Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 7.ª SECÇÃO | ||
Relator: | NUNO PINTO OLIVEIRA | ||
Descritores: | ADMISSIBILIDADE DE RECURSO RECURSO DE REVISTA DUPLA CONFORME REVISTA EXCECIONAL NULIDADE DE ACÓRDÃO | ||
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Data do Acordão: | 07/06/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA | ||
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Sumário : | I. — A arguição de nulidades do acórdão recorrido não é admitida como fundamento exclusivo de recurso de revista. II. — Desde que a dupla conforme não seja o único obstáculo ao conhecimento do recurso, não há que averiguar se se verifica, ou não, alguma das hipóteses do art. 672.º do Código de Processo Civil. | ||
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Decisão Texto Integral: | ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. — RELATÓRIO 1. AA instaurou a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra Seguradoras Unidas, S.A. (actualmente Generali), pedindo que a Ré seja condenada a pagar-lhe: a) A quantia de €.35242,45, a título de danos patrimoniais correspondendo €.22.742,45 ao valor da reparação efetiva do veículo automóvel e €.12.500,00 ao valor do parqueamento do veículo imobilizado, acrescida de juros legais contados desde a data da citação e até efectivo e integral pagamento; ou, em alternativa, b) a quantia de €.43.811,92 a título de danos patrimoniais, correspondendo €.31.311,92 e €.12.500,00 ao valor do parqueamento do veículo imobilizado, acrescida de juros legais contados desde a data da citação e até efectivo e integral pagamento; c) A quantia de €.5.000,00, relativo ao dano de privação de uso do veículo, acrescida de juros legais contados desde a data da citação e até efectivo e integral pagamento. 2. A Ré contestou, defendendo-se por impugnação. 3. O Tribunal de 1.ª instância julgou a acção improcedente. 4. Inconformado, o Autor AA interpôs recurso de apelação. 5. A A Ré contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso. 6. O Tribunal da Relação julgou o recurso improcedente, confirmando, por unanimidade, a decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª instância. 7. Inconformado, o Autor AA interpôs recurso de revista, a título normal e, subsidiariamente, a título excepcional. 8. Em primeiro lugar, o Autor, agora Recorrente, apresentou as seguintes conclusões do recurso de revista interposto a título normal: I. DA ADMISSIBILIDADE DO PRESENTE RECURSO I — O artigo 615.º, n.º 1, alínea b) e c), aplicável ex vi artigo 666.º,n.º 1, ambos do Cód. de Proc. Civil estatui, na parte que aqui importa considerar, que são nulas as sentenças quando não especifiquem os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão e quando ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade entre os fundamentos e a decisão. II — Nos termos do disposto no n.º 4 do mesmo artigo 615.º, as referidas nulidades só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário – são recursos ordinários os recursos de apelação e de revista (artigo 627.º, n.º 2, do CPC) –, podendo o recurso, no caso contrário, ter como fundamento essa e qualquer outra das demais nulidades mencionadas nas alíneas b) a e) do n.º 1. III — Consequentemente, atento o disposto no artigo 671.º, n.ºs 1 e 3, a contrario, doCód. de Proc. Civil, o douto acórdão proferido por este Venerando Tribunal da Relação é passível de recurso de revista para o Colendo Supremo Tribunal de Justiça. IV — Não se verifica uma dupla conforme nos termos previstos no art.º 671.º, n.º 3, do Cód. de Proc. Civil, pois apesar de não ter ocorrido modificação da matéria de facto, a fundamentação é essencialmente diferente, ainda que dentro do mesmo quadro normativo, e não um mero reforço desse entendimento. V — Inclusivamente o douto acórdão recorrido contém referências (no modesto entendimento, incompreensíveis) que não foram sequer mencionadas na sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª instância. VI — Caso assim não se entenda – o que não se concede e apenas se configura por mero dever de patrocínio – e, portanto, se se entender que o douto acórdão aqui prolatado confirmou, por unanimidade, o douto despacho recorrido proferido pelo Tribunal de 1.ª instância sem fundamentação essencialmente diferente, tal tem por consequência a existência de dupla conforme, VII — logo, o recurso de revista deverá ser admitido, a título excecional, por se verificarem, como se explanará, dois dos pressupostos previstos no artigo 672.º, n.º 1, alíneas a) e b), do Cód. de Proc. Civil, cabendo recurso da decisão proferida pelo Tribunal da Relação do Porto por estar em causa: questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito e interesses de particular relevância social. II. DO RECURSO DE REVISTA VIII — A presente revista tem como fundamentos a nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão e a ambiguidade e obscuridade da decisão, (art.º 615.º, n.º 1, alínea b) e c) aplicável ex vi art.º 674.º, n.º 1, alínea c) do Cód. de Proc. Civil). Falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão IX — Na Apelação levada a efeito, o Recorrente invocou a nulidade da sentença, nos termos do disposto do art.º 615.º, n.º 1, alínea c) do Cód. de Proc. Civil. X — No acórdão recorrido, esta questão aparece apreciada num só parágrafo – vide Ponto 4. do aresto – do qual se infere que não se vislumbra qual a contradição entres os fundamentos e a decisão, pois os fundamentos dizem que não se logra sequer determinar a existência de um dano indemnizável e a decisão é a improcedência da ação. XI — E, deste forma, improcede a nulidade. XII — Ora, não é plausível,nem sequer aceitável que seja decidida uma nulidade sem qualquer fundamentação tal qual foi apreciada nos termos referidos, pelo que a falta de fundamentação para a improcedência da nulidade arguida é, em si, mesma uma nulidade nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 615.º, n.º 1, alínea b) do Cód. de Proc. Civil ex vi art.º 674, n.º 1, alínea c) do mesmo diploma. Ambiguidade ou obscuridade da decisão. XIII — Como supra se aludiu, o Recorrente pediu a alteração da matéria de facto impugnando a decisão proferida nos seguintes pontos: §1. Factualidade considerada provada: “10) O local tem pouca iluminação e estava nevoeiro.” “19)Em consequência do referido em 7),o veículo com a matrícula ...-XJ-...,sofreu diversos danos não concretamente apurados.” §2. Factualidade considerada não provada: “a) O local referido em 4) a 7) é um local ermo e às 00.00/00.30horas do dia 11.03.2020 o nevoeiro era cerrado. b) Nas referidas circunstâncias, o Autor conduzia com máxima atenção, cuidado e zelo e a uma velocidade bastante inferior a 50 km/hora e não obstante, sem que nada o fizesse prever, despistou-se. c) O veículo com a matrícula ..