Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
373/07.4TBVPA.P1.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: TAVARES DE PAIVA
Descritores: ÁGUAS
ÁGUAS PARTICULARES
DIREITO DE PROPRIEDADE
SERVIDÃO
SERVIDÃO DE PRESA
USUCAPIÃO
SINAIS VISÍVEIS E PERMANENTES
OBRAS
PRÉDIO
PRÉDIO CONFINANTE
Data do Acordão: 06/21/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática: DIREITO CIVIL - DIREITOS REAIS
Doutrina: - Antunes Varela in RLJ Ano 115º /222.
- Guilherme Moreira, in As Águas no Direito Civil Português, Livro I, pág.111, 501, II nº3.
- P. Lima e A. Varela, in Código Civil Anotado, anotação ao artigo 1390.º, vol. III pág. 276; anotação ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, 24/5/1940 in RLJ ano 73, pág. 300.
- Tavarela Lob , Manuel de Direito de Águas, vol. II pág.8.
Legislação Nacional: CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 1390.º, N.ºS1 A 2.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 31/05/2011 ACESSÍVEL IN WWW.DGSI.PT;
-DE 12/07/2011, ACESSÍVEL IN WWW.DGSI.PT.
Sumário :


I - De acordo com o n.º 1 do art. 1390.º do CC e seguindo a posição dos Prof. Pires de Lima e A. Varela supra exposta, o direito à água que nasce em prédio alheio, conforme o título da sua constituição, pode ser um direito ao uso pleno da água, sem qualquer limitação, e pode ser apenas o direito de a aproveitar noutro prédio, com as limitações inerentes, por conseguinte às necessidades deste. No 1.º caso (uso pleno da água), a figura constituída é a da propriedade da água; no segundo (direito de a aproveitar noutro prédio) é a de servidão.
II - No caso dos autos as águas provêm do prédio de terceiro em posição superior e segue ao longo da extrema poente em cerca de 15 metros flectindo depois para o interior do mesmo prédio ao longo de cerca de 6 metros, até desembocar na caixa de pedra situada nos prédios dos réus e a partir daí segue através de tubo enterrado no solo até á parede extrema Norte do prédio dos RR, sendo que esses obras têm aqui como função o armazenamento / captação e condução de águas.
III - E situando-se essas obras, visíveis e permanentes consubstanciadas na caixa de pedra e regos sulcados no solo (tubo enterrado no solo), não no prédio donde provêm as águas, mas noutro prédio inferior, que, aqui, é o dos réus, à luz do n.º 2 do art. 1390.º do CC não podem tais obras conduzir à usucapião com vista à aquisição do direito de propriedade sobre essa água.
IV - Essas obras situadas no prédio dos réus, inferior aquele donde provém as águas, poderão antes configurar um direito de presa e condução de águas, funcionando neste caso o prédio dos réus como prédio serviente, mas o reconhecimento desse direito não vem peticionado nesta acção.

Decisão Texto Integral:

 Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

 I-Relatório

AA e mulher BB; CC; DD e mulher EE;  FF e mulher, GG; HH; II; JJ intentaram, no Tribunal Judicial da comarca de Vila Pouca de Aguiar, acção declarativa de condenação com processo ordinário, contra KK e mulher, LL pedindo que se condenem os RR:

“ A reconhecer a cada um dos AA, respectivamente, o direito de propriedade de cada um dos prédios identificados nas als. a) a m) do art. 1º da petição inicial;

 A reconhecer aos AA e restantes consortes o direito de compropriedade das águas nascentes no prédio dos RR. identificado nos arts. 5º e 6º da petição inicial;

 A abster-se de praticar quaisquer actos que diminuam a posse e gozo dos direitos supra invocados, nomeadamente, abster-se de alterar o curso normal da referida água;

A indemnizar todos os prejuízos causados ou que venham a causar com os seus actos, os quais serão avaliados em execução de sentença.”

            Alegaram, em suma, após terem corrigido a petição, que são proprietários dos prédios rústicos que identificam, que adquiriram por usucapião e que há mais de 50 anos que os próprios e os antepossuidores dos prédios que lhes pertencem exploram as águas nascentes no prédio dos RR., tendo, para o efeito, escavado e construído no mesmo, em pedra, um poço de captação da referida água, rasgado no mesmo imóvel regos a céu aberto para sua condução e feito caminho apeado de acompanhamento dos mesmos regos, que partem do poço, seguem ao longo do prédio dos RR. até à denominada “p................”, onde é represada e a partir de tal poça, a agua é encaminhada até aos seus prédios por rego escavado a céu aberto e que essas obras foram feitas, mantidas e reparadas por si e antepossuidores até ao presente. Mais alegam que a exploração da água é feita, durante o Inverno como “água de lima”, e, do S..... S....... (Junho a Setembro), é repartida por todos os consortes de acordo com três giros de água, que especificam. Alegam ainda que o R., em Abril de 2006, escavou dois poços no seu prédio, colocou manilhas e drenou as águas do referido prédio para esses poços, conduzindo-as depois em tubos plásticos à extrema do seu prédio, privando-os totalmente do seu gozo e fruição e em consequência de tal actuação, irão sofrer prejuízos, posto que as culturas efectuadas nos seus prédios para consumo próprio e venda, são de regadio.

                                                         

            Os RR contestaram, alegando que os AA nunca praticaram qualquer acto de exploração ou captação de águas nascidas no prédio deles e o que denominam poço mais não é do que um buraco, com cerca de um metro de largura e outro tanto de profundidade, por si aberto há cerca de 17 anos, quando procedeu ao encanamento subterrâneo de águas que corriam e correm no seu prédio, vindas do exterior, e conduzidas por regos e essa é a única água que se infiltra no seu prédio, e que apenas conduziram do modo mencionado para poder cultiva-lo.

            Concluíram pela improcedência da acção.

                       Os AA replicaram, mantendo a posição assumida na petição inicial.

                                                            

            O processo prosseguiu os seus termos e realizada a audiência de discussão e julgamento respondeu-se à matéria da base instrutória por despacho de fls. 310 a 313. sem censura.

