Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
030449
Nº Convencional: JSTJ00004313
Relator: EDUARDO COIMBRA
Descritores: PRESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO CRIMINAL
PRAZO
CONTRAVENÇÃO
FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: SJ196106140304493
Data do Acordão: 06/14/1961
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: DG IªS DE 10-07-1961; BMJ 109 , 429
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PARA O PLENO
Decisão: FIXADA JURISPRUDÊNCIA
Indicações Eventuais: ASSENTO 6/1961
Área Temática: DIR CRIM - TEORIA GERAL.
Legislação Nacional: DL 41033 DE 1957/03/18 ARTIGO 1 ARTIGO 5.
DL 38630 DE 1952/02/02 ARTIGO 4.
CP886 ARTIGO 125 N2 PAR4 PAR6 ARTIGO 486.
CP852 ARTIGO 123 PAR3 ARTIGO 124 PAR1.
L 300 DE 1915/02/03 ARTIGO 32.
CPP29 ARTIGO 155 ARTIGO 646 N6 ARTIGO 669.
CPC39 ARTIGO 763 PAR2.
D 16489 DE 1929/02/15 ARTIGO 3.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO RC DE 1959/06/16 IN JR ANO3 PAG832.
ACÓRDÃO RC PROC16268 DE 1960/04/16.
ASSENTO STJ DE 1961/05/17.
Sumário :
Esta em vigor o artigo 32 da Lei n. 300, de 3 de Fevereiro de 1915, sendo, consequentemente, de dois anos o prazo para a prescrição do procedimento por contravenções e transgressões.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, em sessão de Tribunal Pleno:

Na comarca de Mangualde responderam em processo de transgressão A e B, proprietarios de pinhais situados na freguesia e concelho de Nelas, e C e D, respectivamente industrial de produtos resinosos e empreiteiro resineiro, acusados da pratica, nesses pinhais, de diversas infracções as regras de resinagem, com inobservancia do disposto nos artigos 1 e 5 do Decreto-Lei n. 41033, de 18 de Março de 1957, puniveis pelo artigo 4 do Decreto -Lei n. 38630, de 2 de Fevereiro de 1952, com a redacção que lhe foi dada pelo artigo 8 daquele decreto-lei.
Alegada, em contestação de um dos transgressores, a prescrição, com o fundamento de haverem decorrido mais de seis meses entre a pratica das incisões e a sua participação em juizo, e mais de dois anos entre esses mesmos periodos, foi proferida sentença na qual se considerou constar dos respectivos autos de noticia terem sido as transgressões verificadas em 7 de Dezembro de 1957 e esses autos haverem dado entrada em juizo em 4 de Dezembro de 1959; a prova produzida não permitia, porem, concluir que, naquela data da visita da fiscalização, estivesse ainda a ser explorada resina nos pinhais referidos nos autos, e antes levava a concluir que, pelo menos em fins de Novembro de 1957, ja tinha sido feita a raspa das incisões e esta se encontrava completamente seca.
Ora - acentuou o meritissimo juiz - a prescrição do procedimento criminal conta-se a partir do cometimento dos factos criminosos e contravencionais; e, para as transgressões, da-se ao fim de dois anos, a não ser que, entretanto, tenha sido interrompida por qualquer acto judicial, conforme resulta do disposto no artigo 125, paragrafo 4, do Codigo Penal e no artigo 32 da lei n. 300, de 3 de Fevereiro de 1915.
Mas, como no presente caso não houve qualquer acto judicial interruptivo da prescrição, declarou, nos termos do n. 2 do citado artigo 125, extinto o procedimento criminal quanto aos factos de que os arguidos vinham acusados.
Interposto pelo magistrado do Ministerio Publico recurso dessa decisão, o Tribunal da Relação de Coimbra entendeu que devia considerar-se em vigor o artigo 32 da citada Lei n. 300 segundo o qual "a prescrição do procedimento para punição das contravenções e transgressões e de dois anos"; mas, porque não foi praticado acto algum interruptivo da prescrição, uma vez que o paragrafo 4 do citado artigo 125 alude a acto judicial e não podia deixar de entender-se que este e apenas o praticado pelo juiz confirmou a sentença.
