Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
939/18.7T8STR.E1.S1
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO
Relator: MARIA DA GRAÇA TRIGO
Descritores: ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
DUPLA CONFORME
DECISÃO MAIS FAVORÁVEL
CRÉDITO ILÍQUIDO
RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA
Data do Acordão: 12/09/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: RECLAMAÇÃO INDEFERIDA
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO
Sumário :
No caso dos autos, na parte em que a decisão da Relação difere da decisão da 1.ª instância, tal decisão é mais favorável ao recorrente pelo que, de acordo com a orientação consolidada da jurisprudência do STJ, ocorre quanto a ela o obstáculo da dupla conforme previsto no n.º 3 do art. 671.º do CPC.
Decisão Texto Integral:

Acordam em Conferência no Supremo Tribunal de Justiça



I. O presente recurso de revista não foi admitido por despacho da relatora proferido em 28 de Outubro de 2021, no qual se exarou o seguinte:

«1. Em 6 de Outubro de 2021 foi proferido despacho da relatora nos seguintes termos:

«1. Fidelidade - Companhia de Seguros, S.A. instaurou a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra AA, pedindo a condenação do R. a pagar-lhe a quantia de € 51.738,56, acrescida de juros contados desde a citação.

Por sentença de 12 de Fevereiro de 2020 foi proferida a seguinte decisão:

«Termos em que julgo a acção parcialmente procedente por parcialmente provada e, em consequência, condeno o R., AA a pagar à A., Fidelidade - Companhia de Seguros, S.A., a quantia de € 25.869,28, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4%, desde 03.04.2018, até efectivo e integral pagamento.

Custas por A. e R., na proporção do decaimento»

Tendo o R. interposto recurso para o Tribunal da Relação ...., veio a ser proferido acórdão, em 15 de Abril de 2021, com a seguinte decisão:

«Pelo acima exposto, decide-se revogar parcialmente a Sentença recorrida e, consequentemente:

A) Condena-se o Réu a pagar à Autora a quantia de €4.091,00 (quatro mil e noventa e um Euros), correspondente a 50% do valor despendido pela Autora a título de indemnização por perda total do TB (€5.682,00), por indemnização por dano biológico (€1.000,00) e por dano moral (€1.500,00) de BB, a que acresce o montante relativos a juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação e até integral pagamento;

b) Condena-se ainda o Réu a pagar à Autora a quantia a apurar em liquidação, correspondente a 50% das despesas pagas com a assistência clínica de BB -pagamentos hospitalares e outros relacionados com a sua reabilitação -, como também com as despesas que este sinistrado teve de suportar pelo tempo decorrido até à sua recuperação.

Custas por Apelante e Apelada, na proporção de 9/10 por aquele e de 1/10 por esta».


2. Confrontando uma e outra decisão, verifica-se que:

- A 1.ª instância condenou o R. a pagar à A. a quantia líquida de «€ 25.869,28, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4%, desde 03.04.2018, até efectivo e integral pagamento»;

- Enquanto a Relação manteve a condenação do R. apenas com a alteração de remeter para liquidação o cálculo de parte da quantia a pagar à A.. Em qualquer caso, e como é evidente, o valor final da condenação (composto pela parte já líquida e pela parte a liquidar) não poderá ultrapassar o valor da condenação da 1.ª instância (€ 25.869,28).

Temos assim que, em termos de valor da condenação, a decisão da Relação não difere da decisão da 1.ª instância, verificando-se dupla conforme obstativa da admissibilidade do recurso de revista (cfr. art. 671.º, n.º 3, do CPC). Naquilo em que difere (condenação parcialmente ilíquida), a diferença resulta da decisão de procedência parcial da apelação do R., faltando, pois, o interesse deste em recorrer dessa parte (cfr. art. 631.º, n.º 3, do CPC).

3. Ao abrigo do art. 655.º do CPC, notifique as partes para, querendo, se pronunciarem, no prazo de dez dias, sobre a possibilidade de não conhecimento do recurso pelas razões supra enunciadas.»