                                                               

            Foi, oportunamente, proferida sentença que julgou a acção procedente apenas quanto ao pedido de reconhecimento do direito de propriedade sobre os prédios dos AA, no mais julgou a acção improcedente.

                                                                 

            Os AA não se conformaram e interpuseram recurso de apelação para o Tribunal da Relação do Porto, que, através do Acórdão inserido a fls. 423 a 451, confirmou a sentença da 1ª instância.

            Os AA novamente inconformados interpuseram recurso de revista para este Tribunal.

            Nas suas alegações de recurso formulam as seguintes conclusões:

            I- Resultado provado:

que há mais de 30 anos existe no prédio dos Réus uma caixa em Pedra, com a profundidade de cerca de 1,00 metro em relação ao nível do solo, escavada e construída pelos antepossuidores dos prédios dos Autores

II- que a partir da referida caixa de pedra, existe um tubo, enterrado no solo, que conduz a água até à parede da extrema Norte do prédio dos Réus,

III- que nessa parede a água cai, por uma abertura para uma caixa em pedra denominada " P................"

IV- que antes da colocação do tubo enterrado no solo, a água era conduzida da "C..........."    para a "P................" por um rego a céu aberto, ambos rasgados pelos antepossuidores dos prédios dos Autores

V- que há mais de 30 anos que as águas que brotam do solo do prédio dos Réus, escorrem por efeito da gravidade, até à parede da extrema norte do prédio dos que dessa parede as mesmas águas escorrem para a P................

VII- que as águas que deitam para a P............... provenientes do prédio dos réus, ficam na mesma retidas

VIII- que há mais de 30 anos, a partir da poça da  enxovida, existem regos a céu aberto que conduzem a água nela retida para os prédios dos Autor

IX- que há mais de 30 anos que os Autores e seus antecessores vêm mantendo limpos e reparando os referidos regos e caixas

X- que há mais de 30 anos que os Autores e seus antecessores vêm aproveitando as águas conduzidas por tubo até à parede da extrema norte do prédio dos Réus e as que brotam do solo e escorrem do mesmo prédio até à aludida parede para irrigar os seus prédios

XI- Durante o Inverno como água de lima e do S. João ao S. Miguel, repartem-na entre si e outros consortes.

XII- O que fazem à vista e com o conhecimento de toda a gente, designadamente dos Réus, sem oposição de quem quer que seja e com o ânimo e agindo na convicção de serem donos dessa água, de que exercem um direito que a eles pertence e sem que prejudiquem direitos de terceiros

XIII- que os Réus em data não apurada realizaram pelo menos um furo no solo do seu prédio, que capta a água existente no mesmo, sendo tal água conduzida em tubo enterrado até à parede de pedra, situada na extrema Norte do mesmo prédio

XIV- que os Réus colocaram um tubo à face da parede, que encaixa no tubo enterrado que conduz a águas para local não apurado

XV- do que resulta que o caudal das águas que caíam para a pP................ passou a ser mais reduzido e insuficiente para irrigar as culturas que praticam nos seus prédios entre o S. João e o S. Miguel ( Junho a Setembro)

XVI- Nos termos dos nºs 1 e 2 do artigo 1390° do C. Civil

Considera-se justo titulo de aquisição da água das fontes e nascentes, conforme os casos, qualquer meio legítimo de adquirir a propriedade de coisas imóveis ou de constituir servidões.

A usucapião, porém, só é atendida quando for acompanhada da construção de obras, visíveis e permanentes, no prédio onde exista a fonte ou nascente, que revelem a captação e a posse da água nesse prédio; sobre o significado das obras é admitida qualquer espécie de prova.

XVII- As obras a que o preceito faz referência, só podem ser, para o fim tido em vista, as que são resultantes da intervenção humana, devem apresentar-se perceptíveis aos olhos de todos, e existirem e terem existido durante o prazo do direito usucapível

XVIII- Ora são precisamente estes elementos de visibilidade e permanência juntos que afastam a hipotética invocação de uma utilização tolerada

XIX- Aqueles elementos  reveladores do "animus aquisitivo" torna estável  uma situação material, cuja subsistência é verdadeiramente incompatível com o normal direito de plena e livre disposição. Guilherme Moreira - As água no direito Civil Português (1960) - II, pag. 401-402

XX- Foi polémica a questão levantada em torno da necessidade que o artigo 99° da Lei das águas impôs, a propósito das no prédio superior.

XXI- Para uns, a autoria das obras teria de ser atribuída ao dono do prédio inferior, aquele em beneficio de quem as águas eram aproveitadas.

XXII- v..        Para outros, aquela autoria era uma questão menor. Seria a natureza das obras, o tipo de construção com os mais diversos elementos adjacentes a esclarecer qual a verdadeira utilização e bem assim o fim com que foram edificadas.

XXIII- A lei em vigor contenta-se com a existência de obras no prédio superior.

"Obras que revelem a captação e posse", esta expressão veio substituir a fórmula do artigo 99° da Lei das águas," obras no prédio onde existir a fonte ou nascente, de onde se possa inferir o abandono do primitivo direito do dono do mesmo direito"

XXIV- È suficiente, pois, que as obras existam e revelem uma inequívoca captação e posse da água, matéria de prova a apreciar casuisticamente Guilherme Moreira obra supra citada Manuel Rodrigues, Fontes e Nascentes Pires de Lima , Direitos Reais José Cândido de Pinho, As águas no Código Civil -  comentário, doutrina e Jurisprudência (1985)

XXV- Face à matéria provada supra citada, não pode concluir que as obras efectuadas no prédio dos Réus, nomeadamente a C....., com a profundidade de cerca de 1,00 metros em relação ao nível do solo, escavada e construída pelos antepossuidores dos prédios dos Autores visava armazenar a água proveniente de prédio de terceiro superiormente situado

XXVI-  na verdade,  se os antecessores dos Autores construíram  uma poça,  a denominada "P................" a jusante do prédio dos Réus, para onde era encaminhada e retida   toda a água proveniente do prédio superior, para depois irrigar os prédios dos Autores, bem como de outros consortes,

XXVII- parece-nos de todo ilógico que tivessem escavado e construído, como fizeram uma outra poça, esta dentro do prédio dos réus, exatamente para o mesmo fim

XXVIII- Pois que bastava tão só procederem à abertura de regos de encaminhamento da água para a P................, onde seria junta para depois ser repartida pelos vários consortes.