-XJ-.. era um veículo bem estimado, com aspeto novo e com os cuidados assistenciais efetuados cíclica e atempadamente. d) O parqueamento tem um custo diário de €.50,00, que está a ser suportado pelo Autor.” XIV — Com efeito, entendeu o Recorrente que os meios de prova produzidos a respeito da materialidade em causa nos pontos de facto impugnados – maioritariamente produzidos em audiência de discussão e julgamento –, XV — não só não tinham as virtualidades probatórias que a Meritíssima Juiz a quo lhes conferiu na formação da sua convicção quanto a tais segmentos fácticos e, portanto, enquanto sustentáculo da decisão sobre a matéria de facto, como impunham decisão diametralmente oposta à que foi proferida. XVI — Para o efeito, o Recorrente transcreveu inúmeras passagens dos depoimentos das testemunhas que foram aproveitadas (mas não totalmente) pelo Venerando Tribunal da Relação, o que causa ambiguidade e obscuridade no aresto proferido. De facto. XVII — O acórdão recorrido faz uma análise seletiva, parcial e incorreta dos depoimentos das testemunhas e, desta forma, mantém inalterados os factos que o Recorrente entendeu serem de alterar. Vejamos. 70º — Quanto ao facto provado 10) e facto não provado a), no que tange à iluminação, o douto acórdão recorrido, conclui que “afinal alguma iluminação existe.” e baseia esta conclusão nos depoimentos das testemunhas BB, CC e DD, transcrevendo algumas frases ditas por aquelas testemunhas. XVIII — Mas esta transcrição não é feita na sua totalidade, o que se afigura incompreensível e, mais do isso, incorreto, levando a uma conclusão errada. XIX — O Venerando Tribunal da Relação do Porto aproveitou apenas partes dos depoimentos que justificam a conclusão ali aduzida, com a agravante de que logo a seguir a essas mesmas partes, as testemunhas, em discurso corrido, confirmam precisamente o contrário da conclusão aduzida. XX — Para melhor compreensão, nos depoimentos da CC e do DD, o Venerando Tribunal da Relação do Porto apenas aproveitou a 1.ª parte daqueles segmentos, como de seguida se vê. XXI — A testemunha CC confirmou que no dia do sinistro não havia iluminação – vide gravação na sessão de 31/03/2022 – minuto 00:03:45, com gravação N.º 20220331100707_15...81_399...29: “Testemunha- (…) Estava extremamente escuro. Aquela rua é extremamente escura. Estava muito frio. Mandatária do Autor- Tem iluminação Pública? Testemunha- Não, nenhuma. Aquela rua não tem iluminação praticamente nenhuma. Mandatária do Autor- Terá…, mas não… Testemunha- Não…. Naquele momento…não tinha…não tinha nada. Quando eu me dirigi lá não tinha. Aquilo é uma espécie com mato, muito agrícola…não sei explicar bem…não é assim cidade mesmo, parece mais meio aldeia.” (negrito e sublinhado nosso) XXII — A testemunha DD também confirmou que não se recordava se os postes de iluminação estavam ou não a funcionar, depreendendo-se das suas respostas que não estavam a funcionar, pois de outra forma, lembrar-se-ia – vide gravação na sessão de 31/03/2022, minuto 00:06:33, com gravação n.º 20220331102232_159...81_39...29: “Mandatária da Ré- Há iluminação pública no local? Testemunha- pouca. Mandatária da Ré- pouca. Consegue precisar isso, um bocadinho? Testemunha- tem...tem pouca luz, tem pouca luz. Mandatária da Ré- pronto, mas há postos de iluminação certo? estavam a funcionar na altura? Testemunha- Aí, não me lembro. - Aí, não me lembro - Aí, não me lembro. Mandatária da Ré- não sabe. Testemunha- Não me lembro. Mandatária da Ré- E sabe a localização desses postos de iluminação? Também não?” (negrito e sublinhado nosso) XXIII — Já quanto à testemunha BB, a contradição no acórdão recorrido é flagrante, pois o próprio acórdão refere que a testemunha disse que não havia postes a funcionar, mas conclui que “afinal alguma iluminação existe”. XXIV — Mas vamos ainda mais longe: a testemunha BB, no seu depoimento e aqui aproveita-se para também apreciar a questão do nevoeiro cerrado, afirmou que as luzesali existentes eram a do flash do telemóvel e as de sinalização do reboque– vide gravação na Sessão de 31/03/2022, minuto 00:12:02 com gravação N.º 20220331123920_159...81_39...29: “Mandatária da Ré: Olhe… e iluminação pública no local, há? Testemunha: Pouca. Mandatária da Ré: Pouca… consegue-nos precisar isso? Ali próximo ao local, havia algum poste de iluminação que estivesse a funcionar? Testemunha: Não. Mandatária da Ré: Ali próximo ao local não havia nada?... Esta luz que vemos aqui nas fotografias?… Testemunha: Diga? Mandatária da Ré: A luz que vemos nas fotografias… Testemunha: É do flash do telemóvel. Mandatária da Ré: E para além disso? Vê-se uma outra, amarelada Testemunha: É a do reboque. Mandatária da Ré: É a do reboque? Testemunha: Sim. É dos pirilampos do reboque onde eu estava a trabalhar.” (negrito e sublinhado nosso) XXV — Quanto ao facto não provado b), o acórdão recorrido entende que é “…conclusiva e contém matéria de direito, pelo que não pode ser comprovada.” XXVI — Ora, se o facto não provado b) contém matéria de direito e não pode ser comprovada, pergunta-se por que razão a Meritíssima Juiz a quo a integrou nos factos não provados?! XXVII — Fácil: ao ler este facto não provado, percebe-se notoriamente que se trata de matéria de facto e não de direito, não se compreendendo a razão pela qual o acórdão recorrido “mata” esta questão, tornando-a numa não questão. XXVIII — Ou melhor, talvez se compreenda, pois a prova produzida indicia que aquele facto não provado devia constar da factualidade provada e a ser assim, a ação, com grande margem de certeza, seria procedente. Por outro lado. XXIX — O acórdão recorrido contém ilações relacionadas com os factos não provados b) e c) que são gravíssimas por não serem verdadeiras, dado que não foram sequer ditas por nenhuma das testemunhas, quer do Recorrente, quer da Recorrida e não existe prova documental nesse sentido. Veja-se: XXX — A 1.ª ilação é esta: “Portanto é curioso como aparece um reboque, da mesma oficina onde o autor repara os seus veículos, no local do acidente “inesperado”” XXXI — Em momento algum, foi dito por quem quer que seja, nem tão pouco resulta dos documentos constantes dos autos que a empresa de reboques pertencia à oficina de reparação de automóveis, até porque são sociedades distintas, com NIPC´s, sócios e sede distintas, não existindo nenhuma relação entre elas. XXXII — A 2.ª ilação é: “Logo o embate teria disso com o lado direito do veículo”. XXXIII — Ora, se o Recorrente afirmou que a curva era para a esquerda, mas pensou que era para a direita e virou nessa direção como é que é possível que o embate fosse do lado direito do veículo?! Mais ainda quando as árvores de grande porte, silvado e pedras se apresenta, do lado esquerdo do veículo que é onde existem os danos. XXXIV — E a 3.