Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
861/16.1YRLSB.L1.S1
Nº Convencional: 6ª SECÇÃO
Relator: HENRIQUE ARAÚJO
Descritores: PROPRIEDADE INDUSTRIAL
PATENTE
ARBITRAGEM NECESSÁRIA
TRIBUNAL ARBITRAL
COMPETÊNCIA
INVALIDADE
Data do Acordão: 02/12/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO FALIMENTAR – DISPOSIÇÕES INTRODUTÓRIAS / RECURSOS.
Doutrina:
- Alexandre de Soveral Martins, Revista de Legislação e Jurisprudência, Ano 144º, n.º 3993, Julho/Agosto 2015, p. 418 e ss.; Da Arbitragem Necessária de Litígios entre Patentes e Medicamentos Genéricos no Direito Português, no Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra, Volume XCII, Tomo II, 2016, p. 841;
- Alexandre Libório Dias Pereira, Revista de Legislação e Jurisprudência n.º 4008, Ano 147º, 2018, Janeiro/Fevereiro, p. 182 e ss.;
- Dário Moura Vicente, A tutela internacional da Propriedade Intelectual, 2008, p. 376 a 378;
- José Alberto Vieira, A competência do tribunal arbitral necessário para apreciar a excepção da invalidade de patente registada, Revista de Direito Intelectual n.º 2, 2015, p. 195 e ss.;
- Luís Couto Gonçalves, A questão da competência do tribunal arbitral necessário para apreciar a invalidade da patente com eficácia inter partes, Cadernos de Direito Privado n.º 56, Outubro/Dezembro, 2016, p. 46 e 47;
- Manuel Oehen Mendes, Breves considerações sobre a incompetência dos tribunais arbitrais portugueses para apreciarem a questão da invalidade das patentes e dos certificados complementares de protecção para medicamentos, em Estudos de Homenagem ao Prof. Doutor José de Oliveira Ascensão, p. 946;
- Margarida Sameiro , Direito Intelectual, n.º 1, 2015, p. 329 a 331;
- Pedro de Sousa e Silva, Direito Industrial, Noções Fundamentais, 2011, p. 488;
- Remédio Marques, A arbitrabilidade da excepção de invalidade de patente no quadro da Lei n.º 62/2011, Revista de Direito Intelectual n.º 2, 2014, APDI, p. 211 e ss.;
O regime especial de resolução de conflitos em matéria de patentes Lei n.º 62/2011, Revista da Ordem dos Advogados, Ano 72, Out./Dez. 2012, p. 981 e ss.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DA INSOLVÊNCIA E DA RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS (CIRE): - ARTIGO 14.º .
PROPOSTA DE LEI 13/XII.


Legislação Comunitária:
REGULAMENTO (CE) N.º 44/2001 DO CONSELHO, DE 22 -12- 2000: - ARTIGO 22.º, N.º 4.
REGULAMENTO (UE) N.º 1215/2012 DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO, DE 12 -12.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 27-01-2010, PROCESSO N.º 598/08.5TBCBR.C1.S1;
- DE 14-12-2016, PROCESSO N.º 1248/14.6YRLSB.S1, IN WWW.DGSI.PT.;
- DE 22-03-2018, PROCESSO N.º 1053/16.5YRLSB.S1.S1.


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ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA:

- DE 13-01-2015, PROCESSO N.º 1356/13.OYRLSB.L1-7 ;
- DE 21-05-2015, PROCESSO N.º 1465/14.9YRLSB-6;
- DE 09-07-2015, PROCESSO N.º 336/15.6YRLSB.L1.-1;
- DE 04-02-2016, PROCESSO N.º 138-15.0YRLSB.L1-8;
- DE 21-06-2018, PROCESSO N.º 2384/17.2YRLSB.L1-8;
- DE 21-06-2018, PROCESSO N.º 227/18.9YRLSB.L1-2;
- DE 05-07-2018, PROCESSO N.º 582/18.0YRLSB-6, TODOS IN WWW.DGSI.PT.


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ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:

- DE 24-05-2017, ACÓRDÃO 251/2017, IN WWW.TRIBUNALCONSTITUCIONAL.PT.
Jurisprudência Internacional:
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DA UNIÃO EUROPEIA (TJUE):


- DE 13-07-2006, PROCESSO N.º C-4/03.
Sumário :
I- O tribunal arbitral necessário, constituído ao abrigo da Lei n.º 62/2011, de 12-12 (na versão anterior ao DL n.º 110/2018, de 10-12) para dirimir litígio relativo a medicamentos genéricos, não tem competência para conhecer da invalidade da patente registada, arguida por via de excepção ou de reconvenção.
Decisão Texto Integral:

PROC. N.º 861/16.1YRLSB.L1

            REL. 63[1]

                                                                       *

              ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

            I.         RELATÓRIO

“AA, S.A.”, no âmbito do regime processual especial instituído pela Lei 62/2011, de 12/12, instauraram acção arbitral necessária, tendo por objecto o exercício dos direitos de propriedade industrial emergentes da Patente Europeia n.º 1189608.

Foi instalado o tribunal arbitral para dirimir o litígio relativo aos medicamentos genéricos contendo as substâncias activas “C..., E... e L…”, cujos pedidos de autorização de introdução no mercado (AIM) foram submetidos pela sociedade “BB, SRO”, em 10 de Julho de 2014, e que têm como medicamento de referência o “S...”.

Na petição inicial foi demandada a “CC, Lda.”, uma vez que a “BB SRO” havia transferido para aquela as AIM.

Na contestação a demandada suscitou a excepção da invalidade da reivindicação 16 da patente, por carência de actividade inventiva.

Na resposta, as demandantes suscitaram a questão da incompetência do tribunal arbitral para conhecer dessa questão.

No acórdão saneador prolatado dia 26 de Fevereiro de 2015, e rectificado a 01.03.2016, o tribunal arbitral, por maioria, declarou-se competente para conhecer da questão da invalidade da patente.

Inconformadas, as demandantes interpuseram recurso de apelação dessa decisão, tendo a Relação de Lisboa confirmado o acórdão arbitral.

           Ainda inconformadas, recorrem agora as demandantes para o Supremo Tribunal de Justiça, concluindo as alegações da revista do seguinte modo:

1. Da admissibilidade O presente recurso vem interposto do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que julgou improcedente a impugnação apresentada pelas Recorrentes ao abrigo do artigo 18.º n.º 9 da LAV e confirmou a decisão interlocutória do Tribunal Arbitral constituído nos termos da Lei n.º 62/2011, em que, por maioria da formação decisora, o mesmo Tribunal Arbitral se considerou competente para apreciar e decidir a questão, invocada pela Recorrida a título de exceção, da invalidade de uma patente (in casu, a EP ‘608), com reflexo e valor inter partes, com o voto de vencido de um dos árbitros, que pugnou pela incompetência do Tribunal Arbitral para aferir da validade de patentes.

2. Como é sabido, o recurso é sempre admissível, independentemente do valor da causa e da sucumbência, nos termos do artigo 629.º, n.º 2, do CPC.

