Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
353/13.0PAPNI.L1.S1
Nº Convencional: 3ª SECÇÃO
Relator: JOÃO SILVA MIGUEL
Descritores: ACORDÃO DA RELAÇÃO
MATÉRIA DE FACTO
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
VÍCIOS DO ARTº 410.º DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
QUESTÃO NOVA
HOMICÍDIO QUALIFICADO
HOMICÍDIO PRIVILEGIADO
COMPREENSÍVEL EMOÇÃO VIOLENTA
DESESPERO
CULPA
ATENUAÇÃO DA PENA
Data do Acordão: 04/09/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Área Temática:
DIREITO PENAL - CRIMES CONTRA AS PESSOAS / CRIMES CONTRA A VIDA.
DIREITO PROCESSUAL PENAL - RECURSOS.
Doutrina:
- Figueiredo Dias, Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo I (artigos 131.º a 201.º), 2.ª edição, Coimbra Editora, 2012, §14 ao artigo 133.º, pp. 86, 89.
- Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Universidade Católica Editora, 2008, anotação 12 ao artigo 410.º, p. 1079.
- M. Miguel Garcia e J. M. Castela Rio, “Código Penal” e Parte geral e especial, com notas e comentários, Almedina, Coimbra, 2014, p. 516.
- Simas Santos e Leal-Henriques, “Código de Processo Penal”, Anotado, II Volume, 2ª edição, Edição Rei dos Livros, 2004, p. 740.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL (CPP): - ARTIGOS 379.º, N.º1, ALÍNEA C), 410.º, N.º2 ALÍNEAS A) E B), 425.º, N.º4.
CÓDIGO PENAL (CP): - ARTIGOS 20.º, 131.º, 132.º, N.OS 1 E 2, ALÍNEAS A), C), D), I), E J) , 133.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-DE 1 DE JULHO DE 2009, PROCESSO N.º 732/06.0GCFAR.S1, DE 17 DE NOVEMBRO DE 2011, PROCESSO N.º 267/10.6TCLSB.L1.S1, E DE 8 DE FEVEREIRO DE 2012, PROCESSO N.º 746/08.5TAVFR.P1.S1, ACESSÍVEIS TAL COMO OUTROS CITADOS NO TEXTO, QUANDO OUTRA FONTE NÃO FOR ESPECIFICADA, NA BASE DE DADOS DO IGFEJ EM HTTP://WWW.DGSI.PT/ .
-DE 17 DE DEZEMBRO DE 2014, PROCESSO N.º 8/13.6JAFAR.E1.S1.
-DE 12 DE SETEMBRO DE 2013, PROCESSO N.º 844/11.8JAPRT.
-DE 29 DE OUTUBRO DE 2008, PROCESSO N.º 08P1309.
-DE 7 DE JULHO DE 2010, PROCESSO N.º 22/07.0GACUB.E1.S2.
-DE 10 DE DEZEMBRO DE 2009, PROCESSO N.º 36/08.3GABTC.P1.S1.
-DE 29 DE OUTUBRO DE 2008, PROCESSO N.º 08P1309.
-DE 4 DE JULHO DE 2013, PROCESSO N.º 39/10.8JBLSB.L1.S1.
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-DE 19 DE OUTUBRO DE 1995, ACÓRDÃO DE FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA N.º 7/95, DIÁRIO DA REPÚBLICA (DR), I SÉRIE, N.º 298, DE 28 DE DEZEMBRO DE 1995, PP. 8211-8213.
Sumário :

I - É jurisprudência uniforme do STJ a de que o recurso da matéria de facto, ainda que circunscrito à arguição dos vícios previstos nas als. a) a c) do n.º 2 do art. 410.º do CPP, tem de ser dirigido ao Tribunal da Relação e que da decisão desta instância, quanto a tal vertente, não é admissível recurso para o STJ, enquanto tribunal de revista.
II - É inadmissível o recurso no segmento em que visa o reexame da matéria de facto sob a alegação de que a prova foi incorrectamente apreciada e que o acórdão da Relação enferma dos vícios da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, da contradição insanável da fundamentação e do erro notório na apreciação da prova.
III -O STJ não pode apreciar questão que não tenha sido suscitada perante a Relação, na medida em que os recursos servem apenas para reexaminar as decisões tomadas pelas instâncias e não para apreciar questões novas.
IV - A compreensível emoção violenta, a compaixão, o desespero, ou um motivo de relevante valor social ou moral constituem cláusulas que apontam para a redução da culpa, ou cláusulas de privilegiamento, ou elementos privilegiadores, traduzindo estados de afeto vividos pelo agente, ou causas de atenuação especial da pena do homicídio.
V - A compreensível emoção violenta é um forte estado de afeto emocional provocado por uma situação pela qual o agente não pode ser censurado e à qual também o homem “fiel ao direito” não deixaria de ser sensível.
VI -O estado de desespero, corresponde, não tanto a uma situação objectiva de falta de esperança na obtenção de um resultado ou de uma finalidade, mas sobretudo a estados de afeto ligados à angústia, à depressão ou à revolta, nele se integrando certos casos da chamada humilhação prolongada.
VII - Os factos que estão provados, e as circunstâncias anteriores ao crime, de onde emerge um plano para a prática do crime, congeminado e amadurecido ao longo de 2 meses, o ambiente que o envolveu, numa degradação disfuncional entre mãe e filha, filtrada ao longo do tempo, que, pelo circunstancialismo que lhe subjaz poderia, eventualmente, ser susceptível de induzir um estado psíquico de afetação, não comunga daquela característica intensa e breve, em regra desencadeada de modo imprevisto a algo surgido do momento, nem se revela bastante para a configurar como «emoção violenta», e muito menos para integrar o requisito da compreensibilidade requerido pela norma.
VIII - E a reflexão prolongada sobre o facto funciona como impeditivo do privilegiamento, pois com o passar do tempo o recorrente foi sedimentando a vontade de atuar, aumentando, assim, a exigibilidade do não cometimento do crime, não sendo, em consequência, a sua conduta subsumível à norma do art. 133.º do CP.
Decisão Texto Integral:

Acordam em conferência na secção criminal do Supremo Tribunal de Justiça:

