.000$00.
25-11-1998, Revista n.º 865/98, BMJ n.º 481, pág. 470

Caso de prejuízos irreversíveis sofridos por bébé de 7 meses de idade, em infantário, na sequência de incêndio, resultantes de aleijões nas mãos e da desfiguração da face. Para além de indemnização por danos patrimoniais futuros, a compensação do dano não patrimonial sofrido pelo bébé é fixada em 20.000.000$00.
O acórdão, neste aspecto apresentando-se como vanguardista, fixa ainda em 1.000.000$00, para cada um, a compensação pelos danos não patrimoniais sofridos pelos progenitores.

09-11-1999, Revista n.º 759/99 - 6ª Secção, STJSAC, Edição anual 1999, pág. 349

Lesada com 17 anos de idade, que sofreu um assinalável dano estético ao nível do joelho direito, numa idade em que o culto da beleza e da perfeição física é uma realidade comum a todos os jovens, sendo tal fealdade inibidora – valorado o dano estético em 1.700.000$00.

26-09-2000, Revista n.º 1943/00 - 2ª Secção, STJSAC, Edição anual 2000, pág. 262

Lesado com 12 anos de idade - considera-se que a perda do ano escolar, consequência das lesões sofridas em acidente de viação, constitui dano não patrimonial, cuja indemnização se deve fixar em 500.000$00.
Para além deste dano, o lesado teve internamento de 27 dias, em vários hospitais, esteve em coma 3 dias, findos os quais não conseguia mexer a metade direita do corpo, sem conseguir abrir o olho direito durante dois meses, mantendo na data da alta hospitalar ptose palpebral direita, fixada a indemnização num total de 5.000.000$00.


08-02-2001, Revista n.º 3940/00 – 7.ª Secção, STJSAC, Edição anual 2001, pág. 71

Lesado com 18 anos de idade, frequentando o 1º ano do Curso de Arte e Design, internado na sequência de acidente de viação ocorrido em 1994, em vários hospitais durante vários meses, tendo-lhe sido fixada incapacidade de 39,83%, ficado com cicatrizes na perna e no braço e com dificuldades de movimentação e atentas as dores sofridas – fixada a indemnização de 2.300.000$00, sendo de 2.000.000$00 para os danos não patrimoniais e de 300.000$00 para o dano estético.

01-03-2001, Revista n.º 4074/00 – 7.ª Secção, STJSAC, Edição anual 2001, pág. 105

Lesado com 17 anos de idade, amante do desporto, que em consequência de acidente de viação, perdeu um dos olhos, passando a usar uma prótese de vidro, ficando acentuadamente deformado na face, por cicatrizes, lesões que determinaram incapacidade funcional de 60%, e que se tornou triste, com tendência para o isolamento e dificuldades na vida de relação - fixada a compensação em 8.000.000$00.

19-11-2002, Revista n.º 3254/02 – 6.ª Secção, STJSAC, Edição anual 2002, pág. 337

Lesado com 12 anos de idade, que em consequência de acidente de viação, sofreu dores e internamento hospitalar, apresentava cicatriz na coxa que o desfeia, e que perdeu inteiramente a visão de um dos olhos – considerada ajustada a compensação de 6.000.000$00.

19-11-2002, Revista n.º 2852/02 – 1.ª Secção, STJSAC, Edição anual 2002, pág. 339

Lesado com 17 anos de idade, que em consequência de acidente de viação, sofreu uma perda significativa do seu olfacto e paladar, de forma irreversível, o que lhe causa profundo desgosto e grande dor – fixada a compensação de 2.500.000$00.

26-11-2002, Revista n.º 3567/02 – 6.ª Secção, STJSAC, Edição anual 2002, pág. 345

Lesada com 20 anos de idade, nascida em 13-02-1978, que em consequência de acidente de viação ocorrido em 28-03-1998, ficou paraplégica, com incapacidade permanente absoluta para o trabalho de 75%, numa cadeira de rodas, paralisada da cintura para baixo, numa situação de incontinência, usando fraldas e algálias, completamente dependente de terceira pessoa - considerado equitativo fixar a reparação pelos danos não patrimoniais por ela sofridos em 20.000.000$00.
17-12-2002, Revista n.º 3898/02 – 1.ª Secção, STJSAC, Edição anual 2002, pág. 377

Considerada adequada a compensação de 22.445,91 € por danos não patrimoniais resultantes para menina com 4 anos de idade pelo facto de, no jardim de infância, lhe ter caído na zona da cara e do pescoço sopa quente, causando-lhe queimaduras que lhe provocaram grande sofrimento, insegurança e desequilíbrio psicológico, ficando afectada, de forma não recuperável, numa zona do corpo ostensivamente visível.

13-11-2003, Revista n.º 2961/03 - 7.ª Secção

Pese embora a jurisprudência recente tenha como referência o valor de 10.000.000$00 na compensação pelo dano morte, mostra-se ajustada a indemnização de 25.000.000$00 a título de danos não patrimoniais sofridos por um jovem de 17 anos de idade, vítima de acidente de viação que o deixou tetraplégico, portador de uma IPP de 95%, impedido de ter actividade sexual, permanentemente algaliado, só podendo deslocar-se em cadeira de rodas, vivendo em permanente depressão e angústia.

23-09-2004, Revista n.º 2209/04 - 2.ª Secção

Em consequência do acidente, para o qual nada contribuiu, o autor então com 16 anos, foi sujeito a duas intervenções cirúrgicas à perna direita e, só cerca de um ano depois, concluiu os tratamentos; durante este período de tempo teve dificuldades em locomover-se, sofreu dores atrozes, quer nos tratamentos quer quando mexia a perna direita e nas mudanças de tempo, e esteve impossibilitado da prática de actividades lúdicas. Para além de ter ficado com uma IPP de 7,5%, viu-se impossibilitado de seguir uma carreira de futebolista, à qual dedicou muito tempo e para a qual estava vocacionado, relevando, a frustração, incontestável num jovem futebolista, de, pelo menos, poder sonhar ser uma figura marcante no desporto.
Considerando estes factos, é adequada a fixação da indemnização por danos não patrimoniais, no montante de 2.000.000$00 (9.975,96 €).

