Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
04A1299
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: AFONSO CORREIA
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
AUTO-ESTRADA
BRISA
RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
CULPA
ÓNUS DA PROVA
Nº do Documento: SJ200406220012996
Data do Acordão: 06/22/2004
Votação: UNANIMIDADE COM 1 DEC VOT
Tribunal Recurso: T REL ÉVORA
Processo no Tribunal Recurso: 863/03
Data: 10/30/2003
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: CONCEDIDA A REVISTA.
Sumário : I - O contrato celebrado entre o utente que pretende circular pela auto-estrada e a Brisa, sua concessionária, é um contrato inominado em que o utente tem como prestação o pagamento de uma taxa e a Brisa a contraprestação de permitir que o utente «utilize» a auto-estrada, com comodidade e segurança.
II - Embora o contrato de concessão tenha como Partes Contratantes o Estado Concedente e a Brisa Concessionária, algumas das Bases da Concessão têm carácter normativo, eficácia externa relativamente às partes no contrato; para isso o Legislador as integrou no Decreto Lei aprovador da Concessão, dele fazendo parte integrante (final do preâmbulo e art. 1º do Dec-lei nº 294/97, de 24 de Outubro).
III - Uma dessas Bases é a XXXVI, nº 2, segundo a qual «a concessionária será obrigada, salvo caso de força maior devidamente verificado, a assegurar permanentemente, em boas condições de segurança e comodidade, a circulação nas auto-estradas, quer tenham sido por si construídas, quer lhe tenham sido entregues
IV - O aparecimento de um cão de elevado porte na faixa de rodagem da auto-estrada constitui reconhecido perigo para quem ali circula.
Cabe à Brisa evitar essa (e outras) fonte de perigos, essa anormalidade. Não pode pôr-se a cargo do automobilista a prova da negligência da Brisa ou da origem do cão porque não foi a prestação dele que falhou nem ele tem a direcção efectiva, o poder de facto sobre a auto-estrada (como um todo, incluindo vedações, ramais de acesso e áreas de repouso e serviço.
V - Só o «caso de força maior devidamente verificado» exonera o devedor (a concessionária) da sua obrigação de garantir a circulação em condições de segurança (art. 799º, nº 1, do CC) e, na hipótese de inexecução, do dever de reparar os prejuízos causados.
VI - «Não será suficiente (ao devedor, a Brisa) mostrar que foi diligente ou que não foi negligente: terá de estabelecer positivamente qual o evento concreto, alheio ao mundo da sua imputabilidade moral, que não lhe deixou realizar o cumprimento.
VI - Essa prova só terá sido produzida quando se conhecer, em concreto, o modo de intromissão do animal. A causa ignorada não exonera o devedor, nem a genérica demonstração de ter agido diligentemente».
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça


O Dr. A, Advogado em Lisboa, instaurou, em 6 de Abril de 2000, acção declarativa de condenação, com processo comum e forma ordinária, contra:
Brisa - Auto-Estradas de Portugal, S.A., sediada na Quinta da Torre da Agulha, S. Domingos da Rana, Cascais; e
Companhia de Seguros B, com sede no Largo do Calhariz, em Lisboa,
pedindo a condenação solidária das RR a indemnizar o A.
- a título de danos patrimoniais, na quantia de 1.585.264$, acrescida de juros de mora já vencidos, à taxa de 7%, no montante de 23.958$, e os que se vencerem até ao pagamento da indemnização;
- por danos não patrimoniais, no montante de 2.000.000$.

Alegou para tanto - e muito em síntese - que no dia 9.08.99, pelas 23h55, o autor viajava na sua viatura, um Honda Civic, pela Auto-estrada do Sul, no sentido Sul/Norte, cerca do km 32.
Seguia pela faixa da esquerda quando lhe surge, a meio desta, um animal da raça canina que atravessou desde a berma do lado direito.
O autor ainda tentou evitar o embate no animal, mas não conseguiu, o que levou a seu veículo a entrar em despiste, embatendo no separador central das vias, do que advieram danos elevados no seu carro.
O animal atropelado veio a ser localizado, ainda vivo e ferido, desconhecendo-se quem era o seu dono. Do lado direito da via, donde procedeu esse canino, encontrava-se a vedação em arame, cujo primeiro fio, a partir do chão, na zona do acidente, permite a passagem de um cão, sendo esta anomalia de falta de conservação da vedação da responsabilidade da concessionária Brisa, tendo esta transferido a sua responsabilidade civil, emergente da exploração da rede das Auto-Estradas, para a R. B.
O autor sofreu danos patrimoniais em consequência de ter ficado impossibilitado de trabalhar durante nove dias, despendeu na reparação do veículo 426.401$, a título de franquia da sua companhia de seguros; e pagou à C, 98.935$ pelo aluguer de uma viatura de substituição; em consequência do embate o seu veículo ficou desvalorizado em 260.000$ e o A. sofreu danos não patrimoniais que avalia em 2.000.000$.

A Seguradora B confirmou a existência do contrato de seguro mas afirmou desconhecer a fatalidade alegada que não era pessoal, nem tinha obrigação de conhecer.
A Brisa invocou que patrulha a Auto-Estrada regularmente, com auxílio da Brigada de Trânsito da GNR, e ninguém detectou qualquer anomalia ou falhas nas vedações laterais no local e data do acidente. Não teve, pois, culpa na produção do acidente e não está, por isso, obrigada a indemnizar.
O A. replicou, reafirmando o antes alegado.
Saneado e condensado o processo, foi acrescentada a base instrutória na sequência de articulado superveniente, e em 21 de Junho de 2002 procedeu-se a julgamento, com gravação da prova produzida em audiência, após o que o Tribunal decidiu a matéria de facto perguntada no questionário, sem reclamações.
As partes produziram alegações escritas sobre o aspecto jurídico da causa e o Ex.mo Juiz proferiu sentença que, na parcial procedência da acção e por entender que a Brisa agiu com culpa, condenou as RR a indemnizar o A. por danos patrimoniais (4.116,41 €uros) já apurados e no que em execução de sentença, com o limite de 2.992,79 €uros, se apurar, a título de perda de rendimentos de trabalho, e não patrimoniais (4.000 €uros), com juros de mora à taxa legal.

Apelaram as RR, impetrando alteração da decisão sobre a matéria de facto e consequente revogação do decidido. E em boa hora o fizeram: a Relação de Évora, depois de alterar para não provado as respostas aos quesitos 14º e 15º (que se referiam ao facto de a vedação permitir a passagem de um cão entre o solo e o primeiro fio de arame, vedações que se encontravam frouxas e lassas) e responder restritiva e explicativamente aos quesitos 16º a 19º, considerou que "a Brisa colocou toda a sua diligência, quer para assegurar uma permanente vigilância das vias, quer um estado de conservação das respectivas vedações.
Quem falhou na prova que se lhe impunha e como se propunha na sua petição inicial, foi o autor ao não conseguir demonstrar que havia o buraco a permitir a entrada de animais e que havia fios lassos na vedação, anomalia esta que imputou à R. Brisa, mas que, como se disse, não logrou demonstrar.
Temos, por isso, de concluir que a concessionária cumpriu com as suas obrigações contratuais e que lhe não era imputável o aparecimento do canídeo na via e a sua não remoção até ao instante da colisão, pelo simples desconhecimento da existência e verificação de uma tal realidade fáctica.
Por isso, não pode aqui relevar qualquer outra presunção de culpa e assunção/imputação de responsabilidade objectiva que recaia sobre a concessionária e a responsabilize pelos danos emergentes do referido evento".
Pelo que revogou a sentença e absolveu as RR do pedido.

Foi a vez de o A. pedir revista, insurgindo-se contra a alteração da matéria de facto que teria, ainda, violado caso julgado formado pela decisão de acção sumaríssima sobre o mesmo acidente, proposta pela Seguradora do A., como constante da sentença e auto de inspecção ao local; e deve repor-se a decisão de 1ª Instância, mesmo que se mantenha a factualidade agora apurada.
Como se vê da alegação que coroou com estas Conclusões

1. A decisão do douto Aresto recorrido que alterou a matéria de facto fixada pela 1ª Instância e que - duma penada - revogou a sentença proferida por esta não resulta da prova documental produzida nos autos, nem da aplicação à mesma das normas legais que regem a matéria controvertida e não respeitou os limites definidos pela lei para exercer tal poder (artigo 712°, n° 2 do C.P.C.);

2. Efectivamente, da prova documental produzida nos autos decorre, com absoluta relevância para a boa decisão da causa, o seguinte:
2.1 - Transitou em julgado, em 4 de Outubro de 2001, a sentença da acção sumaríssima apreciada pelo 4° Juízo Cível de Setúbal, cuja respectiva certidão se encontra junta de fls. 319 a fls. 336, a qual teve por objecto o mesmo acidente de viação, a mesma 1ª R. e como autor a seguradora do veículo em causa e que foi condenatória da BRISA, SA., por culpa desta concessionária;
2.2 - Ocorreu, no âmbito do processo referido no ponto anterior, em 9 de Julho de 2001 (quase dois anos após o acidente), uma Inspecção Judicial ao local da colisão, conforme se verifica pelo respectivo auto junto como Doc. 1 às presentes Alegações, a qual permitiu apurar os factos nele mencionados, os quais confirmam a existência de irregularidades e deficiências nas vedações;
2.3 - A prova documental referida nos pontos 2.1 e 2.2 anteriores é composta por documentos autênticos, os quais têm forca probatória plena (artigos 369º e 371º do Código Civil) pelo que não podem ser colocados em crise - e, até, menosprezados - por depoimentos de testemunhas (colaboradores da 1ª R. Brisa, SA, os quais não têm idêntica força probatória;

3. - Ao depreciar a força probatória plena de uma sentença em concorrência com mera prova testemunhal, o douto Aresto recorrido gradua incorrectamente o valor das duas provas em causa, além de desrespeitar e adulterar as normas que regulam a força probatória dos diversos meios de prova admitidos no nosso sistema jurídico;

4. - Não foi aplicado pelo Tribunal recorrido o princípio da protecção do lesado que deve imperar no processo civil, fundamentalmente, no instituto da responsabilidade civil (mera culpa, responsabilidade pelo risco, etc.), onde se deve proteger o lesado, mesmo quando não se determinam as culpas;

5. - Não foi respeitado o princípio da imediação na produção de provas e mal andou o douto Acórdão recorrido quando, a fls. 768, se escreve:
"Por outro lado, embora a testemunha D, num primeiro momento tivesse afirmado que vira arames lassos na vedação, a Instâncias do Senhor advogado de uma das RR., já na parte final do seu depoimento, veio a esclarecer que só fez essa constatação, cerca de um ano depois do acidente dos autos, no momento em que se deslocara ao local, no com um outro Tribunal que estava a julgar um outro acidente ocorrido nessa imediação ...";
5.1 - Verifica-se, ao serem compulsados os autos, que aquilo a que a testemunha presencial do acidente D se reportava era a uma deslocação ao local da colisão, mas, no âmbito de um julgamento que ocorrera, por causa do mesmo acidente de viação, igualmente no Tribunal de Setúbal, onde o mesmo também testemunhou, como decorre de fls. 326 destes autos e do Doc. 1, folha 2, junto a estas Alegações, ou seja, a mencionada testemunha foi ouvida nos dois julgamentos ocorridos, a propósito do acidente do veículo GL;

6. - Da ofensa à excepção de caso julgado:

