Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
3101/13.1TTLSB.L1.S1
Nº Convencional: 4ª. SECÇÃO
Relator: RIBEIRO CARDOSO
Descritores: ÂMBITO DO RECURSO
AMPLIAÇÃO
ADMINISTRADOR-DELEGADO
TRABALHADOR SUBORDINADO
INFRAÇÃO DISCIPLINAR
JUSTA CAUSA DE DESPEDIMENTO
Data do Acordão: 06/30/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Área Temática:
DIREITO DO TRABALHO - CONTRATO DE TRABALHO / CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO / DESPEDIMENTO POR INICIATIVA DO EMPREGADOR ( POR FACTO IMPUTÁVEL AO TRABALHADOR ).
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / SENTENÇA ( EFEITOS DA SENTENÇA ) / RECURSOS / AMPLIAÇÃO DO ÂMBITO DO RECURSO.
Doutrina:
- Aníbal de Castro, Impugnação das Decisões Judiciais, 2.ª ed., 111.
- António Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 17.ª edição, 514, 519.
- Maria do Rosário Palma Ramalho, Tratado de Direito do Trabalho, Parte II, Situações Laborais Individuais, 5.ª edição, 954, 957 e 958.
- Pedro Romano Martinez, Da Cessação do Contrato, 2015, 3.ª edição, 427 e 428.
- Rodrigues Bastos, Notas ao Código de Processo Civil, vol. III, 247.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 619.º, N.º 1, 635.º, N.º 3, 636.º, N.º1, 639.º, N.º 1.
CÓDIGO DO TRABALHO (CT) / 2009: - ARTIGO 351.º, N.º 1.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGO 32.º, N.º 1, 205.º, N.º 1.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-DE 05/04/1989, IN B.M.J. 386/446, DE 23/03/1990, IN A.J., 7.º/90, 20, DE 12/12/1995, IN C.J., 1995, III/156, DE 18/06/1996, C.J., 1996, II/143, DE 31/01/1991, IN B.M.J. 403.º/382.
-DE 08/06/2010, DE 14/09/2005, DE 07/06/2005, DE 20/01/2005, DE 16/11/2006, PROC. N.º 06B3346, DE 09/12/2010 (4ª SECÇÃO), PROC. N.º 4158/05.4TTLSB.L1.S1.
-DE 18/12/2008, PROC. N.º 08S1905.
-DE 05/01/2012, PROC. N.º 3937/04.4TTLSB.L1.S1.
-DE 28/01/2016, PROC. N.º 1715/12.6TTPRT.P1.S1.

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ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA:

- DE 07/03/1985, IN B.M.J., 347.º/477.

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ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:

-N.º 606/2007 E N.º 243/2013, EM WWW.TRIBUNALCONSTITUCIONAL.PT .
Sumário :
1 - Tendo a sentença conhecido dos diversos fundamentos invocados pelo autor e decaindo este relativamente a alguns deles, mas tendo obtido ganho de causa por procedência dos demais, não pode suscitar no recurso de revista a apreciação dos fundamentos em que decaiu, se não tiver requerido a ampliação do âmbito do recurso, para conhecimento dos mesmos, na apelação interposta pelas rés.

2 - A infração disciplinar não pressupõe, necessariamente, a prática de atos, podendo decorrer da omissão de atos destinados a evitar a prática, por outros, de comportamentos infratores, especialmente quando se é detentor de cargo de direção, como era o do autor

3 - Na medida em que as condutas omissivas protagonizadas pelo autor são claramente violadoras dos deveres de zelo e diligência que sobre si impendiam e não podiam deixar de conduzir à quebra de confiança por parte das respetivas entidades empregadoras, e à dúvida fundada acerca da idoneidade do autor e sobre a sua futura conduta no cumprimento do vínculo laboral, configura-se justa causa para o despedimento operado.

Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça ([1])

1 - RELATÓRIO

AA intentou a presente ação para impugnação da regularidade e licitude do despedimento, apresentando o formulário a que aludem os artigos 98º-C e 98º-D do CPT, opondo-se ao despedimento que lhe foi promovido por BB, S.A. e CC, pedindo que seja declarada a ilicitude ou irregularidade do mesmo com as consequências legais.

Teve lugar a audiência de partes sem que tenha sido obtida a conciliação.

As Rés apresentaram articulado de motivação, relatando o percurso do processo disciplinar movido ao Autor e reafirmando o alegado na nota de culpa e na decisão de despedimento, concluindo que o comportamento do Autor viola os deveres laborais a que aludem as alíneas c), e), f) e h) do número 1 do artigo 128º do Código do Trabalho, integrando justa causa de despedimento nos termos do artigo 351º nº 1 e nº 2 alíneas a), d) e e) do Código do Trabalho, pedindo que seja declarada a licitude do despedimento mantendo-se o mesmo nos seus exatos termos.

O Autor contestou por exceção e por impugnação.

Por exceção invocou:

- O poder disciplinar foi exercido por sociedade diversa, entendendo que quem o devia ter desencadeado era a BB, S.A., a DD, S.L, a EE e a FF, e não a BB como sucedeu;

- A violação do disposto no artigo 354º do CT;

- A prescrição do procedimento disciplinar;

- A caducidade do procedimento disciplinar;

- A violação do princípio da audiência do trabalhador;

- A suspensão do contrato de trabalho do Autor.

Por impugnação, o Autor pôs em causa a versão apresentada pelas Rés que considerou conter factos falsos, malversados, incompletos, juízos conclusivos e meras abstrações e afirmando não ter violado quaisquer deveres previstos no artigo 128º do CT, nem quaisquer outras normas legais ou convencionais que regulamentam a sua relação laboral e invocando que, mesmo que assim não fosse, a sanção aplicada viola o princípio da proporcionalidade e adequação da aplicação das sanções disciplinares.

Acrescentou que gostava de trabalhar para as Rés e que não tem outra fonte de rendimento, sendo que, por virtude do seu despedimento, passou a viver angustiado, triste e deprimido, bem como deixou de poder manter o nível de vida a que estava habituado, devido à redução dos seus rendimentos.

Deduziu reconvenção alegando, em síntese, que vinha auferindo a título de retribuição mensal a quantia de € 8.500,00, tinha direito ao uso e fruição, durante 24 horas por dia, de veículo, marca BMW, ao qual atribuía a utilidade económica de € 750,00 mensais, sendo que não necessitava de tal veículo para o exercício das suas funções nas Rés ou nas sociedades de direito privado espanhol, não sendo instrumento de trabalho, tinha direito a telemóvel para utilização pessoal e profissional, sem limite de plafond a que atribuía o valor mensal de € 100,00, tinha direito a combustível no valor de € 400,00 mensais ou € 4.800,00 anuais, para uso pessoal, através do cartão Galp Frota, tinha acesso a Internet com banda larga da TMN, para uso pessoal e profissional, no valor mensal de € 50,00, tinha seguro de saúde Multicare para si, cônjuge e filho, no valor de € 280,00 mensais.

Concluindo no sentido de que o despedimento foi destituído de fundamento legal e, nessa medida ilícito, pediu que a ação e a reconvenção sejam julgadas procedentes e que, em consequência:

A) o despedimento seja declarado ilícito e sem justa causa;

B) sejam as Rés ou cada uma das Rés condenadas a pagar-lhe o total das remunerações que deveria ter auferido, desde a data do despedimento, até à data da sentença, calculadas nos termos do artigo 390º nº 2, al. b) do CT;

C) sejam as Rés ou cada uma das Rés condenadas a reintegrá-lo na 2ª Ré, sem prejuízo da sua antiguidade, salário, categoria profissional e demais contrapartidas ou benefícios;

D) sejam as Rés condenadas a pagar-lhe, a título de indemnização por danos não patrimoniais a quantia de € 30.000,00;

E) sejam as Rés condenadas no pagamento de juros de mora vencidos e vincendos, sobre todas as quantias peticionadas, vencidas e vincendas e também sobre as que resultarem, eventualmente, da aplicação do disposto no artigo 74º do CPT, desde a data da citação, até integral pagamento;

F) sejam as Rés condenadas no pagamento, nos termos do disposto no artigo 829º-A do Código Civil, de uma sanção pecuniária compulsória em montante nunca inferior a € 300,00 por cada dia de incumprimento da decisão judicial que vier a ser proferida até integral e total cumprimento desta.

As Rés responderam pugnando pela inexistência das invocadas exceções, pela inexistência dos pressupostos da responsabilidade civil e pela improcedência da reconvenção. Deduziram também oposição à reintegração invocando que se mostram verificados os requisitos previstos no artigo 392º nº 1 do CT, atenta a detenção pelo Autor de um cargo de direção e o facto do seu regresso ser gravemente prejudicial e perturbador do normal funcionamento da Ré, na medida em que esta deixou de confiar nele, o que inviabiliza o exercício do cargo que desempenhava.

Respondeu o Autor invocando que a oposição à reintegração é extemporânea pois as Rés deveriam ter invocado os fundamentos para a mesma no articulado de motivação do despedimento, além de que não estão preenchidos os pressupostos para que aquela não seja decretada.       

Realizada a audiência de julgamento foi proferida a sentença na qual se julgaram improcedentes as exceções invocadas pelo A. e foi proferida a seguinte decisão:

«Nestes termos, o Tribunal julga a ação procedente e a reconvenção parcialmente procedente e, consequentemente:

A) declara ilícito o despedimento efectuado pelas empregadoras BB, S.A. e CC, S.A., condenando as mesmas:

1) a reintegrar o trabalhador AA, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, fixando-se em € 300,00 (trezentos euros), a quantia diária de sanção pecuniária compulsória devida pelas empregadoras, por cada dia de atraso no cumprimento desta obrigação decidida pelo Tribunal;

2) a pagar ao mesmo trabalhador todas as retribuições vencidas desde a data do despedimento e que se vençam até ao trânsito em julgado desta decisão (nelas se incluindo o valor mensal correspondente à atribuição de viatura automóvel e de telemóvel, a liquidar em execução de sentença, o valor mensal de € 50,00 correspondente à internet e de € 280,00 pelos seguros de saúde), deduzindo-se ao montante obtido os valores referidos no artigo 390.º, n.º 2 do CPT e as quantias auferidas pelo trabalhador a título de subsídio de desemprego;

3) a pagar ao trabalhador os juros de mora vencidos e vincendos sobre as quantias referidas em 2), desde a citação até integral pagamento, à taxa legal prevista para os juros civis;

B) absolvendo as empregadoras quanto ao demais peticionado.

Custas pelas empregadoras, e pelo trabalhador na proporção do decaimento.

Valor: 68.500,01 € [(30.000,01 da reintegração + € 38.500,00 da reconvenção) - artigo 98.º-P do CPT].

Registe e notifique.

Transitada comunique a presente sentença ao ISS».

           

Inconformadas com o decisório na parte em que julgou a ação procedente e a reconvenção parcialmente procedente, as Rés apelaram, tendo sido proferida a seguinte deliberação:

«Em face do exposto, acordam os Juízes deste Tribunal e Secção em julgar procedente o recurso de apelação, em revogar a sentença recorrida e, em consequência, julgam improcedente a acção e declaram lícito o despedimento movido pelas Rés ao Autor AA, absolvendo as Rés dos pedidos.

Custas pelo Autor».

Desta deliberação recorre o A. de revista para este Supremo Tribunal, impetrando a revogação do acórdão recorrido.

As RR contra-alegaram invocando, por um lado, a inadmissibilidade do recurso relativamente às questões referidas nas conclusões 1 a 23, pelo facto da decisão que sobre elas recaiu proferida na primeira instância, ter transitado em julgado uma vez que o A. não requereu a ampliação do recurso de apelação, e por outro, a improcedência das demais questões, tendo ainda requerido que este tribunal, em caso de procedência do recurso, conheça das questões que colocara no recurso de apelação e que a Relação considerou prejudicadas pela deliberação tomada quanto à questão da ilicitude do despedimento.

Juntaram parecer jurídico.

Cumprido o disposto no art. 87º, nº 3 do CPT, o Exmº Procurador-Geral-‑Adjunto emitiu douto parecer no sentido da negação da revista e consequente confirmação do acórdão recorrido.

Notificadas as partes, apenas o recorrente se pronunciou mantendo a posição assumida nas suas alegações.

Prevenindo a possibilidade do não conhecimento das questões suscitadas nas conclusões 1 a 23, foi dado cumprimento ao contraditório, tendo as RR reiterado o seu entendimento de que não podia este tribunal conhecer de tais questões.

O A. pronunciou-se no sentido de que este tribunal podia e devia conhecer das mesmas pois só assim fica salvaguardado o direito ao duplo grau de jurisdição.

Formulou o recorrente as seguintes conclusões, as quais, como se sabe, delimitam o objeto do recurso ([2]) e, consequentemente, o âmbito do conhecimento deste tribunal:

”1- Ambas as notas de culpa e posterior decisão de despedimento, fazem referência e imputam alegadas condutas do A., na qualidade de titular ou membro de órgão estatutário de sociedade comercial ou seja, administrador, em concreto de duas sociedades de direito espanhol, não imputando ao A. qualquer conduta, comissiva ou omissa, enquanto trabalhador das sociedades de direito privado português titular do poder disciplinar.