09-12-2004, Revista n.º 3743/04 - 6.ª Secção

Considerando que o Autor, com 17 anos à data do acidente, esteve internado 42 dias, foi sujeito a 4 intervenções cirúrgicas, apresenta variadíssimas sequelas, ficou com a marcha claudicante, devido ao encurtamento do membro inferior, não consegue correr, saltar, andar de bicicleta, dançar, tem dificuldade em subir e descer escadas, ficou com a perna desfigurada, não vai à praia ou à piscina por sentir vergonha, vive amargurado e desiludido, sente dores intensas, tem dificuldades em relacionar-se com raparigas da sua idade, sendo ele um jovem, e ficou a padecer de uma IPP genérica de 50% e profissional de 100%, mostra-se equilibrada e atendível a sua pretensão de ver fixada a indemnização por danos não patrimoniais em 50.000 Euros.

13-01-2005, Revista n.º 4069/04 - 2.ª Secção

Justifica-se, em termos de equidade, a atribuição da indemnização de € 49.879,79 a um sinistrado que, com apenas 17 anos e saudável que, em consequência de um acidente de viação provocado exclusivamente por outrem, ficou tetraplégico, completamente incapacitado e dependente dos cuidados de uma terceira pessoa, o que lhe causa desgosto.

27-01-2005, Revista n.º 4135/04 - 2ª Secção

Fixada a indemnização de 100.000,00 €, a título de danos não patrimoniais, ao lesado de um acidente de viação, ocorrido sem culpa sua e de que lhe advieram, aos 30 anos de idade, a incontinência total e a impotência, que levou a mulher a abandoná-lo.

15-02-2005, Revista n.º 4509/04 - 1ª Secção

Lesado com 22 anos de idade, estudante, com IPP de 22% - considerando essa incapacidade, quer funcional, quer intelectual, com diminuição do raciocínio e poder de concentração, passando por períodos de amnésia, o que esteve na origem da interrupção dos estudos - confirmada a indemnização a título de danos não patrimoniais em € 6.000.000$00.

08-03-2005, Revista n.º 395/05 - 1ª Secção
Lesada com 18 anos de idade, estudante de curso superior, tendo sofrido lesões que determinaram incapacidade total para qualquer tipo de actividade, ocupação ou trabalho e que requerem necessariamente um acompanhamento permanente e continuado por toda a vida (o quadro traçado é de irreversibilidade) - fixada indemnização em 550.000,00 € (450.000 € pelos danos patrimoniais e 100.000 € pelos não patrimoniais).

08-03-2005, Revista n.º 4486/04 - 6ª Secção

Lesado com 27 anos de idade e saudável à data do acidente, que ficou em consequência do mesmo na situação de tetraparésia - fixado em 250.000 € o montante de indemnização destinada a compensar os danos não patrimoniais de muitíssimo elevado grau.

05-05-2005, Revista n.º 2182/03 - 2ª Secção

Lesada com 19 anos de idade, que em consequência de acidente de viação em que o veículo ficou em chamas, sendo a última a ser retirada, sendo atingida pelo incêndio, sofrendo queimaduras de 3.º grau ao nível do tronco, membro superior direito, membros inferiores e por todo o corpo que lhe causaram indescritível sofrimento, internada 28 dias, sujeitando-se a 6 intervenções cirúrgicas e a vários enxertos; até para tomar banho tinha de submeter-se a anestesia geral; o quantum doloris e o dano estético foram valorados no grau 6, numa escala de 1 a 7; ficou com limitações de amplitude de movimentos e sofreu uma IPP de 55%; perdeu o ano escolar; perturbação das funções de sexualidade; fica muitas vezes de baixa devido à incapacidade, e o seu futuro profissional é incerto - fixada a indemnização em 79 807,66 € (16.000.000$00).

22-09-2005, Revista n.º 2277/05 - 2ª Secção, CJSTJ 2005, tomo 3, pág. 38

Para indemnizar jovem de 18 anos de idade, que ficou paraplégica, com uma IPP de 80%, pelo dano não patrimonial foi considerado adequado o montante de 100.000,00 €.

11-10-2005, Revista n.º 2351/05 - 6ª Secção
Lesado com 32 anos de idade, saudável, desportista e trabalhador, tendo sofrido em consequência do acidente, amputação da perna direita e ficado com uma IPP de 80% - atribuída a compensação de 100.000,00 €.

11-10-2005, Revista n.º 2342/05 - 1.ª Secção

Lesado que à data do acidente tinha 18 anos de idade, estudante, frequentando o 12.º ano de escolaridade, que ficou a padecer de uma IPP de 32,5%.
“Considerando a culpa exclusiva e grave do condutor do veículo automóvel seguro na Ré e a gravidade das lesões sofridas pelo Autor (esfacelo do joelho esquerdo com ruptura capsulo-ligamentar e entorse grave da articulação tíbio-társica esquerda) e as sequelas daí resultantes (rigidez e zonas cicatriciais no joelho esquerdo e articulação tíbio-társica esquerda), bem como a perda do ano escolar, é ajustado fixar a indemnização devida a título de danos não patrimoniais em 25.000 Euros.

20-10-2005, Revista n.º 2382/05 - 7.ª Secção

Lesado com 10 anos de idade que em consequência das lesões sofridas num atropelamento ficou a padecer de uma IPP de 7% - fixada por danos não patrimoniais a quantia de 32. 421,86 €.