2. Veio o Recorrente pronunciar-se da seguinte forma:

«1. Nos termos do disposto no art.º do Código do Processo Civil, existe dupla conforme quando a Relação confirma, sem voto de vencido e com base em fundamentação substancialmente idêntica a decisão da 1ª instância.

2. A dupla conformidade exige, assim, que a questão crucial para o resultado declarado tenha sido objeto de duas decisões “conformes”.

3. Ora, com todo o respeito e salvo melhor opinião, tal não ocorre no presente caso.

4. Desde logo, o Douto Acórdão do Tribunal da Relação não confirmou a sentença proferida pelo Tribunal de primeira instância.

5. Como bem resulta do dispositivo do Acórdão sindicado, decidiu o mesmo “revogar parcialmente a sentença recorrida.”, sublinhado nosso.

6. Por outro lado, a referida sentença condenou o R. a pagar à A. (…) a quantia de 25.869,28€, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% desde 03/04/2018 até efetivo e integral pagamento.

7. E já o Acórdão da Relação, decidiu: “condenar-se o Réu a pagar à Autora a quantia de 4.091,00€ correspondente a 50% do valor despendido pela A. a título de indemnização pela perda total do veículo TB (5.682,00€), por indemnização por dano biológico (1.000,00€) e por dano moral 1.500,00€ de BB, a que acresce o valor relativo a juros de mora à taxa legal contados desde a data da citação até integral pagamento. Condena-se ainda o Réu a pagar à Autora a quantia a apurar em liquidação de sentença correspondente a 50% das despesas pagas com a assistência clínica de BB – pagamentos hospitalares e outros relacionados com a sua reabilitação – como também das despesas que este sinistrado teve de suportar pelo tempo decorrido até à sua recuperação.”

8. Pelo que é manifesto que as duas decisões não conduziram a um mesmo resultado.

Mas mais….

9. Tão pouco resulta do Acórdão recorrido o teto máximo de 25.869,28€ para a liquidação a operar em liquidação de sentença, só podendo o mesmo ter-se fixado pelo facto da aqui Recorrida não ter interposto recurso da sentença proferida pela primeira instância, circunstância essa alheia ao conhecimento do recurso sub judice.

10. Tendo o Acórdão da Relação decidido, ao contrário do sufragado pela primeira instância, que a Seguradora não fez prova dos danos resultantes do acidente e do seu quantum, não pode, pois, considerar-se que há coincidência entre as duas decisões oferecidas ao presente julgado.

11. A questão da não liquidez da obrigação e admissibilidade da sua remessa para execução de sentença pugnada pelo Acórdão Recorrido e objeto da Revista interposta, são questões novas sobre as quais não se verificou duplo grau de jurisdição, impondo-se a sua efetivação com a admissibilidade do Recurso ora interposto.»

A Recorrida não respondeu.

3. Nada na argumentação do Recorrente altera a apreciação feita no despacho da relatora ao confrontar as decisões das instâncias, esclarecendo-se que a dupla conforme se forma em função das decisões e não – como parece entender o Recorrente – em função das questões apreciadas.

Constata-se que:

- A 1.ª instância condenou o R. a pagar à A. a quantia líquida de «€ 25.869,28, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4%, desde 03.04.2018, até efectivo e integral pagamento»;

- O Tribunal da Relação manteve a condenação do R. apenas com a alteração de remeter para liquidação o cálculo de parte da quantia a pagar à A.;

- Não tendo a A. apelado – o que, diversamente do invocado pelo Recorrente, não releva para efeito de descaracterizar a dupla conforme – o valor final da condenação, composto pela parte já líquida e pela parte a liquidar, não poderá ultrapassar o valor da condenação da 1.ª instância (€ 25.869,28).

Deste modo, conclui-se que, quantitativamente, a decisão da Relação não difere da decisão da 1.ª instância, verificando-se dupla conforme que, nos termos do n.º 3 do art. 671.º do CPC, impede a admissibilidade do recurso de revista.

A única diferença entre as decisões diz respeito à decisão de condenação parcialmente ilíquida a qual – reafirma-se – resultou da decisão de procedência parcial da apelação do R., aqui Recorrente, pelo que nesta parte, carece o mesmo de interesse deste em recorrer (cfr. art. 631.º, n.º 3, do CPC).


