Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
568/11.6TCFUN.L1.S1
Nº Convencional: 1ª SECÇÃO
Relator: CABRAL TAVARES
Descritores: CONTRATO DE EMPREITADA
DEFEITO DA OBRA
CADUCIDADE
RECONHECIMENTO DO DIREITO
INTERPRETAÇÃO DA DECLARAÇÃO NEGOCIAL
MULTA
REGIME APLICÁVEL
DIREITO DE DEFESA
PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO
PEDIDO
JUROS LEGAIS
JUROS DE MORA
NATUREZA COMERCIAL
Data do Acordão: 04/10/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL – RELAÇÕES JURÍDICAS / FACTOS JURÍDICOS / O TEMPO E A SUA REPERCUSSÃO NAS RELAÇÕES JURÍDICAS / CADUCIDADE.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGO 331.º, N.º 2.
NOVO REGIME JURÍDICO DAS EMPREITADAS DE OBRAS PÚBLICAS, DL N.º 59/99: - ARTIGO 201.º, N.º 5 E 233.º, N.º 3 DE 02-03.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 12-11-1987;
-DE 20-06-1990;
- DE 20-05-2003, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 23-09-2008;
- DE 16-04-2009;
- DE 04-05-2010;
- DE 04-11-2010;
- DE 19-1-2012, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 08-11-2012;
- DE 07-02-2013, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 10-10-2013;
- DE 06-04-2017, IN WWW.DGSI.PT.
Sumário :

I - O reconhecimento do direito por parte daquele contra quem deva ser exercido, com eficácia impeditiva da caducidade – art. 331.º, n.º 2, do CC – tem de ser “concreto, preciso, indiscutível, evidente, real e categórico, sem margem de vaguidade ou ambiguidade, de tal modo que torne o direito certo e faça as vezes da sentença”.
II - Está ao abrigo de eventual censura do STJ o julgamento da matéria de facto levado a cabo pela Relação, mormente do teor do auto de vistoria e de receção provisória da obra, bem como a interpretação feita de que da mesma não resulta o reconhecimento dos defeitos de obra, por parte da autora, nem uma assunção expressa de responsabilidade pela sua reparação.
III - Tendo as partes consignado expressamente no auto de vistoria e de receção provisória da obra que “Estão previstas e são aplicáveis as penalizações previstas na legislação atualmente em vigor” e não obstante o clausulado contratual ser omisso nessa parte, deve entender-se que, quer para a receção provisória da obra, quer para a ulterior receção definitiva e especificamente quanto ao procedimento de aplicação das multas contratualmente previstas (penalizações), quiseram as partes a regência e aplicação do regime jurídico decorrente do DL n.º 59/99, de 02-03.
IV - Não tendo, porém, a recorrente, enquanto dona da obra, garantido a audiência e defesa do sancionado previamente à aplicação da multa – conforme prescrevem os arts. 201.º, n.º 5, e 233.º, n.º 3, daquele diploma legal – não lhe assiste o direito de, por via da presente ação, obter a condenação da autora/recorrida, no respetivo pagamento.
V - Embora o pedido formulado pela autora não expresse a natureza civil ou comercial dos juros legais de mora peticionados, deve entender-se que considerou os juros comerciais quando tal resulta do valor global peticionado e mencionado na petição inicial, bem como em documento com esta junto.

Decisão Texto Integral:

Acordam, na 1ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça:


I

1. SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES AA, S.A., intentou contra BB - PROMOÇÕES IMOBILIÁRIAS, S.A, ação declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, pedindo a condenação da ré no pagamento à autora de quantias em dívida, emergentes de um contrato de empreitada entre ambos celebrado, no montante global de €599.298,76, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, desde 10-10-2011, sobre a quantia de € 444.293,16, até integral pagamento.

Alegou em síntese que, em 24 de Novembro de 2005,na qualidade de empreiteira, celebrou com a ré, como dona da obra, um contrato de empreitada, tendo por objeto a execução da construção e acabamentos de um edifício de habitação coletiva a edificar no prédio localizado ao ..., pelo preço de € 4.706.073,05, acrescido de IVA, sendo a empreitada tipo "chave na mão"; a obra ficou concluída em finais de Novembro de 2007 e foi formalmente entregue em 12 de Dezembro do mesmo ano; reparou todos os defeitos detetados que eram da sua responsabilidade; a ré não pagou as faturas que foram emitidas desde 31 de Agosto de 2007, no montante global de €415.068,11; sobre as faturas emitidas entre 30 de Março de 2006 e 31 de Agosto de 2007 são devidos juros de mora, uma vez que o seu pagamento não ocorreu no prazo de trinta dias a contar da data do vencimento, conforme estipulado no contrato; para pagamento das faturas emitidas antes de 31 de Agosto de 2007 a ré aceitou diversas letras que foram descontadas em instituições financeiras e que já se encontram pagas, mas por força das quais a autora teve de suportar diversos encargos no valor de €29.135,05, a que acrescem juros de mora a partir do seu vencimento; a obra deveria ter terminado em 7 de Julho de 2007 mas só foi entregue em 12 de Dezembro seguinte, devido a pedidos formulados pela ré para introduzir alterações e entrega tardia dos elementos necessários para tanto, como no que diz respeito à alteração de um laje aligeirada para laje maciça, escadas de emergência, definição de rede de águas pluviais dos logradouros virados a Norte e Nascente, alterações de apartamentos TI para tipologia T3, alteração do projeto de betão armado, localização de cabeceiras de camas, alteração dos materiais de revestimentos das paredes e pavimentos das casas de banho e cozinhas, nas entradas nos blocos e acessos a elevadores, entrega do desenho de implantação das arrecadações, entrega das referências das tintas a aplicar, entrega do desenho de pormenor com implantação do tanque de gás, arranjos exteriores, implantação do posto de transformação; foram executados trabalhos a mais que implicaram também um prolongamento do prazo em 29 dias; a ré sempre reconheceu a dívida; inesperadamente, em 30 de Novembro de 2010, ela, autora, recebeu uma notificação judicial avulsa na qual é referido que face ao atraso na entrega da obra a ré tinha direito à quantia de €345.896,29 por multas, comunicando ainda uma compensação de créditos; nunca poderia ser aplicada tal multa, face ao estipulado no art. 223º, n.º 4, do DL 59/99, de 2 de Março, além de que operou a caducidade desse invocado direito a obter o pagamento de multa pelo atraso na execução na obra, face ao estatuído no art. 1224°, nº 1 do CC.

Contestou a ré, alegando, em síntese, que do auto de receção provisória da obra resulta que foram detetados diversos defeitos que a autora ainda não reparou, estando pendente a ação nº 502/11.3TCFUN na qual se peticiona a reparação dos defeitos; não tendo sido reparados os defeitos, assiste à ré a invocação da exceção de não pagamento; a autora tem afirmado que os valores em dívida seriam os das faturas nºs. A 544, B 298 e B 317; em 25 de Agosto de 2010, a autora assumiu formalmente que o saldo da conta corrente entre as partes era de €452.357,40, sendo que depois ela, ré, pagou €122 000,00 ficando o valor reduzido para €330.357,40; em 16 de Março de 2011, a autora enviou-lhe a fatura nº 2797, no montante de €113.334,70, relativa a alegados trabalhos a mais e só nessa data exigiu juros moratórios no valor de €155.095,60, o que constitui venire contra factum proprium face ao valor anteriormente tido como sendo o devido; os factos invocados pela autora para justificar o atraso na conclusão da obra não relevam.

