Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
644/09.5T2SNS.E1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: ANTÓNIO LEONES DANTAS
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
VIOLAÇÃO DE REGRAS DE SEGURANÇA
RESPONSABILIDADE AGRAVADA
CONSTRUÇÃO CIVIL
EMPRESA DE TRABALHO TEMPORÁRIO
Data do Acordão: 01/14/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Área Temática:
DIREITO CIVIL - RELAÇÕES JURÍDICAS / PROVAS - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / MODALIDADES DAS OBRIGAÇÕES / OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAÇÃO.
DIREITO DO TRABALHO - SEGURANÇA, HIGIENE E SAÚDE NO TRABALHO - ACIDENTES DE TRABALHO.
Doutrina:
- INOCÊNCIO GALVÃO TELES, Direito das Obrigações, 7.ª Edição, Coimbra Editora, 1997, pp. 404, 405.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 342.º, N.º2, 563.º.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGO 639.º.
CÓDIGO DE TRABALHO DE 2003: - ARTIGOS 272.º, 273.º.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGO 59.º, N.º1, ALS. C) E F).
DECRETO-LEI N.º 143/99, DE 30 DE ABRIL (REGULAMENTO DA LEI DE ACIDENTES DE TRABALHO), NA REDACÇÃO QUE LHE FOI DADA PELO DECRETO-LEI N.º 382-A /99, DE 22 DE SETEMBRO: - ARTIGO 71.º, N.º1.
LEI N.º 100/97, DE 13 DE SETEMBRO (REGIME JURÍDICO DOS ACIDENTES DE TRABALHO E DAS DOENÇAS PROFISSIONAIS): - ARTIGOS 18.º, N.º1, 37.º, N.º2, 41.º, N.º1, AL. A).
REGULAMENTO DE SEGURANÇA NA CONSTRUÇÃO CIVIL, APROVADO PELO DECRETO N.º 41 821, 11 DE AGOSTO DE 1958, MANTIDO EM VIGOR PELO ARTIGO 29.º DO DECRETO-LEI N.º 273/2003, DE 29 DE OUTUBRO: - ARTIGOS 51.º, 95.º, 159.º.
REGULAMENTO GERAL DE SEGURANÇA E HIGIENE NO TRABALHO NOS ESTABELECIMENTOS INDUSTRIAIS, APROVADO PELA PORTARIA N.º 53/71, DE 3 DE FEVEREIRO NA REDACÇÃO RESULTANTE DA PORTARIA N.º 702/80, DE 22 DE SETEMBRO: - ARTIGO 69.º.
Legislação Comunitária:
DIRECTIVA N.º 89/391/CEE, DO CONSELHO, DE 12 DE JUNHO DE 1989: - ARTIGO 6.º, N.º4.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-AUJ, DE 6 DE FEVEREIRO DE 2013.
Sumário :

1 - No âmbito de vigência da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, a responsabilidade, principal e agravada, do empregador pela reparação de danos derivados de acidente de trabalho, prevista no artigo 18.º daquele diploma, pode ter dois fundamentos autónomos: a) um comportamento culposo da sua parte, causal do acidente; b) a violação, pelo mesmo empregador, de preceitos legais ou regulamentares ou de directrizes sobre higiene e segurança no trabalho que sejam igualmente causais do acidente;

2 – A responsabilidade pela reparação de acidente de trabalho prevista no artigo 18.º, n.º 1, da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, resultante da violação de normas relativas à segurança, higiene e saúde no trabalho, por parte de empresa utilizadora, e de que seja vítima trabalhador contratado em regime de trabalho temporário, recai sobre a empresa de trabalho temporário, na qualidade de entidade empregadora, sem prejuízo do direito de regresso, nos termos gerais.

3 - A remoção de um varandim de uma Flare de uma refinaria de petróleos, situado a cerca de 18 metros do solo, através do corte dos parafusos que o ligavam àquela estrutura, com recurso a uma grua que o suspenderia e faria descer até ao solo, está sujeita aos condicionalismos de segurança decorrentes do artigo 69.º do Regulamento Geral de Segurança e Higiene no Trabalho nos Estabelecimentos Industriais, aprovado pela Portaria n.º 53/71, de 3 de Fevereiro na redacção resultante da Portaria n.º 702/80, de 22 de Setembro e no artigo 159.º do Regulamento de Segurança na Construção Civil, aprovado pelo Decreto n.º 41 821, 11 de Agosto de 1958, mantido em vigor pelo artigo 29.º do Decreto-lei n.º 273/2003, de 29 de Outubro.

Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:


I

No dia 26 de Setembro de 2008, pelas 12h15, na Base d... I FL-X1[1], na Refinaria da AA, em ..., enquanto exercia as suas funções de ajudante de serralheiro, BB foi atingido na cabeça por um suporte metálico de um varandim em queda.

Naquelas circunstâncias de tempo e de lugar o sinistrado encontrava-se vinculado por um contrato de trabalho temporário com a Ré CC – EMPRESA DE TRABALHO TEMPORÁRIO, SA, encontrando-se a prestar o seu trabalho sob autoridade e direcção de DD – ... DE ..., S.A.. (Al. D) no âmbito de um contrato de utilização de trabalho temporário que esta Ré tinha celebrado com a Ré CC.

Tendo sido instaurado o competente processo de Acidente de Trabalho, e realizadas no mesmo as diligências legalmente previstas, não foi possível a conciliação das partes, vindo então o sinistrado, com o patrocínio do Ministério Público, a instaurar a presente acção especial por acidente de trabalho contra as referidas CC e DD e contra as igualmente Rés EE – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. incorporada, por fusão, na Ré FF COMPANHIA DE SEGUROS, S.A., GG – ..., S.A. e HH – ..., Ldª.

Pretende o Autor que as RR. sejam condenadas a pagar-lhe, na proporção das suas responsabilidades:

- A pensão anual e vitalícia que lhe vier a ser fixada após determinação da incapacidade permanente parcial de que está afectado, por virtude do acidente dos autos;

- Indemnização por IT que lhe vier a ser atribuída com base nos elementos precedentes e no resultado da junta médica que vai requerer;

- As despesas de deslocação a tribunal, por virtude do acidente dos autos.

O processo prosseguiu seus termos, tendo sido fixadas as incapacidades sofridas pelo Autor e realizou-se a audiência de discussão e julgamento, vindo a ser proferida sentença que integra o seguinte dispositivo.

«Por todo o exposto:

A) Condeno a R. FF – Companhia de Seguros, S.A. a pagar ao Autor BB:

- Quanto à ITA, uma indemnização diária no valor de € 11,59, aplicável aos 397 dias, o que perfaz o total de € 4 601,23 (quatro mil, seiscentos e um euros e vinte e três cêntimos).

- Quanto à IPATH, uma pensão anual e vitalícia no valor de € 3.769,25 (três mil, setecentos e sessenta e nove euros e vinte e cinco cêntimos), devida desde 29.10.09.

Sobre tais quantias há que efectuar o desconto dos valores já pagos pela Seguradora ao sinistrado e bem assim dos valores que a título de pensão provisória se encontra a liquidar.

- Subsídio por situações de elevada incapacidade permanente no valor de € 5.112,00 (cinco mil, cento e doze euros).

- Juros de mora, à taxa legal, desde a data em que as obrigações se venceram até integral pagamento.

B) Absolvo as Rés CC - Empresa de Trabalho Temporário, Ld.ª, DD - ... de ..., Ld.ª, GG- ... SA e HH – …, Ld.ª dos pedidos formulados pelo Autor;

C) Condeno a Ré Seguradora nas custas processuais.

Registe e notifique sendo a Seguradora para em 10 dias após o trânsito da presente sentença comprovar nos autos o pagamento das quantias em que foi condenada».

Inconformada com esta decisão dela apelou a Ré FF – Companhia de Seguros, SA para o Tribunal da Relação de Évora, que veio a conhecer do recurso interposto por acórdão de 25 de Maio de 2014, tendo decidido o seguinte:

«Nestes termos, acordam os Juízes Desembargadores da Secção Social deste Tribunal da Relação de Évora, em julgar procedente a apelação, alterando-se a sentença recorrida nos seguintes termos:

I) Condena-se a R. CC – Empresa de Trabalho Temporário, Ld.ª a pagar ao A. BB, a título principal:

a) O montante global de € 6.576,96 (seis mil quinhentos e setenta e seis euros e noventa e seis cêntimos) a título de indemnização por ITA sofrida durante 397 dias.

b) A pensão anual e vitalícia no montante de € 5.964,00 (cinco mil novecentos e sessenta e quatro euros), com efeitos desde 29-10-2009.

c) O montante de € 5.112,00 (cinco mil cento e doze euros), a título de subsídio por situações de elevada incapacidade permanente.

d) Juros de mora, à taxa legal, sobre as prestações em dívida e a calcular desde a data em que as mesmas se venceram até integral pagamento.

Às prestações devidas a título de indemnização por ITA e de pensão anual e vitalícia, serão deduzidas as importâncias pagas pela seguradora ao sinistrado BB, respetivamente, a título de ITA e de pensões provisórias.

II) Condena-se a R. FF – Companhia de Seguros, S.A., a pagar ao A. BB, a título subsidiário:

a) O montante global de € 4.601,23 (quatro mil seiscentos e um euros e vinte e três cêntimos) a título de indemnização por ITA sofrida durante 397 dias;

b) A uma pensão anual e vitalícia no montante de € 3.769,25 (três mil setecentos e sessenta e nove euros e vinte e cinco cêntimos), com efeitos desde 29-10-2009;

c) O montante de € 5.112,00 (cinco mil cento e doze euros), a título de subsídio por situações de elevada incapacidade permanente;

d) Juros de mora, à taxa legal, sobre as prestações em dívida e a calcular desde a data em que as mesmas se venceram até integral pagamento.

Às prestações devidas a título de indemnização por ITA e de pensão anual e vitalícia, serão deduzidas as importâncias pagas pela seguradora ao sinistrado, respetivamente, a título de ITA e de pensões provisórias.

III) Mantém-se a absolvição das RR. DD – ... de ..., Ld.ª, GG – ..., S.A. e HH – Serviços e Equipamentos Técnicos Industriais, Ld.ª dos pedidos formulados pelo A..

Custas, em ambas as instâncias a cargo da R. CC Empresa de Trabalho Temporário, Ld.ª.»

Inconformada com esta decisão dela recorre de revista para este Supremo Tribunal a Ré CC – Empresa de Trabalho Temporário, SA, tendo apresentado, depois de ter sido notificada nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 3 do artigo 639.º do Código de Processo Civil, as seguintes conclusões:

«A - O douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, alterando a douta sentença do Tribunal de 1.ª Instância condenou a Ré CC pela reparação do acidente sofrido pelo sinistrado BB.

B - Para decidir como decidiu considerou que foram violadas pela Ré DD SA, empresa utilizadora, os Arts 272.º e 273.º do CT, os Arts 159.º e 85º do Decreto n.º 41 821 de 11/8/1958 e os nºs 3 e 4 do Art 69.º da Portaria 53/71 de 03/02 na redacção dada pela Portaria [n.º 702/80 de] 22/09.

C - A recorrente entende que as disposições dos n.º 3 e 4 do Art 69.º da portaria 53/71 de 3/02 na gradação dada pela portaria [n.º 702/80 de 22/09] (.) não se aplicam, porquanto aplica-se à atividade exercida nos estabelecimentos industriais e no caso tratava-se de trabalhos no âmbito da atividade de construção e reparação das estruturas, estando sujeito às regras do Decreto (.) n.º 41 821 de 11/8/1958 que regulamenta as normas de Segurança (.) na Construção Civil.

D - O douto Acórdão nas normas que considera violadas entende que foram violadas normas que regulam a prevenção técnica dos riscos profissionais nos estabelecimentos industriais (nºs 3 e 4 do artº 69º da portaria 53/71) e ao mesmo tempo considera que foram violadas normas no âmbito do Regulamento de Proteção na Construção Civil (Arts 159º e 95 º do decreto (.) 41821 de 11/8/1958), no caso ou se aplica o regime para os estabelecimentos industriais ou o regime para a construção civil.

E) - Há erro na determinação da norma aplicada, não se aplicando os n.ºs 3 e 4 da Portaria 53/71, mas mesmo que assim não se entenda e se considere que a portaria 53/71 se aplicava aos trabalhos realizados, não foram violados os n.ºs 3 e 4 do Art. 69.º porque não é aplicado aos trabalhos que se realizavam e que deram causa ao acidente.

F) - O Art.69º regula a elevação de cargas, regulando o nº 3 os recipientes para içar ou arrear materiais soltos na elevação das cargas e arreamento das cargas e no caso não se tratou de elevar ou arrear cargas, tratou-se de execução de trabalhos em altura com risco de queda da objetos.