6.1 - Extrai-se da regra basilar do artigo 497°, n° 2 do C.P.C. que a excepção de caso julgado tem por finalidade evitar a contradição de julgados;
6.2 - Encontram-se reunidos todos os requisitos previstos pelo artigo 498° do C.P.C para que ocorra a excepção de caso julgado (perante a sentença transitada em julgado de fs. 319 a 336):
- identidade do pedido (quanto à sua natureza, uma vez que o efeito jurídico que se pretende alcançar é o ressarcimento de danos sofridos por força de acidente de viação, sem culpa);
- identidade da causa de pedir (nas acções emergentes de acidentes de viação o próprio acidente;
- Identidade dos sujeitos (atenta a respectiva qualidade jurídica);

6.3 "Há identidades de sujeitos quando o autor na segunda acção, embora seja pessoa diversa, intervém também na qualidade jurídica de credor do mesmo devedor." (Acórdão do S.T.J. de 31.10.1967, disponível na internet, www.stj.pt, com o n° convencional SJ19671031 0619632);
6.4 - O caso julgado tem por fundamento a "mesma causa", nos termos do artigo 498° do C.P.C., o que impede a sua repetição, exigindo-se soluções idênticas para situações, igualmente, idênticas, pois, o que se visa evitar é que o tribunal tenha de contradizer uma decisão judicial anterior sobre determinada questão concreta que transitou em julgado, o que a lei considera inaceitável;
6.5 - Na acção sumaríssima condenatória da BRISA, SA., já transitada, como autor encontrava-se a Seguradora do veículo GL e, nos presentes autos, o A. é o proprietário da mesma viatura GL;
6.6 - "Se num primeiro processo, por acidente de viação, proposto contra a companhia seguradora a questão da culpa foi decidida favoravelmente ao demandante e transitou em julgado, seria ferir a autoridade de caso julgado, considerar numa segunda acção (-) contra a mesma ré e outros, que não se provou a culpa, apesar de se ter provado que o acidente ocorreu dentro do mesmo condicionalismo fixado em ambos os processos." (Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 21.01.1997, Colectânea de Jurisprudência, 1997, 1°, páginas 22 a 25);
7. - Através da Inspecção Judicial realizada, junta como Doc. 1, foram detectadas anomalias e deficiências nas vedações e junto a estas, no troço da A2 onde ocorreu a colisão dos autos;

8. Caso se mantivesse o douto Acórdão recorrido, o mesmo violaria o disposto no artigo 675°, n° 1 e n° 2 do C.P.C. porque daí resultariam duas sentenças contraditórias do mesmo Tribunal em que, no que respeita ao mesmo acidente, um condenaria a 1ª R. BRISA. SA. a ressarcir os danos sofridos pela Seguradora do veículo GL por ter culpa, enquanto outra sentença (ou Acórdão) consideraria não ter tal 1ª R. qualquer culpa no mesmo sinistro, pelo que o Recorrente não seria indemnizado pelos danos que suportou;
9. A violação do comando imperativo que constitui o artigo 712°, n° 2 do C.P.C. gerou não apenas um vício formal, mas um verdadeiro vício de fundo. Vejamos:
9.1 - A inalterabilidade da matéria de facto fixada pela 1ª Instância constitui o regime-regra estatuído pelo nosso processo civil, sem prejuízo de assistir à Relação o poder-chave de, a título excepcional, alterar a decisão de facto nos casos em que os elementos de prova imponham, sem possibilidade de destruição por outra prova produzida em julgamento, a fixação dessa factualidade;
9.2 - Para que seja possível ocorrer tal alteração deve o Tribunal da Relação ter em atenção as alegações das partes, mas percorrido o douto Acórdão recorrido, verifica-se que em momento algum faz menção ao facto do A. ter contra-alegado, conforme documento de fls. 710 a 733, pelo que tal articulado não pode ter sido levado em conta, conforme era imposição legal;
9.3 - A mesma alteração apenas se torna possível, caso não haja hipóteses de os elementos de prova em causa serem destruídos por outra prova produzida em julgamento;
9.4 - Em face da sentença de fls. 319 a fls. 336 e, ora, na presença do auto de Inspecção Judicial que é o Doc. 1 junto às presentes Alegações, conclui-se que o douto Aresto recorrido não atendeu a tais elementos probatórios, o que é agravado pelo facto de os mesmos serem documentos autênticos e, nessa medida, terem força probatória plena;

10. O indevido uso efectuado pelo Tribunal recorrido dos poderes conferidos pela lei ao alterar a matéria de facto obriga à reposição da "matéria fáctica estabelecida pelo Tribunal de 1ª Instância (artigo 722°. n° 2 do C.P.C.), devido ao douto Aresto ter incorrido em:
10.1 - Desrespeito à força probatória plena da certidão de sentença de fls. 319 a 336, conforme determinam os artigos 369° e 371° do Código Civil, o que constitui violação dos artigos 659°, n° 2 e n° 3 e 713°, n° 2, ambos do C.P.C.;
10.2 - Ofensa à excepção de caso julgado, de acordo com o preceituado pelos artigos 493°, n° 2, 497°, n° 2 e 498°, todos do C.P.C.;
10.3 - Desrespeito à força probatória plena reconhecida ao auto de Inspecção Judicial, como documento autêntico, pelos artigos 369° e 371° do Código Civil;
10.4 - Impossibilidade de ocorrerem casos julgados contraditórios, nos termos previstos pelo artigo 675°, do C.P.C.;
10.5 - Lapso manifesto na avaliação da idoneidade das testemunhas, uma vez que o D se referiu, na realidade, a uma deslocação ao local da colisão quando se estava a julgar o mesmo acidente, num outro processo;

11. - Os factos provados na 1ª Instância preenchem cabalmente os requisitos da responsabilidade civil extra-contratual, nomeadamente, no que se refere à culpa e à imputação, pelo que incorrem as RR. na obrigação de indemnizar o Recorrente pelos danos sofridos em consequência do acidente de viação sofrido por este na A2;

12. Mesmo que se admitisse a bondade da decisão proferida pelo Tribunal recorrido - o que só por dever de patrocínio se admite e por mera hipótese, sem conceder - ao considerar não provados os artigos 14° e 15° da Base Instrutória e ao alterar o texto dos artigos 16°, 17°, 18° e 19° da mesma, o que é facto é que daí resultaria, à mesma, a omissão do dever de garantir segurança na circulação por parte da 1ª R. Brisa, SA., e a consequente obrigação de indemnizar porquanto:
12.1 - Estava disposta, nesse troço da A2, uma armação de cimento erguida no terreno contíguo às vedações e encostada a estas, mas a elas exteriores (cfr. fotografia de fls. 36 e texto resultante da alteração aos artigos 16° e 1-,0 da Base Instrutória);
12.2 - Também se encontram, próximos da vedação e exterior a esta, relevos em pedra, do próprio terreno, que podem permitir que esta vedação seja transposta por animas ágeis; uma vez transposta a vedação, depois de galgada a vala da berma da via, podem vir a alcançar a faixa de rodagem (cfr. fotografia de fls. 37 e texto resultante da alteração aos artigos 18° e 19° da Base Instrutória);
12.3 - O cão tinha um elevado porte (cfr. fls. 261 e fls. 518 e artigo 6° da Base Instrutória);
12.4 - Dada a comprovada existência de uma armação de cimento e relevos de terreno encostadas às vedações do local da A2 onde o Recorrente sofreu o acidente, mandava a prudência e uma conduta medianamente diligente que a BRISA, SA, ou promovesse a remoção de tais estruturas físicas ou elevasse e reforçasse a altura das redes das vedações, uma vez que estas se encontravam, em termos úteis, diminuídas e ineficazes;
12.5 - Como explicar que, na mesma zona (Km 32.3 da A2. conforme Doc. junto à p.i.) onde se deu o acidente de viação com o veículo GL, tenham ocorrido, posteriormente a esse, pelo menos, dois despistes com idênticas causas:
- em 12 de Julho de 2000, ao Kms. 33.7 - cfr. participação da G.N.R. de fls. 351 e 352;
- em 2 de Outubro de 2000, ao Km 33.4 - cfr. participação da G.N.R. de fls. 353 e 354;

13. - O contrato de concessão impõe à 1ª R. BRISA, SA. a obrigação de assegurar e zelar pela comodidade e segurança do trânsito nas auto- estradas (cfr., entre outras, a Base XXXVI n° 2 do Dec. Lei nº 294/97, de 24 de Outubro) e procura colocar a salvo os legítimos direitos dos utentes de tais vias, pelo que caso estes sofram qualquer violação recai sobre o lesante o dever de reparar os danos suportados pelo lesado, nos termos do disposto no artigo 483°, n° 1 do Código Civil;

14. Uma vez que a 1ª R. BRISA, SA. omitiu a conduta adequada à erradicação ou prevenção do perigo - o que constitui um dever legal para essa sociedade como decorre do contrato de concessão - assume a responsabilidade pelos prejuízos provocados por tal comportamento omissivo, de acordo com o disposto no artigo 486° do Código Civil;

15. - A 1ª R. BRISA, SA. omitiu o dever de conservar em bom estado as vedações e tem de responder pelos danos que causou ao ora Recorrente por via de tal comportamento omissivo, o qual viola flagrantemente as normas que figuram no D.L. 294/97, de 24 de Outubro;

16. - Foi produzida prova bastante do comportamento negligente, omissivo e grosseiro da BRISA, SA., razão pela qual se deve manter a condenação desta concessionária, determinada pela 1ª Instância, o que é válido quer se analise os factos apurados pela óptica da responsabilidade extra-contratual, quer se o faça pelo prisma da responsabilidade contratual.

A Brisa, SA., entende não ocorrer caso julgado nem, de sua parte, responsabilidade culposa, pelo que inexiste obrigação de indemnizar a seu cargo.
A Seguradora lembra que o Supremo Tribunal não pode alterar a matéria de facto e conclui, também, pela bondade do decidido.

Colhidos os vistos de lei e nada obstando, começaremos pela apreciação da reclamação para a conferência.

Com as alegações juntou o Recorrente certidão do auto de inspecção judicial realizado aquando do julgamento de acção sumaríssima, em 9 de Julho de 2001.
Por despacho do Relator foi tal documento mandado desentranhar porque, datando o documento de 9.7.2001 e o julgamento na Relação de Julho de 2003, não podia considerar-se superveniente, nos termos do art. 727º do CPC.
Reclama o Recorrente para a conferência para ver admitido o documento pois
- se encontra justificado pela situação prevista nº 2 do art. 729º e pelo nº 2 do (in fine) do art. 722º, ambos do CPC;
- é necessário por força da alteração da matéria de facto levada a cabo, infundadamente como alegou o Recorrente, pelo Acórdão em crise; e
- é pertinente por se tratar de um documento autêntico (certidão de auto de inspecção judicial), com relevância para a decisão da causa.

Dispõe o art. 727º do CPC:
«Com as alegações podem juntar-se documentos supervenientes, sem prejuízo do disposto no nº 2 do artigo 722º e no nº 2 do art. 729º».

Comentando esta norma diz o Conselheiro Rodrigues Bastos, como referido no despacho reclamado:
«São supervenientes os documentos de que a parte não dispunha à data em que se iniciou, na Relação, a fase do julgamento, isto é, quando o processo foi com vista ao primeiro adjunto; tais documentos, se tiverem interesse para a decisão do recurso, poderão ser juntos até à apresentação das alegações; esta disposição não alarga o poder cognitivo do Supremo relativamente à matéria de facto.»