XXIX- Refira-se também que tendo resultado provado:

que há mais de 30 anos que os Autores e seus antecessores vêm aproveitando as águas conduzidas por tubo até à parede da extrema norte do prédio dos Réus e as que brotam do solo e escorrem do mesmo prédio até à aludida parede para irrigar os seus prédios

Durante o Inverno como água de lima e do S. João ao S. Miguel, repartem-na entre si e outros consortes.

O que fazem à vista e com o conhecimento de toda a gente, designadamente dos Réus, sem oposição de quem quer que seja e com o ânimo e agindo na convicção de serem donos dessa água, de que exercem um direito que a eles pertence e sem que prejudiquem direitos de terceiros.

Concluímos que o Douto Acórdão recorrido, terá interpretado e aplicado incorrectamente a norma constante do artigo 1390° do Código do Civil.

Termos em que requer a Vossas Excelências seja concedido provimento ao presente recurso, revogando-se o douto acórdão recorrido e em substituição seja lavrado douto acórdão que julgue a acção procedente por provada e os RR condenados no pedido.

PEDEM A VOSSAS EXCELÊNCIAS JUSTIÇA

 Os RR contra- alegaram, pugnando pela manutenção do Acórdão recorrido.

 Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

 II- Fundamentação:

                          

             Os factos dados como provados pelas instâncias são os seguintes:

            1- Na matriz predial rústica, da freguesia de Telões, do concelho de Vila Pouca de Aguiar, encontra-se inscrito, sob o artigo 4.474º, um prédio rústico, sito no Lugar d............ – Souto, composto de lameiro, com 2 (duas) macieiras e videiras em cordão, com a área de 3.000m2, a confrontar do Norte com MM, do Sul com NN, do Nascente com caminho público e do Poente com OO, com o valor patrimonial de €165,50 (cento e sessenta e cinco euros e cinquenta cêntimos), omisso na Conservatória do Registo Predial de Vila Pouca de Aguiar, constando como titular inscrito PP (cfr. documento nº1, junto a fls.9, dos autos de procedimento cautelar apensos, e documento junto a fls.89-90, dos presentes autos, cujo teor, no mais, se dá, aqui, por integralmente reproduzido) (A);

2- Na matriz predial rústica, da freguesia de Telões, do concelho de Vila Pouca de Aguiar, encontra-se inscrito, sob o artigo 4.481º, um prédio rústico, sito no ........... – Souto, composto de lameiro, com 3 (três) macieiras, com a área de 280 m2, a confrontar do Norte com Junta de Freguesia, do Sul com estrada, do Nascente com HH e do Poente com caminho público, com o valor patrimonial de €21,65 (vinte e um euros e sessenta e cinco cêntimos), omisso na Conservatória do Registo Predial de Vila Pouca de Aguiar, constando como titular inscrito QQ, aqui, 2º autor (cfr. documento nº2, junto a fls.10, dos autos de procedimento cautelar apensos, e documento junto a fls.91-92, dos presentes autos, cujo teor, no mais, se dá, aqui, por integralmente reproduzido) (B);

3- Na matriz predial rústica, da freguesia de Telões, do concelho de Vila Pouca de Aguiar, encontra-se inscrito, sob o artigo 4.313º, um prédio rústico, sito no Lugar de ............ – Souto, composto de cultura arvense de sequeiro e regadio, lameiro com 5 (cinco) videiras e mata de carvalhos, com a área de 12.950 m2, a confrontar do Norte com RR, do Sul e Poente com SS e do Nascente com caminho público, com o valor patrimonial de €651,33 (seiscentos e cinquenta e um euros e trinta e três cêntimos), omisso na Conservatória do Registo Predial de Vila Pouca de Aguiar, constando como titular inscrito DD, aqui, 3º autor (cfr. documento nº3, junto a fls.11, dos autos de procedimento cautelar apensos, e documento junto a fls.93-94, dos presentes autos, cujo teor, no mais, se dá, aqui, por integralmente reproduzido) (C);

4- Na matriz predial rústica, da freguesia de Telões, do concelho de Vila Pouca de Aguiar, encontra-se inscrito, sob o artigo 4.320º, um prédio rústico, sito no Lugar de......... – Souto, composto de cultura arvense de sequeiro e regadio, com 1 (uma) nogueira, 28 (vinte e oito) macieiras, 4 (quatro) castanheiros, vinha e lameiro, com a área de 14.000 m2, a confrontar do Norte com caminho público, do Sul com TT, do Nascente com UU e do Poente com HH, com o valor patrimonial de €895,74 (oitocentos e noventa e cinco euros e setenta e quatro cêntimos), omisso na Conservatória do Registo Predial de Vila Pouca de Aguiar, constando como titular inscrito FF, aqui, 4º autor (cfr. documento nº4, junto a fls.12, dos autos de procedimento cautelar apensos, e documento junto a fls.95-96, dos presentes autos, cujo teor, no mais, se dá, aqui, por integralmente reproduzido) (D);

5- Na matriz predial rústica, da freguesia de Telões, do concelho de Vila Pouca de Aguiar, encontra-se inscrito, sob o artigo 4.322º, um prédio rústico, sito no Lugar de ............. – Souto, composto de pastagem com castanheiros, com a área de 2400m2, a confrontar do Norte com VV, do Sul e Nascente com caminho público e do Poente com XX, com o valor patrimonial de €76,62 (setenta e seis euros e sessenta e dois cêntimos), omisso na Conservatória do Registo Predial de Vila Pouca de Aguiar, constando como titular inscrito FF, aqui, 4º autor (cfr. documento nº5, junto a fls.13, dos autos de procedimento cautelar apensos, e documento junto a fls.97-98, dos presentes autos, cujo teor, no mais, se dá, aqui, por integralmente reproduzido) (E);