2- As RR., as verdadeiras e autênticas entidades empregadoras do A., deduziram contra o mesmo, duas notas de culpa e uma decisão de despedimento, pelo A. ter incumprido com o normativo da sociedade denominada por "FF", no âmbito do exercício da sua actividade como Administrador em duas sociedades de direito privado espanhol, em território espanhol e por alegadas condutas omissivas do A;

3- A alocação do poder disciplinar e respectiva delimitação assume particular importância, pois é mediante tal delimitação, derivada da sujeição do poder de autoridade e direcção, que podemos aquilatar das obrigações e deveres recíprocos da partes no âmbito da relação jurídica de direito privado de natureza laboral e da extensão do poder disciplinar e dos seus limites e, bem assim, sujeição ao mesmo por parte do Trabalhador e suas respectivas obrigações;

4- Todos os factos objecto de imputação ao A foram alegadamente praticados no âmbito da esfera jurídica das sociedades de direito privado espanhol denominadas por "DD, S.L." e "EE" e não no âmbito da esfera jurídica das RR. no âmbito do mandato que foi conferido ao A.

5- Tais alegadas e descritas condutas foram sempre praticadas na qualidade de Administrador das referidas sociedades e nunca na qualidade de trabalhador das RR.

6- Nenhuma imputação, reflexo ou consequência as alegadas condutas do A para as sociedade portuguesas que se arrogaram titulares do poder disciplinar sobre o A foram alegadas e nenhuma conduta ou imputação dirigida ao A foi por este praticada no âmbito das respectivas entidades empregadoras, afinal, aquelas que proferiram o despedimento do A.

7- O normativo que as RR. invocam que o A violou, reporta-se à "FF", sociedade com quem o A nunca celebrou qualquer contrato de trabalho e com a qual não mantém e não mantinha qualquer relação jurídica, não lhe sendo aplicável;

8- Entende-se e sempre salvo o devido respeito por posição contrária, que no âmbito da relação contratual existente entre o A. e as RR., o A. não estava obrigado a obedecer ao normativo de uma terceira sociedade, a "FF", no âmbito do exercício da actividade de Administrador, para duas sociedade de direito privado espanhol que somente exerciam actividade em Espanha, país onde o A. se encontrava a prestar a sua actividade.

9- Nunca tais sociedades estrangeiras e as RR. incorporaram ou receberam o normativo da "FF", pelo que nunca o A. poderia ou estaria obrigado a obedecer-lhe.

10- A A. era Administrador das sociedades de direito espanhol, situadas em território espanhol e sem representação em Portugal.

11- O A. entende que a sua situação contratual em concreto, não se subsume à previsão do art. 6º e 7º do Código do Trabalho, porquanto, desde logo, o A exerceu a sua actividade na qualidade de administrador das sociedades de direito privado espanhol.

12- Nunca o procedimento disciplinar podia ser considerado como tendo sido desencadeado de modo regular, pela manifesta falta de legitimidade, por um lado, da sociedade denominada por "BB" e, por outro lado, por virtude de as RR. estarem desacompanhadas das sociedades "DD, S.L.", "EE" e "FF", para quem o A exercia um ... mandato!

13- O contrato de trabalho do A. encontrava-se suspenso a partir do momento em que o A. passou a ser administrador das sociedades de direito privado espanhol, sendo naquele âmbito que a responsabilidade contratual do A deveria ter sido apurada e se fosse esse o caso.

14- Pela forma de nomeação, natureza, funções, período, renovação, retribuição e respectivo valor e destituição das referidas funções, torna-se claro que o A. não estava a exercer as funções ao abrigo de um contrato de trabalho celebrado com as RR., mas sim nos termos do mandato que lhe foi conferido pela FF, o que resulta inequívoco do acervo fáctico dado como provado.

15- É manifesto que as RR. procederam à suspensão preventiva do A. de modo totalmente abusivo, em violação do disposto no art. 334° do Código Civil, em manifesto abuso de direito e violação do princípio da boa-fé que imporia, sempre e em todo o caso, o envio de uma justificação, fundamentação ou motivo justificativo por parte do detentor do poder disciplinar que permitisse ao A. compreender os motivos de tão dilatado prazo de suspensão preventiva e, caso assim entendesse, reagir legalmente contra as RR. se tal motivo de tão prolongada suspensão não se lhe afigurasse legal.

16- Muito embora a lei não estabeleça nenhuma cominação para a ultrapassagem daquele prazo, a verdade é que a estipulação de prazo de 30 dias para a suspensão preventiva terá de ser observada pela Empregadora, sendo a sua ultrapassagem, injustificada e em quatro meses, tempo suficiente para ser considerado abuso de direito de suspender preventivamente um trabalhador.

17- Com efeito, estipula o art. 382º, nº 1 do C.T., que o despedimento é ilícito se não tiver sido observado o prazo previsto no art. 329º, nº 1 do C.T ..

18- Matéria imputada ao Trabalhador ora A. e supra aludida, está totalmente prescrita, não podendo ser exercido o poder disciplinar quanto a tal matéria, prescrição que, para todos os devidos efeitos legais, aqui se deixa novamente arguida, pelo que nunca tais condutas poderiam fundamentar a decisão de despedimento do A.

19- O conhecimento das alegadas infracções disciplinares pelas RR. ocorreu, pelo menos, na data da conclusão da auditoria referida nos autos ou seja, a 07 de Maio de 2012 ou, na pior das hipóteses, o que não se concede e somente se coloca para efeitos de raciocínio jurídico, na data da instauração do procedimento de inquérito, a 20 de Setembro de 2012.

20- Ora, tal significa, conforme já foi atrás referido, que entre aquelas datas e a recepção das notas de culpa pelo A., decorreram ou mais de cinco meses ou mais de nove meses, dependendo se inicie a contagem daquele prazo em Maio ou em Setembro de 2012.

21- Na sequência da conclusão da auditoria, foram despedidos dois funcionários que exerciam actividade nas sociedades espanholas, os quais tiveram procedimentos com vista à cessação do seu contrato de trabalho, relacionados com a mesma factualidade.

22- Resulta que entre aquelas datas e o início do procedimento disciplinar ou o início do processo prévio de inquérito anterior à remessa da nota de culpa e a remessa da nota de culpa, decorreram mais de 60 (sessenta) dias.

23- Nos termos e para os efeitos do disposto no nº 2, do art. 329º do C.T., o procedimento disciplinar deve ser exercido nos 60 (sessenta) dias subsequentes àquele em que o Empregador, como é o caso, teve conhecimento da alegada infracção disciplinar.

24- O Tribunal a quo fundamenta a sua decisão na conclusão de que o A., enquanto responsável pela gestão local do negócio de comercialização de Gás e Power na região de Madrid, não cuidou de observar a Norma Regulamentar de Compras, de aplicação obrigatória e não diligenciou pela verificação da regularidade dos pagamentos que eram efectuados às Task Force e outras sociedades que desenvolviam serviços para as sociedades NN.

25- Ora, sempre salvo o devido respeito pela posição expressa no acórdão impugnado, a verdade é que em momento algum se refere uma conduta concreta, um acto ou uma omissão da responsabilidade do A. de onde se possa extrair que o A. não observou a norma regulamentar de comprar.

26- E também não se refere a que título ou que parte da norma, em concreto, foi violada pelo A. bem como as circunstâncias de modo, tempo e lugar da sua conduta, comissiva ou omissa, de onde se possa extrair tal conclusão.

27- A decisão de despedimento também nunca identifica qual o incumprimento do A.

28- Note-se que não existiu por parte do A qualquer acto de compra ou outro, de sua responsabilidade, que levasse ao incumprimento da norma de compras.

29- Foi dada como provada matéria factual suficiente para que se possa concluir que o A, quando teve conhecimento das alegadas irregularidades, adoptou desde logo condutas e decisões no sentido de regularizar todas as situações, conforme se verá adiante.

30- Também não se vislumbra e sempre salvo o devido respeito por opinião diversa, que o A não tenha diligenciado pela verificação da regularidade dos elevados pagamentos que eram efectuados às task forces.

31- Em primeiro lugar, não se refere ou concretiza, mais uma vez, que pagamentos eram esses que foram efectuados e qual o montante.

32- Também se omite qual a alegada irregularidade, em concreto, dos pagamentos em causa, limitando-se a decisão impugnada a concluir que a norma regulamentar de compras foi incumprida.

33- Importava saber quem incumpriu em primeira linha tal norma, em que parte e se o A. estava em condições, na sua qualidade de Administrador das sociedades de direito espanhol, de saber e ter conhecimento de tal facto e se, quando teve conhecimento dos factos, se agiu ou não e como agiu.

34- A decisão de despedimento desde logo nenhuma indicação nos dava sobre tais questões como, aliás, em boa perspectiva, aludiu a decisão proferida pelo Tribunal de 1ª Instância.

35- Face à factualidade dada como provada, a sanção de despedimento do A., surge desproporcional e desadequada em violação do disposto no art. do C.T. 330º, nº 1 do CT;

36- A decisão recorrida violou, multiplamente, nos termos supra alegados, as normas dos arts. 6º, 7º, 329º, nº 5, 353º, nº 6 e 7, 354º, 329º, nº 1, 382º, nº 1, 351º, nº 1 e 2, alíneas a), d) e e), 330º nº 1, 128º, nº 1, todas do Código do Trabalho e art. 334º do Código Civil.”

2 – ENQUADRAMENTO JURÍDICO

Os presentes autos respeitam a ação de processo comum e foram instaurados em 19 de agosto de 2013.

O acórdão recorrido foi proferido em 18 de novembro de 2015.

O contrato de trabalho teve início em 15 de maio de 1991 tendo o A. sido despedido em 31 de julho de 2013. Os factos imputados ao A. ocorreram no período de 18 de março de 2010 a 24 de setembro de 2012.

Nessa medida, é aplicável:

- O Código de Processo Civil na versão conferida pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho;

- O Código de Processo do Trabalho (CPT) aprovado pelo Decreto-Lei n.º 480/99, de 9 de novembro, e alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 323/2001, de 17 de dezembro, 38/2003, de 8 de março, 295/2009, de 13 de outubro, que o republicou e Lei n.º 63/2013, de 27 de agosto;

- O Código do Trabalho aprovado pela Lei 7/2009 de 12 de fevereiro.

3 - ÂMBITO DO RECURSO – DELIMITAÇÃO

Face às conclusões formuladas, são as seguintes as questões submetidas à nossa apreciação:

1 – Ilegitimidade da BB para instaurar procedimento disciplinar (conclusões 1 a 14);

2 – Ilegitimidade das RR para instaurarem procedimento disciplinar por «estarem desacompanhadas das sociedades "DD, S.L.", "EE" e "FF"» (conclusões 1 a 14);

3 – Invalidade da suspensão preventiva, por abuso de direito e consequente ilicitude do despedimento (conclusões 15 a 17);

4 – Prescrição dos factos imputados ao A. (conclusão 18);

5 – Caducidade do procedimento disciplinar (conclusões 19 a 23);

6 – Inexistência de justa causa de despedimento (conclusões 24 a 36);

7 – Oposição à reintegração, caso se conclua pela inexistência de justa causa de despedimento.

4 - QUESTÃO PRÉVIA

Por despacho do relator foram as partes notificadas para se pronunciarem quanto à eventualidade de não conhecimento do recurso relativamente às questões suscitadas nas conclusões 1 a 23 e aqui sintetizadas nos números 1 a 5 do item que antecede.

Como foi referido no aludido despacho, estas questões, integradoras de matéria de exceção, «haviam sido já suscitadas pelo A na sua contestação e foram decididas na sentença (ponto I da fundamentação de direito, alíneas A a D) (A – “Da falta de legitimidade da empregadora BB para o exercício do poder disciplinar… Entendemos assim que inexiste irregularidade/nulidade do procedimento disciplinar conduzido com este fundamento”; B –“Da suspensão abusiva… Entendemos assim que inexiste irregularidade nulidade do procedimento disciplinar conduzido com este fundamento”; C – “Da prescrição do procedimento disciplinar… entende-se que não ocorreu a prescrição do processo disciplinar, improcedendo esta exceção invocada; D – “Da caducidade do procedimento disciplinar… não se verifica que tenha ocorrido o prazo de caducidade estabelecido no normativo aludido, com o que se julga improcedente tal exceção”.

Verifica-se, assim, que a decisão das invocadas exceções foi desfavorável ao A., pese embora a ação tenha sido julgada procedente.

Estabelece o art. 636º do CPC, sob a epígrafe “ampliação do âmbito do recurso a requerimento do recorrido” que, “no caso de pluralidade de fundamentos da ação ou da defesa, o tribunal de recurso conhece do fundamento em que a parte vencedora decaiu, desde que esta o requeira, mesmo a título subsidiário, na respetiva alegação, prevenindo a necessidade da sua apreciação.”

Constata-se, porém, que nas contra-alegações que produziu na apelação, o A. não requereu a ampliação do âmbito do recurso para conhecimento pela Relação das aludidas questões em que decaiu.

Foi, aliás, bem perentório na sua conformação com o decidido.

Consignou: “Na opinião do A. e salvo o devido respeito por opinião diversa, tal decisão não merece qualquer reparo, tendo o Tribunal a quo efectuado um julgamento adequado da prova produzida em audiência de discussão e julgamento e, bem assim, uma correcta interpretação e aplicação do direito vigente e aplicável ao caso sub judice. Assim, entendem o A., salvo o devido respeito por opinião diversa, que não assiste razão, de facto ou de direito, às recorrentes, devendo a decisão recorrida manter-se nos seus precisos termos”. E mais adiante “Em conclusão, o Tribunal a quo decidiu de modo correcto e adequado ao caso sub judice, pelo que entende o A., salvo o devido respeito por opinião diversa, que a decisão não merece qualquer reparo, devendo manter-se na íntegra.” E termina com o seguinte petitório: “Termos em que, e nos melhores em Direito que V. Exas. doutamente suprirão, requer-se que o recurso apresentando pelas RR. seja julgado improcedente, mantendo-se a decisão recorrida, só assim se fazendo a V. costumada JUSTIÇA!”

