Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
20464/95.1TVLSB.L1-A.S1
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO
Relator: CATARINA SERRA
Descritores: ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
RECURSO DE APELAÇÃO
RECURSO DE REVISTA
TRIBUNAL DA RELAÇÃO
RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA
Data do Acordão: 05/24/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECLAMAÇÃO - ARTº 643 CPC
Decisão: RECLAMAÇÃO INDEFERIDA
Sumário :
Do Acórdão da Relação que confirma a decisão de não admissão ou rejeição do recurso de apelação não cabe, em regra, recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.
Decisão Texto Integral:

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA


I. RELATÓRIO


1. Nos presentes autos de execução para pagamento de quantia certa intentados por AA, interpôs o exequente recurso de apelação do despacho proferido em 24.06.2021.


2. Tendo o recurso subido ao Tribunal da Relação ..., proferiu a Exma. Desembargadora, em 18.11.2021, uma decisão singular em que se decidia, a final, não tomar conhecimento do objecto do recurso.


3. Esta decisão singular foi confirmada, em 16.12.2021, por Acórdão da Conferência.


4. Não se contentando, o exequente veio interpor recurso de revista deste Acórdão da Conferência “nos termos e para os efeitos do disposto nos artº 671º e ss. do CPC”.


5. Em 27.01.2022 proferiu a Exma. Desembargadora um despacho manuscrito em que pode ler-se:

Não há lugar a recurso do despacho que não admita o recurso. Deste despacho há lugar a reclamação ex vi do artigo 643.º CPC (…).

Assim, notifique-se a parte para proceder ao pagamento da multa, querendo, após o que se aproveitará o 'recurso' como reclamação”.


6. Por fim, em 14.03.2022, voltou a Exma. Desembargadora a proferir um despacho manuscrito em que pode ler-se:

Autue como reclamação após o que remeta os autos ao STJ”.


7. Distribuído o recurso neste Supremo Tribunal, preferiu, em 1.04.2022, a presente relatora decisão singular onde pode ler-se:

O presente requerimento vem enquadrado no artigo 643.º do CPC.

O artigo 643.º, n.º 1, do CPC é do seguinte teor:

“Do despacho que não admita o recurso pode o recorrente reclamar para o tribunal que seria competente para dele conhecer no prazo de 10 dias contados da notificação da decisão”.

A reclamação prevista na norma é, por conseguinte, o meio processual adequado para os casos em que ocorre uma de duas situações:

a) o Tribunal de 1.ª instância não admitiu o recurso de apelação, caso em que a reclamação deve ser endereçada ao Tribunal da Relação competente para conhecer da apelação; ou

b) o Tribunal da Relação não admitiu o recurso de revista, caso em que a reclamação deve ser endereçada ao Supremo Tribunal de Justiça.

Ora, no caso concreto não ocorre nenhuma das duas situações: a decisão impugnada é um Acórdão que, confirmando uma decisão singular, não admitiu o recurso de apelação.

A reclamação para o Supremo Tribunal de Justiça não é, por isso, o meio processual adequado[1].

Mas diga-se que, mesmo que se considerasse que o presente requerimento era para interposição de recurso de revista, o resultado não seria mais favorável ao requerente.

Dispõe-se no artigo 671.º, n.º 1, do CPC:

“Cabe revista para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão da Relação, proferido sobre decisão da 1.ª instância, que conheça do mérito da causa ou que ponha termo ao processo, absolvendo da instância o réu ou algum dos réus quanto a pedido ou reconvenção deduzidos”.

O recurso de revista respeitaria a um Acórdão de Conferência que decidiu a não admissão do recurso de apelação.

Ora, como explica Abrantes Geraldes, “não é de admitir recurso de revista do acórdão da Relação que confirme a decisão da 1.ª instância de rejeição do recurso de apelação, a não ser quando se verifique alguma das previsões excecionais dos arts. 629.º, n.º 2, e 671.º, n.º 2” [2]. E o mesmo vale, mutatis mutandis, na hipótese em que o Acórdão da Relação confirme a decisão do Desembargador relator de rejeição do recurso de apelação.

Isto porque não se trata nem de um acórdão que conheça do mérito da causa nem de um acórdão que ponha termo ao processo, “absolvendo da instância o réu ou algum dos réus quanto a pedido ou reconvenção deduzidos” [3] [4].