Deduziu, ainda, reconvenção pedindo a condenação da autora no reconhecimento de que ela, ré, é titular do crédito no montante de €81.773,03, a título de trabalhos a menos/menos valias não realizadas; no reconhecimento de que é titular do crédito no valor de €362.368,16, a título de multa contratual devida pelo atraso da obra da responsabilidade da autora reconvinda; a reconhecer o direito a exercer a compensação com os possíveis créditos da autora; se assim se não entender, deve a declaração de compensação realizada por notificação judicial avulsa ser declarada válida e eficaz e ser a autora condenada a reconhecê-lo; ser a autora condenada no pagamento à ré do valor que exceda a medida da compensação.

Houve réplica e, apresentado conjuntamente requerimento de suspensão da instância para acordo, foi este indeferido.

Proferida, a final, sentença, na qual se decidiu: «Julgar parcialmente procedente, por provada, a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário e improcedente a reconvenção e, em consequência: Condenar a ré no pagamento à autora da quantia global de € 301 733,41 (…), acrescida de juros de mora vencidos desde a data do vencimento de cada uma das facturas A 544 (esta apenas quanto ao valor de € 105 278,18), B 298 e B 317 (…), calculados com base nas taxas que foram sendo mensalmente fixadas por Aviso da DGT, conforme Portaria n." 597/2005, de 19.07 e vincendos, até integral pagamento, absolvendo-a do demais peticionado; Absolver a autora/reconvinda do pedido reconvencional».

2. Apelou a ré, tendo a Relação, por unanimidade, julgado o recurso improcedente e confirmado a sentença recorrida.

3. Recorreu a ré para o STJ, subsidiariamente requerendo a admissão do recurso como revista excecional – art. 672º do CPC.

Proferido acórdão por esta secção, em 10 de Outubro último, a não admitir a revista ordinária, por se não verificar o requisito negativo da dupla conforme – art. 671º, nº 3 do CPC (acórdão, a fls. 961/9).

Apresentados os autos à formação prevista no nº 3 do art. 672º do CPC, foi, à luz do disposto na alínea a) do nº 1 do art. 672º do CPC, admitida a revista excecional, restrita ás seguintes questões: (i) «não cumprimento/caducidade do direito à eliminação dos defeitos»; (ii) «multa [pelo atraso da obra] (…)»; (iii) «juros de mora/nulidade da sentença [do acórdão]» (acórdão, a fls. 998/1005).

4. São as seguintes as pertinentes conclusões da alegação da Recorrente:

«(…)

 ll). O Tribunal da Relação a quo decidiu que, quanto à questão da exceção de não cumprimento/caducidade do direito à eliminação dos defeitos, não assistir à apelante, ora recorrente, o direito de “direito a invocar a excepção de não cumprimento do contrato, fundada na falta de reparação dos defeitos das obras”;

mm). Uma vez que não houve, por um lado, reconhecimento por parte da A./apelada nesse sentido e porque, sob pena de romper o equilíbrio contratual ou a equivalência das prestações, não pode existir reconhecimento obstativo da caducidade; Ora,

nn). Na petição inicial a A., ora recorrida, pediu a condenação da R., ora apelante, no pagamento da “quantia de € 559.298,76, acrescido de juros de mora legais (…) até efectivo e integral pagamento …” (sic), a título de preço da empreitada de construção e acabamentos do edifício “...”, sito na freguesia do ..., município de ...;

oo). Na sentença apelada a 1º instância condenou a aqui apelante no pagamento “da quantia global de 301,733,41 € (…), acrescida de juros de mora vencidos desde a data de vencimento das facturas A544 (esta apenas no montante de € 105 278,18), B298 e 317 referidas em 12., calculados com base nas taxas que foram sendo mensalmente fixadas por Aviso da DGT, conforme Portaria nº 597/2005, de 19.07 e vincendos, até integral pagamento, absolvendo-a do demais peticionado”;

pp). Na sua contestação a R., ora recorrente, invocou exceção de não cumprimento por parte da A./apelada; Pois bem,

qq). Atento ao específico e concreto teor fls. 164 a 177 dos autos, de que dá conta os factos 5. e 6. da matéria de facto julgada assente, é fora de qualquer dúvida que tal auto de receção provisória, datado de 12.12.2007, foi efetivamente assinado pela empreiteira, aqui A./apelada, como o foi pela dona da obra, ora R./apelante e, bem assim, pela Fiscalização;

rr). E que do mesmo auto de receção provisória consta, sem margem para equívocos, expressas as “diversas irregularidades, conforme se pode constatar em anexo”, do qual anexo consta o rol respetivo. – cfr. fls. 164 a 177 dos autos -, como dá conta, de resto o Tribunal da Relação no acórdão recorrido, a suas p. 28 a 32;

ss). A./apelada/ora recorrida nessa data tomou expresso conhecimento dessas irregularidades e da necessidade da sua reparação/eliminação, como está processualmente adquirido no ponto 6. da matéria de facto, o que é ostensivo, claro e inequívoco;

tt). Por outro lado, nos termos da cláusula Décima Segunda do contrato de empreitada, as partes foram expressas na previsão das opções que o dono da obra teria aquando da receção provisória da obra, entre as quais a prevista na alínea c) [aceitação provisória “mas sob condições de serem reparados os vícios e imperfeições já patentes” (sic);

uu). Na situação dos autos, é patente, claro, inequívoco e notório que, atento ao teor dos pontos 5. e 6. da matéria de facto julgada assente, o dono da obra/ora recorrente, ao ter feito constar do auto de receção provisória, assinado pela própria empreiteira/A./apelada a expressa indicação das irregularidades e um seu anexo onde as mesmas são discriminadas deitou mão da possibilidade contratual que lhe era conferida pela al. b) da Cláusula Décima Segunda do contrato de empreitada;

vv). Do dito auto receção não consta a conclusão da obra e, por outro lado, esta não foi rejeitada pela ora apelante, mas sim que a aceitação provisória foi condicional “sob condições de ser reparados os vícios e imperfeições já patentes” e constante do dito auto e do anexo para o qual remete;

ww). Tal faculdade contratual, tal qual prevista no contrato de empreitada, determinava, de modo expresso e inequívoco, a necessidade da reparação dos vícios e imperfeições por parte da empreiteira/A./apelada;

xx). Esta ao assinar e ao aceitar tal dito auto de receção condicional ou sob reserva, como assinou e aceitou, obrigou-se, de forma clara, necessária e lógica, a reparar os vícios imperfeições da obra que do dito auto foram feita constar pelo dono da obra e pela fiscalização;

yy). Até porque se a empreiteira/A./apelada discordasse da recepção provisória sob reserva simplesmente não o teria assinado, ao invés do que fez;

zz). Ora, ao invés do concluído pelo Tribunal da Relação a quo, da matéria de facto considerada provada nos pontos 5. e 6. e da sua conjugação com o teor da cláusula Décima Segunda do contrato de empreitada, é possível constatar que a A./apelada/ora recorrida, ao assinar e aceitar o auto de receção nos termos em que o fez, assumiu, pelo menos implicitamente, a inerente responsabilidade pela reparação dos defeitos que a obra já apresentava;

