Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ00002090 | ||
Relator: | NEVES RIBEIRO | ||
Descritores: | PETIÇÃO INICIAL PEDIDOS INCOMPATÍVEIS REIVINDICAÇÃO CUMULAÇÃO DE PEDIDOS | ||
Nº do Documento: | SJ200211070030507 | ||
Data do Acordão: | 11/07/2002 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | T REL ÉVORA | ||
Processo no Tribunal Recurso: | 2557/01 | ||
Data: | 02/07/2002 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | AGRAVO. | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO. | ||
Área Temática: | DIR PROC CIV. | ||
Legislação Nacional: | CPC95 ARTIGO 31 ARTIGO 193 N2 C N3 ARTIGO 470. | ||
Sumário : | Não é substancialmente incompatível o pedido de reconhecimento da propriedade do condomínio sobre um logradouro comum do prédio com o pedido de reparação dos danos por violação desse direito. | ||
Decisão Texto Integral: | ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: 1. No extinto Tribunal de Circulo de Portimão, a administração do condomínio do prédio Edifício Torre Sol, sito em ........., contra "A", instaurou acção declarativa, na qual são formulados os seguintes pedidos: A - que a ré seja condenada a reconhecer que o condomínio é o proprietário do logradouro do prédio acima indicado, abstendo-se de actos violadores do direito de proprietário. B - que a ré seja condenada a pagar 10.850.000$00, quantia relativa ao valor do subsolo ocupado, e 700.000$00, a titulo de despesas; C- que a ré seja condenada a pagar uma indemnização a liquidar em execução de sentença pelo abuso e violação da propriedade do condomínio. 1.1. A pretensão da autora parte da circunstância de a ré haver construído garagens e parqueamento de viaturas no logradouro do prédio, com a área de 831 m2, que é parte comum do condomínio, utilizando para o efeito, parte da superfície do terreno e do subsolo. 2. A ré, no que agora importa, invocou a ineptidão da petição inicial, em virtude de os pedidos se mostrarem em oposição com a causa de pedir, serem incompatíveis entre si, e, o último, ininteligível. A sentença-saneador julgou inepta a petição inicial, absolvendo da instância, a ré A (Fls. 166). 3. A Relação de Évora revogou o assim decidido, considerando os pedidos substancialmente compatíveis e, por isso, idónea a petição apresentada (fls. 220). 4. Daí o presente agravo, agora proposto pela ré, que assim conclui: A) O Acórdão em apreciação fez incorrecta interpretação e aplicação da norma prevista no artigo 193°, do Código do Processo Civil. B) Os pedidos formulados pela autora estão em contradição com a causa de pedir (obra feita de má fé, em terreno alheio), sendo incompatíveis, entre si, e acontecendo que, o último [(indicado na alínea c), do n.º1, é ininteligível)]. C) A autora não pode cumular pedidos, como fez, e querer, ao mesmo tempo, ver reconhecido o seu direito de propriedade sobre a parcela do terreno em questão, manter-se como sua proprietária e deixar permanecer intocável a obra que pertence à ré e, ao mesmo tempo, exigir a importância correspondente à alienação da parcela do terreno (fls.227). 5. O artigo 193, n. 2, alínea c), do Código de Processo Civil, diz que a petição é inepta... «quando se cumulem causas de pedir ou pedidos substancialmente incompatíveis». Comecemos pela ininteligibilidade, recrutando uma observação preliminar: o réu não pode afirmar que não compreendeu o que pretende o autor, pois parece ter interpretado convenientemente a petição inicial - artigo 193º-3, indicado - como resulta de uma simples leitura do seu articulado ( fls. 36, em especial, artigos 17 a 74, sem prejuízo da reserva que acautelou no artigo 16). 