3. No caso dos presentes autos, a questão em apreciação reside em saber se a competência em razão da matéria do tribunal arbitral necessário previsto na Lei n.º 62/2011 inclui ou não a apreciação da questão da nulidade de uma patente, suscitada pela Recorrida a título de exceção e, portanto, com efeitos meramente inter partes (ou se, pelo contrário e como defendemos, tal competência tem de ser exercida a título principal e com efeitos erga omnes, estando, portanto, reservada ao TPI, em ação proposta nos termos e para os efeitos do artigo 35.º do CPI).

4. Ou seja, a questão prende-se com a definição da competência material do tribunal arbitral necessário, que é precisamente uma das situações previstas no artigo 629.º, n.º 2, alínea a), do CPC (cf. Acórdão do STJ de 23 de junho de 2016, proferido no âmbito do processo n.º 1248/14.6YRLSB.S1).

5. Acresce que, sobre essa questão existe um conflito jurisprudencial sedimentado no Tribunal da Relação de Lisboa, conforme previsto no artigo 629.º, n.º 2, alínea d), do CPC.

6. O acórdão recorrido proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa (em que se decidiu que o tribunal arbitral constituído ao abrigo da Lei n.º 62/2011 tinha competência para apreciar a invalidade de uma patente, com efeitos inter partes) está em frontal contradição com o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 13 de dezembro de 2017, proferido no âmbito do processo n.º 751/17.0YRLSB (“acórdão fundamento”) (em que, pelo contrário, se decidiu que ao tribunal arbitral escapava essa mesma competência).

7. Reduzindo o presente processo aos seus elementos basilares, retirando os pormenores do caso concreto, temos uma situação em que empresa “A” iniciou uma arbitragem necessária contra a empresa “B”, ao abrigo da Lei n.º 62/2011, pedindo que a empresa “B” seja condenada a não violar os direitos de propriedade industrial invocados por “A”; “B”, defendendo-se por exceção, invoca, na instância arbitral, a invalidade dos direitos de propriedade industrial invocados nessa ação arbitral, pedindo que a sua nulidade seja declarada com efeitos inter partes; o tribunal arbitral e, posteriormente, a Relação de Lisboa, pronunciam-se sobre essa competência material. A matéria factual aqui descrita é o exato cenário que é avaliado tanto no acórdão recorrido quanto no acórdão fundamento.

8. Tanto o acórdão recorrido como o acórdão fundamento foram proferidos em sede de impugnação de uma decisão interlocutória de um tribunal arbitral necessário previsto na Lei n.º 62/2011, exclusivamente quanto à questão da competência do tribunal arbitral para poder apreciar e conhecer da validade de direitos de propriedade industrial, ainda que por via de dedução de mera exceção perentória, cujos efeitos ficam circunscritos ao processo (ou, pelo contrário, é o tribunal arbitral materialmente incompetente por tal matéria estar reservada à competência exclusiva do TPI).

9. Os acórdãos em confronto são, pois, decisões proferidas no âmago da Lei n.º 62/2011 e tratam ambas de interpretar o regime da declaração de invalidade de direitos de propriedade industrial previsto no CPI (em particular, a interpretação e aplicação das normas previstas nos artigos 4.º, 35.º n.º 1 e 101.º n.º 2 do CPI). Inserem-se, assim, de forma inquestionável, no contexto da mesma legislação.

10. Já quanto à questão fundamental de direito, a mesma prende-se (exclusivamente, até, em ambos os acórdãos em confronto), com a competência do tribunal arbitral previsto na Lei n.º 62/2011 para apreciar e decidir sobre a matéria, suscitada a título de exceção, da validade de uma patente. Sucede, porém, que ambos aplicaram e interpretaram os preceitos em questão (os artigos 2.º da Lei n.º 62/2011 e 35.º, n.º 1 e 101.º n.º 2 do CPI), mas de modo diverso.

11. O Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa objeto deste recurso entendeu que “Está em causa a interpretação conjugada do artigo 2.º da Lei n.º 62/2011, de 12 de dezembro e dos artigos 35.º, n.º 1 e 101.º n.º 2 do Código da Propriedade Industrial.” (cf. página 12 do acórdão recorrido); “A questão está, pois, em saber se essa invalidade pode ser conhecida pelo tribunal arbitral previsto na Lei n.º 62/2011 (mas não declarada com efeitos erga omnes) a título meramente incidental ou por via de exceção processual, para obstar à procedência do pedido, com efeitos inter partes, ou se, ao invés, aos demandados apenas resta a via e instaurar autonomamente no Tribunal da Propriedade Intelectual uma ação de anulação ou de declaração de nulidade (...)” (cf. página 14 do acórdão recorrido); Concluímos, pois, pela competência do tribunal arbitral para apreciar e decidir a matéria invocada pela demandada com vista à declaração de invalidade da patente” (cf. página 24 do acórdão recorrido).

12. O Tribunal da Relação de Lisboa, no acórdão recorrido, entendeu, ainda, seguir e perfilhar inteiramente a fundamentação do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 251/2017, de 24 de maio de 2017, considerando que “É excessivo forçar o requerente da AIM a ter que recorrer ao TPI – com todos os custos associados a esta acção – para ali requerer a declaração de invalidade de uma Patente, com efeitos erga omnes, quando pode apenas invocar a sua invalidade, inter partes, para efeitos exclusivos de se defender do pedido de condenação que lhe foi especificamente dirigido” (cf. página 24 do acórdão recorrido).

13. Questão idêntica foi apreciada no acórdão fundamento, com a resenha fático-       -processual feita no relatório (cf. páginas 1 a 6 do acórdão fundamento), mas em sentido diametralmente oposto ao decidido no acórdão recorrido.

14. Conforme referido no acórdão fundamento “A controvérsia circunscreve-se, assim, à possibilidade de o tribunal arbitral previsto na Lei n.º 62/2011 apreciar a validade de uma patente ou o CCP da mesma que tenha sido questionada apenas a título de exceção, par obstar à procedência do pedido, com efeitos tão só inter partes (cf. página 6 do acórdão fundamento). Sobre a questão solvenda, concluiu-se no acórdão fundamento: “negando-se assim competência ao Tribunal Arbitral em razão da matéria para apreciar a questão da validade do CCP 220” (cf. pág. 12 do acórdão fundamento).

15. Relativamente às possibilidades de defesa dos demandados, no acórdão fundamento refere-se claramente: “Não se diga que as Demandadas estão impedidas de se defender. Uma vez intentada a acção própria no TPI, poderia haver lugar a suspensão da instância arbitral ... As Demandadas, utilizando a acção do artigo 35° do CPI, passam a ter à disposição um processo caracterizado por amplas garantias de defesa, prova e recurso” (cf. página 11 do acórdão fundamento).

16. Do exposto resulta que, o acórdão recorrido e o acórdão fundamento interpretaram e aplicaram de modo diverso e dissemelhante, a factos análogos, as mesmas normas legais, obtendo, por conseguinte, uma solução diametralmente oposta, estando cumulativamente preenchidos os pressupostos previstos na alínea d) do n.º 2 do artigo 629.º do CPC.

17. Deve, assim, ao abrigo do artigo 629.º, n.º 2, alíneas a) e d), do CPC, ser o presente recurso admitido (cf. Acórdão deste STJ de 23 de junho de 2016, proferido no âmbito do processo n.º 1248/14.6YRLSB.S1).