6- Na matriz predial rústica, da freguesia de Telões, do concelho de Vila Pouca de Aguiar, encontra-se inscrito, sob o artigo 4.315º, um prédio rústico, sito no Lugar d................... – Souto, composto de cultura arvense de sequeiro e regadio, com 11 (onze) macieiras, videiras em cordão, vinha em ramada, pomar, mata de carvalhos, pinhal e pastagem, com a área de 35.400 m2, a confrontar do Norte e Nascente com DD, do Sul com caminho púbico e do Poente com estrada, com o valor patrimonial de €872,20 (oitocentos e setenta e dois euros e vinte cêntimos), omisso na Conservatória do Registo Predial de Vila Pouca de Aguiar, constando como titular inscrito ZZ (cfr. documento nº6, junto a fls.14, dos autos de procedimento cautelar apensos, e documento junto a fls.99-100, dos presentes autos, cujo teor, no mais, se dá, aqui, por integralmente reproduzido) (F);

7- Na matriz predial rústica, da freguesia de Telões, do concelho de Vila Pouca de Aguiar, encontra-se inscrito, sob o artigo 4.327º, um prédio rústico, sito no Lugar ........... – Souto, composto de cultura arvense de regadio, com 1 (uma) nogueira, 10 (dez) macieiras, 1 (uma) pereira, 1 (uma) amoreira e pomar, com a área de 1.800 m2, a confrontar do Norte e Poente com XX, do Sul com AAA e do Nascente com caminho público, com o valor patrimonial de €213,19 (duzentos e treze euros e dezanove cêntimos), omisso na Conservatória do Registo Predial de Vila Pouca de Aguiar, constando como titular inscrito BBB (cfr. documento nº7, junto a fls.15, dos autos de procedimento cautelar apensos, e documento junto a fls.101-102, dos presentes autos, cujo teor, no mais, se dá, aqui, por integralmente reproduzido) (G);

8- Na matriz predial rústica, da freguesia de Telões, do concelho de Vila Pouca de Aguiar, encontra-se inscrito, sob o artigo 4.318º, um prédio rústico, sito no Lugar de .......... ou C.......... – Souto, composto de cultura arvense de regadio, com 6 (seis) macieiras, videiras em cordão e videiras em ramada e vinha, com a área de 7.200m2, a confrontar do Norte com CCC, do Sul e Poente com SS e do Nascente com FF, com o valor patrimonial de €602,85 (seiscentos e dois euros e oitenta e cinco cêntimos), omisso na Conservatória do Registo Predial de Vila Pouca de Aguiar, constando como titular inscrito DDD (cfr. documento nº8, junto a fls.16, dos autos de procedimento cautelar apensos, e documento junto a fls.103-104, dos presentes autos, cujo teor, no mais, se dá, aqui, por integralmente reproduzido) (H);

9- Na matriz predial rústica, da freguesia de Telões, do concelho de Vila Pouca de Aguiar, encontra-se inscrito, sob o artigo 4.326º, um prédio rústico, sito no Lugar ......... – Souto, composto de cultura arvense de regadio, com 4 (quatro) macieiras e vinha em ramada, com a área de 05.400m2, a confrontar do Norte e Poente com caminho público, do Sul com CCC e do Nascente com FF, com o valor patrimonial de €495,11 (quatrocentos e noventa e cinco euros e onze cêntimos), omisso na Conservatória do Registo Predial de Vila Pouca de Aguiar, constando como titulares inscritos EEE e II, esta última, aqui, autora (cfr. documento nº9, junto a fls.17, dos autos de procedimento cautelar apensos, e documento junto a fls.105-106, dos presentes autos, cujo teor, no mais, se dá, aqui, por integralmente reproduzido) (I);

10- Na matriz predial rústica, da freguesia de Telões, do concelho de Vila Pouca de Aguiar, encontra-se inscrito, sob o artigo 4.317º, um prédio rústico, sito no Lugar de ..... ou C........ – Souto, composto de cultura arvense de regadio, com 3 (três) macieiras, 1 (uma) pereira, videiras em cordão e ramada, com a área de 7.240m2, a confrontar do Norte com HH, do Sul com TT, e do Nascente e Poente com CCC, com o valor patrimonial de €663,80 (seiscentos e sessenta e três euros e oitenta cêntimos), omisso na Conservatória do Registo Predial de Vila Pouca de Aguiar, constando como titular inscrito SS (cfr. documento nº10, junto a fls.18, dos autos de procedimento cautelar apensos, e documento junto a fls.107-108, dos presentes autos, cujo teor, no mais, se dá, aqui, por integralmente reproduzido) (J);

11- Na matriz predial rústica, da freguesia de Telões, do concelho de Vila Pouca de Aguiar, encontra-se inscrito, sob o artigo 4.319º, um prédio rústico, sito no Lugar de .......... ou ............ – Souto, composto de cultura arvense de regadio, com 2 (duas) cerejeiras, 3 (três) macieiras, e vinha em ramada, com a área de 800 m2, a confrontar do Norte com FFF, do Sul e Nascente com HH e do Poente com caminho público, com o valor patrimonial de €86,49 (oitenta e seis euros e quarenta e nove cêntimos), omisso na Conservatória do Registo Predial de Vila Pouca de Aguiar, constando como titulares inscritos AAA e GGG (cfr. documento nº11, junto a fls.19, dos autos de procedimento cautelar apensos, e documento junto a fls.109-110, dos presentes autos, cujo teor, no mais, se dá, aqui, por integralmente reproduzido) (K);

12- Por si e por passados, há mais de 20 (vinte), 30 (trinta) e mais anos, que os autores AA e BB vêm fruindo e utilizando o prédio descrito em 1, cultivando-o e colhendo os seus frutos, pagando as respectivas contribuições, o que fazem de forma contínua, ininterrupta e reiterada, à vista e com o conhecimento de toda a gente, designadamente, dos réus, sem oposição de quem quer que seja, com o ânimo e agindo na convicção de serem donos desse prédio, de que exercem um direito próprio e sem que prejudiquem direitos de terceiros (L);