O nº 4 determina os cuidados a ter na elevação das cargas e no caso não se tratou da elevação de qualquer carga, mas sim da execução de trabalhos em altura.

G) - Aplicando-se o Regulamento para a Construção Civil o Art.º 95.º não tem aplicação ao caso porquanto regula a circulação nos locais de içamento de cargas «o içamento de cargas junto da locais da circulação habitual será feito ....». Ora para além do local não ser local de passagem habitual, não se realizavam trabalhos de içamento.

H) - O douto acórdão considera como não cumprido o disposto no Art.º 158.º do Decreto (.) 41821 e mantido em vigor pelo Art. 29.º do Decreto-1ei 273/2003 (trabalhos desenvolvidos no âmbito dos estaleiros móveis), considerando que os trabalhos se realizavam a mais de 3,50m  altura e não foram tomadas as medidas eficazes a evitar a queda do objectos, aceita a recorrente que possa ser aplicado este Art.º no entanto, entende que deveria ser conjugado com o disposto no Art. 51.º do decreto (.) 41821 porquanto, a obra se realizava era de retirar um remover um Varandim.

I) - Trabalhos que se realizavam em altura e que visavam a remoção de um varandim (…) para o solo.

H) - No caso e para os trabalhos que se realizavam além da não ser possível o uso da plataforma, esta visa proteger da queda dos utensílios e materiais que estejam a ser usados em altura. No caso a plataforma não permitiria a remoção do varandim e foram usados meios adequados à remoção.

J) - A norma aplicada ao caso seria o disposto no Art. 51º do Decreto (.) 41 821, porquanto regula em matéria de demolição e no caso sendo remoção de um equipamento, deve considerar-se como demolição.

L) - O douto considerou que foram violadas regras de segurança e reguladas pelos Arts antes referenciados, entendendo a aqui recorrente que os Art. 95.º do Decreto (.) 41821 e os n.ºs 3 e 4 do Art. 69.º da portaria 53/71, assim como a portaria referida não se aplicam ao caso.

M) - Aplicando-se o Art. 159.º de Decreto (.) 41 821 por trabalhos em altura e queda de objetos também há lugar a aplicação do Art. 51º do mesmo Decreto (.) trabalhos de demolição e no caso para realizar a remoção do varandim não era possível a colocação de plataforma, sendo que o acidente não ocorreu por falta da plataforma, mas por queda do objeto que estava a ser removido e que a plataforma, rede ou outro equipamento não evitaria a queda.

N) - Os Arts 272.º e 273.º do CT não foram violados porquanto foram previstos e organizados os trabalhos de forma que não ocorressem acidentes.

O) - A recorrente mantém que o tribunal de 1ª instância fez uma apreciação correta da prova e da aplicação do direito, sendo que mesmo que alteração dos factos dados como provados não deverão levar a alteração da decisão proferida pela 1ª Instância e à condenação da Ré CC.

P - Mesmo não se tendo dado como provado que o sinistrado estava impedido de circular junto à base d... não se pode considerar culpa ou violação da regras de segurança que determinem a condenação da recorrente, além de que também não foi dado como provado que tenha sido determinado ao sinistrado que prestasse trabalho no local onde decorreu o acidente ou que estivesse a trabalhar naquele local ou por baixo d... e onde havia risco de queda de objectos por trabalhos em altura. E, não ficou provado a possibilidade de poderem ser usados os meios de proteção e que agora determinaram alteração da sentença da 1ª Instância, como seja a rede-oleado- telas nas circunstâncias em que estava a ser desenvolvido o trabalho ou que seriam meios adequados a evitar o acidente nas circunstâncias em que ocorreu ou que medida alternativa de barreiras físicas também seria a medida adequada ou se seria possível a sua colocação junto à base d..., sendo que o uso dos equipamentos - grua móvel para amarração e suporte dos varandins e uso multifunções - Manitou também móvel não permitia uso de outras medidas de segurança;

Q - Não houve normas de segurança violadas e sem conceder quanto às normas de segurança pretensamente violadas, prevendo-se procedimentos concretos sobre segurança relativamente aos trabalhos executados nomeadamente os que ofereçam perigos designadamente de quedas em altura, o juízo sobre a utilização dos meios de proteção coletiva e individual deveria ser feito em concreto,

R) - Os meios de segurança colectivos usados para o risco de queda de objetos nos trabalhos em altura que se desenvolviam foram os adequados, os exequíveis na sua instalação e foram observadas regras gerais para o tipo de trabalho em altura e trabalhos em plataforma inferior a dois metros com observância de meios de segurança para que recaísse sobre a Recorrente a responsabilidade agravada pela reparação do acidente com fundamento na não observância das regras de segurança seria absolutamente necessário que se demonstrasse, por um lado, que lhe era imputável a si ou seu representante a violação das regras, que por determinação legal lhe competia cumprir e por outro lado o nexo de causalidade entre a violação dessas regras e o acidente.

S) - Não se encontra demonstrado que a Recorrente ou seu representante, agiram com culpa ou que não tenham observado as regras de segurança, higiene e saúde no trabalho que sobre eles impendia.

T) - Conforme se diz anteriormente não se pode considerar como provado que o acidente adveio da violação de regras de segurança, higiene e saúde no trabalho por parte da Recorrente e com comportamento culposo.»

Termina pedindo que seja alterado «o douto Acórdão do Tribunal da Relação e mantida a decisão do tribunal de 1ª instância na absolvição da Ré CC com todas as legais consequências».

O Autor, com o patrocínio do Ministério Público, respondeu às alegações do recorrente tendo apresentado as seguintes conclusões:

«1. Salvo melhor entendimento, o presente recurso não deve proceder.

2. É que, a decisão recorrida foi já proferida após 01-09-2013, pelo que é aplicável ao presente recurso o disposto no novo CPC (vide arts 7.º e 8° da Lei n.º 41/2013, de 2/06).

3. Desde logo, formalmente o recurso não obedece aos requisitos legais, pois que, salvo melhor leitura, não constam do requerimento de interposição do recurso as normas legais que regulam a admissão de tal recurso, nem das respectivas alegações consta expressamente qualquer referência ao normativo legal que as fundamentam.

4. É certo que, a recorrente tem legitimidade para interpor o recurso, e, estando em causa decisão proferida em processo emergente de Acidente de Trabalho, o recurso é sempre admissível (vide art.º 79° al. b) do CPT). Mas, ao modo de interposição do recurso de Revista aplica-se o regime estabelecido no novo CPC (vide art.º 81.º n° 5 do CPT).

5. E os fundamentos do recurso de Revista mostram-se estabelecidos no n.º 1 do artº 674.º do CPC: erro de interpretação ou de aplicação da lei, ou erro de determinação da norma aplicável (vide al. a), violação ou errada aplicação da lei de processo (vide al. b), ou nulidades previstas nos artºs 615.º e 666° do CPC (vide al. c), explicitando-‑se no seu n.º 2, o que se entende por lei substantiva.

6. Ora, salvo melhor entendimento, a recorrente não deu cumprimento às citadas disposições legais, pelo que se não descortina qual o fundamento legal do recurso, e, em consequência, este não deve ser admitido, ou pelo menos, deverá aquela ser convidada a reformular as conclusões do recurso interposto, por as ter apresentado de modo deficiente e obscuro e por não ter dado cumprimento ao disposto nos n.ºs 1 e 2, als. a) e b) do art° 639° do CPC, aplicável nos termos referidos no n.º 3, da citada disposição legal.

7. Sem conceder, parece ainda assim resultar do teor das conclusões das alegações do recurso interposto que, a R./recorrente pretende, ainda que encapotadamente, impugnar a Matéria de Facto que decorreu da alteração operada pelo Tribunal da Relação de Évora (designadamente, os pontos 15, 27, 28, 30 e 40, do Acórdão do T.R. de Évora), mas o disposto no n.º 3 do art.º 674.º do CPC afasta expressamente a possibilidade do recuso de Revista em caso de alegado erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa (salvo ofensa de disposição expressa que imponha certa prova ou fixe a força de determinado meio de prova, pelo que sempre seria de rejeitar o recurso nesta parte, pelo que, no caso sub judice é vedada a apreciação de tal matéria de facto pelo S.T.J., devendo improceder o recurso).

8. Acaba, no entanto, por afirmar que, ainda assim, a alteração da Matéria de Facto realizada não é suficiente para modificar a decisão proferida em 1.ª Instância, designadamente, quanto à responsabilidade pelo acidente em causa, mas sem razão, em nosso entender.

9. É que, o Acórdão ora recorrido alterou, em parte, a matéria de facto constante de decisão proferida em 1.ª Instância, designadamente, em relação aos pontos 15° (vide fls. 932, do Acórdão), 27.º (vide fls. 934, do Acórdão), 28° (eliminado - vide fls. 938, do Acórdão), 30° (eliminado - vide fls. 935vo, do Acórdão) e 40° (eliminado - vide fls. 937v.º do Acórdão), e aqui dados por inteiramente reproduzidos.

10. Questiona-se, no entanto, se mesmo face à matéria de facto primitivamente fixada, não haveria já de concluir-se pela verificação da infracção às regras de segurança, quanto aos procedimentos que estiveram na origem do Acidente participado nos autos.

11. E, tal como decorre do recurso interposto pela Ré/seguradora relativamente à sentença proferida em 1.ª instancia, entende-se que, já se verificava tal violação o que sempre daria origem à responsabilidade agravada da entidade empregadora, ainda que tal violação fosse também de assacar à entidade utilizadora do trabalho temporário ou a terceira entidade.

12. É que, salvo melhor entendimento, e, desde logo, já havia sido dado como provado, para além do mais, o constante dos pontos 20° (decorriam trabalhos de remoção do 2° varandim d... I), 21.º (tal varandim havia sido instalado há cerca de 30 anos, aquando do arranque da Refinaria de ...), 22° (tal varandim situava-se a cerca de 17,9m de altura), 24° ( (só) os suportes do varandim pesavam 31Kg, cada um), 25° (tal varandim estava colocado sobre dois suportes e foi fixo com dois parafusos M8), 26° (na paragem do ano/2004 - cerca de quatro anos antes do acidente - tal varandim foi inspeccionado e sinalizado para ser substituído na próxima paragem, por estar deteriorado, tal como os respectivos componentes e peças), 27.º (à data dos factos o varandim e os parafusos de fixação estavam em estado de corrosão), 29° (a base do varandim não estava a ser amparado, estando apenas o seu topo amarrado à grua).

13. E, assim, face a tal matéria de facto, a que acresce o facto, de inexistir uma cobertura de protecção para o risco de queda de materiais, entende-se que já em sede de 1.ª Instância era patente a prática da infracção ao disposto nos art.º 95° e 159° do Regulamento de Segurança da Construção Civil - Dec. n° 41821 de 11-08-1958 e, bem assim, ao disposto no art° 69° n.ºs 4 e 5 da Portaria n° 53/71 de 3/2, (na redacção da Portaria n.º 702/80, de 22/09), para além das disposições previstas no CT 2003 – art.ºs 272° e 273° - e 18° da LAT.

14. No entanto, a M.m.ª Juiz em causa afastou a verificação de tal infracção, ao que parece, pelo facto de ter entendido que, apesar de ter sido contemplada no Plano de avaliação de riscos e de execução da tarefa em causa e, bem assim, apesar de ao mesma ter sido autorizada pelo dono da obra, a "...", não se tinha averiguado "se tal meio seria possível de implementar tendo em consideração que no terreno estavam a dar apoio aos trabalhos a grua e a máquina multifunções, nem se mesmo colocada em face do peso da base do varandim que caiu tal seria suficiente ... "

15. Certo é, porém, que nada tendo sido feito, é que se revelou insuficiente, de todo ...

16. Acresce que, se foi contemplada no Plano de avaliação de riscos e de execução da tarefa a utilização dos referidos meios, então é porque tal era viável e, obviamente, aconselhável.

17. Por outro lado, já se sabia, desde 2004, após inspecção, do estado de corrosão dos materiais, o que obrigava a um maior cuidado na sua desmontagem, em 2008!

18. Ora, ainda assim, na decisão proferida em sede de l.ª Instância se concluiu não se ter demonstrado "a violação de regras de segurança no trabalho, ou actuação culposa e exclusiva imputável ao empregador ou seu representante … "

19. No entanto, tendo este Tribunal da Relação de Évora no Acórdão ora sob recurso, operado a alteração de parte da Matéria de Facto (designadamente, dos seus pontos 15, 27, 28, 30 e 40), resulta ainda mais nítida a violação das regras de segurança pela empresa que executava os trabalhos.