Do respectivo acordão recorreu extraordinariamente, nos termos do artigo 669 do Codigo de Processo Penal para este Supremo Tribunal de Justiça, o excelentissimo Procurador da Republica junto daquela Relação, a fim de se fixar a jurisprudencia, visto estar em manifesta oposição, sobre a mesma materia de direito - prazo de prescrição do procedimento para punição por contravenção - com o acordão de 16 de Junho de 1959, com transito em julgado, proferido por essa mesma Relação num processo de transgressão da comarca de Soure, de que juntou certidão, no qual se decidiu que e de seis meses, e não de dois anos, aquele prazo, e não ser possivel interpor recurso ordinario para este Supremo Tribunal, atento o disposto no n. 6 do artigo 646 do Codigo de Processo Penal.
Admitido o recurso, foi pelo acordão de folhas 100 reconhecida a evidente oposição entre os dois acordãos sobre a mesma materia de direito.
Seguindo o recurso os seus termos e porque o magistrado recorrente ja havia alegado no sentido de demonstrar a existencia de oposição entre os dois acordãos, apresentou o excelentissimo Ajudante do Procurador-Geral da Republica junto da Secção Criminal deste Supremo Tribunal o douto parecer de folhas 105 sobre o objecto de recurso, no qual sustenta que deve solucionar-se o conflito de jurisprudencia no sentido de estar em vigor o citado artigo 32 da lei n. 300, sendo assim de dois anos o prazo para a prescrição do procedimento por contravenções e transgressões; e que devera lavrar-se assento nesse sentido.
Tudo visto:
E de presumir o transito em julgado do acordão de 16 de Junho de 1959, certificado a folhas 84, invocado em oposição - paragrafo 2 do artigo 763 do Codigo de Processo Civil; tanto ele como o acordão recorrido foram proferidos em processos diferentes e no dominio da mesma legislação; e não era possivel interpor recurso ordinario para este Supremo Tribunal de Justiça, por se tratar de processo de transgressão - n. 6 do artigo 646 do Codigo de Processo Penal.
A oposição entre os dois acordãos, sobre a mesma materia de direito, e manifesta.
Esta consiste, como ja se referiu, em saber qual o prazo da prescrição do procedimento para a punição das contravenções e transgressões, pois enquanto no acordão recorrido se decidiu ser o mesmo de dois anos, por dever considerar-se em vigor o artigo
32 da Lei n. 300, no acordão invocado em oposição entendeu-se que devia considerar-se revogado esse preceito legal, e que, por em materia contravencional ser de um ano o prazo da prescrição das penas, devia reduzir-se para seis meses o da prescrição do procedimento judicial.
E essa a questão de direito, diversamente decidida nos dois acordãos; e porque existe conflito de jurisprudencia, cumpre a este Supremo Tribunal fixar definitivamente a certeza do direito.
E problema de solução delicada o de saber qual o prazo da prescrição do procedimento judicial nas contravenções e transgressões.
Esse prazo tem sido objecto de duvidas na jurisprudencia e, sobretudo, na doutrina.
Como e sabido, ha em direito criminal duas especies de prescrição - a do procedimento criminal e a das penas aplicadas - Codigo Penal, artigo 125, os seus prazos são diferentes, sendo maior o da prescrição da pena que o do procedimento criminal.
E compreende-se bem esse tratamento mais rigoroso para a prescrição da pena, estabelecendo-se prazos mais largos do que para a prescrição do procedimento criminal, porquanto, alem de outras razões, desde que se apura por sentença a existencia do facto criminoso, este adquire maior significado que anteriormente, uma vez que a acção criminal pode conduzir a absolvição ou ao arquivamento do processo.
O Codigo Penal de 1852 estabelecia expressamente que, nas contravenções, o prazo de prescrição do procedimento criminal era de um ano e o prazo de prescrição das penas de dois anos - artigos 123, paragrafo 3, e 124, paragrafo 1.
O projecto de reforma penal de 1884, da autoria do Ministerio da Justiça Lopo Vaz de Sampaio e Melo, reduziu a um ano aquele prazo de dois anos de prescrição das penas - artigo 88, paragrafo 6 - o que veio a ser aprovado, passando essa doutrina depois para o Codigo Penal de 1886, actualmente em vigor, que no artigo 125, paragrafo 6, expressamente dispõe que as penas por contravenções prescrevem passado um ano.
Nada se dispõs, porem, nem naquele projecto, nem nesse Codigo, relativamente ao prazo de prescrição do procedimento judicial por contravenções.