Assim, porque se conformou com a decisão que recaiu sobre as aludidas exceções, a mesma transitou em julgado.

Entendo o A. no requerimento apresentado ao abrigo do direito ao contraditório, que as questões decididas na sentença não são cindíveis, pelo que não se impunha que requeresse a ampliação do âmbito do recurso de apelação.

Mas não tem razão.

Estamos perante diversas questões colocadas ao tribunal e a que este respondeu de forma diversa, sendo nas sobreditas em sentido desfavorável ao A., mas em sentido favorável no que tange ao mérito da causa.

A ampliação do âmbito do recurso a requerimento do recorrido visa, precisamente, estas situações, tal como flui, claramente, do transcrito n.º 1 do artigo 636.º do Código de Processo Civil.

Acresce que, ao repristinar na revista as exceções referidas, está a colocar a este tribunal questões novas que não foram conhecidas pelo tribunal recorrido, sabido como é que o recurso se destina a reapreciar as questões decididas pelo tribunal recorrido (no caso a Relação) e não a decidir questões novas.

E, efetivamente, assim é, motivo pelo qual não pode este tribunal conhecer das aludidas questões.

Tem, aliás, assim sido entendido e decidido por este Supremo Tribunal, nomeadamente nos seus acórdãos indicados pelas recorridas:

Acórdão de 08/06/2010 (Cons. João Bernardo): “A ré que, não obstante a improcedência da ação, também viu naufragar a exceção da caducidade do direito do autor por si invocada, pode/deve, em face da apelação do autor, requerer a ampliação do recurso em ordem a evitar o trânsito em julgado de tal parte da decisão que a prejudicou, sob pena de a mesma se cristalizar (art. 684.º, n.º 4, do CPC).”

Acórdão de 14/09/2005 (Cons. Salvador da Costa): “Invocando o impugnante uma pluralidade de fundamentos, julgados improcedentes, exceto um deles, na fase de condensação do processo, com base no qual teve ganho de causa, a reapreciação da referida decisão de improcedência no recurso interposto pela parte contrária depende do requerimento do primeiro da sua ampliação.

Não tendo o impugnante requerido a ampliação do recurso de apelação, motivo pelo qual a Relação, sem omitir pronúncia, não conheceu do mérito daqueles fundamentos, não pode suscitar a sua apreciação no recurso de revista nem a remessa do processo ao tribunal da 1ª instância para nova apreciação e julgamento.

Acórdão de 07/06/2005 (Cons. Lopes Pinto): “Apenas tem legitimidade para recorrer a parte principal que tenha ficado vencida; se a parte dispositiva da sentença contiver decisões distintas é lícito ao recorrente restringir o recurso a qualquer delas; no caso de pluralidade de fundamentos da ação ou da defesa, o tribunal conhecerá do fundamento em que a parte vencedora decaiu, desde que esta o requeira, mesmo a título subsidiário, na respetiva alegação, prevenindo a necessidade da sua apreciação.”

Acórdão de 20/01/2005 (Cons. Salvador da Costa): “Absolvido o réu no tribunal da instância por fundamento diverso da nulidade do contrato de arrendamento rural que invocara na ação, paralelamente com a declaração judicial de que ele era válido, como não ampliou o recurso de apelação interposto pelos autores com vista ao conhecimento pela Relação daquele vício, motivo porque ela se não pronunciou sobre ele, não pode o primeiro, no recurso de revista, em razão do caso julgado, suscitar a sua reapreciação”.

Vejam-se ainda os seguintes arestos deste mesmo tribunal:

Acórdão de 16/11/2006, proc. 06B3346 (Cons. Oliveira Barros): “I - Não sendo o Supremo Tribunal de Justiça uma 3ª instância, mas sim um tribunal de revista, com conhecimento limitado à matéria de direito (art.26º LOFTJ - Lei nº3/99, de 13/1), resulta flagrante a inoportunidade, em recurso de revista, da ampliação do objecto do recurso ao abrigo do art.684º-A, nº 2, CPC, com base em prova testemunhal a que se aplica o disposto nos arts.396º C.Civ. e 655º, nº1º, CPC.

II - Essa inoportunidade revela-se ainda mais clara quando notado poder essa ampliação ter sido requerida na instância a quo e de tal não ter a recorrida cuidado então - sendo bem sabido que, destinados os recursos, por sua natureza e função, como decorre do nº1º do art.676º CPC, à revisão do decidido no tribunal recorrido (revisio priori instantiae), já não será, nesse caso, mais tarde tempo de lançar mão dessa faculdade.”

Acórdão de 09/12/2010 (4ª Secção) (Cons. Sousa Grandão), proc. 4158/05.4TTLSB.L1.S1: “II - Tendo sido afirmado na sentença de 1.ª instância a ilicitude do despedimento, sendo que esse segmento decisório apenas desfavorecia a R., a mesma, prevenindo o eventual êxito recursório da A., deveria ter ampliado o objecto do recurso nas suas contra-alegações, por forma a que, naquela eventualidade, a Relação pudesse reapreciar a legalidade do despedimento; não o tendo feito, tal omissão consequencia que não poderá ser mais discutida essa questão, visto o trânsito em julgado que sobre ela se formou desde a sentença inicial.”

Acórdão de 18/12/2008 (Cons. Sousa Grandão), proc. 08S1905: “IV - Decidindo a sentença de 1.ª instância pela inexistência da caducidade do procedimento disciplinar invocada pelo autor, mas vindo este a obter ganho de causa na parte nuclear da sua pretensão - reconhecimento da ilicitude do despedimento de que foi alvo -, cabia-‑lhe peticionar a ampliação do objecto do recurso nos termos do art. 684.º-A do CPC, em face da apelação da ré, sob pena de transitarem em julgado os fundamentos em que houvesse decaído (entre os quais, justamente, a caducidade do procedimento disciplinar).”

Invoca ainda o recorrente que só conhecendo este tribunal das aludidas questões se assegurará o direito ao duplo grau de jurisdição.

Admitindo, como hipótese, que o invocado direito exista, competirá ao interessado exercê-lo com recurso aos meios processuais adequados, que no caso seria a ampliação do recurso de apelação e não a suscitação da questão apenas na revista.

Mas o invocado direito não está constitucionalmente garantido, exceto na jurisdição criminal.

Como é sabido e constitui jurisprudência constante quer do Supremo Tribunal de Justiça quer do Tribunal Constitucional, não existe no nosso edifício jurídico qualquer norma que imponha o duplo grau de jurisdição em processo civil.

A Constituição da República Portuguesa não o impõe (com exceção do direito ao recurso no âmbito do processo penal - art. 32º, nº 1 da CRP) ([3]), cabendo ao legislador ordinário definir os casos em que o recurso é admissível.

Pode ler-se a este propósito no Ac. do TC nº 243/2013 de 10.05.2013: «Como o Tribunal Constitucional afirmou no seu Acórdão n.º 287/90, embora a garantia da via judiciária do art. 20.º, n.º 1, da Constituição se traduza prima facie no direito de recurso a um tribunal para obter dele uma decisão sobre a pretensão perante o mesmo deduzida, deve incluir-se ainda na mesma garantia a proteção contra atos jurisdicionais. Isto é, o direito de ação incorpora no seu âmbito o próprio direito de defesa contra atos jurisdicionais, o qual, obviamente, só pode ser exercido mediante o recurso para (outros) tribunais: “o direito (subjetivo) de recorrer visa assegurar aos particulares a possibilidade de impugnarem atos jurisdicionais e ainda tornar mais provável, em relação às matérias com maior dignidade, a emissão da decisão justa, dada a existência de mais do que uma instância”.

No mesmo aresto, todavia, este Tribunal também advertiu que daquela proposição não decorre a existência de um ilimitado direito de recurso, extensivo a todas as matérias, o que implicaria a inconstitucionalidade do próprio estabelecimento de alçadas.

O Tribunal considerou, então, que, com ressalva da matéria penal, atendendo ao que dispõe o n.º 1 do art. 32.º da Constituição, tal direito não é um direito absoluto — irrestringível. Diferentemente, o que se pode retirar, inequivocamente, das disposições conjugadas dos arts. 20.º e [atual] 210.º da Constituição, em matérias diversas da penal, é que existe um genérico direito de recurso dos atos jurisdicionais, cujo preciso conteúdo pode ser traçado, pelo legislador ordinário, com maior ou menor amplitude. Ao legislador ordinário estará vedado, exclusivamente, abolir o sistema de recursos in toto ou afetá-lo substancialmente.

Esta orientação foi posteriormente reafirmada por diversas vezes (cfr., entre outros, os Acórdãos n.ºs 210/92, 346/92, 403/94, 475/94, 95/95, 270/95, 336/95, 489/95, 715/96, 1124/96, 328/97, 234/98, 276/98, 638/98, 202/99, 373/99, 415/2001, 261/2002, 302/2005, 689/2005, 399/2007 e 500/2007).»

Pelo referido e sem necessidade de maiores considerações, não se conhece das questões suscitadas nas conclusões 1 a 23, nos termos sintetizados nos números 1 a 5 do item “ÂMBITO DO RECURSO – DELIMITAÇÃO”.

5 - FUNDAMENTAÇÃO

5.1 - OS FACTOS

Foram os seguintes os factos julgados provados pelas instâncias:

" 1) As empregadoras são sociedades comerciais sob a forma anónima que se integram no grupo económico FF;

2) A empregadora BB, S.A. é detida a 100% pela sociedade II, S.A.;

3) A empregadora BB, S.A. é a única detentora do capital social da empregadora GG, S.A., anteriormente designada HH, S.A.;

4) A II, S.A. detém 100% do capital social da sociedade JJ, S.A.;

5) A JJ, S.A. sucursal em Espanha é a sócia única da sociedade unipessoal de direito espanhol EE, S.L.;

6) A JJ sucursal em Espanha detém 100% do capital social da KK;

7) A sociedade KK, S.A. é a sociedade única de sociedade unipessoal de direito espanhol DD, SL;

8) Ambas as sociedades NN encontram-se integradas no grupo económico FF, desenvolvendo a respetiva actividade na área do negócio da distribuição do OO;

9) A empregadora BB, S.A. é a sociedade que dentro do grupo FF determina e supervisiona a estratégia do grupo no que diz respeito ao negócio do gás natural;

10) O autor foi trabalhador da empregadora CC, entre 15 de Maio de 1991 e 31 de Julho de 2013;

11) Com data de 18/03/2010, e no âmbito da relação laboral, foi aprovada a nomeação do trabalhador como Responsável pela gestão local do negócio de comercialização de PP na região de Madrid, com a nomeação como administrador delegado, constando, além do mais, na fundamentação da proposta de deliberação o seguinte:

«(…) Objectivos/Fundamentação

Após a concretização do negócio de aquisição de activos à OO, na região de Madrid, mais concretamente, na componente de comercialização de PP, justifica-se a nomeação de um responsável pela gestão local do negócio que assegure o acompanhamento e consolidação da actividade de comercialização no segmento residencial e comercial (…)» - cfr. doc. de fls. 36 junto ao procedimento prévio de inquérito e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

12) No grupo FF, foi publicada a ordem de serviço OS-009 2010, com o seguinte teor: «(…) Na sequência da aquisição das actividades de comercialização de OO em Madrid, a Comissão Executiva da FF, na sua reunião de 22 de Abril de 2010, deliberou proceder à nomeação do Engº AA para o exercício de funções de Administrador-Delegado das sociedades DD, SL e EE, S.L.» - cfr. doc. junto a fls. 35 do procedimento prévio de inquérito e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

13) Na sequência desta nomeação, o autor exerceu funções como administrador-‑delegado nas sociedades DD, SL e EE, SUR (NN);

14) Com data de 19 de Maio de 2011, foi aprovado novo mandato anual do trabalhador para as funções de Administrador-Delegado das sociedades NN – cfr. doc. junto a fls. 39 do processo correspondente ao procedimento prévio de inquérito e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

15) Com data de 24 de Setembro de 2012, foi deliberado em assembleia geral e extraordinária do sócio único da sociedade DD, SL, a destituição do trabalhador do cargo de administrador – cfr. doc. junto a fls. 584 do processo disciplinar e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos;

16) Em data não concretamente apurada do ano de 2012, mas anterior ao mês de Maio de 2012, na sequência de denúncias de eventuais fraudes nas relações entre as sociedades NN e os fornecedores, apresentada pelo Comité de Acompanhamento da Luta contra a corrupção de Espanha, foi determinada a realização de uma auditoria à área de vendas das sociedades NN;

17) Da realização da auditoria referida em 16), foi elaborada pela direcção interna da FF o respectivo relatório, com data de 07 de Maio de 2012, onde consta, além do mais, o seguinte:

“Dos 55.881 contratos vendidos pelas Task Force, apenas 37.235 são contratos válidos, correspondendo a uma percentagem de 67% dos contratos vendidos e relativamente a contratos não válidos ou inexistentes foram pagas comissões no valor de € 616.928€ o que corresponde a 30% das comissões pagas» (aditado pela Relação).

«(…) O relatório foi elaborado em resposta ao pedido da Administração da PP, de analisar a denúncia de possível fraude nas relações com os fornecedores da Área de Vendas da LL, apresentada pelo Comité de Acompanhamento da Luta contra a corrupção, de Espanha. O motivo da denúncia foi presenciar que o responsável de vendas da LL tinha na sua posse o carimbo da empresa do fornecedor QQ e autenticava, fazendo uso do carimbo, faturas da QQ.