20. Na verdade, atento, designadamente, o teor dos pontos 2.º, 3.º, 5.º, 6°, 14°, 20.º, 21.º, 26.º, 37° a 39.º da matéria de Facto constante do Acórdão recorrido, pode não ter havido falta de planificação, mas concorda-se que, se tem por verificada a culpa na execução do respectivo Plano, quer pela "DD", enquanto empresa utilizadora do trabalho do sinistrado, quer também da ''CC'', na qualidade de entidade empregadora em virtude de um contrato de trabalho temporário mantido com aquele trabalhador, sendo que, ambas poderiam ter actuado de forma diversa, concluindo-se, assim, que agiram ambas com inobservância das regras de segurança, pois que, tal inobservância por parte da primeira, responsabiliza também a segunda.

 21. Acresce que, para além disso, não foi produzida prova de a entidade empregadora do sinistrado ter dado cumprimento ao disposto nos artºs 272° e 273° n° 4, al. a) do CT/2003 (cooperação no sentido da protecção da segurança e da saúde), providenciado junto da empresa utilizadora, para que os seus trabalhadores actuassem protegidos e devidamente informados sobre as regras de segurança em concreto, naquele local.

22. Assim, não podendo ser impugnada a matéria de facto constante do Acórdão recorrido esta deve ter-se por fixada.

23. E, dela decorre a responsabilização agravada da entidade empregadora, já que, para além do mais, se verifica também o nexo causal entre a violação das regras de segurança e o acidente, tal como decorre da fundamentação de direito constante do Acórdão ora sob recurso, e aqui dada por inteiramente reproduzida.

24. Nesse sentido tem decidido a Jurisprudência já citada no douto Acórdão recorrido e, bem assim, em caso semelhante ao dos autos, mas em acidente mortal, no Ac. do STJ de 29-03-2012- P.º n° 289/09.0TTSTB.E1.S1-www.dgsi.pt e no Ac. do TRE de 08-11-2011- no mesmo P.º  n.º 289/09.0TTSTB.EJ.-www.dgsi.pt.

25. E, a responsabilização da recorrente como entidade empregadora decorre expressamente do Ac. de UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA de 06-02-2013, P.º nº 289.0TTSTB-A.S1-www.dgsi.pt.

26. Pelo que, mesmo que se entendesse não haver lugar à rejeição do recurso interposto sempre seria de manter na íntegra a decisão proferida pelo T.R.E. por ter alterado de acordo com a melhor apreciação dos factos a decisão proferida em 1.ª Instância, e tendo feito a melhor integração jurídica dos factos fixados, deverá o recurso ser considerado improcedente e o Acórdão ser mantido na íntegra.»

Também a FF Companhia de Seguros, S.A. respondeu ao recurso interposto, concluindo nos seguintes termos:

«1. Não se conformando com o douto Acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Évora, o qual veio, com irrepreensível clareza e coesão, reapreciar todas as questões, fácticas e jurídicas, em apreço nos presentes autos, condenando a Ré CC, Ld.ª, a título principal e de forma agravada, a pagar ao A. sinistrado BB, todas as prestações indemnizatórias legalmente previstas e devidas em decorrência do infeliz acidente de trabalho por este sofrido em 26.09.2008, vem a ora R. e Recorrente CC - Empresa de Trabalho Temporário Lda., agora insurgir-se contra a Veneranda decisão ora recorrida, apresentando para o efeito argumentação que, salvo o devido respeito por melhor e douta opinião, não poderá, absolutamente, proceder.

2. Na verdade, e ressalvando o devido respeito, que é mesmo muito, não poderá a ora Recorrida FF deixar de referir, desde logo, que das doutas alegações de recurso apresentadas nos autos pela Recorrente CC, Lda., pouco mais se retira, salvo melhor e douta opinião, do que a sua discordância (embora infundada e muito pouco fundamentada) com a douta e exaustiva apreciação, levada a cabo pelos Exm.ºs Senhores Juízes Desembargadores do Tribunal da Relação de Évora, de todo o circunstancialismo fáctico e jurídico em apreço nos presentes autos.

3. Com efeito, limita-se a ora Recorrente a invocar (embora, em certos momentos, até de forma ininteligível), a inexistência, a seu ver, de nexo de causalidade entre a factualidade apreciada e dada como provada nos autos, e a ocorrência do (infeliz) acidente sofrido pelo A. BB, sustentando, por outro lado, a impossibilidade de "colocação de oleados-telas-redes no local, devido à presença dos equipamentos, móveis e de grandes dimensões, que (a seu ver) eram adequados e necessários à execução daquele trabalho".

4. Assim, conclui a ora Recorrente (surpreendentemente) que "mesmo colocando os equipamentos de segurança que se indicam, entendemos, salvo melhor opinião, que não ficou provado que o objecto não viesse a cair no solo e atingisse trabalhadores que aí eventualmente circulassem".

5. Acrescentando ainda que, a seu ver, “A medida adequada seriam não circular por baixo do local que se desenrolavam os trabalhos e o sinistrado bem sabia que não deveria circular por baixo d..." - sic.

6. Pretendendo assim, presumivelmente, fazer crer que a ocorrência do infeliz acidente em apreço nos autos ter-se-á ficado a dever ao comportamento que imputa como negligente e omissivo do próprio sinistrado, possibilidade (suscitada em sede de defesa da ora R. entidade patronal) que, contudo, ficou desde logo absoluta e manifestamente afastada em sede de Audiência de Discussão e Julgamento.

7. Ora, salvo o devido respeito por melhor e douta opinião, não poderão tais argumentos colher, de todo, perante V. Ex.ªs, encontrando-se o douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora na mais perfeita consonância com toda a factualidade discutida e apreciada nos autos, e bem assim com todas as normas legalmente previstas e aplicáveis ao caso em apreço nos autos.

8. De facto, e conforme bem salientou o douto Aresto agora posto em crise pela Recorrente, de toda a matéria de facto apreciada e provada nos autos, é possível concluir-se (sem qualquer hesitação) "pela assunção de comportamentos culposas por parte da R. DD, Ld.ª, enquanto empresa utilizadora da força de trabalho do sinistrado e aqui A. BB, no âmbito de um contrato de utilização de trabalho temporário que havia celebrado com a R. CC, Lda., e consequentemente por parte desta, enquanto empregadora daquele sinistrado ao abrigo de um contrato de trabalho temporário para exercer funções ao serviço da DD, Lda., já que, cada uma no seu plano, e como iremos verificar, podia e tinha capacidade para atuar de forma diversa, assim como se constata a inobservância de regras de segurança no trabalho por parte da R. DD. Lda., sendo que da matéria de facto provada nada resulta no sentido de que a R. CC. Lda., tenha providenciado junto daquela para que os trabalhadores por si contratados e a ela cedidos, entre eles o aqui A. estivessem a desempenhar as suas funções devidamente protegidos e informados acerca dos riscos ou dos perigos que o trabalho a desenvolver comportava" - com negrito e sublinhado nosso.

9. Assim, e conforme resulta com manifesta clareza do douto Acórdão recorrido, importará considerar, antes de mais, "que os trabalhos a executar consistiam, entre outros, em proceder à remoção do 2.º varandim d... I da refinaria de ..., estrutura que se sabia estar deteriorada, bem como os respectivos componentes e peças, uma vez que tal havia sido sinalizado, já na paragem da refinaria ocorrida em 2004, de forma a ser substituído na paragem seguinte (ponto 26.9 dos factos provados)." -  nosso sublinhado.

10. Para além disso, e conforme salientou o douto Tribunal da Relação, "demonstrou-se que esse varandim tinha os apoios dos seus suportes soldados à Flare a uma altura de 17,9 metros, que os dois suportes do varandim, cada um com 31Kg de peso, se encontravam aparafusados a esses apoios com quatro parafusos e que o varandim estava, por sua vez, colocado sobre esses suportes e fixo aos mesmos através de dois parafusos M8, sendo que, quer o varandim, quer os parafusos de fixação dos suportes se encontravam em avançado estado de corrosão e um desses parafusos já se encontrava partido (cfr. pontos 22.9, 25.9, 27.9 e a parte inicial do ponto 29.9 dos factos assentes)."

11. Sucede que, pese embora tenha sido demonstrado que "em 18/08/2008 a R. ..., S.A. emitira uma autorização de trabalho à R. DD, Lda. nos termos da qual esta deveria colocar oleados-telas-redes sob os locais de trabalho efectuado em altura (ponto 6.9 dos factos assentes), nada se demonstrou no sentido do cumprimento dessa exigência da ..., S.A. para a execução daquele trabalho em concreto, assim como não se demonstrou que, na ausência de colocação dos referidos oleados-‑telas-redes - quiçá por tal não ser tecnicamente possível tendo em vista a prevenção do risco de queda de algum objecto durante a execução do trabalho, ou mesmo de algum elemento da estrutura a remover - tenha sido adoptada alguma outra medida de segurança alternativa, designadamente a criação de uma zona de delimitação de barreiras físicas próxima da Base d... e em torno dela, zona de possível queda de utensílios de trabalho ou de componentes da estrutura a remover e que ficasse interdita à circulação de quem quer que fosse, pelo menos, durante os trabalhos de remoção" - com negritos e sublinhados nossos.

12. Assim, considerou (exemplarmente) o Venerando Tribunal da Relação que "tendo em consideração o estado de degradação do conjunto varandim/suportes e seus componentes anteriormente mencionados, verifica-se que a DD, Ldª, ao não cumprir a referida exigência da ..., S.A. e ao não ter adotado uma qualquer outra medida alternativa e eficaz de forma a afastar o risco de acidente decorrente da queda de objectos durante a execução dos trabalhos em altura na remoção do varandim em causa, traduz a assunção de um comportamento culposo por parte da DD, Ldª., o qual se mostra adequado à produção do sinistro nas circunstâncias em que o mesmo se veio a verificar, tanto mais que nada se provou no sentido do A. estar impedido de circular junto à Base d... I."

13. E assim conclui o douto Acórdão recorrido com o c1aríssimo juízo de prognose: "( ... ) tivesse a DD, Lda. colocado os referidos oleados-telas-redes de proteção, com as características técnicas suficientes que lhe conferissem capacidade para suportar a queda de quaisquer objectos durante a execução do trabalho em causa, ou então criado a mencionada zona de delimitação com barreiras físicas próximas da base da FIare e em torno dela com a interdição de circulação de quem quer que fosse, pelo menos, durante os trabalhos de remoção e o acidente objecto dos autos não se teria verificado" - nosso negrito.

14. Por outro lado, não acautelou a ora Recorrente CC, Lda., tal como amplamente demonstrado nos autos, que tivessem sido observadas e cumpridas as normas legais e regulamentares em vigor em matéria de higiene, segurança e saúde no trabalho (atento o tipo de funções e tarefas incumbidas ao trabalhador sinistrado), não tendo ainda velado pelo cumprimento de quaisquer medidas prévias e preventivas que poderiam, de facto, ter evitado o infeliz resultado da queda da peça metálica que atingiu o A.

15. Ora, nesta medida, e ressalvando o devido respeito por melhor e douta opinião de V. Exas., resulta à saciedade dos autos que o acidente sofrido pelo A. BB em 26.09.2008, o qual lhe determinou uma "incapacidade temporária absoluta (ITA) desde a data do acidente até ao dia 29 de Outubro de 2009 e que, desde esta última data, foi determinante para a afectação ao sinistrado de uma incapacidade permanente parcial de 66%, acrescida de uma incapacidade permanente e absoluta para o seu trabalho habitual (IPATH)", apenas ocorreu devido à assunção de comportamentos negligentes e culposas, quer por parte da R. DD, enquanto empresa utilizadora de mão de obra do trabalhador sinistrado, quer por parte da ora Recorrente CC, Lda., a qual, enquanto entidade empregadora, não poderia descurar que um trabalhador, por si cedido, fosse sujeito a um elevado risco e que estivesse a desempenhar as suas funções sem que estivesse devidamente protegido e informado sobre os riscos e perigos que o trabalho a desenvolver comportava, demonstrando, assim, uma clara violação de um dever geral de cuidado que sobre si, entidade patronal, impendia.

16. De modo que, nenhuma censura merece o douto Acórdão agora proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Évora pois que, de facto, resulta à saciedade dos autos que o acidente em apreço apenas ocorreu, única e exclusivamente, devido ao comportamento negligente e omissivo imputável quer aos representantes da Ré DD, Lda., enquanto empresa executante da obra e utilizadora de mão-de-obra dos trabalhadores, quer aos representantes da Ré e ora Recorrente CC, na qualidade de entidade contratante da mão-de-obra do trabalhador, sobre a qual impendia, por tal motivo, a responsabilidade de assegurar a segurança e a saúde dos seus trabalhadores cedidos.