I. Relatório
i. Nos autos de processo comum, com intervenção do tribunal colectivo, acima identificados, do 1.º Juizo do Tribunal de Peniche, AA foi submetida a julgamento e condenada, como autora material, de 1 (um) crime de homicídio qualificado previsto e punido pelos artigos 131.º e 132.º, n.os 1 e 2, alíneas a) (descendente), c) (pessoa particularmente indefesa em razão da idade e doença), d) (prazer em causar sofrimento), i) (meio insidioso), e j) (premeditação) todos do Código Penal, na pena de prisão por 20 (vinte) anos, e no pagamento ao Centro Hospitalar de ..., EPE, da quantia de €17.753,82 (dezassete mil, setecentos e cinquenta e três euros e oitenta e dois cêntimos) relativa aos danos patrimoniais, acrescida de juros vencidos e vincendos, à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da citação, até integral pagamento.
2. Do assim decidido, a arguida interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, que, por acórdão de 18 de Setembro pp, viria a confirmar na íntegra a decisão recorrida. Não se conformando com a decisão da 2.ª instância, dela recorreu para este Supremo Tribunal, formulando as conclusões que se transcrevem, apesar da extensão:
«A.  Por Acórdão proferido nos autos de processo supra referido, que correu termos pelo 1º Juízo do Tribunal de Peniche, foi a arguida condenada pela prática de um crime de um crime de homicídio qualificado p. e p. pelo art. 131º e 132º nº 1 e 2 al. a), c), d), i) e j) do Código Penal na pena de 20 anos de prisão.
B.     Interposto Recurso para o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, veio este confirmar integralmente a decisão recorrida.
C.     Contudo, o Tribunal a quo, fê-lo sem qualquer fundamentação.
D.     Verificando-se assim, omissão de pronúncia da parte do Digníssimo Tribunal da Relação de Lisboa que consubstancia nulidade insanável que deverá ser reconhecida.
E.      É evidente a leviandade com que o presente Acórdão foi redigido, ou melhor dizendo "copiado", isto porque, não obstante as questões suscitadas e a importância da instância de recurso em análise e bem assim o relevo da presente decisão, em excertos da mesma encontramos erros grosseiros de "encaixe" do acórdão ora recorrido, possivelmente a outro já previamente redigido, a titulo de exemplo:
F.      Desde logo a transcrição das conclusões formuladas pela arguida que não se encontra em consonância com as conclusões efetivamente apresentadas!
G.     Para além disso ao referir" O grau de culpa é muitíssimo acentuado, com elevada intensidade do dolo (directo), manifesta na vontade firme em tirar a vida à vitima, que é evidenciada pela insistência no atropelamento consecutivo".
H.     Ora a falta de brio com que o Acórdão recorrido foi realizado, não se coaduna com um real e efetivo direito de recurso da arguida.
I.       Pois que a mesma suscitou questões que não só não foram devidamente apreciadas, como o Acórdão recorrido manifesta claramente a leveza com que foi feita tal apreciação.
J.      Estamos a falar de uma pena de prisão de 20 anos, aplicada à arguida, cuja personalidade, conforme é referido no próprio Acórdão recorrido “(…) relativamente à perigosidade independente do quadro psicopatológico, a personalidade da arguida revela imaturidade, uma frágil e negativa representação de si mesma, com perturbações cognitivas e emocionais que causam uma importante instabilidade psíquica e um desajustamento social significativo que causam uma importante instabilidade psíquica e um desajustamento social significativo, pelo que não pode ser em rigor excluída a possibilidade de ocorrerem desorganizações e comportamentos disruptivos em circunstâncias potenciadoras de maior tensão e/ou stress que possam activar a sua conflitualidade interpessoal( …)."
K.     Cremos até, que sendo reconhecidas tais características de personalidade da arguida, é facilmente constatável que a sua reclusão em meio prisional, não só permite qualquer salvaguarda para a própria, como coloca em risco inclusive todos os que com a mesma vivenciam em espaço prisional.
L.      Pelo que resulta evidente que necessariamente se impõe à arguida aplicação de medida de segurança e não pena de prisão efectiva pois que tal não permite a cabal salvaguarda das necessidade de prevenção quer especial quer geral.
M.    A recorrente delimitou o objecto de recurso a toda a matéria de direito do Acórdão proferido nos presentes autos.
N.     Nesse sentido a arguida invocou desde logo a existência de contradição patente contradição entre a matéria dada como provada e a própria decisão.
O.     Elencando que, dos factos provados resultava, desde Jogo no ponto 41. que a arguida atuou livre, voluntária e conscientemente, agindo sem qualquer constrangimento a uma vontade livre e esclarecida, bem sabendo que tal comportamento lhe estava vedado pelo Direito.
P.     Resultando igualmente do elenco de factos provados, quanto à personalidade da arguida os pontos 46 a 67 que, são reveladores da falta consciência e até da capacidade de realização de juízo de censura.
Q.     Dos factos provados resulta ainda que pouco tempo antes da prática dos factos, cerca de 3 meses, a arguida “com consumos regulares de haxixe, dificuldades de autocontrolo e verbalizando sentimentos negativos face à mãe e com queixas psicossomáticas, AA foi internada na Psiquiatria no Hospital de..., em Março de 2013".
R. E bem assim resultara provado que na altura a mesma apresentava ideias delirantes e hetero agressividade, mas tivera alta algumas semanas depois, por não apresentar psicopatologia que justificasse o internamento, embora com necessidade de terapêutica anti psicótica.
5.      Referindo-se no Acórdão, depois em jeito de conclusão, que apesar dos traços psicóticos, a arguida não tem um descontrolo psicótico, mantendo o discernimento, bem como a consciência da Ilicitude.
T.      Omitindo no entanto a pronuncia quanto às conclusões constantes dos relatórios periciais junto aos autos, elaborados pelos mesmos peritos e, conforme transcrição feita pela recorrente em sede de recurso, apontam francamente para reconhecimento de inimputabilidade ou, pejo menos, de imputabilidade diminuída!
U.     Até porque, dos factos provados resultara que a arguida detém uma personalidade imatura e desequilibrada propensa a uma impulsividade ideativa e comportamental e pautada por traços esquizóides e impulsivos, associados a uma estrutura de personalidade psicótica, como pode depois o Tribunal na sua fundamentação referir que a arguida mantém o discernimento e consciência da Ilicitude.
V. Existindo patente contradição entre os factos provados, a fundamentação e a decisão em si, ou seja, o Acórdão objecto do presente recurso encontra-se assim ferido de uma contradição insanável entre a fundamentação e a decisão, e erro notório na apreciação da prova nos termos da alínea b), e c) do nº 2, do art. 410º, do Código Processo Penal
W. Do teor dos Relatórios periciais junto aos autos é patente a dúvida sobre a imputabilidade da arguida, a fls. 737 e ss dos autos, refere-se que: "Relativamente à escala esquizofrenia, a examinada apresenta igualmente resultados elevados} nomeadamente nas subescalas de ausência de controlo do eu e experiências sensoriais estranhas. Estes resultados indicam-nos que a examinada experiência perda de controlo sobre os seus processos cognitivos e sobre os seus impulsos, com sentimentos de desconfiança para levar a cabo operações cognitivas normais, podendo surgir sentimentos de dissociação de afectos, despersonalização} agitação e hipersensibilidade a um mundo exterior considerado como ameaçador, recorrendo a uma acentuada impulsividade como mecanismo de defesa face ao mesmo".
X. Ora face a tais conclusões não podia o Acórdão recorrido confirmar a decisão proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, ao dar por provado o facto 41 da matéria provada, ou seja que a arguida actuou livre, voluntária e conscientemente, sem qualquer constrangimento de vontade.
Y.  É certo que os relatórios junto aos autos concluíram pela imputabilidade da arguida.
Z. Mas é igualmente certo que, o conteúdo dos mesmos, reflecte claramente a convicção de uma eventual imputabilidade diminuída, ou até temporária, que devia ter sido aquilatada pelo Tribunal.
AA. O certo é que os Relatórios são omissos na questão de uma eventual imputabilidade diminuída ou temporária, sendo igualmente certo que do teor dos mesmos não pode resultar senão a duvida c1aríssima sobre a imputabilidade da arguida.
BB. Até porque da leitura atenta dos mesmos não nasce outra convicção que não seja a de que a arguida ao deter, como detém uma personalidade psicótica com traços esquizóides e largo espectro esquizofrénico, não pode ser totalmente capaz de realizar um juízo de censura ético e de se autodeterminar de acordo com o mesmo.
CC. É latamente contraditório, atento o relatório pericial, onde é referido que a arguida apresenta valores elevados na escala de  esquizofrenia que               a             mesma                tenha capacidade           de autodeterminação, pois que conforme resulta dos relatórios junto aos autos a mesma têm uma personalidade marcadamente de tipo psicótica com traços impulsivos e esquizóides com acção impulsiva antes do processo de mediação cognitiva.
DD. Referindo os mesmos que a arguida detém franca ausência de controlo do "eu" pelo que tal facto assente resulta em franca contradição com a alegada capacidade da arguida para avaliar a ilicitude e se determinar de acordo com essa avaliação.
EE. Assim, errou o Tribunal a quo, e o Acórdão ora recorrido encontra-se entre o mais ferido de nulidade por omissão de pronuncia quanto à questão da eventual imputabilidade diminuída, sobejamente indiciada na prova pericial produzida.
FF. Tanto mais em face de uma personalidade com altos índices de esquizofrenia, uma vez que conforme, juízo unânime de psiquiatria forense "os portadores de esquizofrenia deverão ser considerados inimputáveis desde que o delito esteja directamente relacionado com a actividade delirante ou alucinatória, em fase produtiva da doença. (..) ,cfr. PSIQUIATRIA E PSICOLOGIA FORENSE: SUAS IMPLICAÇÕES NA LEI- PS1QUIATRIA- PSICOLOGIA FORENSE NO INSTITUTO DE MEDICINA LEGAL-ÂMBITO DE APLICAÇÃO EM DIREITO- RUI MANUEL RIBEIRO CAROLO.
GG.                 Assim e face à prova produzida em audiência de discussão e Julgamento deveria o Tribunal ter-se pronunciado pelo menos pela imputabilidade diminuída da arguida fixando-lhe uma pena em consonância com a culpa igualmente diminuída.
HH. Para além-do-exposto, conforme evidenciados, face à prova produzida o ilícito em causa reveste a forma de homicídio privilegiado p. e p. no art. 133º do Código Penal e não, como erroneamente determinado homicídio qualificado.
II. Quanto a esta questão suscitada peja Recorrente limita-se o Acórdão recorrido a enunciar doutrina e jurisprudência consubstanciadores da definição de homicídio qualificado e de elementos privilegiadores, concluindo pela acertada qualificação jurídica atribuída no presente caso ao condenar a arguida pela prática do mesmo em detrimento da prática de homicídio privilegiado.
JJ. Omitindo pronunciar-se sobre o que fora suscitado pela arguida em sede de recurso.
KK. Isto é, do factualismo provado nos autos resulta que a arguida foi marcada por uma infância traumática, sofrendo e vivenciando vários abusos no seio familiar atribuindo culpas à progenitora por esta não ter sido, na óptica daquela uma verdadeira mãe.
LL. Desde logo nos relatórios sociais na conclusão dos mesmos pode ler-se que:
MM. “(…) o trajecto de vida da arguida foi fortemente marcado por vivências traumáticas com experiências abandónicas e maltratantes das figuras parentais que a fragilizaram ao nível da preparação para responder ás exigências afectivas e sociais da vida adulta{ ... ) carecendo de intervenção ii no capo da psicoterapia/ psiquiatria de forma a resolver experiências traumáticas e adquirir competências de auto controlo".
NN. Para além disso dos relatórios periciais, consta entre o mais “(…) observa-se elevado ressentimento e projecção dos sentimentos de culpa para o seu seio familiar, típicos em casos onde existe um  historial de abusos; (sublinhado nosso).
0.      Continuando ainda "(…) paranóia, resultados extremamente elevados ao nível da subescala fi ideias persecutórias" o que nos sugere ressentimentos, maus tratos, vitimização com temática secundárias de depressão com tendência a projectar e exteriorizar a culpa e os contendas mais agressivos da sua personalidade".
PP. Esclarecendo claramente os pontos 63 a 66 dos factos provados mostram que a arguida teve uma infância absolutamente traumática vendo-se sujeita a abusos e maus tratos vários, não só não tendo sido protegida por aqueles que tinham a obrigação legal e moral de o fazer, como se viu igualmente abusada pelos próprios.
QQ. Todo o circunstancialismo traumático vivenciado pela arguida e patente nos autos foi criando fragilidades na personalidade da mesma, raiva, ódio, por quem, em consciência para a arguida não só nunca a protegeu, como a submeteu a abusos, a sua própria mãe!
RR. A arguida foi gerindo tais sentimentos, conforme estava capacitada para o fazer, não conseguindo racionalizar sentimentos de raiva e ódio pela figura materna, culpabilizando-a por todos os males que lhe sucederam, por todos os traumas vivenciados, sendo que nos dizeres daquela e conforme aquilatado pela mesma a fls. 697 dos autos:
SS.   “Estava com aquele intuito de a matar, pensava que o pesadelo, a pedofilia acabava( ... ) não acabou( ... ) não fiquei aliviada nem satisfeita, fui beber e esquecer".
TT. Tal raciocínio aliado ao teor dos relatórios de perícia psicológica e psiquiatra onde se conclui que "O homicídio, motivado por estes sentimentos não racionalizados de raiva e ódio, assume um carácter intencional sendo premeditado e planeado de forma cuidadosa e intencional", são demonstrativos de que o homicídio em causa foi perpetrado pela arguida motivada por um especial estado de revolta, ódio e raiva que diminui francamente a culpa da mesma.
UU. A arguida com cerca de 11 anos e após o período traumático de institucionalização, voltou para casa persistindo os abusos de tal forma que a arguida à data uma criança se sentia mais segura na rua que em casa junto dos progenitores, tal cenário demonstra claramente o quadro familiar vivenciado pela arguida.
VV. A sujeição de uma criança a abuso reiterados por daqueles que legal e moralmente estavam obrigados à sua protecção não pode deixar de configurar factor determinante ao cometimento do facto delituante, sendo a vítima encarada pela arguida como figurativa do terminus dos abusos de que fora alvo.
WW. Este contexto, em que a arguida se determinou e dispôs a cometer os factos delituosos, deve ser considerado excepcional em matéria de ilicitude, culpa ou prevenção. Devendo, pois, considerar-se acentuadamente diminuída a culpa da arguida, e consequentemente a ilicitude dos factos e a necessidade da pena.
XX. Tendo a arguida actuado como actuou sob intensa perturbação emocional, com alteração do estado de consciência despersonalização e desrealização associada aos traumas de que foi vitima prolongada, sendo sob esse estado que decidiu matar a própria mãe.
YY. Actuando ou assim motivada num quadro de «desespero», enquanto elemento típico do crime previsto no art. 133º do CP., o que determina a diminuição sensível da culpa exigida também pelo art. 133º do CP.
ZZ. A intensa perturbação emocional que vivenciou é de qualificar como emoção violenta e, tendo-a determinado a matar a mãe existe relação de causalidade entre a dita emoção violenta que a dominou e o referido crime cometido.
AAA. O Direito não pode deixar de censurar a conduta da arguida pelo crime de homicídio, contudo e atentas as circunstâncias traumáticas de exposição causadas pela progenitora, tal como resultam dos factos apurados, compeliram a arguida a praticar o facto ilícito, dominada por aquela forte e compreensível emoção violenta que necessariamente diminuem sensivelmente a sua culpa.
BBB.   Resultando cabalmente provado que a recorrente agiu determinada, por uma personalidade psicótica, com elevados índices de esquizofrenia reflexo das vivências traumáticas e abandónicas de que foi alvo ao longo da sua vida e sobretudo na sua infância, factor que determinou a formação da sua personalidade, não podia o tribunal deixar de ponderar o enquadramento jurídico dos factos no crime de homicídio privilegiado.
CCC. Tal ponderação pressuporia uma descrição dos componentes emocionais susceptíveis de traduzir tais conceitos, circunstâncias que o tribunal analisou, pelo que no âmbito da definição e do eventual preenchimento do conceito-tipo «desespero» e assim do enquadramento factual no tipo de ilícito em causa configurar homicídio privilegiado, ao não proceder assim errou notoriamente o Tribunal na ponderação da prova produzida.
DDD. Desde logo porque resulta de toda a prova produzida e bem assim da leitura da matéria de facto, globalmente considerada, que o Tribunal devia ter ponderado na apreciação do exacto estado emocional em que a arguida agiu, e assim concluir pela emoção violenta, susceptível de integrar a previsão do art.133, do Código Penal.
EEE.    Correspondente a uma alteração psicológica, uma perturbação em relação ao seu estado normal, conforme resulta dos relatórios periciais junto aos autos, que o homicídio sendo, como foi motivado por sentimentos não racionalizados de raiva e ódio, cujo enquadramento mental a arguida não soube gerir, desencadeou uma reacção agressiva do agente, que o dominou, determinando-o a agir, unicamente por força da sua influência.
FFF.                 Provando-se como se provou que, na psique da arguida não restasse outra alternativa ante a presença da vítima, de tal modo que suprimir-lhe a vida fosse a solução única no momento, o desespero em que a mesmo agiu torna menos censurável a sua opção, permite concluir pela diminuição sensível da culpa exigida para o preenchimento dos elementos típicos do crime de homicídio privilegiado;
GGG. Não podia o Tribunal deixar de concluir que a arguida foi compelida ao cometimento do facto ilícito por um estado de compreensível emoção violenta devendo este definir-se como um forte estado de afeto, a relação da arguida com a mãe mormente as fortes carências afectivas vivenciadas pela mesma, e bem assim os traumas de abusos vivenciados que, desencadearam uma reação agressiva.
HHH. No art. 133.º do CP está-se perante um especial caso de atenuação da pena, de caso expressamente previsto na lei - art. 72.º, n.º 1, do CP - que conduz a uma redução da moldura penal de mais amplo espectro do que a resultante da modificativa nos termos do art. 73.º do mesmo Código. A autonomização justificar-se-á com a circunstância de a pena cominada no art. 133.º não ter necessariamente de coincidir com aquela que o juiz encontraria em função dos critérios de atenuação especial contidos no art. 73.º, e ainda no propósito do legislador de - dada a frequência com que os tribunais se confrontam com hipóteses de homicídio privilegiado ¬ter pretendido emprestar particular ênfase aos factores relevantes de privilegiamento.
III. Diversamente do que ocorre com a enumeração dos exemplos padrão constantes do n.º 2 do art. 132.º do CP, que enformam os casos de especial censurabilidade ou perversidade no homicídio qualificado, os quais são meramente exemplificativos, a enumeração feita no art. 133.º não é exemplificativa. Trata-se de uma especial forma de atenuação para a qual aqui só se tem em consideração o plano da culpa, quando nos termos gerais é necessário estar-se perante diminuição acentuada, não só da culpa do agente, mas também da ilicitude do facto ou da necessidade da pena.
JJJ. No esforço da compreensão da emoção violenta é imperativo o estabelecimento de uma relação entre o afecto e as suas causas ou motivos, o que ficou provado nos presentes autos pois, para se entender uma emoção tem de se entender as relações que lhe deram origem, tendo em atenção o sujeito que a sentiu e o contexto em que se verificou a atitude, em ordem a entender o estado de espírito, o «conflito espiritual», a situação psíquica que leva o agente ao crime, o que é patente e esclarecedor nos factos provados.
KKK. Assim, cremos existir um erro notório na ponderação da prova pelo Tribunal, facto com o qual a arguida não se pode resignar.
LLL. Em face do exposto violou o Acórdão recorrido o disposto no art, 379º nº 1 al. c) do C.P.C, resultando ainda clara a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e bem assim contradição insanável entre a fundamentação e a decisão, nos termos do disposto no art. 410º nº 2 al. a) e b)».

