Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
15359/17.2T8LSB.L1.S1
Nº Convencional: 7.ª SECÇÃO
Relator: NUNO PINTO OLIVEIRA
Descritores: APOIO JUDICIÁRIO
ÓNUS DE ALEGAÇÃO
CAUSA DE PEDIR
PEDIDO
NOMEAÇÃO DE PATRONO
ÓNUS DA PROVA
PRAZO DE PRESCRIÇÃO
INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO
Data do Acordão: 10/28/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO
Sumário :
Os arts. 6.º e 22.º da Lei 34/2004, de 29 de Julho, na redacção da Lei n.º 47/2007, de 28 de Agosto, exigem que o requerimento de apoio judiciário contenha uma representação prática global, de leigos, daquilo que o requerente pretende.
Decisão Texto Integral:

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA




I. — RELATÓRIO


1. BB propôs acção declarativa de condenação contra AA, advogada, pedindo a condenação da Ré:

I. — a restituir-lhe a documentação por ele entregue ou, em caso de impossibilidade de entrega, indemnizar o Autor em € 17.935,25, correspondente ao valor dos documentos em causa;

II. — a pagar ao Autor a quantia de € 20.514,28, a título de danos patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa de 4% desde a citação até integral pagamento;

III. — a pagar ao Autor a quantia de € 15.000 a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa de 4% desde a citação até integral pagamento.


2. A Ré AA defendeu-se por impugnação e por excepção:

I. — deduziu as excepções dilatórias de incapacidade judiciária, de irregularidade de representação e de ilegitimidade do Autor BB;

II. — deduziu ainda a excepção peremptória de prescrição.


3. O Tribunal de 1.ª instância julgou improcedentes as excepções dilatórias e procedente a excepção peremptória de prescrição — em consequência, absolveu a Ré do pedido.


4. Inconformado, o Autor BB interpôs recurso de apelação.


5. Finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões:

I. O Douto Acórdão considerou procedente a exceção peremptória de prescrição, por se terem passado mais de cinco anos sobre a ocorrência dos factos constitutivos da causa de pedir, não tendo ocorrido qualquer facto suspensivo ou interruptivo da prescrição, absolvendo a Ré do pedido.

II. De acordo com o Douto Acórdão, os factos constitutivos do direito do Autor reportam-se ao período de 2005 a 2008 e “.... o Autor tem "coleccionado" numerosos pedidos de apoio judiciário os quais, sendo deferidos, lhe têm permitido a propositura de, pelo menos na área da jurisdição cível, dezenas de acções judiciais com dispensa do pagamento de custas judiciais e de encargos com Advogado; este facto é, aliás, conhecido oficiosamente por este Tribunal, dadas as variadas acções que já foi chamado a conhecer nestas circunstâncias”.

III. Na situação dos autos, de acordo com o Douto Acórdão, o comprovativo de concessão de apoio judiciário que o Autor apresentou se destinou a "Acção Declarativa de Simples Apreciação - Propor Acção", e não a uma acção de condenação como a presente.

IV. Conclui o Douto Acórdão que, para que o Autor se pudesse valer do disposto no artigo 33°, n.° 4 da Lei do Apoio Judiciário incumbia-lhe demonstrar que o concreto pedido de apoio judiciário foi efetivamente requerido para instaurar a presente acção declarativa de condenação, o que não fez, tendo-se antes "refugiado" no facto de apenas ter na sua posse o documento já referido, junto com a petição inicial;

V. O apoio judiciário de que o Autor é beneficiário foi requerido com a finalidade de instaurar a presente acção de condenação.

VI. A Lei n.° 34/2004, de 29 de julho não impõe qualquer obrigação de indicar o tipo de acção a ser intentada, ou que a mesma deve ser intentada contra determinada pessoa.

VII. A interpretação do Douto Acórdão de que, para que o Autor se pudesse valer do disposto no artigo 33°, n.° 4 da Lei do Apoio Judiciário, incumbia-lhe demonstrar que o concreto pedido de apoio judiciário foi efectivamente requerido para instaurar a presente acção declarativa de condenação viola o art.°20°da Constituição da República.

VIII. Ao Autor cabia somente demonstrar que foram constituídas vicissitudes para prorrogação do prazo de propositura da acção, nos termos do n.° 2 do art.° 33° da Lei do Apoio Judiciário, o que foi realizado na petição inicial.

IX. Pelo que deve assim improceder a exceção de prescrição.

X. Pelo exposto, o Douto Tribunal a quo violou o artigo 33° da Lei do Apoio Judiciário, art° 323°do Código Civil, e o art° 20° da Constituição da República Portuguesa.

Pelo exposto, e com o douto suprimento de V. Exas., deve ser concedido provimento ao presente recurso, e, por via disso, ser proferido acórdão que revogue o Douto despacho recorrido, substituindo-se por outro que ordene o prosseguimento dos autos, com o que se fará a costumada JUSTIÇA!


6. A Ré AA contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso.


7. Finalizou a sua contra-alegação com as seguintes conclusões:

I - No recurso que interpõe o Autor/Recorrente não se conforma com o Despacho Saneador que conheceu do mérito da causa e julgou improcedente a acção.

II - Delimitado pelas suas conclusões, o A. ora recorrente não se conforma com o entendimento vertido no Saneador-Sentença de que "para que o Autor se pudesse valer do disposto no artigo 33°, n.° 4 da Lei do Apoio Judiciário, já citado, incumbia-lhe demonstrar que o concreto pedido de apoio judiciário foi efectivamente requerido para instaurar a presente acção declarativa de condenação, o que não fez" - defendendo, no recurso que apresenta, que o apoio judiciário de que é beneficiário foi requerido com a finalidade de instaurar a presente acção de condenação, que a Lei n.° 34/2004, de 29 de Julho não impõe qualquer obrigação de indicar o tipo de acção e que tal entendimento viola o artigo 20° da CRP.

Não lhes assiste qualquer razão no recurso que apresenta, como seguidamente se enuncia e expõe. Assim,

III. - Por via da acção declarativa de condenação que deduziu pediu o A. a condenação da R. no pagamento da quantia global de €53.449,53, a titulo de indemnização por alegada perda de chance de concretizar objectivos pretendidos no âmbito de 9 processos judiciais em que a Ré foi Patrona Oficiosa e reportados ao ano de 2005 a 2008.

IV. - Na contestação que apresentou a Ré defendeuse, na parte que ora importa, por excepção, alegando a prescrição do direito do Autor, e para tanto impugnando que o pedido de apoio judiciário, requerimento APJ 21538/2010, apresentado em 22.12.2010 junto dos serviços da Segurança Social competentes, e conferido por despacho de 03.01.2011 -na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, nomeação e pagamento da compensação de patrono - utilizado para os presentes autos, intentados cm 05.07.2017 tenha, efectivamente, sido requerido para o palruuínio e propositura dos presentes autos de condenação, o que aduziu sob o pressuposto táctico e alegação de que o Autor é "grande" litigante, beneficiário recorrente do apoio judiciário -sendo inúmeras as acções que intenta e para as quais requer a concessão do apoio judiciário.