17. Por outro lado, e conforme douto entendimento, igualmente prosseguido pelo Venerando Tribunal da Relação de Évora, não restam igualmente quaisquer dúvidas de que foram concretamente violadas regras específicas previstas em matéria de segurança, higiene e saúde dos trabalhadores que exerciam as funções concretamente apreciadas nos autos, sendo que a violação de tais regras e das "leges artis" que regem especificamente aquela actividade profissional, verificam-se como causa única e exclusiva do infeliz resultado - dano - sofrido pelo sinistrado BB.

18. Dito de outro modo, tivessem sido observadas e cumpridas todas as previsões legais e regulamentares em matéria de saúde e segurança dos trabalhadores afectos a tal actividade laboral, nomeadamente através da instalação de telas/barreiras protetoras que impedissem, em concreto, a queda de objectos em altura, ou mesmo através da interrupção/desvio da" circulação dos próprios trabalhadores (dentro do perímetro de segurança afecto a pessoas estranhas ao serviço) durante o período de tempo indispensável à realização daquela tarefa, não teria o sinistrado se posicionado/acedido ao local que, naquele momento, era considerado de alto e elevado risco (nomeadamente de queda de objetos/cargas suspensas).

19. De modo que, inequívoco se demonstra, no caso em apreço, a negligência/culpa dos responsáveis/representantes da entidade patronal. verificando-se um claro nexo de causalidade entre o referido comportamento negligente e omissivo e, mesmo entre a violação de regras de segurança especificamente previstas e a ocorrência do acidente.

20. Ora, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 18.º, n.º 1 e 37.º, nº  2, da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro (LAT), para que a entidade empregadora possa responder a título principal e de forma agravada, em virtude de acidente de trabalho resultante da falta de cumprimento de regras sobre segurança, higiene e saúde dos seus trabalhadores, afigura-se efectivamente necessário provar-se que:

a) por um lado, recaía sobre a empregadora o dever de observar determinadas regras de comportamento cuja observância, seguramente ou muito provavelmente, teria impedido a consumação do evento danoso, sendo ainda necessária a demonstração de que a entidade empregadora (ou seu representante) faltou à observância dessas regras, não tomando por esse motivo o cuidado exigível a um empregador normal;

b) afigurando-se, por outro, essencial a demonstração de que entre essa sua conduta e o acidente existe um nexo de causalidade adequada,

21. Na verdade, o artigo 18.º, n.º 1, da LAT contém duas previsões distintas, contemplando: a) no primeiro segmento, os casos em que o acidente é provocado pela entidade patronal, ou por um seu representante, intencional ou negligentemente (por imprudência, imperícia ou inconsideração, traduzindo a violação do dever geral de cuidado), casos em que a culpa é apreciada pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso (nos termos do artigo 487,º, n.º 1, do Código Civil); e, b) no segundo segmento, os casos de inobservância de regras específicas de comportamento, atinentes a certas e específicas actividades laborais, de que decorrem deveres especiais, cuja violação traduz uma conduta negligente.

22. Ora, de facto, para que seja concretamente afastada a responsabilidade objectiva assumida pela entidade seguradora por via da celebração do contrato de seguro obrigatório de acidentes de trabalho, e em decorrência de determinado sinistro coberto por tal apólice de seguro, devem resultar efectivamente demonstradas todas as circunstâncias que, em concreto, conduziram ao evento danoso e ao resultado lesivo, devendo ser possível afirmar a existência de elos/nexos causais entre o comportamento negligente imputável e concretamente assumido pela entidade empregadora, ou mesmo entre a violação de regras concretas e específicas de segurança e saúde no trabalho e aquele resultado.

23. Por outras palavras, afigura-se necessária a demonstração da responsabilidade subjectiva da entidade empregadora, a qual poderá traduzir-se num comportamento negligente e/ou omissivo causador de danos a um seu subordinado, ou ainda na falta de observação de regras concretas e especificamente balizadoras de determinada actividade laboral exercida pelos seus trabalhadores.

24. No primeiro caso, necessária se fará a prova da culpa, a qual será apreciada tomando como referência o homem médio inserido na mesma profissão e com os conhecimentos medianos necessários para o exercício daquela actividade laboral, sendo que no segundo caso, desnecessária se fará tal demonstração, bastando-se a lei pela concreta violação de uma específica regra existente em matéria de segurança e saúde dos trabalhadores no âmbito da actividade concretamente desempenhada.

25. Nestes casos, determina o artigo 37.º, n.º 2 da LAT (na redacção da Lei 100/97, aplicável ao caso dos autos) que "Verificando-se alguma das situações referidas no artigo 18.º, n.º 1, a responsabilidade nela prevista recai sobre a entidade empregadora, sendo a instituição seguradora apenas subsidiariam ente responsável pejas prestações normais previstas na presente lei. "

26. No mesmo sentido vai a norma prevista no artigo 21.2 da Apólice Uniforme de Seguro de Acidentes de Trabalho para Trabalhadores por conta de outrem (Norma n.º 12/99- R, de 8 de Novembro, com as alterações introduzidas pelas Normas n.ºs 11/2000-R, de 13 de Novembro, 16/2000-R, de 21 de Dezembro, e 13/2005-R, de 18 de Novembro), a qual determina, nos termos previstos na alínea b) do n.º 1, que "Após a ocorrência de um acidente de trabalho, a seguradora apenas tem direito de regresso contra o tomador de seguro: b) pelo valor das indemnizações ou pensões legais e dos demais encargos, quando o acidente tiver sido provocado pela entidade empregadora ou seu representante, ou resultar de falta de observância das regras sobre a higiene, segurança e saúde nos locais de trabalho".

27. Prevendo a norma constante do n.º 2 do mesmo artigo que "Nos casos previstos na alínea b) do número anterior, a seguradora responde subsidiariamente, depois de executados os bens do tomador de seguro, apenas pelas prestações a que haveria lugar sem os agravamentos legalmente estipulados para essas situações, e sempre tomando por base a retribuição declarada." (com negritos e sublinhados nossos).

28. Assim, dispõe expressamente a LAT, e bem assim a Apólice Uniforme de Seguro de Acidentes de Trabalho, até como forma de prevenir e acautelar comportamentos imprevidentes por parte daqueles que são efectivos titulares do "risco de autoridade", que verificando-se qualquer um dos casos previstos no artigo l8.º, n.º 1 da LAT (comportamento culposo que tem como resultado determinado evento lesivo, ou violação específica de regras de segurança), responderá a entidade empregadora (esta sim verdadeira titular dos proveitos obtidos através do exercício profissional dos seus trabalhadores) em primeira linha perante os danos causados por um seu comportamento negligente.

29. E de outra forma não poderia ser, sob pena de se perder a função especialmente reparadora prevista na LAT, no que respeita, por um lado, os danos sofridos por trabalhador sinistrado em virtude de comportamento negligente e/ omissivo imputável à sua entidade patronal, ou mesmo em virtude de esta o sujeitar a riscos desmensurados e desproporcionais com o tipo de trabalho que aquele se propõe a executar, gerando-se ainda, por outro, um claro desequilíbrio das posições contratuais assumidas pela empregadora e pela entidade seguradora que, em contrapartida de determinado prémio de seguro, assume os riscos normais e previsíveis inerentes ao exercício da atividade profissional dos trabalhadores subordinados àquela entidade empregadora.

30. Ora, atenta a factualidade apreciada e provada nos autos, resulta manifesto que o infeliz acidente sofrido pelo trabalhador BB deveu-se inequivocamente, a um comportamento negligente e omissivo imputável quer aos representantes da empresa utilizadora da sua mão-de-obra, DD, quer aos representantes da Recorrente CC entidade empregadora do sinistrado em sentido estrito.

31. Na verdade, se por um lado não foi a obra devidamente planificada e executada pelos representantes da Ré DD atento o conhecido e evidente estado de avançada corrosão e degradação dos materiais intervencionados, não tendo sido devidamente avaliados os riscos inerentes à execução das tarefas atribuídas aos trabalhadores sob suas ordens e supervisão, também não acautelou a Recorrente CC, tal como deveria, que o trabalhador recebesse toda a formação necessária ao desempenho das tarefas (potencialmente perigosas) que lhe seriam atribuídas.

32. Não tendo a ora Recorrente CC. Lda. igualmente prevenido e acautelado os riscos acrescidos aos quais o trabalhador estava sujeito pela circunstância de encontrar-se a trabalhar, ininterruptamente e sem qualquer descanso, por períodos diários de cerca de 12 horas;

33. Não tendo a Recorrente ainda acautelado o controle/fiscalização da movimentação dos trabalhadores em obra, o que teve como consequência a presença do sinistrado num local de alto risco, precisamente no momento em que se encontravam a ser transportadas/içadas cargas suspensas a mais de 17 metros de altura do solo!

34. Ora, determina expressamente o artigo 159.º do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil (Decreto-lei n.º 41821 de 11.08.1958) que "Ficando colocados a mais de 3,50 m de altura materiais e utensílios que possam cair e atingir alguém, será construída uma cobertura de protecção ou adoptada outra medida eficaz."(com negritos e sublinhados nossos).

35. Determina ainda o artigo 95.º do mesmo diploma que "O içamento de cargas junto de locais de circulação habitual de pessoas será feito em recintos resguardados. Se, o volume da carga ou outro motivo atendível impedirem a aplicação desta regra, cumprirá aos interessados providenciar para que a circulação seja desviada ou interrompida pelo tempo indispensável."

36. Ora, tendo resultado da matéria de facto provada que os apoios dos suportes encontravam-se soldados à Flare, a uma altura de 17,9 metros de altura (cfr. facto 22.º da douta Resposta à Matéria de Facto), e resultando ainda claro dos autos que o objecto metálico que atingiu o trabalhador foi precisamente um dos suportes ligados à Flare, inequívoco resulta que os trabalhos de desmontagem do 2.º varandim se situavam a 17,9 metros de altura, constituindo, assim, a execução do trabalho em causa, um verdadeiro trabalho em altura.

37. Por outro lado, resulta ainda manifesto que inexistia qualquer cobertura de protecção para o risco de queda dos materiais, muito embora tal medida estivesse expressamente prevista na autorização de trabalho emitida pela ..., nomeadamente "colocar oleados telas! cintas, sob os locais de trabalho efectuados em altura".

38. Ora, atenta a factualidade julgada provada nos autos (expressamente constante do douto Acórdão agora posto em crise pela Recorrente CC, e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos - por concordar-se na íntegra com todas as suas doutas conclusões), inexistem dúvidas quanto a efectiva falta de observação das regras de higiene, segurança e saúde, por parte da ora Recorrente CC, Lda., expressamente previstas nos artigos 159.º e 95.º do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil (Decreto-lei n.º 41821 de 11.08.1958), e bem assim no artigo 69.º do Regulamento Geral de Higiene no Trabalho nos Estabelecimentos Industriais (Portaria 53/71, na redacção da Portaria 702/80), e nos artigos 272.º e 273.º do Código do Trabalho (lei n.º 99/2003 de 27.08).

39. De modo que, inquestionável resulta, pois, dos autos, e conforme douto entendimento prosseguido pelo Venerando Tribunal da Relação de Évora, que a empresa utilizadora de mão-de-obra DD, Lda., e ora Recorrente CC, Lda., enquanto verdadeira entidade patronal do trabalhador sinistrado, infringiram as disposições legais e regulamentares previstas em matéria de higiene, segurança e saúde no trabalho, permitindo que o trabalhador sinistrado fosse sujeito a um elevado e desmensurado risco, sendo a sua actuação causal para a ocorrência do infeliz acidente em apreço nos autos.

40. Acresce ainda que, independentemente da violação das concretas e identificadas normas de segurança, nunca poderia deixar de se [imputar] à entidade empregadora, aqui R. CC, Lda., a título de culpa, a responsabilidade pela ocorrência do acidente dos autos, tendo em conta a clara e efetiva violação de um dever geral de cuidado que sobre si impendia.

41. De facto, tendo a ..., S.A. emitido uma autorização de trabalho à R. DD, Lda. nos termos da qual esta deveria colocar oleados-telas-redes sob os locais de trabalho efectuado em altura, acautelando, assim, que a eventual queda de objectos, aquando do exercício dos trabalhos em altura, pudesse atingir os trabalhadores presentes na obra, nada se demonstrou no sentido do cumprimento dessa exigência da ....