A final, pede que seja «dado provimento ao recurso, e em consequência (…) reconhecido que a arguida atou em estado de inimputabilidade, ou pelo menos de imputabilidade diminuída, ou caso assim não se entenda, sem prescindir, que a mesma praticou o facto ilícito movida por um estado de especial e compreensível emoção violenta, o que diminui sensivelmente [a] sua culpa nos termos conjugados do disposto nos art. 20.º e 133.º do código penal, alterando-se a pena aplicada nos precisos termos (…).»
3. Na resposta à motivação do recurso, o Senhor procurador-geral adjunto na Relação de Lisboa, conclui que «o acórdão recorrido não merece qualquer censura, pelo que deve ser mantido e confirmado nos seus precisos termos, recusando-se provimento ao recurso», porquanto «a lei mostra-se aplicada e a prova valorada em conformidade», posto que «o acórdão não padece de falta de fundamentação, insuficiências, erro de apreciação ou qualquer nulidade/irregularidade», e «o Tribunal a quo deu cumprimento integral ao preceituado no art.º 127.º do CPP e não violou o disposto nos art.ºs 374.º, 379.º e 410.º, do mesmo compêndio processual», além de que «atenta a matéria de facto provada e não provada não sobram dúvidas que a arguida actuou com culpa, não devendo ser considerada a imputabilidade diminuída».
4. Neste Supremo Tribunal, a Senhora procuradora-geral adjunta, a partir da motivação e conclusões apresentadas, induz que a recorrente «tenta impugnar a matéria de facto, para poder concluir que actuou em estado de inimputabilidade, ou imputabilidade diminuída, ou então num estado especial de compreensível emoção violenta, o que diminui a sua culpa, levando a alterar a medida da pena».
Nessa delimitação, emitiu parecer no sentido de que «todas as questões (…) que envolvem directamente matéria de facto, desde a livre apreciação da prova (art. 127º) quanto aos relatórios periciais e dúvidas sobre a matéria de facto (vícios do nº 2 do art. 410º), não poderão ser objecto de recurso interposto do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, por ser irrecorrível a decisão condenatória nesta vertente»; quanto a alegada omissão de pronúncia sobre inimputabilidade diminuída, o acórdão recorrido «não contém, pois, qualquer omissão (…) que possa a vir a ser conhecida/declarada ou que o Supremo Tribunal tivesse de conhecer suprindo-a»; sobre o «homicídio, homicídio privilegiado e inimputabilidade» entende que «da extensa matéria de facto provada resultam as circunstâncias e os factos que determinaram não só o crime de homicídio como também a especial censurabilidade e perversidade da arguida ..., na pessoa da sua mãe», sem que a recorrente apresente «qualquer fundamento válido que resulte da matéria de facto provada para tentar sustentar que estava determinada por uma compreensível emoção violenta, desespero ou motivo relevante que diminuiu sensivelmente a sua culpa», pois que os fatores da exigibilidade e a emoção violenta presentes no crime «não resultam minimamente dos factos provados», além de que a recorrente «parece confundir inimputabilidade com factores susceptíveis de, «momentaneamente, poderem dominar/estimular a prática do crime».
Por último, quanto à medida da pena, mesmo que não venha sindicada, «a dimensão e a gravidade do comportamento da arguida, o grau da ilicitude, o dolo directo, as medidas de prevenção geral relativas às exigências comunitárias, a ausência de arrependimento, o estar desinserida socialmente até sem apoio familiar, sem hábitos de trabalho, mantêm-se segundo nos parece, como elementos justos e adequados na condenação em 20 anos de prisão (…).»
A concluir, emite parecer que o recurso seja «rejeitado quando versa matéria de facto (arts. 432º nº 1 c) e 420º nº 1 a) CPP) e julgado improcedente quanto a todas as outras questões de direito, por ser manifesta a sua improcedência».
5. Dado cumprimento ao disposto no n.º 2 do artigo 417.º do CPP, a recorrente não respondeu.
6. Não foi requerida audiência de julgamento, pelo que o recurso é apreciado em conferência [artigos 411.º, n.º 5, e 419.º, n.º 3, alínea c), do CPP].
7. Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.