07-12-2005, Revista n.º 3297/05 - 7ª Secção

Lesado com 24 anos de idade com uma IPP de 60%, tendo sofrido várias fracturas, cinco intervenções cirúrgicas, internamento hospitalar durante 2,5 meses e passou a claudicar na marcha, com o quantum doloris a ser quantificado no grau 5 – atribuída a compensação de 75.000,00 €.

21-09-2006, Revista n.º 2016/06-2ª Secção

Lesado com 15 anos, que ficou, em consequência do acidente, seriamente afectado, física e psiquicamente, de que sobressai o ter-lhe sido amputada a perna direita e com 70% de IPP – considera-se revelar-se como adequado, como indemnização por danos não patrimoniais o montante de 39.903,84 euros/8.000 contos (com referência a 1996).

02-11-2006, Revista n.º 3326/06 - 2.ª Secção

Lesada que, à data do acidente de viação tinha 15 anos de idade e ficou com uma IPP de 20%, que se traduz em sérios problemas funcionais numa coxa, sendo que antes era uma pessoa normal.
A indemnização por danos não patrimoniais, no caso do lesado ser jovem, deve ter em conta que tais danos ocorrem numa idade em que não é normal ocorrerem problemas de saúde. Assim, o pretium juventutis implica que, nesta hipótese, a indemnização deva ser fixada, dentro do que são os parâmetros jurisprudenciais, num valor relativamente elevado.
No caso, considera-se equilibrado fixar a indemnização de 35.000,00 €.

02-11-2006, Revista n.º 3559/06 - 7.ª Secção

Lesada com 9 anos de idade, vítima de acidente ocorrido em 16-01-2001; em consequência do embate, sofreu esfacelo grave da perna e pé direito com destruição musculo-esquelética marcada, lesões essas que lhe determinaram a amputação da perna direita pelo 1/3 proximal, o que determinou uma IPP de 55%; foi submetida a cirurgias de remodelação e regularização do coto destinadas a futura utilização de prótese; desde Novembro de 2001 a Fevereiro de 2002 foi submetida a programa de reabilitação com treino protético.
Posteriormente, foi-lhe aplicada a prótese, corrigida regularmente face ao seu crescimento, o que determina a sua submissão a programa clínico de reabilitação.
Os tratamentos a que se sujeita provocam-lhe dores; até à data do acidente era uma criança saudável e tinha alegria de viver; sente-se, em consequência do uso da prótese, inferiorizada e diminuída face às outras crianças, o que se vai acentuando à medida que vai crescendo e que se agravará quando atingir a fase da adolescência; a prótese terá de ser substituída á medida que se for desenvolvendo fisicamente.
Fixado o montante de 60.000,00 €, a título de danos não patrimoniais. (Pelos danos patrimoniais, atribuída a verba de € 110.000,00).
19-12-2006, Revista n.º 3738/06 - 7ª Secção

Lesado com 32 anos, com incapacidade total para exercício de profissão e com 70% de incapacidade geral, com dificuldade em manter o equilíbrio, necessitando de fazer regularmente fisioterapia - atribuída indemnização de 100.000,00 €.

15-02-2007, Revista n.º 302/07 - 7.ª Secção

Lesado com 57 anos. “Justifica-se a fixação da compensação por danos não patrimoniais no montante de 60.000,00 € em razão do sofrimento físico-psíquico decorrente de fractura da tíbia e do perónio com amputação dos topos, de dores intensas nos ossos, de várias intervenções cirúrgicas e tratamentos, de hospitalização durante mais de um ano, de cicatrizes visíveis e extensas, de atrofia dos grupos musculares, de necessidade de locomoção em cadeira de rodas e com canadianas, do encurtamento da perna, da perda de segmentos, da rigidez no pé, da imobilidade de articulações, da lesão neurológica do ciático, das perturbações do sono e do humor, do pânico sobre a evolução futura, da incapacidade permanente geral de setenta por cento, da necessidade de outras intervenções cirúrgicas, do risco de amputação da perna, da dependência de ajudas técnicas de outrem para as suas necessidades básicas, da depressão e angústia e da alteração do padrão sexual”.

01-03-2007, Revista n.º 4025/06 - 7.ª Secção

A autora, doméstica, foi submetida a diversos tratamentos, esteve em estado de coma profundo, em risco de vida, e encontra-se paralisada, com dificuldades de fala e perturbações mentais.
Considerando o número e a gravidade das lesões, que lhe afectaram funções importantes, como as faculdades mentais, a fala e a marcha, as dores sofridas em consequências das lesões e do tratamento a que teve de se submeter, tem de se concluir que, para a autora, então com 44 anos de idade, resultaram limitações físicas, sociais e afectivas, com o inerente e persistente sofrimento e que lhe acarretam uma qualidade de vida manifestamente gravosa.
Para compensar todo este intenso sofrimento e a título de danos não patrimoniais, considera-se adequada e equitativa a quantia de 100.000,00 €.
Ao marido por danos próprios resultantes da alteração da situação de vida em consequência do estado clínico da autora - € 25.000,00.

15-03-2007, Revista n.º 4770/06 - 7ª Secção

Lesado com 14 anos de idade, que sofreu ferimentos que lhe afectaram a perna esquerda, sujeito a operação cirúrgica para colocação de prótese para auxiliar à recuperação óssea, podendo ter de ser sujeito, no futuro, a nova operação, resultando sequelas que determinaram IPP de 10%, acarretando uma limitação e privação que se prolongarão para toda a vida, afectando-lhe a qualidade de vida e limitação das actividades lúdicas – adequado o montante de 15.000,00 €.