Surgiu, assim, o problema de saber qual o prazo a que estava sujeita.
Entendia-se, geralmente, que esse prazo era, em regra, de um ano, estabelecendo-se assim um tratamento unitario para as duas especies de prescrição - Senhor Professor Caeiro da Mata, Direito Criminal Portugues, volume 2, pagina 169 - pois que, segundo uns, a hipotese era abrangida no disposto na ultima parte do paragrafo 2 do citado artigo
125 na referencia a pena aplicavel ao crime que caiba na alçada do juiz de direito em materia correccional, e, segundo outros, porque não a prevendo esse artigo, deveria considerar-se ainda em vigor, nessa parte, o paragrafo 3 do artigo 123 do Codigo Penal de 1852 que, so por lapso, não fora incluido no Codigo de 1886.
Esta ultima razão não podia contudo harmonizar-se com o que claramente dispunha o artigo 90 da Reforma de 1884, segundo o qual ficavam substituidas as regras para a extinção dos crimes e das penas consignadas no Codigo penal, Livro I, Titulo 4, Capitulo 2, o qual continha o paragrafo 3 do artigo 123.
Veio depois a Lei n. 300, de 3 de Fevereiro de 1915, preceituar, no artigo 32, que "a prescrição do procedimento para punição das contravenções e transgressões e de dois anos".
Todavia, nenhum prazo se consignou nesse diploma para a prescrição das penas por contravenção; continuou, por isso, em vigor o de um ano estabelecido no paragrafo 6 do artigo 125 do Codigo Penal.
Ficou, desta maneira, a ser maior o prazo da prescrição do procedimento judicial do que o estabelecido para a prescrição das penas.
Criou-se, desta sorte, uma situação incongruente contraria ao principio geralmente aceite pela doutrina e ao sistema das legislações, designadamente a nossa com relação aos crimes, de que o prazo para a prescrição das penas deve ser mais rigoroso que o prazo para a prescrição do procedimento criminal.
Contudo, a doutrina aceitou a plena vigencia desse preceito, por ter natureza substantiva, conforme se deduz do preceituado no artigo 155 do Codigo de Processo Penal, em razão do que não fora revogado pelo artigo 3 do Decreto n. 16 489, de 15 de Fevereiro de 1929, que aprovou esse diploma, visto so ter revogado toda a legislação processual anterior nele não expressamente ressalvada - Senhor Professor Beleza dos Santos, Lições de Direito Criminal, coligadas por Hernani Marques, pagina 270; Senhor Professor Cavaleiro de Ferreira, Lições de Direito Penal, coligadas por Carmindo Ferreira e Henrique Lacerda,
2 edição, pagina 169; Senhor Professor Eduardo Correia,
Lições de Direito Criminal, coligadas por Francisco Pereira Coelho e Manuel Rosado Coutinho, volume
I, pagina 220.
Somente se discutia qual o prazo de prescrição da pena, respeitando-se, todavia, o prazo estabelecido no citado artigo 32 para a prescrição do procedimento judicial, sobre o qual não havia qualquer duvida.
Com o fim de solucionar a apontada incongruencia, houve quem entendesse que devia fixar-se em dois anos o prazo para as duas especies de prescrição.

Foi esse o criterio seguido pelo Senhor Professor Beleza dos Santos, ao qual aderiu o Senhor Professor Eduardo Correia, Lições de Direito Criminal, coligadas por Seabra de Magalhães, pagina 45, e Lições de Direito Criminal, pagina 121, respectivamente.
Aquele primeiro Professor considerando um contra- senso ser, em materia de contravenções, a prescrição da pena de um ano pelo Codigo Penal e a do procedimento criminal de dois anos pela lei n. 300, sustentava que devia entender-se que esta lei revogou nessa parte o Codigo Penal; utilizava-se assim o argumento sistematico, interpretando extensivamente a lei n. 300, e entendendo que o legislador quis, estabelecer o prazo de dois anos para as duas especies de prescrição no dominio das contravenções.
Largos anos decorreram, no entanto, sem que se pusesse em duvida a plena vigencia do citado artigo 32 da lei n. 300, que a jurisprudencia tinha tambem como indiscutivel.