42. Não se tendo igualmente demonstrado que, na ausência de colocação dos referidos oleados-telas-redes eventualmente até por alguma impossibilidade técnica, tenha sido adoptada alguma outra medida de segurança alternativa, designadamente a criação de uma zona de delimitação de barreiras físicas próxima da Base d... e em torno dela (constituindo esta, uma zona de possível queda de utensílios de trabalho ou de componentes da estrutura a remover), que ficasse interdita à circulação, não apenas das pessoas estranhas ao serviço, mas igualmente aos próprios trabalhadores, pelo menos, durante os trabalhos de remoção dos componentes metálicos em causa.

43. Ora, demonstrado que está que o acidente em apreço nos autos ocorreu, inequivocamente, em decorrência da verificação de uma série de comportamentos negligentes e culposos imputáveis quer à R. DD, Lda., enquanto empresa utilizadora da mão-de-obra dos trabalhadores, quer à Ré e ora Recorrente CC, Lda (a qual, enquanto entidade patronal do A., verdadeiramente, beneficia da actividade prestacional do trabalhador e conforma a sua laboração através de um vínculo - real ou potencial - de autoridade/subordinação jurídica e económica, devendo igualmente assumir a responsabilidade pela reparação dos sinistros que com ele ocorram), sendo assim inquestionável, salvo douta opinião em contrário, o nexo de causalidade entre a actuação negligente e culposa da ora recorrente e a ocorrência do infeliz acidente em apreço nos autos; e resultando ainda inequívoca a violação das normas de segurança e saúde previstas no âmbito da execução desses trabalhos em concreto, forçoso será concluir pela responsabilização da ora Recorrente CC, Ld.ª, entidade patronal do sinistrado e aqui A. BB, nos termos conjugados dos arts. 18.º n.º 1, e 37.º, n.º 2, da LAT, e em conformidade com a douta decisão proferida pelo Venerando Tribunal da Relação no douto Acórdão recorrido.

44. De modo que, ressalvando novamente o devido respeito por melhor e douta opinião de V. Exas., deverão improceder todas as conclusões da Recorrente CC, Lda., não merecendo o Douto Acórdão qualquer censura, devendo ser negado provimento ao presente recurso, mantendo-se, na íntegra, a douta decisão recorrida, só assim se fazendo VERDADEIRA JUSTIÇA.»

Sabido que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, nos termos do disposto nos artigos 635.º, n.º 3, e 639.º do Código de Processo Civil, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, está em causa na presente revista a violação de normas de segurança na execução dos trabalhos em que ocorreu o sinistro e a existência de um nexo de causalidade entre essa violação e aquele sinistro.


II

As instâncias fixaram a seguinte matéria de facto:

«1º. No dia 26/09/2008, pelas 12h15, na Base d... I FL-X1, na Refinaria da AA, em ..., enquanto exercia as suas funções de ajudante de serralheiro, o Autor foi atingido por um suporte metálico em queda, que o atingiu na cabeça. [Al. A) dos factos assentes].

2º. Em 23/04/2008, a Ré GG - ..., S.A. celebrou um contrato escrito com a Ré HH – Serviços e Equipamentos Técnico- Industriais, Lda., nos termos do qual a segunda deveria proceder à reparação d... I e do qual consta:

“[…]

2 – DEFINIÇÃO DOS TRABALHOS

O EMPREITEIRO será responsável por todos os trabalhos adiante indicados, assim como os meios humanos e materiais necessários à sua execução.

[…]

5.2 – RESPONSABILIDADE DO EMPREITEIRO

É da responsabilidade do EMPREITEIRO a direcção, a qualidade técnica de execução, a coordenação e planeamento dos trabalhos, bem como o fornecimento de todos os meios humanos e materiais necessários à execução dos trabalhos que não façam parte dos fornecimentos da responsabilidade da AA descritos neste caderno de encargos.

5.2.1 – NO QUE SE REFERE A MATERIAIS, EQUIPAMENTOS E PESSOAL

São fornecidos pelo Empreiteiro todos os materiais e equipamentos não identificados como da responsabilidade da ..., sendo de salientar, entre outros, os abaixo indicados:

[…]

• Toda a mão-de-obra especializada e auxiliar;

[…]

5.2.2. – NO QUE SE REFERE AO PLANEAMENTO DOS TRABALHOS

[…] o EMPREITEIRO deverá apresentar um planeamento detalhado, no prazo definido no contrato, para aprovação por parte da AA. Este planeamento deverá englobar os seguintes itens:

A descrição e interligação das fases de execução dos trabalhos, com a indicação do “caminho crítico”.

A previsão de duração de cada fase e da conclusão global dos trabalhos. Diagrama de carga de pessoal necessário e respectiva distribuição por categorias profissionais.

Planeamento global dos trabalhos.”.- [Al. B) dos factos assentes]

3º. Em 24/07/2008, a Ré CC – Empresa de Trabalho Temporário, Lda. celebrou com a Ré DD – ... de ..., S.A. um contrato de utilização de trabalho temporário.- [Al. C) dos factos assentes.].

4º. Na mesma data, a Ré CC – Empresa de Trabalho Temporário, Lda. celebrou um contrato de trabalho temporário a termo incerto com o Autor, no âmbito do qual este seria cedido à Ré DD – ... de ..., S.A..- [Al. D) dos factos assentes].

5º. A Ré DD – ... de ..., S.A. tem por atividade o fabrico de estruturas de ... e a manutenção industrial. [Al. E) dos factos assentes].

6º. Em 18/08/2008, a Ré GG - ..., S.A. emitiu uma autorização de trabalho à Ré DD – ... de ..., S.A.., nos termos do qual a segunda deveria “colocar oleados telas redes, sob os locais de trabalho efetuado em altura” [Al. F) dos factos assentes].

7º. O Autor era remunerado pela Ré CC – Empresa de Trabalho Temporário, Lda. [Al. G) dos factos assentes].

8º. O Autor estava subordinado à direção e controlo da Ré DD – ... de ..., S.A.. [Al. H) dos factos assentes].

9º. A Ré CC – Empresa de Trabalho Temporário, Lda. tinha transferido a responsabilidade emergente de acidentes de trabalho ocorridos com o Autor para a Ré EE – Companhia de Seguros, S.A. com referência a uma retribuição na totalidade anual de €5.964,00 [Al. I) dos factos assentes].

10º. À data dos factos, o Autor auferia uma retribuição salarial de € 426,00 x 14 meses (resposta ao artigo 1º da BI).

11º. A Ré GG – ..., S.A. era a dona da obra onde se encontrava o Autor (resposta ao artigo 2º da BI).

12º. A Base d... FL-X1 é propriedade da Ré GG – ..., S.A. (resposta ao artigo 3º da BI).

13º. A Flare tem 124 metros de altura (resposta ao artigo 4º da BI).

14º. O Autor trabalhava nas instalações da Refinaria da ... na paragem de Setembro de 2008, pelo menos desde 15.09.2008, como operário não especializado, no âmbito da obra de desmontagem, montagens e reparação d... nº 1, cuja execução se encontrava a cargo da R. DD, subcontratada pela R. HH (empreiteira geral da obra da R. ...) - (resposta ao artigo 5º da BI).

15º. Desde 15/09/2008, o Autor trabalhava pelo menos 10 horas diárias, descansava aos Domingos e aos sábados trabalhava oito horas (resposta ao artigo 6º da BI) [2].

16º. A R. ... ministrou ao A. uma ação de indução de segurança em refinaria no dia 4 de Agosto de 2008 das 13h30 às 17h30, a qual compreendia o esclarecimento de regras básicas de circulação no ambiente de refinaria, de cuidados a observar e de equipamento individual a utilizar pelos trabalhadores, incluindo o de trabalhos em altura e riscos de queda de objetos e que a R. DD ministrou ao A. ações de sensibilização em 14/04/08; 24/07/08 e 1/08/2008 subordinados à temática de Equipamentos de proteção individual e segurança, Limpeza, Arrumação, Trabalhos em altura, álcool/tabaco, soldadura, movimentação de cargas, gestão de resíduos – (reposta aos artigos 7º a 9º da BI).

17º. O A. já havia trabalhado nas oficinas da R. DD, em ..., desde 14 de Abril de 2008, desenvolvendo as mesmas funções mas em ambiente de Refinaria era a sua primeira experiência profissional (resposta ao artigo 10º da BI).

18º. Nenhum dos colaboradores da equipa e respetivo chefe/encarregado geral, constatou que o A. não estivesse a desempenhar as tarefas que lhe eram distribuídas (resposta ao artigo 11ºda BI).

19º. No momento do facto referido em 1º, o Autor estava equipado com fato de trabalho, botas e capacete (resposta ao artigo 12ºda BI).

20º. No momento do facto referido em 1º, decorriam trabalhos de remoção do 2.º varandim d... I – (resposta ao artigo 13º da BI).

21º. O 2.º varandim d... I foi instalado há trinta anos, aquando do arranque da Refinaria – (resposta ao artigo 14ºda BI).

22º. Aquando da sua montagem, os apoios dos suportes foram soldados à Flare, a uma altura de 17,9 metros – (resposta ao artigo 15ºda BI).

23º. Os dois suportes foram aparafusados a esses apoios, com quatro parafusos cada – (resposta ao artigo 16ºda BI).

24º. Os suportes tinham 31kg cada (resposta ao artigo 17º da BI).

25º. Após, o varandim foi colocado sobre os dois suportes e foi fixo a estes através de dois parafusos M8 – (resposta ao artigo 18º da BI).

26º. O varandim é somente utilizado na altura das paragens da Refinaria e na paragem de 2004 foi inspecionado e sinalizado para ser substituído na próxima paragem, por estar deteriorado, bem como os respetivos componentes e peças – (resposta aos artigos 19º e 20º da BI).

27º. À data dos factos, o varandim e os parafusos de fixação dos suportes encontravam-se em avançado estado de corrosão – (resposta ao artigo 21º da BI).[3]

28º. (Eliminado pela decisão recorrida).[4]

29º. Um dos parafusos encontrava-se partido, sendo que o suporte que caiu ficou somente seguro por um parafuso corroído que, na operação de desmontagem efetuada, cortando as vigas que sustentavam o varandim à Flare, originou que estivesse a suportar o peso de toda a estrutura, que por isso cedeu, soltando-se a base do varandim, que não estava a ser amparada, já que o varandim estava seguro pelo seu topo, amarrado a uma grua. – (resposta aos artigos 23ºe 24ºda BI).

30º. (Eliminado pela decisão recorrida).[5]

31º. À data dos factos, existiam cancelas metálicas, fitas de sinalização de zona de perigo e sinais de queda de objetos, num perímetro delimitado a uma distância de pelo menos 50 metros d... e nas vias de acesso à zona de trabalhos. – (resposta ao artigo 26ºda BI).

32º. O varandim encontrava-se apoiado em dois suportes soldados e aparafusados à Flare – (resposta ao artigo 28º da BI).

33º. Enquanto decorria o corte dos suportes do varandim, o conjunto suportes/varandim estava suportado por uma grua, através dos tubos (guarda-costas) do próprio varandim, através de quatro pontos de amarração – (resposta ao artigo 29º da BI).

34º. A grua estava posicionada e com os cabos em tensão para suportar o varandim e os suportes logo que estes ficassem libertos d... – (resposta ao artigo 30ºda BI).

35º. O primeiro suporte foi cortado por dentro e o segundo suporte foi cortado por fora – (resposta ao artigo 31º da BI).

36º. Após o corte do segundo suporte, o conjunto varandim/suportes soltou-se d... e o suporte cortado em 1.º lugar desprendeu-se, caindo sobre o Autor – (resposta ao artigo 32º da BI).

37º. A Ré HH – ..., Lda. elaborou o plano de segurança e saúde – (resposta ao artigo 34ºda BI.).

38º. O plano de segurança e saúde continha regras de segurança gerais para o tipo de trabalhos em altura e trabalhos em plataforma inferior a 2 metros, a serem desenvolvidos, tendo sido acrescentadas regras específicas para aquele trabalho, através de autorização de trabalho, que incluía a presença do técnico de segurança no local da obra – (resposta ao artigo 35º da BI).

39º. A Ré GG – ..., S.A., autorizou os trabalhos e aprovou o plano de segurança e saúde – (resposta ao artigo 36º da BI).

40º. (Eliminado pela decisão recorrida)[6].

41º. A Ré EE – Companhia de Seguros, S.A. pagou ao Autor a título de indemnização por incapacidade temporária absoluta entre 27/09/2008 e 30/04/2010 a quantia de €5.490,23 – (resposta ao artigo 39º da BI).

42º. A Ré EE – Companhia de Seguros, S.A. pagou ao Autor a título de pensões provisórias a quantia de € 7.999,12 – (resposta ao artigo 40º da BI).