18. Do objeto do recurso: a questão fundamentadora da presente revista reside na competência de um tribunal arbitral para poder apreciar e conhecer, incidentalmente, da (in)validade de uma patente (e não da EP ‘608 dos autos em particular, maxime, dos possíveis fundamentos para a sua alegada invalidade).

19. Foi decidido e lapidarmente explicado por Acórdão deste STJ de 16 de dezembro de 2016, proferido no âmbito do processo n.º 1248/14.6YRLSB.S1 (cf. Doc. n.º 2), com o intuito de fixar jurisprudência sobre esta matéria, por que razões os Tribunais Arbitrais não têm competência para conhecer da validade de direitos de patentes. O mesmo entendimento foi, recentemente, confirmado através do Acórdão do STJ de 22 de março de 2018 (revista n.º 1053/16.5YRLSB.SS1) (cf. Doc. n.º 3).

20. Defendem as Recorrentes que, a invalidade de direitos de propriedade industrial só pode ser declarada por via principal e com efeitos erga omnes. Nessa medida, o tribunal arbitral não tem competência para declarar essa invalidade – seja essa declaração requerida a título de ação, de reconvenção, ou de exceção.

21. A questão central a considerar resulta da atribuição da competência exclusiva do Tribunal Estadual para a apreciação da validade de direitos privativos de propriedade industrial, em ação nos termos do artigo 35.º, n.º 1 do CPI.

22. Da leitura integrada dos artigos 35.º do CPI e do artigo 111.º, n.º 1, alínea c) da LOSJ resulta inequivocamente que o Tribunal competente para apreciar, conhecer e declarar a nulidade ou a anulação de direitos de propriedade industrial é, apenas e em qualquer circunstância, o Tribunal da Propriedade Intelectual, tribunal de competência especializada em razão da matéria.

23. Foi intenção do legislador estabelecer uma reserva de competência estadual e concentrar num único tribunal especializado o contencioso sobre a validade de direitos de propriedade industrial.

24. A concessão de uma patente é um ato administrativo precedido de um procedimento próprio, tendente a uma completa averiguação, levada a cabo pelos serviços do INPI ou do IEP (como foi o caso da EP ‘608), da verificação de todos os pressupostos de facto e de direito.

25. O ato de concessão de uma patente é um ato registral constitutivo de direitos, na medida em que, por esse ato é criado um direito de propriedade industrial autónomo, até aí inexistente, tal como confirma por este STJ no seu Acórdão de 16 de dezembro de 2016 (cf. Doc. n.º 2).

26. Um dos princípios basilares que preside à proteção da propriedade industrial, e que se encontra plasmado no artigo 4.º, n.º 2, do CPI, estabelece que a concessão de direitos de propriedade industrial implica a presunção iuris tantum dos requisitos da sua concessão. Da concessão do título de propriedade industrial resulta, pois, uma presunção da sua validade.

27. O único meio facultado pelo CPI para a elisão da presunção de validade de um título de propriedade industrial é a ação de nulidade ou de anulação desse título, a intentar pelo Ministério Público ou por qualquer interessado junto de um tribunal judicial, conforme resulta claramente do artigo 35.º n.ºs 1 e 2 do CPI.

28. Enquanto o TPI não declarar nulo ou anular um título de propriedade industrial, nenhuma outra autoridade (outros tribunais judiciais e administrativos, tribunais arbitrais, administração pública etc.) se poderá pronunciar sobre a sua invalidade, quer por via de ação, quer de reconvenção, ou exceção, funcionando em toda a sua plenitude a presunção de validade decorrente do artigo 4.º, n.º 2 do CPI.

29. Considerando a natureza absoluta dos direitos privativos que resultam da patente, encontram-se adstritos a averbamento e inscrição no título todos e quaisquer factos que limitem, modifiquem ou extingam esses direitos, entre eles a pendência das ações judiciais de nulidade ou de anulação de direitos privativos, como se lê no artigo 30.º, n.º 1, alínea d) do CPI. Qualquer decisão invalidante proferida nessa ação pelo TPI é sujeita a registo e publicação (n.ºs 3 e 4 do artigo 35.º do CPI) e produz efeitos extintivos do direito de propriedade industrial em causa, oponíveis erga omnes.


30. Admitir, como o Tribunal a quo propugna, a declaração de invalidade, com meros efeitos inter partes, seria negar a natureza erga omnes do direito, ou seja, permitir-se-ia a invalidação subjetivamente parcial da mesma patente, a qual passaria a ser inválida apenas em relação às partes demandadas, continuando a ser válida e oponível contra todos os outros interessados, o que sempre seria inadmissível.

31. E, se viesse a ser julgada improcedente a ação de invalidação, nos termos do artigo 35.º do CPI, julgando-se, pelo contrário, válida a patente, tal decisão, embora eficaz erga omnes, teria de conviver com eventuais decisões individuais considerando a patente inválida, permitindo assim a sua contrafação por parte dos agentes económicos que, sendo parte nessas ações individuais, aproveitavam das decisões nelas proferidas.

32. A vingar a tese do Tribunal recorrido de que a invalidade de uma patente ainda não declarada pelo TPI poderia ser apreciada no âmbito de uma ação arbitral, estaria então franqueada a possibilidade de prolação de decisões contraditórias, considerando uns tribunais a sua invalidade e outros negando-a. Uma declaração de invalidade proferida nestas circunstâncias destruiria a natureza de direito absoluto do direito de patente, oponível erga omnes, sem que nada na lei autorize tal destruição.

33. Foram estes e outros motivos que levaram o TJUE, fazendo uma análise dos vários direitos e interesses em confronto, a decidir que o artigo 16.4 da Convenção de 27 de setembro de 1968 relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial (Convenção de Bruxelas)[2], que trata da competência exclusiva dos tribunais estaduais nacionais, se aplica às decisões sobre a nulidade de patente – sejam elas suscitadas tanto pela via da ação como da exceção (v.g. Acórdão de 13 de julho de 2006, Processo C-4/03, o qual foi também citado por este STJ no seu já amplamente referido Acórdão de 16 de dezembro de 2016).

34. A preocupação do legislador comunitário – de prevenir o risco de decisões contraditórias – foi a mesma do legislador nacional, ao instituir o regime de presunção de validade dos direitos de propriedade industrial e de inarbitrabilidade dessa matéria (artigos 4.º e 35.º do CPI), evitando que dentro do território nacional, diversas autoridades (arbitrais, judiciais, administrativas) pudessem proferir múltiplas e díspares decisões sobre a mesmíssima questão.

35. O artigo 24.º, n.º 4, do Regulamento EU n.º 1215/2012, de 12 de dezembro, invocado pelo Tribunal a quo no acórdão recorrido dispõe que os tribunais do Estado-membro têm competência para conhecer da validade de patentes quer por via de ação, quer por via de exceção. Daqui não decorre, evidentemente, que todo e qualquer tribunal de um Estado-membro tem esta competência; terá esta competência o Tribunal do Estado-membro ao qual a lei interna a tenha atribuído.

36. Assim, também não tem qualquer cabimento, neste caso, a aplicação da solução geral que emerge do artigo 91.º do CPC, invocado en passant na página 16 do acórdão recorrido.

37. É que, independentemente da questão de a competência para a declaração de invalidade de direitos de propriedade industrial ser colocada por via principal ou incidental, ela sempre teria de ser conhecida no tribunal judicial, por força do artigo 35.º do CPI e, não em todos, mas no seio dos tribunais judiciais, no TPI (cf. artigo 111.º, n.º 1, alínea b) da LOSJ).

38. Acresce que, a invalidade de direitos de propriedade industrial só pode ser declarada por via de uma ação, conforme foi, aliás, entendido por este STJ no citado Acórdão de 16 de dezembro de 2016.

39. Nem que fosse apenas pela especial natureza do direito de propriedade industrial (oponibilidade erga omnes e natureza registral do direito de patente), seria indefensável a discussão incidental de direitos, na medida que se abriria a possibilidade de haver contradições entre o registo e o conteúdo de determinada decisão judicial que – embora com eficácia pretensamente circunscrita ao processo – julgasse procedentemente impugnado o facto sujeito obrigatoriamente a registo.

40. Dessa especial natureza do direito de propriedade industrial e da complexidade inerente ao procedimento de averiguação do cumprimento dos requisitos de patenteabilidade, o legislador determinou a criação de uma jurisdição especializada e exclusiva.

41. Por fim, as vias de defesa da Recorrida não se encontram inviabilizadas, nem diminuídas, simplesmente se constata que essas vias não poderiam ser exercidas na instância arbitral, por a tanto se oporem normas especiais imperativas no ordenamento jurídico.

42. No acórdão recorrido, o Tribunal a quo entendeu seguir e perfilhar inteiramente a fundamentação e decisão expressa no Acórdão do TC n.º 251/2017, em que foi sindicada a constitucionalidade da norma “resultante da interpretação conjugada do artigo 2.º da Lei n.º 62/2011, de 12 dezembro, e artigos 35.º, n.º 1 e 101.º, n.º 2, do Código da Propriedade Industrial no sentido de que «em sede de arbitragem necessária instaurada ao abrigo daquele diploma legal, a parte não se pode defender, por exceção, mediante invocação da invalidade de patente, com meros efeitos inter partes»”.

43. A decisão vertida no Acórdão do TC n.º 251/2017, assenta em premissas totalmente erradas e não tem força obrigatória geral.

44. Contrariamente ao que é entendido pelo TC no Acórdão do TC n.º 251/2017, a alegada indefesa, desde logo, não é absoluta, dado que se reporta apenas à impossibilidade de utilização de uma, de várias, vias de defesa, não sendo, porquanto inconstitucional em si mesma.

45. O TC apenas apreciou a problemática da violação do processo equitativo do ponto de vista do direito de defesa dos demandados nas ações arbitrais, obnubilando totalmente a problemática para os demandantes titulares de patentes.

46. Para justificar o alegado prejuízo injustificado ao direito de defesa dos demandados, o TC salienta que: 1) a instauração de uma ação de invalidação de uma patente dificilmente terá qualquer influência na resolução do litígio pendente na ação arbitral, considerando o artigo 36.º do CPI e as normas relativas à suspensão da instância (272.º e ss. Do CPC) e 2) o requerente/titular de AIM pode não ter um interesse na declaração de invalidade da patente através de uma ação de anulação com efeitos erga omnes, visto que tal beneficiaria todos os terceiros concorrentes do titular da patente e não apenas o seu interesse económico.

47. Ora, não resulta do artigo 36.º do CPI que a entidade demandada continuará vinculada ao conteúdo condenatório da decisão arbitral após o trânsito em julgado da declaração de nulidade da patente. Assim, a declaração de nulidade de um direito depois da decisão arbitral permite modificar ou inutilizar a força de caso julgado conferida à decisão arbitral condenatória do demandado.

48. Em relação à suspensão da instância, o próprio regime do artigo 272.º, n.º 2 do CPC é, ele próprio, uma manifestação adjetiva do princípio da proporcionalidade, pelo que ele nunca poderia, sem mais e em termos absolutos, fundamentar um juízo de inconstitucionalidade. Estão em confronto nesse artigo 272.º, n.º 2 do CPC o direito do demandante a uma decisão célere e o direito do demandado a um procedimento prioritário, devendo ambos ser conciliados. Admitir-se sempre o deferimento da suspensão em causa prejudicial é, isso sim, fazer uma interpretação inconstitucional do artigo 272.º, n.º 1 do CPC, por violação do direito à decisão da causa em prazo razoável.

49. Quanto à premissa identificada em 2), não podem ser confundidos argumentos de política jurídico-económica com o facto de saber se da norma sob sindicância resulta a supressão do direito de defesa. E este direito não fica limitado.

50. A solução adotada pelo TC não é nem proporcional, nem respeita o artigo 18.º, n.º 3 da CRP, visto que pondera erradamente os verdadeiros interesses confronto, não tomado em conta que o que é necessário é salvaguardar o conteúdo essencial do direito de patente, diretamente protegido pela Constituição por força do artigo 42.º ou do artigo 62.º da CRP.

51. Foi obliterado que estamos perante um direito temporário e que o cerne deste direito é a fruição de um exclusivo que seria posto em causa com os efeitos inter partes, suprimindo-se do direito de patente a dimensão que lhe mais característica (o seu ius prohibendi).

52. A solução passa, assim, por aquela que foi pugnada por este douto Tribunal no acórdão de 14 de dezembro de 2016 (processo n.º 1248/14.6YRLSB.S1), onde se refere que o requerente de AIM deveria definir a sua estratégia processual optando por propor a ação no TPI e pedir a suspensão da instância arbitral até à decisão relativamente à validade da patente, caso tal fosse do seu interesse.

53. Não tendo a Recorrida utilizado os meios que tinha ao seu dispor, não se justifica que o titular da patente veja o seu direito fundamental aniquilado para salvaguarda de uma mera restrição do direito de defesa dos demandados.

54. Assim, uma interpretação dos artigos 35.º, n.º 1 do CPC e 2.º da Lei n.º 62/2011 segundo a qual é admissível a declaração de nulidade de uma patente por um tribunal arbitral com efeitos inter partes importa a diminuição da extensão e do alcance do conteúdo essencial do direito fundamental de propriedade industrial das titulares de patentes de forma desproporcional, sendo materialmente inconstitucional por violação dos artigos 42.º, 62.º e 18.º, n.os 2 e 3 da CRP, e representando uma solução, em violação do artigo 13.º da Lei Fundamental.

55. É por tudo o que se acaba de referir que, contrariamente ao que foi decidido no acórdão recorrido, a Lei n.º 62/2011, elemento definidor da competência do tribunal arbitral, não inclui (como não podia incluir) os litígios resultantes da existência ou validade de direitos de propriedade industrial relacionados com medicamentos de referência e medicamentos genéricos.

56. O que literalmente nos diz o artigo 2.º da Lei n.º 62/2011 é que estão sujeitos a arbitragem necessária os litígios emergentes da invocação de direitos de propriedade industrial relacionados com medicamentos de referência e medicamentos genéricos – não os emergentes da validade dos mesmos.

57. Por sua vez, também o artigo 1.º da LAV esclarece que são inarbitráveis os litígios que, por lei especial (face à lei geral que a LAV se arroga ser, porque a subtração de um litígio à arbitragem ou ao critério de arbitrabilidade da LAV tanto pode resultar de leis especiais como de leis gerais na matéria que regulam), estejam submetidos exclusivamente à jurisdição dos tribunais do Estado. Entre essas encontra-se, claro, o artigo 35.º do CPI.

58. O Acórdão recorrido, ao confirmar a decisão arbitral interlocutória, enferma do vício de violação de lei substantiva (cf. alínea a) do n.º 1 do artigo 674.º do CPC), uma vez que errou na interpretação e aplicação das normas aplicáveis ao caso concreto, concretamente dos artigos 2.º da Lei n.º 62/2011, 4.º, 35.º, n.º 1, e 101.º, n.º 2, do CPI, 91.º do CPC, tendo incorrido, ainda, na violação dos artigos 42.º, 62.º e 18.º, n.ºs 2 e 3 da CRP, e representando uma solução, em violação do artigo 13.º da Lei Fundamental, pelo que deve ser revogado e substituído por outro que declare a incompetência do tribunal arbitral para conhecer incidentalmente a questão da invalidade de uma patente.

A demandada contra-alegou, batendo-se pela improcedência da revista.

                                                           *

Sendo o objecto do recurso balizado pelas conclusões das recorrentes, a questão que cumpre decidir é a de saber se o tribunal arbitral necessário é competente para conhecer da questão da nulidade da patente de medicamento, anteriormente registada, com efeitos limitados às relações inter partes, questão essa deduzida por via de defesa por excepção.

                                                           *

II.        FUNDAMENTAÇÃO

OS FACTOS

Os factos que interessam à decisão da revista são os que constam do antecedente relatório.

O DIREITO

A Lei n.º 62/2011, de 12 de Dezembro, instituiu a arbitragem necessária para os litígios emergentes da invocação de direitos de propriedade industrial, incluindo os procedimentos cautelares, relacionados com medicamentos de referência e medicamentos genéricos (artigo 2º)[3].

Procurou-se através daquele diploma dar cumprimento aos compromissos assumidos pelo Estado Português perante a Comissão Europeia, o Fundo Monetário Internacional e o Banco Central Europeu no tocante à entrada no mercado de medicamentos genéricos.

Entre outras medidas preconizadas para área da saúde, o Memorando de Entendimento firmado entre o Governo Português e aquelas instituições, de 17 de Maio de 2011, previa, no ponto 3.60., a remoção de “todas as barreiras à entrada de genéricos, especialmente através da redução de barreiras administrativas/legais, com vista a acelerar a comparticipação de genéricos”.

O que então acontecia é que o contencioso relacionado com as patentes e os pedidos de autorização de introdução no mercado de medicamentos genéricos era dirimido nas instâncias administrativas de forma demorada e pouco ágil.

Daí que, na Proposta de Lei 13/XII, na justificação dos motivos da intervenção legislativa, se tivesse escrito:

“Tem vindo, assim, a assistir-se a um vasto conjunto de litígios judiciais a respeito da concessão da autorização de introdução no mercado, da autorização do preço de venda ao público e da autorização da comparticipação do Estado no preço dos medicamentos relacionados com a subsistência de direitos de propriedade industrial a favor de outrem.

No entanto, a questão de saber se existe, ou não, violação de direitos de propriedade industrial depende de sentença a proferir pelos tribunais.

Através da presente proposta de lei o Governo pretende estabelecer um mecanismo alternativo de composição dos litígios que, num curto espaço de tempo, profira uma decisão de mérito quanto à existência, ou não, de violação dos direitos de propriedade industrial. Institui-se, por isso, o recurso à arbitragem necessária para essa composição, solução já adoptada, inclusive no âmbito dos conflitos atinentes aos direitos de autor.

Ainda com o objectivo de promover a celeridade, estabelecem-se prazos para a instauração do processo e para a oposição, contados da publicitação pelo INFARMED, I. P., do pedido de autorização de introdução no mercado. Verificando-         -se o incumprimento do prazo de oposição, o requerente de autorização de introdução no mercado do medicamento genérico não poderá iniciar a sua exploração industrial ou comercial na vigência dos direitos de propriedade industrial.

Adopta-se, ainda, uma tramitação consentânea com a preocupação de celeridade, com garantia pelo devido contraditório das partes, bem como o direito a uma instância de recurso, fixando-se o efeito meramente devolutivo do mesmo, de modo a manter os efeitos da decisão arbitral até à decisão que sobre o mesmo recair”.

Vista a conjuntura em que se implementou a arbitragem necessária para este tipo de litígios é hora de apreciar a questão colocada na revista.

O acórdão recorrido, confirmando a decisão do tribunal arbitral necessário, entendeu que assiste competência a esse tribunal para conhecer da questão da invalidade da patente deduzida pela demandada por via de defesa por excepção peremptória.

A fundamentação jurídica assenta em duas razões primaciais:

- A possibilidade, prevista no artigo 91º do CPC de a demandada se defender por via de excepção, possibilidade essa reforçada pelo disposto no artigo 24º, n.º 4, do Regulamento EU n.º 1215/2012, de 12 de Dezembro;

- A inconstitucionalidade, por violação do princípio da proibição da indefesa, da norma interpretativamente extraível do artigo 2º da Lei 62/2011 e dos artigos 35º, n.º 1, e 101º, n.º 2, do CPI, de que em sede de arbitragem necessária a parte não se pode defender por excepção, mediante a invocação da invalidade da patente, com meros efeitos inter partes.

Quanto à primeira, é verdade que o artigo 91º, n.º 1, do CPC enuncia a regra geral de que o tribunal competente para a acção é também competente para conhecer dos incidentes que nela se levantem e das questões que o réu suscite como meio de defesa. Todavia, essa extensão da competência não pode valer para o efeito de se desencadear no tribunal arbitral necessário, por via de defesa por excepção, um ataque à validade da patente, pois o artigo 35º, n.º 1, do CPI estabelece que a declaração de nulidade ou de anulação de patente só podem resultar de decisão judicial, cabendo ao Tribunal da Propriedade Industrial[4] o julgamento das respectivas acções, conforme decorre, aliás, do artigo 111º, n.º 1, alínea c), da LOSJ.

A questão da possibilidade de ser invocada perante o tribunal arbitral a invalidade da patente, quer através de excepção (peremptória), quer através de pedido reconvencional, remonta a momento anterior à aprovação da Lei 62/2011.

De facto, o Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, solicitou a diversas entidades que se pronunciassem sobre o teor da Proposta de Lei 13/XII, tendo o Infarmed e a Associação Portuguesa de Arbitragem apresentado comentários expressos sobre essa matéria.

O Infarmed[5] propôs uma redacção complementar ao artigo 2º, tendo em vista “(…) afastar a dúvida quanto à conjugação com o disposto no artigo 35º do CPI (…)”, procurando desse modo que o legislador esclarecesse se o tribunal arbitral tinha competência material para aferir da existência e validade do direito de propriedade industrial invocado pelas empresas originadoras.

A APA[6] também defendeu que fosse feita menção, no artigo 2º da Proposta, à apreciação de questões de validade.

Apesar disso, o legislador optou por não fazer quaisquer acertos normativos[7], o que é bem demonstrativo da sua intenção de não atribuir essa competência ao tribunal arbitral[8] e reservando à apreciação deste apenas as questões atinentes ao acertamento dos direitos do titular da patente.