ª ilação é: “…note-se aliás que se assim fosse o autor não teria adquirido por 5 mil euros um novo mercedes usado” XXXV — Como é que o Recorrente poderia proceder à reparação, ainda que provisória, do veículo automóvel, quando o orçamento rondava os 20 mil euros? E será que com 5 mil euros conseguiria colocar o veículo a circular? XXXVI — Já quanto ao facto não provado constante da alínea d), é inaceitável dizer-se que o depoimento do Sr. EE é desconforme com esta realidade, pois foi o próprio que confirmou qual o valor do parqueamento e não haverá ninguém melhor do que ele para o dizer, independentemente do que o Recorrente, à data se lembrava. Assim. XXXVII — Os factos dados como provados e não provados impugnados e que o Venerando Tribunal da Relação não alterou, por contraditórios com toda a restante matéria dada como provada e face à prova produzida, não pode jamais afirmar-se que naquele dia e hora não ocorreu um acidente de viação, com aquele veículo. XXXVIII — Ocorre pois obscuridade e ambiguidade na decisão proferida pela Relação. Portanto. XXXIX — O acórdão de que se recorre padece de nulidades por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão e ainda de ambiguidade ou obscuridade da decisão final violando, deste modo, as regras de direito, sindicáveis perante este Tribunal Supremo. XL — Por isso, podem e devem ser postas em causa e alteradas as decisões tomadas pela Relação, pelo que nos termos do disposto no art.º 684º, do Cód. Proc. Civil, devem ser julgadas procedentes as nulidades supra invocadas e serem estas supridas por este Supremo Tribunal, declarando em que sentido a decisão deve ser modificada, conhecendo-se dos fundamentos do presente recurso. 9. Em segundo lugar, admitido a hipótese de se considerar haver dupla conforme, o Autor, agora Recorrente, apresentou as seguintes conclusões do recurso de revista interposto a título excepcional: I — Dá-se aqui por reproduzida os arts.º 1.º a 69.º e conclusões I a XL do recurso de revista que, por razões de economia processual se não transcrevem, sendo que, no modesto entendimento do Recorrente e salvo o devido respeito por melhor opinião, aquele douto aresto afigura-se incorreto. II — Por isso, é do douto acórdão que assim decidiu, com o qual não se conforma, que o Recorrente vem interpor o presente recurso de revista. A) DA QUESTÃO CUJA APRECIAÇÃO, PELA SUA RELEVÂNCIA JURÍDICA, É CLARAMENTE NECESSÁRIA PARA UMA MELHOR APLICAÇÃO DO DIREITO [ARTIGO 672.º, N.º 1,ALÍNEA A), DO CPC] III — No caso sub judice, a questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, se torna necessária para uma melhor aplicação do direito consubstancia-se na interpretação dada aos normativos constante nos art.º 32.º, art.º 46.º, 99.º, 100.º do RJCS e art.º 342.º, n.º 1 e 2 do Cód. Civil, respeitantes ao ónus e inversão do ónus da prova. IV — O douto acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto entendeu que é ao segurado (aqui Recorrente) que incumbe o ónus da provada ocorrência do sinistro com a indicação dos elementos constitutivos do seu direito indemnizatório reclamado, cobertos pelo risco e, por sua vez, incumbe à seguradora demonstrar a existência de uma eventual causa de exclusão da sua responsabilidade. V — Tal constitui jurisprudência pacífica e doutrina dominante, com a qual o Recorrente concorda, porém entende que o direito não devidamente aplicado no caso em apreço. VI — Incumbia ao Recorrente demonstrar os elementos constitutivos do direito indemnizatório de que se arroga credor na qualidade de segurado, sendo esses elementos: a prova do sinistro, os danos e o nexo de causalidade entre o concreto sinistro e os danos. VII — O Recorrente logrou demonstrar, quer através de prova documental, junta por si, por terceiros e até mesmo pela Recorrida, quer através de prova testemunhal que o sinistro em causa nos autos ocorreu no dia 11 de março de 2020, pelas 00,17 horas, na Rua da ..., ..., distrito ..., Concelho ..., freguesia .... VIII — Foi interveniente o veículo ligeiro de passageiro, de marca Mercedes-Benz, modelo C – Classe (w205) C 250, de matrícula ..-XJ-.., propriedade do Recorrente e por ele conduzido. IX — Logrou provar que o acidente ocorreu à noite, num local sem iluminação, com condições climatéricas adversas: nevoeiro e asfalto molhado, que se despistou e entrou pelo mato dentro (pois pensava que a curva era para a direita quando na verdade era à esquerda). X — Esse mato era constituído por árvores de grade porte, silvado, folhas e pedras, tendo sido ainda descrito a existência de um pilar de pedra que dificultou o reboque do veículo, levando mesmo a partir o guincho do reboque. XI — Aliás, a sentença proferida na 1.ª instância na pág. 10 considera sem “quaisquer dúvidas que no dia e local em causa, o veículo do Autor, com o Autor a conduzir, saiu da estrada em que seguia e ficou imobilizado numa zona de mato e arvoredo”. XII — E na pág. 11, logo no primeiro e segundo parágrafos, a sentença descreve e admite a descrição que o Recorrente fez do local e das circunstâncias do acidente, descrição corroborada pelas testemunhas que estiveram no local. XIII — Razão pela qual se conclui que o Recorrente cumpriu com o ónus de provar que o sinistro ocorreu nas circunstâncias já descritas. XIV — No que tange aos danos, os mesmos foram aferidos com a Recorrida e a Oficina Reparadora de automóveis, tendo sido elaborado, pela Recorrida, um “Boletim de Perda Parcial”, junto aos autos onde segundo a própria Recorrida, os mesmos ascendiam ao valor de € 22.742,45 (vinte e dois mil, setecentos e quarenta e dois euros e quarenta e seis cêntimos). XV — Por último e talvez o elemento mais importante para a constituição do direito de indemnização é o nexo de causalidade entre o concreto sinistro e os danos. XVI — Em primeiro lugar, os peritos admitiram, desde logo, que quando existe uma alteração ao contrato de seguro, designadamente com inclusão de mais coberturas como ocorreu no caso sub judice, há uma presunção (errada no nosso entendimento) de que o acidente foi simulado, doloso ou fraudulento. XVII — No ponto de vista do Recorrente, tal significa que a análise e averiguação do sinistro não será efetuada corretamente, pois o objetivo não é verificar as condições em que o sinistro ocorreu, mas sim encontrar elementos (nem que seja só um) de que o sinistro não ocorreu naquele dia, hora e local e, em consequência (dizemos nós) beneficiar a Companhia de Seguros, neste caso a Recorrida, para a qual prestam serviços. XVIII — De facto, os peritos FF e GG consideraram que os danos não eram compatíveis com o local do acidente, referindo-se, expressamente, aos danos nas jantes e nos retrovisores, principalmente, no retrovisor direito e desvalorizando todos os demais danos (que são imensos) na lateral esquerda do veículo automóvel, irrepreensivelmente, compatíveis com o local do sinistro. XIX — Ora, como podem ambos os peritos fazer tal afirmação, se o perito GG se baseou apenas nas fotografias do veículo, e a sua visita ao local foi posterior