05-07-2007, Revista n.º 1734/07 - 6ª Secção

Lesado com 42 anos, definitivamente impossibilitado de exercer a profissão de bombeiro, e impossibilitado de sozinho vestir-se e lavar-se e com andar notoriamente claudicante – atribuída indemnização de 85.000,00 €.

15-11-2007, Revista n.º 2671/07 - 7.ª Secção

Lesado com 45 anos de idade que em consequência do acidente sofreu dores intensas, quer no momento do acidente quer depois com tratamentos e intervenções cirúrgicas; esteve em perigo de vida, o que lhe causou grande angústia; continua a sofrer dores que têm vindo a agravar-se; sofre frequentemente de obstipação, retenção urinária, que degenera, muitas vezes, em infecções urinárias; sofre ainda de impotência sexual e diminuição da sensibilidade da perna e pé direitos, bem como de tetraplegia incompleta e psicose pós-traumática; desloca-se em cadeira de rodas, com auxílio de outrem, por não conseguir movimentá-la sozinho devido à atrofia dos seus membros; ficou com sequelas irreversíveis que o levam a uma vida de dependência e terceira pessoa para a satisfação das suas necessidades básicas, com uma IPA de, pelo menos 50%, e de uma incapacidade geral permanente de 80%; não consegue deslocar-se, alimentar ou beber um copo de água sozinho; apresenta várias cicatrizes na zona da cabeça, pescoço, face lateral esquerda e região inguinal direita, com vários centímetros de extensão; à data do acidente tinha boa saúde, não padecia de qualquer deficiência física e era muito dedicado à família e aos amigos, convivendo com estes semanalmente em jogos variados, de que ficou privado, perdendo a alegria de viver; considera-se justa e equitativa a quantia de 79.000,00 € destinada a compensar o autor pelos danos não patrimoniais sofridos.

13-12-2007, Revista n.º 4312/07 - 2.ª Secção

Sinistrado, que na data da propositura da acção tinha 35 anos de idade, em consequência das lesões sofridas no acidente, ficou com a sua capacidade para o trabalho afectada de forma permanente e na sua totalidade. “Demonstrando os factos provados, entre outros, que: - o autor, em resultado do acidente, ficou paraplégico e dependente de uma cama e cadeira de rodas, para além da sua dependência permanente de terceira pessoa para satisfação das suas necessidades diárias; - teve um quantum doloris no grau 6/7, um dano estético no grau 6/7 e ficou com um prejuízo de afirmação pessoal de grau 4/5 e um prejuízo sexual no grau 5/5; tem-se por adequado o montante de 100.000,00 € destinado ao ressarcimento dos danos não patrimoniais sofridos pelo autor”.

18-12-2007, Revista n.º 4165/07 - 6.ª Secção

Provando-se que, como consequência do acidente, ocorrido em Janeiro de 1999, o Autor X, à data com 17 anos de idade, sofreu fractura exposta do punho esquerdo, esfacelo do pé esquerdo, fractura e esfacelo do fémur esquerdo, fractura da anca e da bacia, esfacelo das massas musculares e vasos sanguíneos da perna esquerda, esfacelo do escroto, da raiz do pénis e da raiz da coxa esquerda com destruição testicular, falta de sensibilidade no pé esquerdo, fractura da tíbia e do perónio, tendo sido submetido a 3 intervenções cirúrgicas, numa das quais lhe foi colocado na zona do fémur esquerdo uma placa metálica com parafusos e encavilhamento, esteve internado cerca de 3 meses, depois retido na cama, em casa, durante mais 2 meses, tendo ficado com marcha claudicante, impossibilitado de caminhar apressado, subir e descer escadas, e pegar em objectos pesados, julga-se conforme à equidade fixar em 55.000,00 € a compensação pelos seus danos não patrimoniais.
Atendendo a que, como consequência do acidente, o Autor Y, então um jovem com 16 anos de idade, sofreu traumatismo crânio-encefálico com perda de consciência, amnésia para o acidente, fractura do fémur esquerdo, fractura da extremidade cubital do punho direito, feridas contusas na região testicular, esteve cerca de 3 meses internado, foi sujeito a duas intervenções cirúrgicas, tendo ficado retido no leito, em casa, durante algumas semanas, fez fisioterapia e utilizou canadianas durante 6 meses, ficou com lombalgia, limitação da flexão do joelho esquerdo, dificuldade em correr, saltar, fazer carga e permanecer de pé por períodos prolongados, tendo também sofrido encurtamento de 2 cm da perna esquerda e cicatrizes, o que tudo lhe causa desgosto, tendo além disso perdido o ano no curso de tecnologia informática que frequentava, afigura-se adequado fixar em 20.000,00 € a compensação pelos danos não patrimoniais.

10-01-2008, Revista n.º 4518/07 - 2.ª Secção

À data do acidente, o menor tinha 4 anos de idade e, em consequência das lesões, ficou a padecer de uma incapacidade permanente geral de 25%, à qual acresce, a título de dano futuro, mais 5%.
Sofreu várias lesões, nomeadamente fractura craniana, fractura e perda de três dentes, fractura do externo da clavícula esquerda, fractura do ramo isquiopúbico; esteve internado em hospitais, registando um coma profundo durante vários dias; foi submetido a diversas e delicadas intervenções cirúrgicas; ficou com cicatrizes que constituem defeito estético notório e apreciável; sofreu dores com as lesões e com os tratamentos.
Assim, mostram-se equitativos os montantes fixados a título de danos futuros e danos não patrimoniais, respectivamente de 120.000,00 € e 100.000,00 €.