Quer isto dizer, em suma, que o recurso de revista sempre teria de ser rejeitado.

Face ao exposto, não se toma conhecimento da presente reclamação.


*


Custas pelo reclamante, sem prejuízo do apoio judiciário de que eventualmente beneficie”.


8. Inconformado com esta decisão, vem agora o recorrente AA reclamar para a Conferência, ao abrigo do artigo 652.º, n.º 3, do CPC.

Pugna, imediatamente, pela admissibilidade do recurso de revista do Acórdão de Conferência que confirmou a decisão de não admissão do recurso de apelação e, mediatamente, pela admissão deste último, alegando, em conclusão:

a) Em 24/06/2021, o Tribunal de 1ª instância proferiu despacho (refª PE ...58), que decidiu:

“Nos presentes autos interveio como patrono do Recorrente o BB e que mantinha o patrocínio à data em que foi proferido o despacho de 16.9.2013 que declarou deserta a instância, despacho devidamente notificado a tal patrono do Recorrente.

Esse despacho transitou em julgado já que dele não foi interposto recurso, pelo que, a presente execução está deserta desde 2013 e por isso extinta, não podendo prosseguir.

Entretanto, em 2020, veio intervir nos autos a senhora advogada CC, como patrona do Recorrente, invocando substituição tácita no patrocínio.

Resulta da informação vinda da Ordem dos advogados que o pedido de substituição de patrono efetuado pelo Recorrente foi indeferido, pelo que, a senhora advogada CC não é patrona do Recorrente não podendo nessa qualidade intervir nos autos nem em nome do Recorrente dirigir requerimentos ao processo invocando a substituição no patrocínio, expressamente indeferida pela entidade competente para a sua apreciação.

Assim, indefere-se o requerido pela mesma senhora advogada, no sentido de ser associada aos autos como patrona do Recorrente e ser-lhe concedido, nessa qualidade, acesso ao processo.

Notifique.”

b) O Recorrente apresentou Recurso de Apelação em 06/09/2021, que foi admitido pelo Tribunal de 1ª instância e subiu ao Tribunal da Relação ....

c) Em 18/11/2021, pela Exma. Desembargadora Relatora do Tribunal da Relação ..., foi proferida decisão singular que, a final e após sumariar alguns factos e/ou actos do processo, decidiu não conhecer o objecto do recurso, porquanto:

“A Exma. Sra. Dra. CC informou que o recurso foi interposto em nome do Recorrente, enquanto patrona oficiosa, face ao indeferimento [tratar-se-á, certamente, de lapso de escrita, devendo ler-se “deferimento”] tácito do pedido de substituição de patrono efectuado junto da Ordem dos Advogados – fls. 532 e sgs.

Ora, face ao extractado supra, constata-se que a Sra. Advogada subscritora das alegações e conclusões do recurso não tem poderes de representação no que ao Recorrente concerne, porquanto não é sua patrona oficiosa, sendo omissa nos autos qualquer procuração.

Assim, a Sra. Advogada não pode intervir nos autos em representação do Recorrente – cfr. arts. 40 e sgs. CPC e legislação relativa ao apoio judiciário – Lei 34/2004 de 29/7. Destarte, não se conhece do objecto do recurso.”

d) Decisão que foi mantida pelo Acórdão de 16/12/2021, “nos precisos termos que se deixou exarado”.

e) Ora, salvo o devido respeito – que é muito – não podia o Tribunal da Relação ... recusar o recurso com fundamento na falta de poderes de representação da advogada, quando o recurso versa, não só mas também, tal matéria: os poderes da advogada subscritora, a validade da sua nomeação por deferimento tácito e a inexistência do indeferimento expresso da sua nomeação.

f) Com efeito, os poderes de representação da advogada subscritora, sendo um pressuposto de admissão, são também objecto do próprio recurso.

g) Pelo que, recusar o recurso com tal fundamento, consiste numa negação do direito de acesso do Recorrente à justiça e aos tribunais, impedindo-o de sindicar uma decisão, com base nos fundamentos dessa mesma decisão, que se contestam.

h) Bem resultam dos autos os seguintes factos/actos processuais:

1) Em 29/06/2020, requereu junto do ... de ... da Ordem dos Advogados a substituição do patrono nomeado.