Objetivo

O objectivo do presente trabalho foi analisar e aprofundar os indícios que originaram a denúncia e avaliar a veracidade dos fundamentos que a suportam. (…)

Do presente trabalho destacam-se as seguintes conclusões:

- Aprovação indevida de custos de comissões. Faturas de 640.583 € que correspondem a comissões sobre 19.277 contratos não válidos (de clientes sem consumo e/ou facturação), que representam 34% da amostra analisada;

Exemplos de contratos não válidos:

- Contratos duplicados pelos mesmos fornecedores;

- Contratos duplicados entre fornecedores distintos;

- Contratos fraudulentos (cliente alega não ter sido contactado pela FF – 1859 casos em 2012);

- Contratos com dados incorrectos.

- Existência de conflitos de interesses;

• O responsável pela empresa QQ é irmão de um colaborador da área de venda retalhista;

• O responsável pela validação da facturação afirmou ter na sua posse e utilizar o carimbo da QQ para autenticar faturas emitidas por esta (…)

- Incumprimento da NR – Compras e NO – Níveis de competência de autorização;

• Os fornecedores analisados foram adjudicados directamente pela área de negócios, sem envolver o departamento de compras e sem autorização formal do Administrador Executivo (AE);

• A facturação da QQ ascendeu a 900K€, sendo que a partir de 750 K€ tinha de ser aprovada pelo Administrador Executivo.

- Atuações da área de vendas em benefício dos fornecedores, em detrimento dos interesses da FF:

• Inexistência de pedido de pagamentos sobre comissões pagas não válidas (contratos revogados, fraudulentos, erróneos);

• pagamento adiantado de faturas, a título de «previsão de comissões» por serviços não prestados;

• Pagamento de preços de comissões bonificadas, por cumprimento de objectivos não validados correctamente

• Condição de pronto pagamento.

(…)

Recomendações

Tendo em conta a gravidade das situações analisadas, as recomendações apresentadas em seguida, são de implementação imediata, conforme acordado com a área do negócio.

1. Com base nos factos analisados e nas normas existentes, em concreto, o Código de Ética e Conduta, recomenda-se que se faça a atribuição das responsabilidades aos colaboradores da FF envolvidos.

Encarregar os serviços jurídicos de uma investigação, para determinar a existência de responsabilidades disciplinares e propor as medidas adequadas. (…) – cfr. documento que se encontra junto a fls. 4 a 20 do processo correspondente ao processo prévio de inquérito e 123 a 156 dos autos e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

18) Em consequência das recomendações constantes no relatório de auditoria referido em 17), procedeu-se a nova auditoria às sociedades NN, na sequência do qual foi elaborado, em Julho de 2012, novo relatório, do qual consta, além do mais, o seguinte;

“Apenas 50% do número de contratos vendidos cumpre com os critérios adequados de validação que justificam o pagamento de comissões sobre os mesmos” (aditado pela Relação)

“O sobrecusto de 1m € deve-se aos seguintes motivos:

(i) 13% dos contratos vendidos não se encontravam registados no sistema das sociedades NN;

(ii) 17% dos contratos vendidos foram faturados em duplicado;

(iii) 7% dos contratos vendidos não foram activados;

(iv) 4% dos contratos vendidos foram alvo de reclamações por parte de clientes, pelo facto de nunca os terem celebrado;

(v) 9% dos contratos vendidos não cumprem com diversos critérios de validação, tais como, que a duração do contrato seja superior a 3 meses ou que um contrato se serviços esteja sempre vinculado a um contrato de energia activo (aditado pela Relação).

«(...) O relatório foi elaborado em resposta ao pedido do Comité Executivo, de aprofundar a análise das operações da NN para identificar irregularidades e as inerentes responsabilidades. Uma vez que se trata de uma continuação do trabalho realizado para o Relatório «Auditoria NN – Fornecedores da Área de Vendas”, publicado no dia 9 de Maio, no presente relatório apresentam-se os resultados desta análise adicional. (…)

Objetivo

O objectivo do presente trabalho foi determinar o prejuízo económico devido à falta de controlo dos custos de expansão e identificar as irregularidades de outras áreas, em particular do Back Office e da Faturação.

Alcance

As operações da área de retalho durante o período Janeiro 2011-Junho 2012

(…)

Após a apresentação do relatório da auditoria interna em Maio de 2012 «Auditoria NN – Área de Vendas» a Comissão Executiva da FF solicitou uma análise adicional para a identificação de outras possíveis irregularidades noutras áreas do sector de retalho.

Desta análise adicional destacam-se as seguintes conclusões:

 Sobrecustos da área de vendas

(…)

 Irregularidades na adjudicação de fornecedores

(…)

 Faturação deficiente a clientes.

(…)

 Gestão deficiente do backoffice

(…)

Processo de facturação:

Foram identificadas deficiências no processo de facturação. Foi analisada a informação da facturação de clientes ativos durante 3 e até 12 meses no sistema e o resultado apurado foi o seguinte:

De 40.336 clientes de gás, nunca foi facturado consumo de 2.359 (6%) dos mesmos.

De 16.716 clientes de electricidade, nunca foi facturado o consumo de 3.130 (19%) dos mesmos.

A área de facturação, 8 meses após a implementação do SAP-ISU, ainda não dispõe de relatórios de exceções sobre clientes com consumos que não tenham sido facturados.

Tendo em conta o processo de facturação e as implicações que podem ter as deficiências mencionadas, a análise vai prosseguir noutro relatório com o objectivo de identificar os motivos que originam a falta de facturação e propor acções de melhoria.

Está actualmente a ser desenvolvido um projecto de estabilização, realizando alterações organizacionais e de processos, procurando regularizar, entre outras, as situações anteriormente descritas.

Gestão do back office

Da análise realizada identificaram-se deficiências na gestão do Back office. Em concreto:

O contrato com a MM, o fornecedor de back office, com 1,5 M€ incorridos entre 2011 e 2012 ainda não está assinado. (…)

Foram identificadas deficiências no controlo das faturas apresentadas pela MM.

(…)

Está actualmente a ser desenvolvido um projecto de estabilização, realizando alterações organizacionais e de processos, procurando regularizar, entre outras, as situações anteriormente descritas. (…)» - cfr. doc. junto a fls. 21-29 do processo correspondente ao procedimento prévio de inquérito e 157-173 dos autos e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais (alterado pela Relação)

19) Com data de 14/09/2012, foi pela empregadora BB, S.A., proferido «DESPACHO INTERNO» através do qual decidiu: «a abertura de um processo prévio de inquérito (…), em virtude de ter formulado a suspeita da existência de comportamentos irregulares praticados pelo trabalhador AA, enquanto Administrador Delegado das empresas do Grupo FF “DD, S.L.” e “EE, S.L.”, os quais se relacionam, entre outros, com (i) a existência de uma indevida aprovação de custos relativos a comissões, (ii) o incumprimento da norma interna “Compras y No” e (iii) a prevalência do interesse de fornecedores em detrimento das referidas sociedades no Grupo FF, comportamentos esses com consequências particularmente danosas designadamente decorrentes da aplicação de coimas pelas autoridades espanholas competentes.

(…)

A necessidade de abertura do presente processo de inquérito decorre e fundamenta-se na circunstância de, na presente data, a BB apenas conhecer de forma indiciária a prática desses factos, pelo que a instauração de um processo prévio de inquérito se revela objectivamente indispensável para o concreto apuramento dos mesmos, bem como as circunstâncias de modo, tempo e lugar em que as possíveis condutas ilícitas foram praticadas pelo trabalhador. (…)

Atenta a gravidade dos indícios já apurados, praticados noutras empresas do Grupo FF e aptos a determinar a quebra irreversível de confiança no trabalhador e por se entender que a presença deste se mostra inconveniente, determina-se a suspensão preventiva do mesmo, sem perda de retribuição, e com efeitos imediatos, com vista à averiguação concreta dos factos, (…)» cfr. doc. junto a fls. 1 do processo correspondente ao procedimento prévio de inquérito e 120 destes autos e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

20) A decisão referida em 19) foi tomada de acordo com a empregadora CC, que com data de 14/09/2012, comunicou ao autor a instauração pela empregadora BB do processo prévio de inquérito e da suspensão aplicada – cfr. doc. junto a fls. 274 do processo disciplinar e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

21) O autor foi notificado da instauração do processo prévio de inquérito e determinação da suspensão preventiva sem perda de retribuição e do “Despacho interno” referido em 19) por comunicação datada de 14 de Setembro de 2012;

22) Com data de 29/01/2013, foi elaborado documento denominado «Relatório», através do qual e além do mais que aí consta, foi dado por concluído o processo prévio de inquérito – cfr. doc. junto a fls. 385-414 do processo correspondente ao processo prévio de inquérito e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

23) Com data de dia 15 de Fevereiro de 2013, a empregadora BB instaurou processo disciplinar contra o trabalhador, remetendo-lhe, por correio registado com aviso de recepção, um escrito, onde, sob o assunto:

Instauração de procedimento disciplinar com vista ao despedimento/Comunicação de nota de culpa, lhe comunica, além do mais, seguinte:

«Serve a presente para comunicar a V. Exa que, nos termos do artigo 353.º, n.º 1 do Código do Trabalho, lhe foi instaurado um processo disciplinar pela BB, S.A. com intenção de proceder ao seu despedimento, nos termos e pelos factos constantes da nota de culpa, que se anexa.

V. Exa. poderá, querendo, no prazo de 10 (dez) dias úteis a contar da recepção da presente carta, responder à nota de culpa, deduzindo por escrito os elementos que considere relevantes para o esclarecimento dos factos e a sua participação nos mesmos, podendo juntar documentos e solicitar a realização de diligências probatórias que se mostrem pertinentes para o esclarecimento da verdade. (…)» - cfr. doc. junto a fls. 27 do processo disciplinar e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, remetendo-lhe a nota de culpa que se encontra junta a fls. 1 a 53 do processo disciplinar e cujo teor se considera aqui por igual e integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

24) Com data de 27 de Fevereiro de 2013, a empregadora CC remeteu ao trabalhador, por correio registado com aviso de recepção, comunicação do mesmo teor da referida em 23), remetendo-lhe a nota de culpa que se encontra junta a fls. 55 a 114 do processo disciplinar e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais;

25) Com data de 27 de Fevereiro de 2013, foi remetida pela empregadora à Comissão de Trabalhadores da CC cópia da nota de culpa e comunicação da mesma ao trabalhador;

26) O trabalhador apresentou resposta à Nota de Culpa em 14 de Março de 2013.

27) O trabalhador requereu, na apresentação da resposta à nota de culpa, a inquirição de dez testemunhas, juntou 15 (quinze) documentos e requereu a junção aos autos pela Arguente do respectivo registo disciplinar;

28) Os instrutores do processo disciplinar, por despacho datado de 21 de Março de 2013, designaram data para inquirição das testemunhas arroladas pelo trabalhador, fazendo constar que «(…) Mais se informa que, a inquirição das testemunhas será conduzida em exclusivo pelos instrutores, pelo que não se consentirá a presença do Trabalhador-Arguido e/ou do seu Mandatário. (…)» – cfr. doc. de fls. 267-268 do processo disciplinar e cujo teor se considera;

Finalmente, os Instrutores deram por encerrada a fase instrutória do processo disciplinar.

29) Com data de 8 de Maio de 2013, foi declarada encerrada a fase instrutória do processo disciplinar e determinado o envio à Comissão de Trabalhadores da empregadora CC.

30) Com data de 7 de Julho de 2013, a Comissão de Trabalhadores da empregadora CC emitiu o PARECER que se encontra junto ao processo disciplinar, em cópia, a fls. 820 e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

31) Em 18 de Julho de 2013, foi elaborado relatório final de instrutores, no qual se conclui: (…) propõe-se ao Trabalhador-Arguido da sanção disciplinar de despedimento com justa causa.» - cfr. doc. junto a fls. 859 do processo disciplinar e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

32) Por decisão datada de 26 de Julho de 2013, a empregadora CC aplicou ao trabalhador a sanção de despedimento com justa causa, ao que aderiu a empregadora BB, por termo de adesão da mesma data – cfr. doc. de fls. 861 e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

33) Por escrito datado de 29 de Julho de 2013, foi comunicado ao trabalhador:

«(…) Serve a presente para comunicar a V. Exa. que se encontra concluído o processo disciplinar que lhe foi instaurado pela BB, S.A. e pela CC.

Mais se informar V. Exa. que a BB aderiu à decisão final proferida pela CC de aplicação da sanção disciplinar de despedimento com justa causa, nos termos e pelos fundamentos constantes da mesma decisão que se dá por integralmente reproduzida. (...)» - cfr. doc. junto a fls. 862 do processo disciplinar e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

34) As sociedades NN integram o Grupo FF, dedicando-se à actividade de comércio de gás natural, em concreto, à aquisição de gás natural e posterior venda a consumidores finais e outras sociedades comerciais;

35) O desempenho desta atividade pela FF iniciou-se no ano de 2010, através da aquisição das sociedades de Direito espanhol NN à sociedade de Direito espanhol OO;

36) Com esta aquisição, a FF adquiriu a carteira de clientes da OO, bem como incorporou os trabalhadores desta na sua estrutura.

37) Durante o ano de 2011, a OO continuou a prestar serviços de Back Office (gravação de contratos, entre outros) para as sociedades NN;

38) A atividade comercial estava por sua vez a cargo da área de vendas das sociedades NN, as quais têm como escopo a captação de clientes de OO, bem como a prestação de serviços complementares, através do canal de vendas, com recurso às sociedades que integram as «Task Force», fornecedores/prestadores de serviços que têm a seu cargo a angariação de clientes para as sociedades NN);

39) O contrato de prestação de serviços de Back office com a OO terminou no final do ano de 2011, passando estes serviços a ser prestados por uma empresa externa.