V - Nos termos do disposto no artigo 33°, n.° 4, da Lei 34/2004, de 29.06, quando o Autor seja beneficiário de apoio judiciário na modalidade de nomeação e pagamento da compensação de patrono - como é a modalidade do apoio nos autns "APJ 215387/2010" - a acção considera-se proposta na data em que foi apresentado o requerimento pedindo a nomeação de patrono - que no caso seria em 22.12.2010;

VI - Resulta do artigo 6° n° 2 da Lei 34/2004, de 29.06, que "a protecção jurídica é concedida para questões ou causas judiciais concretas ou susceptíveis de concretização em que o utente tenha um interesse próprio e que versem sobre direitos directamente lesados ou ameaçados de lesão”.

VII - Por força do artigo 22° n° 7 da referida lei "é da competência dos serviços da segurança social.… a identificação precisa do fim a que se destina o apoio judiciário". - Identificação que há-de resultar da finalidade indicada pelo Requerente no seu requerimento de protecção jurídica.

VIII - O benefício de apoio judiciário é sempre concedido tendo em vista uma determinada causa (a propor ou já pendente) e não para a satisfação de um determinado direito ou pretensão do requerente, independentemente do número e tipo de processos e procedimentos que a satisfação daquele direito ou pretensão possa envolver.

IX - Uma decisão que concede tal benefício apenas pode ser invocada na causa cujo objecto se enquadre no fim para o qual o apoio judiciário foi requerido e concedido, não produzindo qualquer efeito no âmbito de outras acções cujo objecto não se enquadre naquele fim para o qual foi requerido e concedido.

X - Assim, para que a acção possa ser considerada proposta na data em que foi apresentado o requerimento pedindo a nomeação de patrono, nos termos do disposto no artigo 33°, n.° 4, da Lei 34/2004, de 29.06, a acção proposta terá de corresponder e enquadrar na finalidade para a qual o apoio judiciário foi requerido e concedido - o que não sucede nos presents autos, não podendo a acção ser considerada proposta em 22.12.2010.

XI - Com efeito, do comprovativo de concessão de apoio judiciário (referência APJ 215387/2010) junto aos autos pelo Autor, consta como fim a que se destina: “-Acção Declarativa de Simples Apreciação - Propor acção”;

XII.- Por seu turno, a presente acção é uma Acção Declarativa de Condenação, pela qual peticiona o Autor a condenação da Ré a pagar-lhe uma indemnização fundada na "perda de chance" - com evidente finalidade diferente da que resultaria de uma acção de simples apreciação.

XIII. - Factualidade que por si só determina que a acção não possa ser considerada como proposta em 22.10.2010, porque não se destinando aos presentes autos o apoio judiciário requerido e concedido e aos mesmos junto.

XIV. - Acresce que, em cumprimento do despacho judicial que deferiu as diligências de prova requeridas pela A., no seu requerimento probatório junto com a sua contestação, a Ordem dos Advogados, veio informar os autos, que 1. Correm termos no Conselho Regional de Lisboa cerca 240 processos de nomeação de patrono em que é beneficiário do Apoio Judiciário, BB, por deferimento do apoio judiciário pelos Serviços da Segurança Social, no período compreendido entre 2008 e até ao presente [21.06.2019]"; (sublinhado nosso); Acrescentando-se no aludido oficio da OA que "2. Refira--se ainda que não obstante o número mencionado, correm, igualmente termos no Conselho Regional de Lisboa processos de nomeação de patrono de data anterior a 2008." E do, assim, oficiado pela OA, resulta demonstrado que "o A. é "grande" litigante, beneficiário recorrente do apoio judiciário - sendo inúmeras as acções que intenta e para as quais requer a concessão do apoio judiciário.

XV. - Notificado, por seu turno e nos mesmos termos, o Autor para vir juntar aos autos "cópia/duplicado do requerimento de concessão de apoio judiciário que apresentou na segurança social, em 2010, para obter a respectiva concessão para os presentes autos. " -uma vez que com a propositura da acção bastou-se com a junção da comunicação do despacho que o deferiu - o que permitira aferir/ demonstrar que o concreto pedido de apoio judiciário utilizado nos presentes autos, foi efectivamente requerido para instaurar a presente acção -, veio o Autor informar os autos, por requerimento de 08.12.2019 de que, "1. O único documento que o Autor possui do acto administrativo de concessão de apoio judiciário é o documento com a referência APJ 215387/2010, o qual foi junto com a petição inicial."; "3. (...) sendo que o comprovativo de concessão de apoio judiciário já indica os fins a que se destina.["-Acção Declarativa de Simples Apreciação - Propor acção"]" (sublinhado nosso).

XVI. - Não dispondo o Autor do aludido comprovativo foi o CDSS notificado para enviar "aos autos cópia do requerimento apresentado pelo ora Autor em 2010; caso exista mais do que um pedido referente a esse ano, deverá o Centro remeter cópia de todos. "(cfr. Despacho proferido em 14.01.2020); E em cumprimento, o CDSS, informou nos autos - por ema/7 datado de 13.05.2020 - que "no ano de 2010 foram apresentados pelo requerente, BB, 29 requerimentos de protecção jurídica, conforme lista anexa." (sublinhado nosso); da mesma aludida lista anexa não é possível aferir se o Apoio Judiciário em apreço se destinou e teve como finalidade a de propor a presente acção.

XVII. - Mais, lê-se na sentença, como respeitosamente se transcreve: Compulsada a matéria factual assente, verifica-se que os factos constitutivos do direito do Autor se reportam ao período de 2005 a 2008 (portanto, há mais de dez anos) e, ainda, que o Autor tem "coleccionado" numerosos pedidos de apoio judiciário os quais, sendo deferidos, lhe têm permitido a propositura de, pelo menos na área da jurisdição cível, dezenas de acções judiciais com dispensa do pagamento de custas judiciais e de encargos com Advogado; este facto é, aliás, conhecido oficiosamente por este Tribunal, dadas as variadas acções que já foi chamado a conhecer nestas circunstâncias.

XVIII - De tudo, compulsado o comprovativo de concessão de apoio judiciário (referência APJ 215387/2010) junto aos autos pelo Autor, consta como fim a que se destina: "-Acção Declarativa de Simples Apreciação - Propor acção" e em face do aduzido pela Ré, em sede de excepção de prescrição, onde e em súmula, impugna que o pedido de apoio judiciário utilizado para os presentes autos tenha sido requerido para os intentar, o que fez sob o pressuposto fáctico de que o Autor é "grande" litigante, beneficiário recorrente do apoio judiciário - sendo inúmeras as acções que intenta e para as quais requer a concessão do apoio judiciário - factualidade esta demonstrada pelos ofícios da O A e pela informação do CDSS já supra aludidos, e reforçada pelo conhecimento oficioso do Tribunal a quo.

XIX. - Impunha-se ao A., para beneficiar do disposto no artigo 33°, n.° 4, da Lei 34/2004, de 29.06, demonstrar que o concreto pedido de apoio judiciário foi efectivamente requerido para instaurar a presente acção declarativa de condenação    o que não fez.

XX. - E assim, a presente acção intentada em 05.07.2017, não pode ser considerada proposta em 22.12.2010, data do requerimento de protecção jurídica "APJ 215387/2010", porquanto não logrou o Autor demonstrar que o concreto pedido de apoio judiciário foi efectivamente requerido para instaurar a presente acção declarativa de condenação, não beneficiando do disposto no artigo 33°, n.° 4, da Lei 34/2004, de 29.06.