à do perito FF, que, por sua vez, se deslocou ao local do acidente 15 dias após a data do sinistro, lapso temporal perfeitamente idóneo a alterar as condições físicas do local em comparação com as do momento do sinistro (curiosamente não existe registo fotográfico desta diligência, mas adiante também falaremos disso). XX — Porém, as várias testemunhas que estiveram no local e viram o carro confirmaram que o local tinha pedras, pilares e árvores de grande porte suscetíveis de causar os danos que o veículo tinha, sendo que a testemunha BB confirmou a existência de uma pedra grande e de um pilar e, com certeza, foi aí que o retrovisor e as jantes bateram bem como a existência de vegetação. XXI — E quanto às jantes, mencionou que quando estava a tentar rebocar o veículo do Recorrente, o guincho do reboque partiu e a parte traseira do veículo bateu contra uma pedra, causando outos danos. XXII — E, a este propósito, quanto aos sinais de arrastamento, havia de se ter considerado o facto de o reboque ter estado a fazer força e fricção para retirar o veículo do local onde estava, o que implica, desde logo, um arrastamento do veículo, causando danos nos pneus e nas jantes. XXIII — Repare-se que todos os demais danos (que são a maioria) são absolutamente compatíveis com o local do sinistro e isso é desvalorizado pelos peritos. XXIV — Aliás, não se compreende e aqui sim, é caso de suspeição, a razão pela qual os peritos não tiraram fotografias ao local do acidente ou, tendo tirado, por que razão a Recorrida não as juntou aos autos. XXV — Atente-se o ónus da prova quanto à possibilidade do sinistro ter sido simulado ou doloso compete à Recorrida (art.º 342.º, n.º 2 do Cód. Civil). XXVI — Ainda que o perito (pois só um deles foi ao local e viu o veículo automóvel) o tenha feito 15 dias após o sinistro, é estranho não terem tirado fotografias. XXVII — Certamente as mesmas iam revelar aquilo que não é conveniente à Recorrida e que a visualização do google maps não permitiu ver, ou seja, de que o local reunia todas as condições compatíveis com os danos que o veículo do Recorrente possuía e, com certeza, iria revelar as pedras, a dita pedra grande que terá partido o guincho, árvores de grande porte, vegetação densa, sinais/ marcas no piso do arrastamento dos pneus. XXVIII — Até porque não só a Recorrida não juntou tais fotografias como também, quando solicitada, não forneceu os elementos do processo ao Recorrente. XXIX — Esta recusa é notoriamente suspeita bem como a inexistência de fotografias do local do sinistro 15 dias após o mesmo, pois são raros os relatórios de averiguação de acidentes de viação que não contêm fotografias do local do sinistro, mais ainda quando se pretende escusar a responsabilidade. XXX — O perito FF que tanto falou do pneu furado com sinais de arrastamento, acaba por entrar em consonância com o afirmado pela testemunha BB que disse que ao tentar puxar o veículo, a força foi tanta que partiu o guincho e, segundo a lei da física, (parece-nos óbvio) que este ato implicou arrastamento do veículo com fricção dos pneus de tal forma elevada ao ponto de partir o guincho, o que aliás já se constatou e foi mencionado nos artigos precedentes desta peça. XXXI — Sendo que as condições estão reunidas para que os danos tenham ocorrido naquele local e só assim não entenderam os peritos face à presunção pré-concebida de que o acidente haveria de ter ocorrido noutro local e seria um sinistro simulado, dada a alteração do seguro. XXXII — Mas quanto a este ponto coloca-se a questão: então porque é que a Recorrida aceitou a alteração, recebeu o prémio (que é bem mais alto) se já fazia intenção de, mediante uma situação destas, furtar-se à responsabilidade? XXXIII — A testemunha HH no que tange a esta questão dos pneus (bastante extensa e com pouca relevância, diga-se) afirmou que a jante partida para estar no estado em que estava tinha de ter batido em algo duro. Ora. XXXIV — O depoimento efetuado pela testemunha BB foi no sentido da existência de pedras, pilares árvores de grande porte, pilares e uma pedra grande que dificultaram a retirada do veículo do local e, repita-se, provocaram o estrago do guincho do reboque. XXXV — Todos os detalhes relatados por ele levam à conclusão de que as jantes partiram no embate com as pedras e pilares, principalmente, com o embate na pedra grande que tanto dificultou o reboque. XXXVI — Assim, é questão de intensa relevância jurídica que se considere que o Recorrente logrou provar a existência do sinistro no local, dia e hora indicado, os danos e ainda o nexo de causalidade entre o concreto sinistro e os danos XXXVII — E que por outro lado, não conseguiu a Recorrida provar a existência de uma causa de exclusão da sua responsabilidade. XXXVIII — E, resolvida a questão jurídica desta forma, é imperioso que se determine a existência de um direito de crédito do Recorrente sobre a Recorrida, devendo aquela proceder ao pagamento da indemnização devida. B’) DOS INTERESSES DE PARTICULAR RELEVÂNCIA SOCIAL [ARTIGO 672.º, N.º 1, ALÍNEA B), DO CPC]. XXXIX — Entende o Recorrente que a questão em apreço nos presentes autos reveste “interesse de particular relevância social”, designadamente no que tange ao ónus da prova do segurado e inversão do ónus da prova da seguradora, bem como quanto à questão da alteração ao contrato de seguro. XL — O contrato de seguro é um contrato bilateral ou sinalagmático e aleatório, sendo-o na medida em que a prestação da seguradora fica dependente de um evento futuro e incerto – um sinistro -, a concretizar o risco coberto. XLI — Constituindo o risco a possibilidade de ocorrência de um evento futuro e incerto, de natureza fortuita, com consequências prejudiciais para o segurado, tal elemento essencial do contrato de seguro concretiza-se no sinistro (ocorrência concreta do risco. XLII — Celebrado entre as partes contrato de seguro de danos próprios e alegado concreto sinistro, ao segurado incumbe o ónus da prova das alegadas ocorrências concretas, em conformidade com as situações descritas nas cláusulas de cobertura do risco do contrato, que determinariam o pagamento da indemnização, ou seja, a prova do sinistro, dos danos e do nexo de causalidade entre o concreto sinistro alegado e esses danos, como factos constitutivos do seu direito de indemnização (nº1, do art.º 342º, do Código Civil), competindo à seguradora o ónus da alegação e da prova dos factos ou circunstâncias que sejam suscetíveis de retirar a natureza fortuita que os mesmos aparentem ou excludentes do risco, a título de factos impeditivos, conducentes à exclusão da sua responsabilidade (n.º 2 de tal artigo). XLIII — Não cumpre aquele ónus a seguradora que se limita a fazer acusações vãs e sem fundamento de que o sinistro não ocorreu naquelas circunstâncias. Por outro lado. XLIV — O Decreto-lei n.º 72/2008, de 16 de Abril respeitante ao RJCS estipula no art.