4. Pelo exposto, não se admite o recurso.


Custas pelo Recorrente.»


II. Da decisão de não admissão do recurso, vem o Recorrente impugnar para a Conferência ao abrigo do disposto no art. 652.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, invocando essencialmente o seguinte:

«6.º Nos termos do disposto no art.º do Código do Processo Civil, existe dupla conforme quando a Relação confirma, sem voto de vencido e com base em fundamentação substancialmente idêntica a decisão da 1ª instância.

7.º A dupla conformidade exige, assim, que a questão crucial para o resultado declarado tenha sido objeto de duas decisões “conformes”.

8.º Ora, com todo o respeito e salvo melhor opinião, tal não ocorre no presente caso.

9.º Desde logo, o Douto Acórdão do Tribunal da Relação não confirmou a sentença proferida pelo Tribunal de primeira instância.

10.º Como  bem resulta   do dispositivo do Acórdão sindicado, decidiu o mesmo “revogar parcialmente a sentença recorrida.”, sublinhado nosso.

11.º Por outro lado, a referida sentença condenou o R. a pagar à A. (...) a quantia de 25.869,28€, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% desde 03/04/2018 até efetivo e integral pagamento.

12.º E já o Acórdão da Relação, decidiu: “condenar-se o Réu a pagar à Autora a quantia de 4.091,00€ correspondente a 50% do valor despendido pela A. a título de indemnização pela perda total do veículo TB (5.682,00€), por indemnização por dano biológico (1.000,00€) e por dano moral 1.500,00€ de BB, a que acresce o valor relativo a juros de mora à taxa legal contados desde a data da citação até integral pagamento. Condena-se ainda o Réu a pagar à Autora a quantia a apurar em liquidação de sentença correspondente a 50% das despesas pagas com a assistência clínica de BB – pagamentos hospitalares e outros relacionados com a sua reabilitação – como também das despesas que este sinistrado teve de suportar pelo tempo decorrido até à sua recuperação.”

13.º Pelo que é manifesto que as duas decisões não conduziram a um mesmo resultado.

(...)

14.º Tão pouco resulta do Acórdão recorrido o teto máximo de 25.869,28€ para a liquidação a operar em liquidação de sentença, só podendo o mesmo ter-se fixado pelo facto da aqui Recorrida não ter interposto recurso da sentença proferida pela primeira instância, circunstância essa alheia ao conhecimento do recurso sub judice.

15.º Tendo o Acórdão da Relação decidido, ao contrário do sufragado pela primeira instância, que a Seguradora não fez prova dos danos resultantes do acidente e do seu quantum, não pode pois considerar-se que há coincidência entre as duas decisões oferecidas ao presente julgado.

16º A questão da não liquidez da obrigação e admissibilidade da sua remessa para execução de sentença pugnada pelo Acórdão Recorrido e objeto da Revista interposta, são questões novas sobre as quais não se verificou duplo grau de jurisdição, impondo-se a sua efetivação com a admissibilidade do Recurso ora interposto.

17.º Com todo o respeito e salva melhor opinião, carece de razão a decisão ora sindicada quando refere “…, esclarecendo-se que a dupla conforme         se forma em função das decisões e não – como        parece entender o Recorrente – em função das questões apreciadas.

18.º Este não é efetivamente o entendimento perfilhado e preconizado por este Venerando Tribunal.

19.º Veja-se a este propósito o Sumário do Douto Acórdão do STJ de 28/01/2016, disponível em (...) de            onde resulta inequívoco que “Existe dupla conforme quando a Relação confirma, sem voto de vencido e com base em fundamentação substancialmente idêntica a decisão da 1ª instância.

II – A dupla conformidade exige, assim, que a questão crucial para o resultado declarado tenha sido objeto de duas decisões “conformes”.

(…)

20.º No caso em apreço a suscetibilidade de liquidação dos alegados danos em execução de sentença constitui questão nova, introduzida pelo Tribunal da Relação, com a qual a Recorrente não se conforma, e que pela sua “novidade” não gozou de apreciação por dois graus de jurisdição.

21.º Pelo que se impõe a admissibilidade do presente Recurso, o que se requer.».