2) Porque, por ofício datado de 03/07/2020, o CR ... da OA tal lhe solicitou em razão da pandemia, em 10/09/2020 o Recorrente repetiu o envio de tal comunicação, através do correio electrónico da advogada subscritora do presente recurso, por não dispor de correio electrónico próprio.

3) Sendo que, em 15/09/2020 e novamente através do email da advogada, remeteu àquele CR... declaração de aceitação do patrocínio subscrita por esta, bem como requerimento em que, nomeadamente, invoca a sua situação de imunodeprimido, que desaconselha o contacto com diversos advogados, e a relação de conexão entre os presentes autos e os já patrocinados pela mesma advogada, por forma a justificar o pedido de que seja esta nomeada em substituição do anterior patrono.

4) Decorridos que foram mais de 30 dias sem que o CR... se pronunciasse, em 19/10/2020, a advogada dirigiu comunicação invocando a verificação do deferimento tácito da pretensão, atento o disposto no artº130º do Código de Procedimento Administrativo (CPA).

5) Sendo que, na mesma data, deu conhecimento aos autos das mencionadas comunicações.

6) Em 11/12/2020, invocando novamente o deferimento tácito do pedido de substituição de patrono, requereu nos autos o acesso à tramitação electrónica dos mesmos.

7) Do que deu conhecimento ao CR..., na mesma data, requerendo a criação do processo de nomeação no seu SinOA.

8) Por ofício electronicamente enviado em 30/12/2020, o CR... indefere o requerido – criação do processo no SinOA – não se pronunciando quanto ao deferimento tácito invocado.

9) Mais recusando, em 12/01/2021, a notificação ao beneficiário/Recorrente – o que certamente não poderia suceder em se tratando de pronúncia quanto ao pedido de substituição de patrono apresentado por aquele – e especificando que se tratava de resposta ao email da advogada de 11/12/2020, no qual “solicita em nome própria e não como veículo de transmissão de requerimento de beneficiário” – ou seja, solicita a criação do processo de nomeação no SinOA.

10) Entretanto, nos presentes autos, fora a advogada subscritora deste recurso associada no sistema Citius, tendo podido compulsar electronicamente os mesmos.

11) Como resulta expressamente do requerimento que apresentou em 17/01/2021, dando conta das irregularidades constatadas e, a final, requerendo que o Recorrente fosse pessoalmente notificado da interrupção da instância, declarando-se nulo todo o processado desde a omissão de tal notificação.

12) E do que deu conta ao CR... em 04/02/2021.

13) Que, em resposta, a notificou em 01/03/2021, para que “remeta a este ... despacho judicial onde é determinada a nomeação da Senhora Advogada para o patrocínio do beneficiário do Apoio Judiciário”.

14) Em 19/03/2021, respondeu a advogada ao CR..., invocando, uma vez mais que “Em 15/10/2020, mostra-se tacitamente deferida – artº 130º do CPA e artº 25º, nº 1 e 2 da Lei nº34/2004 de 29 de Julho – a substituição do Exmo. Colega Dr. DD, pedido cujo enquadramento abrangeu também a declaração de aceitação da advogada subscritora, presente ao Ilustre Presidente do CR...” e o mais que melhor consta da comunicação que fez juntar aos presentes autos, na mesma data.

15) Tendo o Recorrente tomado conhecimento do ofício dirigido pelo CR... aos autos em 05/04/2021 e do qual consta, nomeadamente, que “indeferiu o pedido de substituição de patrono escolhido na pessoa da Senhora Advogada” – decisão que até hoje se desconhece – de imediato dirigiu comunicação àquele CR..., cuja cópia juntou aos autos em 22/04/2021.

16) Em 17/06/2021, veio o CR... aos autos: “Informar o Tribunal que,

a. Em 10.09.2020 o beneficiário do Apoio Judiciário solicitou substituição de Patrono junto deste Conselho Regional;

b. Por despacho datado de 19.10.2020 foi o pedido de substituição indeferido;

c. Tendo o beneficiário do Apoio Judiciário notificado por via postal simples, em 20.10.2020, da decisão proferida;”

17) Sem juntar o despacho de indeferimento que refere ter sido proferido em 19/10/2020, nem tão-pouco comprovativo da notificação que refere ter sido efectuada ao Recorrente em 20/10/2020.

18) Despacho e notificação que – repete-se – são desconhecidos do beneficiário até à presente data, por nunca terem sido por si recebidos.