º 91.º que existe um dever de informação entre o tomador do seguro e a seguradora no que tange a alterações ao contrato, remetendo ainda para os arts. 18.º a 21.º e 24.º deste diploma. XLV — O Recorrente entendeu proceder à alteração das coberturas do seu contrato de seguro durante a sua vigência e a Recorrida aceitou essas mesmas alterações e cobrou o prémio respeitante às mesmas. XLVI — O Recorrente ficou convencido de que se tivesse um sinistro como o descrito nos autos, a Recorrida cobriria o risco, mas tal não aconteceu. XLVII — Surpreendentemente, o Recorrente tomou conhecimento durante a pendência do julgamento que quando existe uma alteração ao contrato de seguro, designadamente com inclusão de mais coberturas como ocorreu no caso sub judice, há uma presunção por parte da Recorrida de que o acidente foi simulado, doloso ou fraudulento. XLVIII — O que reveste manifesta má-fé perante os segurados que, inocentemente, procedem a alterações aos seus seguros, criam expetativas e depois as mesmas vêm-se frustradas dado o comportamento das Seguradoras. XLIX — Assim, é de relevante interesse social, a análise desta presunção assumida pela Recorrida, ajustando-se a decisão de forma que se faça a necessária e expectável Justiça que a comunidade jurídica não entende poder ser feita de outra forma. L — O acórdão recorrido põe em causa a eficácia do direito e a sua credibilidade, sobretudo na perspetiva da sua aplicação casuística, na medida em que as enunciadas questões cuja apreciação, pela sua relevância jurídica e relevância social, se tornam inequivocamente necessárias para uma melhor aplicação do direito, assumindo assim uma relevância autónoma e para além dos interesses em jogo no caso concreto, o que leva, por si só, à admissão do recurso de revista excecional. LI — É isto, esta violação gritante, esta injustiça atroz, que o Recorrente clama seja corrigida por V. Exas. Nestes termos, e nos melhores de Direito que V.ªs. Ex.ªs. muito doutamente suprirão, deve ser julgado procedente o recurso interposto, alterando-se, em conformidade, o Acórdão proferido Decidindo deste modo, farão V.ªs. Ex.ªs., aliás como sempre, um ato de INTEIRA E SÃ JUSTIÇA. 10. A Ré contra-alegou, pugnando pela inadmissibilidade e, subsidiariamente, pela improcedência do recurso. 11. Em 3 de Maio de 2023, foi proferido o depacho previsto no art. 655.º do Código de Processo Civil. 12. O Rrcorrente AA respondeu ao despacho previsto no art. 655.º do Código de Processo Civil nos seguintes termos: 1º Resulta do parecer/despacho proferido pelo Exmo. Senhor Relator o seguinte: “Ora o recurso de revista excepcional pressupõe o preenchimento dos requisitos gerais de admissibilidade do recurso de revista, designadamente dos requisitos relacionados com o conteúdo da decisão recorrida — art. 671.º,n.º 1 —,com a alçada e com a sucumbência—art.629.º,n.º1—, com a legitimidade dos recorrentes — art. 631.º — e com a tempestividade do recurso — art. 638.º do Código de Processo Civil . Em consequência, “[p]ara se determinar se é, no caso, de admitir a revista excepcional, deve começar por se apurar se, no caso concreto, estão preenchidos os requisitos gerais de admissibilidade da revista, rejeitando logo o recurso, sem necessidade de apreciação dos requisitos específicos, se se concluir que não se mostram verificados tais requisitos”. (…) 14. Ou seja — o art. 674.º, n.º 1, alínea c), deve coordenar-se com o art. 615.º, n.º 4, do Código de Processo Civil e, entre os corolários da coordenação entre o art. 674.º, n.º 1, alínea c), e o art. 615.º, n.º 4, do Código de Processo Civil está o de que não é admissível o recurso de revista com fundamento exclusivo na falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito — no sentido do art. 615.º, n.º 1, alínea b) —, ou na ambiguidade, ou na obscuridade da decisão proferida — no sentido do art. 615.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil. (…) 16. Ou seja — caso a revista tivesse um fundamento distinto da arguição de nulidade da decisão recorrida, deveria averiguar-se da sua admissibilidade e, caso a revista fosse admissível, a ambiguidade, a obscuridade, ou a falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito de decisão poderia ser arguida perante o tribunal ad quem — in casu, perante o Supremo Tribunal de Justiça —; caso a revista não tenha ,como não tem,umfundamento distinto daarguição da nulidade da decisão recorrida, a ambiguidade, a obscuridade, ou a falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito de decisão só podem ser arguidas perante o tribunal a quo — perante o Tribunal da Relação.” 2.º E conclui: “Face ao exposto, são fundadas as dúvidas sobre a admissibilidade do recurso.” Ora. 3º Salvo o devido respeito por melhor opinião, carece de razão o Exmo. Senhor Relator, porquanto parece confundir os fundamentos invocados para a interposição do recurso de revista excecional com os fundamentos que foram invocados para a interposição de recurso de revista. De facto. 4º Foi entendimento do Recorrente, numa primeira análise, não existir, por um lado, dupla conforme nos presentes autos por considerar que o douto acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação do Porto tinha uma fundamentação essencialmente diferente da sentença proferida em 1.ª instância, embora confirmando-a e, 5º Por outro lado, entender que o douto acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação do Porto continha nulidades por não especificar os fundamentos de facto e de direito que justificaram a decisão ali proferida e por existir ambiguidade ou obscuridade entre os fundamentos e a decisão. 6º Razão pela qual entendeu que a decisão proferida pelo Venerando Tribunal da Relação do Porto poderia e deveria ser objeto de recurso de revista para o Colendo Supremo Tribunal de Justiça. 7º De todo o modo e acautelando a hipótese de se entender existir dupla conforme, o que no caso em concreto ocorreu, conforme despacho proferido em 20-03-2023, o Recorrente interpôs recurso de revista excecional. 8º Este recurso de revista excecional não teve como fundamento as nulidades e os argumentos invocados em sede de recurso de revista, como parece inferir-se do parecer a que agora se responde, mas outros. 9º Ou seja, o recurso de revista excecional foi interposto ao abrigo do disposto nos artigos 671.º, n.º 3 e 672.º, n.º 1, alíneas a) e b), do Cód. de Proc. Civil, cabendo recurso da decisão proferida pelo Tribunal da Relação do Porto por estarem em causa: A) questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito e, B) interesses de particular relevância social. 10º Razão pela qual não se compreende as dúvidas suscitadas quanto à admissibilidade do recurso de revista excecional. 