XXI. - Nenhuma razão assiste ao A. no recurso que interpôs - que aliás é já o terceiro na pendência dos presentes autos, e sempre ao abrigo de apoio judiciário que lhe foi deferido, de entre muitos de que beneficia, pelo menos na zona de abrangência do Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados e da área de jurisdição civil da Ia Instância;

XXII. - E não poderá deixar de se questionar, como pode um cidadão, que se apresenta com domicílio num apartado dos CTT em Lisboa, com insuficiência económica (de acordo com os critérios do regime da concessão do Apoio Judiciário), ter uma tal actividade que justifique a sua necessidade, de e pelo menos na circunscrição do Conselho Regional de Lisboa ser beneficiário de Apoio judiciário, por deferimento do apoio judiciário pelos Serviços da Segurança Social, em 240 processos de nomeação de patrono, no período compreendido entre 2008 e até ao presente [21.06.2019]"; (sublinhado nosso)

XXIII. - A Sentença proferida não merece censura.

Termos em que e nos mais de direito que V. Exas. doutamente suprirão deve o recurso interposto ser julgado improcedente.


8. O Tribunal da Relação …… julgou o recurso procedente, revogando a sentença recorrida.


9. O dispositivo do acórdão recorrido é do seguinte teor:

Em face do exposto, os juízes desembargadores que integram este colectivo da Relação  …, acordam em julgar a apelação procedente, assim revogando a decisão proferida, na parte em que julgou procedente a excepção peremptória da prescrição, determinando assim que a acção prossiga para apreciação do pedido formulado pelo Autor.


10. Inconformada, a Ré AA interpôs recurso de revista.


11. Finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões:

I - Vem o presente recurso interposto do douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação ….., em 25 de Fevereiro de 2021, que considerou, ora respeitosamente em síntese, que “(…) não assume relevância o facto do ofício que foi enviado ao requerente indicar ter sido deferido o seu pedido de nomeação de patrono para intentar acção declarativa de simples apreciação” [e serem os presentes autos declarativos de condenação] (…) não reconheceu “válido o obstáculo que levou a que se considerasse que o A. não se poderia prevalecer do estabelecido no art.º 33.º , n.º 4 da Lei do Acesso ao Direito e aos Tribunais” e assim “que tal normativo será aplicável ao caso em apreço.”, considerando a acção proposta em 22.10.2010, data em que foi apresentado o requerimento de apoio judiciário, e deste modo julgou a “apelação procedente, assim revogando a decisão proferida, na parte em que julgou procedente a excepção peremptória da prescrição, determinando assim que a acção prossiga para apreciação do pedido formulado pelo Autor.”

II - A Ré, ora Recorrente, não se conforma com o prolatado acórdão e muito respeitosamente dissente da fundamentação do mesmo, entendendo que não lhe assiste razão. Ao decidir como decidiu, e salvo o devido respeito que é muito, o Douto acórdão interpretou erradamente a norma contida no artigo 22.º n.º 7 (e artigos para as quais a mesma remete) da Lei do Acesso ao Direito e aos Tribunais, bem como a norma contida no artigo 33.º n.º 4 da referida Lei, violou a norma conjugada dos citados artigos quando julga aplicada e válida nos presentes autos a norma contida no referido artigo 33.º n.º 4 da referida Lei, violou as regras de repartição do ónus omitindo a necessária pronúncia e julgamento que as mesmas impunham sobre os elementos probatórios nos autos.

III - Por via da acção declarativa de condenação que deduziu pediu o A. a condenação da R. no pagamento da quantia global de €53.449,53, a titulo de indemnização por alegada perda de chance de concretizar objectivos pretendidos no âmbito de 9 processos judiciais em que a Ré foi Patrona Oficiosa e reportados ao ano de 2005 a 2008 – acção que foi intentada em 05.07.2017.

IV - Para instruir a acção o A. juntou a decisão proferida pela Segurança Social comprovativa de concessão de apoio judiciário (referência APJ 215387/2010), na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, nomeação e pagamento da compensação de patrono, da qual consta como fim a que se destina o apoio concedido: “-Acção Declarativa de Simples Apreciação – Propôr acção” (cf. requerimento ref. 34251143, fls. 420);

V - Na contestação que apresentou a Ré defendeu-se, na parte que ora importa, por excepção, alegando a prescrição do direito do Autor, e para tanto impugnou que o aludida decisão de concessão de apoio judiciário - requerimento APJ 21538/2010, apresentado em 22.12.2010 junto dos serviços da Segurança Social competentes, e conferido por despacho de 03.01.2011 - utilizado para os presentes autos, intentados em 05.07.2017 tenha, efectivamente, sido requerido para o patrocínio e propositura dos presentes autos de condenação, uma vez que daquela decisão da Segurança Social consta como fim a que se destina o apoio concedido: “-Acção Declarativa de Simples Apreciação – Propôr acção”, com evidente finalidade diferente daquela que é objecto nos presentes autos de condenação;

O que aduziu, ainda, sob o pressuposto fáctico e alegação de que o Autor é “grande” litigante, beneficiário recorrente do apoio judiciário – sendo inúmeras as acções que intenta e para as quais requer a concessão do apoio judiciário.

VI - Quanto a esta alegação respondeu o Autor, pugnando, pela sua improcedência, alegando, fundamentalmente, que o apoio judiciário de que o Autor é beneficiário foi requerido com a finalidade de instaurar acção de condenação, sendo que a legislação em vigor não impõe a obrigação de indicar a finalidade específica de tal pedido, quer quanto à identificação dos sujeitos processuais envolvidos, quer no objecto da acção que venha a ser intentada.

VII - Das diligências probatórias requeridas pela R., ora Recorrente, em sede de requerimento probatório deduzido na sua contestação, que foram deferidas e determinadas, ao abrigo do dever de gestão processual e do princípio da adequação formal, nos termos do despacho ref. 389596890 (fls. 392), posteriormente confirmado pelo Tribunal da Relação ….. (cf. apenso A): Foi oficiada a Ordem dos Advogados, Pelouro do Apoio Judiciário, para vir informar os presentes autos do seguinte: qual o número total de processos em apoio judiciário em que é requerente de patrocínio e tal lhe foi concedido, o ora A., no período compreendido entre 2008 até à presente data; E foi o A. notificado para juntar aos autos, cópia/duplicado do requerimento de concessão de apoio judiciário que apresentou na segurança social, em 2010, para obter a respectiva concessão para os presentes autos. “

VIII - Em cumprimento do despacho judicial que deferiu as diligências de prova requeridas:

1. A Ordem dos Advogados, veio informar os autos, que “1. Correm termos no Conselho Regional de Lisboa cerca 240 processos de nomeação de patrono em que é beneficiário do Apoio Judiciário, BB, por deferimento do apoio judiciário pelos Serviços da Segurança Social, no período compreendido entre 2008 e até ao presente 21.06.2019];

2. Refira-se ainda que não obstante o número mencionado, correm, igualmente termos no Conselho Regional de Lisboa processos de nomeação de patrono de data anterior a 2008.” (sublinhado nosso);

IX - Notificado, por seu turno, o Autor para vir juntar aos autos “cópia/duplicado do requerimento de concessão de apoio judiciário que apresentou na segurança social, em 2010, para obter a respectiva concessão para os presentes autos. “ - o que permitira aferir/ demonstrar que o pedido de apoio judiciário utilizado nos presentes autos, não obstante da decisão da segurança social que recaiu sobre o mesmo constar como fim a que se destina o apoio concedido: “-Acção Declarativa de Simples Apreciação – Propôr acção”, foi efectivamente requerido para instaurar a presente acção de condenação - veio o Autor informar os autos, por requerimento de 08.12.2019 de que, “1. O único documento que o Autor possui do acto administrativo de concessão de apoio judiciário é o documento com a referência APJ 215387/2010, o qual foi junto com a petição inicial.”; “3. (…) sendo que o comprovativo de concessão de apoio judiciário já indica os fins a que se destina.” (sublinhado nosso)