II. Fundamentação
a. Enquadramento, rejeição do recurso quanto a matéria de facto e questões a apreciar
1.  Constitui jurisprudência assente que, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, relativas aos vícios da decisão quanto à matéria de facto, a que se refere o n.º 2 do artigo 410.º do CPP, e às nulidades, a que alude o n.º 3 do mesmo preceito, é pelo teor das conclusões apresentadas pelo recorrente, onde resume as razões do pedido (artigo 412.º, n.º 1, do CPP), que se define e delimita o objeto do recurso.
Nas conclusões apresentadas, a recorrente afirma que «delimitou o objecto do recurso a toda a matéria de direito do acórdão proferido», mas requer que o Supremo Tribunal volte a reapreciar os vícios da decisão, nos termos do artigo 410.º, n.º 2, do CPP.
Esses vícios já foram examinados pelo tribunal da relação, nele se concluindo que a decisão recorrida não enfermava de nenhum deles.
É jurisprudência constante que nos casos em que são alegados vícios da decisão, nos termos do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, cometidos pela 1.ª instância e apreciados pelo tribunal da relação, da decisão deste tribunal não cabe recurso para o Supremo Tribunal, por o direito constitucional ao duplo grau de jurisdição ter ficado assegurado com a decisão da 2.ª instância sobre o alegado vício[1].
Este Supremo Tribunal tem entendido uniformemente que, nas situações em que são arguidos vícios, como os alegados pela recorrente, relativos à insuficiência da matéria de facto e à contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão, previstos nas alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 410.º, «o recurso da matéria de facto, ainda que circunscrito à arguição dos vícios previstos nas als. a) a c) do n.º 2 do art. 410.º do CPP, tem de ser dirigido ao Tribunal da Relação e que da decisão desta instância, quanto a tal vertente, não é admissível recurso para o STJ, enquanto tribunal de revista», sendo «inadmissível o recurso do arguido no segmento em que visa o reexame da matéria de facto sob a alegação de que a prova foi incorretamente apreciada e que o acórdão da Relação enferma dos vícios da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, da contradição insanável da fundamentação e do erro notório na apreciação da prova.»[2]
Não obstante a restrição da cognição do Supremo Tribunal de Justiça a matéria de direito, o Supremo Tribunal pode, porém, conhecer oficiosamente[3], dos vícios referidos no n.º 2 do artigo 410.º do CPP, tratando-se de vício que resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada ou a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão.
De facto, qualquer dos vícios do n.º 2 do artigo 410.º há-de resultar, como decorre da lei, do texto da decisão recorrida, por si só, ou conjugado com as regras da experiência, estando vedada a consideração e ponderação de quaisquer meios de prova produzidos em julgamento, salvo nos casos previstos designadamente no n.º 3 do artigo 674.º do CPC, surpreendendo-se o vício «quando se retira de um facto dado como provado, uma conclusão inaceitável no plano da lógica, quando se dá como provado algo que notoriamente está errado, que não podia ter acontecido, ou quando, usando um processo racional e lógico, se retira de um dado facto dado como provado uma conclusão ilógica, arbitrária e contraditória, ou notoriamente violadora das regras da experiência comum, ou ainda quando determinado facto provado é incompatível ou irremediavelmente contraditório com outro dado de facto (positivo ou negativo) contido no texto da decisão recorrida»[4].
No entanto, apreciar tais vícios não significa apreciar matéria de facto, que ficou estabilizada com o acórdão do tribunal recorrido, sobre a qual não é admissível recurso.
E quanto aos alegados vícios, da análise da decisão recorrida, nenhum deles se descortina.
Nessa medida e nesta parte, o recurso é rejeitado.
2. Neste contexto, as questões que agora se desenvolvem e cuja reapreciação é requerida, tal como se depreendem das conclusões formuladas, por não serem especificamente enunciadas, são as relativas à alegada omissão de pronúncia, por falta de fundamentação da decisão recorrida quanto à questão da imputabilidade diminuída (Conclusões A a GG), e à qualificação jurídica dos factos que, no entender da recorrente, integram um crime de homicídio privilegiado e não um crime de homicídio qualificado (Conclusões HH a KKK).

a. Matéria de facto

Relativamente à recorrente, a 1.ª instância deu como provada a matéria de facto seguinte, que foi confirmada pelo acórdão recorrido[5]:

«1.   Da acusação:

1- A AA é filha da vítima BB.

2- Desde 2004 não vive com a progenitora, apesar de passar algumas temporadas na companhia do agregado familiar da vítima.

3- Ao tempo dos presentes factos - 24 de Julho de 2013 - a arguida não residia no agregado familiar da progenitora.

4- Morava em ... e não mantinha boas relações com a sua mãe, a quem acusava de não querer saber de si e de se recusar a ajudá-la quando precisava.

5- Resolveu vingar-se, concebendo um plano com o propósito de lhe retirar a vida.

6- Para este efeito, em Maio de 2013 numa drogaria das ..., a arguida comprou um garrafão de 5 litros de ácido sulfúrico, em material plástico de cor branca, devidamente etiquetado de origem, designadamente com rótulo indicando tratar-se de ácido sulfúrico com pureza a 98 %.

7- Que guardou em sua casa nas ....

8- No dia 24/7/13, pelas 15 horas, munida do referido garrafão de ácido sulfúrico, que ocultou numa mochila de cor verde e castanha, deslocou-se de ... para a cidade de ..., com o propósito de executar o plano contra a vida da sua mãe.

9- Chegada a esta cidade dirigiu-se à residência da mãe, sita na Rua ....

10- Onde tocou à campainha.

11- A mãe não lhe abriu a porta, por causa das ameaças de morte que a arguida lhe fazia regularmente.

12- E telefonou ao seu companheiro, CC, para que regressasse a casa.

13- Quando este chegou, deparou-se com a arguida junto à porta da rua, acabando ambos por entrar em casa onde se encontrava a vítima.

14- Nesta ocasião, a arguida convidou a vítima, sua mãe, e o padrasto para irem tomar um café nas proximidades da residência.

15-No que todos acederam.

16- Após terem tomado o café, o CC abandonou o local, tendo a vítima ficado na companhia da arguida.

17- Cerca das 16 horas e 25 minutos, a vítima e a arguida abandonaram o café e dirigiram-se para a pastelaria "..." nesta cidade.

18- No cruzamento da Rua ... com a Rua ..., a arguida disse à vítima para esperar um pouco, visto que precisava de urinar.

19- Afastando-se do local, com a finalidade de retirar da mochila o garrafão contendo ácido sulfúrico e a tirar-lhe a tampa para permitir o derramamento do conteúdo sobre o corpo da sua mãe.

20- Acto contínuo, aproximou-se da vítima e despejou parte do conteúdo do garrafão na cabeça e no tórax daquela.

21- De imediato, a vítima começou a gritar e a pedir socorro, enquanto fugia da arguida.

22- Porém, esta foi no seu encalço despejando, por mais 3 vezes, o resto do conteúdo, sempre com a vítima a gritar e a pedir socorro,

23- Acabando por cair no chão, contorcendo-se com dores.

24- Enquanto fugia, a BB perdeu parte do vestuário, bem como a botija de oxigénio que usava para a auxiliar na respiração, uma vez que se tratava de doente do foro oncológico.