aaa). Tal asserção é clara, notória e inequívoca, como se disse, muito ao invés do que parece propugnar o Tribunal da Relação recorrido, até porque a A./recorrida assinou o auto, e sabia e não podia ignorar as opções contratuais previstas na clausula 12ª do contrato por si também assinado e que no cotejo destas só se podia estar em face duma receção provisória condicional ou sob reserva;

bbb). Por outro lado, o Tribunal da Relação a quo foi de entendimento que se operasse o reconhecimento obstativo da caducidade do direito de reparação dos defeitos por parte da A./ora recorrida tal violaria o equilíbrio das prestações ou equivalência das prestações;

ccc). Fê-lo por referência a comparação entre o montante do crédito da A./apelada/ora recorrida e o montante das reparações em questão;

ddd). O Tribunal, para além de limitar-se a enumerar o rol dos defeitos/desconformidades, formula aquele juízo decisório assente em permissivas que só o próprio julgador, porventura, conhece;

eee). De fato, depois de constatar o óbvio e evidente – que nos autos e na sua matéria de fato não consta o apuramento do possível valor necessário à reparação dos defeitos/desconformidades em questão -, decide a questão por si próprio levantada por lhe ser “possível perspectivar que o valor das reparações é muito inferior ao que falta liquidar”- cfr. p. 32 do acórdão recorrido;

fff). Ora, os custos de reparação dos defeitos não são notórios nem se mostram apurados em sede de matéria de fato com considerada provada em qualquer das instâncias:

ggg). O julgamento judicial deve constituir um silogismo assente em fatos processualmente adquiridos, pelas formas processuais devidas, pelo que se não alcança a que título o afirmado o é ou que meios de prova aduz o Tribunal para estribar a sua conclusão;

hhh). Reitera-se: inexiste nos autos qualquer avaliação dos custos necessários da reparação dos defeitos em apreço e não consta do elenco dos fatos provados qualquer matéria que lhe permita inferir no sentido que infere, mormente por referência a quaisquer percentagens de retenção a título de garantia;

iii). A comparação que visou o Tribunal estabelecer é virtualmente impossível por total ausência de matéria de fato que a corrobore e constitui um simples exercício de voluntarismo ilegal e de pura adivinhação, ofensiva de qualquer processo judicial justo e equitativo;

jjj). E que exige concordância entre os fundamentos – também os de fato – e as conclusões de direito, o que não ocorre na situação em questão;

kkk). Ao se mostrar processualmente impossível tal comparação, nenhuma conclusão no sentido da violação do equilíbrio contratual ou equivalência das prestações mostra-se possível e fundamentado, nem pode constituir fundamento para impedir o reconhecimento por parte    da        A./recorrida obstativo da caducidade em apreço;

lll). Ao assim ter procedido o Tribunal da Relação recorrido o disposto nos arts. 428º, 331º/2, 309º e 1220º/2 do CC e, bem assim, a cláusula 12ª do contrato de empreitada em questão;

mmm). Como incorreu em nulidade disposto no art. 615º/1, al. c) do CPP, pois que alicerçou fundamento decisório sem qualquer matéria de fato considerada demonstrada;

nnn). Em conformidade, deve o decidido ser revogado e substituído por outro que julgue a exceção de não cumprimento subsistente e eficaz, obstando de modo, até que esse cumprimento ocorresse [no caso, até que os defeitos e imperfeições elencados no ponto 41 da matéria de facto sejam reparadas], a exigibilidade do pagamento do remanescente do preço da empreitada à A./apelada;

ooo). Quanto à questão da multa contratual, o Tribunal da Relação decidiu que não assistia à R./ora recorrente o direito de aplicar tal multa nem de obter nestes autos a condenação desta, tendo julgado improcedente a compensação de créditos e o pedido reconvencional daquela;

ppp). Na reconvenção a ora recorrente pediu o reconhecimento da compensação por si realizada no montante de € 345.896,29 decorrente da aplicação de multa contratual por atraso na entrega da obra por parte da A./apelada;

qqq). O Tribunal decidiu como decidiu por a dita multa dever ser aplicada observando o disposto no Decreto-Lei nº 59/99, de 2.3;

rrr). Contudo, nos autos fora de dúvida que a notificação da R./recorrente à A./recorrida no sentido da aplicação da multa contratual foi realizada a 30.11.2010 (cfr. ponto 7. dos factos assentes), como é igualmente certo que a A./recorrida procedeu única e tão somente como consta descrito na factualidade do ponto 8;

sss). Como do mesmo modo é claro que as partes não submeteram, em momento algum e como decorre do clausulado do seu contrato de empreitada, o dito contrato ou a sua execução ao regime jurídico público ou de direito administrativo aplicável aos contratos administrativos de empreitadas de obras públicas;

ttt). Tal circunstância é, de resto expressamente reconhecida pelo próprio Tribunal na p. 35 do seu acórdão, 2º §º;

uuu). E assim sendo, como é cristalino no contrato de empreitada, se não alcança como pode, de forma paradoxal, o Tribunal subsumir a execução do contrato ao regime público;

vvv). De facto, só o faz apegando-se ao auto de receção provisória, sem que o contextualize e o interprete à luz da autonomia privada das partes consubstanciada no contrato por si outorgado;

www). Ora, estas tinham conhecimento – porque assinaram o dito contrato! – dos seus concretos termos e do regime jurídico que pretenderam aplicar à sua relação contratual e à execução do contrato em questão;

xxx). E é manifesto que a sujeição ao regime público das empreitadas públicas da dita execução do contrato não foi nem desejada nem querida pelas partes, nem tão pouco plasmaram isso na sua autorregulação contratual;

yyy). Tal automomia privada e liberdade contratual é a plasmada no contrato de empreitada dos autos e nenhuma outra, em obediência, de resto, ao disposto no art. 405º do CC, pelo que as incidências da sua execução só podem ser interpretadas à luz e em conformidade com os termos do clausulado contratual;

zzz). A interpretação do auto de receção feito pela Relação infringe e viola os concretos termos do contrato da empreitada, pois que neste nenhum aspeto da sua execução foi submetido ao regime de direito público;

aaaa). E se as partes entendessem submeter qualquer aspeto da execução do contrato ao regime jurídico público, maxime ao art. 201º do DL 59/59, tê-lo-iam previsto e externado, de forma expressa, no contrato dos autos.;

bbbb). Ao invés, a cláusula contratual nº 23ª é clara e precisa quanto à questão que se ocupa: previa a aplicação de multa contratual por atraso na execução da empreitada e previa o seu quantibus concreto diário;

cccc). Importa notar, ainda, que na situação dos autos o observado pela recorrente ofereceu à A./recorrida uma maior garantia de segurança e fidedignidade do que aquela que decorre dito DL nº 55/99, pois que, como decorre dos fatos provados, a mesma teve lugar através de por notificação judicial avulsa – ao contrário de simples notificação à empreiteira;

dddd). E esta teve todo o tempo entre a receção da notificação judicial avulsa e a interposição da presente ação judicial para sobre a mesma se pronunciar e a impugnar, ao invés do prazo de impugnação previsto naquele diploma;

eeee). O Tribunal da Relação ao considerar que aplicação da multa contratual prevista na cláusula 23º do contrato de empreitada devia observar o disposto no DL 59/99 – aqui totalmente inaplicável -, infringiu tanto aquela cláusula, o contrato de empreitada em apreço e, bem assim, o princípio da autonomia privada das partes, previsto no art. 405º do CC;

