Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
4382/13.6TBCSC.L1.S1
Nº Convencional: 6ª SECÇÃO
Relator: ANA PAULA BOULAROT
Descritores: JOGO DE FORTUNA E AZAR
PROIBIÇÃO DE ACESSO
SALAS DE JOGOS
INSPECÇÃO GERAL DE JOGOS
RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL
DIREITOS DE PERSONALIDADE
EXPECTATIVA JURÍDICA
CULPA
CONCORRÊNCIA DE CULPAS
Data do Acordão: 12/10/2015
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: ANOT. POR HUGO LUZ DOS SANTOS, IN "REVISTA DE DIREITO E DE ESTUDOS SOCIAIS" - A. 58 - 2ª SÉRIE, Nº 1-4 (JAN.-DEZ. 2017) P. 372-411
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL - RELAÇÕES JURÍDICAS / PESSOAS SINGULARES / DIREITOS DE PERSONALIDADE - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / FONTES DAS OBRIGAÇÕES / RESPONSABILIDADE CIVIL / RESPONSABILIDADE POR FACTOS ILÍCITOS / MODALIDADES DAS OBRIGAÇÕES / OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAÇÃO.
Doutrina:
- António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, 115.
- Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, I Vol., 1986, 477/478.
- Canaris citado por Manuel A. Carneiro da Frada, “A própria vida como dano? : dimensões civis e constitucionais de uma questão-limite” , In: Estudos em honra do Professor Doutor José de Oliveira Ascensão, vol. I, Coimbra, 2008, pp. 189 e 190.
- Henrique Lopes, Epidemiologia de dependência de jogo a dinheiro em Portugal, 2005.
- Januário Pinheiro, “ Lei do Jogo” Anotada e Comentada, 202 .
- Paulo Mota Pinto, A Limitação Voluntária do Direito à Reserva sobre a Intimidade da Vida Privada, pp. 552 e 553.
- Pedro Pais de Vasconcelos, in Direito de Personalidade, 45/47.
- Rabindranath V. A. Capelo de Sousa, O Direito Geral de Personalidade, 350, nota 873.

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- PARECER DA PROCURADORIA GERAL DA REPÚBLICA, DE 16 DE NOVEMBRO DE 1998, IN WWW.DGSI.PT .
- RECOMENDAÇÃO DA PROVEDORIA DE JUSTIÇA N.º 10/A-8/B/2012, HTTP://WWW.PROVEDOR-JUS.PT/ARCHIVE/DOC/REC_10AB2012_0.PDF
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 70.º, N.º2, 81.º, N.º1,483.º, 486.º, 487.º, N.º1, 570.º, N.º1,
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGO 26.º,
D.L. N.º 31/2011, DE 4 DE MARÇO (LEI DO BINGO): - ARTIGO 3.º
D.L. N.º 422/89, DE 2 DE DEZEMBRO (LEI DO JOGO): - ARTIGOS 1.º, 38.º, 29.º, 36.º, 41.º, 95.º, 125.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 29 DE MARÇO DE 2012, IN WWW.DGSI.PT .
Sumário :

I. Um jogador pode, por sua iniciativa, solicitar à autoridade competente (Inspecção Geral de Jogos), a proibição de acesso às salas de jogo, nos termos do artigo 38.º da Lei do Jogo.

II. Tal pedido insere-se dentro da esfera dos direitos de personalidade, constitucionalmente consagrados, cfr artigo 26.º da CRPortuguesa, na vertente da autodeterminação das partes.  

III. Se a lei permite a proibição de entrada nas salas de jogo, a pedido do próprio, é para que a mesma seja cumprida e não incumprida, devendo as concessionárias prover os meios necessários e suficientes para o efeito, levando a sua omissão à responsabilização daquelas em responsabilidade extra contratual, por violação de direito subjectivo do impetrante e de uma disposição legal destinada a proteger os interesses deste.

IV. Apurando-se que a conduta do jogador contribuiu para a produção do resultado, uma vez que não obstante o pedido formulado de inibição de entrada, continuou a frequentar as salas de jogo em outra área geográfica, deverá ser ponderada a repartição de culpas.

(APB)

Decisão Texto Integral:

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

I N, intentou contra E, SA acção declarativa com processo ordinário, pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de € 201.405,00, a titulo de indemnização por danos patrimoniais, decorrentes de gastos efectuados a jogar nas salas de jogo da Ré, apesar da proibição obtida para o efeito.

Alegou, para tanto, em síntese que frequentava, com regularidade, as salas de jogos do casino do E e de L, tendo-se viciado no jogo, aí apostando quantias elevadas.

Por força dos problemas económicos e familiares que o jogo lhe estava a causar, em 23 de Dezembro de 2011, junto da Inspecção de Jogos, apresentou requerimento de proibição de acesso a qualquer sala de jogos do país, o qual foi deferido. No entanto, pouco após a notificação do deferimento da proibição, o Autor não conseguiu resistir à tentação e voltou à sala de jogos do casino E, passando a apostar na sala de máquinas, como até então o tinha feito, várias vezes por semana, às vezes diariamente, desde cerca das 22 horas até ao fecho da sala, pelas 3 horas da manhã, tendo perdido mais de € 146.405,00 de Janeiro a Junho de 2012.

Os funcionários da Ré sabendo da proibição de entrada do Autor em qualquer casino, permitiram a sua entrada e que continuasse a jogar, aliciando-o com bebidas, comidas e jantares grátis, além de espectáculos, os quais lhe eram oferecidos a si e a quem o acompanhava.

O Autor, devido à omissão por parte da Ré de não permissão de entrada em qualquer sala de qualquer casino, de incumprimento da ordem e notificação da Inspecção Geral de Jogos, encontra-se completamente endividado, perdeu todo o seu crédito e credibilidade, assim como parte da sua dignidade, vive amargurado e deprimido.

Citada, a Ré veio apresentar contestação, na qual veio invocar duas excepções dilatórias - a ilegitimidade da Ré Administração da E (…), S.A e a incompetência material do Tribunal comum, tendo no mais impugnado a versão apresentada pelo Autor, invocando que não tem, nem teve, a possibilidade de impedir o acesso do Autor às salas de máquinas e de jogo, quer por agir na qualidade de concessionária, sujeita à tutela, quer pela natureza das notificações que recebe, quer pela própria legislação que estabelece os meios que pode utilizar para o efeito, tendo, quanto aos meios que lhe estão ao alcance usado de toda a diligência possível. A responsabilidade primeira pela entrada do Autor no Casino E da Ré deve ser imputada a título de dolo ao próprio Autor e seguidamente ao Serviço de Inspecção de Jogos, a quem cabe vigiar e fiscalizar as salas de jogo e os frequentadores. Alegou ainda que a pretensão que o Autor deduz assenta na prática por aquela de actos ilícitos que lhe são inteiramente imputáveis e que por conseguinte, excluem qualquer responsabilidade da Ré, quanto aos mesmos.

O Autor replicou defendendo a improcedência das excepções dilatórias invocadas.

Foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 79.058.70, absolvendo a Ré do demais peticionado.

Inconformada com tal decisão a Ré interpôs recurso de Apelação o qual veio a ser julgado procedente com a absolvição da mesma do pedido.

Inconformado, vem agora o Autor recorrer de Revista, apresentando as seguintes conclusões:

- Uma vez que não vem posta em causa a ilicitude da conduta da recorrida, importa aferir se face ao factos provados se pode ou não afirmar a existência de culpa da Ré.

- Consta da matéria de facto assente que o Autor logo após o seu pedido de interdição passou a jogar no casino E que em regra não frequentava.

- Do facto de o Autor ter passado a jogar no casino do E, que anteriormente não frequentava, em regra, logo após ter pedido a sua interdição, não se pode concluir que o Autor logo após a apresentação do pedido para a sua proibição de aceder às salas de jogos, passou a frequentar o casino do E, que antes não frequentava.

- Pois o Autor como qualquer jogador compulsivo jogava em várias salas de jogos nomeadamente na do casino do E e apenas em data imediatamente anterior ao seu pedido de proibição jogou no casino de L.

- O Autor era conhecido dos funcionários da Ré.

- Por vezes, os funcionários da Ré ofereciam bebidas e comidas ao Autor e a quem o acompanhava, quando aquele se encontrava na sala de jogos.

- Provado que o Autor era conhecido da Ré, ali entrava várias vezes por semana e permanecia largos períodos a jogar, ali levantava dinheiro utilizando o seu cartão bancário, era portador do cartão de cidadão e outros cartões com fotografia, cabia à Ré vigiar o seu acesso e permanência, mas ao invés, tenta justificar o injustificável, o que prova a negligência grosseira, pois se a Ré é diligente mas no acesso tudo permite, se fosse o caso, o casino carecia de segurança.

- A Ré face à actividade que explora está obrigada a zelar proactivamente pelo cumprimento das proibições de acesso impostas a indivíduos sujeitos à vertente negativa da actividade do jogo.

- O facto da lei não estipular um dever directo ao explorador de um casino de controlar pela apresentação de determinado cartão de identificação não isenta o mesmo do dever de fazer cumprir as normas que impendem o acesso de determinadas pessoas à sala de jogos não tradicionais, mesmo que por outros meios.

- Alegou a Ré, como consta no ponto 36.º dos factos provados: “A Ré para impedir o acesso às máquinas das pessoas proibidas de jogar usa os seguintes meios: a divulgação das notificações, instalação de câmaras de videovigilância, o enfoque destas nas entradas, o monotorização em permanência por uma equipa de operadores de CCTV cujo quadro conta com 7 elementos, cuidado e vigilância permanente que é exercido pelas chefias no interior da sala, a facilidade de comunicação entre estes e os operadores de CCTV e o controlo de utilização do cartão Club in.”

- Mas a Ré não alegou nem provou que tendo sido o Autor notado a jogar na sala de máquinas ao ponto de lhe terem sido oferecidas bebidas e comida a ele e a quem o acompanhava para que este permanecesse mais tempo a jogar e incentivando-o ao jogo, por indicação do chefe de sala (pessoa também incumbida de impedir o acesso e permanência às máquinas das pessoas proibidas) e a facilidade de comunicação deste com os operadores de CCTV, tivesse sida pedida por algum dos seus funcionários identificação ao Autor.

- A Ré, depois de ter notado o Autor na sala de jogos pela forma como jogava, ao ponto de lhe oferecer bebidas, tinha ao seu alcance um meio simples c eficaz (e sem necessidade de outros meios que a Ré alegou e provou usar) de impedir a sua permanência na sala de jogos.

- Assim e como se extrai da sentença do Tribunal da 1ª instância é evidente que os meios que a Ré alega usar para impedir o acesso à sala de máquinas pelas pessoas proibidas não foram suficientes nem eficazes para o cumprimento do seu dever.

- A Ré pura e simplesmente não cumpriu o seu dever, e sendo a acção ou omissão um ato controlável pela vontade, para afastar a sua culpa há que assentar que tudo fez, tudo o que estava ao seu alcance para obviar a este resultado, o que não se verifica no caso concreto.

- A Ré alegou e provou que é difícil o controlo (com os meios que dispõe) devido ao número de pessoas que entram diariamente no casino, mas não é impossível principalmente se a pessoa proibida, como foi o caso do Autor, ora Recorrente de Janeiro a Junho de 2012 jogou na sala de máquinas da Ré várias vezes por semana, gastando por vezes diariamente quantias superiores a €4.000,00, tendo por vezes os funcionários da Ré oferecido bebidas e comidas ao Autor e a quem o acompanhava quando este se encontrava na sala de jogos.

- A Ré não fez tudo o que estava ao seu alcance para acatar a proibição determinada pela Inspecção Geral de Jogos, de acesso do Autor à sua sala de jogos.

- A Ré poderia ter conformado a sua conduta de modo a assegurar o cumprimento do dever que lhe era exigível e imposto por lei.

- Os factos são suficientes para integrar um juízo de reprovação ético-jurídica à conduta da Ré, concluindo-se pela sua culpa.

- No acesso à sala e permanência na sala de máquinas a lei exige que o jogador seja portador de um documento de identificação (artigo 36.°, n° 3 da Lei do Jogo), pelo que os funcionários e responsáveis do casino podiam ter exercido o controlo do acesso do Autor.

- E mesmo que o controlo de acesso do Autor à sala de máquinas se tivesse frustrado, qualquer funcionário da Ré, nomeadamente o chefe de sala, poderia ter expulsado o Autor, o que também não sucedeu entre Janeiro a Junho de 2012.

- Consta dos factos provados que a fotografia do Autor que constava na notificação feita à Ré era de meio corpo, tipo passe.

- Daí não se pode concluir como o fez o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, que por essa razão, ninguém na Ré, detectou pessoa cuja aparência correspondesse à fotografia do Autor impressa na notificação do SIJ.

- Certo é que se trata de uma fotografia tipo passe no entanto tal fotografia em nada prejudica o reconhecimento do Autor pelo contrário o Autor tem traços de fisionomia incomum os quais em tudo contribuem para a sua identificação rápida e clara e a fotografia apesar do seu tamanho permite uma identificação visual imediata do Autor, (fls. 242 dos autos)

- Não exclui a culpa da Ré a circunstância da fotografia do Autor constante na notificação feita pela Inspecção Geral de Jogos à Ré ser de meio corpo, tipo passe, pois a mesma não dificultou o seu reconhecimento.

- O facto de Autor ter passado a frequentar o casino do E após o seu pedido de proibição a aceder às salas de jogos não contribuiu, muito menos de forma decisiva para não ser identificado.

- Pois o Autor não frequentou o casino do E de forma habitual imediatamente antes do seu pedido de proibição por frequentar o casino de L..., no entanto o Autor era conhecido dos funcionários da Ré e de outros jogadores que como o Autor frequentavam vários casinos.