25- Apesar de ver a mãe prostrada no chão, com o corpo a fumegar e a pele a derreter, a arguida, indiferente à sua desdita, abandonou o local, deixando a camisola que trajava e os sapatos que calçava, por terem sido atingidos por salpicos do ácido sulfúrico derramado.

26- Tomou um táxi e dirigiu-se ao terminal rodoviário, tendo abandonado a cidade de ... em transporte público.

27- Refugiando-se em casa de um amigo na cidade de ....

28- Apesar de também ter sido atingida pelo ácido sulfúrico que derramou sobre a mãe, a arguida não se deslocou a qualquer unidade de saúde, para receber assistência médica, para evitar ser reconhecida e localizada pelas autoridades.

29- Em consequência da conduta da arguida, a vítima sofreu queimaduras de 3° grau na face, no tronco e nos membros superiores, que ocuparam 30 % da superfície corporal, obrigando ao transporte por helicóptero para a Unidade de Queimados do Centro Hospitalar de ..., onde ficou ventilada e sedada.

30- Em risco de vida.

31- Malgrado todos os cuidados médicos prestados, a vítima BB veio a falecer em 20/8/13.

32- Em consequência das lesões de queimadura do 3° grau, na cabeça, face, tórax, abdómen e membros superiores provocadas por ácido sulfúrico.

33- Entre a data do evento e a morte decorreram 27 dias, durante os quais decorreu internamento hospitalar ininterrupto e múltiplas intervenções terapêuticas.

34-As lesões descritas no relatório da autópsia foram a causa directa e necessária da morte de BB.

35- A arguida, ao despejar o ácido sulfúrico sobre a cabeça e o tronco da vítima, escolheu zonas vitais do corpo.

36- A arguida AA conhecia a capacidade corrosiva e letal do ácido sulfúrico, quando dirigido às zonas vitais do corpo, bem como dos efeitos mortais destas lesões no organismo humano.

37- Ao despejar o ácido sulfúrico sobre as zonas vitais da vítima, representou a morte desta como resultado da sua conduta.

38- Resultado que quis alcançar e concretizou.

39- Deste modo, agiu com a intenção de lhe retirar a vida.

40- A arguida mantinha alguns contactos com a vítima, conhecia a sua idade e dependência de suporte de vida para apoio ao sistema respiratório, utilizou um meio particularmente doloroso para concretizar o desejo de vingança e durante 2 meses concebeu detalhadamente o plano para concretização da morte da mãe.

41- A arguida actuou livre, voluntária e conscientemente, agindo sem qualquer constrangimento a uma vontade livre e esclarecida, apesar de saber que tal comportamento lhe estava vedado pelo Direito.

Do pedido de indemnização civil

42- Na sequência das lesões sofridas pela vítima DD, supra descritas, o Centro Hospitalar de ..., EPE prestou-lhe assistência hospitalar.

43- A assistência prestada consistiu nos procedimentos necessários ao tratamento das queimaduras extensas, ou queimaduras da espessura total da pele, incluindo ventilação mecânica.

44- O custo dessa assistência hospitalar importa em 17.753,82 €.

Relativos à arguida:

45- A arguida já foi condenada:

a) No âmbito do processo comum n.° 3/11.0PAPNI, do 1.ºJuízo do Tribunal de Peniche, por decisão de 18.11.2013, transitada em julgado a 30.09.2013, pela prática, no dia 01.01.2011, de um crime de ofensa à integridade física, previsto e punido pelo 143.°, n.° 1 do Código Penal, na pena de 220 dias de multa, depois substituída por 146 dias de prisão;

46- A arguida apresenta uma organização da Personalidade imatura e desequilibrada, propensa a uma impulsividade ideativa e comportamental e pautada pelos traços esquizóides e impulsivos, associados a uma estrutura de personalidade psicótica.

47- A sua personalidade pode ser caracterizada pelas frequentes, drásticas e imprevisíveis alterações de humor que afectam de forma decisiva a sua capacidade de gestão de conflitos e o seu ajustamento psicossocial.

48- A arguida acredita que as suas necessidades emocionais foram menosprezadas e ignoradas nas relações que foi estabelecendo na sua vida, projectando a culpa e a hostilidade para o seu seio familiar, sendo esta a angústia de base a todo o seu funcionamento psíquico.

49- Este funcionamento é gerido pela arguida através da resistência, desconfiança e rebeldia face à autoridade e através de um registo primário de externalização dos seus conflitos, com comportamentos socialmente desviantes (acting-out) sem qualquer mediação cognitiva.

50- A angústia descrita conduz a que a arguida não experiencie gratificação no âmbito das suas relações interpessoais, observando-se alienação social e emocional, optando por se manter afastada das relações pessoais num registo esquizóide.

51- Existe ainda uma temática depressiva secundária, mas que não é elaborada pela arguida e que surge como consequência das intensas carências afectivas e assente na crença de que nada que possa fazer irá produzir efeitos positivos.

52- A arguida manifesta atitudes negativas face ao tratamento, acreditando que não pode ser ajudada e não se sentindo disposta a discutir os seus problemas com outros, o que dificulta ou impossibilita eventuais processos de mudança comportamentais.

53- Ao nível cognitivo, a arguida apresenta uma inteligência global considerada ligeiramente reduzida quando comparada com outros sujeitos da sua idade, mas sem sinais de deterioração mental ou deterioração mnésica.

54- Contudo, revela algumas dificuldades no controlo dos seus processos cognitivos, sendo nitidamente pouco flexível e manifestando dificuldades ao nível da internalização de alguns aspectos associados às normas sociais.

55- Mas a arguida não apresenta indicadores de deterioração mental ou de deterioração mnésica significativos, revelando algumas dificuldades para focalizar a sua atenção e para manter os seus níveis de concentração de forma continuada, com distratibilidade fácil e uma elevada susceptibilidade interpessoal, que afecta a mobilização de alguns recursos cognitivos em situações de maior tensão.

56- Ao nível dos seus relacionamentos interpessoais e de socialização, a arguida revela um acentuado comprometimento e desajustamento, uma vez que tende a retrair-se e a isolar-se de uma forma autocentrada e imatura, não existindo envolvimento emocional significativo no âmbito das poucas relações que estabelece, revelando grandes dificuldades relacionais ao nível da gestão de conflitos e de contenção dos seus impulsos agressivos.

57- A arguida, sem capacidade de autocrítica, culpava a sua mãe pelos problemas da sua vida, exprimindo sentimentos de raiva e ódio que não conseguia racionalizar e integrar na sua vida mental.

58- A arguida, para os factos relatados nos autos, apresenta a sua capacidade de avaliar a ilicitude do seu comportamento e de se determinar por esta avaliação mantida, preenchendo os critérios médico-legais de imputabilidade.

59- As perturbações/disfunções graves a nível da personalidade da arguida, supra descritas, são resultantes do estilo de vida marginal que esta adoptou ao longo dos últimos anos, com consumo continuado de tóxicos.

60- Relativamente à perigosidade independente do quadro psicopatológico, esta personalidade acima descrita, revela imaturidade, uma frágil e negativa representação de si, com perturbações cognitivas e emocionais que causam uma importante instabilidade psíquica e um desajustamento social significativo, pelo que não pode ser em rigor excluída a possibilidade de ocorrerem desorganizações e comportamentos disruptivos em circunstâncias potenciadoras de maior tensão e/ou stress que possam activar a sua conflitualidade interpessoal.

61- Os riscos de violência, tanto no seu atual contexto institucional como em eventual contexto de inserção na comunidade, são considerados altos.

62- A arguida carece, do ponto de vista médico-legal, de um tratamento competente, especializado e prolongado em consulta de Psiquiatria, numa terapêutica mista-farmacológica e psicoterapêutica, para reduzir esse mesmo risco e prevenir eventuais situações potenciadoras de descompensação do seu quadro de natureza psicótica.

63- AA nunca beneficiou de um enquadramento familiar securizante, tendo mesmo sido institucionalizada na infância, entre os 3 e os 9 anos de idade e terá crescido muito sozinha, sem referências afectivas.

64- Neste sentido, toda a infância e adolescências surgem bastante traumáticas, autoreferenciando a arguida registos de maus-tratos, abusos sexuais e sentimentos abandónicos da figura materna.

65- O padrão de relacionamento entre mãe e filha, sempre foi muito disfuncional, com agressões verbais mútuas.

66- A arguida acusa a falecida mãe de inúmeras situações traumáticas, designadamente não a proteger do assédio do padrasto e de a incentivar à prática da prostituição, ainda em criança, bem como de "comprar" o seu silêncio ao longo dos anos.

67- Desde os 11 anos, num contexto de alegado sofrimento, AA começou a protagonizar fugas de casa, declarando sentir-se mais segura na rua do que em casa, substituindo gradualmente a família pelo apoio de amigos, namorados e vivências de rua, num contexto de pobreza e instabilidade de vínculos.

68- Progressivamente, ao longo dos últimos anos, cada vez mais a arguida ia a casa apenas para comer, tomar banho ou pedir dinheiro.

69- A arguida foi mãe com 15 anos de idade, na sequência de uma relação marital inicialmente securizante, que se manteve por cerca de três anos, até aos seus 17, altura em que saiu de casa, referindo-se a várias agressões do companheiro.

70- Retomou o anterior estilo de vida e foi apoiada pela segurança social.

71- Contudo, não terminou o curso de hidrobalneoterapia que então terá frequentado.