ffff). Em consequência, o acórdão recorrido é ilegal, devendo ser revogado e substituído por outro que reconheça à recorrente o direito de aplicar a multa contratual em apreço e de obter nestes autos a condenação da recorrida no seu pagamento, com a consequente compensação de créditos;

gggg). Quanto aos juros moratórios civis, a A./ora recorrida não pediu a condenação da recorrente em juros moratórios comerciais, mas sim limitou-se a sua condenação nos “juros de mora legais”;

hhhh). Ante a ausência de pedido estava as instâncias impedidas de decidirem como decidiram, porquanto impunha-se a observância do princípio do pedido. – cfr. art. 615º/1 – al. e) CPC;

iiii). Não tendo formulado tal pedido, por muito que assim não veja o Tribunal da Relação recorrido, os juros moratórios legais a aplicar são os previstos no art. 559º/1 do Código Civil e na portaria nº 291/2003, de 8.4., que são de 4%. – cfr. assim, neste sentido, Ac. TRLisboa, de 28/4/2015, proferido nos autos do proc. nº 145/11.1TCFUNL1 – 1ª Secção;

jjjj). O acórdão recorrido é, tal qual a sentença da 1ª instância, [nulo] nesta parte (cfr. art. 615º/1 e) do CPC), como infringe o princípio do pedido e o disposto nos arts. 559/1 do CC, portaria 291/2003 e, ainda, o disposto no art. 103º/§º3 do Código Comercial;

kkkk). Em consequência, deve a nulidade ser declarada e revogada o acórdão recorrido, com as legais consequências.»

Contra-alegou a Recorrida, defendendo a manutenção do acórdão da Relação.

5. Vistos os autos, cumpre decidir.


II


6. As questões – três questões – a decidir no presente recurso, enquanto revista excecional, e consideradas as transcritas conclusões da alegação da Recorrente (CPC, arts. 635º, nº 4 e 639º, nºs 1 e 2), foram já circunscritas pelo anterior acórdão que o admitiu (supra, 3).

7. Vem fixada pelas instâncias a seguinte matéria de facto (transcreve-se do acórdão recorrido, que procedeu á sua ordenação):

1. A autora exerce a actividade de indústria de construção civil e obras públicas (alínea A)).

2. A ré exerce a actividade imobiliária, compreendendo a construção para venda de imóveis (por acordo).

3. Por contrato escrito de 24-11-2005, a autora e a ré, nas qualidades de empreiteira e dona da obra, respectivamente, celebraram um contrato de empreitada para a construção e acabamentos de um edifício de habitação colectiva, a edificar sobre um prédio urbano, composto por um terreno destinado à construção urbana, com a área de 5 667 m2, localizado no sítio da ..., inscrito na respectiva matriz sob o artigo 6 028° e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n° 3515, conforme documento que consta de fls. 9 verso a 17 p.p. e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais (alínea C)).

4. De acordo com o vertido no contrato referido em 3. as partes acordaram no seguinte:

a) o preço seria no montante de € 4 706 073,05, acrescido do IVA, à taxa em vigor no momento do pagamento, sendo a empreitada tipo "chave na mão";

b) o preço seria pago pela ré à autora, em função dos trabalhos realizados e de acordo com cronograma financeiro, referido na cláusula terceira do referido contrato;

c)  o prazo de pagamento das facturas seria de 30 dias a contar da data da sua emissão;

d) os trabalhos teriam início no dia 3 de Janeiro de 2006 e seriam concluídos no prazo de 18 meses, a contar dessa data;

e) no caso de suspensão dos trabalhos, não decorrentes da própria natureza destes, nem imputável à empreiteira, considerar-se-ia automaticamente prorrogado, por período igual ao da suspensão, o prazo de execução da obra;

f) a dona da obra poderia exigir que fossem realizadas alterações ao plano convencionado, ao projecto de execução da empreitada e aos trabalhos e materiais empregues, desde que o valor não excedesse 1/4 do preço estipulado e não houvesse modificação da natureza da obra. Neste caso a empreiteira teria direito a um aumento do preço estipulado, correspondente ao acréscimo de despesa e trabalho, a um prolongamento do prazo para execução da obra, o qual seria calculado pelo critério da proporcionalidade do tempo fixado em função da natureza dos trabalhos;

g) Se os trabalhos não se concluíssem dentro do prazo fixado na cláusula oitava a empreiteira pagaria à dona da obra, uma multa diária, no montante de 0,05% do valor global da empreitada (alínea D)).

5. A multa contratual diária fixada é de € 2.353,04 (ponto 83.).

6. A execução dos trabalhos do empreendimento referido em 3. teve o seu início a partir do bloco A, ou seja de Sul para Norte (ponto 50.).

7. Foram efectuadas, pela ré, alterações no bloco D, passando de 9 TI para 3 T3 e os correspondentes desenhos foram entregues à autora em 28-06-2006 (alínea J)).

8. Uma alteração de tipologia (de TI para T3) só começa a afectar o rendimento ou ritmo de execução da obra após o início das alvenarias (divisórias/blocos) caso não haja alteração da localização das cozinhas, casas de banho, nem das coretes na estrutura do bloco (ponto 64.).

9. Uma alteração de tipologia como a referida em 8. determina a realização de menos três casas de banho, menos seis cozinhas e menos seis salas (ponto 66.).

10. Por decisão do dono da obra e da sua fiscalização foi solicitada, na reunião de obra de 31-03-2006, uma alteração nas lajes para as reforçar com bandas maciças, tendo nessa data sido apresentado desenho pelo projectista (pontos 11. e 52. da base instrutória).

11. A 21-04-2006, 28-04-2006 e 5-05-2006, a autora evidenciava a execução de betonagens em lajes, conforme actas n.ºs 9 a 11 (ponto 92.).

12. Na reunião de 12-05-2006, o projectista da estrutura apresentou o desenho da laje maciça para substituição da laje aligeirada (ponto 12.).

13. Na reunião de obra de 9-06-2006 o empreiteiro, a ora autora, apresentou a sugestão para a escada de emergência e na reunião de 16-06-2006 a fiscalização solicitou ao empreiteiro a proposta de preço para a execução das referidas escadas (pontos 13. e 53. da base instrutória).

14. Na reunião de obra de 21-06-2006 o empreiteiro entregou os desenhos e as propostas de preços sobre as escadas de emergência (pontos 14. e 54. da base instrutória).

15. Em 27-07-2006 foram entregues ao empreiteiro, pela fiscalização, uma solução alternativa com os elementos desenhados com a introdução das escadas de emergência e no dia 6-09-2006 a autora apresentou a proposta de preço para a sua execução, que foi aprovada pelo dono da obra, no valor de € 18 931,20 (pontos 15.,55. e 56. da base instrutória).

16. Em 28-06-2006, a autora apresentou, a pedido da fiscalização e do dono da obra, a definição da rede de águas pluviais dos logradouros dos apartamentos virados a Norte e a Nascente, o que não estava definido no projecto inicial que lhe foi entregue, e em 11-10-2006 e 18-10- 006 a ré solicitou rectificação da proposta de preço da rede de drenagem e águas pluviais (pontos 16.,59. e 60. da base instrutória).