11º De todo o modo, para além dos fundamentos do recurso de revista excecional que adiante se explicitarão, dado existirem dúvidas sobre os mesmos, há que ter em consideração que o acesso ao recurso de revista excecional não prescinde da verificação dos pressupostos gerais de admissibilidade do recurso, designadamente os relacionados com a natureza e conteúdo da decisão (art.º 671.º), valor do processo ou da sucumbência (art.º 629.º, n. º1), legitimidade (art.º 631.º) e tempestividade (art.º 638.º). 12º Não estando preenchidos os requisitos gerais supramencionados, deve o recurso de revista ser rejeitado de imediato, sem necessidade de apreciação dos requisitos específicos. 13.º Neste sentido, veja-se o douto acórdão proferido pelo Colendo Supremo Tribunal de Justiça em 22-02-2018, no processo n.º 2219/13.5T2SVR.P1.S1). 14º Ou mesmo, como salienta Abrantes Geraldes na sua obra “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, nas págs. 364 e 389, que a revista excecional está prevista para situações de dupla conforme, nos termos em que esta é delimitada pelo n.º 3, do art.º 671.º, do CPC, desde que se verifiquem também os pressupostos gerais de acesso ao terceiro grau de jurisdição, designadamente os que respeitam à natureza ou ao conteúdo da decisão em face do art.º 671º, ao valor do processo e da sucumbência. (negrito e sublinhado nosso). 15º No caso em apreço os requisitos estão preenchidos: o recurso é o próprio, o valor do processo é superior à alçada do Tribunal da Relação, a parte tem legitimidade e o recurso foi apresentado dentro do prazo legal. Posto isto. 16º Avançaremos para as circunstâncias de interposição do presente recurso de revista excecional. 17º O art.º 671.º, n.º 3 do Cód. de Proc. Civil determina que a verificação da dupla conforme exclui a possibilidade de revista. 18º Mas ao mesmo tempo, o art.º 672.º do Cód. de Proc. Civil cria a plataforma necessária para o funcionamento do mecanismo designado por revista excecional, ou seja, constata-se que a regra da dupla conforme comporta exceções. 19º Estas traduzem-se em casos em que revista poderá ser admitida, ainda que o acórdão da Relação reproduza, na íntegra, tanto quanto ao seu dispositivo como quanto aos seus fundamentos, e sem voto de vencido, a decisão da 1.ª instância. 20º Falamos, então, de três exceções: revista extraordinária, revista excecional e direito transitório, o qual já se situa fora do âmbito daquela norma, mas comporta também uma exceção ao regime. 21º Para o caso em apreço, importa-nos a revista excecional. 22º Assim, a Reforma de 2007 introduziu, no âmbito do Código de Processo Civil, uma nova figura: a revista excecional. 23º Tal introdução vinha, desde logo, vertida no Preâmbulo do DL n.º 303/2007, no qual se referia que a regra da dupla conforme comporta três exceções, ao abrigo das quais se admite o recurso do acórdão da relação que se encontre nas situações descritas: a) quando esteja em causa uma questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito; b) quando relevem interesses de particular relevância social ou, c) quando o acórdão da Relação esteja em contradição com outro, já transitado em julgado, proferido por qualquer Relação ou pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito. 24º Tais exceções viriam a ser previstas no então artigo 721.º-A, aditado ao Código de Processo Civil de 2007, dando, assim, palco à chamada “revista excecional” no plano dos recursos cíveis. 25º Vinha, então, aquele novo artigo 721.º-A elencar os casos em que seria permitido recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça quando se verificasse existir dupla conforme entre o acórdão da Relação e a decisão proferida em 1.ª instância. 26º Daqui se retira, desde logo, que a revista excecional só teria lugar quando estivesse, efetivamente, em causa a existência de dupla conformidade entre as decisões da 1.ª instância e da Relação, pois, na sua ausência, já será admitida a revista “normal”, não havendo, logicamente, lugar a revista excecional. 27º Assim, a revista excecional surge como uma via alternativa ao bloqueio suscitado pela dupla conforme, mas quedado um conjunto de razões e circunstâncias, não deve impedir o acesso ao Supremo Tribunal de Justiça. 28º Desta forma, sempre que exista dupla conforme e se verifique estar em causa um dos casos previstos no artigo 672.º, pode a parte recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça mediante interposição de recurso de revista excecional. 29º Revertendo ao caso sub judice, verifica-se existir uma questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, se torna necessária para uma melhor aplicação do direito que se consubstancia na interpretação dada aos normativos constante nos art.º 32.º, art.º 46.º, 99.º, 100.º do RJCS e art.º 342.º, n.º 1 e 2 do Cód. Civil, respeitantes ao ónus e inversão do ónus da prova. (negrito e sublinhado nosso). 30º Constituindo ainda esta questão da interpretação das normas respeitantes ao ónus e inversão do ónus da prova, questão interesse de particular relevância social. (negrito e sublinhado nosso) 31º Tudo de harmonia com as disposições contidas no art.º 672.º, n.º 1, alíneas a) e b) do Cód. de Proc. Civil. 32º Por todo o exposto, deve o presente recurso de revista excecional ser admitido por se encontrarem verificados todos os seus pressupostos e requisitos legais. 13. A Recorrida: Seguradoras Unidas, S.A. — actualmente Generali Seguros, S.A. — não respondeu ao despacho previsto no art. 655.º do Código de Processo Civil. II. — FUNDAMENTAÇÃO OS FACTOS 14. O acórdão recorrido deu como provados os factos seguintes: 1) Em 18.04.2019, o Autor celebrou um contrato de seguro com a Ré, relativo ao veículo ligeiro de passageiros, de marca Mercedes-Benz, modelo C - Class (w205) C 250, de matrícula ..-XJ-.., através da apólice n.º ...63, um seguro obrigatório de responsabilidade civil por danos causados a terceiros e com as coberturas facultativas de danos próprios de quebra de vidros, furto ou roubo, incêndio, raio ou explosão e fenómenos da natureza, sendo o capital seguro de €.38.750,00. 2) Posteriormente, em 20.11.2019, o Autor solicitou a alteração da cobertura referida em 1) e passou a incluir na mesma também a cobertura de actos de vandalismo e a cobertura de choque, colisão ou capotamento, passando todas as coberturas a ter um capital seguro de €.35.505,00. 3) Com a alteração referida em 2), as partes acordaram também uma franquia de €.250,00. 4) A Rua da ..., na freguesia ..., Concelho ..., é uma estrada com piso asfaltado, em bom estado de conservação e com limite de velocidade a 50 km/hora. 5) A estrada tem cerca de 6.50 metros de largura e duas faixas de rodagem, cada uma destinada a um sentido de marcha. 6) A Rua da ... no sentido Norte/sul constitui uma recta, com boa visibilidade, a que segue uma curva para a esquerda. 7) No dia 11 de Março de 2020, por volta das 00.00/00.30 horas, o veículo ligeiro de passageiros, de marca Mercedes-Benz, modelo C - Class (w205) C 250, de matrícula ..