Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
43/08.6ECLSB-A.S1
Nº Convencional: 3.ª SECÇÃO
Relator: OLIVEIRA MENDES
Descritores: RECURSO DE REVISÃO
ACÓRDÃO PARA FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
JOGO DE FORTUNA E AZAR
Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 01/18/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: IMPROCEDENTE
Área Temática: DIREITO PROCESSUAL PENAL - RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS
/ FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA / REVISÃO.
Legislação Nacional: CÓDIGO PROCESSO PENAL (CPP): - ARTIGOS 445.º, N.º 1 E
3, 446.º, N.º 1 E 2, 449.º, N.º 1, AL. D).
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
- ACÓRDÃO DE FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA N.º 4/10, DE 8 DE
MARÇO.
Sumário : I - A recorrente sustenta o recurso de revisão de sentença que interpôs, na circunstância de haver sido condenada pela autoria material de um crime de exploração de jogo ilegal, com base em exame pericial que qualificou máquina de jogo de que era possuidora como desenvolvendo um jogo de fortuna ou azar, quando de acordo com o AUJ n.º 4/2010, de 08-03, posteriormente prolatado, aquela máquina desenvolve uma modalidade afim de um jogo de fortuna ou azar, actividade não punível como crime, antes como mera contra-ordenação, circunstancialismo que enquadra no fundamento previsto na al. d) do n.º 1 do art. 449.° do CPP.

II - Conquanto a recorrente sustente o pedido de revisão formulado no fundamento constante da al. d) do n.º 1 do art. 449.° do CPP, ou seja, na descoberta de novos factos ou meios de prova que suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação, a verdade é que a mesma não indica qualquer novo facto ou meio de prova, sendo que fundamenta o pedido de revisão em AUJ, mais precisamente na jurisprudência fixada no Ac. n.º 4/2010, pretendendo que a orientação jurisprudencial que ali foi adoptada pelo STJ seja aplicada à situação factual que se encontra subjacente à sentença revidenda e que motivou a sua condenação como autora material do crime de exploração de jogo ilegal.

III - Sucede que a lei não atribui aos AUJ essa virtualidade ou efeito. De acordo com o disposto no n.º 1 do art. 445.º do CPP, a decisão que fixa jurisprudência só tem eficácia no processo a que respeita e nos processos cuja tramitação tiver sido suspensa nos termos do n.º 2 do art. 441.º, o que, obviamente, não é o caso dos autos. Evidentemente, sem embargo do efeito genérico que produz relativamente a todas as decisões que, posteriormente, venham a ser proferidas sobre a mesma questão, efeito previsto no n.º 3 do art. 445.º e n.ºs 1 e 2 do art. 446.º do CPP. Logo, carece de fundamento o recurso de revisão apresentado pela recorrente.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

AA, com os sinais dos autos, interpôs recurso extraordinário de revisão da sentença que a condenou como autora material de um crime de exploração de jogo ilegal, previsto e punível pelas disposições conjugadas dos artigos 1º, 4º, n.º 1, alínea g) e 108º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de Dezembro, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 10/95, de 19 de Janeiro, na pena de 180 dias de multa substituídos por igual tempo de multa à taxa diária de € 15,00.

A recorrente fundamenta o recurso interposto na circunstância de haver sido condenada, em 28 de Fevereiro de 2008, com base em exame pericial que qualificou máquina de jogo de que era possuidora como desenvolvendo um jogo de fortuna ou azar, quando de acordo com o acórdão de fixação de jurisprudência n.º 4/10, de 8 de Março, aquela máquina desenvolve uma modalidade afim de um jogo de fortuna ou azar, actividade não punível como crime, antes como mera contra-ordenação.

Na resposta apresentada o Ministério Público formulou as seguintes conclusões:

1. A arguida AA foi condenada, por sentença transitada em julgado em 29.04.2008, pela prática, em autoria material, de um crime de jogo ilegal.

2. Com o presente recurso pretende a recorrente se autorize a revisão da sentença condenatória, transitada em julgado, proferida no processo principal.

3. Os fundamentos invocados não preenchem os requisitos previstos na alínea d) do n.º 1 do artigo 449º do Código de Processo Penal para a revisão da sentença proferida.