E o Conselheiro Amâncio Ferreira, na obra também ali indicada:
«É limitada, em confronto com o que ocorre no julgamento da apelação (art. 706.°), a possibilidade da junção de documentos no recurso de revista (art. 727.°).
Enquanto no primeiro, os documentos podem ser juntos ou com as alegações ou posteriormente a elas, no segundo apenas o podem ser com as alegações; ainda, no primeiro, os documentos que podem ser juntos com as alegações são tanto os supervenientes como os que se tomarem necessários em virtude do julgamento proferido pelo tribunal recorrido, ao passo que no segundo os documentos que podem ser juntos são apenas os supervenientes, na circunstância os que a parte não pôde juntar na Relação até ao início dos vistos aos juízes, ou por não ter conhecimento da sua existência, ou por não ter podido fazer uso deles, ou por eles ainda se não terem constituído.

A faculdade de juntar documentos com as alegações da revista não significa que o Supremo possa conhecer da matéria de facto ou alterar a fixada pela 2ª instância. Daí, na parte final do art. 727.°, haver o cuidado de se referir que a junção de documentos ocorre "sem prejuízo do dis-posto no nº 2 do art. 722º e no nº 2 do art. 729º.
Para que servirão então os documentos juntos pelas partes? Segundo Alberto dos Reis, "os documentos podem servir para estabelecer ambiente favorável a quem os junta, podem contribuir para criar, no âmbito dos julgadores, determinada disposição ou inclinação, podem reforçar o que na Relação se tenha decidido, nas não podem autorizar o Supremo a revogar ou modificar o julgamento de facto emitido pelo tribunal de 2ª instância".

Há contudo um caso excepcional em que o documento junto pela parte é susceptível de ter reflexos no desfecho do recurso de revista. Tal ocorrerá quando a existência da figura jurídica ajuizada só possa provar--se por certo tipo de documento não junto aos autos, bastando-se a Relação, para a dar como verificada, com a prova testemunhal ou com um documento de força probatória inferior. Se o recorrido juntar com a sua contra-alegação o documento exigido por lei, que não lhe foi possível apresentar até ao início da fase do julgamento na Relação, o Supremo acabará por negar a revista. Pense-se na prioridade de pagamento reclamada por determinado credor sobre o valor de certo imóvel, com base em hipoteca voluntária constituída por documento particular e que as instâncias reconheceram, não obstante o art. 714.° do CC determinar que o acto de constituição da hipoteca voluntária, quando recaia sobre bens imóveis, dever constar de escritura pública ou de testamento. Entretanto, e já após o início da fase de julgamento na Relação, o credor, depois de uma busca no espólio de seu falecido pai de quem herdara o crédito, veio aí encontrar a escritura de constituição da hipoteca, confirmativa da anteriormente feita através de documento particular, bem como o certificado do seu registo (art. 4.°, nº 2, do C. R. Predial). O recorrido logrará que o Supremo negue a revista, juntando com a sua contraminuta uma certidão da escritura de constituição da hipoteca e o certificado do seu registo».

Da simples leitura destes ensinamentos resulta que não colhe, aqui no recurso de revista, o invocado ensinamento do Professor Antunes Varela para o recurso de apelação, como expressamente Ele ensina quando se refere à «decisão da 1ª Instância» e resulta da letra do art. 706º, nº 1, do CPC: «ou no caso de a junção apenas se tornar necessária em virtude do julgamento proferido na 1ª instância».
Por isso se disse há pouco que «É limitada, em confronto com o que ocorre no julgamento da apelação (art. 706.°), a possibilidade de junção de documentos no recurso de revista (art. 727.°)».

Nem há qualquer semelhança com a situação examinada pelo Professor Alberto dos Reis, mesmo no facto de, em tal exemplo, o recorrido não ter podido juntar o documento na 2ª instância.

Não sendo o documento superveniente não pode ser junto com as alegações da revista, sem necessidade de se apreciar a sua força probatória que, como se verá, não é, nem de longe, a que o Recorrente lhe atribui e jamais poderia levar este Supremo Tribunal a alterar a decisão de facto da Relação.
Termos em que se desatende a reclamação.

As questões submetidas à nossa apreciação são as de saber se

I - a Relação, alterando a decisão sobre a matéria de facto, violou caso julgado formado pela sentença proferida na acção sumaríssima junta por certidão de fs. 319 a 336 (referida na parte final dos factos provados) e decidiu contra factos provados por documentos autênticos que são essa certidão e o auto de inspecção ao local a que se procedeu aquando do julgamento de tal acção, junto com as alegações da revista - conclusões 1ª a 10.5ª;
II - mesmo com a factualidade assente pela Relação, devem as RR ser condenadas por ter a Brisa agido com culpa por violação da Base XXXVI, nº 2, do Dec-lei nº 294/97, nos termos dos art. 483º e 486º do CC - conclusões 11ª a 16ª.

Mas antes é mister ver que a Relação assentou nos seguintes Factos - (1)
A - A R. Brisa transferiu para a Seguradora B, por meio de contrato de seguro, titulado pela apólice n° 87/38.299, a sua responsabilidade civil pelos danos causados a terceiros decorrentes da exploração e conservação da rede de Auto-Estrada do Sul - A2, Lisboa-Setúbal, da qual é concessionária;
1 e 2 - Em 9.08.1999, pelas 23h55, o autor circulava com a sua viatura Honda Civic, matrícula GL, na Auto-Estrada do Sul, no sentido Sul Norte, tendo pago a respectiva portagem;
3 e 4 - Ao km 32, quando o autor seguia pela faixa da esquerda, surge no meio desta, um cão, que atravessou a estrada da direita para a esquerda, atento o sentido de marcha do autor;
5 e 6 - O cão - que tinha elevado porte - apareceu de modo imprevisto e inopinado.
8 e 9 - O autor tentou evitar o embate, accionando os travões e virando a direcção, mas não conseguiu, acabando por atropelar o animal, projectando-o.
10 - O autor conduz veículos ligeiros há mais de catorze anos.
11 e 12 - Com o embate, o veículo Honda entrou em despiste, desgovernado, e acabou por colidir com a parte da frente no «rail» do separador central.
13 - Em virtude do acidente, o carro do autor teve de ser retirado da A2 através de reboque, por ter os órgãos de locomoção próprios danificados;
16 - Nesse troço da A2 estava disposta uma armação de cimento, erguida no terreno contíguo às vedações, encostada e exterior a estas, que pode ser usada como trampolim por animais.
17 a 19 - Também se encontram, próximos da vedação e exterior a esta, relevos em pedra, do próprio terreno, que podem permitir que esta (vedação) seja transposta por animais ágeis; uma vez transposta a vedação, depois de galgada a vala da berma da via, podem vir a alcançar a faixa de rodagem.
22 - Após o acidente, o Autor dirigiu-se à portagem de Coina, onde apresentou a reclamação lavrada no Livro 12, fls. 35, perante funcionários da Brisa;
23 - Em 12.08.99, o autor recebeu, via fax, o despacho da Brisa, de fls. 43-44, dizendo não poder ser responsabilizada pelo sucedido;
24 e 25 - Em 18.08.99, o autor remeteu à Brisa carta registada com aviso de recepção em que apresentou reclamação contra o despacho agora referido; a Brisa, por carta de 20.08.99, comunicou ao autor que tinha efectuado a participação do ocorrido à R. Seguradora.
26 - Em 1.09.99, o autor enviou à segunda Ré cópia da reclamação que tinha apresentado à primeira R.
27 - Em 22.09.99, através de correio registado, o autor reclamou à 1ª R. o pagamento da quantia de 625.264$, referentes a danos sofridos no acidente.
28 - O autor pagou à F, a nota de débito 100.000464, na quantia de 426.401$00, correspondente ao valor da franquia referente à factura da sua companhia de seguros, referente à reparação do seu veículo Honda.
29 e 30- O autor alugou um veículo automóvel durante o período em que o seu veículo se encontrava a reparar, tendo pago a quantia de 98.935$.
31 - O autor pagou à Inspeauto - Centro de Inspecções, Lda, a quantia de 4.329$, para que lhe pudessem ser devolvidos o livrete e o título de registo de propriedade da sua viatura.
32 - Por ter tido necessidade de accionar a sua apólice de seguro de danos próprios, que tem para a sua viatura Honda, o Autor vai perder os bónus em duas anuidades e pagar o agravamento do prémio no valor não inferior a 95.600$.
33 - Em consequência do acidente, a viatura do autor sofreu uma desvalorização comercial de, pelo menos, 200.000$.
34 a 36 - Devido ao acidente o autor ficou incapacitado para o trabalho durante alguns dias e, durante esse período, não pôde comparecer no escritório onde labora (factos 31 e 32 da sentença), o que lhe causou autor teve prejuízos.
39 e 40 - O Autor teve de recorrer ao médico devido às dores no tórax e nos membros que sofreu nos dias seguintes ao acidente e também pelo quadro de ansiedade e fobia pela condução de veículos.
41 - Face à patologia apresentada, o autor foi submetido a tratamento de psicoterapia durante vários meses, devido à perturbação post «stress traumático» que sofreu.
42 - Os serviços da Brisa procedeu à fiscalização diária e regular da Auto-Estrada, através de brigadas móveis;
43 - Também as Brigadas da BT/GNR efectuam tal fiscalização, através de circulação nas faixas de rodagem.
44 - As vedações são verificadas pelo pessoal da obra civil da Brisa, encarregue da manutenção das mesmas, às segundas, quartas e sextas-feiras, no período de Verão; e às segundas e sextas-feiras, no período de Inverno.

Mais está provado:
- Por sentença de 12.7.2001, na acção sumaríssima nº 181/2000 que correu termos pelo 4º Juízo Cível de Setúbal, movida por "E", seguradora do ora Recorrente Dr. A, contra "Brisa-Auto-Estradas de Portugal, SA, foi esta condenada a pagar à A. a quantia de 647.294$00, com juros de mora desde a citação, sendo 632.493$00 da parte da reparação do veículo do Segurado, suportada pela A. Seguradora, e 14.801$00 do custo da peritagem efectuada, tudo em consequência do acidente aqui em apreço que se julgou ter ficado a dever-se a culpa da Brisa por a vedação ser contornável, "qualquer cão a poderia saltar" - certidão de fs. 319 a 336.