-XJ-.., propriedade do Autor e por ele conduzido, no local referido em 4) a 6), em circunstâncias não concretamente apuradas, saiu da faixa de rodagem para a direita, entrando para uma zona de mato e arvoredo, onde ficou imobilizado. 8) Nas circunstâncias referidas em 7), o Autor circulava, pelo menos, a 40 a 45 km/hora. 9) O local referido em 4) a 6), por volta das 00.00/00.30 horas, é um local com pouco movimento rodoviário. 10) O local tem pouca iluminação e estava nevoeiro. 11) O veículo foi rebocado pela S... que transportou o veículo para o armazém, sito em ... e, no mesmo dia, pelas 08h55 procedeu à entrega do veículo acidentado na oficina indicada pelo Autor, a A..., Unipessoal, Lda., com sede na Rua do ..., n.º 589, .... 12) O sinistro foi participado à Ré. 13) E a 09.04.2019, a Ré remeteu ao Autor email com o seguinte teor: “Exmo/a.(s) Senhor/a(s): No seguimento da vistoria efetuada pelos nossos serviços técnicos à viatura na oficina, informamos que a estimativa de reparação 22.742,46c se torna excessivamente onerosa face ao valor seguro. Nos termos do Decreto-Lei nº 214/97, de 16 de Agosto, o valor seguro à data do sinistro é de 31.311,92c e o veículo com danos foi avaliado em 17.776,00c. Face ao exposto, embora ainda não nos seja possível assumir uma posição quanto a responsabilidades, colocamos condicionalmente à sua disposição a quantia de 13.285,92c, já deduzida a franquia contratual de 250,00c e mantendo V/ Exa(s). a posse do veículo com danos do qual pode dispor livremente, pelo que aguardamos que nos remeta fotocópias do cartão de cidadão ou bilhete de identidade e cartão de contribuinte do proprietário, assim como dos documentos da viatura. Na eventualidade de pretender desde já comercializar o veículo sinistrado, no estado em que ele se encontra, pelo valor de 17.776,00c, indicamos desde já a entidade que deverão contactar: ... Visual Av. D. João II Lote ...6.2.5 ... .../Fax: ...75 (Alertamos que a proposta de aquisição termina no dia 25 de Maio de 2020, pelo que a partir desta data não nos responsabilizamos pela redução deste valor.) Na hipótese de V/ Exa. não pretender reparar o veículo nem o comercializar no estado em que ele se encontra, cumpre-nos adverti-lo para a obrigação de obter um certificado de destruição da viatura com vista aos cancelamentos da matrícula e do registo de propriedade de acordo com as disposições legais dos veículos em fim de vida. Se pretenderem obter algum esclarecimento adicional, por favor contactem-nos através de um dos meios abaixo indicados. Com os nossos melhores cumprimentos. (…)”. 14) Posteriormente, por email de 27.04.2020, pelas 16h21, a Ré informou o autor que: “Caro Cliente AA, Serve a presente para informar V. Exa. (s) que, após analise aos elementos que integram o nosso processo, concluímos que o mesmo não ocorreu conforme participado. Assim sendo, não é da nossa responsabilidade a regularização dos prejuízos reclamados Se pretender obter algum esclarecimento adicional, por favor contacte-nos através de um dos meios abaixo indicados. Com os nossos melhores cumprimentos, II Departamento de Sinistros Unidade de Sinistros Automóvel com Danos Materiais”. 15) Perante esta comunicação, o Autor respondeu, no próprio dia, pelas 18h22, pedindo elementos e explicação quanto à decisão ora tomada: “Boa noite, não estou a conseguir compreender o que querem dizer com o e-mail enviado, pois não tem qualquer lógica. No dia 11 de março tive um acidente ao qual fiz a devida participação, tendo ainda posteriormente facultado todos os dados solicitados por a vossa companhia. Tenho seguro de dados próprios contratado para a minha viatura, como é possível não ser da vossa responsabilidade? Com que elementos se baseiam para alegarem que não é da vossa responsabilidade a regularização dos prejuízos? Pago anualmente 1800€ para usufruir de um seguro de danos próprios que é obrigação vossa faze-lo vigorar nesta situação.” 16) Explicação e elementos que nunca obteve, conforme email de 08.05.2020, onde a Ré comunica que: “Exmo. Sr. AA, Em resposta á comunicação que nos remeteu, cumpre-nos informar que não nos será possível ir de encontro á pretensão de V.Exas, dado se tratar de documentação interna da Companhia, pelo que somente poderão ser disponibilizados em sede própria e se solicitado. Com os melhores cumprimentos, …”. 17) A Ré procedeu ao envio do recibo de cobrança do prémio do seguro em 08.04.2020, no valor de €.1.751,45, o que foi pago pelo Autor. 18) Em 21.04.2021, a Ré enviou outro aviso de cobrança, o qual, desta vez, não foi pago pelo Autor. 19) Em consequência do referido em 7), o veículo com a matrícula ..-XJ-.., sofreu diversos danos não concretamente apurados. 20) Após o referido em 7), foi efectuada pela Ré uma peritagem ao veículo para apuramento dos danos, tendo apurado a existência dos danos melhor descritos e discriminados no escrito intitulado «Estimativa de Danos». 21) A peritagem referida em 20), apurou que a reparação dos danos aí descritos tem um custo não inferior a €.22.742,45. 22) Em face do valor referido em 21), a Ré entendeu ter ocorrido perda total do veículo por entender que o valor estimado da reparação pelos danos se torna excessivamente onerosa face ao valor seguro, conforme email referido em 13). 23) Em 11.03.2020, o veículo do Autor tinha o valor comercial de € 31.311,92. 24) O veículo com a matrícula ..-XJ-.. trata-se de um veículo de gama elevada, reconhecido pela sua qualidade de construção, segurança, capacidades dinâmicas e prestações. 25) O veículo com a matrícula ..-XJ-.. era guardado em garagem. 26) O veículo encontra-se parqueado na oficina A..., Unipessoal, Lda., desde o dia a seguir ao acidente, ou seja, desde 11.03.2020. 27) Desde o dia do acidente em apreço, o Autor encontra-se privado da utilização do seu veículo, para as suas deslocações pessoais e profissionais. 28) A A2B apresentou à Ré, uma oferta de compra do veículo sinistrado, em 27.03.2020, pelo valor de €.17.776,00. 29) A Ré recebeu uma proposta de compra do veículo após o sinistro da UON pelo valor de €.16.069,00, em 27.03.2020. O DIREITO 15. O recurso de revista excepcional pressupõe o preenchimento dos requisitos gerais de admissibilidade do recurso de revista, designadamente dos requisitos relacionados com o conteúdo da decisão recorrida — art. 671.º, n.º 1 —, com a alçada e com a sucumbência — art. 629.º, n.º 1 —, com a legitimidade dos recorrentes — art. 631.º — e com a tempestividade do recurso — art. 638.º do Código de Processo Civil [1]. 16. Em consequência, “[p]ara se determinar se é, no caso, de admitir a revista excepcional, deve começar por se apurar se, no caso concreto, estão preenchidos os requisitos gerais de admissibilidade da revista, rejeitando logo o recurso, sem necessidade de apreciação dos requisitos específicos, se se concluir que não se mostram verificados tais requisitos” [2].