42º. O sinistrado nasceu em 21 de Março de 1990.

43º. Em consequência do acidente descrito em 1º ficou acometido com uma incapacidade temporária absoluta entre 27 de Setembro de 2008 e 29 de Outubro de 2009 e desde esta data, está afetado com uma incapacidade permanente de 66% com incapacidade para o trabalho habitual.»


III


1 – Tendo-se constatado que as conclusões das alegações do recurso apresentadas pela Ré CC – Empresa de Trabalho Temporário SA, que se encontram a fls. 954 e 955, não respeitavam as exigências decorrentes do artigo 639.º do Código de Processo Civil, foi aquela Ré notificada para os efeitos do disposto no n.º 3 do mesmo artigo, vindo apresentar as conclusões rectificadas que se encontram a fls. 1067 a 1069.

Notificada do teor dessas conclusões, a Ré FF Companhia de Seguros S.A. veio referir que as mesmas ultrapassam o conteúdo das alegações apresentadas tendo requerido que se julgassem não escritas as novas conclusões «na parte em que introduz[em] matéria (claramente) não referenciada nas alegações de recurso, oportunamente apresentadas».

Analisadas as conclusões agora apresentadas e feita a articulação das mesmas com as alegações da recorrente, constata-se que efectivamente aquelas conclusões, embora não suscitem questões novas com reflexo no objecto do recurso, introduzem, contudo, novos argumentos no âmbito da crítica que é dirigida à decisão recorrida.

É o que se passa com as referências à inaplicabilidade ao caso dos autos dos vários números do artigo 69.º do Regulamento Geral de Segurança e Higiene no Trabalho, aprovado pela Portaria n.º 53/71, de 3 de Fevereiro, com as alterações decorrentes da Portaria n.º 702/80, de 22 de Setembro, matéria que não teve qualquer tratamento nas alegações de recurso apresentadas pela recorrente.

Do mesmo modo, não mereceu igualmente qualquer tratamento naquelas alegações a matéria da aplicação ao caso dos autos do artigo 51.º do Regulamento aprovado pelo referido Decreto n.º 41 821, de 11 de Agosto de 1958.

No mais, as novas conclusões apresentadas não ultrapassam o conteúdo das alegações retomando nas suas linhas gerais o conteúdo das conclusões inicialmente apresentadas.

Ora é líquido que a oportunidade de apresentar novas conclusões que integrem as especificações decorrentes do referido n.º 2 do artigo 639.º do Código de Processo Civil, permitida pelo n.º 3 do mesmo dispositivo, não pode ser aproveitada para alterar o âmbito das alegações inicialmente apresentadas.

As exigências decorrentes daquela norma hão-se ser satisfeitas no estrito âmbito do recurso interposto, ou seja de forma articulada com as matérias tratadas nas alegações de recurso apresentadas.

Em conformidade com o exposto, embora o Tribunal tenha de se debruçar sobre as normas de segurança com relevo no processo causal do acidente, não se conhecerão dos novos argumentos agora integrados pela recorrente nas conclusões E), F) e H), relacionados com as normas legais acima citadas.

2 - Tem consagração constitucional o direito dos trabalhadores à prestação do trabalho em condições de higiene, segurança e saúde, conforme resulta da alínea c) do n.º 1 do artigo 59.º da Lei Fundamental, resultando igualmente da alínea f) do n.º 1 do mesmo artigo, o direito dos trabalhadores à assistência e reparação de acidentes de trabalho e doenças profissionais de que sejam vítimas.

O n.º 1 do artigo 272.º do Código de Trabalho de 2003, que se encontrava em vigor na data em que ocorreu o acidente dos autos, reafirma o direito à segurança, à saúde e higiene no trabalho, impondo ao empregador a obrigação de assegurar esse direito, através de um complexo de medidas de natureza preventiva referidas no n.º 2 do mesmo dispositivo e que incidem, tal como resulta do seu n.º 3, sobre a «a) Planificação e organização da prevenção de riscos profissionais»; «b) Eliminação dos factores de risco e de acidente»; «c) Avaliação e controlo dos riscos profissionais»; «d) Informação, formação, consulta e participação dos trabalhadores e seus representantes»; «e) Promoção e vigilância da saúde dos trabalhadores».

O artigo 273.º do mesmo código concretiza o complexo de obrigações enunciado no artigo 272.º, sintetizando as «obrigações gerais do empregador» em matéria de segurança, saúde e higiene no trabalho.

O n.º 4 daquele artigo 273.º consagra o princípio da cooperação na implementação das medidas de natureza preventiva no local de trabalho, quando no mesmo «desenvolvam, simultaneamente, actividades com os respectivos trabalhadores» várias empresas, estabelecimentos ou serviços, determinando que os empregadores, «tendo em conta a natureza das actividades que cada um desenvolve», devem «cooperar no sentido da protecção da segurança e da saúde».

Afirmado o princípio da cooperação, aquele dispositivo determina quem assume a responsabilidade pela coordenação e implementação das medidas, referindo que as “obrigações” que oneram as entidades empregadoras são «asseguradas pelas seguintes entidades:
a) A empresa utilizadora, no caso de trabalhadores em regime de trabalho temporário ou de cedência de mão-de-obra;
b) A empresa em cujas instalações os trabalhadores prestam serviço;
c) Nos restantes casos, a empresa adjudicatária da obra ou serviço, para o que deve assegurar a coordenação dos demais empregadores através da organização das actividades de segurança, higiene e saúde no trabalho, sem prejuízo das obrigações de cada empregador relativamente aos respectivos trabalhadores».

Este dispositivo corresponde no essencial ao disposto no n.º 4 do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 441/91, de 14 de Novembro, que, nos termos do seu artigo 1.º, consagrava os «princípios que visam promover a segurança, higiene e saúde no trabalho, nos termos do disposto nos artigos 59.º e 64.º da Constituição», que por sua vez tem origem no n.º 4 do artigo 6.º da Directiva n.º 89/391/CEE[7], do Conselho, de 12 de Junho de 1989, diploma este que foi transposto para o sistema jurídico português através daquele Decreto-Lei.

3 – Resulta do disposto no artigo 95.º do Regulamento de Segurança na Construção Civil, aprovado pelo Decreto n.º 41 821, 11 de Agosto de 1958, mantido em vigor pelo artigo 29.º do Decreto-lei n.º 273/2003, de 29 de Outubro, que «o içamento de cargas junto de locais de circulação habitual de pessoas será feito em recintos resguardados. Se o volume da carga ou outro motivo atendível impedirem a aplicação dessa regra, cumprirá aos interessados providenciar para que a circulação seja desviada ou interrompida pelo tempo indispensável».

Por outro lado decorre do artigo 159.º do mesmo Regulamento que «ficando colocados a mais de 3,5m de altura materiais e utensílios que possam cair e atingir alguém, será construída cobertura de protecção ou adoptada outra mais eficaz».

Resulta dos n.ºs 3 e 4 do artigo 69.º da Regulamento Geral de Segurança e Higiene no Trabalho, aprovado pela Portaria n.º 53/71, de 3 de Fevereiro, na redacção resultante da Portaria n.º 702/80, de 22 de Setembro, que «os recipientes destinados a içar ou arrear ferramentas ou materiais soltos devem ser concebidos de maneira que nenhum dos objectos transportados possa cair» e «a elevação deve ser precedida da verificação da correcta fixação dos cabos, ligas ou outras amarras às cargas, do bom equilíbrio destas e da existência de qualquer perigo para os trabalhadores».

Do mesmo modo, nos termos do n.º 5 daquele artigo 69.º do mesmo Regulamento, «no decurso da elevação, transporte horizontal e descida das cargas suspensas os sinaleiros devem dirigir a manobra de maneira a que as cargas não esbarrem em qualquer objecto» e, nos termos do n.º 6 do mesmo artigo, «os condutores dos aparelhos de elevação devem evitar, tanto quanto possível, transportar as cargas por cima dos trabalhadores e dos locais onde a sua eventual queda possa constituir perigo».

4 - O acidente dos autos, conforme resulta da matéria de facto, ocorreu em 26 de Setembro de 2008, pelo que é enquadrável pelo regime jurídico decorrente da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro (Regime Jurídico dos Acidentes de Trabalho e das Doenças Profissionais), que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2000, conforme resulta da alínea a) do n.º 1 do seu artigo 41.º, conjugada com o disposto no n.º 1 do artigo 71.º do Decreto-Lei n.º 143/99, de 30 de Abril (Regulamento da Lei de Acidentes de Trabalho), na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 382-A /99, de 22 de Setembro.

O n.º 1 do artigo 18.º da Lei n.º 100/97, sob a epígrafe «casos especiais de reparação», estabelece que «quando o acidente tiver sido provocado pela entidade empregadora ou seu representante, ou resultar de falta de observação das regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho, as prestações fixar-se-ão segundo as regras seguintes: (a) nos casos de incapacidade absoluta, permanente ou temporária, e de morte, serão iguais à retribuição; (b) nos casos de incapacidade parcial, permanente ou temporária, terão por base a redução de capacidade resultante do acidente».

Por seu lado, o n.º 2 do artigo 37.º da mesma Lei dispõe que «verificando-se alguma das situações referidas no artigo 18.º, n.º 1, a responsabilidade nele prevista recai sobre a entidade empregadora, sendo a instituição seguradora apenas subsidiariamente responsável pelas prestações normais previstas na presente lei».

Deste modo, no domínio da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, a responsabilidade agravada do empregador pela reparação de danos derivados de acidentes de trabalho tem dois fundamentos autónomos: a) - um comportamento culposo da sua parte; b) - a não observância pelo empregador das regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho.

Resulta do artigo 18.º da Lei n.º 100/97, um regime específico de responsabilização da entidade empregadora pela reparação dos danos derivados do acidente que se projecta na dimensão das prestações asseguradas ao sinistrado, nos termos decorrentes das várias alíneas do n.º 1 daquele dispositivo, e na responsabilização das entidades empregadoras pelo pagamento destas prestações, ficando a responsabilidade das seguradoras relegada para um plano de mera subsidiaridade, conforme decorre do n.º 2 do artigo 37.º daquele diploma.

À luz do regime decorrente da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, cabe aos beneficiários do direito à reparação por acidente de trabalho, bem como às seguradoras que pretendam ver desonerada a sua responsabilidade, nos termos do n.º 2 do artigo 342.º do Código Civil, o ónus de alegar e provar os factos que revelem que o acidente ocorreu por culpa do empregador, ou que o mesmo resultou da inobservância por parte daquele de regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho.

Não basta, contudo, que se verifique um comportamento culposo da entidade empregadora ou a ocorrência de uma situação de inobservância das regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho por parte daquela entidade, para a responsabilização desta, de forma agravada, pelas consequências do acidente, tornando-se, ainda, necessária a prova do nexo de causalidade entre a conduta culposa daquela ou inobservância das regras de segurança e a produção do acidente.

5 - O artigo 563.º do Código Civil, sob a epígrafe «nexo de causalidade», ao estatuir que «a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão», fundamentando a solução legislativa na probabilidade de não ter havido prejuízo se não fosse a lesão, tem sido visto como expressão do acolhimento no sistema jurídico português da teoria da causalidade adequada.

Conforme refere INOCÊNCIO GALVÃO TELES, «a orientação hoje dominante (…), consiste em só considerar como causa jurídica do prejuízo a condição que, pela sua natureza e em face das circunstâncias do caso, se mostre apropriada para o gerar. A ideia de causalidade fica assim restringida às condições que (…) apresentam aptidão ou idoneidade para a produção do dano. Causa será só a condição adequada a essa produção»[8].

Prossegue aquele autor referindo que a melhor formulação daquela teoria talvez seja a seguinte: «como causa adequada deve considerar-se, em princípio, toda e qualquer condição do prejuízo. Mas uma condição deixará de ser causa adequada, tornando-se pois juridicamente indiferente, desde que seja irrelevante para a produção do dano segundo as regras da experiência, dada a sua natureza e atentas as circunstâncias conhecidas do agente, ou susceptíveis de ser conhecidas por uma pessoa normal, no momento da prática da acção. E dir-se-á que existe aquela irrelevância quando, dentro deste condicionalismo, a acção não se apresenta de molde a agravar o risco de verificação do dano» e prossegue «Alguém pratica certo acto a que se segue, imediatamente ou mais tarde, um prejuízo que sem esse acto não se daria. O acto, condição ou pressuposto do prejuízo, é, em princípio, causa jurídica deste. Mas deixará de o ser se, à data da ocorrência, não se mostrar idóneo para aumentar o perigo de produção do prejuízo, segundo o que a experiência da vida ensina, em face da própria índole do acto e das circunstâncias conhecidas ou cognoscíveis»[9].