17. Na acta da reunião de 6-09-2006 ficou consignado que devido à incompatibilidade entre o projecto de estrutura e de arquitectura, foi necessário o projectista apresentar um pormenor de betão armado para a ligação das armaduras na laje do bloco C, à cota 370,93 (pontos 17. e 67. da base instrutória).

18. A alteração da laje referida em 12. não afecta a execução dos demais trabalhos, designadamente, de alvenarias (ponto 69.).

19. Para a execução de tal laje será razoável um prazo de três dias (ponto 70.).

20. As falhas de segurança determinaram advertências formais à autora (ponto 77.).

21. Em 20-09-2006 a ré comunicou à autora que nos apartamentos da fracção V, X e Z do Bloco D, o quarto com a designação de 2, as cabeceiras das camas foram alteradas, virando-as para Nordeste, com necessidade de alterar as infra-estruturas nesse quarto, o que implicaria um período de cerca de duas semanas de trabalho (ponto 19.).

22. Em 11-10-2006, a fiscalização da obra solicitou a rectificação da proposta de preços para a execução do projecto de águas pluviais dos logradouros (alínea I)).

23. Na reunião de obra de 25-10-2006 a autora informou a fiscalização que o dono da obra solicitou alterações no apartamento modelo atinentes à colocação do espelho nas casas de banho, substituição do pavimento da cozinha, roda-tectos, assentamento de rodapé, frente de roupeiro (ponto 20.).

24. Foi aceite pelo dono da obra que a entrega do apartamento modelo ocorresse até finais do mês de Julho de 2006 e em 25-10-2006 o empreiteiro deu conta que ocorreram atrasos na sua conclusão face a pedido de alterações por parte da ré (ponto 93.).

25. Na reunião de obra de 10-01-2007, a fiscalização pediu à autora a entrega das propostas de preços para os granitos a colocar nas entradas dos edifícios e acessos aos elevadores (ponto 20.).

26. Na acta da reunião de obra de 7-02-2007 as partes consignaram que a execução das arrecadações nos Blocos G, H e I está suspensa (ponto 26.).

27. Na reunião de obra de 14-02-2007, foram entregues pelo dono da obra ao empreiteiro as plantas finais das arrecadações (ponto 27.).

28. Na reunião de obra de 2-05-2007, consignou-se que os granitos a colocar nas entradas dos blocos de apartamentos foram adjudicados pelo dono da obra no dia 26-04-2007, não tendo ainda o empreiteiro feito a encomenda do material (ponto 24.).

29. Na reunião de obra de 27-06-2007 o projectista de arquitectura entregou desenho com a implantação da arrecadação a executar na garagem do bloco C (ponto 28.).

30. Na reunião de obra de 1-06-2007 foram acordadas entre o projectista, o dono da obra e o empreiteiro as referências das tintas a utilizar nas pinturas exteriores, ficando ainda por decidir qual a referência das tintas a aplicar nas garagens (ponto 30.).

31. Nas reuniões de obra de 1-08-2007 e 8-08-2007, a autora questionou a ré sobre a referência da tinta que deverá ser aplicada nas entradas dos blocos, entre o lambrim e o rodapé e nas fachadas exteriores ao nível das entradas dos apartamentos (ponto 31).

32. Eram necessários 15 dias para a execução destas pinturas (ponto 32.).

33. Na reunião de obra de 8-06-2007 ficou decidido pela ré quais os materiais a aplicar no exterior das entradas dos blocos e nas casas do lixo (ponto 33.).

34. Na acta da reunião de obra de 15-06-2007 ficou consignado que no dia 12-06-2007 foram acordadas, entre o dono da obra, empreiteiro e o representante da Câmara Municipal de ... as concordâncias a executar entre o acesso Norte e o Impasse da Olaria (ponto 34.).

35. Na reunião de obra de 27-06-2007 a fiscalização entregou ao projectista da arquitectura desenho de pormenor com a implantação do tanque do gás (ponto 35.).

36. Ainda na reunião de 27-06-2007 o projectista da arquitectura entregou ao empreiteiro os seguintes elementos técnicos: desenho dos arranjos exteriores junto ao Bloco I; desenho de implantação do Posto de Transformação (ponto 36.).

37. Na reunião de obra de 11-07-2007 foi entregue pelo projectista da estrutura o desenho com a definição da estrutura do Posto de Transformação (ponto 38.).

38. Na reunião de obra de 8-08-2007 a ré aprovou as armaduras de iluminação a colocar nas áreas comuns interiores dos blocos dos apartamentos (ponto 39.).

39. A ré executou, pelo menos, os trabalhos a mais não previstos em projecto, discriminados nas facturas (já pagas) A 365, de 13-03-2006, no montante de € 3 864,05 (sem IVA), A 426, de 30-09-2006, no montante de € 740,00, A 427 de 30-11-2006, no montante de € 1 681,99, A 428, de 30-11-2006, no montante de € 14373,68 e o correspondente ao valor de € 107.210,80 quanto à factura n.º A 536, de 09-08-2007 (pontos 41. e 78. da base instrutória).

40. Na data de 12-12-2007 foi lavrado e assinado entre a autora e a ré o auto de vistoria e recepção provisória da empreitada "..." que consta de fls. 164 a 177 dos autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, onde consta, designadamente, no seu ponto 1.2. que "Na presente data o empreiteiro entrega ao Dono, tendo a Fiscalização efectuado diversas vistorias, sendo assinaladas diversas irregularidades, conforme se pode constatar em anexo", constando desse anexo um elenco de não conformidades existentes na obra (alínea E)).

41. A obra referida em 3. foi entregue à ré conforme auto de recepção provisória referido em 33., em 12-12-2007 (ponto 1. da base instrutória).

42. As não conformidades referidas em 40. foram comunicadas à autora na data de 12-12-2007, que delas tomou conhecimento e, bem assim, da necessidade da sua reparação/eliminação (alínea F)).

43. De entre os defeitos de obra especificados no anexo ao auto de recepção provisória referido em 40. e constantes de fls. 167 a 177 p.p. a autora não reparou os seguintes:

Aspectos Gerais - falta de detectores de incêndio na casa do lixo do Bloco F e na sala do condomínio; conclusão da parede e pintura da sala de condomínio; pintura global dos muros exteriores;

Fracções - correcção de soalho dilatado na sala da fracção B do Bloco A; soalho com mancha na suite da fracção I do Bloco B; fissuras, lâmpada da varanda com água da laje da varanda de cima, fecho das caixilharias com deficiências, soleira da sala partida, humidade do tecto e parede, sem isolamento acústico, autoclismo a verter na fracção S do Bloco C; soalho dilatado na sala da fracção V do Bloco D e da fracção AA do Bloco E; soalho da sala com ressalto nas transições com a entrada e com a cozinha da fracção AC do Bloco; moldura do espelho da WC da suite partida e soalho dilatado na sala da fracção AG do Bloco E; soalho dilatado na sala, mosaicos ocos na cozinha e fissuras na fracção AR do Bloco E; soalho dilatado na sala da fracção AI do Bloco F; soalho dilatado na sala da fracção AM do Bloco F; soalho com mancha na suite, soalho dilatado na sala da fracção AO do Bloco F; soalho dilatado na sala da fracção AP do Bloco F; afinar móveis de cozinha, correcção de alinhamento do móvel da garrafeira com a parede, soalho dilatado na sala da fracção AQ do Bloco F; soalho dilatado na sala e deslocação de carretel de segurança contra incêndio da área do lugar de estacionamento n.º 56 da fracção AR do Bloco F; correcção de alinhamento do roupeiro da suite com a parede na fracção AT do Bloco G; mosaico oco na cozinha e correcção de alinhamento da moldura do espelho/azulejos no WC comum na fracção BR do Bloco I;