A Recorrida não apresentou resposta à impugnação.

Cumpre decidir.


III. Invoca o Recorrente, ora reclamante, os seguintes argumentos no sentido da não verificação de dupla conforme entre as decisões das instâncias:

- A dupla conforme implica que a decisão da Relação seja inteiramente coincidente com a decisão da 1.ª instância;

- A dupla conforme forma-se em função do conhecimento de questões recursórias pelo que a apreciação de uma nova questão pela Relação implica necessariamente a descaracterização da dupla conforme.

Consideremos cada um destes argumentos.

Quanto ao primeiro – a dupla conforme implica uma coincidência absoluta entre as decisões das instâncias – socorremo-nos das autorizadas palavras de Lopes do Rego acerca do conceito de dupla conforme (em A dupla conforme – Cadernos do STJ – Secções Cíveis, 2021, págs. 19-20):

«No seu sentido natural ou normal, a dupla conformidade significará fundamentalmente que quatro juízes – o de 1ª instância, na sentença proferida, – e os três desembargadores que apreciaram a apelação, por unanimidade (isto é, sem voto de vencido) – dirimiram o litígio nos mesmos termos, segundo entendimento jurídico coincidente no que se refere ao segmento decisório que integra a sentença e o acórdão proferidos; era, aliás, esta unanimidade decisória que, no sistema instituído em 2007, legitimava a restrição substancial no livre acesso ao STJ, por tal coincidência decisória poder razoavelmente fazer presumir o acerto da decisão tomada, permitindo dispensar ou desconsiderar inclusivamente a identidade das respetivas fundamentações.

Numa primeira fase, a jurisprudência da Formação orientou-se no sentido de a dupla conforme pressupor a coincidência ou sobreposição total das decisões, implicando qualquer quebra ou dissidência da unanimidade dos juízes o afastamento da dita presunção de acerto e tendencial incontrovertibilidade do decidido, de modo a permitir, sem mais, a interposição da revista normal.

Cedo se tornou, porém, evidente a imprestabilidade deste critério como mecanismo efetivo de filtragem no acesso ao Supremo, já que qualquer mutação, alteração, reforço ou aditamento ao teor decisório da sentença, em comparação com a decisão contida no acórdão da Relação, afastava o obstáculo da dupla conforme.

Tem-se crescentemente sedimentado na jurisprudência do STJ o entendimento – que neste momento é predominante – segundo o qual não pode recorrer para o STJ em revista normal a parte que obteve na Relação – em ação caracterizada pela existência de um objeto processual uno ou incindível – uma decisão de conteúdo mais favorável que o alcançado na sentença apelada (...)».

Temos assim que, diversamente do alegado pelo Recorrente, a subsunção da situação dos autos ao conceito normativo de dupla conforme não pode ser feita de forma simplista e automática, antes se impõe, como se entendeu na decisão ora impugnada, que se atenda às especificidades do caso concreto.

Verifica-se que:

- A 1.ª instância condenou o R. a pagar à A. a quantia líquida de «€25.869,28, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4%, desde 03.04.2018, até efectivo e integral pagamento»;

- Apreciando o recurso de apelação do R., o Tribunal da Relação manteve a sua condenação, apenas com a alteração de remeter para liquidação o cálculo de parte da quantia a pagar à A.;

- Não tendo a A. apelado, o valor final da condenação, composto pela parte líquida e pela parte a liquidar, não poderá ultrapassar o valor da condenação da 1.ª instância (€25.869,28).

Deste modo, conclui-se que na parte em que a decisão da Relação difere da decisão da 1.ª instância, tal decisão é mais favorável ao R, ora Recorrente, pelo que ocorre quanto a ela o obstáculo da dupla conforme previsto no n.º 3 do art. 671.º do CPC.

Passemos a considerar o segundo argumento invocado pelo Recorrente: a dupla conforme forma-se em função do conhecimento de questões recursórias pelo que a apreciação de uma nova questão pela Relação implica, necessariamente, a descaracterização da dupla conforme.