6. Os pedidos dizem-se substancialmente incompatíveis quando os efeitos jurídicos que visam produzir, com a procedência da acção, cada um deles exclua a possibilidade de verificação de cada um dos outros. A compatibilidade dos pedidos (e das causas de pedir donde emergem) avalia-se pela conciliação dos efeitos que decorrem da procedência da acção. Segundo os autores mais seguidos, esta avaliação explica-se "para que o reconhecimento de um deles não exclua a possibilidade de verificação do outro". (1) Só existe cumulação substancial (a incompatibilidade processual deixou de ser relevante - artigos 31 e 470, do Código de Processo Civil), quando, no mesmo processo, é formulada uma pluralidade simultânea de pedidos, e não, para valerem numa relação de alternatividade ou subsidiariedade. Para valerem todos, todos tem que ser harmonizáveis entre si, emergentes ou não, da mesma causa de pedir. A conciliabilidade está nos efeitos - repita-se. 7. Exposto este sumário enquadramento, segue-se analisar que pedidos é que estão em causa na acção: Recuperemo-los, de novo: A autora/administradora do condomínio pediu: - que a ré seja condenada a reconhecer que o condomínio é o proprietário do logradouro comum ao prédio, abstendo-se de praticar actos que violem o direito de propriedade da autora sobre essa parte comum ao prédio. - que a ré seja condenada a pagar 10.850.000$00, quantia relativa ao valor do subsolo ocupado, e 700.000$00 a titulo de despesas; - que a ré seja condenada a pagar uma indemnização a liquidar em execução de sentença pelo abuso e violação da propriedade do condomínio. 8. Lembre-se, para melhor compreensão da realidade, que está em causa conhecer no agravo, que a pretensão da autora emerge da alegada circunstância de a ré haver construído garagens e feito parqueamento para viaturas, no logradouro do prédio, ocupando uma área de 831 m2, - área que é parte comum do condomínio- utilizando para tal finalidade, parte da superfície do terreno e do subsolo da autora. Ora bem. Os elementos expostos, quando confrontados com o enquadramento relativo à noção legal - aceite de forma pacífica pela doutrina e pela jurisprudência (2) - que se deixou enunciada anteriormente (n.º6), não deixam, a nosso ver, grande hesitação sobre a compatibilidade dos pedidos indicados, que radicam na mesma causa de pedir e são expressão da alegada violação do direito de propriedade, de que é titular o condomínio, enquanto conjunto de partes comuns do prédio (constituído em propriedade horizontal) e traduzido num direito colectivo, titulado em todos os condóminos do mesmo prédio, na forma indicada pelo artigo 1420 n. 1 e 2, do Código Civil. Se a acção proceder, os efeitos podem verificar-se, sem que a verificação de um ou algum, exclua a verificação de outro ou de outros. Ou seja: Se vier a reconhecer-se a alegada propriedade do condomínio, a procedência, total ou mesmo parcial do pedido, não é incompatível com a solicitada reparação dos danos, por violação do direito assim reconhecido, porventura afectado pela forma alegada na petição. É uma afirmação inquestionável que decorre da simples constatação do que nesta se pede, e se transcreveu, resumindo, no ponto 7. Termos em que, sem necessidade de maiores explanações, se confirma a decisão recorrida, negando-se provimento ao agravo. Custas pela ré/agravante. Lisboa, 7 de Novembro de 2002 Neves Ribeiro, Araújo de Barros, Oliveira Barros. ---------------------------- (1) Anselmo de Castro, Lições, I, 157; Castro Mendes, Direito do Processo Civil II, 264; Antunes Varela, R. L. J. Ano 120, 281; Teixeira de Sousa - As partes, o objecto e a prova na acção declarativa, páginas 145/146, edição LEX, Lisboa, 1995. (2) Alguma doutrina foi indicada na nota anterior. Quanto à jurisprudência do Supremo e das Relações é muito abundante e foi consultada a partir dos descritores "compatibilidade de pedidos" e "cumulação de pedidos", tendo o resultado da busca informática apontado sempre no sentido da noção de compatibilidade ou cumulação de pedidos, defendida no texto. |