Garagens - pavimentos das garagens com depressões impedindo o escoamento das águas; pintura de arranjo de fissura na parede do estacionamento n.º 37;

Entradas e Caixas de Escadas - colocação de silicone na junta entre o vão de alumínio e a parede na caixa de escadas de cada bloco; colocação de protecções nos vértices salientes das caixas de escadas; humidade da parede da caixa de escadas entre os pisos O e -1 do Bloco B; vidro com defeito no patamar intermédio entre os pisos 3 e 4 do Bloco F; limpeza de mosaicos na transição entre a antecâmara de acesso à garagem e o patamar de entrada no Bloco G; betumar transição entre os mosaicos da entrada do bloco e da caixa de escadas no Bloco I, selar negativos existentes no tecto do patamar de escadas do piso -2 e alinhar armadura/pictograma da fracção "BI" do Bloco I;

Rede eléctrica das fracções - todos os exaustores sem ligação terra;

Rede eléctrica das áreas comuns - não funcionamento dos videoporteiros de todo o bloco I

Rede de drenagem e Esgotos - tampa do separador de óleos da garagem F partida (pontos 43. e 87. da base instrutória).

44. A autora emitiu, entre outras, as seguintes facturas, que, ainda se encontram em dívida: Factura n° A 544, de 31/08/2007, no montante de € 251 180,57, sendo que a ré pagou, a quantia parcial de € 145 902,39; Factura n° B 298, de 24/10/2007, no montante de € 68 328,03; Factura n° B 317, de 21/12/2007, no montante de € 128 127,20; Factura n° 2787, de 16/03/2011, no montante de € 113 334,70 (ponto 3. da base instrutória).

45. A ré aceitou diversas letras que foram descontadas em instituições financeiras (ponto 5. Da base instrutória).

46. A autora debitou à ré as notas de débito n.º 302, com data de 8-01-2010, no valor de € 700,00; 304, com data de 21-01-2010, no valor de € 735,00; 307, com data de 28-01-2010, no valor de € 300,00; 308, com data de 28-01-2010, no valor de € 3308,02; 311, com data de 19-02-2010, no valor de € 1 147,78; 313, com data de 26-02-2010, no valor de € 5099,10; 314, com data de 27-02-2010, no valor de € 535,00; 324, com data de 29-03-2010, no valor de € 1 653,45; 325, com data de 30-03-2010, no valor de € 520,00; 332, com data de 5-04-2010, no valor de € 650,00; 335, com data de 28-04-2010, no valor de € 2989,18; 336, com data de 28-04-2010, no valor de € 2375,86; 344, com data de 30-04-2010, no valor de € 297,39; 348, com data de 28-05-2010, no valor de € 435,00; 356, com data de 22-06-2010, no valor de € 1 619,26; 357, com data de 4-07-2010, no valor de € 600,00; 365, com data de 2-08-2010, no valor de € 2 753,01; 371, com data de 27-08-2010, no valor de € 410,00; 378, com data de 17-09-2010, no valor de € 1 532,63; 385, com data de 2-10-2010, no valor de € 200,00; 388, com data de 27- 10-2010, no valor de € 426,96; 395, com data de 16-11-2010, no valor de € 190,00; e 402, com data de 30-11-2010, no valor de € 894,10, tendo a ré pago a quantia de € 236,69 (ponto 6. da base instrutória).

47. Com data de 5 de Janeiro de 2010, a ré dirigiu à autora uma mensagem electrónica mediante a qual apresentava proposta para venda de um projecto com 20 apartamentos no ..., com projecto de arquitectura e projecto de imagem e plantas comerciais em 3D, situado na Rua ... pelo preço de € 360 000,00, admitindo vender por € 320 000,00, sendo o pagamento efectuado por dedução no crédito da autora sobre a empresa BB - Promoções Imobiliárias, S. A. (ponto 9. da base instrutória).

48. Com datas de 17-06-2010, 13-07-2010, 17-08-2010 e 25-08-2010 e por referência à empreitada "...", a BB, S. A. comunicou à autora o modo como previa pagar diversas quantias com valores de € 200 000,00, € 80 000,00 e € 210 000,00, tendo a autora dirigido à ré uma mensagem electrónica, com data de 6-10-2010, dando conta que estava terminado o plano de pagamento por esta definido e que os valores não estavam integralmente pagos, apresentando a «conta-corrente» um saldo de € 330 357,40 e que o valor da dívida ascendia a € 452 357,40, solicitando a apresentação de um novo plano de pagamentos (ponto 10. da base instrutória).

49. Com data de 6-10-2010 a autora dirigiu à ré uma mensagem electrónica em que consignou que o saldo devedor desta era no valor de € 452 357,40 (quatrocentos e cinquenta e dois mil, trezentos e cinquenta e sete euros e quarenta cêntimos) (ponto 47.).

50. Em 30-11-2010 a autora recebeu uma notificação judicial avulsa solicitada pela ré mediante a qual esta lhe dá conta que a autora se tinha atrasado na entrega da obra e, como tal, tinha a pagar à ré a quantia de € 345 896,29, e comunica uma compensação nos créditos (alínea G)).

51. A autora respondeu à notificação, dizendo que o atraso na entrega da obra, estava devidamente justificado e como tal a ré não tinha nenhum crédito exigível judicialmente, para que pudesse haver "compensação" (alínea H)).

52. Até 16-03-2011 a autora tinha emitido apenas as facturas nºs A 544, B 298 e B 317 referidas em 12. (ponto 45.).

53. Por carta com data de 16 de Março de 2011 a autora enviou à ré a sua factura n° 2797, no montante de € 113 334,70 com referência a trabalhos a mais executados na obra entre 3-1-2006 a 12-12-2007, cuja liquidação solicitou e nessa data exigiu juros moratórios no montante de € 155.095,60 (ponto 49.).»

8. Do direito.

8.1. Não cumprimento/caducidade do direito à eliminação dos defeitos [conclusões ll) a nnn) da alegação da Recorrente].

8.1.1. No quadro da presente ação, está em causa a aplicação do prazo de caducidade previsto no nº 3, com remissão para a última parte do nº 2, do art. 1225º do CC (prazo de um ano, subsequente à denúncia, dentro do qual terá de ser instaurada a ação destinada a exercitar o direito à eliminação dos defeitos ou à indemnização): tal prazo, como se observa no acórdão da Relação, tinha já decorrido, quando a ora Recorrente deduziu o pedido por via reconvencional.

A questão que importa decidir respeita a saber se, como pretende a Recorrente, se verificou o reconhecimento pela autora, a empreiteira, ora Recorrida, do direito à reparação, causa impeditiva da caducidade (art. 331º, n.º 2, do CC).

8.1.2. A Relação confirmou o julgamento da 1ª instância no sentido de que não se verificou o reconhecimento do direito por parte da autora, quanto aos defeitos discriminados no anexo ao auto de vistoria e receção provisória da obra, de 12 de Dezembro de 2007.

Aduziu a Relação, em vista a melhor convencimento judicial, que, mesmo hipoteticamente a querer dar-se por verificado o pretendido reconhecimento, sempre improcederia a exceção de não cumprimento do contrato, por violação do princípio do equilíbrio ou equivalência das prestações.