- A Ré é pessoa experiente e conhecedora dos hábitos dos jogadores compulsivos, mas não tem interesse em impedir o acesso e permanência de jogadores, nomeadamente proibidos, pela razão de que lucra com isso.

- O Autor não adaptou qualquer conduta que tornasse inviável a sua identificação pelo contrário entrou, permaneceu e saiu várias vezes por semana, durante cerca de seis meses na sala de máquinas explorada pela Ré, onde jogou, apostando sempre forte o que era do conhecimento dos funcionários da Ré que por terem detectado ser um “bom jogador” lhe ofereceram bebida e comida por diversas vezes, incentivando-o dessa forma ao jogo.

- A Ré não se ficou apenas pela omissão do cumprimento da notificação da Inspecção-Geral de Jogos, mas mais do que isso, adoptou condutas que aliciaram o Autor a deslocar-se e a permanecer na sala de jogos do casino do E.

- Não podemos concordar com a afirmação constante do douto acórdão recorrido de que o Autor “(...) com essa conduta, tornou inviável a imputação de um juízo de desvalor à concessionária, ora Apelante, por não lhe ser exigível outro comportamento, nas condições descritas.”

- Pois como também é referido na sentença do Tribunal a quo “Não obstante o regime legal ser incompleto, o conjunto de deveres impostos à Ré impõe: uma conduta proactiva adequada ao efectivo cumprimento do dever legal de proibir a entrada àqueles que lenham sido objecto de proibição administrativa de acesso à sala de jogos de casino, dado o conhecimento que necessariamente tem da personalidade compulsiva da generalidade dos jogadores proibidos de frequentar as salas de jogos. Cfr AC RP de 01/07/2013 no processo 984/09.7TVPRT.P1”.

- Acrescenta: “Todo o regime legal, como se viu, afasta a necessidade de identificação dos jogadores quando se dirigem às salas de máquinas, não podendo a Ré impô-la sem desobedecer àquele quadro legal, mas pode fazê-lo quando existam motivos que o determinem, como a averiguação da existência ou não da proibição de acesso aos jogos imposta sobre o jogador, nomeadamente face ao tipo de jogo observado.” - No caso em concreto existiam motivos sérios para averiguação da proibição do Autor e a Ré não o fez.

- Incumbe sobre as concessionárias a obrigação de determinar a quem for encontrado numa sala de jogos em infracção às disposições legais, que se retire.

- Em particular, estão obrigadas a desenvolver os actos necessários a impedir o acesso às salas de jogos a quem requereu e obteve do Inspector-geral de jogos a proibição de acesso, nos termos do disposto no artigo 38.° da Lei do Jogo cfr acórdão do STJ de 29 de Março de 2012, proc. N.°1840/05.0TBESP.

- No caso dos autos existiam indícios claros para que a Ré pudesse concluir que o Autor poderia estar impedido de jogar pelo que era exigido à Ré que utilizasse um grau maior de busca do Autor na lista de impedidos ou que obtivesse a identificação do mesmo, o que a concessionária não cumpriu durante cerca de seis meses consecutivos.

- O Acórdão recorrido considera que: “Nas condições mencionadas, impõe-se concluir que os actos excluem um juízo de reprovação ético-jurídica à conduta da Ré, levando-nos a excluir a culpa, ou seja a percentagem de culpa de 60% que lhe tinha sido atribuída pela 1ª instância.”

- Não podemos concordar com a posição assumida pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa e sim com a que consta da sentença da 1ª instância: “Assim, na repartição de culpas, há que conjugar o comportamento negligente da sociedade anónima que com fins lucrativos se dedica a esta actividade (pesando o carácter profissional da mesma como exigente de especiais deveres de cuidado e maior responsabilidade a negligência como atenuadora dessa mesma responsabilidade) e o comportamento doloso do Autor, pesando contra si o dolo mas a seu favor o titular da norma protectora, considerado, pois, como parte necessitada de protecção. Assim, entende-se adequado fixar, neste caso, em 60% para a Ré e 40% para o Autor.”

- O Autor ao pedir a sua proibição de ingresso às salas de jogo assumiu a dificuldade per si de se afastar do jogo, cabia à Ré, principal beneficiária desse “vício”, tomar as medidas necessárias a impedir o acesso ao jogo/vicio.

- Consta ainda do douto acórdão recorrido que: "”(...) ao ter passado a frequentar outro casino, onde era totalmente desconhecido, o Autor acabou por, intencionalmente, dificultar, mesmo inviabilizar, o seu reconhecimento de forma a permitir o cumprimento da decisão da Inspecção-Geral de Jogos.”

- Ora, não podemos concordar com tal afirmação pois no ponto 18- dos factos provados consta: “O Autor passou a frequentar as salas de jogo do casino do E em data compreendida entre a apresentação do pedido efectuado pelo Autor para a sua proibição a aceder a salas de jogos e os finais do mês de Janeiro e 2012.”

- Portanto entre o dia 23/12/2011 e final do mês de Janeiro de 2012.

- No ponto 24- dos factos provados consta: “De Janeiro a Junho de 2012 (...).”

- O Autor frequentou a sala de máquina do casino do E vários dias por semana, por várias horas durante cerca de seis meses, daqui se extrai que o Autor não era nem podia ser desconhecido no casino do E.

- Não era totalmente desconhecido antes da sua proibição de aceder às salas de jogos de todos os casinos por frequentar a sala de jogos do casino do E, e;

- Não era desconhecido depois do despacho da Inspecção -Geral de Jogos que ocorreu em 27/12/2011 nem depois de ter acedido à sala de jogos do casino do E, o que ocorreu no decurso do mês de Janeiro de 2012, e,

- Mesmo que assim não fosse, o Autor ora Recorrente, deixou de ser desconhecido logo no dia 20 de Janeiro de 2012 quando se dirigiu à sala de jogos do casino do E (ponto 20 dos factos provados) tendo levantado na caixa de multibanco ali existente €800,00 (fls.192) e/ou nos dias subsequentes em que o Autor passou a jogar na sala de máquinas do casino do E (ponto 21 dos factos provados), várias vezes por semana, gastando por vezes diariamente quantias superiores a €4.000,00.

- E também, não era desconhecido quando os funcionários da Ré lhe ofereceram bebidas e comidas (ponto 22 dos factos provados).

- Pois a proibição do Autor em aceder a quaisquer salas de jogos verificou-se desde o início da sua entrada na sala de jogos do casino do E e estava em vigor no decurso do mês de Junho de 2012.

- Ora, o Autor era sobejamente conhecido pelo menos de alguns dos funcionário da Ré (chefe e funcionários das salas de máquinas).

- O Autor não teve qualquer intenção de dificultar o seu reconhecimento, muito menos inviabilizar o seu reconhecimento, sempre se apresentou a jogar de igual forma na sala de máquina das Ré.

- Face ao acima exposto o Venerando Tribunal da Relação deveria também ter concluído pelo preenchimento do pressuposto da responsabilidade civil “a culpa” da Ré, ainda que na sua modalidade mais ténue, a negligência e pelo preenchimento dos demais pressupostos da responsabilidade civil, “o dano e o nexo de causalidade adequada entre o facto e o dano”, tal como concluiu o Tribunal de 1ª instância.