X - Não dispondo o Autor do aludido comprovativo foi o Centro Distrital da Segurança Social notificado para enviar “aos autos cópia do requerimento apresentado pelo ora Autor em 2010; caso exista mais do que um pedido referente a esse ano, deverá o Centro remeter cópia de todos.”(cfr. despacho proferido em 14.01.2020); Em cumprimento, o CDSS, informou nos autos – por email datado de 13.05.2020 (fls. 422) - da impossibilidade de juntar cópia do requerimento apresentado pelo Autor (APJ 215387/2010) uma vez que os processos de protecção jurídica entre 2001 e 2015 já foram eliminados, em cumprimento do Regulamento Arquivístico em vigor (Portaria n.º 1383/2009 de 4 de Novembro); mais informou que “no ano de 2010 foram apresentados pelo requerente, BB, 29 requerimentos de protecção jurídica, conforme lista anexa.” (sublinhado nosso)

XI - No saneador-sentença prolatado pela 1.ª Instância:

“Compulsada a matéria factual assente”, e, na “sequência das diligências probatórias promovidas por iniciativa da Ré, cumpra verificar, e aquilatar de acordo com as regras de distribuição do ónus da prova, se o pedido de apoio judiciário ao abrigo do qual o Autor diz ter proposto a presente acção (e as vicissitudes eventualmente ocorridas no âmbito desse pedido) é susceptível de fazer interromper o prazo prescricional de cinco anos.”

Considerou-se que, “(…) o benefício do apoio judiciário é sempre concedido tendo em vista uma determinada causa (a propor ou já pendente) (…) Por isso, e por força do artigo 22º, n.º 7 do mesmo diploma, uma decisão que concede tal benefício só pode ser invocada na causa cujo objecto se enquadre no fim para o qual o apoio judiciário foi requerido e concedido, não produzindo qualquer efeito para outras acções cujo objecto não se enquadre no fim para o qual tal apoio judiciário foi requerido e concedido.”

“Na situação dos autos, verifica-se, do comprovativo de concessão de apoio judiciário que o Autor apresentou – aquele com referência APJ 215387/2010 (ponto 6. dos factos provados e fls. 90 dos autos) –, que tal apoio se destinou a “Acção Declarativa de Simples Apreciação – Propôr Acção”, e não a uma acção de condenação como a presente (…) para que o Autor se pudesse valer do disposto no artigo 33º, n.º 4 da Lei do Apoio Judiciário, já citado, incumbia-lhe [em face da excepção deduzida pela Ré, ora recorrente e em face dos elementos probatórias nos autos] demonstrar que o concreto pedido de apoio judiciário foi efectivamente requerido para instaurar a presente acção declarativa de condenação, o que não fez(…).

A final foi proferido saneador-sentença, onde foi apreciada a excepção da prescrição tendo-se considerado que o prazo prescricional há muito que se encontrava totalmente verificado, inexistindo qualquer facto interruptivo ou suspensivo do mesmo. Por essa forma, decidiu-se julgar a acção totalmente improcedente e, em consequência, absolver a Ré do pedido,

XII - Inconformado o Autor interpôs recurso do saneador-sentença, no qual e delimitado pelas suas conclusões, o A. não se conforma com o entendimento vertido no Saneador-Sentença de que “para que o Autor se pudesse valer do disposto no artigo 33º, n.º 4 da Lei do Apoio Judiciário, já citado, incumbia-lhe demonstrar que o concreto pedido de apoio judiciário foi efectivamente requerido para instaurar a presente acção declarativa de condenação, o que não fez” – defendendo, no recurso que apresenta, que o apoio judiciário de que é beneficiário foi requerido com a finalidade de instaurar a presente acção de condenação, que a Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho não impõe qualquer obrigação de indicar o tipo de acção e que tal entendimento viola o artigo 20.º da CRP.

XIII - O Acórdão recorrido, entendeu, ora respeitosamente em síntese, que “(…) não assume relevância o facto do ofício que foi enviado ao requerente indicar ter sido deferido o seu pedido de nomeação de patrono para intentar acção declarativa de simples apreciação” [e serem os presentes autos declarativos de condenação] (…) não reconheceu “válido o obstáculo que levou a que se considerasse que o A. não se poderia prevalecer do estabelecido no art.º 33.º , n.º 4 da Lei do Acesso ao Direito e aos Tribunais” e assim “que tal normativo será aplicável ao caso em apreço.”, considerando a acção proposta em 22.10.2010, data em que foi apresentado o requerimento de apoio judiciário (…)”

XIV - Para tanto, considerou o Acórdão que o saneador-sentença ao decidir como decidiu, baseou-se fundamentalmente no facto de a aludida concessão de patrocínio ter sido deferida para que fosse intentada acção de simples apreciação e não acção de condenação como a que efectivamente foi interposta. (sublinhado nosso); Ora, inversamente, o saneador-sentença, fundamenta a sua decisão, também, nos seguintes elementos de prova – aos quais, diga-se, o Acórdão recorrido não atendeu, tão pouco se pronunciou - :

- Nas diligências probatórias realizadas que foram deferidas e determinadas, ao abrigo do dever de gestão processual e do princípio da adequação formal, nos termos do despacho ref. 389596890 (fls. 392), posteriormente confirmado pelo Tribunal da Relação ….. (cf. apenso A) – junto da Ordem dos Advogados e da Segurança Social, como supra alegado.

- No conhecimento de que o Autor tem “coleccionado” numerosos pedidos de apoio judiciário os quais, sendo deferidos, lhe têm permitido a propositura de, pelo menos na área da jurisdição cível, dezenas de acções judiciais com dispensa do pagamento de custas judiciais e de encargos com Advogado; este facto é, aliás, conhecido oficiosamente por este Tribunal, dadas as variadas acções que já foi chamado a conhecer nestas circunstâncias.

- E compulsada a matéria factual assente e na sequência das diligências probatórias promovidas por iniciativa da Ré, verificou e aquilatou de acordo com as regras de distribuição do ónus da prova, se o pedido de apoio judiciário ao abrigo do qual o Autor diz ter proposto a presente acção seria válida para os presentes autos de acordo com o estatuído no artigo 22.º n.º 7 da Lei do Acesso ao Direito e aos Tribunais;

XV – E para tanto, o Acórdão procede à seguinte interpretação do artigo 22.º n.º 7 da Lei do Acesso ao Direito e aos Tribunais: O despacho-saneador limita-se a referir que "É da competência dos serviços da segurança social a identificação rigorosa dos elementos referentes aos beneficiários, bem como a identificação precisa do fim a que se destina o apoio judiciário, para os efeitos previstos no n.0 5 do artigo 24. 0 e nos artigos 30.º e 31.º”.