Sustenta a Recorrente que, em vista do teor do auto de receção provisória da obra conjugado com o disposto na cláusula 12ª do contrato de empreitada e da matéria dada por assente nos nºs. 42 e 43 (vêm referidos os nºs 5 e 6, anteriores à renumeração operada pelo acórdão da Relação), dever-se-á entender que a Recorrida, ao assinar o referido auto, «obrigou-se, de forma clara, necessária e lógica, a reparar os vícios e imperfeições da obra» discriminados em anexo ao mesmo auto.

8.1.3. Dispõe o art. 331º do CC, no nº 1, que «Só impede a caducidade a prática, dentro do prazo legal ou convencional, do ato a que a lei ou convenção atribua efeito impeditivo», ressalvando o nº 2 que «Quando, porém, se trate de prazo fixado por contrato ou disposição legal relativa a direito disponível, impede também a caducidade o reconhecimento do direito por parte daquele contra quem deva ser exercido».

Esse reconhecimento, com eficácia impeditiva da caducidade, tem de ser – conforme reiterado na jurisprudência deste tribunal – concreto, preciso, indiscutível, evidente, real e categórico, sem margem de vaguidade ou ambiguidade, de tal modo que torne o direito certo e faça as vezes da sentença, porque tem o mesmo efeito que a sentença pela qual o direito fosse reconhecido (entre outros, ASTJ de 20.5.2003, 19.1.2012, 7.2.2013, 6.4.2017, todos, bem com os adiante citados, disponíveis em www.dgsi.pt).

8.1.4. Entenderam as instâncias que, no caso, presentes os apontados requisitos que normativamente o deverão conformar, não se verificou o reconhecimento do direito, nos termos previstos no citado nº 2 do art. 331º do CC.

No que respeita ao auto de vistoria e receção provisória da obra, assinado por ambas as partes e pela fiscalização, consta do mesmo que a autora (empreiteira) considerou as tarefas relativas às desconformidades assinaladas como não exequíveis (sic).

Ponderado o estabelecido na cláusula 12ª, al. b), do contrato de empreitada, donde consta que, aquando da inspeção, a dona da obra comunicará à empreiteira, fazendo-se lavrar no respetivo auto de receção, que aceita provisoriamente a obra, «mas sob condições de serem reparados os vícios e imperfeiçoes já patentes», observou-se no acórdão da Relação que, não se tendo tal lavrado no auto e aí apenas exarado as desconformidades assinaladas pela fiscalização no anexo, a comunicação nesses termos à empreiteira «não traduz, de forma inequívoca, a assunção pela mesma da responsabilidade pela sua eliminação, sendo sintomático de tal a circunstância de no auto não se ter fixado qualquer prazo para a autora, enquanto empreiteira, proceder à reparação/eliminação dos defeitos».

Transcreveu-se no acórdão, com juízo final de concordância, o seguinte segmento da decisão da 1ª instância: «(…) quer da matéria apurada, quer do teor do auto de recepção provisória não se extrai qualquer dado que permita afirmar que a autora assumiu expressamente a responsabilidade pela verificação dos defeitos de modo a que se possa concluir de modo inequívoco que a autora aceitou assumir a sua reparação. Na ausência de qualquer outra prova que depusesse nesse sentido e face ao teor daquilo que foi feito consignar no auto de vistoria não é possível asseverar um reconhecimento dos defeitos por parte da autora com tal extensão e alcance».

8.1.5. O entendimento da Recorrente radica na apresentação de uma diferente interpretação dos factos, cujo julgamento realizado pela Relação, em resultado da apreciação da prova produzida, está ao abrigo de eventual censura por parte do Supremo (CPC, art. 674º, nº 3).

Em vista do apontado julgamento definitivo na matéria por parte da Relação (não estando em causa eventual violação dos critérios previstos nos arts. 236º a 238º do CC, nem vindo a questão nesse campo suscitada), não pode acolher-se o alcance normativo pretendido pela Recorrente, quanto ao alegado reconhecimento do direito por parte da autora.

8.1.6. A questão da eventual violação do princípio do equilíbrio ou equivalência das prestações, cautelarmente examinada no acórdão da Relação (supra, 8.1.2), mostra-se prejudicada.

8.2. Multa pelo atraso da obra [conclusões ooo) a ffff) da alegação da Recorrente].

8.2.1. Na cláusula 23ª do contrato de empreitada celebrado, ficou estabelecido que «Se os trabalhos não se concluírem dentro do prazo peremptoriamente fixado na cláusula oitava [18 meses a contar do dia 3 de Janeiro de 2006] a empreiteira pagará à dona da obra uma multa diária no montante de 0,05% do valor global da empreitada (…)» – multa essa fixada no montante de € 2.353,04 [nºs. 4, alínea g) e 5 da matéria assente].

A ré-reconvinte veio comunicar à autora, através de notificação judicial avulsa, recebida em 30 de Novembro de 2010, que, por atraso na entrega da obra, lhe era devido o pagamento de € 345 896,29, a considerar para efeitos de compensação nos créditos, tendo esta respondido que o atraso na entrega da obra estava devidamente justificado, não detendo aquela crédito exigível judicialmente, para efeitos da pretendida compensação (matéria dada por assente nos nºs. 50 e 51, referidos pela Recorrente aos nºs 7 e 8, anteriores à renumeração operada pelo acórdão da Relação)

A situação vem do seguinte modo enquadrada na sentença (passo transcrito no acórdão da Relação):

«“(…) a ré alegou ainda pretender exercer o direito à compensação por entender que detém sobre a autora um crédito no valor de € 362 368,16 a título de multa contratual devida pelo atraso de 154 dias na execução da obra que deve ser imputado a responsabilidade da autora, sendo que o valor da multa diária era de € 2 353,04. Sabe-se que a obra deveria ser entregue até 3 de Julho de 2007 e apenas o foi em 12-12-2007. Contudo, resultou também demonstrado que a ré solicitou diversas alterações a serem introduzidas na obra já no decurso da sua execução que, naturalmente, terão exigido a concessão de prorrogação do prazo acordado em conformidade, aliás, com o estipulado na cláusula Vigésima Quinta do contrato de empreitada. Não foi possível determinar a quem se ficaram a dever os atrasos na execução da obra, sendo certo que foram apuradas circunstâncias em que a dona da obra teria de entregar os elementos necessários para a execução (nomeadamente, como se aferiu quanto às escadas de emergência) e outras em que a empreiteira se depara com dificuldades em concluir, designadamente, o apartamento-modelo, mas sem que se tenham aferido os factores que determinaram essas dificuldades. Como tal, não é possível atribuir à autora a responsabilidade por todo o período de atraso na data prevista para a entrega da obra.»

8.2.2. A não imputabilidade à autora, pelas razões acolhidas no acórdão da Relação, da responsabilidade por todo o período de atraso na entrega da obra tão só constituirá desenvolvimento marginal à questão, nesta parte, objeto do presente recurso.

A questão, cujo reexame vem suscitado pela Recorrente [conclusões ooo) a ffff), cits.], respeita à interpretação, confirmada pela Relação, relativamente ao contrato de empreitada celebrado, de que, subsidiariamente, «foi intenção das partes subordinar a matéria das penalizações ao procedimento específico previsto no D. L. n.º 59/99».