40) A partir de Novembro de 2011, implementou-se o sistema informático SAP IS-U, cuja gestão competia às sociedades NN, no qual se encontra a informação relativa aos clientes da FF;

41) Na sequência de ter sido apresentada uma denúncia pelo Comité de Acompanhamento da Luta Contra a Corrupção em Espanha, iniciou-se uma auditoria interna à área de vendas das sociedades NN, a qual foi efectuada pelo Departamento de Auditoria Interna da FF.

42) A auditoria interna referida em 16) e 17) teve como referência o período compreendido entre 01 de Janeiro de 2011 e 31 de Março de 2012;

43) A auditoria referida em 18) referiu-se ao período compreendido entre Janeiro de 2011 e Junho de 2012;

44) No Grupo FF encontra-se publicada uma «Norma Regulamentar» sobre «compras», de acordo com a qual e, além do mais:

«(…) 1. Objectivo

Estabelecer procedimentos para o exercício da função compras no Grupo FF, sendo esta entendida como o conjunto de ações desenvolvidas para assegurar a disponibilização de bens e serviços, conforme as necessidades das Unidades Organizacionais e Empresas do Grupo, dentro das condições de qualidade e prazo acordadas e ao menor custo total possível

(…)

2.1. Âmbito organizacional

A presente NR aplica-se a todas as Unidades Organizacionais do Grupo FF e às Empresas Participadas e, que a FF detenha mais de 50% do capital social ou o controlo da sua gestão (…);

45) A norma regulamentar referida em 44) prevê ainda regras de autorização e assinatura de documentos de compra, para a emissão de documentos de adjudicação para o exterior, nos termos do documento junto a fls. 201 a 216 do processo disciplinar e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

46) No que concerne ao fornecedor Telemarketing, no período balizado entre Janeiro de 2011 e Junho de 2012 foram liquidadas facturas no valor de € 1.300.000,00, sem que a adjudicação tivesse sido feita de acordo com as regras referidas em 45);

45) No ano de 2011, o fornecedor QQ apresentou às sociedades NN faturas que ascendem a um total de € 900.000,00, sem que tenha havido intervenção da área de negócio e/ou do Conselho de Administração;

48) A campanha desenvolvida para novos clientes denominada «GOL T» criada em 2011, que importou para as sociedades NN um valor total de € 884.009,00, não foi orçamentada nem autorizada de acordo com as regras referidas em 45);

48-A- O Autor tinha conhecimento da norma Regulamentar 017 2008, bem como teve conhecimento das situações descritas nos pontos 46, 47 (45) e 48 dos factos provados, tendo tomado posição sobre a obrigatoriedade de serem assinados os contratos com os prestadores de serviços em reunião que se realizou em 17 de Janeiro de 2012” (aditado pela Relação).

49) O fornecedor QQ, tinha como sócio fundador o irmão de um colaborador da área de vendas das sociedades NN;

50) O fornecedor RR tem como sócio um ex-trabalhador da OO, o qual mantém relações de amizade com um gestor da área comercial de negócio das sociedades NN;

51) O fornecedor SS tem como objecto o fornecimento de gás.

52) A certa altura a SS passou a exercer serviços de angariação de clientes paras as sociedades NN, tendo recebido destas as respectivas comissões;

53) Posteriormente este fornecedor criou uma nova empresa, a TT, a qual também começou a prestar serviços para as sociedades NN;

54) O responsável junto das sociedades NN pela validação das facturas tinha em sua posse e utilizava o carimbo do fornecedor QQ para autenticar facturas emitidas por este fornecedor.

55) Com data de 6 de Março de 2012 UU remeteu um escrito, por correio electrónico, com conhecimento ao trabalhador, dando conta que:

«(…) é importante que saiba que a nota de crédito que me entregaram da QQ foi feita aqui no escritório. Enviei o e-mail, como viu, e às duas da tarde já me tinham entregue a nota de crédito («nota de abono») sem que tenha vindo ninguém da QQ, como sempre suponho que se vai negar a evidência, gostaria de saber quem tem o carimbo da QQ aqui no escritório(…)» - cfr. doc. de fls. 195 do processo prévio de inquérito e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

56) As relações comerciais com as empresas que integravam as «task force» iniciaram-se em 2011, titulados por documentos com as condições comerciais subjacentes aos acordos, assinados apenas pelos representantes daquelas sociedades;

57) Dos documentos referidos em 56) constavam as comissões a pagar pelas sociedades NN, e que o pagamento das faturas fosse efectuado a pronto pagamento;

58) O autor tinha conhecimento do referido em 56) e 57);

59) Em reunião de coordenação de 17 de Janeiro de 2012, foi referida pelo trabalhador:

«(…) a obrigatoriedade de que todos os prestadores de serviços com quem trabalhamos terem um contrato assinado e estarem vinculados ao código de conduta do Grupo FF. VV ficou encarregue de ver o modelo de contrato que deve ser seguido e a obter o acordo de WW como responsável jurídico em Espanha. É dado o prazo de um mês, até 15 de Fevereiro, para que estes contratos estejam elaborados e assinados pelas pessoas autorizadas dando-se a instrução de que não serão pagas mais faturas a partir dessa data se não houver um contrato que as suporte.

Diz-se que os contratos com a MM e a XX ainda estão pendentes, aguardando-se que a Assessoria Jurídica dê uma resposta. (…)» - cfr. doc. de fls. 57 do processo prévio de inquérito e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

60) Até Dezembro de 2011 foram pagas pelas sociedades NN comissões às sociedades que integram as referidas task forces no valor de € 3.000.000,00;

61) Nas auditorias realizadas constatou-se a ocorrência de situações em que as facturas apresentadas pelas sociedades que integram as referidas Task Force não correspondiam às comissões que estas cobravam;

62) O pagamento da factura era efetuado com referência ao mero envio dos contratos pelas sociedades que integram as referidas Task Force e não em virtude dos contratos estarem efectivamente activos no sistema informático das sociedades NN;

63) Não se fazia o controlo posterior se os contratos celebrados com os clientes pelas sociedades que integram as referidas Task Force se encontravam activos no sistema, não obstante as facturas e as comissões serem pagas;

64) Detetou-se nas auditorias que parte das facturas haviam sido pagas fora do circuito instituído para a aprovação de facturas (P2P), com a justificação de que se tratavam de pagamentos urgentes.

65) Algumas das facturas aprovadas foram pagas em adiantado, a pedido e no interesse do próprio fornecedor de Task Force;

66) Na sequência das auditorias e de acordo com o que delas consta, foi efetuada uma análise à facturação de clientes activos durante 3 meses e até 12 meses apurando-se que:

(i) de 40.336 clientes de gás, nunca chegou a ser facturado o consumo de 2.359 clientes  (6%);

(ii) de 16.716 clientes de electricidade, em momento algum foi facturado o consumo de 3.130 clientes (19%).

67) Em consequência das situações relatadas e que constam das auditorias foi implementado pelas sociedades NN um “projecto de estabilização do negócio”, que ainda se encontra em curso;

68) A gestão de Back Office das sociedades NN está a cargo da empresa MM.

69) Entre 2011 e 2012, as sociedades NN já pagaram à empresa MM o montante de € 1.500.000,00 pelos serviços prestados, sem a existência de contrato assinado pelo trabalhador;

70) Com referência à gestão de Back Office, detectou-se, na segunda auditoria realizada, as conclusões que aí se fizeram constar e que aqui se dão novamente por reproduzidas para todos os efeitos legais;

71) As faturas apresentadas pela empresa MM foram efectuadas com base em estimativas e com recurso a critérios alternativos;--

72) O “projecto de estabilização do negócio” foi ainda estendido à regularização da área de Back Office.

73) Em virtude de se ter detectado o registo de 12 mil clientes falsos, foi iniciado um processo de verificação de todas as reclamações apresentadas que passou pela realização de telefonemas a cada um dos alegados clientes, sendo que, caso não lograssem contactar telefonicamente o cliente em causa, as sociedades NN procediam ao envio de uma carta com vista à regularização da situação.

74) Dos 12 mil clientes contactados, apenas cerca de mil clientes confirmaram ser efetivamente clientes das Sociedades NN.

75) Relativamente aos restantes cerca de 11 mil “clientes”, está a ser efectuada uma tentativa de clarificação das respectivas situações contratuais.

76) Encontram-se a correr termos os seguintes processos administrativos contra as sociedades NN:

(i) Entidade Autuante: Direcção Geral de Consumo CAM

Contra: DD, S.L.

Processo n.º 05-ESAC-00065.5/2012

Notificada em 21/09

Proposta de sanção: 195.000€

Tipologia das Infracções: i) Inscrição sem manifestação de consentimento do cliente; ii) Leituras estimadas em facturas bimestrais de fornecimento de gás; iii) Falta de registo de pedido de baixa de contratos e manutenção da facturação; iv) Aplicação de taxas por alta de pagamentos de modo distinto do estabelecido contratualmente; v) Não fornecimento de informação/documentação.

(ii) Entidade Autuante: Direcção Geral de Consumo CAM

Contra: EE, S.L.

Processo n.º 05-ESAC-00061.1/2012

Notificada em 22/08

Proposta de sanção: 97.100€

Tipologia das Infracções: i) 70 Reclamações por inscrições não solicitadas; ii) Reclamações por cobranças indevidas; iii) 56 Reclamações por irregularidades nos contratos de manutenção.

(iii) Entidade Autuante: Direcção Geral de Indústria CAM

Contra: DD, S.L. e EE, S.L.

Processo n.º 05-MI-00083.7/2012

Notificada em 10/08

Proposta de sanção: 600.000 €

Tipologia das Infracções: Infracção do prazo de início dos Contratos e infracção do dever  de informação aos clientes.

(iv) Entidade Autuante: Direcção Geral de Indústria CAM.

Contra: DD, S.L.

Processo n.º 05-MI-00328.0/2012

Notificada em 28/09

Proposta de sanção: 3.005,06 €

Tipologia das Infracções: Falta de resposta ao Processo de reclamação nº 2011L674

(v) Entidade Autuante: Direcção Geral de Indústria CAM

Contra: DD, S.L.

Processo n.º 05-MI-00327.8/2012

Notificada em 28/09

Proposta de sanção: 3.005,06 €

Tipologia de Infracções: Falta de resposta ao Processo de reclamação nº 2011L566

(vi) Entidade Autuante: Direcção Geral de Indústria CAM

Contra: DD, S.L.

Processo n.º 05-MI-00179.5/2012

Notificada em 04/10

Proposta de sanção: 3.005,06 €

Tipologia de Infracções: Falta de resposta ao Processo de reclamação nº 2011L576

(vii) Entidade Autuante: Direcção Geral de Indústria CAM

Contra: DD, S.L.

Processo n.º 2012 L 614

Notificada em 12/11

Tipologia de Infracções: Erro na leitura do contador

(viii) Entidade Autuante: Câmara Municipal de …

Contra: EE, S.L.

Processo nº 2-024-12

Notificada em 31/08

Proposta de sanção: 3.005,06€

Tipologia de Infracções: Não prestação de informação à Delegação de Consumo

(ix) Entidade Autuante: Comunidade Autónoma De …

Contra: KK, S.A.U.

Processo nº C19/18/2012

Notificada em 4/10

Proposta de sanção: 50.000 €

Tipologia de Infracções: i) Atraso na activação dos contratos de electricidade; ii) Aposição de cláusulas nos contratos sem dar oportunidade aos clientes de as conhecer em momento anterior à celebração; iii) Infracção do dever de prestar aos clientes a informação relevante e essencial; iv) Ausência de previsão contratual do direito à denúncia; v) Falta de entrega do contrato; vi) Facturação de serviços não solicitados.

(x) Entidade Autuante: Comunidade Autónoma De …

Contra: KK, S.A.U.

Processo nº C19/18/2012

Notificada em 4/10

Proposta de sanção: 4.507,59 €

Tipologia de Infracções: i) Ausência de manifestação de vontade do consumidor em  contratar; ii) Ausência de remissão para a documentação requerida pela Secção de  Consumo.

(xi) Entidade Autuante: Agência Espanhola de Protecção de Dados

Contra: DD, S.L.

Processo n.º PS/00393/2012

Notificada em 19/09

Proposta de sanção: 50.000€

Tipologia de Infracções: Utilização não autorizada de dados pessoais de cliente

(xii) Entidade Autuante: Agência Espanhola de Protecção de Dados

Contra: DD, S.L.

Processo n.º PS/00260/2012

Proposta de sanção: 40.000€

Tipologia de Infracções: Utilização não autorizada de dados pessoais de cliente

77) Encontram-se a correr termos contra as sociedades NN:

(i)Tribunal De Instrução 50 De Madrid

Contra: KK, S.A.U.

Processo-crime por Burla

(ii) Tribunal de Instrução 4 de Valdemoro

Constituição de Arguido de Representante Legal de GEE (KK)/MSG

(DD)

Inquérito Prévio 1613/2012, sendo que em 30 de Setembro de 2012, as sociedades NN e a a KK tinham recebido 71.500 reclamações, referentes a 52.000 clientes, num universo de 330.000 clientes.

78) Às sociedades NN foram aplicadas sanções de natureza administrativa/contra-ordenacional, sanções estas aplicadas pela Agência Estatal de Protecção de Dados, Direcção Geral do Consumo e Direcção Geral da Indústria, ambas da Comunidade Autónoma de …, sendo que, à data do procedimento disciplinar, já tinham sido pagas algumas dessas sanções (alterado pela Relação).