Se tivermos presentes os preceitos legais para os quais esse n.º 7 remete, concluiremos que o que se visa não é a identificação rigorosa do tipo de acção que deverá ser instaurada. (…). A referêcia que é feita naquele n.º 7 do art. 22.º, à " identificação precisa do fim a que se destina o apoio judiciário" está, quanto a nós, dirigida à finalidade última - deduzir acção ou apresentar defesa perante acção que tenha sido interposta por terceiros. (sublinhado nosso)

XVI – Não pode a Ré, estar mais em desacordo com tal interpretação. O sistema de acesso ao direito e aos tribunais destina–se a assegurar que ninguém seja dificultado ou impedido em razão da sua condição social ou cultural, ou por insuficiência de meios económicos, o conhecimento, o exercício ou a defesa dos seus direitos. A Lei nº 34/2004 de 29/07, com a redacção que lhe foi dada pela Lei nº 47/2007 de 28/08, em vigor na data do pedido de apoio judiciário apresentado pelo A., e que consagra o regime de concessão do benefício do apoio judiciário permite concluir que tal benefício é sempre concedido para questões ou causas judiciais concretas ou susceptíveis de concretização. É isso o que decorre, desde logo, do artigo 6.º nº 2 da citada Lei e ainda do disposto do artigo 18.º quando delimita, concreta e expressamente, as situações em que o benefício concedido para uma determinada causa se estende a outros processos que têm uma determinada conexão com aquele para o qual foi concedido. Por outro lado, há que atender ao disposto no nº 7 do artigo 22.º da mesma Lei, que dispõe que é da competência dos serviços da segurança social a identificação rigorosa dos elementos referentes aos beneficiários bem como a identificação precisa do fim a que se destina o apoio judiciário, para os efeitos previstos no nº 5 do artigo 24º (início do prazo interrompido) 30º (nomeação de patrono) e 31º (notificação da nomeação ).

XVII - Daqui decorre que a finalidade para a qual é concedido o benefício de apoio judiciário é sempre uma determinada causa (a propor ou já pendente) sendo apenas extensível a outros processos nas situações previstas no artigo 18.º, nºs 4 a 7 da citada Lei nº 34/2004 de 29/07.

Fora das situações aí previstas, uma decisão que concede o benefício do apoio judiciário apenas pode ser invocado numa causa cujo objecto se enquadre no fim para o qual o apoio judiciário foi requerido e concedido. É este o entendimento que se alcança no Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, em 10.012.2009, proferido no processo n.º 820/08.8TBESP-E.P1 , disponível em www.dgsi.pt ;

XVIII - Por outro lado, é certo, como se alcança no Acórdão ora em crise que, quem formula o pedido de patrocínio não tem que ter (e na grande maioria das vezes não tem mesmo) conhecimentos jurídicos que permitam indicar que tipo de acção deverá ser utilizada para a salvaguarda dos seus direitos e/ou interesses. Daí que o próprio requerimento de pedido de apoio judiciário para além de contemplar o preenchimento do tipo de acção a propor (“propor acção judicial – tipo de acção”), contempla o campo de preenchimento “4.3. Observações. Explique, por palavras suas, a sua pretensão”, de modo, precisamente, a permitir o cumprimento pela Segurança Social do disposto no artigo 22.º n.º 7 da Lei em apreço (formulário em vigor à data em que o A., ora Recorrido, formulou o seu pedido de apoio Modelo PJ1/2007 – DGSS, aprovado pela Portaria n.º 11/2008 de 3 Janeiro);

XIX - É a decisão proferida pela Segurança Social, da qual consta a modalidade requerida, o fim e a finalidade a que se destina que delimita o concreto apoio judiciário que foi deferido e conferido, e no âmbito do qual deverá ser nomeado patrono (para a acção a propor ou para acção em curso) – está em causa uma decisão administrativa que tem a virtualidade de à luz do disposto do artigo 33.º n.º 4 da Lei do Acesso ao Direito e aos Tribunais fazer interromper a prescrição ou caducidade de um determinado direito. Sendo que, dispõe o n.º 1 do art.º 29.º da Lei n.º 34/2004 de 29 de Julho alterada e republicada pela Lei n.º 47/2007 de 28 de Agosto que: "A decisão que defira o pedido de protecção jurídica especifica as modalidades e a concreta medida do apoio concedido.”

XX - Por seu turno, e ao contrário do pretendido pelo Acórdão proferido, o ofício da ordem a nomear o Ilustre Advogado como patrono, e no qual se limita a dizer que a nomeação se destina a "instaurar acção”, não tem qualquer efeito conformador, delimitador ou mesmo rectificativo daquela decisão proferida pela segurança social.

XXI - Ao patrono nomeado, cabe analisar a pretensão e adequar o melhor procedimento judicial à satisfação do direito do beneficiário/requerente, competindo-lhe inteirar-se se o teor daquela decisão da segurança social – que deve ser junta aos autos – e a pretensão que lhe é comunicada pelo requerente estão em sintonia com o fim/finalidade a que se destina. O patrono nomeado está limitado, na sua intervenção, ao disposto no despacho da Segurança Social. Quando o despacho da Segurança Social que não corresponde à efectiva pretensão do beneficiário, compete-lhe, promover pelas competentes correções junto da Segurança Social (o que no âmbito da sua nomeação dará lugar à criação da vicissitude “Rectificação da S.S.”) Esta necessidade de “Rectificação da S.S.” está plasmada nas regras procedimentais da própria Ordem dos Advogados, em sede do Instituto de Acesso ao Direito.

XXII - A este propósito veja-se o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, em 21-05-2020, no âmbito do processo n.º 23/19.6T8MTA-B.L1-8 , disponível em www.dgsi.pt, ora em síntese:

“Conforme resulta dos factos dados como assentes, a A. juntou à petição inicial documento comprovativo da concessão do benefício de apoio judiciário na modalidade de dispensa da taxa de justiça e demais encargos com o processo. Resulta do art. 6º nº 2 da L 34/2004, de 29 de julho, que “a proteção jurídica é concedida para questões ou causas judiciais concretas ou suscetíveis de concretização em que o utente tenha um interesse próprio e que versem sobre direitos diretamente lesados ou ameaçados de lesão”. (…)

Do documento comprovativo da concessão do benefício de apoio judiciário junto pela A. com a petição inicial resultava que o apoio judiciário foi concedido para a instauração de processo de inventário. Contudo, o processo instaurado pela A. não é processo de inventário.

A não junção, com a petição inicial, de documento comprovativo da concessão do benefício de apoio judiciário para o processo instaurado significa que não foi cumprido o art. 552º nº 3 do C.P.C. - na redação dada pela L 41/2013. (…) Apesar de não ter sido junto, com a petição inicial, documento comprovativo da concessão do benefício de apoio judiciário para o processo instaurado, a secção não procedeu à recusa da petição inicial. (…)

Conforme resulta dos factos dados como assentes, a 31 de julho de 2019, a A. juntou comunicação do ISS da qual consta o seguinte:

“Assunto: Requerimento de Protecção Jurídica - 2ª via – Rectificação da finalidade do pedido (…) O Apoio Judiciário requerido destina-se:

– Acção cível - Prosseguir Proc. 23/19.6T8MTA Tribunal Moita”. (…)


A decisão do ISS de retificação da finalidade do pedido é complemento e parte integrante da decisão do ISS de concessão do benefício de apoio judiciário (cf. art. 617º nº 2 do C.P.C.). (…)

Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar procedente a apelação, revogando o despacho recorrido, devendo o tribunal recorrido, considerando regularizada a situação da falta de documento comprovativo da concessão do benefício do apoio judiciário para a ação instaurada, fazer os autos principais prosseguir a sua normal tramitação.”