- Nesta acção procedeu-se a inspecção ao local, em 9.7.2001, ficando no respectivo auto consignado
INSPECÇÃO AO LOCAL
--- Nessa sequência em conformidade com o disposto no artigo 615º do C.P.C., fez consignar na acta o seguinte:---
--- 1 - No espaço circundante da auto estrada, do lado direito, considerando o sentido Setúbal / Lisboa, entre os quilómetros 33 e 32 existe uma "roulotte" onde habitam pessoas, junto da qual havia cães de pequeno porte e um cão de raça pastor alemão, ainda jovem, preso a um pinheiro;---
--- 2 - Do mesmo lado da auto-estrada, a cerca de 30 a 40 m do 1º viaduto que existe entre os mencionados quilómetros 33 e 32, há um troço da vedação junto do qual há uma pedra, com cerca de vinte a trinta cm de largura a 10 cm da rede, de cujo topo ao cimo da vedação incluindo o arame farpado distam 54 cm;---
--- 3 - Na zona onde se situa essa pedra o arame farpado que encima a rede encontra-se solto do poste que fica a 2,48 m da aludida pedra;---
--- 4 - Não existe o grampo que deveria segurar esse arame farpado e o aspecto do poste em madeira indicia que o mesmo já se soltou, há, pelo menos, meses, porquanto não há sinais de ferrugem nem diferença na coloração da madeira;---
--- 5 - A 13,70 m da mencionada pedra, existe uma caixa de esgotos, cuja manilha superior é em forma de cone incompleto, a qual se encontra aberta, distando a sua parte superior da rede 70 cm e do topo dessa tampa ao limite superior da rede, incluindo o arame farpado, a distância é de 45 cm;---
--- 6 - Entre os dois referidos quilómetros existem pelo menos três vivendas que se encontram devidamente vedadas, sendo as respectivas vedações autónomas da auto-estrada e eficazes no que respeita ao impedimento de passagem de cães;---
-- 7 - Próximo do primeiro viaduto que se segue ao mencionado quilometro 33, também do lado direito existe uma vivenda na qual funciona uma criação de cães e que também é utilizada como "hotel para cães;---
--- 8 - Tal vivenda mostra-se vedada em termos eficazes para impedir a passagem de cães.

Só depois de assentarmos na factualidade atendível para decisão é que podemos aplicar-lhe o direito. Temos, pois, de começar a análise do recurso pela decisão da 1ª questão, a de saber se a Relação decidiu contra factos protegidos por caso julgado ou provados por documento autêntico. O que supõe prévia análise dos poderes deste Supremo Tribunal para apreciar o uso ou não uso, pela Relação, das competências fixadas no art. 712º do CPC e do conceito de caso julgado.

Nos termos do art. 712º do CPC,
1. A decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação:
a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 690.º-A, a decisão com base neles proferida;
b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas;
c) Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou.
2. No caso a que se refere a segunda parte da alínea a) do número anterior, a Relação reaprecia as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em atenção o conteúdo das alegações de recorrente e recorrido, sem prejuízo de oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados.
3. A Relação pode determinar a renovação dos meios de prova produzidos em 1ª instância que se mostrem absolutamente indispensáveis ao apuramento da verdade, quanto à matéria de facto impugnada, aplicando-se às diligências ordenadas, com as necessárias adaptações, o preceituado quanto à instrução, discussão e julgamento na Iª instância e podendo o relator determinar a comparência pessoal dos depoentes.
4. Se não constarem do processo todos os elementos probatórios que, nos termos da alínea a) do nº 1, permitam a reapreciação da matéria de facto, pode a Relação anular, mesmo oficiosamente, a decisão proferida na Iª instância, quando repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto ou quando considere indispensável a ampliação desta; a repetição do julgamento não abrange a parte da decisão que não esteja viciada, podendo, no entanto, o tribunal ampliar o julgamento de modo a apreciar outros pontos da matéria de facto, com o fim exclusivo de evitar contradições na decisão.
5. Se a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa não estiver devidamente fundamentada, pode a Relação, a requerimento da parte, determinar que o tribunal de 1ª instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados ou repetindo a produção da prova, quando necessário; sendo impossível obter a fundamentação com os mesmos juízes ou repetir a produção da prova, o juiz da causa limitar-se-á a justificar a razão da impossibilidade.
6 - Das decisões da Relação previstas nos números anteriores não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.

De notar que o nº 6 - proíbe o recurso, para este Supremo Tribunal, das decisões da Relação em matéria de facto - foi acrescentado pelo artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 375-A/99, de 20 de Setembro e é aqui aplicável, como a todos os processos entrados depois de 20 de Outubro de 1999 (art. 8º, nº 2 e 9º do dito Dec-lei).
Nos termos do art. 721º do CPC,
1. Cabe recurso de revista do acórdão da Relação que decida do mérito da causa.
2. O fundamento específico do recurso de revista é a violação da lei substantiva, que pode consistir tanto no erro de interpretação ou de aplicação, como no erro de determinação da norma aplicável; acessoriamente, pode alegar-se, porém, alguma das nulidades previstas nos artigos 668.º e 716.º.
3. Para os efeitos deste artigo, consideram-se como lei substantiva as normas e os princípios de direito internacional geral ou comum e as disposições genéricas, de carácter substantivo, emanadas dos órgãos de soberania, nacionais ou estrangeiros, ou constantes de convenções ou tratados internacionais.

Como disposto no art. 722º do mesmo CPC,
1. Sendo o recurso de revista o próprio, pode o recorrente alegar, além da violação de lei substantiva, a violação de lei de processo, quando desta for admissível o recurso, nos termos do nº 2 do artigo 754.º, de modo a interpor do mesmo acórdão um único recurso.
2. O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de recurso de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova.
3. Se o recorrente pretender impugnar a decisão apenas com fundamento nas nulidades dos artigos 668.º e 716.º, deve interpor agravo. Neste caso, se a decisão for anulada, da que a reformar, quando proferida pelo tribunal recorrido, pode ainda recorrer-se de revista, com fundamento na violação de lei substantiva.

Diz o art. 729º do referido diploma processual:
1. Aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, o Supremo aplica definitivamente o regime jurídico que julgue adequado.
2. A decisão proferida pelo tribunal recorrido quanto à matéria de facto não pode ser alterada, salvo o caso excepcional previsto no nº 2 do artigo 722.º.
3. O processo só volta ao tribunal recorrido quando o Supremo entenda que a decisão de facto pode e deve ser ampliada, em ordem a constituir base suficiente para a decisão de direito, ou que ocorrem contradições na decisão sobre a matéria de facto que inviabilizam a decisão jurídica do pleito.

Discutiu-se no passado se o STJ podia exercer censura sobre o comportamento da Relação reportado ao não uso ou ao uso dos seus poderes de alteração e anulação da decisão proferida na 1ª instância sobre a matéria de facto.
Firmou-se então jurisprudência no sentido de essa censura não poder ser exercida quando a Relação não fizesse uso dos seus poderes de alteração e anulação; se o fizesse, competia ao STJ verificar se a Relação agira dentro dos limites traçados por lei para os exercer, por tal constituir matéria de direito, embora sem poder sindicar a apreciação das provas a que a Relação houvesse procedido, visto tal actividade respeitar ao apuramento da matéria de facto.
Presentemente, também o STJ não pode, a solicitação da parte interessada, exercer censura sobre o uso dos poderes por parte da Relação no que concerne ao julgamento da matéria de facto do tribunal de 1ª instância. E isto por a decisão da Relação que implemente tais poderes ser hoje insusceptível de recurso (nº 6 do art. 712.°, aditado pelo DL nº 375-A/99, de 20 de Setembro).
Porém o Supremo pode ex officio exercer tacitamente censura sobre o não uso por parte da Relação dos poderes de alteração ou anulação da decisão de facto, sempre que entenda dever esta decisão ser ampliada, em ordem a constituir base suficiente para a decisão de direito, ou que ocorrem contradições na decisão sobre a matéria de facto que inviabilizam a decisão jurídica do pleito, ante o estatuído no nº 3 do art. 729º.

Tanto na apreciação do recurso de revista como no de agravo, o STJ só conhece de questões de direito (art. 26.° da LOFTJ). Não controla a matéria de facto nem revoga por erro no seu apuramento; compete-lhe antes fiscalizar a aplicação do direito aos factos seleccionados pelos tribunais de primeira e segunda instâncias (arts. 722.°, nº 2, 729.°, n.os 1 e 2, e 755.°, nº 2). Daí dizer-se que o STJ é um tribunal de revista e não um tribunal de 3ª instância (art. 210.°, n.º 5, da CRP).
Fundamento específico da revista, segundo o nº 2 do art. 721º, é a violação da lei substantiva, que pode consistir tanto no erro de interpretação ou de aplicação, como no erro de determinação da norma aplicável.
Confirmando que o STJ só decide questões de direito, diz-se no nº 2 do art. 722º que o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de recurso de revista. A esta regra introduz o mesmo preceito duas excepções:
1ª - Ofensa duma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto;
2ª - Ofensa de preceito expresso de lei que fixe a força de determinado meio de prova.

Resulta do nº 1 do art. 729.° que o STJ julga normalmente através do sistema de substituição: aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, o Supremo aplica definitivamente o regime jurídico que julgue adequado.
No que concerne à matéria de facto, o STJ tem de acatar a adquirida nos autos, que não tem necessariamente de coincidir com a seleccionada pela Relação. Além disso, pode também o STJ servir-se dos factos notórios e dos que chegarem ao seu conhecimento por virtude do exercício das suas funções (art. 514.°), não só em vista à correcção do apuramento fáctico feito com base neles pelas instâncias mas igualmente para completar esse apuramento, quando as instâncias os não tenham considerado. Ainda, o STJ pode alterar a decisão da 2.ª instância sobre a matéria de facto nos casos excepcionais previstos no n.º 2 do art. 722.° (art. 729.°, nº 2).
Mas, em regra, o Supremo não se pronuncia sobre a verdade dos factos em que se baseia a invocada infracção à lei. Compete-lhe antes apurar se foi exacta a aplicação da lei, no pressuposto de que os factos aos quais a aplicou o tribunal a quo são verdadeiros tal como ele os considerou provados.

Não podendo, em regra, alterar a decisão sobre a matéria de facto, é permitido, contudo, ao Supremo fazer voltar o processo ao tribunal recorrido quando entenda que a decisão de facto deve ser ampliada, de forma a constituir base suficiente para a decisão de direito, ou que ocorrem contradições na decisão sobre a matéria de facto que inviabilizam a decisão jurídica do litígio (art. 729.°, nº 3).

A anulação não é decretada pelo STJ, que apenas manda julgar de novo na 2ª instância. Esta é que, se não puder cumprir a decisão do STJ, no âmbito dos seus poderes da modificabilidade das decisões de facto, tem de anular a decisão da 1ª instância, a fim de a matéria de facto ser alargada ou desobstruída de contradições.

Na linha do exposto, não é admissível recurso para o STJ contra a selecção da matéria de facto, incluída na base instrutória ou considerada como assente (arts. 511.°, n.os 2 e 3, nem tão-pouco das decisões da Relação respeitantes a matéria de facto (art. 712.°, nº 6) - (2).
Documentos autênticos são os documentos exarados, com as formalidades legais, pelas autoridades públicas nos limites da sua competência ou, dentro do círculo de actividade que lhe é atribuído, pelo notário ou outro oficial público provido de fé pública; todos os outros documentos são particulares - art. 363º, nº 2, do CC.
Os documentos autênticos fazem prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade ou oficial público respectivo, assim como dos factos que neles são atestados com base nas percepções da entidade documentadora; os meros juízos pessoais do documentador só valem como elementos sujeitos à livre apreciação do julgador - art. 371º, nº 1, CC.

Nos termos do art. 655º, n.os 1 e 2, do CPC, o tribunal colectivo aprecia livremente as provas, decidindo os juízes segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto.
Mas quando a lei exija, para a existência ou prova de facto jurídico, qualquer formalidade especial, não pode esta ser dispensada, tendo-se por não escritas (nº 4 do art. 646º CPC) as respostas do Tribunal Colectivo sobre questões de direito e bem assim as dadas sobre factos que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, por documento, acordo ou confissão da partes.

Da mesma forma a Relação decide livremente os factos, podendo alterar a decisão da 1ª Instância sobre a matéria de facto no sentido que julgue mais correcto, sempre que esteja de posse dos mesmos elementos de prova que serviram ao Julgador de facto. Mas não pode, igualmente, decidir contra factos que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, por documento, acordo ou confissão da partes. É que neste caso o erro na fixação dos factos materiais da causa pode ser objecto do recurso de revista - art. 722º, nº 2, do CPC.