13- Por si e antecessores, há mais de 20 (vinte), 30 (trinta) e mais anos, que o autor QQ vem fruindo e utilizando o prédio mencionado em 2, cultivando-o e colhendo os seus frutos, pagando as respectivas contribuições, o que faz de forma contínua, ininterrupta e reiterada, à vista e com o conhecimento de toda a gente, designadamente, dos réus, sem oposição de quem quer que seja, com o ânimo e agindo na convicção de ser dono desse prédio, de que exerce um direito próprio e sem que prejudique direitos de terceiros (M);

14- Por si e por passados, há mais de 20 (vinte), 30 (trinta) e mais anos, que os autores DD e EE vêm fruindo e utilizando o prédio aludido em 3, cultivando-o e colhendo os seus frutos, pagando as respectivas contribuições, o que fazem de forma contínua, ininterrupta e reiterada, à vista e com o conhecimento de toda a gente, designadamente, dos réus, sem oposição de quem quer que seja, com o ânimo e agindo na convicção de serem donos desse prédio, de que exercem um direito próprio e sem que prejudiquem direitos de terceiros (N);

15- Por si e antecessores, há mais de 20 (vinte), 30 (trinta) e mais anos, que os autores FF e GG vêm fruindo e utilizando os prédios identificados em 4, 5, 6 e 7, cultivando-os e colhendo os seus frutos, pagando as respectivas contribuições, o que fazem de forma contínua, ininterrupta e reiterada, à vista e com o conhecimento de toda a gente, designadamente, dos réus, sem oposição de quem quer que seja, com o ânimo e agindo na convicção de serem donos desses prédios, de que exercem um direito próprio e sem que prejudiquem direitos de terceiros (O);

16- Por si e por passados, há mais de 20 (vinte), 30 (trinta) e mais anos, que o autor HH vem fruindo e utilizando o prédio referido em 8, cultivando-o e colhendo os seus frutos, pagando as respectivas contribuições, o que faz de forma contínua, ininterrupta e reiterada, à vista e com o conhecimento de toda a gente, designadamente, dos réus, sem oposição de quem quer que seja, com o ânimo e agindo na convicção de ser dono desse prédio, de que exerce um direito próprio e sem que prejudique direitos de terceiros (P);

17- Por si e antecessores, há mais de 20 (vinte), 30 (trinta) e mais anos, que a autora II vem fruindo e utilizando o prédio descrito em 9, cultivando-o e colhendo os seus frutos, pagando as respectivas contribuições, o que faz de forma contínua, ininterrupta e reiterada, à vista e com o conhecimento de toda a gente, designadamente, dos réus, sem oposição de quem quer que seja, com o ânimo e agindo na convicção de ser dona desse prédio, de que exerce um direito próprio e sem que prejudique direitos de terceiros (Q);

18- Por si e antecessores, há mais de 20 (vinte), 30 (trinta) e mais anos, que a autora JJ vem fruindo e utilizando os prédios mencionados em 10 e 11, cultivando-os e colhendo os seus frutos, pagando as respectivas contribuições, o que faz de forma contínua, ininterrupta e reiterada, à vista e com o conhecimento de toda a gente, designadamente, dos réus, sem oposição de quem quer que seja, com o ânimo e agindo na convicção de ser dona desses prédios, de que exerce um direito próprio e sem que prejudique direitos de terceiros (R);

19- Na Conservatória do Registo Predial de Vila Pouca de Aguiar encontra-se descrito sob o nº0000000000000, da freguesia de Telões, o prédio rústico, situado no Lugar de ..........., composto de lameiro com videiras, com a área de 2650 m2, a confrontar do Norte com PP, do Sul com HHH, do Nascente com estrada e do Poente com III, inscrito na matriz predial rústica, sob o artigo 4.480º, com o valor patrimonial de €142,36 (cento e quarenta e dois euros e trinta e seis cêntimos), constando da inscrição “G”, correspondente à apresentação nº12 de 28 de Julho de 1997, a aquisição a favor do réu marido KK, por sucessão hereditária e partilha judicial por óbito de NN, casado que foi com JJJ (cfr. documento junto a fls.87-88, cujo teor, no mais, se dá, aqui, por integralmente reproduzido) (S);

20 - Há mais de trinta anos que existe, no prédio mencionado em S) da matéria assente, uma C..... com a profundidade de cerca de 1 metro em relação ao nível do solo, retratada a fls. 47 a 49, escavada e construída pelos antepossuidores dos prédios dos Autores( redacção introduzido pelo Acórdão recorrido)  (1º);

21- Há mais de trinta anos, ao longo do muro existente na sua extrema Poente, no sentido Sul / Norte, existe um rego sulcado no solo por onde corre água que brota do aludido muro;

O muro mencionado suporta as terras do prédio confrontante, do lado Poente, com o prédio mencionado em S);

A água referida provém do prédio confrontante, do lado Poente, com o prédio mencionado em S);

A cerca de 15 metros da extrema Norte do prédio referido em S), o mencionado rego tem uma derivação para o interior do prédio referido em S) ao longo de cerca de 6 m, por onde corre a água supra mencionada por rego a céu aberto, até desembocar na caixa de pedra referenciada na resposta ao art.º 1;

A partir da caixa de pedra referida na resposta ao art.º 1, existe um tubo, enterrado no solo, que conduz a água até à parede da extrema Norte do prédio referido em S);

 Do lado poente do prédio referido em S) ao longo de um muro existente na sua extrema , existe um rego sulcado no solo por onde corre água que provém do prédio de terceiro em posição superior e segue ao longo da extrema Poente em cerca de 15 metros, flectindo depois para o interior do mesmo prédio , ao longo de cerca de 6 metros até desembocar na C..... , referida na resposta ao art.1º. A partir da caixa de pedra referida na resposta ao artigo 1º existe um tubo enterrado no solo, que conduz a água até à parede da extrema Norte do prédio referido em S) ; nessa parede ,por uma abertura a água cai, por uma para C..... denominado “ Poço .........”. Antes da colocação do tubo enterrado no solo a água era conduzida da “ C.....” para a P................ por um rego a céu aberto ambos rasgados pelos antepossuidores dos prédios dos AA ( º redacção introduzida pelo Acórdão) 2º e 4º.