21-02-2008, Revista n.º 26/08 -7ª Secção

Lesado com 38 anos de idade ficou com total e permanente incapacidade; sofreu várias lesões e intervenções cirúrgicas e a padecer de impotência sexual - atribuído a título de danos não patrimoniais o montante de 100.000,00 €.
08-05-2008, Revista n.º 3818/07 - 7.ª Secção

Lesada com 19 anos, estudante, quando foi vítima de acidente de viação, que ficou afectada com uma IPP de 70%; “não sendo dependente de terceira pessoa para a execução das actividades da vida diária, necessita de acompanhamento e supervisão de terceira pessoa para todas elas; apresenta perturbações de memória, abaixamento de rendimento intelectual e da atenção, lentificação psicomotora, instabilidade emocional e irritabilidade.
Ficou com uma cicatriz no queixo com cerca de 3 cm, que a desfeia, tendo movimentos do corpo hesitantes e descoordenados; sofreu traumatismo crâneo-encefálico grave e coma, com prolongado internamento hospitalar; suportou dores intensas; fez tratamentos de fisioterapia e programa de reabilitação física”.
A título de danos patrimoniais (futuros) e não patrimoniais, são adequados, respectivamente, os montantes de 250.000,00 € e 100.000,00 €”.

03-07-2008, Revista n.º 1339/08 - 7ª Secção

Lesado com 19 anos, com amputação de um braço e dores durante o longo período de intervenções cirúrgicas e tratamentos de recuperação – atribuído o montante de 60.000,00 € destinado ao ressarcimento dos danos não patrimoniais.

10-07-2008, Revista n.º 1940/08-6ª Secção

Lesado com 22 anos de idade, que ficou numa situação de vida vegetal, sem controlo dos esfíncteres, sexualmente impotente, impossibilitado de usar o corpo, necessitando de acompanhamento permanente no futuro, não interagindo ou compreendendo o mundo que o rodeia – não considerado excessivo o valor de 150.000,00 € fixado nas instâncias para compensar os danos não patrimoniais.

16-09-2008, Revista n.º 2117/08 - 1.ª Secção

“Provando-se que a Autora, ora exequente, à data do acidente era uma criança (nascida em 1980) alegre e saudável, que sofreu em consequência do atropelamento de que foi vítima (e para cuja ocorrência contribuiu na proporção de 50%), traumatismo crânio-encefálico grave, com coma profundo, encontrando-se, no ano seguinte completamente dependente de terceiros, vindo a fazer uma evolução muito lenta, com tratamentos prolongados e dolorosos de fisioterapia, sendo já independente na marcha, mas usando tala moldada para estabilização das tibiotársicas, com o membro superior direito afuncional, e apresentando escoliose dorso-lombar com ângulo de 10º, apraxia do discurso, construindo pequenas frases, limitações na compreensão, frequenta o 1.º ano de escolaridade sem aproveitamento, necessitando de apoio psíquico-pedagógico, do auxílio de terceira pessoa para tomar banho, fazer refeições e tomar os medicamentos, sequelas que envolvem uma incapacidade permanente geral de 80%, afigura-se equitativo fixar em 30.000.000$00 a indemnização por danos não patrimoniais”.

23-10-2008, Revista n.º 2318/08 - 2.ª Secção

Lesada que à data do acidente tinha 29 anos de idade, que ficou a padecer de uma IPP de 65%, com incapacidade total para o exercício da sua profissão habitual, na fixação dos danos não patrimoniais foi julgado adequado à sua compensação, face à impressionante gravidade dos danos, a quantia de 180.000,00 €, não podendo funcionar as quantias usualmente atribuídas para compensar o dano vida como limite à indemnização aqui em apreço.

29-10-2008, Processo n.º 3380/08 - 5ª Secção

Lesada com 17 anos de idade, com várias lesões e sequelas funcionais com limitação da mecânica articular dos membros inferiores, IPP de 45%, com 5% de dano futuro, dezenas de cirurgias e dezenas de anestesias gerais, tendo de ser reoperada, coxeadura do membro inferior esquerdo, deixando de poder tomar banho e de subir e descer escadas sozinha, com necessidade de ajuda de terceiros, abandono da formação académica, interrupção da relação com o namorado, quantum doloris de grau 6, dano estético de 6 numa escala de 7 – confirmada a quantia de 250.000,00 €, como compensação por danos não patrimoniais.

22-01-2009, Revista n.º 3404/08 – 2ª Secção
Lesado com 5 anos de idade, completados no dia do acidente, teve de suportar internamento hospitalar de 3 dias, esteve imobilizado com gesso em ambas as pernas durante 30 dias, e, depois de tirar o gesso, sem poder andar durante mais 30 dias; andou em tratamento durante cerca de um ano, ficando como sequela física com diferença de cerca de um cm entre a perna esquerda e a direita.
Considerada não excessiva, podendo até qualificar-se de modesta, a indemnização de 12.000,00, fixada pela Relação, como indemnização por danos não patrimoniais.

03-03-2009, Revista n.º 9/09 - 6.ª Secção

Lesado de 47 anos de idade, médico, que por causa do acidente sofrido deixou em definitivo de exercer a profissão e de auferir rendimentos, ficando a padecer de deficiências que lhe conferem uma incapacidade permanente geral de 85%.
Na situação referida justifica-se uma indemnização de 150.000,00 € por danos morais se estiver provado, além de tudo o mais, que o lesado ficou em consequência do acidente imediata e irreversivelmente paraplégico, perdendo todo e qualquer tipo de sensibilidade da cintura para baixo, precisando da ajuda permanente de terceira pessoa até ao final dos seus dias para se levantar, deitar e sentar na cadeira de rodas, vestir-se e tratar da higiene pessoal, e que se tornou uma pessoa profundamente deprimida, sem alegria e vontade de viver.