As respostas a quesitos podem ser restritivas ou explicativas, desde que se mantenham dentro da matéria articulada (Col. Jur. 1983, tomo IV, pág. 143) e sempre se entendeu que a resposta negativa a um quesito significa apenas que dele nada se provou e não que se haja provado o contrário do que nele se perguntava (entre muitos outros, os Ac. nos BMJ 334-430 e 324-545).

Nos termos do nº 1 do art. 671º do CPC
1. Transitada em julgado a sentença, a decisão sobre a relação material controvertida fica tendo força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 497.º e seguintes, sem prejuízo do que vai disposto sobre os recursos de revisão e de oposição de terceiro. Têm o mesmo valor que esta decisão os despachos que recaiam sobre o mérito da causa.
2. -
Dispõe, por seu turno, o artigo 672.º, sob a epígrafe "caso julgado formal":
Os despachos, bem como as sentenças, que recaiam unicamente sobre a relação processual têm força obrigatória dentro do processo -

Diz o art. 673.º, sobre o alcance do caso julgado:
A sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga: se a parte decaiu por não estar verificada uma condição, por não ter decorrido um prazo ou por não ter sido praticado determinado facto, a sentença não obsta a que o pedido se renove quando a condição se verifique, o prazo se preencha ou o facto se pratique.

Nos termos dos n.os 1 e 2 do art. 497º do CPC, a excepção (dilatória) do caso julgado pressupõe a repetição de uma causa depois de a primeira causa ter sido decidida por sentença que já não admite recurso ordinário.
Tanto a excepção da litispendência como a do caso julgado têm por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior.

Como disposto no art. 498º do mesmo diploma,
1. Repete-se a causa quando se propõe uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir.
2. Há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica.
3. Há identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico.
4. Há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico. Nas acções reais a causa de pedir é o facto jurídico de que deriva o direito real; nas acções constitutivas e de anulação é o facto concreto ou a nulidade específica que se invoca para obter o efeito pretendido.

Em regra, «O que adquire a força e a autoridade de caso julgado é a posição tomada pelo juiz quanto aos bens ou direitos (materiais) litigados pelas partes e a concessão ou denegação da tutela jurisdicional para esses bens ou direitos. Não a motivação da sentença: as razões que determinaram o juiz; as soluções por ele dadas aos vários problemas que teve de resolver para chegar àquela conclusão (pontos ou questões prejudiciais)» - (3).

Aplicando estes ensinamentos ao caso em apreço, temos por certo que a Relação não decidiu nem contra factos protegidos por caso julgado nem plenamente provados, nomeadamente por documento autêntico.

A acção sumaríssima julgada pelo Tribunal de Setúbal tinha, como pano de fundo e causa de pedir, essencialmente, os mesmos factos aqui em causa; os pedidos formulados além e aqui são pedidos indemnizatórios de danos provocados pelo mesmo acidente; mas os AA são diferentes: além foi demandante a Seguradora do aqui A., pedindo o reembolso do que, naquela qualidade, pagou ao seu Segurado e era da responsabilidade das RR; aqui o A. pede a reparação dos danos por si sofridos. Não obstante esta diferença, não custa admitir a identidade de causas a que se refere o nº 1 do art. 498º do CPC.
Mas o certo é que o caso julgado se formou sobre a posição tomada pelo juiz quanto aos bens ou direitos (materiais) litigados pelas partes e a concessão ou denegação da tutela jurisdicional para esses bens ou direitos. A motivação da sentença, as razões que determinaram o juiz, as soluções por ele dadas aos vários problemas que teve de resolver para chegar àquela conclusão (pontos ou questões prejudiciais) não ficam abrangidos pela força de caso julgado.

Os factos provados numa acção não ficam, sem mais, provados noutra.
Com efeito e nos termos do art. 522º do CC,
1. Os depoimentos e arbitramentos produzidos num processo com audiência contraditória da parte podem ser invocados noutro processo contra a mesma parte, sem prejuízo do disposto no nº 3 do artigo 355.º do Código Civil; se, porém, o regime de produção da prova do primeiro processo oferecer às partes garantias inferiores às do segundo, os depoimentos e arbitramentos produzidos no primeiro só valem no segundo como princípio de prova.

«Mas o preceito refere-se à invocação das provas e não à apreciação do tribunal, pois é sabido que o caso julgado só se forma sobre a decisão, delimitada pelo objecto da acção, identificado pelo pedido e pela causa de pedir, nos termos dos arts. 497° e 498º do C.P.C. Assim, não pode ser invocada em qualquer processo a matéria de facto dada como provada em outro processo anterior, ainda que entre as mesmas partes - (4),e «os factos provados em anterior acção, só por si não constituem resolução integral de qualquer questão, e, portanto, sobre eles não pode formar-se caso julgado. A factualidade provada em determinada acção tem o alcance de simples caso julgado formal - (5).

De resto, não se enxerga grande diferença entre os factos provados naquela acção sumaríssima (fs. 322 a 324) - que já inclui os relatados no auto de inspecção agora junto e não admitido - e os fixados pela Relação.
Lá se mantêm as pedras e caixa de esgotos junto à rede e no espaço considerado, entre os quilómetros 32 e 33, a vedação aparenta estar em bom estado de conservação.
A única diferença daquela factualidade para a aqui considerada é que à data de 09-07-2001 esse arame farpado estava solto do poste que fica a 2,48 m da pedra referida no número seguinte, já não existindo o grampo que o deveria segurar e o aspecto do poste indicia que se encontra assim, há, pelo menos, meses, porquanto não existiam sinais de ferrugem, nem diferença na coloração da madeira.
Mas, tendo o acidente ocorrido em 9 de Agosto de 1999, nada nos garante que já então estivesse solto o arame farpado, como se verificou na inspecção ao local, em Julho de 2001, quase dois anos depois.
A decisão foi diferente naquela acção sumaríssima e na Relação porque além se entendeu caber à Brisa pôr cobro a situações que, em termos da experiência comum e dentro de parâmetros de grande razoabilidade, são passíveis de, a qualquer momento, permitirem o surgimento inopinado de animais na via, pondo em risco a vida de quem nelas transita.

Inverificado caso julgado ou prova plena de quaisquer factos, podia a Relação alterar a decisão da 1ª Instância sobre a matéria de facto, nos termos do art. 712º, nº 1, a), e 2, do CPC. E não pode este Supremo Tribunal sindicar essa decisão da Relação por dela não caber recurso - art. 712º, nº 6, do CPC.
Os factos assentes a que aplicaremos o direito são, pois, os assim julgados pela Relação.
Pelo que se desatende o arrazoado e concluído de 1 a 10.5.

Aplicando a estes factos o Direito

Questão de fundo é a de saber se as RR estão constituídas na obrigação de indemnizar o A. pelos danos sofridos em consequência do acidente havido quando, cerca da meia noite de 9 de Agosto de 1999, circulava na Auto-estrada A2, no sentido Setúbal - Lisboa.

Responsabilidade civil é a obrigação imposta a alguém de reparar os danos sofridos por terceiro. E pode ter natureza contratual - é a proveniente da falta de cumprimento das obrigações emergentes dos contratos, de negócios unilaterais ou da lei, quando as obrigações em sentido técnico provêm da lei; ou extracontratual, se resultante da violação de direitos absolutos ou da prática de actos que, embora lícitos, causam prejuízo a outrem. Na responsabilidade extracontratual, a obrigação de indemnizar nasce, em regra, da violação de uma disposição legal ou de um direito absoluto que é inteiramente distinto dela.
A responsabilidade contratual vem regulada nos art. 798º - (6). e ss, no campo do incumprimento e mora, enquanto que a extracontratual encontra guarida própria no capítulo «fontes das obrigações», art. 483º e ss.
Para além de os efeitos serem comuns (art. 562º) e de a culpa ser apreciada nos mesmos termos, os da responsabilidade civil extracontratual (799º, 2 e 487º, 2, pela diligência de um bom pai de família), na responsabilidade civil contratual o ónus da prova da culpa recai sobre o devedor - 799º, 1 - enquanto que na extracontratual cabe ao lesado, salvo beneficiando de presunção legal, provar a culpa do autor da lesão - 487º, nº 1).
O mesmo acto pode envolver para o agente, simultaneamente, responsabilidade contratual (por violar uma obrigação) e responsabilidade extracontratual (por infringir ao mesmo tempo um dever geral de abstenção ou o direito absoluto correspondente.
Perante uma situação concreta, sendo aplicáveis paralelamente as duas espécies de responsabilidade civil, de harmonia com o princípio da consunção, o facto deve, em primeira linha, considerar-se ilícito contratual, pois de um prisma dogmático o regime da responsabilidade contratual «consome» o da extra-contratual - (7).

Já Vaz Serra - (8), ensina: «a solução que se afigura preferível é a de que são aplicáveis as regras de ambas as responsabilidades, à escolha do lesado, pois a solução contrária representaria para este um prejuízo grave quando as normas da responsabilidade extracontratual lhe fossem favoráveis, e não é de presumir que ele tenha querido, com o contrato, afastá-las, não sendo mesmo válida uma convenção prévia de exclusão de algumas delas ... A responsabilidade contratual não exclui a delitual» - (9).

A responsabilidade extracontratual funda-se em geral na culpa (483º,1), excepcionalmente (483º, 2) no risco (499º a 510º), preocupação social de indemnização de lesados sem culpa destes e, em casos residuais, em factos lícitos (1348º, 2 - obrigação de indemnizar os donos dos prédios vizinhos por danos causados por escavações, 1349º, 3 - por acto em estado de necessidade - 339º, nº 2 - por passagem forçada momentânea, expropriações - 1310º).

São normas fundamentais, no tocante à responsabilidade extracontratual fundada na culpa, as constantes dos art. 483º, 486º, 487º e 493º, nº 1:
ARTIGO 483º
(Princípio geral)
1. Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.
2. Só existe obrigação de indemnizar independentemente de culpa nos casos especificados na lei.
ARTIGO 486º
(Omissões)
As simples omissões dão lugar à obrigação de reparar os danos, quando, independentemente dos outros requisitos legais, havia, por força da lei ou do negócio jurídico, o dever de praticar o acto omitido.
ARTIGO 487º
(Culpa)
1. É ao lesado que incumbe provar a culpa do autor da lesão, salvo havendo presunção legal de culpa.
2. A culpa é apreciada, na falta de outro critério legal, pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso.
ARTIGO 493º
(Danos causados por coisas, animais ou actividades)

1. Quem tiver em seu poder coisa móvel ou imóvel, com o dever de a vigiar, e bem assim quem tiver assumido o encargo da vigilância de quaisquer animais, responde pelos danos que a coisa ou os animais causarem, salvo se provar que nenhuma culpa houve da sua parte ou que os danos se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa sua.

No que à responsabilidade contratual respeita, releva o disposto nos art. 405º, 406º, 798º e 799º:
ARTIGO 405º
(Liberdade contratual)

1. Dentro dos limites da lei, as partes têm a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes dos previstos neste código ou incluir nestes as cláusulas que lhes aprouver.
2. As partes podem ainda reunir no mesmo contrato regras de dois ou mais negócios, total ou parcialmente regulados na lei.
ARTIGO 406º
(Eficácia dos contratos)

1. O contrato deve ser pontualmente cumprido, e só pode modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei.
2. Em relação a terceiros, o contrato só produz efeitos nos casos e termos especialmente previstos na lei.
ARTIGO 798º
(Responsabilidade do devedor)

O devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor.
ARTIGO 799º
(Presunção de culpa e apreciação desta)

1. Incumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua.
2. A culpa é apreciada nos termos aplicáveis à responsabilidade civil.