79) O autor, até à data em que exerceu funções nas sociedades NN, teve conhecimento da existência dos processos em que a notificação daquelas ocorreu até essa data;

80) O trabalhador YY participou em reuniões, em …, com a Direcção-Geral de Energia e Direcção-Geral do Consumo, e teve conhecimento pelas entidades da existência de uma multa cujo valor ascendia a € 600.000,00 (seiscentos mil euros).

81) Apesar do trabalhador já ter conhecimento desta multa e do processo em causa, não informou o trabalhador YY a respeito da mesma.

82) Até ao final de 2011 as sociedades NN dependiam do sistema informático comercial da OO;

83) Tendo o sistema SAP ISU sido escolhido com base no custo e no tempo necessário para a sua implementação, tendo ocorrido desacertos na passagem do sistema informático comercial da OO, para o Sistema SAP ISU;

84) Os trabalhadores VV e ZZ foram despedidos pela KK, S.A.U.;

85) O trabalhador tinha competência para aprovação de despesas de funcionamento até ao limite de € 750 000,00 (setecentos e cinquenta mil euros);

86) Em 27 de Março de 2012, o A. reportou à Comissão de Luta Contra a Corrupção a possível existência de irregularidades, designadamente a elaboração de notas de créditos referentes a facturas emitidas pelo fornecedor com erros, tendo efectuado a denúncia referida em 16);

87) Em 30 de Setembro de 2012, as sociedades NN e a KK tinham recebido 71.500 reclamações, referentes a 52.000 clientes num universo de 330.000 clientes, e tinham sido objecto de sanções de natureza/administrativa/contra-ordenacional, aplicadas pela Agência Estatal de Proteção de Dados, Direção Geral do Consumo e Direcção Geral da Industria da Comunidade Autónoma de Madrid;

88) A designação do trabalhador como administrador delegado teve como fundamento a confiança que o autor soubera granjear dentro do grupo FF durante a vigência do seu contrato de trabalho, bem como o conhecimento dos procedimentos em vigor no grupo;

89) As NN integravam na sua estrutura, além do mais, o presidente de administração AAA, um director de vendas, VV e uma directora financeira, UU, sendo que todos os directores tinham poderes delegados pela FF, sendo considerados directores de Nível A2, ou seja, tinham autonomia para tomar decisões no âmbito das respetivas direcções e gerir as mesmas de acordo com a sua experiência encontrando-se os níveis de competência de autorização publicados em norma orgânica NO-004 2006 01 de 5, junta ao procedimento disciplinar a fls. 190-196 dos autos e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, sendo que ainda estavam sujeitos à Norma Regulamentar de Compras.) (alterado pela Relação).

90) Com data de 27 de Março de 2012, o trabalhador remeteu ao Comité de Luta contra a corrupção o escrito, por correio electrónico, junto em cópia a fls. 186 do procedimento prévio de inquérito e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, sendo que em data anterior o trabalhador BBB solicitou ao Autor que fizesse tal denúncia e que caso não fosse feita ele próprio a faria (alterado pela Relação).

90a) Em reunião ocorrida no dia 27 de Junho de 2012, com a presença do trabalhador, de UU, CCC, BBB, DDD e EEE, foi abordado e decidido, além do mais, que se iria realizar um concurso para adjudicação dos contratos com as task forces, sendo convidadas as empresas que se considerassem óptimas do ponto de vista da qualidade do seu trabalho – cfr. ata de reunião de fls. 198 do processo disciplinar e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

90b) Com data de 7 de Agosto de 2012, o trabalhador remeteu um escrito a FFF, com conhecimento ao responsável pelo planeamento e controlo do grupo e à diretora financeira UU, com o seguinte teor:

«(…) Em resumo, estamos de acordo com o estudo na AI relativa à 2ª análise onde o saldo contabilístico é o seguinte:

1. SS/Print/MDF tem com a FF um débito de 49.837 €

2. QQ tem com a FF um débito de 61.246 €

3. RR tem com a FF um crédito de 72.254 €

Neste pressuposto, sugiro que mantenhamos as operações com a SS/Print/MDF e QQ até que consigamos neutralizar a conta corrente e simultaneamente realizar o pagamento com a RR pelo saldo acima referido (…,)», tendo sido proposto pelo trabalhador o acerto de contas que resulta dos escritos por correio electrónico que correspondem aos documentos juntos a fls. 215-218 do processo disciplinar e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

91) Na altura em que o trabalhador se apercebeu da inexistência de autorização e adjudicação do projecto IRINDE, decidiu proceder à suspensão do mesmo, não efectuando o pagamento, sendo que após contacto do Sr. GGG com o Administrador Dr. AAA, foram dadas instruções expressas ao A. para pagamento, com fundamento em parecer dos serviços jurídicos da KK em Espanha;

92) O Trabalhador é detentor de um registo disciplinar sem qualquer registo de infracções disciplinares;

93) O trabalhador foi substituído, nas sociedades NN por HHH;

94) Em reunião ocorrida a 11 de Setembro de 2012, com a presença do Director de Recursos Humanos da FF e do Dr. III, Director dos Serviços Jurídicos, o trabalhador foi informado da intenção da FF em fazer cessar o seu contrato de trabalho com a 2ª ré;

95) No ano de 2010, o trabalhador auferiu prémio de desempenho.

96) Desde 1991 que todas as avaliações de desempenho realizadas ao trabalhador foram positivas.

97) O trabalhador era tido pelos seus colegas, sejam superiores hierárquicos, do mesmo nível ou subordinados, como sendo um profissional diligente, competente e dedicado à RR.

98) O trabalhador, para quem o conhece e com ele trabalha ou trabalhou, é considerado um trabalhador obediente, zeloso, diligente, leal e incapaz de actuar no sentido de prejudicar os interesses da empregadora;

99) O trabalhador gostava de trabalhar nas empregadoras;

100) Por via do despedimento a que foi sujeito, o trabalhador ficou angustiado, triste e deprimido;

101) O trabalhador deixou de poder manter o nível de vida a que estava habituado por virtude da diminuição dos seus rendimentos;

102) E passou a padecer de preocupação por força do referido em 100);

103) O trabalhador vinha auferindo a título de prestação da sua actividade profissional para a empregadora CC a quantia mensal de € 8.500,00, tendo auferido remuneração mensal no valor de € 16.387,78 aquando do exercício das suas funções nas sociedades NN;

104) Como contrapartida da prestação da sua actividade para as empregadoras, o trabalhador tinha direito ao uso e fruição, durante 24 horas por dia, de um veículo de marca BMW modelo 520, matrícula 00-HH-00;

105) O trabalhador tinha ainda direito a telemóvel, para utilização pessoal e profissional indistinta, sem limite de plafond;

106) O trabalhador tinha acesso à internet, com banda larga, da TMN, para uso pessoal e profissional, no valor mensal de € 50,00;

107) O trabalhador dispunha de seguro de saúde Multicare para si, cônjuge e filho, no valor de e 280,00 (alterado pela Relação):

108) O trabalhador dispunha de seguro de saúde Multicare para si, cônjuge e filho, no valor de € 280,00 mensais.)

109) Ao trabalhador foi atribuído pelo Instituto da Segurança Social subsídio de desemprego, com início a 28 de Agosto de 2013, por um período de 1140 (mil, cento e quarenta dias), no valor diário de € 34,94 (trinta e quatro euros e noventa e quatro cêntimos), sendo esse montante diário reduzido em, 10% a partir do 181º dia.

110) No âmbito do projecto IRINDE, estava em causa o desenvolvimento de um projecto de consultadoria por parte do Sr. GGG (aditado pela Relação).

111) A SS passou a exercer serviços de angariação de clientes expandindo a sua atividade, ao saber que as comissões são mais altas para as sociedades que integram as task forces do que os centros de gás (aditado pela Relação).

112) O Autor tinha conhecimento da não existência de contratos com as Task Force e que estavam a ser pagos os serviços que estas desenvolviam para as NN, mas só a partir de Janeiro de 2012 solicitou e realizou diligências no sentido de rectificar algumas das irregularidades que se verificavam (aditado pela Relação).          

113) Em reunião havida com as autoridades, os respectivos Directores Gerais fizeram comentários negativos sobre a actuação da FF e das NN, referindo que estas não respondiam às informações que lhes eram solicitadas (aditado pela Relação).”

5.2 - O DIREITO

Vejamos então, de entre as referidas questões que constituem o objeto do recurso, aquelas de que este tribunal pode conhecer, como referido, mas não sem que antes se esclareça que este tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos produzidos nas alegações e conclusões, mas apenas as questões suscitadas, bem como, nos termos dos arts. 608º, n.º 2, 663º n.º 2 e 679ºdo Código de Processo Civil, não tem que se pronunciar sobre as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras ([4]).

5.2.1 – Inexistência de justa causa de despedimento (6)

5.2.1.1 – Da suspensão do contrato de trabalho

Como se vê pelos factos provados, o A. celebrara o contrato de trabalho com a BB, exercia as funções na CC e as infrações imputadas ocorreram enquanto Administrador-Delegado das empresas sediadas em Espanha pertencentes ao mesmo grupo empresarial ([5]).

Poder-se-ia colocar a questão de saber se, face ao estabelecido no art. 398º, nº 2 do Código das Sociedades Comerciais, o contrato de trabalho que celebrara com a BB e com a CC se teria suspendido com a nomeação de Administrador-Delegado nas NN.

Esta questão foi submetida pelo A. à apreciação do tribunal, tendo merecido, na sentença da 1ª instância, a seguinte decisão:

«F) Da suspensão do contrato de trabalho:

Alegou o autor que na sequência da sua deslocação para Madrid, ao abrigo de expatriação, o contrato por si celebrado com a empregadora CC ficou suspenso para todos os efeitos legais, e tendo o mesmo passado a exercer um cargo de administrador, pelo que as empregadoras nunca podiam proceder disciplinarmente contra o trabalhador por alegados atos praticados por este no exercício da administração de sociedade de direito estrangeiro.

A este propósito resulta dos autos que pela comissão executiva da FF foi nomeado o trabalhador para o exercício das funções de Administrador-Delegado das sociedades NN como responsável pela gestão local do negócio que assegure o acompanhamento e consolidação da actividade de comercialização no segmento residencial e comercial [factos provados 11) e 12)].

De acordo com o acórdão da Relação de Lisboa 04-07-2007 (proferido no processo 3364/2007-4): «se o trabalhador já vinculado à pessoa coletiva é nomeado administrador da entidade patronal, o contrato individual de trabalho suspende-se enquanto durarem aquelas funções.»

Ora, no caso dos autos, a nomeação do trabalhador como Administrador-Delegado não ocorreu para a própria entidade patronal, mas para sociedades que integravam o mesmo grupo, tendo ainda a sua causa e efeito na relação laboral que mantinha com as entidades empregadoras.

Em face dos termos da nomeação do trabalhador como «responsável local» e «administrador delegado», e da relação de grupo entre as sociedades em causa, não se pode aqui falar numa suspensão do contrato de trabalho «tout court», já que, para o que ao caso releva, mantiveram-se para o trabalhador os deveres emergentes daquela relação laboral e cuja violação foi imputada ao trabalhador no âmbito do despedimento a que o mesmo foi sujeito, não estando as empregadoras impedidas de agir disciplinarmente contra o trabalhador.

Assim sendo, entendemos que se não verifica qualquer causa de nulidade/irregularidade do processo disciplinar.»

Apesar desta decisão desfavorável, o A., à semelhança das questões atrás referidas, não requereu a ampliação do âmbito do recurso de apelação para apreciação pela Relação da questão da suspensão do contrato de trabalho que celebrara com as RR.

Não o tendo feito, a decisão transcrita transitou em julgado, restando o seu acatamento (art. 619º, nº 1 do CPC e 205º, nº 2 da CRP).

5.2.1.2 - Da justa causa de despedimento

Nas conclusões 25 a 35 insurge-se o recorrente contra a decisão da Relação na parte em que considerou verificar-se justa causa de despedimento.

Nos termos do art. 351º, nº 1 do CT, constitui justa causa de despedimento «o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho».

A justa causa de despedimento (conceito indeterminado) é assim, integrada pelos seguintes requisitos cumulativos:

“- um comportamento ilícito, grave, em si mesmo ou pelas suas consequências, e culposo do trabalhador (é o elemento subjectivo da justa causa);

- a impossibilidade prática e imediata de subsistência do vínculo laboral (é o elemento objectivo da justa causa);

 - a verificação de um nexo de causalidade entre os dois elementos anteriores, no sentido em que a impossibilidade de subsistência do contrato tem que decorrer, efectivamente, do comportamento do trabalhador” ([6]).

Não basta, pois que se verifique um comportamento culposo e ilícito do trabalhador, sendo ainda necessário que esse comportamento tenha como consequência necessária a impossibilidade prática e imediata de subsistência do vínculo laboral.

A impossibilidade da subsistência da relação de trabalho constitui assim, “uma limitação ao exercício do direito de resolução do contrato de trabalho na sequência do princípio, constante do art. 808º do CC, de a resolução de qualquer contrato depender da perda de interesse por parte do lesado (no caso o empregador), determinada objectivamente… Perante o comportamento culposo do trabalhador impõe-se uma ponderação de interesses; é necessário que, objectivamente, não seja razoável exigir do empregador a subsistência da relação contratual. Em particular, estará em causa a quebra da relação de confiança motivada pelo comportamento culposo. Como o comportamento culposo do trabalhador tanto pode advir da violação de deveres principais como de deveres acessórios, importa, em qualquer caso, apreciar a gravidade do incumprimento, ponderando a viabilidade de a relação laboral poder subsistir.” ([7]).