- No caso dos autos a Ré tinha o dever jurídico de praticar o acto omitido, consubstanciado no impedimento que devia ter feito na entrada do Autor na sala de máquinas do casino E e foi a violação desse dever que deu origem ao dano.

- Dispõe o artigo 486º do Código Civil que as simples omissões dão lugar à obrigação de reparar os danos, quando, independentemente dos outros requisitos legais, havia por força da lei ou do negócio jurídico, o dever de praticar o acto omitido.

- Lê-se na sentença de 1ª instância: “Decorre patente dos factos apurados que o Autor viu o seu património diminuído na quantia de 131,764,50 € e que caso tivesse sido impedido de jogar nas máquinas utilizadas na Ré não teria esse prejuízo, sendo que existe uma relação de causalidade adequada entre permitir o acesso à sala de máquinas para jogar e a perda das quantias jogadas.”

- Continua: “Na hipótese de o próprio lesado ter concorrido para a produção ou o agravamento do dano, estipula o artigo 570º do Código Civil o ajustamento da concessão e do montante da indemnização à forma como, em cada caso concreto, a culpa do agente ou do devedor e a culpa do lesado contribuíram para a verificação do dano.”

- Não podíamos estar mais de acordo com a douta decisão da 1ª instância.

- E nessa medida, afigura-nos justa a repartição da responsabilidade de 60% para a Ré e 40% para o Autor. “(…) é a Ré responsável por 60% das perdas lidas pelo Autor  (estas, tendo em conta a percentagem de 10% que poderia ter recebido dos valores jogados, nos termos supra expostos) no valor de 131764,50, o que perfaz 79.058,70.”

- O Douto Acórdão recorrido, ao revogar a decisão da 1ª instância, absolvendo a Apelante do pedido, Apelante, violou, por erro de interpretação e de aplicação, o disposto no artigo 25.º da Constituição da República Portuguesa; 350.º, 483.º, 486.°, 487.°, todos do Código de Processo Civil; nos artigos 36.°, nº 1, 38.°, 41.°, n.°3, todos do Decreto Lei 422/89, de 2 de Dezembro, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.°10/95, de 19 de Janeiro e 40/2005, de 17 de Fevereiro.

Nas contra alegações a Ré concluiu pela improcedência do recurso e no caso de assim se não entender, pediu a ampliação do objecto da Revista:

- Deverá proferir-se Revista que confirme integralmente o decidido no Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa;

- Se assim não acontecer deverá considerar-se ampliado o objecto do presente recurso, por aplicação do disposto no artigo 636º n.º 1 do CPC e serem apreciadas as matérias de direito suscitadas no Recurso de Apelação interposto para o Tribunal da Relação de Lisboa mas que este não apreciou por terem ficado prejudicadas, e também aquelas em que na Apelação se decidiu de modo diferente do invocado pela então Recorrente, alterando, se for o caso, a decisão de 1ª Instância, por esta ter violado, por erro de interpretação e de aplicação, o disposto no art.º 607.º n.º 2 e 3 do Código de Processo Civil; art.º 26.º e 27.º da Constituição da República Portuguesa; os art.ºs 38.º, n.º 2, 41.º, nºs 2 e 3 e 35.º n.º 3 do Decreto-lei 422/89, de 2 de Fevereiro; o n.º 2 do Título III da Portaria n.º 217/2017, de 26 de Fevereiro; os artºs 342.º nº 1, 350.º, 483.º, 486.º, 487.º, 563.º, 566.º, n.º 2 e 570.º do Código Civil (C.C.), e em consequência decidir-se em absolver a ora Recorrida/Ré de todos os pedidos formulados pelo Autor ou, se assim se entender, mandar que os autos desçam ao Tribunal da Relação de Lisboa para julgar tais questões.

- Se assim também não for entendido, por se considerar que no recurso de Revista não tem aplicação o artigo 638º do CPC, deverá então admitir-se o recurso subordinado interposto considerando-se a presente contra-alegação como alegação nesse recurso subordinado para, em caso de procedência da alegação do ora Recorrente serem apreciadas as matérias de direito suscitadas no Recurso de Apelação interposto para o Tribunal da Relação de Lisboa, mas que este não apreciou por terem ficado prejudicadas, e também aquelas em que na Apelação se decidiu de modo diferente do invocado pela então Recorrente, alterando, se for o caso, a decisão de 1ª Instância, por esta ter violado, por erro de interpretação e de aplicação, o disposto no art.º 607.º, n.º 2 e 3 do Código de Processo Civil; art.º 26.º e 27.º da Constituição da República Portuguesa; os art.ºs 38.º, n.º 2, 41.º, n.ºs 2 e 3 e 35.º, n.º 3 do Decreto-lei 422/89, de 2 de Fevereiro; o n.º 2 do Título III da Portaria n.° 217/2017, de 26 de Fevereiro; os art.ºs 342.º, n.º 1, 350.º, 483.º, 486.º, 487.º, 563.º, 566.º n.º 2 e 570.º do Código Civil (C.C.), e em consequência decidir-se em absolver a ora Recorrida/Ré de todos os pedidos formulados pelo Autor ou, se assim se entender, mandar que os autos desçam ao Tribunal da Relação de Lisboa para julgar tais questões, ou caso assim se não entenda e havendo procedência das alegações de recurso, deverá ser reduzido o valor do dano indemnizável e seja revista a medida da responsabilidade de cada parte, fixando-se em 20% para a Ré e em 80% para o Autor.

II Põe-se como problema a resolver no âmbito do presente recurso o de saber se a Ré, aqui Recorrida, omitiu o cumprimento de algum dever, originando a violação do direito do Autor e no caso afirmativo qual a medida da sua responsabilidade.

 

As instâncias declararam como provados os seguintes factos:

1- O Autor frequentava com uma regularidade de vários dias por semana, as salas de jogos do casino de L, até Dezembro de 2011, fazendo apostas que, por dia chegavam a 1.500,00 €.

2- Parte deste dinheiro era seu e do seu cônjuge, outra parte emprestada e outra parte entregue por clientes seus para que lhes fizesse obras de construção civil, algumas das quais acabou por não realizar.

3- 0 Autor apresentou em 23/12/2011, junto da Inspecção de Jogos, requerimento para que fosse proibido o seu acesso a qualquer sala de jogos do país.

4- Por despacho da Inspecção-Geral de Jogos de 27/12/2011, foi deferida a sua pretensão, determinando a proibição do Autor a aceder a quaisquer salas de jogos de todos os casinos do país, pelo período de dois anos.

5- Despacho que foi comunicado ao Autor, por carta fechada datada de 11/01/2012.

6- Esta decisão foi comunicada à Ré, na pessoa do director dos serviços de jogos dos casinos, assim como às restantes salas de jogos do país;

7- Nessa notificação constavam os elementos de identificação e fotografias do Autor.

8- A Ré é a actual concessionária da exploração dos jogos de fortuna e azar na zona de jogo permanente do E.

9- A Ré explora o casino E ao abrigo do contrato de concessão celebrado com o Estado Português.

10- Em Dezembro de 2011, o Autor tinha perdido tudo e estava sem dinheiro, sem património, sem emprego e em vias de se divorciar.

11-   No casino E, a ficha de cliente do Autor foi criada em 11-01-2012, pelo Sr Inspector S, no dia em que foi introduzido no sistema informático do SIJ a proibição de o Autor entrar nos Casinos.

12-   A fotografia do Autor que constava na notificação feita à Ré era de meio corpo, tipo passe.

13-   Nela, apenas é visível a cara do Autor.

14- A Direcção do Serviço de Jogos da empresa concessionária deu imediato conhecimento visual do teor da notificação que lhe foi enviada aos seus trabalhadores e chefias a qual incluía uma reprodução da fotografia de tipo passe do Autor.

15-   Todos os profissionais do Casino E ficaram alertados e atentos para, caso detectassem o indivíduo da fotografia e de nome …, este fosse impedido de entrar, ou fosse expulso do interior dos casinos.

16-   Os trabalhadores da Ré estavam atentos a centenas de notificações de teor semelhante à que foi disponibilizada em relação ao Autor.

17-   Ninguém na Ré detectou qualquer pessoa cuja aparência correspondesse à fotografia impressa na notificação do SIJ.

18-   0 Autor passou a frequentar as salas de jogo do casino do E em data compreendida entre a apresentação do pedido efectuado pelo Autor para a sua proibição a aceder a salas de jogos e os finais do mês de Janeiro de 2012.

19-   0 facto do Autor ter passado a jogar no Casino E, que anteriormente não frequentava, em regra, logo após ter pedido a sua interdição, o que dificultou a identificação do Autor.

20-   No dia 20 de Janeiro, o Autor dirigiu-se à sala de jogos do casino E, levantando na Caixa Multibanco ali existente €800,00 (fls. 192).

21-   Desde pelo menos data aproximada a essa, o Autor passou a jogar na sala de máquinas do Casino do E, várias vezes por semana, gastando por vezes diariamente quantias superiores a € 4.000,00.

22-   Por vezes, os funcionários da Ré ofereciam bebidas e comidas ao Autor e a quem o acompanhava, quando se encontravam na sala de jogos.

23-   Pelo menos 90% do dinheiro que o Autor levantava perdia-o no jogo.

24- De Janeiro a Junho de 2012, levantou no Casino E € 146.405,00 (cento e quarenta e seis mil quatrocentos e cinco euros), que utilizou na sala de jogo, perdendo pelo menos 90% desse valor, no montante de € 131.764,50.

25- As máquinas também oferecem prémios aos jogadores.

26- Algumas vezes, o Autor levou consigo quantias monetárias em valor que se não mostra possível calcular, as quais jogou e perdeu.

27- 0 Autor não restituiu o dinheiro que pediu emprestado para jogar nem o dinheiro que lhe foi entregue para fazer obras que não realizou.

28- 0 crédito e a credibilidade do Autor estão diminuídos por ser conhecido que este gastou no jogo, dinheiro entregue para efectuar negócios.

29- 0 Autor está amargurado e deprimido.

30- O Autor não pediu ajuda a nenhum dos empregados ou responsáveis da sala de máquinas do Casino do E.

31- 0 Autor era pessoalmente desconhecido no Casino do E, antes de ser proibido de ali entrar.

32- 0 Autor não se apresentava no Casino do E com o seu último apelido.

33- 0 Autor não foi reconhecido como frequentador interdito, não pretendeu entrar na sala de jogos tradicionais do Casino do E, nem efectuou levantamento de montante igual ou superior a € 2.000,00, não provocou desacatos ou distúrbios na sala, pelo que os trabalhadores da Ré não exigiram àquele a sua identificação pessoal.

34- Não é hábito jogadores compulsivos deslocarem-se aos casinos com familiares e o Autor fê-lo no casino do E.

35- No casino do E, entram diariamente mais de 3400 pessoas, podendo ultrapassar as 7.000 ao fim de semana, a esmagadora maioria é gente anónima e desconhecida.

36- A Ré, para impedir o acesso às máquinas das pessoas proibidas de jogar usa os seguintes meios: a divulgação das notificações, instalação de câmaras de videovigilância, o enfoque destas nas entradas, a monitorização em permanência por uma equipa de operadores de CCTV cujo quadro conta com 7 elementos, cuidado e vigilância permanentes que são exercidos pelas chefias no interior da sala, a facilidade de comunicação entre estes e os operadores de CCTV e o controlo da utilização do cartão Club in.

Vejamos

O jogo é entendido na nossa ordem jurídica como o conjunto de jogos de fortuna ou azar, sendo os mesmo qualificado no artigo 1º da Lei do Jogo como «aqueles cujo resultado é definido por assentar exclusivamente na sorte.».

A Lei do Jogo considera que o jogo é uma actividade de interesse e de ordem pública, como decorre do seu preâmbulo e do artigo 95º, bem como do preâmbulo e do artigo 3.º do Decreto-Lei 31/2011, de 4 de Março (Lei do Bingo), reconhecendo-se-lhe múltiplas incidências, não apenas económicas mas também sociais, penais e tributárias.

Porque o jogo pode causar frequentemente uma adição, que conduz necessariamente à existência de jogadores compulsivos, a chamada ludopatia, estado este reconhecido desde 1992 pela Organização Mundial De Saúde como doença e assumido, ao nível dos cuidados de saúde, por vários países, embora tal não aconteça no nosso Serviço Nacional de Saúde apesar das várias recomendações a propósito, a Lei do Jogo veio introduzir a possibilidade do jogador solicitar que o seu próprio acesso às salas de jogo lhe seja proibido, vide sobre esta temática Henrique Lopes, Epidemiologia de dependência de jogo a dinheiro em Portugal, 2005.

Quer isto dizer que o legislador não ignorando, por um lado, os malefícios e consequências sociais negativas do jogo, teve a necessidade de conformá-lo a uma regulamentação e fiscalização particularmente rigorosa tendo em atenção, embora, a constatação das suas pontencialidades no desenvolvimento das áreas turísticas, cfr preâmbulo da Lei; Parecer da PGR de 16 de Novembro de 1998, in www.dgsi.pt; Recomendação da Provedoria de Justiça n.º 10/A-8/B/2012.

No caso em análise, o Recorrente em 23 de Dezembro de 2011, apresentou junto da Inspecção de Jogos, um requerimento a solicitar a proibição do seu acesso a qualquer sala de jogos do país, sendo que por despacho da Inspecção-Geral de Jogos de 27 de Dezembro de 2011, foi deferida tal pretensão, determinando a proibição daquele a aceder a quaisquer salas de jogos de todos os casinos do país, pelo período de dois anos, o que foi comunicado ao Autor e à Ré, na pessoa do director dos serviços de jogos dos casinos, assim como às restantes salas de jogos do país, constando de tal notificação os elementos de identificação e fotografias do Autor, pontos 3 a 6 da factualidade dada como provada.

Como já aludimos supra, um jogador, pode por sua iniciativa, solicitar à autoridade competente, a proibição de acesso às salas de jogo, sendo tal possibilidade resultante do processo aludido no artigo 38º da Lei do Jogo onde se preceitua:

«1. Por sua iniciativa, ou a pedido justificado das concessionárias, ou ainda dos próprios interessados, o Inspector-Geral de Jogos pode proibir o acesso às salas de jogos a quaisquer indivíduos, nos termos do presente diploma, por períodos não superiores a cinco anos.

2. Quando a proibição for meramente preventiva ou cautelar, não excederá dois anos e fundamentar-se-á em indícios reputados suficientes de ser inconveniente a presença dos frequentadores nas salas de jogos.

3. Das decisões tomadas pelo Inspector-Geral de Jogos, ao abrigo do disposto nos números anteriores e nos arts. 36.º e 37.º, cabe recurso para o membro do Governo responsável pela área do turismo, nos termos da lei geral.».

O Autor/Recorrente, efectuou como se expôs, o pedido para a sua própria interdição de entrada nos casinos, devido a ser um frequentador regular, de vários dias por semana, das salas de jogos do casino de L, até Dezembro de 2011, fazendo apostas que, por dia chegavam a 1.500,00 €, esbanjando dinheiros próprios e do e do seu cônjuge, de empréstimos que contraía para o efeito e ainda, quantias entregues por clientes seus para que lhes fizesse obras de construção civil, algumas das quais acabou por não realizar.

Tal pedido do Autor/Recorrente, insere-se dentro da esfera dos seus direitos de personalidade, constitucionalmente consagrados, cfr artigo 26º da CRPortuguesa, na vertente da autodeterminação das partes.   

O direito subjectivo de personalidade implica uma posição jurídica pessoal de vantagem, de livre exercício, dominantemente activa, inerente à afectação, com êxito, de bens e dos correspondentes meios, isto é, de poderes jurídicos e materiais, necessários, convenientes ou simplesmente úteis, à realização de fins específicos e um seu concreto titular, cfr Pedro Pais de Vasconcelos, in Direito de Personalidade, 45/47.

De outra banda, a perspectiva objectiva dos direitos não abrange apenas o dever do próprio para consigo e para com os demais, mas também está situado neste âmbito o dever de tutela do Estado, pois o poder público não deve apenas abster-se de violar os direitos, sobre si impende o supremo dever de os proteger (no caso veja-se o poder que é conferido à Inspecção-Geral de Jogos com a qual colaboram as concessionárias, atribuindo-lhes o poder dever de colaborar com aquela no condicionamento do acesso às salas de jogo), cfr Canaris citado por Manuel A. Carneiro da Frada, A própria vida como dano? : dimensões civis e constitucionais de uma questão-limite , In: Estudos em honra do Professor Doutor José de Oliveira Ascensão, vol. I, Coimbra, 2008, págs. 189 e 190

A pessoa humana, enquanto tal, deve exercer o direito ao livre desenvolvimento da sua personalidade, podendo ela própria definir os contornos do direito, através do consentimento ou pela sua limitação voluntária, desde que tal não seja contrário à ordem pública, cfr artigos 70º, nº2 e 81º do CCivil.

Traduzindo a limitação voluntária do direito, in casu, a declaração unilateral do interessado no sentido do não exercício do mesmo, autorizando a sua proibição de entrada nos casinos, nos termos do artigo 38º da Lei do Jogo, o titular do direito autoriza a prática do acto lesivo e, consequentemente, este acto terá uma dupla vertente, pois confere à outra parte um poder jurídico e cria para si um compromisso jurídico em tolerar o acto autorizado, tratando-se de um “consentimento autorizante”, cfr Rabindranath V. A. Capelo de Sousa, O Direito Geral de Personalidade, 350, nota 873; Paulo Mota Pinto, A Limitação Voluntária do Direito à Reserva sobre a Intimidade da Vida Privada, op. cit., págs. 552 e 553; António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, 115, sicOs direitos de personalidade representam, como quaisquer outros direitos subjectivos, posições de liberdade, reconhecidas ao seu beneficiário. Nessa qualidade, eles implicam disponibilidade”.

O princípio geral que rege a matéria da responsabilidade civil vem consignado no artigo 483° do Código Civil segundo o qual «Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação», incumbindo ao lesado provar a culpa do autor da lesão, de acordo com o disposto no artigo 487º, nº1, do mesmo diploma legal.

Constituem pressupostos do dever de reparação resultante da responsabilidade civil por factos ilícitos: a existência de um facto voluntário do agente e não de um facto natural causador de danos; a ilicitude desse facto; a existência de um nexo de imputação do facto ao lesante; que da violação do direito subjectivo ou da lei resulte um dano; que haja um nexo de causalidade entre o facto praticado pelo agente e o dano sofrido pela vítima de forma a poder concluir-se que este resulta daquela, cfr Antunes Varela, Das Obrigacões em Geral, I Vol., 1986, 477/478.

O segundo grau, afastou a responsabilidade da Recorrida, uma vez que entendeu que a esta não poderia ser assacada qualquer culpa na produção do resultado, além do mais porque:

«(…)6- Esta decisão foi comunicada à Ré, na pessoa do director dos serviços de jogos dos casinos, assim como às restantes salas de jogos do país;

7-     Nessa notificação, constavam os elementos de identificação e fotografias do Autor.

11-   No casino E, a ficha de cliente do Autor foi criada em 11-01-2012, pelo Sr Inspector S, no dia em que foi introduzido no sistema informático do SIJ a proibição de o Autor entrar nos Casinos.

12-A fotografia do Autor que constava na notificação feita à Ré era de meio corpo, tipo passe.

13-   Nela, apenas é visível a cara do Autor.

14-   A Direcção do Serviço de Jogos da empresa concessionária deu imediato conhecimento visual do teor da notificação que lhe foi enviada aos seus trabalhadores e chefias a qual incluía uma reprodução da fotografia de tipo passe do Autor.

15-   Todos os profissionais do Casino E ficaram alertados e atentos para, caso detectassem o indivíduo da fotografia e de nome N, este fosse impedido de entrar, ou fosse expulso do interior dos casinos.

16-   Os trabalhadores da Ré estavam atentos a centenas de notificações de teor semelhante à que foi disponibilizada em relação ao Autor.

17-   Ninguém na Ré detectou qualquer pessoa cuja aparência correspondesse à fotografia impressa na notificação do SIJ.

18-   0 Autor passou a frequentar as salas de jogo do casino do E em data compreendida entre a apresentação do pedido efectuado pelo Autor para a sua proibição a aceder a salas de jogos e os finais do mês de Janeiro de 2012.

19-   0 facto do Autor ter passado a jogar no Casino E, que anteriormente não frequentava, em regra, logo após ter pedido a sua interdição, o que dificultou a identificação do Autor.

35.   No casino do E, entram diariamente mais de 3400 pessoas, podendo ultrapassar as 7.000 ao fim de semana, a esmagadora maioria é gente anónima e desconhecida.

36.   A Ré, para impedir o acesso às máquinas das pessoas proibidas de jogar usa os seguintes meios: a divulgação das notificações, instalação de câmaras de videovigilância, o enfoque destas nas entradas, a monitorização em permanência por uma equipa de operadores de CCTV cujo quadro conta com 7 elementos, cuidado e vigilância permanentes que são exercidos pelas chefias no interior da sala, a facilidade de comunicação entre estes e os operadores de CCTV e o controlo da utilização do cartão Club in.

Na espécie, a Ré/Recorrida ao não cumprir a obrigação que sobre si impendia, de interditar a entrada ao Autor/Recorrente, violou o direito de personalidade daquele, bem como violou a proibição decorrente do normativo inserto no artigo 38º da lei do Jogo, que implicava a restrição de acesso à sala de jogo e consequente expulsão deste, como impõe o artigo 37º do mesmo diploma.

Como se verifica, da factualidade ora destacada, após a apresentação do pedido efectuado pelo Autor para a sua proibição de aceder a salas de jogos, passou a frequentar o Casino do E, que antes não frequentava. Tal circunstância, obviamente dificultou a identificação do Autor. Tanto mais que a fotografia do Autor que constava da notificação feita à Ré era apenas de meio corpo, tipo passe. E, por isso, ninguém na Ré, detectou qualquer pessoa cuja aparência correspondesse à fotografia impressa na notificação do SIJ. Sendo certo que entram no Casino do E, diariamente, 3400 pessoas, podendo ultrapassar 7000, ao fim de semana, sendo a maioria gente anónima e desconhecida, já se pode ver a dificuldade, praticamente a impossibilidade, de controlar tal número de pessoas, de modo a detectar as pessoas que são objecto da proibição de acesso.

Nestas condições, verificando-se que após ter feito a apresentação do pedido para a sua proibição a aceder a salas de jogos, o Autor passou a frequentar outro casino que não aquele que frequentava habitualmente, contribuiu decisivamente para não ser identificado. O Autor, com essa conduta, tornou inviável a imputação de um juízo de desvalor à concessionária, ora Apelante, por não lhe ser exigível outro comportamento, nas condições descritas.

Nas condições mencionadas, impõe-se concluir que os factos excluem um juízo de reprovação ético-jurídico à conduta da Ré, levando-nos a excluir a sua culpa, ou seja, a percentagem de culpa de 60% que lhe tinha sido atribuída pela l.ª instância.

Tanto mais que na própria sentença recorrida se admite o comportamento doloso do Autor. E na verdade, ao ter passado a frequentar outro casino, onde era totalmente desconhecido, o Autor acabou por, intencionalmente, dificultar, mesmo inviabilizar, o seu reconhecimento de forma a permitir o cumprimento da decisão da Inspecção-Geral de Jogos.

Faltando um dos pressupostos da responsabilidade civil que são cumulativos, prejudicada fica a apreciação dos restantes. (…)».

Não se pode concordar com este raciocínio, porquanto no mesmo se descuraram outros factos, igualmente dados como provados, que conjugados com estes supra descritos, nos conduzem necessariamente a uma outra conclusão.

É que, provado ficou ainda que:

«20-  No dia 20 de Janeiro, o Autor dirigiu-se à sala de jogos do casino E, levantando na Caixa Multibanco ali existente €800,00 (fls. 192).

21-   Desde pelo menos data aproximada a essa, o Autor passou a jogar na sala de máquinas do Casino do E, várias vezes por semana, gastando por vezes diariamente quantias superiores a € 4.000,00.

22-   Por vezes, os funcionários da Ré ofereciam bebidas e comidas ao Autor e a quem o acompanhava, quando se encontravam na sala de jogos.

23.   Pelo menos 90% do dinheiro que o Autor levantava perdia-o no jogo.

24.  De Janeiro a Junho de 2012, levantou no Casino E € 146.405,00 (cento e quarenta e seis mil quatrocentos e cinco euros), que utilizou na sala de jogo, perdendo pelo menos 90% desse valor, no montante de € 131.764,50.»

Queremos nós dizer que, não obstante esteja correcta a asserção de que o facto de o Casino do E ter bastante afluência diária, cerca de 3400 pessoas, podendo chegar a 7000 ao fim de semana, o que poderá dificultar a identificação dos jogadores, porquanto tal identificação não é obrigatória, não obstante os jogadores sejam obrigados a trazer consigo a respectiva identificação desde que tal entrada se limite às salas mistas de máquinas, bingo e de jogo do «Keno», ao contrário das salas de jogo bancado onde a identificação do jogador é obrigatória, cfr artigos 36º, 29º e 41º da Lei do Jogo, não quer dizer que a inércia da Ré possa estar isenta de critica.

Se não.

Estipulam aqueles normativos o seguinte:

«Artigo 36.º

Restrições de acesso

1 - O acesso às salas de jogos de fortuna ou azar é reservado, devendo o director do serviço de jogos ou a Inspecção-Geral de Jogos recusar a emissão de cartões de entrada ou o acesso aos indivíduos cuja presença nessas salas considerem inconveniente, designadamente nos casos do n.º 2 do artigo 29.º»

«Artigo 29.º

Reserva do direito de acesso aos casinos

1 - As concessionárias podem cobrar bilhetes de entrada nos casinos, cujo preço não deverá exceder um montante máximo a fixar anualmente pela Inspecção-Geral de Jogos.

2 - O acesso aos casinos é reservado, devendo as concessionárias não permitir a frequência de indivíduos que, designadamente:

a) A partir das 22 horas, sejam menores de 14 anos, excepto quando maiores de 10 anos, desde que acompanhados pelo respectivo encarregado de educação;

b) Não manifestem a intenção de utilizar ou consumir os serviços neles prestados;

c) Se recusem, sem causa legítima, a pagar os serviços utilizados ou consumidos;

d) Possam causar cenas de violência, distúrbios do ambiente ou causar estragos;

e) Possam incomodar os demais utentes do casino com o seu comportamento e apresentação;

f) Sejam acompanhados por animais, exerçam a venda ambulante ou prestem serviços.»

«Artigo 41.º

Controlo de acesso às salas de jogos

1 - As concessionárias manterão, durante todo o tempo em que estiverem abertas as salas de jogos tradicionais, um serviço, devidamente apetrechado e dotado de pessoal competente, destinado à identificação dos indivíduos que as pretendam frequentar e à fiscalização das respectivas entradas.

2 - Os porteiros das salas a que se refere o número anterior devem solicitar aos frequentadores a apresentação do cartão de acesso, por forma bem visível, e ainda, quando os não conheçam e o respectivo cartão não inclua a fotografia do titular, a exibição do documento que haja servido de base à emissão.