Recentemente, porem, tanto o Senhor Professor Cavaleiro de Ferreira, Curso de Processo Penal, volume III, pagina 62 (edição de 1958), como a Revista de Legislação e de Jurisprudencia, ano 90, pagina 371 (Abril de 1958), vieram suscitar o problema da vigencia do aludido preceito.
Aquele Professor chega a conclusão que e de um ano o prazo para a prescrição do procedimento criminal por contravenções; por sua vez, a citada Revista conclui ser esse prazo de seis meses.
Seduzido pela aliciante argumentação do estudo publicado nessa revista, o acordão da Relação de Coimbra, de 16 de Junho de 1959, invocado em oposição, entendeu ser de seis meses, e não de dois anos, o prazo de prescrição do procedimento judicial por contravenção.
E essa, segundo parece, a unica decisão dos tribunais superiores discordante da plena vigencia do artigo 32 da lei n. 300.
Ha, por isso, que examinar o problema.
No lugar citado, o Senhor Professor Cavaleiro de Ferreira sustenta que toda a legislação processual penal anterior ao Codigo de Processo Penal foi por este revogada, a não ser que se encontre especialmente ressalvada; a Lei n. 300 não se integra nessa ressalva; e se a prescrição e de considerar como instituto do direito processual, não pode considerar-se em vigor o citado artigo 32.
Aduz ainda que a circunstancia de o artgo 155 do Codigo de Processo Penal remeter para a lei penal não implica uma posição legislativa sobre a natureza substantiva da prescrição.
Aventa ser admissivel sustentar que o prazo da prescrição do procedimento criminal por contravenções, nos termos do Codigo Penal e, na maior parte dos casos, de um ano.
O artigo 125, paragrafo 6, desse codigo reduziu a um ano o prazo de prescrição das penas por contravenção que, no Codigo de 1852, era de dois anos; e quanto a prescrição do procedimento criminal estabeleceu so o mesmo prazo de um ano para as infracções puniveis com penas compreendidas na alçada do juiz de direito.
O sistema da lei foi o de compreender as contravenções entre aquelas infracções.
Deste modo se suprimiram alguns graves inconvenientes e uma incompreensivel e desequilibrada aspereza na aplicação do instituto da prescrição ao procedimento criminal por contravenções. Por isso, mantendo-se em vigor a indicação das penas contidas na alçada do juiz, não obstante esta haver sido suprimida, para os efeitos da prescrição, seria de um ano a prescrição do procedimento criminal por contravenções puniveis com multa inferior a 60 escudos e prisão ou desterro ate um mes. Ora, nos termos do artigo 486 do Codigo Penal estes limites compreenderiam pelo menos todas as contravenções de regulamentos, quer governamentais, quer das autarquias locais; quanto aos limites superiores estabelecidos por leis ulteriores, deveria entender-se, de igual modo, que não afectavam a manutenção do prazo da prescrição.
A citada Revista argumenta, essencialmente, com a chamada regra do dobro, aceita por certos sistemas legislativos, em harmonia com a qual deve ser duas vezes maior o prazo da prescrição das penas do que o necessario para a prescrição do procedimento criminal.
Esse pensamento fora justamente consagrado pelo Codigo de 1852, não so para os crimes, mas tambem para as contravenções: o prazo de um ano para a prescrição do procedimento criminal por contravenções e o de dois anos para a das penas que lhes tenham sido aplicadas.
Com a elevação, nos termos do artigo 32 da Lei n. 300, para dois anos do prazo de prescrição do procedimento por contravenções e transgressões, sem paralelamente se alterar de maneira expressa o prazo de um ano, estabelecido na ultima parte do paragrafo 6 do artigo 125 do Codigo Penal para a prescrição das penas aplicadas a infracções de natureza contravencional, criou-se uma situação aberrante e contraria a logica, aos ensinamentos de direito comparado e aos proprios principios a que a lei aderiu.
Devia, por isso, fazer-se uma interpretação modificativa ou correctiva.
E porque e duvidosa a vigencia do citado artigo 32 da Lei n. 300 e nenhuma duvida ha sobre a do paragrafo 6 do artigo 125 do Codigo Penal, e atendendo a regra do dobro, desde que o prazo de prescrição das penas por contravenções e de um ano, ha que considerar o decurso de seis meses como prazo necessario para a prescrição do respectivo procedimento criminal, e ter, consequentemente, como reduzido a seis meses o prazo fixado no citado artigo 32.