XXIII - Ora, no caso em apreço nos presente autos o benefício do apoio judiciário que foi solicitado pelo A. e a respectiva pretensão, foi qualificada pela Segurança Social como fim a que se destina o apoio concedido: “-Acção Declarativa de Simples Apreciação – Propôr acção” (cf. requerimento ref. 34251143, fls. 420) e , comunicada, pela Ordem dos Advogados, ao Ilustre Advogado nomeado patrono, por ofício onde se limita a dizer que a nomeação se destina a "instaurar acção. E foi proposta uma acção de condenação.

XXIV - Não consta nos autos, que quer o Autor, quer o Ilustre Advogado, seu patrono nomeado tenha solicitado qualquer “Rectificação da S.S.” da decisão de concessão de apoio judiciário concedida.

Assim,

XXV - Nos termos do disposto no artigo 33.º, n.º 4, da Lei 34/2004, de 29.06, quando o Autor seja beneficiário de apoio judiciário na modalidade de nomeação e pagamento da compensação de patrono a acção considera-se proposta na data em que foi apresentado o requerimento pedindo a nomeação de patrono;

XXVI - Resulta do artigo 6.º nº 2 da Lei 34/2004, de 29.06, que “a protecção jurídica é concedida para questões ou causas judiciais concretas ou susceptíveis de concretização em que o utente tenha um interesse próprio e que versem sobre direitos directamente lesados ou ameaçados de lesão”.

XXVII - O benefício de apoio judiciário é sempre concedido tendo em vista uma determinada causa (a propor ou já pendente). Por força do artigo 22.º nº 7 da referida lei “é da competência dos serviços da segurança social a identificação precisa do fim a que se destina o apoio judiciário”. – identificação que há - de resultar da finalidade indicada pelo Requerente no seu requerimento de protecção jurídica. E dispõe o n.º 1 do art.º 29º da Lei n.º 34/2004 de 29 de Julho alterada e republicada pela Lei n.º 47/2007 de 28 de Agosto que: "A decisão que defira o pedido de protecção jurídica especifica as modalidades e a concreta medida do apoio concedido.”

XXVIII - Uma decisão que concede tal benefício apenas pode ser invocada na causa cujo objecto se enquadre no fim para o qual o apoio judiciário foi requerido e concedido, não produzindo qualquer efeito no âmbito de outras acções cujo objecto não se enquadre naquele fim para o qual foi requerido e concedido.

XXIX - Para que a acção possa ser considerada proposta na data em que foi apresentado o requerimento pedindo a nomeação de patrono, nos termos do disposto no artigo 33.º, n.º 4, da Lei 34/2004, de 29.06, a acção proposta terá de corresponder e enquadrar na finalidade para a qual o apoio judiciário foi requerido e concedido.

XXX - O que não sucede nos presentes autos, não podendo a acção ser considerada proposta em 22.12.2010, porque não se destinando aos presentes autos o apoio judiciário requerido e concedido e aos mesmos junto: o comprovativo de concessão de apoio judiciário (referência APJ 215387/2010) junto aos autos pelo Autor, consta como fim a que se destina: “-Acção Declarativa de Simples Apreciação – Propôr acção”, por seu turno, a presente acção é uma Acção Declarativa de Condenação, pela qual peticiona o Autor a condenação da Ré a pagar-lhe uma indemnização.

XXXI - Compulsado o teor da decisão da concessão de apoio judiciário (referência APJ 215387/2010) junto aos autos pelo Autor, com as demais diligências de prova nos autos - A Ordem dos Advogados, veio informar os autos, que “1.Correm termos no Conselho Regional de Lisboa cerca 240 processos de nomeação de patrono em que é beneficiário do Apoio Judiciário, BB, por deferimento do apoio judiciário pelos Serviços da Segurança Social, no período compreendido entre 2008 e até ao presente [21.06.2019]”; (sublinhado nosso); e o Centro Distrital da Segurança Social informou que só “no ano de 2010 foram apresentados pelo requerente, BB, 29 requerimentos de protecção jurídica, conforme lista anexa.”, e bem assim o conhecimento oficioso do Tribunal da 1.ª Instância de que o Autor tem “coleccionado” numerosos pedidos de apoio judiciário os quais, sendo deferidos, lhe têm permitido a propositura de, pelo menos na área da jurisdição cível, dezenas de acções judiciais com dispensa do pagamento de custas judiciais e de encargos com Advogado; este facto é, aliás, conhecido oficiosamente por este Tribunal, dadas as variadas acções que já foi chamado a conhecer nestas circunstâncias - de acordo com as regras de distribuição do ónus da prova impunha-se ao A., para beneficiar do disposto no artigo 33.º, n.º 4, da Lei 34/2004, de 29.06, demonstrar que a decisão de concessão de apoio judiciário para a propositura de Acção Declarativa de Simples Apreciação que juntou aos autos foi efectivamente requerido para instaurar a presente acção declarativa de condenação – o que não fez.

XXXII - A presente acção intentada em 05.07.2017, não pode ser considerada proposta em 22.12.2010, data do requerimento de protecção jurídica “APJ 215387/2010”, não beneficiando do disposto no artigo 33.º, n.º 4, da Lei 34/2004, de 29.06, consequentemente não se mostrando interrompido o prazo de prescrição conforme decidido pela 1.º Instância.

XXXIII - E mesmo que nos presentes autos não estivesse em causa a prescrição, nunca o A. poderia prosseguir os autos beneficiando de um apoio judiciário que para os mesmos não foi concedido, impondo-se-lhe que procedesse ao pagamento das necessárias taxas de justiça – devidas pela propositura da acção e dos dois recursos que já interpôs (e das contra-alegações que ao presente aduzirá) e bem assim custeando os honorários ao Ilustre Advogado.

Termos em que e nos mais de direito que V. Exas. doutamente suprirão deve o recurso interposto ser julgado procedente revogando-se o Acórdão recorrido.


12. O Autor contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso.


13. Finalizou a sua contra-alegação com as seguintes conclusões:

I. A Recorrente apresentou o presente recurso com o fundamento de que, ao contrário do afirmado no Venerando Acórdão do Tribunal da Relação ….., deve proceder a exceção de prescrição, absolvendo-se a Ré do pedido.

II. Alega a Recorrente que, tendo em conta o disposto no n.º 7 do art.º 22.º da Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, a finalidade para a qual é concedido o benefício de apoio judiciário é sempre uma determinada causa (a propor ou já pendente) sendo apenas extensível a outros processos nas situações previstas no artigo 18.º, nºs 4 a 7 da citada Lei nº 34/2004 de 29/07.

III. Alega igualmente a Recorrente que o patrono nomeado está limitado, na sua intervenção, ao disposto no despacho da Segurança Social, competindo-lhe promover pelas competentes correções junto da Segurança Social quando o despacho desta não corresponde à efetiva pretensão do beneficiário.

IV. Conclui a Recorrente que, tendo a pretensão do Autor que foi objeto de apoio judiciário sido qualificada pela Segurança Social como fim a que se destina o apoio concedido: “Acção Declarativa de Simples Apreciação”, e não tendo sido solicitada qualquer “Rectificação da S.S.” da decisão de concessão de apoio judiciário concedida, não pode a ação ser considerada proposta em 22.12.2010, porque não se destina aos presentes autos o apoio judiciário requerido e concedido e aos mesmos junto.