72- Ocupava o tempo junto de amigos da rua, praticando desportos náuticos e fazendo letras de fado, que também cantava, chegando a viver em casa de um monitor de kitesurf e bodyboard e depois na de um músico, para quem terá trabalhado algum tempo.

73- A arguida refere um alegado episódio de violação coletiva e continuada, aos 18 anos de idade, quando viveu em casa de um namorado.

74- Refere ainda que, desde essa altura ficou ansiosa, com menor vivacidade, maior irritabilidade e falta de ar, tendo sido acompanhada em consulta de psicologia, mas não aderiu à continuidade do acompanhamento.

75- Próximo dos 20/21 anos, estabeleceu a segunda relação marital, que a arguida classifica como gratificante, mas que terminaria pouco depois, aos 22 anos, num quadro de instabilidade afectiva, altura em que foi viver para ..., juntamente com o filho e com uma amiga, que conheceu nas ....

76- Foi na região do ..., onde também adoptou um estilo de vida de risco, que negligenciou o filho, por vezes junto de outros sem abrigo, tendo-lhe sido retirada a criança pelo Tribunal.

77- Desmotivada pelas actividades e aprendizagens, a arguida concluiu apenas o 6.° ano de escolaridade, aos 13/14 anos de idade.

78- A nível profissional, a arguida identifica apenas duas actividades, num restaurante e numa empresa de eventos musicais, embora sempre procurasse prover pela sua subsistência, colaborando com pessoas amigas, que temporariamente a acolhiam ou lhe davam alimentos.

79- À data dos factos, AAo, residia no ..., na casa de um amigo que conheceu nas ruas, que adoptava um estilo de vida desregrado.

80- Depois de perder o filho, AA desorganizou-se mais, tendo chegado a viver no ano transacto, cerca de três meses em França, junto da irmã mais nova, que a expulsou de casa, dada a desorientação da arguida.

81- Quando regressou a Portugal, a arguida encontrava-se emocionalmente descompensada e fisicamente muito debilitada, tendo sido apoiada pelos serviços de segurança social.

82- Com consumos regulares de haxixe, dificuldades de autocontrolo e verbalizando sentimentos negativos face à mãe e com queixas psicossomáticas, AA foi internada em Psiquiatria no Hospital de ..., em Março de 2013.

83- Apresentava ideias delirantes e hetero agressividade, mas teve alta algumas semanas depois, por não apresentar psicopatologia que justificasse o internamento, embora com necessidade de terapêutica antipsicótica.

84- Nessa altura, apesar do apoio dos serviços sociais locais, a arguida rejeitou o projecto de inserção numa instituição, bem como as consultas na equipa de tratamento do IDT de ..., às quais não compareceu.

85- A arguida expressa afirmações motivacionais no sentido de mudar o seu anterior estilo de vida.

86- Em meio prisional, AA não apresenta grandes dificuldades de auto-controlo e mantém consulta de psiquiatria com terapêutica ansiolítica/antidepressiva que, todavia, nem sempre toma.

87- De modo geral, a arguida regista uma inter-acção interpessoal adequada, embora se registe, em 27 de Fevereiro, uma sanção disciplinar de 5 dias de Permanência Obrigatória no Alojamento (POA) por comportamento incorrecto face a funcionário.

88- De momento, os familiares manifestam sentimentos negativos, que comprometem qualquer tipo de suporte.

89- Resta-lhe o apoio de outras reclusas, designadamente uma ex-reclusa, que já a visitou.

B- Factos não provados:

Não se provaram quaisquer outros factos com relevo para a decisão da causa.»

Por tais factos, foi a recorrente condenada pela prática de um crime de homicídio qualificado, na pena de 20 anos de prisão, qualificação jurídica de que discorda, por entender estar-se perante um crime privilegiado de homicídio, bem como de não ter sido considerada a inimputabilidade, ou pelo menos a imputabilidade diminuída, questões que se passam a examinar.


b. Omissão de pronúncia quanto à inimputabilidade ou imputabilidade diminuída da recorrente
1. Suscita a recorrente a omissão de pronúncia quanto à sua inimputabilidade ou imputabilidade diminuída.
A recorrente suscita a questão da inimputabilidade. Fá-lo em termos hesitantes na conclusão T, quando afirma que «omitindo (…) a pronúncia quanto às conclusões constantes dos relatórios periciais junto aos autos, (…) apontam francamente para reconhecimento de inimputabilidade (…)» e, a final, no pedido, quando invoca «que a arguida atuou em estado de inimputabilidade».
É a 1.ª vez que a questão da inimputabilidade é suscitada nestes termos, não tendo sido submetida ao tribunal da relação.
Trata-se de questão nova, sendo que «os recursos servem apenas para reexaminar as decisões tomadas pelas instâncias e não para apreciar questões novas, conforme tem sido múltiplas vezes afirmado. Por isso se entende que o Supremo Tribunal de Justiça não pode apreciar questão não suscitada perante a 2ª instância.»[6]
Assim sendo, não há que conhecer de tal questão.
2. Quanto à questão da imputabilidade diminuída, a recorrente suscitou-a perante o tribunal de relação, nomeadamente nos n.os 11, 12 e 15 das suas conclusões.
O acórdão recorrido identifica a questão da imputabilidade diminuída no n.º 3 da parte VI, epigrafado de «Cumpre decidir», reproduzindo-a nos seguintes termos:
«A arguida atou em estado de imputabilidade diminuída e praticou o facto ilícito movida por um estado de especial e compreensível emoção violenta, o que diminui sensivelmente sua culpa nos termos conjugados do disposto nos art. 20.º e 133.º do Código Penal, alterando-se a pena aplicada nos precisos termos, o que requer.»

O acórdão recorrido, no capítulo 6, onde aborda as questões sobre um «Eventual erro de julgamento» refere-se expressamente que «[o] tribunal a quo pronunciou-se expressamente sobre a eventual imputabilidade diminuída da arguida, pelo que não existe omissão de pronuncia» acrescentado, «sobre a imputabilidade diminuída invocada pela arguida, entendemos que tal não se verifica, tal como decidiu o Tribunal a quo», cuja parcela da decisão reproduziu como segue:

«No que concerne ao enquadramento psicológico da arguida (Factos Provados 46 a 62), o tribunal baseou-se no teor dos relatórios periciais de fls. 688 a 745 (relatório pericial psicológico) e fls. 748 a 755 (relatório pericial psiquiátrico), assim como nos esclarecimentos dos peritos que os elaboraram. Tais relatórios (com especial destaque para o primeiro) mostram-se bem esclarecedores sobre as características da personalidade da arguida que, apesar de traços psicóticos, não tem um descontrolo psicótico, mantendo o discernimento, bem como a consciência da ilicitude. Como os peritos bem referiram, a conduta da arguida decorreu de um planeamento que ela soube descrever, descrevendo também os actos praticados.»

Ainda no mesmo capítulo, a questão da imputabilidade diminuída é trazida à discussão nestes termos:

«Dos depoimentos/declarações dos Srs. Peritos Médicos (…), cujas gravações ouvimos, resulta que embora a personalidade da arguida registe determinadas “disfunções” – “psicótica, imatura, desequilibrada, impulsiva, com traços esquizóides” - tal não coloca em crise a sua imputabilidade, que entendem existir, não havendo a considerar nenhuma inimputabilidade diminuída para a prática dos factos imputados. A arguida planeou cuidadosamente a acção e sabia o que queria fazer, tinha capacidade para avaliar as consequências e a ilicitude dos seus actos e se determinar em função dessa avaliação.»

A requerente alega (Conclusão EE) que o acórdão recorrido encontra-se «ferido de nulidade por omissão de pronúncia quanto à questão da eventual imputabilidade diminuída, sobejamente indiciada na prova pericial produzida», fundando-se no disposto nas alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 410.º e a alínea c) do n.º 1 do artigo 379.ºambos do CPP.
3. Nos termos da última norma mencionada, é nula a sentença «quando o tribunal deixe pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar …», norma aplicável aos acórdãos proferidos em recurso, por força do disposto no artigo 425.º, n.º 4, do CPP. Neste domínio, é jurisprudência deste Supremo Tribunal[7] que:
«(…) da conjugação do disposto no art. 97º nº 5 com as demais normas atinentes aos actos decisórios dos juízes, muito em particular com os arts. 118.º, n.ºs 1 e 2, 123.º, n.ºs 1 e 2, 374.º, n.º 2, 379.º, n.º 1, al. a), e 425.º, n.º 4, todos do Código de Processo Penal, resulta inequívoco que o dever de fundamentação não assume exactamente a mesma extensão consoante o acto decisório seja um simples despacho interlocutório, uma sentença ou um acórdão de um tribunal de 1.ª instância ou um acórdão proferido em sede de recurso por um tribunal de superior grau hierárquico.
As exigências de fundamentação da sentença prescritas no art. 374.º, n.º 2, do Código de Processo Penal não são directamente aplicáveis aos acórdãos proferidos em recurso pelos tribunais superiores, mas tão-só por via das disposições conjugadas dos arts. 379.° e 425.°, n.º 4, daquele diploma legal, conforme é entendimento do Supremo Tribunal de Justiça, o que tem levado este Tribunal a considerar que “aquelas decisões não são elaboradas nos precisos termos previstos para as sentenças proferidas em 1.ª instância, o que bem se compreende dado o seu objecto ser a decisão recorrida e não directamente a apreciação do objecto do processo” e que “por isso o tribunal de recurso está apenas obrigado a sindicar a decisão recorrida, verificando, grosso modo, se a prova foi legal e correctamente valorada e apreciada (caso lhe tenha sido pedido e caiba nos seus poderes de cognição o reexame da matéria de facto) […] sendo que, no caso de entender que a valoração e apreciação da prova se mostram correctas […] pode limitar-se a explicitar as razões pelas quais adere aos juízos de facto […] formulados pelo tribunal recorrido, ou seja, à decisão sob recurso.” (ac. 21-01-2009 – Proc. 4016/08 – 3ª Sec.).»
4. O acórdão recorrido além de destacar o julgamento da 1.ª instância sobre a questão, com o qual concordou, como expressamente refere, ainda acrescentou que foram ouvidos os depoimentos/declarações dos peritos médicos e que não obstante a «personalidade da arguida registe determinadas “disfunções” – “psicótica, imatura, desequilibrada, impulsiva, com traços esquizóides”», essas disfunções não colocam «em crise a sua imputabilidade, que entendem existir, não havendo a considerar nenhuma inimputabilidade diminuída para a prática dos factos imputados».
Não ocorre, assim a alegada omissão de pronúncia, improcedendo o recurso nesta parte.