4. A recorrente invoca, por um lado, o exame pericial efectuado (que não existe nos autos), por outro lado, o Acórdão de Fixação de Jurisprudência n.º 4/10, de 08.03 e o Acórdão n.º 21/98.5FDCBR, do Tribunal da Relação de Coimbra.

5. A máquina em causa nos autos (v.g. roleta) não tem mecanismo de jogo idêntico àquele que determinou o acórdão de fixação de jurisprudência.

6. Não existem quaisquer factos novos nem novos meios de prova que suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação, motivo pelo qual deve a mesma ser mantida nos seus precisos termos.

7. Deverá, pois, ser negada a pretendida revisão de sentença, com base nesse fundamento (alínea d) do n.º 1 do artigo 449º do Código de Processo Penal).

8. Por tudo o que se disse, parece-nos que deverá ser julgado improcedente o recurso interposto pela recorrente, denegando a pretendida revisão, no que se fará a habitual Justiça.

A Exma. Juíza prestou informação na qual se pronuncia no sentido de que o recurso não merece provimento por não se verificar o fundamento de revisão invocado pelo recorrente, previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 449º do Código de Processo Penal, nem qualquer outro dos fundamentos previstos na lei.

O Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no qual entende que não deverá ser autorizada a revisão pretendida, visto que, ao contrário do invocado, inexiste qualquer novo facto ou meio de prova, sendo que a única novidade surgida após a prolação da sentença revivenda, concretamente o acórdão do pleno das secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça, não constitui fundamento válido de revisão.

Colhidos os vistos, cumpre agora decidir.

                                       ***

A recorrente AA sustenta o recurso de revisão de sentença que interpôs, na circunstância de haver sido condenada pela autoria material de um crime de exploração de jogo ilegal, com base em exame pericial que qualificou máquina de jogo de que era possuidora como desenvolvendo um jogo de fortuna ou azar, quando de acordo com o acórdão de fixação de jurisprudência n.º 4/10, de 8 de Março, posteriormente prolatado, aquela máquina desenvolve uma modalidade afim de um jogo de fortuna ou azar, actividade não punível como crime, antes como mera contra-ordenação, circunstancialismo que enquadra no fundamento previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 449º do Código de Processo Penal[1].

Conquanto a recorrente sustente o pedido de revisão formulado no fundamento constante da alínea d) do n.º 1 do artigo 449º do Código de Processo Penal, ou seja, na descoberta de novos factos ou meios de prova que suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação, a verdade é que a mesma não indica qualquer novo facto ou meio de prova, sendo que fundamenta o pedido de revisão em acórdão de fixação de jurisprudência, mais precisamente na jurisprudência fixada no acórdão n.º 4/10, pretendendo que a orientação jurisprudencial que ali foi adoptada por este Supremo Tribunal seja aplicada à situação factual que se encontra subjacente à sentença revivenda e que motivou a sua condenação como autora material do crime de exploração de jogo ilegal.

Sucede que a lei não atribui aos acórdãos de fixação de jurisprudência essa virtualidade ou efeito. De acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 445º do Código de Processo Penal, a decisão que fixa jurisprudência só tem eficácia no processo a que respeita e nos processos cuja tramitação tiver sido suspensa nos termos do n.º 2 do artigo 441º, o que, obviamente, não é o caso dos autos. Evidentemente, sem embargo do efeito genérico que produz relativamente a todas as decisões que, posteriormente, venham a ser proferidas sobre a mesma questão, efeito previsto no n.º 3 do artigo 445º e n.ºs 1 e 2 do artigo 446º do Código de Processo Penal.

Deste modo, não se verificando o fundamento de revisão de sentença invocado pela recorrente nem qualquer outro dos legalmente previstos, o recurso não pode proceder.

                                         *

Termos em que se acorda negar o pedido de revisão de sentença.

Custas pela recorrente, fixando em 3 UC a taxa de justiça.

                                         *

Lisboa, 18 de Janeiro de 2012.

Oliveira Mendes (relator)


Maia Costa


Pereira Madeira

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[1] - É do seguinte teor a alínea d) do n.º 1 do artigo 449º do Código de Processo Penal:
«1. A revisão de sentença transitada em julgado é admissível quando:

d) Se descobrirem novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação».