Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
185/13.6TBBRR-A.L1.S1
Nº Convencional: 6.ª SECÇÃO
Relator: ANA PAULA BOULAROT
Descritores: INIBIÇÃO DO PODER PATERNAL
MAIORIDADE
INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE
Data do Acordão: 10/13/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: DEFERIDA PARCIALMENTE A RECLAMAÇÃO.
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO
Sumário :

I- Uma vez que o menor atingiu a maioridade nos termos dos artigos 122º, 129º e 130º do CCivil, tendo ficado habilitado a reger a sua pessoa e a dispor dos seus bens, ficou precludida qualquer possibilidade de serem exercidas as responsabilidades parentais que convocaram a necessidade da inibição requerida ao abrigo do preceituado no artigo 1915º do CCivil, cessando em relação aos Requeridos as responsabilidades aludidas no artigo 1877º daquele diploma legal.

II- Este vazio respeitante ao objecto do processo – de inibição do exercício das responsabilidades parentais – arrasta, a se, a desnecessidade de apreciação dos pressupostos processuais relativos à legitimidade para recorrer, além do mais, os quais se mostram a jusante daquele outra ocorrência de fundo, impeditiva do andamento dos autos e que conduz à extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, nos termos do artigo 277º, alínea e) do CPCivil.

Decisão Texto Integral:
PROC 185/13.6TBBRR-A.L1.S1

6ª SECÇÃO

ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

AA, Requerida nos autos de inibição do exercício das responsabilidades parentais que o MINISTÉRIO PÚBLICO intentou contra si e outrem, veio reclamar para a Conferência do despacho singular produzido em férias pela Exª Conselheira de turno, que faz fls 190, que decidiu não conhecer do recurso de Revista interposto, pugnando, em apertada síntese:

- A revista interposta foi decidida liminarmente pela Colenda Juiz Conselheira relatora, considerando que, apesar da admissão do recurso no Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, a decisão proferida em primeira instância, por ausência de recurso da sua parte, havia transitado em julgado quanto a si, nessa mesma instância.

- Considerou a Colenda Juiz Conselheira relatora que, está vedado à aqui recorrente reclamante a faculdade de interpor recurso ao abrigo do disposto pelo art. 631º n.º 2 do C.P.C., assim como não pode aproveitar o recurso de Apelação interposto pelo co-réu, seja ao abrigo do disposto pelo art. 634º n.º 1 C.P.C., seja ao abrigo da al. b) do n.º 2 da citada disposição legal.

- É desta decisão que ora se reclama, porquanto pugna a reclamante, apreciando a possibilidade de ser interposto ou não recurso ordinário de uma decisão e definir-se em que momento ocorre o trânsito, que o mesmo sempre só ocorrerá, no caso da sua insusceptibilidade, com o esgotamento do prazo para a arguição de nulidades da sentença ou dedução do incidente de reforma, nos termos do disposto pelos arts. 615º, 616º, 666º e 685º do C.P.C..

- A reclamante suscitou tal apreciação (de inutilidade superveniente da lide), como questão prévia à sua alegação de recurso, e tal despacho, em momento algum a conhece, pois a maioridade do BB, a dia 31 de maio (art. 122º, 129º e 130º CC), traduz a aquisição da total capacidade de exercício de direitos (art. 1232 CC), deixando de estar sujeito às responsabilidades parentais (art. 1877 CC) - art. 287 e) C.P.C. - e essa maioridade ocorre no decurso desse prazo.

- Vedar, como no despacho aqui em crise, o direito de recurso à reclamante arrasa desde logo o princípio primeiro da Constituição da República Portuguesa, de defesa da dignidade da pessoa humana, a quem se reconhece a qualidade de vítima de violência doméstica, assim como se marginaliza um dos princípios basilares do estado de direito democrático, desrespeitando-se e não garantindo a efectivação dos direitos e liberdades fundamentais como é o direito ao recurso (art. 1º, 2º e 20º C.R.P.).

A fls 1926, o Requerido vem esclarecer o Tribunal que o filho BB se encontra a viver na sua companhia.

A fls 1937, a Exª Senhora procuradora Geral Adjunta, junto deste Supremo Tribunal de Justiça, embora concorde com a decisão reclamada pugna pela declaração da extinção da presente instância por inutilidade superveniente da lide, face à maioridade do filho dos Requeridos, BB (uma vez que CC já havia atingido a maioridade em 00 de … de 2029), em representação do qual havia requerido a inibição do exercício das responsabilidades parentais.

Vejamos.

O despacho singular da Exª Relatora de turno é do seguinte teor:

«1.Independentemente da apreciação dos demais obstáculos à admissibilidade do presente recurso de revista, verifica-se que, diversamente do invocado pela Recorrente, não tendo esta interposto recurso da sentença da Ia instância que decretou a inibição do exercício das responsabilidade parentais de ambos os progenitores quanto ao (então) menor BB, tal decisão transitou em julgado relativamente à ora Recorrente, não podendo esta, nos termos do art. 632°, n° 2, do Código de Processo Civil, vir interpor recurso de revista do acórdão da Relação que revogou a decisão de inibição relativamente ao progenitor DD.

Na verdade, e contrariamente ao alegado pela Recorrente, sendo parte principal no processo, não pode esta interpor recurso de revista ao abrigo do n° 2 do art. 631° do CPC; nem tampouco pode pretender aproveitar do recurso de apelação interposto pelo progenitor DD, seja ao abrigo do n° 1 do art. 634° do CPC (por não se verificarem os pressupostos do litisconsórcio necessário), seja ao abrigo da alínea b) do n° 2 do mesmo art. 634° (por não se verificar o pressuposto do interesse essencialmente dependente).

2.Pelo exposto, não se admite o recurso.».

Vejamos.

Sem embargo de se poder discutir, in casu, se o recurso interposto pelo Requerido em segundo grau aproveitou ou não à Requerida, suscita-se a montante uma outra questão de índole processual  susceptível de prejudicar a apreciação desse pressuposto processual, qual é, a da maioridade dos jovens cuja inibição do exercício das responsabilidades parentais foi decretada.

Efectivamente, o objecto dos presentes autos consistiu nesse pedido de inibição, a qual veio a ser decretada por sentença de primeira instância, confirmada pelo Tribunal da Relação de Lisboa, por Acórdão de 21 de Maio de 2020, cfr fls 1839 a 1862.

Contudo, em 00 de … de 2020, o jovem BB, completou 18 anos, atingindo assim a maioridade nos termos dos artigos 122º, 129º e 130º do CCivil, tendo ficado habilitado a a reger a sua pessoa e a dispor dos seus bens, precludida ficando qualquer possibilidade de, no caso, serem exercidas as responsabilidades parentais que convocaram a necessidade da inibição requerida ao abrigo do preceituado no artigo 1915º do CCivil, porquanto cessaram em relação aos Requeridos as responsabilidades parentais aludidas no artigo 1877º daquele diploma legal.

Este vazio respeitante ao objecto do processo, arrasta a se a desnecessidade de apreciação dos pressupostos processuais relativos à legitimidade para recorrer, além do mais, os quais se mostram a jusante daqueleoutra ocorrência de fundo, impeditiva do andamento dos autos.

Destarte, deferindo-se parcialmente a reclamação apresentada, face à maioridade do jovem BB, declarando-se extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, nos termos do artigo 277º, alínea e) do CPCivil.

Sem custas.

Lisboa, 13 de Outubro de 2020

Ana Paula Boularot (Relatora)

José Rainho

Graça Amaral

Sumário (art. 663º, nº 7, do CPC).