12-03-2009, Processo n.º 578/09 - 3ª secção

Lesado de 16 anos de idade à data do acidente, que sofreu 754 dias de doença, incapacidade permanente geral de 45%, que evoluirá provavelmente para 55%, com dores e sofrimentos que os tratamentos médicos e intervenções cirúrgicas causaram, vendo a sua vida escolar interrompida por algum tempo e a capacidade de trabalho futura irremediavelmente diminuída - confirmado o valor de € 175.000,00 como indemnização por danos não patrimoniais.

26-05-2009, Revista n.º 3413/03.2TBVCT.S1 - 1.ª Secção

Lesado com 28 anos de idade à data do acidente, então motorista de pesados - fixado em 200.000,00 € o valor da indemnização por danos não patrimoniais, pois que o autor ficou, por causa do acidente, devido às lesões sofridas e às sequelas correspondentes, afectado de uma incapacidade permanente de 100%, necessitando de: usar um par de canadianas como auxiliar de locomoção; submeter-se a consultas periódicas de controle do seu sangue, a intervenções cirúrgicas com anestesia geral, internamentos hospitalares, análises clínicas, exames radiológicos, consultas e tratamentos das especialidades de Urologia e de Cirurgia Vascular, bem como do foro psicológico e psiquiátrico, nomeadamente em relação ao seu estado de impotência sexual; ingerir medicamentos e tomar injecções penianas relacionadas com o seu estado de total impotência sexual; recorrer a tratamentos de fisioterapia dos seus membros inferiores; suportar as despesas com uma terceira pessoa para o desempenho de tarefas pessoais e diárias, tais como cortar as unhas dos pés, locomover-se, tomar banho.

28-05-2009, Revista n.º 1670/05.9TBVCT.S1 - 2.ª Secção

“Revelando os factos apurados que a autora, à data do acidente, tinha quatro anos de idade, em consequência do embate sofreu traumatismo e feridas contusas na face, esfacelo da face e fractura do maxilar, ruptura do canal lacrimo-nasal e epicanto pós-traumático do olho esquerdo, foi sujeita a intervenções e tratamentos vários, os quais se repetirão ao longo da sua infância e adolescência, ficou com o maxilar torto, ligeira obstrução nasal e duas cicatrizes na face (uma de 10 e outra de 5 cm), sofreu um quantum doloris de grau 4 e um dano estético de grau 5, e ficou traumatizada com o sinistro, vendo agravado o seu atraso na fala e criando um estado ansioso que não pré-existia, reputa-se de equitativa a quantia de 80.000,00 € destinada ao ressarcimento dos danos não patrimoniais sofridos pela autora”.

18-06-2009, Revista n.º 268/09-2ª Secção

Lesado com 26 anos de idade, que ficou a padecer de uma IPP de 15%, foi sujeito a diversas intervenções cirúrgicas e exames clínicos, sofreu dores e angústias, passou a ter dificuldades de marcha, impedido de praticar desportos, tendo diversas cicatrizes e períodos de grande astenia física e psíquica - adequada a indemnização de 49.879, 79 €.
25-06-2009, Revista n.º 2409/04.1TBCBR.C1.S1 - 6ª Secção

Lesado com 38 anos de idade, com total incapacidade, para toda a vida, não só para o exercício de qualquer profissão, mas também para toda e qualquer tarefa, por pequena que seja, para qualquer actividade de lazer, para movimentação, com incontinência urinária e fecal, impossibilidade de ter relações sexuais por falta de erecção, tendo de ficar para sempre acamado ou em cadeira de rodas, dependendo para tudo de outrem – considerado adequado o montante de € 120.000,00 fixado pela Relação.

07-07-2009, Revista n.º 3306/08 - 7ª Secção

Lesado com 53 anos de idade, reformado, com IPP de 60% para as diversas tarefas da vida diária, doméstica e de lazer, sofrendo lesões irreversíveis, (tetraplegia incompleta sensitiva e motora), dependente da ajuda de terceira pessoa até para as mais simples e íntimas tarefas e actividades da sua vida diária, que cada vez mais se apercebe da sua própria incapacidade motora e vê a sua reforma para sempre confinada a uma cadeira de rodas – tem-se por equilibrada a importância de € 90.000,00.

19-09-2009, Revista n.º 292/1999-09 - 6ª Secção

Lesado com 38 anos de idade, que ficou com IPP de 75% - pelo dano não patrimonial sofrido, considerado de gravíssimo, é confirmada a verba de € 250.000,00.


Revertendo ao caso concreto.