19) Do que o Recorrente deu conta aos autos por requerimento apresentado em 24/06/2021, sobre o qual se desconhece que haja recaído algum despacho.

20) Até porque, atento o despacho da mesma data, foi a advogada imediatamente desassociada do processo Citius.

i) Uma vez que, em 15/10/2020, não se mostrava indeferido o pedido de substituição de patrono, apresentado pelo Recorrente junto do CR... em 10/09/2020, formou-se um acto tácito de deferimento, nos termos do disposto no artº130º do CPA e nº1 e 2 do artº25º da Lei nº34/2004 de 29 de Julho (LADT).

j) Nem tão-pouco, nomeadamente aquando do indeferimento do pedido da advogada de criação do processo no SinOA, procedeu o CR... a qualquer acto expresso de indeferimento do pedido de substituição de patrono apresentado pelo Recorrente.

k) Apenas em 05/04/2021, veio o CR... informar o Tribunal – e não notificar o beneficiário/requerente da substituição – de que o pedido de substituição foi indeferido.

l) Detalhando, em 17/06/2021, que o invocado indeferimento expresso ocorreu em 19/10/2020 e foi notificado ao beneficiário por notificação expedida em 20/10/2020.

m) O que não se verifica, pelo menos quanto à notificação e não foi demonstrado nos autos pelo CR....

n) Pelo que não podia(m) o(s) Tribunal(is) decidir, como decidiu(ram), com base nessa mera invocação da prolação de despacho de indeferimento e sua notificação ao beneficiário, que não ocorreu.

o) Despacho de indeferimento que, a ter sido proferido, não pode produzir qualquer efeito na esfera jurídica do beneficiário, aqui Recorrente, porquanto não lhe foi notificado.

p) E que, ademais, sempre teria de cumprir os requisitos dos artº 167º e 168º do CPA, uma vez que o deferimento tácito do pedido de substituição de patrono é um acto constitutivo de direitos.

q) A decisão singular e o Acórdão que a mantém, para além de terem por fundamento de facto factos não verificados nem provados, também apresentam uma insuficiência da fundamentação de direito, remetendo de forma vaga para a Lei do Apoio Judiciário, sem cuidar de aplicar o artigo adequado, assim dificultando a sua impugnação.

r) Ao mesmo tempo que não foi dado cumprimento ao disposto no nº 1 do artº 655º do CPC, o que constitui uma nulidade processual prevista no nº 1 do artº 195º do CPC – que desde já se invoca –, na medida em que constitui a “omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva” e que “possa influir no exame ou na decisão da causa.”

s) Em resultado da decisão singular e acórdão que a mantém e que decidem não conhecer do objecto do recurso, o ora Recorrente e beneficiário de apoio judiciário – validamente concedido pela Segurança Social e ainda em vigor, porque não revogado por esta entidade – encontra-se na prática impedido no seu direito de acesso à justiça e aos tribunais.

t) Inclusivamente para demonstrar que a advogada subscritora se encontra tacitamente nomeada.

u) Pelo que tais decisões violam princípios constitucionais como o Princípio da igualdade, o do Respeito e garantia de efectivação de direitos e liberdades fundamentais, o direito de acção e de acesso à justiça e aos tribunais, a reserva de competência legislativa da Assembleia da República e o princípio da Separação de poderes, previstos, nomeadamente nos artº 2º, artº 13º/1, artº 18º/1, artº 20º/1, 2 e 5, artº 147º, artº 161º alínea c), artº 165º alínea b), artº 182º, artº 199º alínea d) e artº 202º/1 e 2, todos da Constituição da República Portuguesa.

v) Termos em que se requer a revogação da decisão recorrida porquanto se fundamenta em factos não demonstrados, cerceando direitos fundamentais constitucionalmente consagrados”.


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II. FUNDAMENTAÇÃO

OS FACTOS

Os factos relevantes para a presente decisão são os apresentados no Relatório que antecede e que se dão aqui por reproduzidos.


O DIREITO

Neste seu novo esforço de conseguir que seja admitido o recurso de revista do Acórdão de Conferência que confirmou a decisão de não admissão do recurso de apelação e, mediatamente, seja admitido este último, o reclamante não esgrime argumentos novos ou diferentes daqueles que já havia esgrimido na reclamação inicial e que já foram directamente contraditados na decisão singular.