22 - Essa poça é feita em pedra ancestral (5º);

23 - Há mais de 30 anos que as águas que brotam do solo do prédio referido em S) (19), escorrem, por efeito da gravidade, até à parede da extrema Norte do prédio;

Dessa parede, as mesmas águas escorrem para a “P................” ;

As águas que deitam para a “P................”, provenientes do prédio referido em S), ficam na mesma retidas (6º);

24 - Há mais de 30 anos que, a partir da “P................”, existem regos a céu aberto que conduzem a água nela retida para os prédios referidos em A a K (1 a 11) - (7º);

25- Há mais de 30 anos que os AA. e seus antecessores vêm mantendo limpos e reparando os regos e caixas de pedra acima referidas (8º);

25- Há mais de 30 anos que os AA. e seus antecessores vêm aproveitando as águas conduzidas por tubo até à parede da extrema Norte do prédio referido em S), acima mencionadas, e as que brotam do solo e escorrem do mesmo prédio até à aludida parede para irrigar os prédios aludidos em A a K) - (9º);

26 - Servindo-se dessa água, durante o Inverno, como “água de lima” (10º);

27 - E desde o S. João ao S. Miguel, isto é, de Junho a Setembro, repartindo aquela água entre si e outros consortes (11º);

28- O que fazem à vista e com o conhecimento de toda a gente, designadamente, dos réus KK e KKK (54º);

29 - Sem oposição de quem quer que seja (55º);

30 - E com o ânimo e agindo na convicção de serem donos dessa água, de que exercem um direito que a eles pertence, e sem que prejudiquem direitos de terceiros (57º);

31 - Em data não apurada, os RR. realizaram, pelo menos, um furo no solo do prédio referido em S) que capta água existente no mesmo, sendo tal água conduzida em tubo, enterrado no solo também pelos RR., até à parede de pedra situada na extrema Norte do mesmo prédio;

 Os RR. colocaram um tubo à face da parede, que encaixa no tubo enterrado mencionado, que conduz a água por este trazida para local não apurado;

Antes da actuação dos RR. acabada de mencionar, a água captada pelo furo referido, escorria, por efeito da gravidade, para a parede situada na extrema Norte do prédio referido em S) e daí para a “P................” (58º);

32 - Os RR. actuaram do modo referido na resposta ao art. 58º sem autorização dos AA. (59º);

33- Em consequência da actuação dos RR., os AA. ficaram impossibilitados de utilizar a água captada pelo furo referido em S) (60º);

34 - As culturas praticadas pelos AA. nos prédios referidos em A a K são de regadio, e respeitam a alface, abóbora, couve, batata, fava, ervilha, beterraba e tomate (61º);

37 - Devido ao referido na resposta ao art.º 60º, o caudal das águas referidas na resposta ao artigo 9º passou a ser mais reduzido e insuficiente para irrigar as culturas mencionadas no art.º 61º no período referido no artigo 11º - (62º);

38 - Os AA. destinam os produtos cultivados nos prédios mencionados em A) a K) para seu consumo - (63º).

     

Apreciando:

Antes de mais importa precisar que com a presente a acção os AA visam sobretudo o reconhecimento do direito de propriedade das águas nascentes no prédio dos RR, ou seja, no prédio rústico, sito no lugar........., que confronta de Nascente com Estada camarária, de Poente com III, de Norte com PP e de Sul com  HHH e não tanto o reconhecimento do direito de propriedade sobre os prédios identificados nas als. a) a m) do art. 1º da petição inicial que,   reconheça-se   nunca chegou a ser questionado na presente acção.

            Isto para dizer o que está em causa verdadeiramente na presente acção é  o reconhecimento do direito de propriedade sobre as águas  que, segundo os AA, são  nascentes no prédio dos RR.

            Significa, desde logo, que temos de ter em atenção o que vem provado, nomeadamente ao nível da localização da nascente das águas.

            E neste domínio vem provado:

Há mais de 30 anos existe no prédio referido em S) (o prédio dos RR) uma caixa em pedra, com a profundidade de cerca de 1,00 metro em relação ao nível do solo, retratada a fls. 47 a 49 escavada e construída pelos antepossuidores dos prédios dos autores ( cfr. resposta ao art. 1º da BI);

            Do lado poente do prédio referido em S) ao longo de um muro existente na sua extrema, existe um rego sulcado no solo por onde corre água que provém do prédio de terceiro em posição superior e segue ao longo da extrema Poente em cerca de 15 metros, flectindo depois para o interior do mesmo  prédio, ao longo de cerca de cerca de 6 metros até desembocar na caixa de pedra , referida na resposta ao art. 1º.

            A partir da caixa de pedra referida na resposta ao art. 1º existe um tubo enterrado no solo, que conduz a água até à parede da extrema Norte do prédio referido em S) nessa parede , por uma abertura a água cai para uma caixa  em pedra denominada “ P................”.

            Antes da colocação do tubo enterrado no solo a água era conduzida da “ C.....” para a P................ por um rego a céu aberto, ambos rasgados pelos antepossuidores dos prédios dos AA .

            Há mais de trinta anos ao longo do muro existente na sua extrema Poente, no sentido Sul/ Norte existe um rego sulcado no solo por onde corre água que brota do aludido muro.

            O muro mencionado suporta as terras do prédio confrontante do lado Poente com o prédio mencionado em S).

 A água referida provém do prédio confrontante, do lado Poente, como prédio mencionado em S).

Do lado poente do prédio referido em S) ao longo de um muro existente na sua extrema, existe um rego sulcado no solo por onde corre água que provém do prédio de terceiro em posição superior e segue ao longo da extrema Poente em cerca de 15 metros, fletindo depois para o interior do mesmo prédio, ao longo de cerca de 6 metros até desembocar na caixa em pedra , referida na resposta ao art.1º. A partir da caixa de pedra referida na resposta ao artigo 1º existe um tubo enterrado no solo, que conduz a água até à parede da extrema Norte do prédio referido em S) ; nessa parede, por uma abertura a água cai, por uma para caixa em pedra denominado “ P...........”. Antes da colocação do tubo enterrado no solo a água era conduzida da “ caixa em pedra” para a P................ por um rego a céu aberto ambos rasgados pelos antepossuidores dos prédios dos AA (  redacção introduzida pelo Acórdão) 2º e 4º.