Não se tem, porem, como justificado qualquer destes pontos de vista.
Consonte ja se referiu, o preceito do citado artigo 32 não foi revogado pelo Codigo de Processo Penal.
Trata-se, na verdade, de um preceito de natureza substantiva, o que alias resulta claramente do disposto no artigo 155 desse Codigo, em harmonia com o qual "os termos, prazos e efeitos da prescrição e as causas da sua interrupção são os estabelecidos na lei penal".
E, assim, a propria lei a indicar que considera os prazos de prescrição como de direito substantivo.
Se bem que ao instituto da prescrição ja se tenham apontado fundamentos de natureza processual, a doutrina e hoje quase unanime em lhe atribuir natureza substantiva, como se acentuou ja no acordão de que emanou o recente assento deste Supremo Tribunal, de 17 de Maio findo, cujas razões, por isso, e desnecessario reproduzir.
Desta maneira, mesmo abstraindo do preceito do citado artigo 155 do Codigo de Processo Penal, não seria viavel a hipotese de revogação do artigo 32 da Lei n. 300.
Mas, a admitir-se mesmo a natureza adjectiva do instituto da prescrição, para se poder atribuir a prescrição do procedimento criminal por contravenção prazo diverso do de dois anos estabelecidos nesse preceito, haveria que considera-lo revogado.
Ora, essa revogação so poderia ter sido operada pelo Codigo de Processo Penal; mas, o preceito do seu artigo 155, ja aludido, não pode dar lugar a duvidas quanto a sua vigencia, tão claros e categoricos são os seus termos.
Quanto a regra do dobro, ela não existe, nem esta formulada em qualquer texto legal. E certo que, em regra, e mais dilatado o prazo de prescrição da pena do que o do procedimento criminal.
Nem sempre, porem, o criterio da nossa lei relativamente aos prazos da prescrição criminal nas duas formas, se exprime na regra do dobro.
Não sucede isso, por exemplo, com as penas maiores e os crimes a que essas penas respeitam: os prazos são respectivamente de 20 e 15 anos.
Não e licito, a pretexto de se fazer "interpretação correctiva", e perante preceitos tão claros e terminantes como são os do artigo 32 da Lei n. 300 e do paragrafo 6 do artigo 125 do Codigo Penal, pretender considerar modificado aquele artigo 32.
Isso seria pedir a interpretação o que so a revogação pode dar, como com justeza refere no seu douto parecer o ilustre representante do Ministerio Publico.
E evidente que, se o legislador, no citado artigo 32 fixou o prazo de dois anos para a prescrição do procedimento judicial em materia contravencional, e nada dispos quanto a prescrição das penas, foi porque quis relativamente a esta prescrição, que o prazo continuasse a ser o de um ano estabelecido no Codigo Penal.
De resto, se e certo que se justifica a necessidade de um tratamento mais rigoroso para a prescrição das penas, relativamente aos factos criminosos, pode admitir-se que, em materia contravencional, interessa antes um prazo mais longo para a prescrição do procedimento judicial do que para a prescrição da pena.
Encarada a questão pelo aspecto pratico, e, portanto, mais economico do que juridico, pode interessar antes um prazo mais dilatado para a prescrição do procedimento judicial, pois que se este for maior, maior sera tambem a probabilidade de arrecadar, pelo pagamento voluntario, as importancias das multas, uma vez que so excepcionalmente as contravenções são punidas com a pena de prisão.
E uma tal solução nada tem de imoral ou de injusta.
Mas, seja como for, a verdade e que, perante a clareza da lei, o conflito de jurisprudencia tem de solucionar-se considerando em vigor o aludido artigo 32 da Lei n. 300.
Nessa conformidade se formula o seguinte assento:
Esta em vigor o artigo 32 da Lei n. 300, de 3 de Fevereiro de 1915, sendo consequentemente de dois anos o prazo para a prescrição do procedimento por contravenções e transgressões.


Lisboa, 14 de Junho de 1961

Eduardo Coimbra (Relator) - Mario Cardoso - Lopes Cardoso
- Morais Cabral - F. Toscano Pessoa - Pinto de Vasconcelos
- Carlos de Miranda - Barbosa Viana - Da Mesquita - Amorim Girão - Amilcar Ribeiro - Jose Avelino Moreira
- Bravo Serra - Alfredo Jose da Fonseca.