Aplicando estes princípios ao caso presente, tendo em conta a sua envolvência e os seus especiais contornos.
Como decorre da facticidade dada por provada, foi longo, duro, e sem dúvida muito difícil e penoso, o calvário por que passou o DD, como o é o presente, não sendo propriamente risonhas as perspectivas de futuro.
O demandante DD, aos 8 anos de idade, viu ceifada a vivência de criança, expropriado o direito de brincar, amputada a alegria de viver, removido o direito e o prazer de coisas tão simples, como andar, saltar, saltitar, correr, jogar, nadar, dançar, mais tarde, o de conhecer a puberdade, o de namorar, o de conviver, confraternizar e acompanhar os jovens da sua idade, e mais à frente, o de ter filhos, o de se afirmar como homem e cidadão de corpo inteiro, pelo menos naquilo que depender do físico, coarctada a sua autonomia vivencial, viu afectada a auto suficiência, com a necessidade de amparo, o não poder prescindir de ajuda de terceiro - agora de sua Mãe - para os actos mais comezinhos do dia a dia, como o vestir-se, lavar-se, tornando-se visível o cerceamento muito grave das possibilidades de acesso à vida profissional, vendo desde logo fechadas muitas portas, as previsíveis dificuldades, levando mais tempo a atingir certos patamares profissionais, carecendo de despender maior esforço para conseguir idênticos objectivos, sendo ainda presente a perda da qualidade de vida, o prejuízo estético, o fortíssimo e poderoso handicap funcional, inultrapassável nas manifestações da vida afectiva e sexual, a muito grave e elevada afectação do sentimento de auto estima derivada da contemplação do que é na comparação com os seus contemporâneos, a sensação continuada, prolongada, sempre presente, da dependência e da incapacidade.
A matéria de facto provada quanto a danos não patrimoniais é extensa e expressiva, retirando-se apenas referências a pontos chave da longa descrição.
O menor DD ficou paraplégico, sem sensibilidade abaixo da linha intermamilar, fazendo infecções urinárias, respiratórias e dermatológicas e úlcera na região occipital, sendo ventilado durante 15 dias.
Em consequência do acidente o demandante ficou internado mais de oito meses, no Hospital de Santa Maria desde a data do acidente (22-12-2003) até 15 de Março de 2004, e após, no Centro de Medicina de Reabilitação do Alcoitão, onde permaneceu até 03 de Setembro de 2004.
Foi submetido a várias intervenções cirúrgicas com anestesias gerais e sequente sujeição a programas de reabilitação física.
A incapacidade temporária geral total foi de 765 dias, num período de 22-12-2003 a 24-01-2006, o que significa que, durante os anos completos de 2004 e 2005, esteve impedido de realizar com razoável autonomia as actividades da vida diária, familiar e social, sendo do mesmo período a incapacidade temporária para a actividade ocupacional habitual de estudante.
Efectuou 197 deslocações ao Centro de Medicina de Reabilitação do Alcoitão entre a data da alta deste - 3 de Setembro de 2004 - e 10 de Abril de 2006 (data da propositura da acção cível enxertada), tendo efectuado outras 82 deslocações ao Hospital de Santa Maria no mesmo período.
Foi submetido a tratamentos de acupunctura.
Padece de quantum doloris de grau 6 numa escala de 7, de dano estético de 5 numa escala de 7 graus.
Padece de ausência de controle de esfíncteres, obrigando a uso de fraldas e de bebegel, tendo a necessidade de fazer auto algaliação de 3 em 3 horas, constituindo uma situação irreversível.
Tem necessidade de ter vigilância do for urológico, tomando diariamente dois comprimidos para o funcionamento da bexiga.
Ficou na dependência de ajudas técnicas (cadeira de rodas, ortóteses e botas ortopédicas), médicas fisiátricas e medicamentosas, bem como apoio de terceira pessoa.
Tem a perspectiva de viver numa cadeira de rodas até ao fim dos seus dias.
Necessita de fisioterapia e hidroterapia para não agravar o seu estado.
Acresce a perda do avô com quem seguia no veículo embatido, estando encarcerado cerca de 40 minutos ao lado do mesmo, já morto, só dele conseguindo falar e chorar a sua morte mais de dois meses transcorridos sobre o acidente.


Por tudo isto, em suma, evidente se torna a gravíssima e extensa afectação da integridade fisiológica, anatómica e estética do demandante; as dores físicas e morais, intensas e profundas; a perda da marcha; a perda da fruição das alegrias da vida; o prejuízo da distracção e passatempo; o prejuízo juvenil, ficando o demandante, ainda uma criança, privado das alegrias próprias da idade e tornando-se adolescente e jovem, sem as vivências próprias dessa idade; o prejuízo sexual; a impossibilidade de procriação; o prejuízo da auto-suficiência e da afirmação pessoal.
E tudo isto sendo o demandante DD uma criança saudável, viva, forte, alegre, comunicativo e participativo, sendo membro dos escuteiros, praticando actividades ao ar livre, como andar de bicicleta, jogar à bola.
Uma última palavra para a situação económica de demandante e demandados, matéria em relação à qual, em derradeiro argumento, os demandados na resposta ao recurso do demandante, vieram invocar a existência de vício decisório.
Os demandados vieram responder, apresentando a peça de fls. 903/4, alegando que quanto à situação económica do arguido, da demandada civil e do lesado, nada de concreto se provou, havendo um deficit de matéria de facto, o que constitui o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada previsto no artigo 410º, n.º2, alínea a), do Código de Processo Penal, com possível reenvio do processo para novo julgamento
Ora, sobre este aspecto os demandados nada disseram antes, nem no primeiro recurso – cfr. II - Danos não patrimoniais - fls. 747vº e conclusões 16ª e 17ª -, nem no presente – cfr. fls. 863 e 870, onde se limitam a reproduzir o alegado no anterior recurso e conclusões supra referidas – invocando em ambos os casos apenas o excesso de valoração e propondo a quantia de 70.000 euros.
Apenas alegam que actualmente as pequenas empresas atravessam um período de grande dificuldade e que a realidade económica do arguido pode ser problemática.
Sendo colocada apenas agora estamos perante uma questão absolutamente nova, certo sendo que o recurso para o Supremo, para mais vindo de decisão da Relação, não pode ter como fundamento qualquer dos vícios decisórios contemplados no artigo 410º do Código de Processo Penal.
De qualquer modo, a sentença de Benavente, confirmada pelo acórdão recorrido, no que reporta à situação económica das partes deu como assente que os pais do demandante são operários, vivendo em zona rural, sem disponibilidades financeiras, tendo inclusive a mãe, trabalhadora rural nas campanhas de tomate, deixado de trabalhar para acompanhar o filho que dela necessita desde o acidente (factos provados n.º s 158, 159, 144, 145, 171 e 172).
E que o demandado é motorista há cerca de 20 anos, sendo sócio da demandada, proprietária do veículo conduzido por aquele, sendo superior a respectiva condição económica relativamente ao demandante (factos provados n.ºs 45, 50, 53 e 198).
Não sendo obviamente exuberantes os elementos disponíveis, não deixa de existir um patamar suficiente para ancorar a decisão a este nível, sabido que o nível económico do demandado é superior ao do demandante, dedicando-se a demandada a actividade transportadora.
De qualquer modo, a alegada débil situação económica não impediu que os demandados aceitassem o valor de 350.000,00 euros como indemnização pela perda de capacidade aquisitiva do demandante fixada pela Relação, quando no recurso então interposto entendiam por justa a sua fixação em 250.000,00 €, como ressalta da conclusão 9.ª, a fls. 748, do 4º volume e ainda conclusões 6.ª e 7.ª.
E quanto ao facto de vir a ser problemática a situação do demandado, conviremos sem esforço que problemática é sem dúvida a situação do DD, atirado para uma condição de vida para a qual em nada contribuiu, tendo tido apenas a pouca sorte de estar no lugar errado à hora errada.