“A subsistência do contrato é aferida no contexto de um juízo de prognose em que se projeta o reflexo da infração e do complexo de interesses por ela afetados na manutenção da relação de trabalho, em ordem a ajuizar da tolerabilidade da manutenção da mesma” ([8]).

A impossibilidade de subsistência do contrato de trabalho, “equivalente à inexistência ou inadequação prática de medida alternativa à extinção do vínculo” ([9]), para além de ter que ser imediata, deve ser aferida não em termos de impossibilidade objetiva, mas de inexigibilidade para a outra parte da manutenção daquele vínculo laboral em concreto ([10]), considerando “o entendimento de um bonus pater familias, de um empregador razoável” ([11]).

“É que a inexigibilidade – envolvendo, como assinalou Bernardo Xavier, «um juízo de probabilidade, de prognose, sobre a viabilidade da relação de trabalho» - surge apontada ao suporte psicológico do vínculo. O que ela significa – o que significa a referência legal é «impossibilidade prática» da subsistência da relação de trabalho – é que a continuidade da vinculação representaria (objectivamnente) uma insuportável e injusta imposição ao empregador. Nas circunstâncias, a permanência do contrato e das relações (pessoais e patrimoniais) que ele supõe seria de molde a ferir de modo desmesurado e violento a sensibilidade e a liberdade psicológica de uma pessoa normal colocada na posição do empregador” ([12]).

Vejamos então o caso dos autos ([13]).

Revogando a sentença da primeira instância, entendeu a Relação que a conduta do A. enquanto trabalhador das RR, no exercício das funções de Administrador-Delegado das sociedades DD, SL. e EE, S.L., integrava justa causa de despedimento, por violação dos deveres contratuais de obediência, de zelo e diligência e de não promoção de produtividade da empresa, a que aludem as alíneas e), c) e h) do  art. 128º, nº 1 do Código do Trabalho.

Argui o recorrente que no acórdão recorrido em momento algum se refere uma conduta concreta, um acto ou uma omissão da responsabilidade do A. de onde se possa extrair que o A. não observou a norma regulamentar de comprar… também não se refere a que título ou que parte da norma, em concreto, foi violada pelo A. bem como as circunstâncias de modo, tempo e lugar da sua conduta, comissiva ou omissa de onde se possa extrair tal conclusão; …não existiu por parte do A qualquer acto de compra ou outro, de sua responsabilidade, que levasse ao incumprimento da norma de compras.

Mas não tem razão.

Vem, efetivamente, provado que, “com data de 18/03/2010, e no âmbito da relação laboral, foi aprovada a nomeação do trabalhador como Responsável pela gestão local do negócio de comercialização de PP na região de Madrid, com a nomeação como administrador delegado, constando, além do mais, na fundamentação da proposta de deliberação o seguinte:

  «(…) Objectivos/Fundamentação

Após a concretização do negócio de aquisição de activos à OO, na região de Madrid, mais concretamente, na componente de comercialização de PP, justifica-se a nomeação de um responsável pela gestão local do negócio que assegure o acompanhamento e consolidação da actividade de comercialização no segmento residencial e comercial (…)»”, tendo o A. sido nomeado, em 22 de abril de 2010, “para o exercício de funções de Administrador-Delegado das sociedades DD, SL e EE, S.L.”, cargo que manteve até à sua destituição deliberada em 24 de setembro de 2012.

Tinha pois o A. como missão, “assegur[ar] o acompanhamento e consolidação da actividade de comercialização no segmento residencial e comercial”.

No Grupo FF encontra-se publicada uma «Norma Regulamentar» sobre «compras», de acordo com a qual e, além do mais:

«(…) 1. Objectivo

Estabelecer procedimentos para o exercício da função compras no Grupo FF, sendo esta entendida como o conjunto de ações desenvolvidas para assegurar a disponibilização de bens e serviços, conforme as necessidades das Unidades Organizacionais e Empresas do Grupo, dentro das condições de qualidade e prazo acordadas e ao menor custo total possível

(…)

2.1. Âmbito organizacional

  A presente NR aplica-se a todas as Unidades Organizacionais do Grupo FF e às Empresas Participadas e, que a FF detenha mais de 50% do capital social ou o controlo da sua gestão (…);

A norma regulamentar referida prevê ainda regras de autorização e assinatura de documentos de compra, para a emissão de documentos de adjudicação para o exterior.

O trabalhador tinha competência para aprovação de despesas de funcionamento até ao limite de € 750 000,00 (setecentos e cinquenta mil euros).

Ora, está provado que “no que concerne ao fornecedor Telemarketing, no período balizado entre Janeiro de 2011 e Junho de 2012 foram liquidadas facturas no valor de € 1.300.000,00, sem que a adjudicação tivesse sido feita de acordo com as regras referidas. No ano de 2011, o fornecedor QQ apresentou às sociedades NN faturas que ascendem a um total de € 900.000,00, sem que tenha havido intervenção da área de negócio e/ou do Conselho de Administração. A campanha desenvolvida para novos clientes denominada «GOL T» criada em 2011, que importou para as sociedades NN um valor total de € 884.009,00, não foi orçamentada nem autorizada de acordo com as regras referidas. O Autor tinha conhecimento da norma Regulamentar 017 2008, bem como teve conhecimento das situações descritas…”.

Está também provado que “as relações comerciais com as empresas que integravam as «task force» iniciaram-se em 2011, titulados por documentos com as condições comerciais subjacentes aos acordos, assinados apenas pelos representantes daquelas sociedades (facto 56). Desses documentos “constavam as comissões a pagar pelas sociedades NN, e que o pagamento das faturas fosse efectuado a pronto pagamento (facto 57). O autor tinha conhecimento do referido (facto 58).

Os fornecedores analisados foram adjudicados directamente pela área de negócios, sem envolver o departamento de compras e sem autorização formal do Administrador Executivo (AE);

A facturação da QQ ascendeu a 900K€, sendo que a partir de 750 K € tinha de ser aprovada pelo Administrador Executivo.”

Não oferece, pois, a menor dúvida de que não foi observado o procedimento imposto pela aludida norma regulamentar, o que era do conhecimento do A. e a que estava obrigado já que emitida pela II, sociedade detentora direta ou indiretamente da totalidade do capital de todas as empresas do grupo em que se inseriam a BB, a CC e as NN e para ser aplicada em todas as empresas do grupo.

Alega ainda o A. que “quando teve conhecimento das alegadas irregularidades, adoptou desde logo condutas e decisões no sentido de regularizar todas as situações… Também não se vislumbra e sempre salvo o devido respeito por opinião diversa, que o A não tenha diligenciado pela verificação da regularidade dos elevados pagamentos que eram efectuados às task forces…

Não se refere ou concretiza, mais uma vez, que pagamentos eram esses que foram efectuados e qual o montante.

Também se omite qual a alegada irregularidade, em concreto, dos pagamentos em causa, limitando-se a decisão impugnada a concluir que a norma regulamentar de compras foi incumprida. Importava saber quem incumpriu em primeira linha tal norma, em que parte e se o A. estava em condições, na sua qualidade de Administrador das sociedades de direito espanhol, de saber e ter conhecimento de tal facto e se, quando teve conhecimento dos factos, se agiu ou não e como agiu. A decisão de despedimento desde logo nenhuma indicação nos dava sobre tais questões.

Está provado, todavia, que “dos 55.881 contratos vendidos pelas Task Force, apenas 37.235 são contratos válidos, correspondendo a uma percentagem de 67% dos contratos vendidos e relativamente a contratos não válidos ou inexistentes foram pagas comissões no valor de € 616.928€ o que corresponde a 30% das comissões pagas”. Mais se provou ter ocorrido a “aprovação indevida de custos de comissões. Faturas de 640.583 € que correspondem a comissões sobre 19.277 contratos não válidos (de clientes sem consumo e/ou facturação), que representam 34% da amostra analisada.

Exemplos de contratos não válidos:

- Contratos duplicados pelos mesmos fornecedores;

- Contratos duplicados entre fornecedores distintos;

- Contratos fraudulentos (cliente alega não ter sido contactado pela FF – 1859 casos em 2012);

- Contratos com dados incorrectos.”

Provado está também que “até Dezembro de 2011 foram pagas pelas sociedades NN comissões às sociedades que integram as referidas task forces no valor de € 3.000.000,00 e que “as facturas apresentadas pelas sociedades que integram as referidas Task Force não correspondiam às comissões que estas cobravam. O pagamento da factura era efetuado com referência ao mero envio dos contratos pelas sociedades que integram as referidas Task Force e não em virtude dos contratos estarem efectivamente activos no sistema informático das sociedades NN. Não se fazia o controlo posterior se os contratos celebrados com os clientes pelas sociedades que integram as referidas Task Force se encontravam activos no sistema, não obstante as facturas e as comissões serem pagas. Parte das facturas foram pagas fora do circuito instituído para a aprovação de facturas (P2P), com a justificação de que se tratavam de pagamentos urgentes. Algumas das facturas aprovadas foram pagas em adiantado, a pedido e no interesse do próprio fornecedor de Task Force.”

Também na área de vendas ocorreram atuações “em benefício dos fornecedores, em detrimento dos interesses da FF:

• Inexistência de pedido de pagamentos sobre comissões pagas não válidas (contratos revogados, fraudulentos, erróneos);

• Pagamento adiantado de faturas, a título de «previsão de comissões” por serviços não prestados;

• Pagamento de preços de comissões bonificadas, por cumprimento de objectivos não validados correctamente;

• Condição de pronto pagamento.

Apenas 50% do número de contratos vendidos cumpre com os critérios adequados de validação que justificam o pagamento de comissões sobre os mesmos;

O sobrecusto de 1m € deve-se aos seguintes motivos:

(i) 13% dos contratos vendidos não se encontravam registados no sistema das sociedades NN;

(ii) 17% dos contratos vendidos foram faturados em duplicado;

(iii) 7% dos contratos  vendidos não foram activados;

(iv) 4% dos contratos vendidos foram alvo de reclamações por parte de clientes, pelo facto de nunca os terem celebrado;

(v) 9% dos contratos vendidos não cumprem com diversos critérios de validação, tais como, que a duração do contrato seja superior a 3 meses ou que um contrato se serviços esteja sempre vinculado a um contrato de energia activo;

De 40.336 clientes de gás, nunca foi facturado consumo de 2.359 (6%) dos mesmos;

De 16.716 clientes de electricidade, nunca foi facturado o consumo de 3.130 (19%) dos mesmos.

A área de facturação, 8 meses após a implementação do SAP-ISU, ainda não dispõe de relatórios de exceções sobre clientes com consumos que não tenham sido facturados.

Entre 2011 e 2012, as sociedades NN pagaram à empresa MM o montante de € 1.500.000,00 pelos serviços prestados, sem a existência de contrato assinado pelo trabalhador.

Ora, apesar de estarem em causa procedimentos relativos ao ano de 2011 e que eram do conhecimento do A., este apenas em reunião que se realizou em 17 de Janeiro de 2012 tomou posição sobre a obrigatoriedade de serem assinados os contratos com os prestadores de serviços.

O Autor tinha conhecimento da não existência de contratos com as Task Force e que estavam a ser pagos os serviços que estas desenvolviam para as NN, mas só a partir de Janeiro de 2012 solicitou e realizou diligências no sentido de rectificar algumas das irregularidades que se verificavam.

Está também provado que “o responsável junto das sociedades NN pela validação das facturas tinha em sua posse e utilizava o carimbo do fornecedor QQ para autenticar facturas emitidas por este fornecedor. Com data de 6 de Março de 2012, UU remeteu um escrito, por correio electrónico, com conhecimento ao trabalhador, dando conta que:

  «(…) é importante que saiba que a nota de crédito que me entregaram da QQ foi feita aqui no escritório. Enviei o e-mail, como viu, e às duas da tarde já me tinham entregue a nota de crédito («nota de abono») sem que tenha vindo ninguém da QQ, como sempre suponho que se vai negar a evidência, gostaria de saber quem tem o carimbo da QQ aqui no escritório (…)»”.

É certo que “com data de 27 de Março de 2012, o trabalhador remeteu ao Comité de Luta contra a corrupção o escrito, por correio electrónico”, reportando “a possível existência de irregularidades, designadamente a elaboração de notas de créditos referentes a facturas emitidas pelo fornecedor com erros”. Todavia também não é menos certo “que em data anterior o trabalhador BBB solicitou ao Autor que fizesse tal denúncia e que caso não fosse feita ele próprio a faria.”

Em consequência dos procedimentos atrás referidos foram instaurados às empresas sob administração do A., as sociedades NN, diversos processos.

Assim:

“(i) Entidade Autuante: Direcção Geral de Consumo CAM

Contra: DD, S.L.

Processo n.º 05-ESAC-00065.5/2012

Notificada em 21/09

Proposta de sanção: 195.000€

Tipologia das Infracções: i) Inscrição sem manifestação de consentimento do cliente; ii) Leituras estimadas em facturas bimestrais de fornecimento de gás; iii) Falta de registo de pedido de baixa de contratos e manutenção da facturação; iv) Aplicação de taxas por alta de pagamentos de modo distinto do estabelecido contratualmente; v) Não fornecimento de informação/documentação.

(ii) Entidade Autuante: Direcção Geral de Consumo CAM

Contra: EE, S.L.