Tal interpretação é frontalmente impugnada pela Recorrente, referindo-a como infringindo «o princípio da autonomia privada das partes, previsto no art. 405º do CC», para tanto tendo por «manifesto que a sujeição ao regime público das empreitadas públicas da dita execução do contrato não foi nem desejada nem querida pelas partes, nem tão pouco plasmaram isso na sua autorregulação contratual» e [conclusões eeee) e xxx) da alegação].

As instâncias, para procederem à enunciada interpretação do clausulado contratual em causa, não se dirigiram à averiguação e reconstituição da vontade real das partes, mas, desconhecida essa vontade, cuidaram de seguir os critérios normativos previstos nos arts. 236º a 238º do CC. Conformada como questão de direito, cabe a este Tribunal dela conhecer (entre outros, ASTJ de 12.11.87, 20.6.90, 23.9.2008, 16.4.2009, 4.5.2010, 4.11.2010, 8.11.2012, 10.10.2013).

8.2.3. Como vem anotado no acórdão da Relação, no contrato de empreitada celebrado inexiste uma cláusula de receção genérica, a título subsidiário, do regime jurídico das empreitadas das obras públicas (contido no DL 59/99, de 2 de Março, vigente à data da celebração do contrato e revogado pelo DL 18/2008, de 29 de Janeiro, que aprovou o Código dos Contratos Públicos).

A convocação, subsidiária e por remissão, daquele regime restringe-se em matéria de previsão e aplicação de penalizações (cláusula penal constante da cláusula 23º do contrato, acima considerada).

Na interpretação do contrato de empreitada entre ambas as partes celebrado – interpretação obviamente situada no quadro da liberdade e autonomia contratuais que às partes assistem –, rege, conforme reiterado na jurisprudência deste tribunal antes citada, a teoria da impressão do destinatário (art. 236º do CC), de natureza objetivista, de acordo com a qual a declaração deverá valer com o sentido que um declaratário normal, medianamente instruído e diligente, colocado na posição do concreto declaratário, a entenderia; tratando-se, como é o caso, de negócios formais «não pode a declaração valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do respetivo documento, ainda que imperfeitamente expresso» (art. 238º, nº 1 do CC).

Importa, tal como procederam as instâncias, partir do teor do clausulado do contrato, também integrado pelos termos em que se veio a manifestar nos atos praticados pelas partes ao seu abrigo e visando dar-lhe execução, nuclearmente, na redação do auto de receção provisória da obra.

A referida cláusula 23ª é de todo omissa quanto ao procedimento e à efetivação da aplicação da multa aí prevista por atraso na conclusão da obra.

Nada igualmente, a esse respeito, se colhe nas demais 30 cláusulas do contrato (documento, a fls. 9,v./17).

A questão das penalizações é, contudo, expressamente retomada e precisada pelas partes, no nº 3 do auto de vistoria e receção provisória da obra, auto igualmente assinado pela fiscalização (documento que irá, justamente, fundamentar a imputação à empreiteira da multa em causa), nos seguintes termos: «Estão previstas e serão aplicáveis as penalizações previstas na legislação atualmente em vigor, à data da elaboração do presente documento».

A encimar o mesmo auto tinha-se consignado como «objetivo a realização da vistoria, segundo os artigos 217, 218 e 219 do Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março»; e, sob o nº 2.8, que «Findo o prazo da garantia e por iniciativa do dono da obra ou a pedido do empreiteiro, será efetuada a vistoria final de todos os trabalhos, conforme o artigo 227 do decreto-lei n.º 59/99» (previa-se no nº 3 deste artigo que «Serão aplicáveis à vistoria e ao auto de receção definitiva os preceitos correspondentes da receção provisória»).

Resulta, com clareza, dos termos consignados que as partes, para a receção provisória da obra, bem como para a ulterior receção definitiva, se quiseram matricialmente orientar pelo regime constante do DL 59/99; especificamente, quanto ao procedimento de aplicação das multas contratualmente previstas (penalizações) – perante a constatada omissão regulamentar no clausulado do contrato, em geral e na cláusula 23ª, em especial –, multas eventualmente emergentes desse mesmo auto, pretenderam integrá-lo e harmonizá-lo no quadro do regime legal à data vigente, através de remissão genérica, em primeira linha abarcando, atentas as anteriores referências expressa no auto, o DL 59/99.

A aplicação das multas, à luz do disposto nos arts. 201º, nº 5 e 233º, nº 3 daquele diploma legal, «será precedida de auto lavrado pela fiscalização, do qual o dono da obra enviará uma cópia ao empreiteiro, notificando-o para, no prazo de oito dias, deduzir a sua defesa ou impugnação» e «nenhuma sanção se considera definitivamente aplicada sem que o empreiteiro tenha conhecimento dos motivos da aplicação e ensejo de deduzir a sua defesa».

Não tendo a Recorrente, enquanto dona da obra, previamente à aplicação da multa, garantido a audiência e defesa do sancionado, não lhe assiste o direito, por via da presente ação, de obter a condenação da autora no respetivo pagamento, como decidido pelas instâncias.

Contrária interpretação, pretendida pela Recorrente, incorreria em odiosa restringenda.

8.3. Juros de mora/nulidade do acórdão [conclusões gggg) a kkkk) da alegação da Recorrente].

8.3.1. Sobre esta mesma questão, então reportada à sentença da 1ª instância, escreveu-se no acórdão da Relação:

«Na p. i. a autora peticionou a condenação da ré no pagamento à autora da quantia global de €599 298,76, acrescida de juros de mora legais desde 10/10/2011, sobre a quantia de €444.293,16, até efectivo e integral pagamento.

Não explicitou de forma expressa se se reportava aos juros de mora comerciais, se aos civis.

Todavia, no art. 14º da p.i. a autora aludiu ao facto de possuir um crédito sobre a ré relativo a juros de mora atinente a pagamentos parciais do preço, no valor global de €155.095,60, conforme doc. n.º 6 que juntou (fls. 64v a 66 dos autos).

Ora, flui desse documento que os juros moratórios considerados pela autora foram os juros comerciais.

Sendo assim, infere-se da p.i., no seu conjunto, que quando na mesma a autora alude a juros de mora se reporta aos juros comerciais. Seria ilógico interpretar a p.i. no sentido da autora ter peticionado o pagamento de juros de mora vencidos até 10/10/2011 à taxa dos juros comerciais, e no demais ter peticionado juros de mora à taxa dos juros civis.

Deste modo, o tribunal podia condenar a ré no pagamento dos juros de mora à taxa dos juros comerciais, não enfermando, por isso, a sentença da arguida nulidade, não se tendo condenado em quantidade superior ou em objecto diverso do que foi pedido.»

8.3.2. Concorda-se com a decisão: embora a autora não tenha com inteireza preenchido o pedido formulado a final, no que aos juros de mora respeita, tal preenchimento é alcançado nos termos da própria petição (no seu art. 14º), bem como de documento com a mesma junto.

Situação diversa da julgada em acórdão da mesma Relação (certidão junta pela Recorrente, a fls. 883/901), onde se não verifica a possibilidade de tal preenchimento.


III

Nos termos expostos, acorda-se em negar a revista, mantendo-se o acórdão recorrido.

Custas pela Recorrente.


Lisboa, 10 de Abril de 2018

J. Cabral Tavares (Relator)

Fátima Gomes

Garcia Calejo