No tocante à perfeição da declaração negocial interessa ter presente o comando do art. 234º:
Artigo 234º
(Dispensa da declaração de aceitação)

Quando a proposta, a própria natureza ou circunstâncias do negócio, ou os usos tornem dispensável a declaração de aceitação, tem-se o contrato por concluído logo que a conduta da outra parte mostre a intenção de aceitar a proposta.

Nos termos do nº1 do art. 217º do mesmo CC, a declaração negocial pode ser expressa ou tácita: é expressa, quando feita por palavras, escrito ou qualquer outro meio directo de manifestação da vontade, e tácita, quando se deduz de factos que, com toda a probabilidade, a revelam.

Porque se trata de acidente em auto-estrada, a A2, com pagamento de portagem - colisão do veículo conduzido pelo A. com um cão de elevado porte, de que resultaram danos patrimoniais e não patrimoniais para o condutor - convém examinar o contrato de concessão desta A2, à data vigente.

Tal contrato - de concessão da construção, conservação e exploração - regula-se pelas Bases Anexas ao Dec-lei nº 264/97, de 24 de Outubro, em vigor desde o dia imediato à sua publicação (art. 7º) e para vigorar (a concessão) até 31 de Dezembro de 2030 (Base XL).
Nos termos do preâmbulo (penúltimo parágrafo), «as bases anexas ao presente diploma consubstanciam o resultado da negociação mantida com a concessionária. O carácter contratual da concessão não é prejudicado pela integração no presente diploma das bases anexas, cuja necessidade resulta da circunstância de algumas dessas bases apresentarem eficácia externa relativamente às partes no contrato».
Ou seja: embora o contrato de concessão tenha como Partes Contratantes o Estado Concedente e a Brisa Concessionária, não pode esquecer-se o carácter normativo de algumas das Bases da Concessão; essas Bases não são simples cláusulas contratuais que obriguem, apenas, os Contratantes. Quis o Legislador que tais Bases tivessem eficácia externa relativamente às partes no contrato. E por isso as integrou em Decreto Lei de que fazem parte integrante (art. 1º).
Interessa notar as seguintes:

Base XV
1 - As taxas de portagem para as diferentes classes de veículos definidas nos termos da base XVI são o produto da aplicação das tarifas de portagem à extensão de percurso a efectuar pêlos utentes, acrescido do IVA à taxa em vigor.

Base XXII
5 - As auto-estradas deverão ainda ser dotadas com as seguintes obras acessórias:
a) - Vedação em toda a sua extensão, devendo ser as passagens superiores em que o tráfego de peões seja exclusivo ou importante também vedadas lateralmente em toda a extensão;

Base XXXIII
1 - A concessionária deverá manter as auto-estradas que constituem o objecto da concessão em bom estado de conservação e perfeitas condições de utilização, realizando, nas devidas oportunidades, todos os trabalhos necessários para que as mesmas satisfaçam cabal e permanentemente o fim a que se destinam, em obediência a padrões de qualidade que melhor atendam os direitos do utente.

Base XXXVI

2 - A concessionária será obrigada, salvo caso de força maior devidamente verificado, a assegurar permanentemente, em boas condições de segurança e comodidade, a circulação nas auto-estradas, quer tenham sido por si construídas, quer lhe tenham sido entregues para conservação e exploração, sujeitas ou não ao regime de portagem.

Base XLVII
1 - A concessionária fica isenta de responsabilidade por falta, deficiência ou atraso na execução do contrato quando se verifique caso de força maior devidamente comprovado.
2 - Para os efeitos indicados no número anterior, consideram-se casos de força maior unicamente os que resultam de acontecimentos imprevistos e irresistíveis cujos efeitos se produzem independentemente da vontade ou das circunstâncias pessoais da concessionária, nomeadamente actos de guerra ou subversão, epidemias, radiações atómicas, fogo, raio, graves inundações, ciclones, tremores de terra e outros cataclismos naturais que directamente afectem os trabalhos da concessão.

Base XLIX
1 - Serão da inteira responsabilidade da concessionária todas as indemnizações que, nos termos da lei, sejam devidas a terceiros em consequência de qualquer actividade decorrente da concessão.

Em matéria de acidentes em auto-estradas é incontornável o estudo do Senhor Professor Sinde Monteiro, na Revista de Legislação e Jurisprudência, anos 131º - 41 e ss, 132º - pág. 29 e ss e 133º - pág. 27 e ss.

Aquele Professor comenta decisões deste Supremo Tribunal e do Tribunal de Santo Tirso e estuda a questão sob três diferentes pontos de vista:
A - Responsabilidade delitual por ser a disciplina potencialmente aplicável a toda a causação de danos na vida social;
B - Responsabilidade contratual por a utilização de auto-estradas estar normalmente condicionada ao pagamento de portagem;
C - Contrato com eficácia de protecção para terceiros que resultaria das obrigações da concessionária, constantes do contrato de concessão (Base XXXVI, nº 2), mesmo quanto a auto-estradas sem portagem (SCUTs).

Sob o prisma responsabilidade delitual, tendo a Brisa em seu poder a auto-estrada no seu todo, não só o piso como também as vedações (que não impedem a entrada de animais), aplicar-se-ia a presunção de culpa do nº 1 do art. 493º CC, consistindo a ilicitude na violação de disposição destinada a proteger interesses alheios: a Base XXII, nº 5, al. a) do contrato de concessão, aprovado pelo Dec-Lei nº 294/97, de 24 de Outubro, que contempla o dever de vedação em toda a extensão, disposição com eficácia externa relativamente às partes no contrato.
O mesmo se diz no respeitante à Base XXXVI, nº 2, que consagra o dever de assegurar a circulação em boas condições de segurança e comodidade, a implicar responsabilidade por pavimento irregular, neve, gelo, manchas de óleo, etc.
Nas restantes estradas mantém-se a presunção do nº 1 do art. 493º, mas em menor grau, apenas em relação àqueles obstáculos anormais, como valas e outros não sinalizados, em violação do art. 5º do C. Estrada. O menor dever de vigilância e a mais baixa velocidade nessas estradas levam a esse afrouxamento da presunção de culpa.

De acordo com a corrente maioritária da jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, é aplicável à responsabilidade civil extracontratual das autarquias locais por acto ilícito de gestão pública a presunção de culpa estabelecida no artigo 493º nº 1, do Código Civil.
Com base nesta presunção, os Municípios têm respondido pelos danos provocados em consequência de acidente de viação ocorrido com veículo automóvel que caiu num buraco existente numa estrada municipal ou em rua com tampa de saneamento saliente acima do solo e que danifica automóvel que nela bate - (10).

A responsabilidade contratual da Concessionária da auto-estrada resultaria do incumprimento do contrato de direito privado celebrado com o Utente em que a taxa de portagem é mais o preço de uma prestação de serviço do que taxa de direito público.
Estaríamos em presença de contrato entre o utente e a concessionária, empresa de direito privado e fim lucrativo. Ao pagamento do preço do serviço, proporcional à extensão do troço percorrido (incluindo Imposto sobre o Valor Acrescentado) corresponde da parte da Concessionária a obrigação de, salvo caso de força maior devidamente verificado, assegurar permanentemente, em boas condições de segurança e comodidade, a circulação nas auto-estradas, quer tenham sido por si construídas, quer lhe tenham sido entregues para conservação e exploração, sujeitas ou não ao regime de portagem.
Permitindo ou não evitando que um cão circule na auto-estrada (facto), pondo em risco vida e fazenda do condutor (ilicitude), a Concessionária incumpre o contrato - 762º, nº 1, a contrario - e torna-se, por isso - art. 798º - responsável pelo prejuízo (dano) que causa (nexo de causalidade entre o facto ou comportamento omissivo e o dano) ao credor (art. 483º e 562º do CC).
A presunção de culpa (nexo de imputação, juízo de censura, do facto ao agente) da Concessionária devedora resultaria aqui do regime fixado no art. 799º, nº 1, do CC.
Aí estão reunidos os cinco elementos da responsabilidade civil culposa, tradicionalmente vistos no art. 483º, nº 1, do CC.

Nas auto-estradas sem portagem, sem custos para os utilizadores (SCUTs) não é possível o apelo directo à responsabilidade contratual. A defesa e protecção dos Utentes está no contrato de concessão enquadrável na figura dos contratos com eficácia de protecção para terceiros.
O próprio preâmbulo do Decreto-Lei nº 294/97 alude a que algumas das bases do contrato de concessão têm «eficácia externa relativamente às partes no contrato» (in fine).
Entre outras, integra-se nesse número a Base XXXVI, cujo nº 2 determina, como se viu, que «a concessionária será obrigada, salvo caso de força maior devidamente verificado, a assegurar permanentemente, em boas condições de segurança e comodidade, a circulação nas auto-estradas, quer tenham sido por si construídas, quer lhe tenham sido entregues para a conservação e exploração, sujeitas ou não ao regime de portagem».
Esta garantia, ligada funcionalmente à observância do disposto em numerosas cláusulas contratuais, tem em vista a protecção de terceiros, os utentes, que são quem vai suportar os efeitos do bom ou defeituoso cumpri-mento das obrigações assumidas pela concessionária, sem que todavia lhes caiba um direito à prestação, como corresponderia à técnica do contrato a favor de terceiro.
Parece assim razoável a inclusão desses terceiros no âmbito de protecção do contrato celebrado com o Estado, o que justifica a chamada à colação da figura dos «contratos com eficácia de protecção para terceiros».

«Com respeito ao grupo de casos mais recente (protecção do património), o que se pretende essencialmente com o recurso a esta moderna figura de «quase-contrato» é conseguir tutela jurídica para interesses (puramente patrimoniais) que, em princípio, não são delitualmente protegidos. Mas a propósito do grupo de casos tradicional, no qual estão em causa bens jurídicos (vida, integridade física, propriedade) que gozam de tutela delitual geral, por integrarem verdadeiros direitos subjectivos (art. 483º, nº 1), a razão de ser do instituto consiste justamente em permitir aos beneficiários usufruírem de certas vantagens do regime jurídico contratual, das quais, no direito português, a mais importante concerne ao ónus da prova da culpa».