Por esta razão reitera-se apenas a convicção de que do Acórdão proferido pela conferência que confirma a decisão de não admissão do recurso de apelação não cabe nem reclamação nem recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, excepto nos casos em que o recurso é sempre admissível e remete-se para a respectiva fundamentação da decisão singular.

Para confirmar que esta não é uma decisão isolada mas sim consonante com a posição que vem sendo sustentada há tempo neste Supremo Tribunal de Justiça, inclusivamente, nesta ... Secção, referem-se, a título exemplificativo, o Acórdão de 19 de Fevereiro de 2015 (Proc. 3175/07....), o Acórdão de 21 de Fevereiro de 2019 (Proc. 27417/16....), o Acórdão de 10 de Dezembro de 2019 (Proc. 4154/15....), o Acórdão de 3 de Novembro de 2020 (Proc. 1560/13....), o Acórdão de 25 de Fevereiro de 2021 (Proc. 12884/19....), o Acórdão de 28 de Outubro de 2021 (Proc. 2743/17....), e o Acórdão de 9 de Dezembro de 2021 (Proc. 2290/09....)[5]. Em todos eles se afirma, com ligeiras variações, que, excepto nos casos em que o recurso é sempre admissível, do Acórdão proferido pela conferência que confirma a decisão de não admissão do recurso de apelação não cabe do não cabe recurso de revista, porém, nem reclamação nem recurso para o Supremo Tribunal de Justiça[6].

A terminar, cabe refutar a alegação de inconstitucionalidade constante, nomeadamente, das conclusões u) e v) da presente reclamação.

Como é do conhecimento geral, o direito ao recurso não é um direito absoluto ou irrestrito, sendo objecto de diversas restrições justificadas. É o próprio Tribunal Constitucional que o afirma, esclarecendo que “a Constituição, maxime, o direito de acesso aos tribunais, não impõe ao legislador ordinário que garanta sempre aos interessados o acesso a diferentes graus de jurisdição para defesa dos seus direitos[7], e que “o legislador ordinário tem liberdade para alterar as regras sobre a recorribilidade das decisões judiciais, aí se incluindo a consagração, ou não, da existência dos recursos, conquanto, como tem sustentado parte da doutrina […] não suprima em bloco ou limite de tal sorte o direito de recorrer de modo a, na prática, inviabilizar a totalidade ou grande maioria das impugnações das decisões judiciais, ou, ainda, que proceda a uma intolerável e arbitrária redução do direito ao recurso […][8].


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III. DECISÃO

Pelo exposto, confirma-se o despacho reclamado e mantém-se a decisão de inadmissibilidade da revista.


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Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC.

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Lisboa, 24 de Maio de 2022


Catarina Serra (relatora)

Rijo Ferreira

Cura Mariano

_______

[1] Cfr., designadamente, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 7.03.2019 (Proc. 1821/18.3T8PRD-B.P1.S1) e de 29.10.2019 (Proc. 738/03.0TBSTR.E1.S3).

[2] Cfr. Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Coimbra, Almedina, 2020 (6.ª edição), p. 229.

[3] Cfr. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 19.02.2015 (Proc. 3175/07.4TBVCT-B.G1-A.S1) e de 21.02.2019 (Proc. 27417/16.6T8LSB-A.L1.S2).

[4] Em termos semelhantes leia-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 3.11.2020 (Proc. 1560/13.1TBVRL-N.G1.S1): “Não admite recurso de revista o acórdão da Relação que confirme o despacho do relator que rejeite o recurso de apelação, por ilegitimidade do apelante, terceiro num procedimento cautelar”.
[5] Este último relatado pela presente Relatora.
[6] Veja-se ainda Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, cit., p. 401 (nota 576), em que, depois do excerto já mencionado na decisão singular, se reitera: “do despacho do relator de não admissão do recurso de apelação, ao abrigo do art. 643.º, cabe reclamação para a conferência, sendo que o acórdão que for proferido apenas admite recurso nos termos do artigo 671.º, n.º 2, e 629.º, n.º 2”.
[7] Cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 431/02, de 22.10.2002.[8] Cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 100/99, de 10.02.1999, cuja doutrina foi confirmada, mais recentemente, por exemplo, pelo Acórdão n.º 657/2013, de 8.10.2013.