b.  Qualificação jurídica dos factos

1.   As instâncias integraram os factos cometidos pela recorrente no tipo penal de homicídio qualificado, previsto e punido pelas disposições combinadas dos artigos 131.º e 132.º, n.os 1 e 2, alíneas a) (descendente), c) (pessoa particularmente indefesa em razão da idade e doença), d) (prazer em causar sofrimento), i) (meio insidioso), e j) (premeditação) todos do CP.

No recurso que interpôs para a 2.ª instância, a recorrente suscitou a questão da diferente qualificação jurídica dos factos, entendendo integrado o tipo penal de homicídio privilegiado, p. e p. pelo artigo 133.º do CP, questão que foi detalhadamente apreciada, com recurso a extenso suporte doutrinal e abundante jurisprudência, concluindo pela desconsideração de tal tipo penal, e mantendo o decidido.

Agora perante este Supremo Tribunal, reitera a recorrente que praticou o facto ilícito num quadro de desespero (Conclusão YY), mas sobretudo «movida por um estado de especial e compreensível emoção violenta, o que diminui sensivelmente sua culpa nos termos conjugados do disposto nos art. 20.º e 133.º do Código Penal, alterando-se a pena aplicada nos precisos termos».

O apelo ao artigo 20.º do CP, relativo à inimputabilidade, deve ser liminarmente afastado pelo que antes se referiu quanto aos factos provados e juízo firmado, por um lado, por ter sido afirmada a imputabilidade da recorrente, e, por outro, por não ser de considerar qualquer inimputabilidade ou imputabilidade diminuída.

2.   Subsiste, assim, a divergência quanto à qualificação do ilícito cometido, que a recorrente entende dever ser o de homicídio privilegiado, por ter sido cometido num quadro de desespero (conclusões YY, CCC e FFF) ou motivada por emoção violenta, como decorre das suas conclusões ZZ, AAA, GGG, JJJ e em particular da DDD, quando refere que «resulta de toda a prova produzida e bem assim da leitura da matéria de facto, globalmente considerada, que o Tribunal devia ter ponderado na apreciação do exacto estado emocional em que a arguida agiu, e assim concluir pela emoção violenta, susceptível de integrar a previsão do art.133.º, do Código Penal», emoção violenta que define como «um forte estado de afeto, a relação da arguida com a mãe mormente as fortes carências afectivas vivenciadas pela mesma, e bem assim os traumas de abusos vivenciados que, desencadearam una reação agressiva» (Conclusão GGG).

Preceitua o artigo 133.º do CP que «[q]uem matar outra pessoa dominado por compreensível emoção violenta, compaixão, desespero ou motivo de relevante valor social ou moral, que diminuam sensivelmente a sua culpa é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos».

Este Supremo Tribunal já interpretou a norma penal em causa, no sentido de que «[a] enumeração das circunstâncias que caracterizam o tipo privilegiado de homicídio feita no artigo 133.º não é exemplificativa», não tendo sido intenção «consagrar uma cláusula geral de menor exigibilidade no crime de homicídio; foi, pelo contrário, a de vincular uma tal cláusula à verificação de um dos pressupostos nele explicita e esgotantemente contidos»[8]-[9].

Constituindo a «compreensível emoção violenta; a compaixão; o desespero; ou um motivo de relevante valor social ou moral (…) cláusulas que apontam para a redução da culpa, ou cláusulas de privilegiamento, ou elementos privilegiadores, traduzindo estados de afecto vividos pelo agente, ou causas de atenuação especial da pena do homicídio», ficando o efeito diminuídor da culpa a «dever ao reconhecimento de que, naquela situação (endógena e exógena), também o agente normalmente “fiel ao direito” (“conformado com a ordem jurídico penal”) teria sido sensível ao conflito espiritual que lhe foi criado e por ele afectado na sua decisão, no sentido de lhe ter sido estorvado o normal cumprimento das suas intenções» (cf., Figueiredo Dias, Comentário Conimbricense § 1, pág. 47, e § 3, pág. 48).»[10]

Ainda segundo o mesmo acórdão, «[a] compreensível emoção violenta é um forte estado de afecto emocional provocado por uma situação pela qual o agente não pode ser censurado e à qual também o homem normalmente “fiel ao direito” não deixaria de ser sensível (cf., Figueiredo Dias, Comentário Conimbricense …, § 7, pág. 50)», tendo a emoção violenta «referências na «figura paralela» da provocação denominada “suficiente”, no domínio do CP/1886, sendo aquela  que atingiu “uma intensidade tal que, face a ela, seria razoavelmente de esperar que o provocado reagisse através de uma agressão” (cf., Eduardo Correia, in Direito Criminal, II, págs. 278 e ss), sendo «imperativo o estabelecimento de uma relação entre o afecto e as suas causas ou motivos, pois, para se entender uma emoção tem de se entender as relações que lhe deram origem, tendo em atenção o sujeito que a sentiu e o contexto em que se verificou a atitude, em ordem a entender o estado de espírito, o «conflito espiritual», a situação psíquica que leva o agente ao crime», mas o «facto que origina a emoção não tem que radicar, no entanto, em qualquer provocação. Na perspectiva do art. 133º - assente, não em juízos de ponderação ético-jurídicos dos valores conflituantes, mas sim na valoração da situação psíquica que leva o agente ao crime – o que interessa é «compreender» esse mesmo estado psíquico, no contexto em que se verificou, a fim de se poder simultaneamente «compreender» a personalidade do agente manifestada no facto criminoso e, assim, efectuar sobre a mesma o juízo de (des) valor que afinal constitui o juízo de culpa.»[11]

Apoiando-se na doutrina, «Figueiredo Dias (Parecer publicado na Colectânea de Jurisprudência 1987, tomo 4, pág. 55), considera, (…), que o que interessa é «compreender» o estado psíquico do agente, no contexto em que se verificou, a fim de se poder simultaneamente «compreender» a personalidade do agente manifestada no facto criminoso e, assim, efectuar sobre a mesma o juízo de (des)valor que afinal constitui o juízo de culpa”», enquanto «Teresa Serra (Homicídios em série, págs. 166 e 168), (…), sustenta que a emoção violenta só é compreensível em face das razões que lhe deram origem e do sujeito particular que as sofreu, especificando que o critério para aferir da diminuição sensível da culpa provocada por uma emoção violenta deve ser concretizado por referência à personalidade do agente individual que actua», tendo a jurisprudência seguido um ou outro dos critérios[12].

Sobre o elemento desespero também compreendido na norma penal em causa, seguindo Figueiredo Dias[13], «estará em causa não tanto a situação de falta de esperança na obtenção de um resultado ou de uma finalidade, quanto sobretudo estados de afecto ligados à angústia, à depressão ou à revolta», sendo que «casos haverá em que o desespero se associa (ou dá lugar) a uma súbita emoção violenta que determina a conduta homicida» e àquele poderão ser reconduzidos «certos casos da chamados de “humilhação prolongada” ou “tirania doméstica”».

Tais factores emotivos são geralmente entendidos como uma perturbação afectiva intensa e breve, que via de regra se desencadeia de modo imprevisto, provocada como reação a certos acontecimentos, acabando por predominar sobre as demais actividades psíquicas.[14]

3.   Na perspectiva da Recorrente, são a «compreensível emoção violenta» e o «desespero» que diminuem de forma sensível a sua culpa e privilegiam o crime de homicídio que praticou, suportando esta pretensão na argumentação que apresenta, nomeadamente nas conclusões RR a YY, AAA e BBB, onde alude a «circunstâncias traumáticas de exposição causadas pela progenitora», a «uma personalidade psicótica, com elevados índices de esquizofrenia reflexo das vivencias traumáticas e abandónicas de que foi alvo ao longo da sua vida e sobretudo na sua infância», a «abusos (…) de tal forma que se sentia mais segura em casa do que na rua», «a sujeição de uma criança a abuso reiterados por daqueles que legal e moralmente estavam obrigados à sua protecção não pode deixar de configurar factor determinante ao cometimento do facto delituante», e, assim, o «contexto em que a arguida se determinou e dispôs a cometer os factos delituosos, deve ser considerado excepcional em matéria de ilicitude, culpa ou prevenção (…)».