Estes ensinamentos do Senhor Professor Sinde Monteiro foram repetidos a propósito de danos causados por arremesso de pedras de passagem superior não vedada - Acórdão deste Supremo Tribunal, de 17.2.2000 (Col. Jur. STJ 00-I-107) - e aparecimento de cão na auto-estrada, (sentença de Santo Tirso) na RLJ 133-17 a 32 e 59 a 66.
Naquele Acórdão concluiu-se, com apoio no ensino do Senhor Professor Antunes Varela -(11):
«O contrato celebrado entre o utente que pretende aceder à auto-estrada e a Brisa, sua concessionária, apresenta-se como uma afloração da relevância das relações contratuais de facto: as relações entre a Brisa-concessionária e o utente não envolvem nenhuma declaração de vontade expressa, antes uma proposta tácita por parte do utente em aceder à auto-estrada, traduzida no pagamento da «taxa-portagem» e na aceitação tácita da Brisa a permitir a utilização da auto-estrada por parte do utente.
Trata-se de um contrato inominado em que o utente tem como prestação o pagamento de uma taxa e a Brisa a contraprestação de permitir que o utente «utilize» a auto-estrada, com comodidade e segurança, sendo certo que o conteúdo da prestação da concessionária Brisa deriva de um dos princípios fundamentais em que assenta toda a disciplina legislativa dos contratos: «o princípio da confiança, assente no stare pactos, segundo o qual cada contraente deve responder pelas expectativas que justificadamente cria, com a sua declaração, no espírito da contraparte (cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, voI. I, 9ª ed., págs. 237-238)».
Não é outro o ensinamento de Galvão Telles - (12), a propósito da contratação automática e da aceitação tácita:
«Como é do conhecimento geral, existem máquinas automáticas, colocadas em locais a que qualquer pessoa pode ter acesso, e que põem à sua disposição determinadas mercadorias, como maços de cigarros, ou até serviços, como os inerentes à utilização de um telefone ou de um parque de estacionamento. Essas máquinas funcionam mediante a introdução de moeda ou moedas; feita a introdução, a mercadoria ou os serviços pretendidos são postos à disposição do utente, que pode retirar a primeira ou utilizar os segundos.
Restringindo-nos, por ora, ao modelo clássico das máquinas automáticas, no sentido restrito da expressão, diremos que se debatem duas teses: a da oferta automática e a da aceitação automática. Em nosso modo de ver, as duas modalidades não se contrapõem, antes se cumulam ou, melhor, sucedem-se uma à outra. O proprietário ou concessionário da máquina, pondo-a à disposição do público, faz uma oferta generalizada, uma verdadeira oferta ao público; aquele que utiliza a máquina, introduzindo o dinheiro ou o cartão, aceita essa oferta; o contrato fica assim fechado e até, algumas vezes, desde logo cumprido, pela aquisição do produto e seu pagamento.

O artigo 234.° do Código Civil, subordinado à epígrafe "dispensa da declaração de aceitação", acha-se redigido nos seguintes termos: "Quando a proposta, a própria natureza ou circunstâncias do negócio ou os usos tornam dispensável a declaração da aceitação, tem-se o contrato por concluído logo que a conduta da outra parte mostre a intenção de aceitar a proposta".
ão pode, em bom rigor, falar-se de dispensa da aceitação. A aceitação é sempre necessária e também existe aqui. Simplesmente, neste caso, apresenta-se como aceitação tácita, porque se deduz dos factos apontados no artigo, que com toda a probabilidade a revelam (art. 217.°, nº 1, in fine).
No entanto, há que acentuar a particularidade, assinalada no artigo 234.°, de que o contrato tem-se por concluído com a aceitação, sem que esta haja de ser comunicada ao proponente, diversamente do que por via de regra acontece».

Mais se disse naquele Acórdão:
«O contrato celebrado entre o utente que pretende aceder à auto-estrada e a Brisa, sua concessionária, como afloração da relevância das relações contratuais de facto, permite-nos precisar que, no caso sub judice, entre o Autor e a Ré Brisa foi celebrado, mediante a convergência de declarações de vontade tácitas (proposta e aceitação) um contrato inominado: o Autor pagou uma «taxa-portagem» e a Ré Brisa obrigou-se a ceder a utilização da auto-estrada AI, com comodidade e segurança.
A celebração desse contrato teve como efeito imediato que o mesmo devia ser pontualmente cumprido - art. 406.°, nº 1, do CC -
Dito de outro modo, a Ré Brisa cumpre com pontualidade a sua prestação proporcionando ao Autor uma circulação cómoda e segura até findar o contrato: quando o Autor sai - deixa de utilizar - da auto-estrada.
O autor só pode exigir da Ré Brisa o dever de proporcionar-lhe uma circulação cómoda e segura na decorrência do contrato, de sorte que o direito do Autor esgota-se com o cumprimento desse contínuo dever».

A resposta à questão «que direitos tem o utente no caso de incumprimento de contrato por parte da Brisa é dada pelo art. 798.° do CC - integrado nos princípios gerais sobre a falta de cumprimento e mora imputáveis ao devedor.
A sanção estabelecida neste preceito é a de o devedor indemnizar o prejuízo causado ao credor, sendo certo que vários pressupostos se devem reunir para o efeito: a ilicitude, a culpa, o prejuízo sofrido pelo credor, o nexo de causalidade entre o facto e o prejuízo.
Os direitos do utente, no caso de incumprimento do contrato por parte da Brisa, esgotam-se no direito a ser indemnizado, já que os demais direitos conferidos ao credor na impossibilidade de cumprimento - o direito à resolução (arts. 801.°, nº 2, e 794.°) - não são configuráveis nesta situação».

E assimilando as duas situações, a do terceiro que arremessa pedras da passagem superior não vedada e a do cão que atravessa a faixa de rodagem, colidindo com o automóvel que ali circula - "equiparação que se nos antolha inaceitável" - (13) -, o referido Acórdão de 2000 concluiu que «ao Autor não assiste o direito de exigir à Brisa a indemnização pelos danos causados no seu veículo pela conduta ilícita e culposa de terceiro».

Aceitando-se, como se aceita, ter-se constituído entre Concessionária e Utente relação contratual com obrigações recíprocas, sinalagmáticas, em que ao pagamento, pelo Utente, da «taxa-portagem» corresponde, de banda da Brisa, a obrigação de ceder a utilização da auto-estrada, com comodidade e segurança ou, noutra perspectiva, concluindo-se que do contrato de concessão resulta o direito do Utente a circular na auto-estrada, verdadeiro contrato a favor de terceiro (art. 443º e ss do CC) em que o promitente (concessionária) se obriga face ao promissário (o Estado) a realizar aos terceiros interessados (os utilizadores) uma determinada prestação (facultar a utilização da auto-estrada com segurança e comodidade) - (14) ou, ainda e por fim, «aceitando-se que o contrato de concessão é dotado de eficácia de protecção em relação aos utentes, estes últimos devem poder prevalecer-se da presunção de culpa estabelecida no art. 799º, nº 1, do Código Civil».

Ora, nos termos deste art. 799º, nº 1 - como já se viu - incumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua.
Mas provar o quê?
Bastará à Brisa demonstrar que as vedações estavam em boas condições, que se não sabe como é que o cão apareceu na faixa de rodagem, que a Concessionária devedora tem brigadas móveis que procedem à fiscalização diária e regular da auto-estrada, que as vedações são verificadas pelo pessoal da obra civil da Brisa encarregue da manutenção das mesmas, às segundas, quartas e sextas-feiras, no período de Verão e às segundas e sextas-feiras, no período de Inverno?

Da generalidade dos contratos de concessão - (15) - como deste, aprovado pelo Dec-lei nº 294/97, de 24 de Outubro, a Base XXXVI, nº 2 - consta uma Base com a epígrafe Manutenção e disciplina do tráfego cujo teor convém relembrar:
"A concessionária será obrigada, salvo caso de força maior devidamente verificado, a assegurar permanentemente, em boas condições de segurança e comodidade, a circulação nas auto-estradas, quer tenham sido por si construídas, quer lhe tenham sido entregues para conservação e exploração, sujeitas ou não ao regime de portagem".

A Base XLVII acima vista reza assim:
1 - A concessionária fica isenta de responsabilidade por falta, deficiência ou atraso na execução do contrato quando se verifique caso de força maior devidamente comprovado.
2 - Para os efeitos indicados no número anterior, consideram-se casos de força maior unicamente os que resultam de acontecimentos imprevistos e irresistíveis cujos efeitos se produzem independentemente da vontade ou das circunstâncias pessoais da concessionária, nomeadamente actos de guerra ou subversão, epidemias, radiações atómicas, fogo, raio, graves inundações, ciclones, tremores de terra e outros cataclismos naturais que directamente afectem os trabalhos da concessão.

É certo que este conceito de força maior é aqui utilizado para os efeitos indicados no número anterior, para os casos de falta, deficiência ou atraso na execução do contrato. Mas porque haveria o Estado Concedente de querer tanto rigor quando o incumprimento ou defeituoso cumprimento pela Concessionária a Si respeita e não usar o mesmo critério nas relações da Concessionária com os Utentes que Ele tem o dever constitucional (art. 60º, nº 1, da Constituição) e legal (art. 1º e 2º, nº 2, da Lei nº 24/96, de 31.7.1996 (Lei de Defesa do consumidor) de proteger? Ainda para mais quando em ambas as Bases - XXXVI, nº 2 e XLVII, nº 1 - usa a mesma expressão «caso de força maior devidamente comprovado» ou «caso de força maior devidamente verificado»!

«Estamos perante uma fórmula do mesmo tipo da utilizada no art. 705.° do Código de Seabra para efeitos de exclusão da responsabilidade contratual. Não bastava a mera prova da ausência de culpa. Era indispensável demonstrar a verificação de uma das circunstâncias explicitadas nesse dispositivo legal, sendo certo que o conceito de "força maior", tal como o de "caso fortuito" utilizado no art. 2051º do Código Civil italiano, tem apetência para englobar acontecimentos naturais, o facto do lesado ou de terceiro.
Só o «caso de força maior devidamente verificado» exonera o devedor (a concessionária) da sua obrigação de garantir a circulação em condições de segurança e, na hipótese de inexecução, do dever de reparar os prejuízos causados.
Isto significa, no essencial, que «não será suficiente (ao devedor) mostrar que foi diligente ou que não foi negligente: terá de estabelecer positivamente qual o evento concreto, alheio ao mundo da sua imputabilidade moral, que não lhe deixou realizar o cumprimento».
Mas terá o devedor de fazer sempre a prova histórica precisa dos factos que justificam a invocação da força maior? v. g., no caso de facto de terceiro, será indispensável identificar esse terceiro?
Pensamos que isso seria ir longe demais, devendo considerar-se verificado o caso de força maior uma vez conseguida a prova inequívoca da intervenção do facto de terceiro, bem como da inexistência de culpa por parte do devedor.
Do que parece dever sempre tratar-se é de um facto estranho à esfera de actividade do devedor. Factos que caem na sua esfera de domínio, mesmo sem implicarem uma actuação culposa (v. g. a avaria de um veículo de fiscalização ou a doença de um funcionário) nomeadamente na modalidade de "culpa de organização", não deverão ser considerados como constituindo força maior.

Para efeitos de cumprimento deste ónus probatório muito depende da concreta causa de acidente.
Se se trata de um facto que não é em princípio de atribuir à esfera de responsabilidade do devedor, v. g. uma mancha de óleo no pavimento, o encargo traduzir-se-á na demonstração do exercício da adequada vigilância para descobrir e afastar esta fonte de perigos. Mas se aparecem pedras na pista, então parece-nos de exigir a demonstração inequívoca da intervenção de terceiros, bem como do carácter imprevisível desta, o que terá impedido o devedor de evitar o surgir daqueles perigos ou, pelo menos, de chamar para eles a atenção.

Sendo assim, a necessidade de a devedora fazer a prova de uma causa estranha, conquanto não directamente imposta pela aplicação do art. 799.°, nº 1, faz presa na incorporação no contrato inominado da obrigação de segurança.
Até ter conseguido essa prova, mais propriamente do que o não ter ilidido uma presunção de culpa, o devedor (a concessionária) não terá sequer demonstrado um adimplemento de acordo com os critérios contratualmente devidos (pontual).