            Segundo a factualidade que vem provada, resulta que a nascente das águas, aqui em questão, situa-se no prédio confrontante com o dos RR, o do lado poente, ou seja, no prédio de III,( S) situando-se, assim , o prédio dos RR em nível inferior.

            Ou seja, as águas, como vem provado, provém do prédio de terceiro em posição superior e segue ao longo da extrema Poente em cerca de 15 metros, fletindo depois para o interior do mesmo prédio, ao longo de cerca de 6 metros até desembocar na caixa de pedra situada no prédio dos RR (S) e a partir daí segue através de um tubo enterrado  no solo, que conduz a agua até á parede extrema  Norte do prédio referido em S) .

            Antes de mais impõe-se qualificar juridicamente a água, aqui em questão.

            Como acima se referiu, os AA através da presente acção reclamam a propriedade das aguas nascentes no prédios dos RR, invocando para o efeito a usucapião.

            Vejamos:

Importa, desde logo, determinar em função dos factos provados, se estamos perante fonte ou nascente situada no prédio dos RR, ou se, antes as águas ( fonte ou nascente ) se situam num prédio terceiro.  

            A respeito ao direito de propriedade sobre a água os Profs. P. Lima e A. Varela in C. Civil Anotado e relativamente ao art. 1390 do C. Civil, depois afastarem a doutrina que o Prof Guilherme Moreira havia sustentado no seu estudo sobre as Águas ( II nº3 ) e que fez escola (  no sentido  de que o direito a uma água que nasce em prédio alheio é sempre um direito de propriedade e nunca o um direito de servidão- cfr.  Prof. Pires de Lima , anotação ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, 24/5/1940 in RLJ ano 73º , pag. 300) consideram que “ o direito à água que nasce em prédio alheio, conforme o título da sua aquisição, pode ser um direito ao uso pleno da água, sem qualquer limitação, e pode ser apenas o direito de a aproveitar noutro prédio, com as limitações inerentes, por conseguinte, às necessidades deste. No primeiro caso, a figura constituída é a da propriedade da água; no segundo, é a de servidão. A constituição dum direito de propriedade depende da existência de um título capaz de a transferir; a constituição de uma servidão da existência de um dos meios referidos no art. 1547 : contrato, testamento, usucapião, destinação do pai de família, sentença e decisão administrativa”.

            E acrescentam os citados Autores “foi esta a doutrina que acabou por ser legislativamente consagrada, ao prever-se expressamente a possibilidade de constituição de qualquer dos dois direitos na parte final do nº1”. ( cfr. também Anotação dos citados Autores  ao art. 1390 do C. Civil  vol. III pag. 276 )    

            Também o Prof. Guilherme Moreira in As Águas no Direito Civil Português  Livro I  pag.111 sobre a propriedade das águas, acentuava  que   já na resolução régia de 17 de  Agosto de 1775  «declarou-se que  o domínio e posse das águas de que se trata sendo estas como são particulares , pertencentes aos donos das quintas onde têm os seus nascimentos, o decurso natural delas pelo ribeiro onde desaguam não pode servir de argumento a favor dos prédios inferiores , sem que os donos destes tivessem um título claro de compra feita aos primeiros, ou de um açude ou canal com manufactura constante e permanente que fizesse presumir o referido título.”

 Para que se adquirisse, pois, direito às águas particulares independentemente de qualquer título por que o proprietário delas transmitisse esse direito, necessário era que houvesse obras de manufactura constante e permanente destinadas ao aproveitamento dessas águas.

“ O facto de se deixar correr a água de um prédio superior para um inferior era por eles considerado como sendo um direito facultativo, não se constituindo assim um direito algum para o prédio superior, embora o decurso de água fosse imemorial, desde que no prédio superior não houvesse alguma obra que obstasse a que a água fosse derivada em prejuízo do prédio inferior.

        

            A respeito das águas das nascentes escreveu-se no Ac deste Supremo de 12.07.2011acessível in www.dgsi.pt/stjnão são , pois, res nullius se, emergindo à superfície das profundidades do solo, o proprietário do prédio delas se apodera quando assim brotam , como primeiro ocupante delas, beneficiando relativamente a elas como que do direito de preferência de primeiro ocupante.

 Ao invés, as águas- e a respectiva nascente – são porções do solo de onde emergem, pars fundi, inserindo-se no direito de propriedade deste; logo, a propriedade do solo importa necessariamente a propriedade da nascente e das águas que nela surgem ( cfr. Tavarela Lobo , Manuel de Direito de Águas, vol II p.8)

            E  acrescenta o citado Acórdão “ o direito sobre as águas das fontes ou nascentes “ está compreendido no direito de propriedade sobre o prédio , mas pode destacar-se deste, constituindo de per si objecto do direito de propriedade” ( Guilherme  Moreira I, p. 501).

Também no Ac. do STJ datado de 31.05.2011 acessível in www.dgsi.pt / Relator Cons. Fernando do Vale )  se considerou “ enquanto não forem desintegradas da propriedade superficiária, por lei ou negócio jurídico, as águas são partes componentes dos respectivos prédios “ e “ quando desintegradas adquirem autonomia e são consideradas de per si imóveis “ .

            A separação e desintegração das águas do domínio do prédio pode verificar-se na sequência de título de aquisição do direito à água ( ou ao uso da  água) a favor de terceiro, desde logo , porque o art. 1389 do C Civil depois de reconhecer ao proprietário do prédio a faculdade de se servir da água de fonte ou nascente nela existente e dela dispor livremente , ressalva as restrições previstas na lei “ e os direitos que terceiro haja adquirido ao uso da água por título justo”

            E a respeito dos títulos de aquisição estatui o art. 1390 nº1” considera-se título justo de aquisição da água das fontes e nascentes conforme os casos, qualquer meio legítimo de adquirir a propriedade de coisas imóveis ou de constituir servidões.”