Esta posição carece de razão. A dupla conforme forma-se em função das decisões e não das questões apreciadas, apenas podendo a apreciação de questão nova pela Relação relevar para descaracterizar a dupla conforme se, nos termos do art. 671.º, n.º 3 do CPC, dessa apreciação resultar uma fundamentação essencialmente diferente entre as decisões. Ver, neste sentido, o acórdão deste Supremo Tribunal de 14 de Janeiro de 2021 (proc. n.º 100/14.0TBSRP.E2.S1),[1] consultável em www.dgsi.pt:

«Cumpre esclarecer que, diversamente do que parece ser o entendimento da Recorrente, a dupla conforme se afere em função da decisão final e não em função de partes da fundamentação da decisão ou de questões por ela apreciadas. Assim sendo, considera-se inteiramente incorrecta e inadequada a metodologia adoptada pela Recorrente de confrontar passagem por passagem a fundamentação do acórdão recorrido, invocando que, sempre que aquela não coincida exactamente com a fundamentação da sentença, não se verificará a formação de dupla conforme.

A dupla conforme, repete-se, afere-se pela decisão final e, nos termos do n.º 3 do art. 671.º do Código de Processo Civil, apenas pode ser descaracterizada se existir voto de vencido ou fundamentação essencialmente diferente.

Ora, no caso dos autos, o acórdão recorrido julgou o recurso de apelação improcedente, confirmando, sem voto de vencido, a decisão da 1.ª instância. Deste modo, os argumentos invocados pela Recorrente apenas poderão relevar se se tiver verificado fundamentação essencialmente diferente.

De acordo com a jurisprudência consolidada deste Supremo Tribunal, e nas palavras do acórdão de 19.02.2015 (proc. n.º 302913/11.6YIPRT.E1.S1), disponível em www.dgsi.pt[1]:

- «Não é qualquer alteração, inovação ou modificação dos fundamentos jurídicos do acórdão recorrido, relativamente aos seguidos na sentença apelada, qualquer nuance na argumentação jurídica por ele assumida para manter a decisão já tomada em 1ª instância, que justifica a quebra do efeito inibitório quanto à recorribilidade, decorrente do preenchimento da figura da dupla conforme.

- Só pode considerar-se existente uma fundamentação essencialmente diferente quando a solução jurídica do pleito prevalecente na Relação tenha assentado, de modo radicalmente ou profundamente inovatório, em normas, interpretações normativas ou institutos jurídicos perfeitamente diversos e autónomos dos que haviam justificado e fundamentado a decisão proferida na sentença apelada – ou seja, quando tal acórdão se estribe decisivamente no inovatório apelo a um enquadramento  jurídico perfeitamente diverso e  radicalmente diferenciado daquele em que assentara a sentença proferida em 1ª instância.». [negrito nosso]

Não milita em sentido diverso do aqui propugnado o acórdão deste Supremo Tribunal referido pelo Recorrente (acórdão de 28.01.2016, proferido no proc. n.º 802/13.8TTVNF.P1.G1-A.S1, consultável em www.dgsi.pt). Com efeito, pela respectiva fundamentação verifica-se estar em causa situação inteiramente distinta da que ora nos ocupa; aí se considerou que, suscitada em sede de revista a questão do alegado desrespeito pelas regras que regulam os poderes da Relação na reapreciação da matéria de facto, se deve entender que a mesma questão não se encontra abrangida pela dupla conforme formada pelas decisões.  

Retornando ao caso dos autos, a única diferença entre as decisões diz respeito à decisão de condenação parcialmente ilíquida. Esta diferença – no que se refere ao aqui Recorrente – não descaracteriza a dupla conforme, tanto por não assentar em fundamentação essencialmente diferente, como porque resulta, precisamente, da parcial procedência da apelação do dito Recorrente. Na verdade, e como se afirma na decisão ora impugnada, na parte em que a condenação é ilíquida, carece ele de interesse em recorrer (art. 631.º, n.º 3, do CPC).


IV. Pelo exposto, indefere-se a impugnação, confirmando-se a decisão de não admissão do recurso.


Custas pelo Recorrente/reclamante.


Lisboa, 9 de Dezembro de 2021



Maria da Graça Trigo (relatora)

Maria Rosa Tching

Catarina Serra      

_____

[1] Do presente colectivo.