Na hipótese do arremesso de pedras, estamos tipicamente perante um facto imprevisível de terceiro, o que impede seja evitado o facto ilícito. E a prova feita não deixará normalmente dúvida sobre este carácter de exterioridade, necessário para a caracterização da força maior.

De modo bem diferente se passam as coisas nas hipóteses de acidentes provocados pelo atravessamento de animais (quase sempre canídeos).
Em primeiro lugar, não se tem conseguido descobrir o processo através do qual o animal se introduziu na auto-estrada. Poderá ter conseguido passar através de algum ponto fraco da vedação, porventura até muito longe do local do acidente, ter sido abandonado pelo proprietário em plena estrada ou ter-se escapulido do cativeiro; até poderá ter entrado na zona das portagens, onde nos parece óbvio que deve igualmente ser exercida vigilância.
Sendo assim, não está feita a prova de que o acontecimento que impediu o devedor de cumprir pontualmente (facultando a utilização da auto-estrada, com segurança) «se tenha verificado fora da esfera pela qual o devedor deve responder».
Essa prova só terá sido produzida quando se conhecer, em concreto, o modo de intromissão do animal. A causa ignorada não exonera o devedor, nem a genérica demonstração de ter agido diligentemente».

Em resumo:
«Perante o fenómeno do acidente provocado pela entrada de um animal na auto-estrada, o direito pode adoptar uma de duas atitudes.
Impor à vítima o ónus da prova de um facto ilícito e culposo, quer da entidade gestora da auto-estrada, quer de um terceiro. Teremos então uma visão fatalista das coisas visto que o lesado não tem qualquer possibilidade de controlo sobre a fonte de perigo. Ou fazer recair o ónus da prova da ausência de culpa ou da violação de um dever à entidade encarregada de zelar pela segurança da auto-estrada.
Ao tornar obrigatória a vedação das auto-estradas em toda a extensão, o nosso direito pretende afastar esta fonte de perigos. No plano do direito probatório, a atitude que melhor se compatibiliza com essa postura é a de fazer impender o ónus da prova da ausência de culpa sobre quem tem a possibilidade (e o dever, ligado à custódia), bem como os conhecimentos e os meios técnicos e humanos para controlara fonte dos perigos.
Dada a diversidade de modos e locais possíveis para a intrusão do animal, parece-nos que este ónus dificilmente poderá estar cumprido sem a demonstração positiva de como é que, apesar de lá estarem as barreiras, o animal se introduziu».

Os factos, o Direito e o Recurso

Relembrando os factos agora relevantes, temos que em 9.08.1999, pelas 23h55, o autor circulava com a sua viatura Honda Civic, matrícula GL, na Auto-Estrada do Sul, no sentido Sul Norte, tendo pago a respectiva portagem;
Ao km 32, quando o autor seguia pela faixa da esquerda, surge no meio desta, um cão, que atravessou a estrada da direita para a esquerda, atento o sentido de marcha do autor;
O cão - que tinha elevado porte - apareceu de modo imprevisto e inopinado.
O autor tentou evitar o embate, accionando os travões e virando a direcção, mas não conseguiu, acabando por atropelar o animal, projectando-o.
O autor conduz veículos ligeiros há mais de catorze anos.
Com o embate, o veículo Honda entrou em despiste, desgovernado, e acabou por colidir com a parte da frente no «rail» do separador central.
Em virtude do acidente, o carro do autor teve de ser retirado da A2 através de reboque, por ter os órgãos de locomoção próprios danificados.
Além destes danos no automóvel o A. sofreu outros danos patrimoniais e não patrimoniais, ora indiscutidos.

Os serviços da Brisa procedem à fiscalização diária e regular da Auto-Estrada, através de brigadas móveis;
Também as Brigadas da BT/GNR efectuam tal fiscalização, através de circulação nas faixas de rodagem.
As vedações são verificadas pelo pessoal da obra civil da Brisa, encarregue da manutenção das mesmas, às segundas, quartas e sextas-feiras, no período de Verão; e às segundas e sextas-feiras, no período de Inverno.

Aqui está bem desenhada a situação de facto comum em casos que tais: ao entrar na auto-estrada pela Via Verde ou retirando o ticket da máquina existente no acesso à auto-estrada, o automobilista A. aceita a proposta genérica da concessionária Brisa e conclui-se o contrato inominado segundo o qual o automobilista, contra o pagamento da taxa-portagem, adquire o direito à prestação, a cargo da Brisa, de circular pela auto-estrada em condições de comodidade e segurança.
Seguia o A. pela auto-estrada quando, de modo imprevisto e inopinado, um cão de grande porte atravessa a faixa de rodagem, da esquerda para a direita. O A., condutor com experiência de mais de 14 anos de condução, tenta evitar a colisão mas não consegue deixar de atropelar o animal; o carro entra em despiste e, desgovernado, bate com a parte da frente no «rail» do separador central e fica impossibilitado de se deslocar pelos seus próprios meios. O A. sofre algumas contusões, nada de muito grave.
É claro que se não apura como é que o cão apareceu na auto-estrada, mas sabe-se que as vedações naquela zona estavam em boas condições e que a Brisa fiscaliza diária e regularmente a auto-estrada e vedações.
Daqui parte-se, como fez a Relação, para concluir que a concessionária cumpriu com as suas obrigações contratuais e que lhe não era imputável o aparecimento do canídeo na via e a sua não remoção até ao instante da colisão, pelo simples desconhecimento da existência e verificação de uma tal realidade fáctica.
Por isso, não pode aqui relevar qualquer outra presunção de culpa e assunção/imputação de responsabilidade objectiva que recaia sobre a concessionária e a responsabilize pelos danos emergentes do referido evento".

A Brisa não teve culpa, diz a Relação. E o automobilista, que culpa teve?
O senso comum dita a solução. O incumprimento do contrato ocorreu na parte a cargo da Brisa. Foi a prestação da Concessionária que falhou: ela obrigou-se pelo contrato celebrado com o A. Utente e tinha-se antes obrigado perante o Estado Concedente - com eficácia externa, para os Utentes - a, salvo caso de força maior devidamente verificado, assegurar permanentemente, em boas condições de segurança e comodidade, a circulação na auto-estrada (Base XXXVI, nº 2 do contrato de concessão). A presunção da sua culpa radica no disposto no art. 799º, nº 1, do CC e na violação do dever imposto por esta Base XXXVI, nº 2.
O aparecimento de um cão de elevado porte na faixa de rodagem da auto-estrada constitui reconhecido perigo para quem ali circula. Cabe à Brisa evitar essa (e outras) fonte de perigos, essa anormalidade. Não pode pôr-se a cargo do automobilista a prova da negligência da Brisa ou da origem do cão porque não foi a prestação dele que falhou nem ele tem a direcção efectiva, o poder de facto sobre a auto-estrada (como um todo, incluindo vedações, ramais de acesso e áreas de repouso e serviço.
Como acima ficou dito, só o «caso de força maior devidamente verificado» exonera o devedor (a concessionária) da sua obrigação de garantir a circulação em condições de segurança e, na hipótese de inexecução, do dever de reparar os prejuízos causados.
Isto significa, no essencial, que «não será suficiente (ao devedor, a Brisa) mostrar que foi diligente ou que não foi negligente: terá de estabelecer positivamente qual o evento concreto, alheio ao mundo da sua imputabilidade moral, que não lhe deixou realizar o cumprimento».
Essa prova só terá sido produzida quando se conhecer, em concreto, o modo de intromissão do animal. A causa ignorada não exonera o devedor, nem a genérica demonstração de ter agido diligentemente».

Não tendo provado, como lhe cumpria (art. 799º, nº 1, do CC) que o incumprimento da sua prestação - facultar o uso da auto-estrada com comodidade e segurança - não procede de culpa sua, a Brisa tornou-se responsável pelo prejuízo causado ao A. (art. 798º e 562º e ss). E a B é solidariamente responsável pelo pagamento da indemnização devida por via do seguro que com a Brisa contratou.
Não pode, pois, manter-se o decidido pela Relação.

Decisão

Termos em que se decide
a) - conceder a revista e
b) - revogar a decisão recorrida para ficar a subsistir a sentença do Tribunal de Setúbal.

Custas da apelação e da revista pelas RR.
As custas da reclamação para a conferência são da responsabilidade do Reclamante, com a taxa de justiça fixada em três UCs - art. 18º, nº 3 e 16º do CCJ.

Lisboa, 22 de Junho de 2004
Afonso Correia
Ribeiro de Almeida
Nuno Cameira (Votei a decisão. Entendo que a condenação da ré se justifica por ter violado o dever que lhe é imposto pela Base XXXVI, nº 2 do Contrato de Concessão o que resulta, em concreto, das respostas aos pontos 16 a 19 da Base Instrutória - e por não ter demonstrado que no local do acidente as vedações estavam em efectivas boas condições, isto é, implantadas de molde a impedir a intromissão na auto-estrada de um animal como aquele que ali surgiu - um cão de "elevada estatura", segundo se processa).

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(1) - A letra e números que antecedem cada facto indicam a sua proveniência, da especificação e respostas a quesitos, respectivamente.
(2) - Consº Amâncio Ferreira, op. cit., 216 e ss.
(3) - Noções Elementares, Processo Civil, 1976, pág. 326. No mesmo sentido Antunes Varela, Manual de Processo Civil, 2ª ed.,1985, págs. 710 a 719, e Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratórío, vol. III pág. 392.
(4) - Ac. da Relação de Lisboa, de 17.11.83, na Col. Jur. 1983-V-114.
(5) - Ac. da Relação de Évora, de 18.2.1981, na Col. Jur. 1981, tomo I, pá 115/116.
(6) - Do Código Civil, como os mais de que se não indique diferente origem.
(7) - BMJ 468-407, citando A. Costa, Obrigações, 6ª, ed., 455 e ss.
(8) - RLJ 102-312 e 313.
(9)- I - O facto de se celebrar um contrato de transporte em navio não significa que todo e qualquer dano causado ao transportado na ocasião do transporte deva ter solução jurídica com base nas normas da responsabilidade contratual.
II - A circunstância de ter ocorrido lesão do direito à saúde (os direitos absolutos, como a saúde e a vida, gozam de protecção legal, não necessitando de contrato para a sua protecção) do transportado na fase do cumprimento do contrato de transporte (por o navio, indo das Berlengas para Peniche ter colidido com uma traineira, de tal colisão resultando anos para o passageiro autor na acção) não é suficiente para descaracterizar o tipo de responsabilidade civil que recai sobre o transportador nem impede a aplicação das regras relativas à responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos, incluindo as relativas à prescrição - STJ, Ac. 13.2.01, Col. STJ 01-I-117.
(10) - Ac. do STA, de 24.3.1999, no BMJ 485-173 e de 29.4.98, no BMJ 476-157.
(11) - Das Obrigações em Geral, I, 9ª ed., 237/238.
(12) - Manual dos Contratos em Geral, 4ª ed., 150 e 249.
(13) - Sinde Monteiro, RLJ 133-61 e 64.
(14) - «Técnico-juridicamente, o contrato de concessão funciona aqui como relação de cobertura ou de provisão. No que respeita à relação de valuta, estão em causa as tarefas do Estado no sentido de promover a bem estar e qualidade de vida dos cidadãos» - Sinde Monteiro, RLJ 133-65, nota 60.
(15) - Cfr. vários contratos na nota 45, pág. 62, da RLJ 133.