V. Embora o n.º 7 do art.º 22.º da Lei 34/2004 indique ser necessária a identificação precisa do fim a que se destina o apoio judiciário, não se pode aferir que seja com o rigor invocado pela Recorrente.

VI. Conforme indica o Venerando Acórdão recorrido, “…quem formula o pedido de patrocínio não tem que ter (e na grande maioria das vezes não tem mesmo) conhecimentos jurídicos que permitam indicar que tipo de acção deverá ser utilizada para a salvaguarda dos seus direitos e/ou interesses”.

VII. Conforme decidiu o Tribunal da Relação de Guimarães de 13.07.2020, processo n.º 1534/19.9PBBRG.G1, Mesmo tendo o erro nas notificações sido originado pelo teor do próprio requerimento onde foi formulado o pedido de proteção jurídica, a responsabilidade de tal equívoco não pode ser imputada à requerente, mas antes aos serviços da segurança social”.

VIII. Conforme indica o Venerando Acórdão recorrido, “A referência que é feita naquele n.º 7 do art.º 22.º, à “identificação precisa do fim a que se destina o apoio judiciário” está, quanto a nós, dirigida à finalidade última deduzir acção ou apresentar defesa perante acção que tenha sido interposta por terceiros”.

IX. Por outro lado, a Recorrente não refere o que entende ser uma identificação precisa para efeitos da referida disposição legal.

X. São invocados pela Recorrente os Acórdãos proferido pelo Tribunal da Relação do Porto de 10.12.2009, processo 820/08.8TBESP-E.P1 e pelo Tribunal de Relação de Lisboa de 21.05.2020, processo 23/19.6T8MTA-B.L1-8.

XI. Os referidos acórdãos, porém, não se pronunciam a necessidade de identificação precisa prevista no n.º 7 do art.º 22.º da Lei n.º 34/2004.

XII. O Venerando Acórdão recorrido não merece qualquer reparo

Pelo exposto, e com o douto suprimento de V. Exas., deve o recurso interposto ser julgado improcedente e, consequentemente, manter-se a decisão recorrida, fazendo-se assim a costumada JUSTIÇA!


14. Como o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente (cf. arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. art. 608.º, n.º 2, por remissão do art. 663.º, n.º 2, do Código de Processo Civil), as questões a decidir, in casu, são as seguintes:

I. — se o Autor, agora Recorrido, tinha o ónus de identificação precisa do fim a que se destinava o apoio judiciário;

II. — se o Autor, agora Recorrido, cumpriu o ónus de identificação precisa do fim a que se destinava o apoio judiciário;

III. — se a presente acção deve considerar-se proposta na data em que foi apresentado o pedido de nomeação de patrono.


II. — FUNDAMENTAÇÃO


  OS FACTOS


15. O acórdão recorrido deu como provados os factos seguintes:

1. A Ré é Advogada.

2. O Autor tem vindo a efectuar, desde pelo menos o ano de 2005, dezenas de pedidos de apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono e dispensa do pagamento de custas judiciais.

3. No âmbito desses pedidos, a Ré foi nomeada como Patrona pelo Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados, quer do Autor, quer do E……………., de que aquele foi director, entre 2005 e 2008.

4. Na qualidade de Patrona e durante esse período temporal, a Ré propôs as acções a que correspondem os seguintes números:

a. Processo 3270/06.......,  .." Juízo Cível ..... (intentada em 02.03.2006).

Réus CC e DD;

b. Processo n.° 3268/06......., Juízos Cíveis ...... (intentada em 02.03.2006):

Réus EE e FF;

c. Execução n.° 3173/94, .. Juízo Cível (extinto) ......:

Executado GG (processo arquivado desde 29.12.2008);

d. Execução n.° 6161/94, .. Juízo Cível (extinto) ......:

Executado HH;

e. Processo n.° 5104/94, .. Juízo Cível (extinto) ......

Ré: II;

f. Processo n.° 1943/09....... (anterior 3457/94 (3457-A/1994), ..° Juízo Cível (extinto) ......

Réu: JJ;

g. Processo n.° 27104/09....... (anterior 1400/94 .. juízo Cível de ......):

Ré: KK;

h. Processo n.° 1703/96.......,  .. Juízo Criminal de ...... (extinto):

Arguido: LL;

i. Processo n.° 666/96.......,  .. Juízo Criminal do Tribunal Judicial ......

MM.

5. A presente acção foi intentada em 05.07.2017.

6. O Autor propôs a presente acção com apoio judiciário, concedido na sequência do requerimento APJ 21538/2010, apresentado em 22.12.2010 junto dos serviços da Segurança Social competentes.

7. Desse requerimento, consta que o fim a que se destinou o pedido de apoio judiciário aí formulado foi "Acção Declarativa de Simples Apreciação - Propor Acção”.


  O DIREITO


16. A primeira questão suscitada pela Ré, agora Recorrente, consiste em determinar se o Autor, agora Recorrido, tinha o ónus de identificação do fim a que se destinava o apoio judiciário.


17. Os arts. 6.º e 22.º da Lei 34/2004, de 29 de Julho, na redacção da Lei n.º 47/2007, de 28 de Agosto, em vigor à data da propositura da presente acção, eram do seguinte teor:

Artigo 6.º — Âmbito de protecção

1. — A protecção jurídica reveste as modalidades de consulta jurídica e de apoio judiciário.

2. — A protecção jurídica é concedida para questões ou causas judiciais concretas ou susceptíveis de concretização em que o utente tenha um interesse próprio e que versem sobre direitos directamente lesados ou ameaçados de lesão. […]

Artigo 22.º — Requerimento

1. — O requerimento de protecção jurídica é apresentado em qualquer serviço de atendimento ao público dos serviços de segurança social.

2. — O requerimento de protecção jurídica é formulado em modelo, a aprovar por portaria dos ministros com a tutela da justiça e da segurança social, que é facultado, gratuitamente, junto da entidade referida no número anterior e pode ser apresentado pessoalmente, por telecópia, por via postal ou por transmissão electrónica, neste caso através do preenchimento do respectivo formulário digital, acessível por ligação e comunicação informática.

3. — Quando o requerimento é apresentado por via postal, o serviço receptor remete ao requerente uma cópia com o carimbo de recepção aposto.

4. — O pedido deve especificar a modalidade de protecção jurídica pretendida, nos termos dos artigos 6.º e 16.º, e, sendo caso disso, quais as modalidades que pretende cumular.

5. — (Revogado pela Lei n.º 47/2007, de 28 de Agosto.)

6. — A prova da entrega do requerimento de protecção jurídica pode ser feita:

a) Mediante exibição ou entrega de cópia com carimbo de recepção do requerimento apresentado pessoalmente ou por via postal;

b) Por qualquer meio idóneo de certificação mecânica ou electrónica da recepção no serviço competente do requerimento quando enviado por telecópia ou transmissão electrónica.

7. — É da competência dos serviços da segurança social a identificação rigorosa dos elementos referentes aos beneficiários, bem como a identificação precisa do fim a que se destina o apoio judiciário, para os efeitos previstos no n.º 5 do artigo 24.º e nos artigos 30.º e 31.º


18. Os termos em que estão redigidos os n.ºs 4 e 7 são suficientemente claros no sentido de que o requerente deve indicar a finalidade — como, p. ex., a finalidade de propor uma acção ou de contestar uma acção proposta por terceiro — e que, no caso de ter como finalidade propor uma acção, deverá explicar de uma forma simples qual é o direito que pretende exercer e quais são os factos que o ameaçam ou que o violam.