6 - Por acórdão do Pleno desta Secção, de 6 de Fevereiro de 2013, foi unificada a jurisprudência sobre a responsabilização das empresas de trabalho temporário pelos acidentes de trabalho derivados do incumprimento de normas segurança quando o trabalho seja prestado por trabalhadores em regime de trabalho temporário, nos seguintes termos: «A responsabilidade pela reparação de acidente de trabalho prevista na Base XVII da Lei n.º 2127, de 3 de Agosto de 1965, e no artigo 18.º, n.º 1, da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, resultante da violação de normas relativas à segurança, higiene e saúde no trabalho, por parte de empresa utilizadora, e de que seja vítima trabalhador contratado em regime de trabalho temporário, recai sobre a empresa de trabalho temporário, na qualidade de entidade empregadora, sem prejuízo do direito de regresso, nos termos gerais».

Na fundamentação deste acórdão referiu-se como suporte do decidido, para além do mais, o seguinte:

[4 − O recurso por uma empresa a trabalhadores temporários cedidos por uma empresa de trabalho temporário, tal como outras situações das referidas no citado n.º 4 do artigo 273.º do Código do Trabalho de 2003, «tem por consequência a alteração nas condições de exposição aos riscos profissionais, ou mesmo, a formação de novos riscos profissionais que determinam novas necessidades de informação no âmbito da coordenação e da cooperação entre os seus actores»[10], pelo que «num primeiro momento, haverá que reenviar a questão para o contexto da obrigação geral de prevenção em que está investida cada uma das diferentes empresas intervenientes e para os deveres que daí resultam para com os respectivos trabalhadores. Essa obrigação deve ser executada, por cada uma delas antes, durante e após a realização do trabalho em co-actividade (…)»[11], uma vez que «as responsabilidades das empresas em co-actividade no domínio da SST não se excluem mas sobrepõem-se»[12].

Por isso mesmo, deve continuar a ter-se presente, tal como se referiu no acórdão desta secção de 27 de Janeiro de 2003, proferido na revista n.º …, que «é de considerar que, ainda que a responsabilidade pela observância das condições de segurança num determinado local incumba a um terceiro (que responderá por tal perante as entidades fiscalizadoras competentes ou até em face da entidade patronal, na sede própria), continua a ser a entidade patronal - que paga a remuneração e exerce o seu poder de autoridade sobre o trabalhador -, a responsável directa perante este por determinar a execução da prestação laboral em local onde não foram previamente cumpridas as prescrições legais sobre higiene e segurança no trabalho»[13]].


IV


1 – Refere a recorrente que «aplicando-se o Regulamento para a Construção Civil, o Art.º 95.º não tem aplicação ao caso porquanto regula a circulação nos locais de içamento de cargas referindo que «o içamento de cargas junto de locais da circulação habitual será feito (…) para além de o local não ser local de passagem, não se realizavam trabalhos de içamento».

Afirma que «tinham sido cumpridas as disposições para evitar circulação de estranhos na zona de intervenção e que no local estavam apenas os trabalhadores necessários à execução (…), sendo que «executando o sinistrado o trabalho onde lhe foi determinado nunca sofreria o acidente, porque a peça caiu junto à base d..., local onde não era necessária a intervenção».

Realça que «considerando que os trabalhos se realizavam a mais de 3,50 m altura e não foram tomadas as medidas eficazes a evitar a queda de objectos, aceita (…) que possa ser aplicado este artigo», mas que «para os trabalhos que se realizavam, além de não ser possível o uso da plataforma, esta visa proteger da queda dos utensílios e materiais que estejam a ser usados em altura» e que «no caso a plataforma não permitiria a remoção do varandim e foram usados meios adequados à remoção».

Refere ainda que «mesmo não se tendo dado como provado que o sinistrado estava impedido de circular junto à base d... não se pode considerar [que exista] culpa ou violação das regras de segurança que determinem a condenação da recorrente, além de que também não foi dado como provado que tenha sido determinado ao sinistrado que prestasse trabalho no local onde decorreu o acidente ou que estivesse a trabalhar naquele local ou por baixo d... e onde havia risco de queda de objectos por trabalhos em altura».

Destaca também que «não ficou provado a possibilidade de poderem ser usados os meios de proteção e que agora determinaram alteração da sentença da 1.ª instância, como seja a rede-oleado-telas nas circunstâncias em que estava a ser desenvolvido o trabalho ou que seriam meios adequados a evitar o acidente nas circunstâncias em que ocorreu ou que medida alternativa de barreiras físicas também seria a medida adequada ou se seria possível a sua colocação junto à base d..., sendo que o uso dos equipamentos - grua móvel para amarração e suporte dos varandins e uso multifunções - Manitou também móvel não permitia uso de outras medidas de segurança».  

Entende também que «não houve normas de segurança violadas e sem conceder quanto às normas de segurança pretensamente violadas, prevendo-se procedimentos concretos sobre segurança relativamente aos trabalhos executados nomeadamente os que ofereçam perigos designadamente de quedas em altura, o juízo sobre a utilização dos meios de proteção coletiva e individual deveria ser feito em concreto» e que «para que recaísse sobre a Recorrente a responsabilidade agravada pela reparação do acidente com fundamento na não observância das regras de segurança seria absolutamente necessário que se demonstrasse, por um lado, que lhe era imputável a si ou seu representante a violação das regras que por determinação legal lhe competia cumprir e por outro lado o nexo de causalidade entre a violação dessas regras e o acidente».

 2 - A decisão recorrida individualizou as normas de segurança cuja violação considerou causais do acidente dos autos, nos seguintes termos:

«Já em relação à execução dos trabalhos em causa, a matéria de facto provada permite, a nosso ver, concluir pela assunção de comportamentos culposos por parte da R. “DD, Ld.ª”, enquanto empresa utilizadora da força de trabalho do sinistrado e aqui A. BB, no âmbito de um contrato de utilização de trabalho temporário que havia celebrado com a R. “CC, Ld.ª”, e consequentemente por parte desta, enquanto empregadora daquele sinistrado ao abrigo de um contrato de trabalho temporário para exercer funções ao serviço da “DD, Ld.ª”, já que, cada uma no seu plano e como iremos verificar, podia e tinha capacidade para atuar de forma diversa, assim como se constata a inobservância de regras de segurança no trabalho por parte da R. “DD. Ld.ª”, sendo que da matéria de facto provada nada resulta no sentido de que a R. “CC, Ldª”, tenha providenciado junto daquela para que os trabalhadores por si contratados e a ela cedidos, entre eles o aqui A., estivessem a desempenhar as suas funções devidamente protegidos e informados acerca dos riscos ou dos perigos que o trabalho a desenvolver comportava.

Vejamos!

Importa considerar antes de mais, que os trabalhos a executar consistiam, entre outros e como referimos, em proceder à remoção do 2º varandim d... I da refinaria de ..., estrutura que se sabia estar deteriorada, bem como os respetivos componentes e peças, uma vez que tal havia sido sinalizado, já na paragem da refinaria ocorrida em 2004, de forma a ser substituído na paragem seguinte (ponto 26º dos factos provados).

Para além disso, demonstrou-se que esse varandim tinha os apoios dos seus suportes soldados à Flare a uma altura de 17,9 metros, que os dois suportes do varandim, cada um com 31kg de peso, se encontravam aparafusados a esses apoios com quatro parafusos e que o varandim estava, por sua vez, colocado sobre esses suportes e fixo aos mesmos através de dois parafusos M8, sendo que, quer o varandim, quer os parafusos de fixação dos suportes se encontravam em avançado estado de corrosão e um desses parafusos já se encontrava partido (cfr. pontos 22º a 25º, 27º e a parte inicial do ponto 29º dos factos assentes).

Acontece que, não obstante haver-se demonstrado que em 18/08/2008 a R. “..., S.A.” emitira uma autorização de trabalho à R. “DD, Ld.ª” nos termos da qual esta deveria colocar oleados-telas-‑redes sob os locais de trabalho efetuado em altura (ponto 6º dos factos assentes), nada se demonstrou no sentido do cumprimento desta exigência da “..., S.A.” para a execução daquele trabalho em concreto, assim como não se demonstrou que, na ausência de colocação dos referidos oleados-telas-‑redes – quiçá por tal não ser tecnicamente possível tendo em vista a prevenção do risco de queda de algum objeto durante a execução do trabalho, ou mesmo de algum elemento da estrutura a remover – tenha sido adotada uma outra medida de segurança alternativa, designadamente a criação de uma zona de delimitação com barreiras físicas próxima da base d... e em torno dela, zona de possível queda de utensílios de trabalho ou de componentes da estrutura a remover e que ficasse interdita à circulação de quem quer que fosse, pelo menos, durante os trabalhos de remoção.

Ora, tendo em consideração o estado de degradação do conjunto varandim/suportes e seus componentes anteriormente mencionado, verifica-se que a “DD, Ld.ª”, ao não cumprir a referida exigência da “..., S.A” e ao não ter adotado uma qualquer outra medida alternativa e eficaz de forma a afastar o risco de acidente decorrente da queda de objetos durante a execução dos trabalhos em altura na remoção do varandim em causa, traduz a assunção de um comportamento culposo por parte da “DD, Ld.ª” o qual se mostra adequado à produção do sinistro nas circunstâncias em que o mesmo se veio a verificar, tanto mais que nada se provou no sentido do A. estar impedido de circular junto à base d... I. Com efeito, tivesse a “DD, Ld.ª” colocado os referidos oleados-telas-redes de proteção, com caraterísticas técnicas suficientes que lhe conferissem capacidade para suportar a queda de quaisquer objetos durante a execução do trabalho em causa, ou então criado a mencionada zona de delimitação com barreiras físicas próxima da base d... e em torno dela com a interdição de circulação de quem quer que fosse, pelo menos, durante os trabalhos de remoção e o acidente objeto dos autos não se teria verificado.

Acresce que, nas aludidas circunstâncias, também não poderemos deixar de considerar violadora de elementares regras de segurança a opção assumida e levada à prática pela “DD, Ld.ª” de determinar que se procedesse ao corte dos suportes do varandim em causa na zona de ligação dos mesmos à Flare, acautelando apenas e previamente a sustentação do conjunto suportes/varandim através de uma grua posicionada com cabos em tensão fixados em quatro pontos de amarração aos tubos (guarda-costas) do varandim (pontos 33º e 34º dos factos assentes), como se aquele conjunto formasse uma peça única e não apresentasse, como apresentava, elevados níveis de corrosão nos seus diversos elementos componentes, mormente nos parafusos de fixação do varandim aos suportes, sendo que um desses parafusos, que se destinava a fixar precisamente o suporte que veio a cair já se encontrava partido, como resulta da primeira parte da matéria de facto provada que consta do ponto 29º dos factos assentes. Em tais circunstâncias impunha-se, a nosso ver, que, pelo menos, a referida amarração fosse feita de forma a abarcar também os próprios suportes devido ao estado de corrosão em que se encontravam os respetivos parafusos de fixação, a circunstância de um desses parafusos se encontrar já partido e o facto de cada um dos suportes ter o considerável peso de 31 kg.

Deste modo e nessas mesmas circunstâncias, não se pode estranhar que, efetuado o corte do primeiro suporte do varandim, na sua ligação à Flare, suporte que, após isso, ficou somente seguro por um parafuso já corroído e a suportar o peso da estrutura, ao proceder-se ao corte do segundo suporte, o conjunto varandim/suportes se tenha soltado d..., momento em que o referido parafuso cedeu, levando a que o suporte cortado em 1º lugar se tivesse desprendido, já que não estava a ser amparado, caindo e atingindo o sinistrado e aqui A. BB na cabeça, em consequência do que este sofreu lesões que determinaram tivesse ficado afetado de uma incapacidade temporária absoluta (ITA) entre o dia 27 de setembro de 2008 e o dia 29 de outubro de 2009 e que, desde esta última data, tivesse ficado afetado de uma incapacidade permanente e absoluta para o seu trabalho habitual (IPATH), bem como de uma incapacidade permanente parcial (IPP) com um coeficiente de desvalorização de 66% para as demais profissões (cfr. os pontos 1º, 29º, 35º, 36º e 43º dos factos assentes).