 Impõe-se, então, no caso em apreço, averiguar se concorrem os requisitos da aquisição do direito de propriedade da água pela via da usucapião, conforme alegam os AA .

            O nº2 do citado normativo estabelece que “ a usucapião, porém só é atendida quando for acompanhada da construção de obras, visíveis e permanentes, no prédio onde exista a fonte ou nascente, que revelem captação e a posse da água nesse prédio”

            A exigência, no caso da permanência e visibilidade das obras ou sinais equiparados, justifica-se pela possibilidade de, assim, presumir no dono do imóvel a renúncia ao direito de propriedade da água ou assunção de conduta consentânea com a constituição de correspondente servidão e, bem assim, na necessidade de salvaguardar a boa fé do comércio jurídico relativamente a eventual adquirente nos termos em que a lei pretende tutelá-la ( cfr. A. Varela in  RLJ  Ano 115º /222).

 Isto para dizer que o adquirente do direito de propriedade sobre águas provenientes de nascentes em prédio alheio por usucapião deve, para além disso, alegar e demonstrar também a posse das obras, visíveis e permanentes nesse prédio reveladoras da captação e condução de água para o seu prédio.

Ora, no caso em apreço, a água, aqui em questão, localiza-se (nasce, brota) não nos prédios dos RR, mas no prédio confrontante de III, sendo que as obras (caixa de pedra e regos sulcados no solo e  através de tubos enterrados no solo) situam-se antes no prédio dos RR ( prédio inferior)  e também, segundo o provado, visavam essas obras  sobretudo armazenar/captar e encaminhar  a água, que provém do  dito prédio confrontante com o dos RR.

Essas obras situando-se no prédio inferior, como é o caso do dos RR, e visando as mesmas sobretudo o armazenamento e condução de águas com vista a servir os prédios dos AA, não podem levar ao direito de propriedade pela via da usucapião sobre as aguas nascentes localizadas em prédio superior, que, aqui, nem sequer foi demandado.

            Essas obras ( caixa de pedra  e regos sulcados no solo do prédio dos RR) quando muito poderão configurar um direito de servidão de presa e condução de águas, funcionando o prédio dos RR como prédio serviente, mas  este direito não vem  peticionado,   sendo que  essas circunstâncias não podem ser atendidas para efeitos de aquisição da propriedade  das águas pela via da usucapião, por a situação não ser enquadrável  na previsão do nº2 do art. 1390 do C. Civil.

            Note-se que nos termos do citado normativo “ a usucapião, porém, só é atendida quando for acompanhada da construção de obras, visíveis e permanentes, no prédio onde exista a fonte ou nascente, que revelem a captação e a posse da água nesse prédio.”

            No caso dos autos essas obras ( caixa de pedra para armazenamento/captação da água , regos e canalização subterrânea)   revelam de facto a posse e actuação dos AA sobre a água em termos de captação/armazenamento e condução, mas  situam-se não no prédio da nascente, onde a água brota/nasce , mas no prédio inferior,  o prédio dos RR , circunstância esta que faz com que o direito dos AA  à água não é de propriedade, mas, como  acima se disse, de servidão de presa e de condução e, isto porque, para ter direito de propriedade  sobre a água, além de título justo de aquisição, aqueles  actos de posse consubstanciadas  em  obras visíveis e permanentes teriam de ocorrer no prédio onde existe a fonte ou nascente ( art. 1390 nº2 do CC).

            Não é o que se passa no caso dos autos, porquanto, as águas provêm do prédio de terceiro em posição superior e segue ao longo da extrema Poente em cerca de 15 metros, flectindo depois para o interior do mesmo prédio ao longo de cerca de 6 metros, até desembocar na caixa de pedra situada no prédio dos Réus (S),  e a partir daí segue através de tubo enterrado no solo que conduz a água até á parede extrema Norte do prédio referido em (S), sendo que essas obras  têm aqui como função fundamentalmente   o armazenamento / captação e condução das águas que provêm daquele prédio.   

           

            Improcedem, deste modo, as conclusões dos recorrentes.

 Concluindo:

1- De acordo com o nº1 do art. 1390 do C. Civil e seguindo a posição dos Prof. Pires de Lima e A. Varela supra exposta, o direito à água que nasce em prédio alheio, conforme o título da sua constituição, pode ser um direito ao uso pleno da água, sem qualquer limitação, e pode ser apenas o direito de a aproveitar noutro prédio, com as limitações inerentes, por conseguinte às necessidades deste. No 1º caso  (uso pleno da água), a figura constituída é a da propriedade da água; no segundo  (direito de a aproveitar noutro prédio) é a de servidão.

2- No caso dos autos as águas provêm do prédio de terceiro em posição superior e segue ao longo da extrema Poente em cerca de 15 metros flectindo depois para o interior do mesmo prédio ao longo de cerca de 6 metros, até desembocar na caixa de pedra situada nos prédios dos RR e a partir daí segue através de tubo enterrado no solo  até á parede extrema Norte do prédio dos RR, sendo que esses obras têm aqui como função o armazenamento / captação e condução de águas .

3- E situando-se essas obras, visíveis e permanentes consubstanciadas na caixa de pedra e regos sulcados no solo (tubo enterrado no solo),não no prédio donde provêm as águas, mas noutro prédio inferior, que, aqui, é o dos Réus, à luz do nº2 do art. 1390 do C. Civil não podem tais obras conduzir à  usucapião com vista à  aquisição do direito de propriedade sobre essa água.

4-  Essas obras situadas no prédio dos Réus, inferior aquele donde provém as águas, poderão antes configurar um direito de presa e condução de águas, funcionando neste caso o prédio dos RR como prédio serviente, mas o reconhecimento desse direito não vem peticionado nesta acção.     

 III- Decisão:

            Nestes termos e considerando o exposto, acordam os Juízes deste Supremo em negar a revista e confirmar o Acórdão recorrido.

            Custas pelos recorrentes

            Lisboa e Supremo Tribunal de Justiça