17. O art. 615.º, n.º 4, do Código de Processo Civil é do seguinte teor:
1. — É nula a sentença quando: a) Não contenha a assinatura do juiz; b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido. […] 4. — As nulidades mencionadas nas alíneas b) a e) do n.o 1 só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário, podendo o recurso, no caso contrário, ter como fundamento qualquer dessas nulidades.
17. O Autor, agora Recorrente, enuncia nas conclusões do recurso de revista interposto a título normal duas questões, e só duas questões:
I. — a nulidade do acórdão recorrido, “por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão” [conclusões VIII-XII]; II. — a nulidade do acórdão recorrido, “por […] ambiguidade e obscuridade da decisão” [conclusões XIII-XXXVIII].
18. Ora o Supremo Tribunal de Justiça tem considerado, constantemente, que a arguição de nulidades do acórdão recorrido não é admitida como fundamento exclusivo de recurso de revista [3].
19. Como se diz, p. ex., no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Novembro de 2016 — processo n.º 740/15 —,
III. — A arguição de nulidades da decisão final ao abrigo dos artigos 615.º, n.º 1, alíneas b) a e), e 666.º, n.º 1, do CPC só é dedutível por via recursória quando aquela decisão admita recurso ordinário, nos termos conjugados dos artigos 615.º, n.º 4, 2.ª parte, e 674.º, n.º 1, alínea c), do mesmo Código, e portanto como fundamento acessório desse recurso. IV. — Se aquela decisão não admitir recurso ordinário, as referidas nulidades só são arguíveis mediante reclamação perante o próprio tribunal que proferiu tal decisão, nos termos dos artigos 615.º, n.º 4, 1.ª parte, e 617.º, n.º 6, do CPC. V. — Não sendo admissível recurso ordinário, em termos gerais, por virtude da ocorrência de dupla conforme, as nulidades previstas nas alíneas b) a e) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC só são arguíveis por via recursória, se a revista for interposta a título especial ou de revista excecional nos termos dos artigos 629.º, n.º 2, e 672.º, n.º 1, do CPC, respetivamente. VI. — Não tendo a Recorrente interposto a revista a título especial ou excecional, mas apenas com fundamento em nulidade por omissão de pronúncia, a mesma não é admissível, nos termos conjugados dos artigos 615.º, n.º 4, e 671.º, n.º 3, do CPC, sem prejuízo da eventualidade de o tribunal a quo conhecer ainda daquela nulidade, ao abrigo e nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 617.º do mesmo Código.
20. O art. 674.º, n.º 1, alínea c), deve coordenar-se com o art. 615.º, n.º 4, do Código de Processo Civil e, entre os corolários da coordenação entre o art. 674.º, n.º 1, alínea c), e o art. 615.º, n.º 4, do Código de Processo Civil está o de que não é admissível o recurso de revista com fundamento exclusivo na falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito — no sentido do art. 615.º, n.º 1, alínea b) —, ou na ambiguidade, ou na obscuridade da decisão proferida — no sentido do art. 615.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil.
21. Como se diz no acórdão do STJ de 18 de Janeiro de 2022 — processo n.º 6798/16.7T8LSB-A.L2.S1 —, “Não há lugar a recurso de revista para análise exclusiva de eventuais nulidades. As nulidades só são arguíveis por via do recurso de revista quando da decisão reclamada caiba também recurso ordinário, conforme nº 4 do art. 615º do CPC”.
22. Ou seja — caso a revista tivesse um fundamento distinto da arguição de nulidade da decisão recorrida, deveria averiguar-se da sua admissibilidade e, caso a revista fosse admissível, a ambiguidade, a obscuridade, ou a falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito de decisão poderia ser arguida perante o tribunal ad quem — in casu, perante o Supremo Tribunal de Justiça —; caso a revista não tenha, como não tem, um fundamento distinto da arguição da nulidade da decisão recorrida, a ambiguidade, a obscuridade, ou a falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito de decisão só podem ser arguidas perante o tribunal a quo — perante o Tribunal da Relação [4].
23. O Autor, agora Recorrente, alega, em resposta ao art. 655.º do Código de Processo Civil, que há uma diferença entre as questões suscitadas na revista interposta a título normal e as questões suscitadas na revista interposta a título excepcional — enquanto que, na revista interposta a título normal, o Autor, agora Recorrente, teria suscitado a questão das nulidades do acórdão recorrido, na revista interposta a título excepcional não a teria suscitado.
24. Ora, como se diz, p. ex., no Provimento do Exmo. Senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça n.º 23/2019, “[a] lei estabelece uma forma única de revista que, num número limitado de casos, pode ser excepcionalmente admitida, por força da verificação de um especial interesse público na apreciação de um determinado caso pelo Supremo Tribunal de Justiça”.
25. Em vez de duas revistas diferentes, ou de duas formas de revista diferentes, em que sejam suscitadas questões diferentes, há uma forma única de revista.
26. O recorrente há-de delimitar o objecto do recurso, formulando as questões que pretende que sejam apreciadas e decididas pelo Supremo Tribunal de Justiça.
27. Caso haja dupla conforme, e caso o único obstáculo ao conhecimento das questões que o recorrente pretende que sejam apreciadas e decididas seja a dupla conforme, deverá invocar alguma das hipóteses do art. 672.º do Código de Processo Civil.
28. Em concreto, o Autor, agora Recorrente, requereu que o recurso fosse admitido como revista normal e, subsidiariamente, como revista excepcional.
29. As questões que o Autor, agora Recorrente, pretende que sejam apreciadas e decididas no recurso interposto a título de revista normal têm de coincidir com as questões que o Autor, agora Recorrente, pretende que sejam apreciadas e decididas no recurso interposto a título de revista excepcional.
30. Ora, em concreto, recurso de revista interposto a título de revista normal não deve admitir-se, e não deve admitir-se por razões que não têm nada a ver com a dupla conforme.
32. A razão pela qual o recurso de revista interposto a título de revista normal não deve admitir-se encontra-se na circunstância de ter como fundamento, na circunstância de ter como fundamento exclusivo, as alegadas nulidades do acórdão recorrido.
33. Em diferentes palavras, ainda que insistindo em igual pensamento — ainda que o Tribunal da Relação não tivesse confirmado a decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª instância, ainda que não houvesse dupla conforme, nunca o recurso de revista deveria admitir-se.
34. A dupla conforme não é, por isso, o único obstáculo ao conhecimento do recurso — e, desde que a dupla conforme não seja o único obstáculo ao conhecimento do recurso, não há que averiguar se se verifica, ou não, alguma das hipóteses do art. 672.º.
III. — DECISÃO Face ao exposto, não se toma conhecimento do objecto do presente recurso. Custas pelo Recorrente AA. Lisboa, 6 de Julho de 2023 Nuno Manuel Pinto Oliveira (relator) José Maria Ferreira Lopes Manuel Pires Capelo ____ [1] Cf. designadamente os acórdãos do STJ de 22 de Fevereiro de 2018 — processo n.º 2219/13.5T2SVR.P1.S1 — e de 26 de Novembro de 2019 — processo n.º 1320/17.0T8CBR.C1-A.S1. |