Sobre a compreensível emoção violenta, em que considerou integrar toda «[a] intensa perturbação emocional que vivenciou» (conclusão ZZ), e na qual incorpora, também, toda a factualidade constitutiva do desespero, para a bem qualificar é «imperativo o estabelecimento de uma relação entre o afecto e as suas causas ou motivos, o que ficou provado nos presentes autos pois, para se entender uma emoção tem de se entender as relações que lhe deram origem, tendo em atenção o sujeito que a sentiu e o contexto em que se verificou a atitude, em ordem a entender o estado de espírito, o «conflito espiritual», a situação psíquica que leva o agente ao crime, o que é patente e esclarecedor nos factos provados.»

4.   Nas instâncias ficou provado que a recorrente procurou a mãe no dia 24 de julho de 2013, tendo-se deslocado das ... para ..., e quando ficou só com ela, na rua, afastou-se um pouco, com a finalidade de retirar o garrafão contendo ácido sulfúrico, e a tirar-lhe a tampa para permitir o derramamento do conteúdo sobre o corpo da mãe, o que fez ato contínuo, na cabeça e no tórax daquela (n.os 8, 19, 20), tendo usado um meio particularmente doloroso para concretizar o desejo de vingança, tendo durante 2 meses concebido detalhadamente o plano para concretização da morte dela, período durante o qual comprou o garrafão com ácido sulfúrico, e agido sem qualquer constrangimento a uma vontade livre e esclarecida (n.º 41). Apesar de a recorrente ter uma organização de personalidade imatura e desequilibrada, pautada por traços esquizóides e impulsivos, associados a uma estrutura de personalidade psicótica (n.º 46) e uma inteligência global considerada ligeiramente reduzida quando comparada com outros sujeitos da sua idade, mas sem sinais de deterioração mental ou deterioração mnésica (n.º 53), apresenta a sua capacidade para avaliar a ilicitude do seu comportamento e de se determinar por esta avaliação (n.º 58).

Nunca beneficiou de um enquadramento familiar securizante, tendo mesmo sido institucionalizada na infância, entre os 3 e os 9 anos de idade e terá crescido muito sozinha, sem referências afectivas, toda a infância e adolescência surgem bastante traumáticas, autoreferenciando a arguida registos de maus-tratos, abusos sexuais e sentimentos abandónicos da figura materna, com um padrão de relacionamento entre mãe e filha, sempre muito disfuncional, com agressões verbais mútuas, esta acusando a falecida mãe de inúmeras situações traumáticas, designadamente não a proteger do assédio do padrasto e de a incentivar à prática da prostituição, ainda em criança, bem como de "comprar" o seu silêncio ao longo dos anos, começando a protagonizar, desde os 11 anos, fugas de casa, declarando sentir-se mais segura na rua do que em casa, sendo que, progressivamente, ao longo dos últimos anos, cada vez mais a arguida ia a casa apenas para comer, tomar banho ou pedir dinheiro (n.os 63 a 68).

5.   Os factos que estão provados, e as circunstâncias anteriores ao crime, de onde emerge um plano para a sua prática, congeminado e amadurecido ao longo de 2 meses, o ambiente que o envolveu, numa degradação disfuncional entre mãe e filha, filtrada ao longo do tempo, que, pelo circunstancialismo que lhe subjaz poderia, eventualmente, ser susceptível de induzir um estado psíquico de afectação, não comunga daquela característica intensa e breve, em regra desencadeada de modo imprevisto a algo surgido do momento, nem se revela bastante, entendida com a «gravidade ou peso (…) que estorva o cumprimento das intenções normais do agente e determinada por facto que lhe não é imputável»[15], para a configurar como «emoção violenta», e muito menos para integrar o requisito da compreensibilidade da emoção requerido pela norma.

Sobre o invocado desespero, com a delimitação e contornos antes assinalados, também da factualidade provada não decorre a configuração de um tal estado, «enquanto fonte de emoção violenta, ou seja de desespero limitativo das suas capacidades de resistência à situação criada pelo outro»[16], de que a situação vivenciada «se tenha transformado em estado de revolta motivador de um qualquer ataque emocional súbito e desculpável, próprio de quem não vê qualquer saída para a situação, enfim, que indiciem que o Arguido se sentiu encurralado, numa situação insuportável, ou que, como afirma, tivesse atingido o limite do desespero», devendo «ser afastada a subsunção da conduta ao tipo privilegiado quando não resulta dos factos provados que o recorrente tenha realizado a acção sob a influência dominadora e perturbadora desses sentimentos, de modo a afirmar-se que matou devido ao desespero, ainda que na acção homicida o agente assuma uma reacção ao comportamento reiterado da vítima, adequado a gerar sentimentos de desespero e saturação.[17]

Da factualidade provada não se descortina que a arguida e recorrente tenha perdido o controlo da ação que empreendeu, prendida por emoções ou afetos, antes mantendo o discernimento e a vontade, sem que tenha sido afetada ou perturbada por uma perda de consciência da realidade, fruto de uma descarga emocional; pelo contrário, o ato foi planeado em detalhe, ao longo de dois meses, com escolha do meio a usar ‒ o ácido sulfúrico ‒, cujas qualidades corrosivas e letais conhecia, e reflexão quanto ao momento da execução, na rua, encontrando-se apenas com a mãe, dependente de suporte de vida, e escolha de zonas vitais.

Como este Supremo Tribunal já decidiu, «[a] reflexão prolongada sobre o facto funciona como impeditivo do privilegiamento, pois com o passar do tempo o recorrente foi sedimentando a vontade de actuar, aumentando assim, a exigibilidade do não cometimento do crime»[18].

De todo o exposto decorre que não pode considerar-se integrado o tipo privilegiado do artigo 133.º do CP, improcedendo o recurso, também nesta parte.

III. Decisão

Termos em que acordam os Juízes do Supremo Tribunal de Justiça em:
a) Rejeitar, por não ser admissível, nos termos dos artigos. 414.º, n.º 2, e 420.º, n.º 1, alínea b), do CPP, o segmento do recurso em que a Recorrente concluiu que o acórdão recorrido enferma dos vícios da insuficiência para a decisão da matéria de facto e de contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão, previstos nas alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP;
b) Negar, no mais, quanto à omissão de pronúncia e diversa qualificação jurídica dos factos, provimento ao recurso.

Custas a cargo da recorrente, com 5 unidades de conta (UC) de taxa de justiça [artigo 513.º, n.º 1, do CPP e artigo 8.º, n.º 9 e Tabela III, do Regulamento das Custas Processuais (RCP), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, com as alterações de que foi objecto posteriormente].

*

Supremo Tribunal de Justiça, 9 de abril de 2015

(Processei e revi – artigo 94.º, n.º 2, do CPP)

Os Juízes Conselheiros,

João Silva Miguel

Armindo Monteiro

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[1]     Vd Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Universidade Católica Editora, 2008, anotação 12 ao artigo 410.º, p. 1079.
[2]     Acórdão de 4 de julho de 2013, processo n.º 39/10.8JBLSB.L1.S1.
[3]     Vd o acórdão de 19 de outubro de 1995, publicado como acórdão de fixação de jurisprudência n.º 7/95, Diário da República (DR), I série, n.º 298, de 28 de dezembro de 1995, pp. 8211-8213.
[4]     Simas Santos e Leal-Henriques, Código de Processo Penal, Anotado, II Volume, 2ª edição, Edição Rei dos Livros, 2004, p. 740.
[5]     Inserem-se os factos provados n.os  9 a 15, inclusive, que não constam do acórdão recorrido, em suporte papel nem no registo digital, devido a razões que se desconhecem, mas que se entende tratar de lapso de transcrição ou colagem do texto do acórdão da 1.ª instância onde constam, incorporação que é consentida pelo disposto nos n.os 1, alínea b), e 2 do artigo 380.º do CPP. Neste sentido, vd. Acórdãos deste Supremo Tribunal de 1 de julho de 2009, processo n.º 732/06.0GCFAR.S1, de 17 de novembro de 2011, processo n.º 267/10.6TCLSB.L1.S1, e de 8 de fevereiro de 2012, processo n.º 746/08.5TAVFR.P1.S1, acessíveis tal como outros citados no texto, quando outra fonte não for especificada, na base de dados do IGFEJ em http://www.dgsi.pt/.
[6]     Acórdão de 17 de dezembro de 2014, processo n.º 8/13.6JAFAR.E1.S1.
[7]     Acórdão de 17 de dezembro de 2014, processo n.º 8/13.6JAFAR.E1.S1.
[8]     Acórdão de 12 de setembro de 2013, processo n.º 844/11.8JAPRT.
[9]     Para uma análise circunstanciada da evolução histórica e interpretação deste tipo penal, vd. o acórdão de 29 de outubro de 2008, processo n.º 08P1309.
[10]    Acórdão citado na nota 8.
[11]    Idem.
[12]    Idem.
[13]    Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo I (artigos 131.º a 201.º), 2.ª edição, Coimbra Editora, 2012, §14 ao artigo 133.º, p. 89.
[14]    M. Miguel Garcia e J. M. Castela Rio, Código Penal e Parte geral e especial, com notas e comentários, Almedina, Coimbra, 2014, p. 516.
[15]    Figueiredo Dias, ob. cit, p. 86.
[16]    Acórdão de 7 de julho de 2010, processo n.º 22/07.0GACUB.E1.S2.
[17]    Acórdão de 10 de dezembro de 2009, processo n.º 36/08.3GABTC.P1.S1.
[18]    Acórdão de 29 de outubro de 2008, processo n.º 08P1309