Tendo em conta todos estes factores, atendendo a que o demandante em nada contribuiu para a eclosão do acidente que o vitimou, o qual se ficou a dever em exclusivo a conduta ilícita contra-ordenacional estradal e criminal grave e exclusiva do demandado Jerónimo dos Santos, tendo em conta a gravidade das lesões e sequelas (uma das demais circunstâncias do caso, a que alude o artigo 494º, in fine, do Código Civil), procurando um justo grau de compensação, tendo presente o sentido das proporções, sem olvidar as soluções dadas pela jurisprudência em lugares similares ou paralelos, entendendo-se no caso concreto justificar-se intervenção correctiva, afigura-se adequado fixar a indemnização por danos não patrimoniais em € 250.000,00.
Improcede, assim, a pretensão dos demandados (fixação do dano em € 70.000), procedendo em parte a do demandante (que pretendia a compensação de € 300.000, face aos 100.000 fixados pela Relação).

Concluindo.

Resulta do exposto que passa a ser definitiva a fixação dos montantes indemnizatórios peticionados nos termos seguintes:
I - Perda de capacidade aquisitiva de ganho - € 350.000,00 (valor aceite pelos demandados)
II - Danos futuros previsíveis já determináveis (despesas com medicamentos, algálias, fraldas, bebegel) – € 120.000,00
III - Compensação por danos não patrimoniais – € 250.000,00
IV – Mantém-se a decisão de relegar para execução de sentença a liquidação das despesas com intervenções cirúrgicas, tratamentos e inerentes exames, bem como ajudas técnicas (cadeiras de rodas, ortóteses, botas ortopédicas), que se venham a mostrar necessárias na evolução da situação clínica do demandante, bem como a condenação em juros de mora.

Fixado o montante global indemnizatório/compensatório em € 720.000,00 (350.000+120.000+250.000), há que deduzir o montante de € 465.449,29 já pago pela seguradora e recebido na sequência de transacção, e encontrando-se esgotado o capital do contrato de seguro, serão os demandados AA e T... F... R... Lda. condenados a pagar, solidariamente, a parte sobrante de € 254.550,71, acrescida de juros de mora nos termos estabelecidos.


DECISÃO

Pelo exposto, acordam neste Supremo Tribunal de Justiça em julgar parcialmente procedentes os recursos interpostos pelos demandados AA e T... F... R..., Lda., e pelo demandante DD, e em consequência:
I - Confirmar o acórdão recorrido, no que toca ao montante fixado a título de indemnização por dano patrimonial, futuro, na vertente de lucro cessante, consistente na perda de capacidade aquisitiva do demandante, ou seja, fixando-o no valor de 350.000,00 €, aceite pelos demandados, assim julgando improcedente o recurso do demandante quanto à pretensão de fixação em € 435.000,00;
II - Julgar procedente o recurso do demandante, revogando o acórdão recorrido na parte em que reduziu para 15 anos o período de consideração e sequente quantificação dos danos futuros previsíveis já determináveis, com despesas de medicamentos, algálias, bebegel e fraldas, incluindo a condenação em relegar para execução de sentença o que se viesse a verificar para além do mesmo período de 15 anos e fixando-se tal período em 55 anos;
III - Julgar parcialmente procedente o recurso dos demandados, no que respeita à fixação do montante dos danos futuros previsíveis e determináveis relativos às despesas com medicamentos, algálias, fraldas e bebegel, fixando a indemnização a esse título em € 120.000,00;
IV - Julgar procedente o recurso do demandante, no que respeita ao montante compensatório dos danos não patrimoniais, revogando o acórdão recorrido nesta parte, e fixando-o em € 250.000,00.
V - Manter o mais decidido, ou seja, a relegação para liquidação em execução de sentença de danos futuros previsíveis não determináveis, correspondentes a despesas futuras (a partir de Abril de 2006), incluindo, além das do custo com eventuais intervenções cirúrgicas e internamentos e inerentes exames, que venham a ser determinadas pela evolução da situação clínica do demandante, as ajudas técnicas, que se revelem necessárias para curar as lesões do demandante, com exclusão, conforme II e III supra, dos medicamentos, das fraldas, algálias e bebegel no período a seguir aos 15 anos, que nessa parte se revoga (face à condenação de III que abrange todo o período), valendo para a relegação, nos termos ora redifinidos, o indicado período de 55 anos.
VI – Condenar solidariamente os demandados a pagarem ao demandante a quantia de € 254.550,71, acrescida de juros de mora.

Custas pelo demandante e pelos demandados AA e T... F... R..., Lda., na proporção da sucumbência, de acordo com as normas do processo civil, aplicáveis ex vi do artigo 523.º do Código de Processo Penal, com taxas de justiça, nos termos do artigo 88.º, do Código das Custas Judiciais.

Consigna-se que foi observado o disposto no artigo 94º, n.º 2, do Código de Processo Penal.

Lisboa, 25 de Novembro de 2009

Raúl Borges (Relator)
Fernando Fróis