Ora, não podendo a R. “DD, Ld.ª” desconhecer as regras então em vigor em matéria de higiene, segurança e saúde no trabalho que estava a executar, desde logo as previstas no Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 99/2003 de 27-08 (artigos 272º e 273º) ao estipular-se que o empregador é obrigado a organizar as atividades de segurança e saúde no trabalho que visem a prevenção de riscos profissionais, avaliando e controlando esses riscos e eliminando os fatores de risco de acidente, assegurando aos trabalhadores condições de segurança e saúde em todos os aspetos relacionados com o trabalho, bem como as estabelecidas nos artigos 159º e 95º do Decreto n.º 41821 de 11/08/1958 e mantido em vigência pelo art. 29º do Decreto-Lei n.º 273/2003 de 29-10 (os trabalhos em causa estavam a ser desenvolvidos no âmbito de estaleiros temporários ou móveis), ao preverem que, ficando colocados a mais de 3,50 metros de altura materiais e utensílios que possam cair e atingir alguém, será construída uma cobertura de proteção – o que, como se referiu, até havia sido imposto pela própria “..., S.A.” – ou adotada outra medida eficaz, designadamente providenciando pelo desvio ou interrupção da circulação de pessoas pelo tempo indispensável ou, como referimos, criando a já mencionada zona de delimitação próxima da base d... I, interdita a quem quer que fosse durante a execução dos trabalho em causa, bem como ainda as disposições estabelecidas nos n.ºs 3 e 4 do art. 69º da Portaria n.º 53/71 de 03-02, na redação dada pela Portaria n.º 702/80 de 22-09, que regulam o içamento de cargas em locais de trabalho de zonas industriais, verifica-se que a violação de tais regras de segurança se mostrou igualmente adequada à verificação do acidente em causa nos termos em que o mesmo ocorreu, tanto mais que, como também já se referiu nada se provou no sentido do A. estar impedido de circular junto à base d... I, integrado como estava na equipa de trabalhadores da “DD, Ld.ª” que tinham por missão a execução dos mencionados trabalhos.»

Merecem a nossa adesão estas considerações.

3 - Antes de nos debruçarmos sobre as normas de segurança que a decisão recorrida considerou em concreto violadas, importa que se tenha presente que o n.º 2 do artigo 272.º do Código do Trabalho impõe ao empregador a obrigação de assegurar o direito à segurança no trabalho dos trabalhadores, através de um complexo de medidas de natureza preventiva que incidem, tal como resulta do seu n.º 3, sobre a «a) Planificação e organização da prevenção de riscos profissionais»; «b) Eliminação dos factores de risco e de acidente»; «c) Avaliação e controlo dos riscos profissionais»; «d) Informação, formação, consulta e participação dos trabalhadores e seus representantes»; «e) Promoção e vigilância da saúde dos trabalhadores.»

Por sua vez, o artigo 273.º do mesmo código concretiza o complexo de obrigações enunciado no artigo 272.º, sintetizando as «obrigações gerais do empregador» em matéria de segurança, saúde e higiene no trabalho.

A materialização do cumprimento destas medidas há-de projectar-se em medidas concretas, mas pode igualmente exigir a formulação de um complexo de normas que disciplinem a realização das tarefas em causa, normas estas que seguramente relevam para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 18.º da LAT.

No caso dos autos, a referência a este tipo de normatividade deriva do facto descrito no ponto n.º 6 da matéria de facto dada como provada, nos termos do qual «em 18/08/2008, a Ré GG - ..., S.A. emitiu uma autorização de trabalho à Ré DD – ... de ..., S.A., nos termos do qual a segunda deveria “colocar oleados telas redes, sob os locais de trabalho efetuado em altura”».

À luz deste facto, a ..., enquanto dona da obra, impôs condicionalismos à respectiva execução que não podem deixar de considerar como «regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho», relevantes para os efeitos do referido artigo 18.º da Lei dos Acidentes de Trabalho.

Entre esses condicionalismos estava a obrigação de instalação de oleados-telas-redes sob os locais de trabalho efectuado em altura, exigência que obviamente visava acautelar o risco decorrente da queda de objectos para a segurança dos trabalhadores que se encontrassem no local da respectiva execução.

4 - O acidente ocorreu quando eram executadas nas instalações da AA em ... obras de renovação d... I FL-X1, da Refinaria da AA, ali situada, descritas no contrato a que se refere o ponto n.º 2 da matéria de facto dada como provada, quando se procedia à desmontagem de um varandim que se encontrava implantado naquela Flare.

Embora o risco criado pela desmontagem do varandim não seja directamente originado pela actividade de natureza industrial prosseguida por aquela refinaria, ele não deixa de decorrer daquele estabelecimento industrial, nomeadamente da infraestrutura que o integra e que é essencial à normalidade do seu funcionamento.

Tal como decorre da matéria de facto, o varandim encontrava-se com sinais de corrosão e «na paragem de 2004 foi inspecionado e sinalizado para ser substituído na próxima paragem, por estar deteriorado, bem como os respetivos componentes e peças» e «à data dos factos, o varandim e os parafusos de fixação dos suportes encontravam-se em avançado estado de corrosão».

O risco criado pela desmontagem e substituição do varandim em causa é assim um risco inerente ao estabelecimento industrial em causa, pelo se deverá considerar que actividade prosseguida no momento em que ocorreu o acidente se encontra sujeita ao disposto no artigo 69.º do Regulamento aprovado pela Portaria n.º 53/71, de 3 de Fevereiro, tal como bem se considerou na decisão recorrida.

Carece de qualquer fundamento a afirmação do recorrente de que os trabalhos em causa não consistiam em trabalhos de elevação de cargas que seriam o objecto dos dispositivos daquele artigo 69.º citados na decisão recorrida.

Na verdade, o artigo em causa tem por epígrafe «manutenção de cargas», aplica-se tanto à elevação de cargas como à descida já que os riscos criados com estas duas operações são os mesmos, não havendo qualquer razão válida para introduzir quaisquer diferenciações.

A letra deste dispositivo, concretamente do seu n.º 4, suporta tanto uma operação como a outra referindo-se expressamente à «descida das cargas suspensas», o que induz a identidade de situações.

Por outro lado, o facto de o artigo 95.º do Regulamento de Segurança na Construção Civil se referir a locais de «circulação habitual de pessoas» e a desvio ou interrupção desses locais não exclui a aplicabilidade dos comandos derivados do artigo 69.º do Regulamento aprovado pela Portaria n.º 53/71, de 3 de Fevereiro acima referidos, articulando-se com a disciplina que os mesmos integram.

5 – Os trabalhos em cuja execução ocorreu o acidente dos autos estão sujeitos ao regime decorrente do Regulamento de Segurança da Construção Civil aprovado pelo Decreto n.º 41 821, de 11 de Agosto de 1958.

Na verdade, estava em causa a reparação d... da refinaria com substituição de parte dos equipamentos que a integram e o acidente ocorreu quando era removido um varandim que se encontrava apoiado naquela estrutura.

A execução desta actividade, exigindo o concurso de meios adequados, nomeadamente uma grua que suportava o varandim e o equipamento onde se encontravam os serralheiros a realizar as tarefas de corte dos parafusos que apoiavam o varandim à Flare, acarreta os riscos próprios das actividades de construção civil e, por isso mesmo, deve considerar-se que as obras em causa se encontram igualmente sujeitas ao mencionado Regulamento.

Neste sentido, não pode deixar de se considerar que a execução dos trabalhos em causa exigia o recurso aos meios de prevenção previstos no artigo 159.º daquele regulamento, que determina que quando fiquem colocados «a mais de 3,50m de altura materiais e utensílios que possam cair a atingir alguém, será construída uma cobertura de protecção ou adoptada outra medida eficaz».

Ora ocorrendo os trabalhos de corte dos parafusos que apoiavam a ligação do suporte Flare, exigindo esta operação o recurso a equipamento adequado e criando o risco de libertação de componentes da estrutura, não pode deixar de se considerar que a instalação da cobertura ou de outra solução adequada era necessária para reduzir o risco derivado da execução daqueles trabalhos, quanto mais não fosse impedir o acesso dos trabalhadores à zona circundante da base d....

Tal como se admite na decisão recorrida, a eventual dificuldade prática de construção da cobertura, não eximia os intervenientes da obrigação de encontrar uma outra solução adequada para controlar o risco derivada da execução dos trabalhos.

Acresce que a proprietária da obra teve consciência desta obrigação impondo na autorização concedida à Ré DD – ... de ..., S.A.., a exigência de que deveria “colocar oleados telas redes, sob os locais de trabalho efectuado em altura”», exigência que não foi cumprida.

Nenhuma censura merece pois a decisão recorrida na parte em que considerou que na execução dos trabalhos em que ocorreu o acidente foram violadas as normas de segurança decorrentes do referido artigo 159.º daquele Regulamento de Segurança na Construção Civil.

6 - O incumprimento das normas de segurança teve um evidente contributo causal para o acidente dos autos.

Na verdade, se a protecção prevista no referido artigo 159.º daquele Regulamento tivesse sido implementada, apesar do peso do suporte que atingiu o sinistrado, é de presumir que a mesma teria aptidão para impedir que o sinistrado fosse atingido, evitando desse modo o acidente.

Do mesmo modo, se na execução da operação de separação do varandim d... tivessem sido devidamente acautelados os riscos criados para o sinistrado que se encontrava junto da base d..., executando uma rega da mesma para impedir que as ervas se incendiassem, respeitando os parâmetros decorrentes do artigo 69.º da Portaria n.º 53/71, de 3 de Fevereiro, nomeadamente do respeito da parte final do n.º 4 daquele artigo que condiciona a execução da actividade à verificação prévia «da não existência de qualquer perigo para outros trabalhadores», o acidente teria sido evitado.

Objectivamente, as referidas medidas de natureza preventiva tinham aptidão para reduzir o risco de queda de objecto decorrente da execução dos trabalhos em altura e por essa forma o respectivo incumprimento constitui causa adequada do sinistro.

Censura não merece, igualmente, a decisão recorrida na parte em que considerou que o incumprimento destas normas de segurança acarretava a responsabilização da recorrente, como empregadora do trabalhador, nos termos do artigo 18.º da LAT referindo que «por seu turno, não poderia a R. “CC, Ld.ª”, enquanto empregadora, deixar de velar pelo cumprimento das referidas normas em relação aos trabalhadores por si contratados mediante contrato de trabalho temporário e cedidos à mencionada utilizadora, entre eles o aqui A. BB, e isso não se verificou».

Na verdade, a recorrente, na qualidade de empregadora do sinistrado tem intervenção directa na definição das condições de segurança em que os seus trabalhadores vão desempenhar a sua actividade e no controle dos riscos que enquadram prossecução da sua actividade, não podendo alhear-se dos mesmos, tal como acabou por acontecer no caso dos autos.

Impõe-se, pois, a negação da revista e a confirmação da decisão recorrida.


V


Termos em que se acorda em negar a revista e confirmar a decisão recorrida.

As custas da revista ficam a cargo da recorrente.

Anexa-se sumário do Acórdão.

Lisboa, 14 de Janeiro de 2015

António Leones Dantas (relator)

Melo Lima

Mário Belo Morgado

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[1] Segundo António Ricardino Teixeira Vasconcelos, in Flexibilização dos Sistemas de Flares da Refinaria do Porto da ..., «numa instalação industrial de Refinação de Petróleo existem equipamentos com diversas funções, mas um dos equipamentos mais notórios, por motivo das suas características proeminentes, são os fachos com uma pequena chama ardente no topo. Os fachos são a parte mais visível de um processo que tem como principal objectivo aumentar a segurança de uma unidade industrial e minimizar o impacto ambiental. Industrialmente, o facho é muitas vezes designado como Flare. Ao processo global dá-se o nome de sistema de flare», disponível in http://repositorio-aberto.up.pt/bitstream/10216/66814/1/000136174.pdf.
[2] Redacção resultante da decisão recorrida.
[3] Redacção resultante da decisão recorrida.
[4] A redacção inicial era a seguinte: «Os parafusos de fixação dos suportes não eram visíveis – (resposta ao artigo 22ºda BI)».
[5] A redacção original era a seguinte: «À data dos factos, a área circundante e próxima d..., encontrava-se sinalizada como área de acesso interdito a pessoas estranhas ao serviço. – (resposta ao artigo 25ºda BI).»
[6] A redacção inicial era a seguinte: «O Autor dirigiu-se ao local referido em 1º, onde não era possível ser visto pelo condutor da máquina e pelo técnico de segurança. – (resposta ao artigo 38º da BI)».
[7]Alterada em aspectos que não relevam no âmbito do presente recurso pela Directiva 2007/30/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 20 de Junho de 2007.
[8] Direito das Obrigações, 7.ª Edição, Coimbra Editora, 1997, p. 404.
[9] Obra citada, p. 405.
[10] MANUEL M. ROXO, Obra citada, p. 115.
[11] Ibidem.
[12] Ibidem.
[13] Disponível nas Bases de Dados da DGSI, processo 03S3775.