3 - A entrada e permanência nas salas mistas, de máquinas e de bingo, e nas salas de jogo do keno é condicionada à posse de um dos documentos de identificação previstos no artigo 39.º, devendo os porteiros de tais salas solicitar a exibição do mesmo, quando a aparência do frequentador for de molde a suscitar dúvidas sobre o cumprimento do requisito constante da alínea a) do n.º 2 do artigo 36.º

Não obstante no caso sub judice, não tivesse existido uma qualquer destas situações particulares que levassem ao pedido de identificação do Recorrente, não é crível que todas aquelas pessoas que frequentam as salas de jogo da Recorrida em número de 3400 por dia e de 7000 aos fins de semana, as frequentem regularmente todos os dias e nelas gastem quantias entre 800 e 4000 euros, e assim sendo, afigura-se-nos pelo menos razoável, que um tal comportamento diário de gastos, num país onde o ordenado mínimo atingia à data os 485 euros, tivesse suscitado, pelo menos, a curiosidade dos funcionários e dos responsáveis, de molde a colher informações sobre a identidade de uma personalidade, tão abonada, que se permitia diariamente esbanjar uma tal quantia de dinheiro.

De outra banda, também não se afigura normal que a Recorrida, desconhecendo, como diz desconhecer, o Recorrente, no meio dos milhares de jogadores que diariamente frequentam as suas salas, se permitia fazer-lhe ofertas de comidas e bebidas, bem como aos respectivos acompanhantes.

Todos estes considerandos nos levam à culpa da Ré/Recorrida, na omissão do dever de impedir o acesso do Recorrente às salas de jogo, nos termos das disposições conjugadas do artigo 38º da lei do Jogo e 486º do CCivil, cfr a propósito Januário Pinheiro, Lei do Jogo Anotada e Comentada, 202 sic «Proibido que seja, o jogador adquire uma expectativa, que tem de ser jurídica e que consiste no impedimento do acesso às salas de jogos, e as empresas concessionárias assumem a obrigação de impedir esse acesso.»; neste mesmo sentido o Ac STJ de 29 de Março de 2012 (Relator Tavares de Paiva), citado na sentença de primeiro grau e nas alegações de recurso, in www.dgsi.pt.

Efectivamente, se uma pessoa pede ajuda para deixar de jogar, através daquele meio preventivo e cautelar prevenido pelas disposições conjugadas do artigo 38º da Lei do Jogo e 70º, nº2 e 81º, nº1 do CCivil, cerceando assim, voluntariamente o seu direito de personalidade à sua autodeterminação, é porque não consegue sozinho (por si só), fazê-lo.

Se a lei permite que seja dada essa ajuda através da proibição de entrada nas salas de jogo, a pedido do próprio, é para que a mesma seja cumprida e não incumprida, devendo as concessionárias prover os meios necessários e suficientes para o efeito, não podendo a sua omissão levar apenas à condenação daquelas numa mera multa, nos termos do preceituado no artigo 125º da Lei do Jogo, face ao que dispõe o artigo 483º, nº1 do CCivil: houve a violação pela Ré de um direito subjectivo do Autor e de uma disposição legal destinada a proteger os interesses deste.

Mostram-se verificados, desta feita, todos os pressupostos do dever de indemnizar, a que alude aquele mesmo normativo civil, o que faz precludir a pretensão da Recorrida no que tange à ampliação do objecto do recurso, porquanto nas questões suscitadas por esta nas suas contra alegações de recurso, verifica-se que o que a mesma pretende é o conhecimento da sua razão, a qual, como se viu, foi conhecida, pela sua improcedência parcial em primeiro grau, total procedência em segundo grau e agora em sede de Revista, pela repristinação do ali decidido, não havendo quaisquer outras questões a conhecer, para além da medida da responsabilidade lhe foi assacada, porquanto não se demonstraram factos suficientes para o afastamento da mesma, como por si era esgrimido nos autos. 

Quanto ao montante indemnizatório.

Pretende o Autor/Recorrente, neste conspectu, que se mantenha a proporção de culpas aferida na primeira instância, de 40% para o Autor e de 60% para a Ré, ao que a Recorrida contrapõe o valor de 80% para aquele e de 20% para si própria.

Se concedemos razão à Ré quando aventa em abono da sua tese que não se pode conceder aos frequentadores que agem com dolo, uma vantagem que resultaria da interpretação da lei no sentido de que esta confere aos cidadãos um direito absoluto e individual à protecção, o que poderia redundar numa manifesta desporporcionalidade, se se chegasse à conclusão que qualquer pessoa poderia, quiçá, pedir dolosamente a restrição de acesso às salas de jogo, para poder obter vantagens patrimoniais das concessionárias, caso não fiscalizassem adequadamente as entradas e ao permitirem as mesmas, possibilitassem a efectivação de gastos.

Para tal, necessário se tornaria a alegação e prova de factualidade conducente a tal conclusão, isto é, impunha-se que a Ré alegasse e provasse – o que não aconteceu – que o Autor se havia colocado propositadamente naquela precisa situação para obter uma vantagem patrimonial daquela.

 

Porém, nada nos foi trazido aos autos neste sentido, para alem do comportamento compulsivo do Autor, que não obstante ter pedido a sua restrição de entrada, mudou de sala de jogo (de L para o E) e aproveitou-se da inércia culposa da Ré, já que esta, atentos os comportamentos reiterados do Recorrente, poderia e deveria ter agido de outra maneira, não compactuando com aquele, nem incentivando a sua permanência no casino, omitindo o dever de se informar acerca da sua identidade, o que sempre se imporia, além do mais face às circunstâncias específicas da actuação do Recorrente, o qual se tornou de um momento para o outro cliente regular e habitual do casino do E, aí despendendo somas altas de dinheiro nas salas mistas.

Quer dizer, ao contrário do que se entendeu em primeiro grau, que da parte do Autor existiu um comportamento doloso ao frequentar o casino, ao arrepio da proibição que havia solicitado, entendemos que se tratou, antes, de um comportamento culposo, grave, uma vez que sobre si impendia também o dever de se procurar controlar, recorrendo quiça a ajuda psicológica e/ou outra, não estando demonstrado que o Recorrente tenha agido intencionalmente, por forma a lesar a Ré/Recorrida.

A medida da repartição da responsabilidade foi adequadamente efectuada pelo primeiro grau, tendo em atenção o disposto no artigo 570º, nº1 do CCivil, embora se considere que ambas as actuações foram a título de culpa.

III Destarte, concede-se a Revista e em consequência revoga-se a decisão ínsita no Acórdão impugnado, repristinando-se a decisão de primeiro grau, embora com fundamentos algo diversos, condenando-se a Ré/Recorrida a satisfazer ao Autor/Recorrente, a titulo de indemnização por danos patrimoniais, a quantia de € 79.058,70.

Custas da Revista pela Ré/Recorrida e nas instâncias na proporção decidida pelo 1º grau.

Lisboa, 10 de Dezembro de 2015

(Ana Paula Boularot)

(Pinto de Almeida)

(Júlio Manuel Vieira Gomes)