Processo n.º 05-ESAC-00061.1/2012

Notificada em 22/08

Proposta de sanção: 97.100€

Tipologia das Infracções: i) 70 Reclamações por inscrições não solicitadas; ii) Reclamações por cobranças indevidas; iii) 56 Reclamações por irregularidades nos contratos de manutenção.

(iii) Entidade Autuante: Direcção Geral de Indústria CAM

Contra: DD, S.L. e EE, S.L.

Processo n.º 05-MI-00083.7/2012

Notificada em 10/08

Proposta de sanção: 600.000 €

Tipologia das Infracções: Infracção do prazo de início dos Contratos e infracção do dever de informação aos clientes.

(iv) Entidade Autuante: Direcção Geral de Indústria CAM.

Contra: DD, S.L.

Processo n.º 05-MI-00328.0/2012

Notificada em 28/09

Proposta de sanção: 3.005,06 €

Tipologia das Infracções: Falta de resposta ao Processo de reclamação nº 2011L674

(v) Entidade Autuante: Direcção Geral de Indústria CAM

Contra: DD, S.L.

Processo n.º 05-MI-00327.8/2012

Notificada em 28/09

Proposta de sanção: 3.005,06 €

Tipologia de Infracções: Falta de resposta ao Processo de reclamação nº 2011L566

(vi) Entidade Autuante: Direcção Geral de Indústria CAM

Contra: DD, S.L.

Processo n.º 05-MI-00179.5/2012

Notificada em 04/10

Proposta de sanção: 3.005,06 €

Tipologia de Infracções: Falta de resposta ao Processo de reclamação nº 2011L576

(vii) Entidade Autuante: Direcção Geral de Indústria CAM

Contra: DD, S.L.

Processo n.º 2012 L 614

Notificada em 12/11

Tipologia de Infracções: Erro na leitura do contador

(viii) Entidade Autuante: Câmara Municipal de …

Contra: EE, S.L.

Processo nº 2-024-12

Notificada em 31/08

Proposta de sanção: 3.005,06€

Tipologia de Infracções: Não prestação de informação à Delegação de Consumo

(ix) Entidade Autuante: Comunidade Autónoma De …

Contra: KK, S.A.U.

Processo nº C19/18/2012

Notificada em 4/10

Proposta de sanção: 50.000 €

Tipologia de Infracções: i) Atraso na activação dos contratos de electricidade; ii) Aposição de cláusulas nos contratos sem dar oportunidade aos clientes de as conhecer em momento anterior à celebração; iii) Infracção do dever de prestar aos clientes a informação relevante e essencial; iv) Ausência de previsão contratual do direito à denúncia; v) Falta de entrega do contrato; vi) Facturação de serviços não solicitados.

(x) Entidade Autuante: Comunidade Autónoma De …

Contra: KK, S.A.U.

Processo nº C19/18/2012

Notificada em 4/10

Proposta de sanção: 4.507,59 €

Tipologia de Infracções: i) Ausência de manifestação de vontade do consumidor em contratar; ii) Ausência de remissão para a documentação requerida pela Secção de Consumo.

(xi) Entidade Autuante: Agência Espanhola de Protecção de Dados

Contra: DD, S.L.

Processo n.º PS/00393/2012

Notificada em 19/09

Proposta de sanção: 50.000€

Tipologia de Infracções: Utilização não autorizada de dados pessoais de cliente.

(xii) Entidade Autuante: Agência Espanhola de Protecção de Dados

Contra: DD, S.L.

Processo n.º PS/00260/2012

Proposta de sanção: 40.000€

Tipologia de Infracções: Utilização não autorizada de dados pessoais de cliente.”

Para além destes “encontram-se a correr termos contra as sociedades NN:

(i) Tribunal De Instrução 50 De Madrid

Contra: KK, S.A.U.

Processo-crime por Burla

(ii) Tribunal de Instrução 4 de Valdemoro

Constituição de Arguido de Representante Legal de GEE (KK)/MSG

(DD)

Inquérito Prévio 1613/2012, sendo que em 30 de Setembro de 2012, as sociedades NN e a a KK tinham recebido 71.500 reclamações, referentes a 52.000 clientes, num universo de 330.000 clientes.

Às sociedades NN foram aplicadas sanções de natureza administrativa / contra-ordenacional, sanções estas aplicadas pela Agência Estatal de Protecção de Dados, Direcção Geral do Consumo e Direcção Geral da Indústria, ambas da Comunidade Autónoma de Madrid, sendo que, à data do procedimento disciplinar, já tinham sido pagas algumas dessas sanções.

O autor, até à data em que exerceu funções nas sociedades NN, teve conhecimento da existência dos processos em que a notificação daquelas ocorreu até essa data.”

Perante este acervo factual concluiu a Relação «que estamos perante um quadro de incumprimento, por parte do Autor, dos deveres laborais de obediência, de zelo e diligência e de não promoção da produtividade da empresa a que aludem as alíneas e), c) e h) [do art. 128º, n.º 1] do Código do Trabalho.

Na verdade, o Autor, como responsável pela gestão local do negócio de comercialização de PP na região de Madrid não cuidou de observar a Norma Regulamentar de Compras, de aplicação obrigatória, nem diligenciou (ele próprio, ou através de subordinados) pela verificação da regularidade dos elevados pagamentos que eram efectuados às Task Force e a outras sociedades que desenvolviam serviços para as sociedades NN, sem que tivesse sido cumprida a norma regulamentar de compras.

E se é certo que, conforme refere a sentença recorrida, o Autor não é omnipresente e acrescenta-se, nem omnisciente, a verdade é que o simples facto de ter conhecimento que eram prestados serviços às NN sem que tivessem sido respeitados os procedimentos regulamentares que também eram aplicáveis àquelas sociedades, tal situação exigia-lhe uma maior fiscalização e empenho nos negócios em causa, nomeadamente na consulta das contas e documentos que ilustrassem o desenvolvimento de tais negócios e a que, necessariamente, tinha acesso, o que seria de exigir a qualquer trabalhador com igual nível de responsabilidade colocado na sua posição e perante o elevado risco criado pela desobediência aos procedimentos instituídos.

Acresce, ainda, que perante a factualidade provada não podemos deixar de concluir que foi a sua falta de controlo do negócio de que foi incumbido de gerir, controlo que lhe era exigível e de que ele era capaz, pois foi exactamente por ser um profissional competente, zeloso e diligente que foi colocado à frente desse mesmo negócio, que determinou, designadamente pagamentos indevidos, comentários negativos das autoridades sobre as sociedades em causa e, obviamente, uma imagem negativa das mesmas, bem como a aplicação de sanções de elevado montante às sociedades NN, não contribuindo, assim para a produtividade das sociedades, mas para uma situação de quase insustentabilidade das mesmas.    

Assim, dúvidas não temos que, perante os factos enunciados, o Autor não exerceu as suas funções em obediência às instruções a que estava obrigado na gestão das sociedades NN, como não actuou de acordo com a diligência de um bom pai de família perante um negócio de tal envergadura e que não se compadecia com as omissões que se verificaram da sua parte, nomeadamente não actuando mais cedo quanto à celebração dos contratos com os prestadores de serviços, ou não implementando mecanismos de controlo apertado relativamente aos pagamentos dos serviços prestados.

(…)

Ora, analisando os factos provados à luz do que ficou dito sobre o conceito de justa causa impõe-se concluir que o comportamento omissivo do Autor é culposo e grave em si mesmo e nas suas consequências e no quadro em que se verificou ilustra uma quebra de confiança que, necessariamente, terá de existir entre empregador e trabalhador, sendo susceptível de criar no espírito do empregador a dúvida sobre a idoneidade futura da conduta deste trabalhador.

Acresce que o comprovado comportamento do Autor consubstanciado na inobservância das normas impostas e na falta de diligência e de zelo na condução dos negócios para que foi nomeado, com a correspondente falta de promoção da produtividade da empresa, no quadro da gestão da empresa empregadora é suficiente para nos permitir concluir que a manutenção da relação laboral traduziria uma imposição injusta ao empregador, entendido este como um empregador normal e razoável colocado na posição das recorrentes, sendo certo que a sanção expulsiva se mostra proporcional à conduta do Autor.

Assim sendo e não obstante o Autor ter adoptado comportamentos para regularizar algumas situações, a verdade é que já o fez tardiamente, sendo certo que a comunicação ao Comité de Corrupção surge após um trabalhador lhe ter comunicado que se não fosse feita a denúncia, ele próprio a faria, o que em nada abona a favor do Autor, deixando transparecer, mais uma vez, uma postura passiva e omissiva perante uma situação grave e que urgia esclarecer.

Também é certo que se provou que o Autor trabalhou para a CC desde 15 de Maio de 1991…, é detentor de um registo disciplinar sem qualquer registo de infracções disciplinares…, desde 1991 que todas as avaliações de desempenho realizadas ao trabalhador foram positivas…, o trabalhador era tido pelos seus colegas, sejam superiores hierárquicos, do mesmo nível ou subordinados, como sendo profissional diligente, competente e dedicado às Rés… e que o trabalhador, para quem o conhece e com ele trabalha ou trabalhou é considerado um trabalhador obediente, zeloso, diligente, leal e incapaz de actuar no sentido de prejudicar os interesses da empregadora.

Porém, tais factos não assumem peso suficiente para poderem afastar a gravidade do comportamento do Autor e a atitude omissiva e negligente que adoptou no que respeita à gestão das sociedades NN, pelo que entendemos que os factos provados terão de subsumir-se ao conceito de justa causa de despedimento, nos termos do artigo 351º nº 1 e 2 als. a), d) e e) do CT.»

Concordamos com as transcritas considerações.

Não se pode olvidar que o A. foi nomeado Administrador-Delegado, sendo o “responsável pela gestão local do negócio que assegure o acompanhamento e consolidação da actividade de comercialização no segmento residencial e comercial”.

E se é verdade que não praticou diretamente muitas das irregularidades ocorridas, não é menos certo que era ele o responsável pelo empreendimento das medidas necessárias a evitá-las ou a pôr-lhes cobro.

A infração disciplinar não impõe, necessariamente, a prática de atos. Ela pode ocorrer por omissão de atos destinados a evitar a prática, por outros, de comportamentos infratores, especialmente quando se é detentor de cargo de direção máxima, como era o do A.

As condutas omissivas protagonizadas pelo autor e acima explicitadas são claramente violadoras dos deveres de zelo e diligência que sobre si impendiam e não podiam deixar de conduzir à dúvida fundada acerca da idoneidade do A. e sobre a sua futura conduta no cumprimento do vínculo laboral, conduzindo assim à quebra da confiança das respetivas entidades empregadoras, imprescindível à manutenção daquele vínculo.

Entendemos, em suma, que se verificou justa causa para o despedimento do A., tendo o mesmo sido lícito como concluiu a Relação, cuja decisão, por isso mesmo, não merece censura.

6 – Oposição à reintegração (7)

Tendo-se concluído pela licitude do despedimento, fica prejudicada a apreciação da questão da oposição à reintegração deduzida pelas recorridas.

DECISÃO

Pelo exposto delibera-se:

1 – Negar a revista e confirmar o acórdão recorrido.

3 – Condenar o recorrido nas custas.

Anexa-se o sumário do acórdão.

Lisboa, 30.06.2016

Ribeiro Cardoso (Relator)

Pinto Hespanhol

Gonçalves Rocha



_______________________________________________________
[1] Acórdão redigido segundo a nova ortografia com exceção das transcrições (em itálico) em que se manteve a original.
[2] Cfr. 635º, n.º 3 e 639º, n.º 1 do Código de Processo Civil, os Acs. STJ de 5/4/89, in BMJ 386/446, de  23/3/90, in AJ, 7º/90, pág. 20, de 12/12/95, in CJ, 1995, III/156, de 18/6/96, CJ, 1996, II/143, de 31/1/91, in BMJ 403º/382, o ac RE de 7/3/85, in BMJ, 347º/477, Rodrigues Bastos, in “NOTAS AO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL”, vol. III, pág. 247 e Aníbal de Castro, in “IMPUGNAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS”, 2ª ed., pág. 111.    
[3] Ac. TC nº 606/2007: “Apesar de em processo civil não estar constitucionalmente assegurado um direito ao recurso das decisões judiciais…”.
[4] Ac. STJ de 5/4/89, in BMJ, 386º/446 e Rodrigues Bastos, in NOTAS AO Código de Processo CivIL, Vol. III, pág. 247, ex vi dos arts. 663º, n.º 2 e 608º, n.º 2 do CPC.
[5] Tal como resulta dos factos provados 1) a 7), a II era detentora de 100% do capital da HH, que, por sua vez detinha 100% do capital da CC, a II era também detentora de 100% do capital da JJ que era detentora de 100% do capital da EE e de 100% do capital da KK, que detinha 100% do capital da DD, SL.
[6] Maria do Rosário Palma Ramalho, Tratado de Direito do Trabalho, Parte II, Situações Laborais Individuais, 5ª edição, pág. 954.
[7] Pedro Romano Martinez, Da Cessação do Contrato, 2015, 3ª edição, págs. 427 e 428.
[8] Ac. do STJ de 28.01.2016, proc. 1715/12.6TTPRT.P1.S1 (Cons. Leones Dantas).
[9] António Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 17ª edição, pág. 514.
[10] Neste sentido Maria do Rosário Palma Ramalho, in ob. cit. págs. 957 e 958.
[11] Ac. do STJ de 5.01.2012, proc. 3937/04.4TTLSB.L1.S1 (Cons. Sampaio Gomes).
[12] António Monteiro Fernandes, in ob. cit. pág. 519.
[13] São nossos todos os sublinhados que doravante forem inseridos.