Daí que, como cristalinamente se afirma no voto de vencido do acórdão do tribunal arbitral (fls. 108, verso dos autos), a Lei 62/2011 abrange apenas os litígios emergentes da invocação de direitos de propriedade industrial (cfr. artigo 2º dessa lei) e não os litígios referentes à existência e validade desses mesmos direitos.

Por outro lado, conforme resulta do acórdão de 13.07.2006 do Tribunal de Justiça da União Europeia (processo n.º C-4/03), a competência exclusiva de certo tribunal para apreciar determinada matéria preclude a possibilidade de a mesma ser suscitada, embora em termos meramente incidentais, em causa pendente perante outro tribunal, tendo-se aí consignado o seguinte:

“O artigo 16.°, n. 4, da Convenção de 27 de Setembro de 1968 relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial, alterada, em último lugar, pela Convenção de 29 de Novembro de 1996 relativa à adesão da República da Áustria, da República da Finlândia e do Reino da Suécia, deve ser interpretado no sentido de que a regra de competência exclusiva que estabelece abrange todos os litígios relativos à inscrição ou à validade de uma patente, quer a questão seja suscitada por via de acção quer por via de excepção”.

Esta orientação seria expressamente acolhida no artigo 22º, n.º 4, da Convenção de Lugano de 2007, relativa à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, e pelo artigo 24º, n.º 4, do Regulamento Bruxelas I reformulado[9], neste se definindo que, independentemente do domicílio das partes, têm competência exclusiva:

“Em matéria de inscrição ou de validade de patentes, marcas, desenhos e modelos e de outros direitos análogos sujeitos a depósito ou a registo, quer a questão seja suscitada por via de acção quer por via de excepção, os tribunais do Estado vinculado pela presente convenção em cujo território o depósito ou o registo tiver sido requerido, efectuado ou considerado efectuado nos termos de um instrumento comunitário ou de uma convenção internacional;

Sem prejuízo da competência do Instituto Europeu de Patentes, nos termos da convenção relativa à emissão de patentes europeias, assinada em Munique em 5 de Outubro de 1973, os tribunais de cada Estado vinculado pela presente convenção são os únicos competentes, sem consideração de domicílio, em matéria de inscrição ou de validade de uma patente europeia emitida para esse Estado, quer a questão seja suscitada por via de acção quer por via de excepção”.

É certo que, como assinala a recorrida, esse acórdão do TJUE trata de uma questão de competência internacional, tendo-se limitado a proibir a apreciação, por via de reconvenção ou de excepção, por parte de um tribunal de um Estado-Membro, e reconhecendo a competência para tal ao tribunal do Estado-Membro cuja administração pública tenha concedido o respectivo direito industrial. Esta solução de atribuir a competência exclusiva aos tribunais dos Estados-Membros em cujo território o depósito ou registo da patente tenha sido requerido ou efectuado encontra justificação na circunstância de tais tribunais estarem em melhor posição para conhecer dos casos em que o litígio incide sobre a validade da patente ou a existência do depósito ou registo.

Na síntese de Dário Moura Vicente, as razões justificativas da competência exclusiva dos tribunais do país do registo são, por um lado, a concessão do direito de propriedade industrial como manifestação de soberania nacional e, por outro, o princípio da boa administração da justiça e da segurança jurídica[10].

O acórdão do STJ de 14.12.2016[11] pegou na “linha argumentativa” desse acórdão para concluir que “ao menos em determinadas situações, a atribuição de competência a certo tribunal é de tal modo exclusiva, face aos interesses em causa, que inibe em absoluto a possibilidade de qualquer outro tribunal se poder vir a pronunciar sobre a matéria reservada ao primeiro, ainda que a título puramente incidental e com efeitos circunscritos ao processo: e daqui decorre naturalmente que a parte que figurar como réu ou demandado na causa pendente perante o tribunal carecido de competência exclusiva fica privada da possibilidade de excepcionar quanto às matérias reservadas à apreciação exclusiva do único tribunal competente para as apreciar”.

Coincidentemente, afirma Luís Couto Gonçalves[12]:

“O que é exclusivo de uma determinada categoria de tribunais não pode ser retirado desses tribunais, sob pena de os objectivos que justificam essa exclusividade deixarem de poder ser prosseguidos e ficarem dependentes da circunstância acidental de a questão ter sido suscitada em processo por via de acção (que só poderia ser apreciada no tribunal exclusivamente competente) ou por via de excepção (que poderia ser conhecida por qualquer tribunal)”.

Vê-se, do exposto, que a primeira das razões em que se arrima a decisão recorrida não pode ser aqui sufragada.

A segunda razão mobilizada pelo acórdão recorrido encontra apoio no acórdão de 24.05.2017 do Tribunal Constitucional[13], em que se decidiu:

“Julgar inconstitucional a norma interpretativamente extraível do artigo 2.º da Lei n.º 62/2011, de 12 de Dezembro e artigos 35.º, n.º 1, e 101.º, n.º 2, do Código da Propriedade Industrial, ao estabelecer que, em sede de arbitragem necessária instaurada ao abrigo da Lei n.º 62/2011, de 12 de Dezembro, a parte não se pode defender, por excepção, mediante invocação da invalidade de patente, com meros efeitos inter partes”.

A fundamentação desse acórdão desenvolve-se nos seguintes termos:

“Efectivamente, ao não admitir a invocação, no processo que corre perante do tribunal arbitral necessário, da nulidade da patente, a título de estrito meio de defesa, como mera excepção peremptória, configura, portanto, uma restrição ao direito fundamental de defesa em tribunal, previsto no artigo 20.º da Constituição.

(…)

A impossibilidade de invocação da nulidade da patente como defesa por excepção na acção arbitral implica um sacrifício significativo – por vezes, absoluto – do direito de defesa, com o fim de proteger a existência de uma via processual única (a acção de declaração de nulidade ou anulação da patente) e a competência exclusiva do TPI, que estão relacionados com a natureza da patente. É necessário, pois, aferir da proporcionalidade da imposição desta restrição, face a este fim.

(…)

Embora se compreendam as preocupações que levam à imposição de apenas uma via processual e um tribunal no âmbito do conhecimento da invalidade das patentes, o sistema montado para prosseguir este fim é susceptível de ter como consequência, por vezes, uma ablação total do direito de defesa ou, noutras vezes, uma significativa compressão. Inexiste a demonstração cabal de que a possibilidade de o tribunal arbitral se pronunciar sobre a validade da patente, com meros efeitos inter partes, produza danos irreversíveis ou gravosos à protecção da patente, equivalentes ao sacrifício imposto ao direito de defesa do requerente de AIM. Efectivamente, afastar esta possibilidade pode ter como consequência, ainda que apenas por vezes, impedir um agente económico de exercer a sua liberdade de iniciativa com base numa patente nula ou inválida – o que dificilmente encontra justificação. A protecção da patente, valor central no nosso ordenamento, não justifica a restrição do direito de defesa a este nível, podendo ser alcançada por outras vias.

Assim, a norma objecto do presente julgamento revela-se excessiva porquanto prejudica de modo desproporcionado o direito à defesa do requerente de AIM. Termos em que deve ser julgada inconstitucional por violação do princípio da proibição de indefesa (artigo 20.º da Constituição em conjugação com o seu 18.º, n.º 2)”.

O défice de defesa resultante da improvável suspensão da instância arbitral e o ónus excessivo de instaurar uma acção de nulidade da patente no TPI são os argumentos que levaram o TC a concluir que a restrição ao direito fundamental de defesa “redunda numa impossibilidade de exercício do direito à tutela jurisdicional efectiva”.

Com todo o respeito, não cremos que as normas em causa se traduzam numa intolerável ou desproporcionada compressão do direito de defesa, em violação do artigo 20º da Constituição.

Neste particular, revemo-nos integralmente nas considerações formuladas por Alexandre Libório Dias Pereira na anotação a esse acórdão do TC, na Revista de Legislação e Jurisprudência n.º 4008, páginas 182 e seguintes[14]:

“Como o acórdão deixa claro, esse défice refere-se a decisão arbitral transitada em julgado. Todavia, a Lei n.º 62/2011 garante recurso da decisão arbitral para o Tribunal da Relação competente, ainda que com efeito meramente devolutivo (artigo 3º, n.º 7). Não descortinamos o alegado défice de defesa pois a lei garante o direito de recurso para o Tribunal da Relação. No caso de o tribunal arbitral não ter decretado a suspensão da instância, apesar de ter sido instaurada ação prejudicial sobre a validade da patente que não seja manifestamente dilatória, é algo excessivo falar em ‘ablação total do seu direito de defesa’ ou ‘impossibilidade de exercício do direito à tutela jurisdicional efetiva’, uma vez que a lei garante o recurso. Não será, por isso, certamente, que a restrição ao direito de defesa não cumpre a ‘justa medida’ ou ‘proibição do excesso’.

(…)

Também o argumento do ‘ónus excessivo’ por forçar o requerente a ‘uma defesa por antecipação’, ou a defender – mesmo contra o seu – o interesse económico de concorrentes e o interesse público não se afigura, salvo o devido respeito, concludente.

O interesse próprio do requerente de AIM em poder explorar uma invenção cuja patente é inválida significa, na prática, como já o disse várias vezes o Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) pretender beneficiar de uma patente que se tem por inválida. Não se afigura interesse legítimo e digno de tutela querer beneficiar de uma patente inválida como se esta fosse válida. São razões de ordem pública económica que justificam a existência ou não de direitos exclusivos como os conferidos pelas patentes e outros direitos de propriedade industrial.

(…)

No domínio das patentes os interesses privados são protegidos por razões de interesse público e na medida deste. É o interesse público que justifica a outorga da patente e, de igual modo, é o interesse público que justifica a sua revogação”.

Não se reconhece, portanto, que a restrição de defesa nos moldes acima tratados, ditada em função da ampla margem de liberdade do legislador na modelação do processo a tramitar nos tribunais judicias e arbitrais, prejudique de modo desproporcionado o direito de defesa da demandada.

Para mais, é bom notar, como acima se disse, que o que está em causa neste tipo de litígios é o acertamento dos direitos do titular da patente, destinando-se as acções arbitrais, por via de regra, a apurar se há patente ou certificado complementar de protecção[15] (CCP) em vigor e até quando, se e em que medida a utilização da AIM ofende a patente ou o CCP, e decretar antecipadamente as medidas adequadas à defesa destes contra uma eventual e hipotética utilização ilícita da AIM.

Por isso é que, como refere Margarida Sameiro[16], a acção arbitral, na perspectiva do titular do direito, assume um pendor preventivo e inibitório, atendendo a que o que se pretende é que haja uma condenação na abstenção de determinados actos pelo titular da AIM, actos esses que poderão consubstanciar a violação efectiva dos direitos violados.

Na verdade, os direitos conferidos pela patente ao titular compreendem, por um lado, o direito exclusivo de explorar a invenção patenteada em qualquer parte do território português, e, por outro o direito de impedir a terceiros, sem o seu consentimento, o fabrico, a oferta, a armazenagem, a introdução no comércio ou a utilização de um produto objecto de patente, ou a importação ou posse do mesmo, para algum dos fins mencionados – artigo 101º, n.ºs 1 e 2, do CPI.

A natureza constitutiva do registo da patente proporciona ao seu titular o direito de patente, que corresponde a um direito subjectivo de exploração económica da invenção, em regime de monopólio e oponível erga omnes[17], com a consequente limitação que daí resulta para a actuação de terceiros.

Alexandre de Soveral Martins[18] explica que a protecção conferida pelas patentes permite às fabricantes de produtos farmacêuticos a realização de investimentos mais elevados por contarem com o monopólio de que poderão beneficiar durante certo tempo. Isso funciona como um estímulo à investigação para obter novos produtos, novos processos ou novas aplicações e conduz à concepção de complexas estratégias de gestão da carteira de patentes.

 A protecção destes direitos resulta ainda do facto de só poderem ser declarados inválidos por tribunais judiciais com tramitação processual específica, à qual todos os interessados são chamados. Com efeito, a patente ou é válida e confere um direito exclusivo oponível erga omnes, ou não é válida e nesse caso o direito não é oponível erga omnes: tertium non datur”[19].

Não se mostra, por isso, aceitável que os tribunais arbitrais possam decretar a invalidade da patente, mesmo que com mera eficácia inter partes (invalidade relativa).

Refere Luís Couto Gonçalves[20], que “também não se afigura compreensível (…) admitir que um direito absoluto, com eficácia erga omnes, deixasse de ser oponível contra os potenciais concorrentes infractores, para sê-lo apenas contra os concorrentes não infractores. Dito de outro modo, um direito absoluto registado só oponível, estranhamente, a quem não tivesse qualquer interesse em o questionar”.

A mesma opinião tem Manuel Oehen Mendes[21]:

 “No Direito português vigente, não se vislumbra qualquer fundamento legal para a admissão da invalidade dos direitos absolutos com efeitos meramente inter partes, uma vez que eles são direitos oponíveis erga omnes por definição”.

Não faz qualquer sentido que, mediante a decretação da ineficácia da patente inter partes, ficasse reconhecido ao demandado o direito a comercializar o produto patenteado, apesar de nada ter contribuído para a invenção, retirando-se a quem nesta investiu esse mesmo direito exclusivo.  

Importa não esquecer que o interesse do titular da patente baseia-se no interesse público de promoção do desenvolvimento técnico através de um sistema de patentes confiáveis. E esta confiabilidade assume muito maior relevo numa área tão sensível como a do mercado de medicamentos.

Acresce que é igualmente do interesse público e dos consumidores em geral que, a existir invalidade de uma determinada patente (concedida pelos serviços do Estado após um rigoroso processo de verificação dos requisitos legais), os seus efeitos sejam destruídos com eficácia geral e não apenas relativamente a alguns agentes ou actos mercadológicos.

Este é o conjunto de motivos que nos leva a considerar, no âmbito da legislação aplicável à presente contenda[22], que o tribunal arbitral necessário carece de competência para apreciar a questão da invalidade da patente de que a recorrente é titular[23], o que implicará a revogação da decisão sob recurso.

                                                           *

III.      DECISÃO

Nestes termos, procede a revista e revoga-se o acórdão recorrido, decretando-           -se a incompetência material do tribunal arbitral para conhecer da questão da invalidade da patente suscitada pela recorrida na acção arbitral, por via de defesa por excepção.