19. O Autor, agora Recorrente, admite-o, ao dizer na conclusão V das alegações de recurso que, “…o n.º 7 do art.º 22.º da Lei 34/2004 [indica] ser necessária a identificação precisa do fim a que se destina o apoio judiciário…”, ainda que “não se [possa] aferir que [a identificação] seja com o rigor invocado pela Recorrente”.


20. Esclarecido que o Autor, agora Recorrido, tinha o ónus de identificação do fim, deve pôr-se a segunda questão — se o Autor, agora Recorrido, cumpriu o ónus de identificação do fim a que se destinava o apoio judiciário.


21. Os factos dados como provados sob os n.ºs 6 e 7 são do seguinte teor:

6. O Autor propôs a presente acção com apoio judiciário, concedido na sequência do requerimento APJ 21538/2010, apresentado em 22.12.2010 junto dos serviços da Segurança Social competentes.

7. Desse requerimento, consta que o fim a que se destinou o pedido de apoio judiciário aí formulado foi "Acção Declarativa de Simples Apreciação - Propor Acção”.


22. O acórdão recorrido considera que a questão é a de averiguar se o requerente e apoio judiciário tinha o ónus de indicar “se se trata de acção de simples apreciação (positiva ou negativa), ou de condenação, ou mesmo constitutiva, ou executiva até (pense-se na hipótese de alguém pensar que detém titulo executivo, quando na realidade o documento que tem em seu poder não o é)”.


23. O problema está em que o requerente não explicou, “por palavras suas”, a pretensão que pretendia deduzir. em termos de concretizar, ainda que só minimamente, o pedido e a causa de pedir.


24. Em termos análogos aos da distinção entre efeitos práticos, efeitos jurídicos e efeitos prático-jurídicos [1], deve distinguir-se uma “representação clara de juristas” e uma “representação prática global […] — uma representação de leigos” [2].


25. O requerente faz, e tem de fazer, uma “representação prática global […] — uma representação de leigos” — do pedido e da causa de pedir; daquilo que pretende e das razões por que o pretende; não faz, e não tem de fazer, uma “representação clara de juristas”.


26. O requerimento de apoio judiciário deve indicar a “representação prática global”, de leigos, daquilo que o autor pretende. O formulário [3] confirma-o, ao conter um campo — Observações — em que o requerente deve “[explicar], por palavras suas, a sua pretensão”, e as intruções de preenchimento [4] esclarecem que o requerente deve “explicar sucintamente:

— o motivo pelo qual vem pedir apoio judiciário;

— descrever qual a situação em que os seus direitos se encontram prejudicados ou ameaçados ou correm o risco de vir a estar e em que o recurso ao tribunal seja o meio adequado para a defesa desses mesmos direitos, quer exista já um processo judicial ou haja a intenção de o iniciar”.


27. Enquanto o requerente de apoio judiciário deve apresentar uma identificação aproximada do fim a que se destina o apoio judiciário, consistente com uma “representação prática global […] — [com] uma representação de leigos” —, os Serviços da Segurança Social deverão fazer a sua identificação precisa, consistente com uma “representação clara de juristas”.


28. O facto de o requerente ter feito constar como fim do pedido de apoio judiciário "Acção Declarativa de Simples Apreciação - Propor Acção” poderá ser irrelevante; poderá não significar nada de decisivo; o facto de o requerente não ter descrito, de uma forma minimamente adequada, “a situação em que os seus direitos se encontram prejudicados ou ameaçados ou correm o risco de vir a estar e em que o recurso ao tribunal seja o meio adequado para a defesa desses mesmos direitos”, esse, terá de ser relevante; terá de significar algo— terá de significar que o Autor, agora Recorrido, não cumpriu o ónus de identificação, ainda que aproximada, do fim a que se destinava o apoio judiciário.


29. Esclarecido que o o Autor, agora Recorrido, não cumpriu o ónus de identificação, ainda que aproximada, do fim a que se destinava o apoio judiciário, deve pôr-se a terceira questão: — se a presente acção deve considerar-se proposta na data em que foi apresentado o pedido de nomeação de patrono.


30. O art. 33.º, n.º 4, da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, é do seguinte teor:

4. — A acção considera-se proposta na data em que for apresentado o pedido de nomeação de patrono.


31. O ónus da prova de que foi apresentado um pedido de nomeação de patrono para a presente acção recai sobre o Autor, agora Recorrido, por se tratar de um facto impeditivo do facto modificativo ou extintivo prescrição, invocado pela Ré, agora Recorrente [5].


32. O facto de o Autor, agora Recorrido, não ter cumprido o ónus de identificação, ainda que aproximada, do fim a que se destina o apoio judiciário determina que não possa estabelecer-se se foi apresentado um pedido de nomeação de patrono para a presente acção (para um acção com um pedido e com uma causa de pedir correspondentes aos da acção proposta).


33. Em consequência, o requerimento apresentado em 22 de Dezembro de 2010 não tem (não pode ter) o efeito interruptivo do prazo de prescrição previsto no art. 33.º, n.º 4, da Lei n.º 34/2004, em ligação com o art. 323.º, n.º 2, do Código Civil.


34. As instâncias estiveram de acordo em que deveria aplicar-se o prazo de três anos do art. 498.º do Código Civil — e o Autor, agora Recorrente, não colocou em causa nas conclusões do recurso de revista que devesse aplicar-se o prazo de três anos.


35. Estando as instâncias de acordo em deveria aplicar-se o prazo de prescrição de três anos do art. 498.º do Código Civil, em termos que não foram colocados em causa no presente recurso de revista, constata-se que, entre a data em que o Autor, agora Recorrente, terá tido conhecimento do seu (alegado) direito de indemnização (entre 2005 e 2008) e a data da propositura da acção (5 de Julho de 2017) decorreram, no mínimo, oito anos — logo, que o  (alegado) direito de indemnização do Autor, agora Recorrido, se encontrava prescrito.


III. — DECISÃO

Face ao exposto, concede-se provimento ao recurso e revoga-se o acórdão recorrido, repristinando-se a decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª instância.

Custas pelo Recorrido BB, sem prejuízo do apoio judiciário que lhe tenha sido concedido.


Lisboa, 28 de Outubro de 2021


Nuno Manuel Pinto Oliveira (relator)

José Maria Ferreira Lopes

Manuel Pires Capelo

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[1] Cf. Manuel de Andrade, Teoria geral da relação jurídica, vol. II — Facto jurídico, em especial negócio jurídico, Livraria Almedina, Coimbra, 1974 (reimpressão), págs. 120-122.

[2] Cf. Manuel de Andrade, Teoria geral da relação jurídica, vol. II — Facto jurídico, em especial negócio jurídico, cit., pág. 122.

[3] In: WWW: < https://www.seg-social.pt/documents/10152/21736/PJ_1_DGSS/0e0614b9-4fb3-4a29-868d-6ee9888f7a6c/0e0614b9-4fb3-4a29-868d-6ee9888f7a6c >

[4] In: WWW: < https://www.seg-social.pt/documents/10152/21736/PJ_1_2_DGSS.pdf/41038c6a-8ea5-45c5-bb55-11792f48860a >.

[5] Cf. art. 342.º do Código Civil.