                                                           *

Custas pela recorrida.

                                                           *

                            LISBOA, 12 de Fevereiro de 2019

Henrique Araújo (Relator)

Maria Olinda Garcia

Catarina Serra

___________________
[1] Relator:     Henrique Araújo
  Adjuntas:  Maria Olinda Garcia
                      Catarina Serra
[2]     Hoje artigo 22.º, n.º 4 do Regulamento (CE) n.º 44/2001 do Conselho, de 22 de dezembro de 2000
[3] O DL 110/2018, de 10 de Dezembro, que aprovou o novo Código da Propriedade Intelectual viria, entretanto, a revogar o regime de arbitragem necessária, criando uma nova forma resolução deste tipo de litígios e alterando substancialmente os artigos 2º e 3º da Lei 62/2011. Da exposição de motivos consta, nessa parte, o seguinte:: ”Finalmente, reconhecendo que o circunstancialismo que levou à aprovação da Lei n.º 62/2011, de 12 de dezembro, que criou um regime de composição dos litígios emergentes dos direitos de propriedade industrial quando estavam em causa medicamentos de referência e medicamentos genéricos, foi ultrapassado e se mostram reunidas as condições para revisitar esta matéria, opta-se por revogar o regime de arbitragem necessária então criado, deixando às partes a opção entre o recurso a arbitragem voluntária ou ao tribunal judicial competente”. O actual artigo 3º passa a prever, no n.º 3, a possibilidade de ser invocada e reconhecida, no processo arbitral voluntário, a invalidade da patente com meros efeitos inter partes. Esta alteração, sendo posterior à entrada dos autos em juízo, não os atinge, por força do princípio consagrado no artigo 12º, n.º 1, do Código Civil.
[4] O TPI, com competência territorial de âmbito nacional – foi criado pela Lei 46/2011, de 24 de Julho, instituído pelo DL 67/12, de 20 de Março, e instalado pela Portaria n.º 84/2012, de 29 de Março. A criação deste tribunal de competência especializada em matéria de propriedade industrial, resultou dos compromissos assumidos pelo Estado Português perante a Comissão Europeia, o Fundo Monetário Internacional e o Banco Central Europeu relativamente ao sistema judicial (cfr. ponto 7.11. do Memorando de Entendimento”, de 17 de Maio de 2011.
[5] Parecer de 21 de Setembro de 2011.
[6] Parecer de 27 de Setembro de 2011.
[7] Ao contrário do que aconteceu com a recentíssima alteração ao n.º 3 do artigo 3º da Lei 62/2011.
[8] Sobre estes antecedentes ver Margarida Sameiro em “Revista de Direito Intelectual”, n.º 1, 2015, páginas 329 a 331.
[9] Regulamento (UE) n.º 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial.
[10] “A tutela internacional da Propriedade Intelectual”, 2008, páginas 376 a 378.
[11] No processo n.º 1248/14.6YRLSB.S1 (Conselheiro Lopes do Rego), consultável em www.dgsi.pt.
[12] “A questão da competência do tribunal arbitral necessário para apreciar a invalidade da patente com eficácia inter partes”, em Cadernos de Direito Privado n.º 56, Outubro/Dezembro de 2016, página 46.
[13] Acórdão 251/2017, em www.tribunalconstitucional.pt
[14] Ano 147º, 2018, Janeiro/Fevereiro.
[15] O CCP é um instrumento que permite estender a protecção da patente de invenção de medicamentos – artigos 115º e seguintes de CPI.
[16] Loc. cit., página 325.
[17] Cfr. acórdão do STJ de 27.01.2010, no processo n.º 598/08.5TBCBR.C1.S1 (Conselheiro Oliveira Rocha).
[18] Revista de Legislação e Jurisprudência, Ano 144º, n.º 3993, Julho/Agosto 2015, páginas 418 e seguintes.
[19] Alexandre Libório Dias Pereira, “Da Arbitragem Necessária de Litígios entre Patentes e Medicamentos Genéricos no Direito Português”, no Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra, Volume XCII, Tomo II, 2016, página 841.
[20] Ob. cit., página 47.
[21] “Breves considerações sobre a incompetência dos tribunais arbitrais portugueses para apreciarem a questão da invalidade das patentes e dos certificados complementares de protecção para medicamentos”,  em Estudos de Homenagem ao Prof. Doutor José de Oliveira Ascensão, página 946.
[22] Queremos com isto significar que, considerando a nova redacção do n.º 3 do artigo 3º do CPI, está agora contemplada a possibilidade de ser arguida perante o tribunal arbitral voluntário, por via de excepção, a questão da invalidade da patente, com mera eficácia inter partes. Não se crê, contudo, que tenha acabado a controvérsia, nomeadamente no que concerne à compatibilização entre o direito absoluto conferido ao titular da patente e o espectro dos efeitos alcançados com a eventual decretação, em acção arbitral, da invalidade relativa dessa mesma patente.
[23] A doutrina e a jurisprudência estão divididas quanto a esta problemática. No sentido que defendemos vejam-se, na jurisprudência, além do acórdão da Relação de Lisboa de 13.12.2017 junto pelas recorrentes, os acórdãos do STJ de 14.12.2016 (já referenciado) e de 22.03.2018, no processo n.º 1053/16.5YRLSB.S1.S1 (Conselheira Fernanda Isabel Pereira) e os acórdãos da Relação de Lisboa de 21.05.2015, no processo n.º 1465/14.9YRLSB-6 (Desembargador Tomé Ramião), de 04.02.2016, no processo n.º 138-15.0YRLSB.L1-8  (Desembargador Ilídio Sacarrão Martins), de 21.06.2018, no processo n.º 227/18.9YRLSB.L1-2 (Desembargador Jorge Leal) ; em sentido contrário, os acórdãos da Relação de Lisboa de 13.01.2015, no processo n.º 1356/13.OYRLSB.L1-7 (Desembargadora Rosa Ribeiro Coelho) e de 09.07.2015, no processo n.º 336/15.6YRLSB.L1.-1 (Desembargador Manuel Marques – que subscreveu o acórdão recorrido), de 21.06.2018, no processo n.º 2384/17.2YRLSB.L1-8 (Desembargador Luís Mendonça), de 05.07.2018, no processo n.º 582/18.0YRLSB-6 (Desembargadora Maria de Deus Correia), todos disponíveis em www.dgsi.pt.. Na doutrina, o entendimento que seguimos é defendido pelos autores mencionados nas notas de rodapé antecedentes e ainda por Pedro de Sousa e Silva, “Direito Industrial – Noções Fundamentais”, 2011, página 488.; entendimento contrário têm Remédio Marques “A arbitrabilidade da excepção de invalidade de patente no quadro da Lei n.º 62/2011”, Revista de Direito Intelectual n.º 2 – 2014, APDI, páginas 211 e seguintes, Dário Moura Vicente, “O regime especial  de resolução de conflitos em matéria de patentes (Lei n.º 62/2011), na Revista da Ordem dos Advogados, Ano 72, Out/Dez 2012, páginas 981 e seguintes, e José Alberto Vieira, “A competência do tribunal arbitral necessário para apreciar a excepção da invalidade de patente registada”, Revista de Direito Intelectual n.º 2 -2015, páginas 195 e seguintes.