Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
026949
Nº Convencional: JSTJ00008193
Relator: MAGALHÃES BARROS
Descritores: REINCIDENCIA
PENAS
FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: SJ195007030269493
Data do Acordão: 07/03/1950
Votação: MAIORIA COM 4 VOT VENC
Referência de Publicação: DG IªS 22-07-1950; BMJ N20, 209
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PARA O PLENO
Decisão: FIXADA JURISPRUDÊNCIA
Indicações Eventuais: ASSENTO 9/1950
Área Temática: DIR CRIM - TEORIA GERAL.
Legislação Nacional: CP886 ARTIGO 55 N1 N2 N3 N4 ARTIGO 57 N1 N2 N3 N4 ARTIGO 91 PAR1 PAR3 ARTIGO 92 ARTIGO 100 N1 N2 N3 N4 ARTIGO 351 ARTIGO 355 ARTIGO 356 ARTIGO 433.
DL 26643 DE 1936/05/28 ARTIGO 56 ARTIGO 109 ARTIGO 137 ARTIGO 139 ARTIGO 459 ARTIGO 460.
L DE 1867/07/01 ARTIGO 11 ARTIGO 14.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO STJ DE 1948/01/21 IN BMJ N5 PAG143.
ACÓRDÃO STJ DE 1937/06/18 IN COL OF ANO36 PAG213.
ACÓRDÃO STJ DE 1948/11/03 IN BMJ N10 PAG150.
ASSENTO STJ DE 1949/07/12 IN BMJ N14 PAG81.
Sumário :
Estão revogados para a metropole, em crimes comuns, os ns. 1 a 4 do artigo 100 do Codigo Penal e o artigo
14 da Lei 1 de Julho de 1867, sendo a agravação neles prevista efectuada nos termos da segunda parte dos paragrafos 1 e 3 do artigo 91 e do artigo 92 do mesmo Codigo e artigo 11 daquela lei.
Decisão Texto Integral: Acordam em Tribunal Pleno no Supremo Tribunal de Justiça:

No acordão de 3 de Novembro de 1948, proferido no presente processo - e ja publicado no Boletim do Ministerio da Justiça, n. 10, pagina 150 -, decidiu-se:
Que os crimes de ofensas corporais voluntarias e homicidio voluntario são da mesma natureza para efeitos de reincidencia;


Que a agravação da pena, por motivo da reincidencia, se fazia por meio do disposto no artigo 100 do Codigo Penal.


Deste acordão recorreu para o Tribunal Pleno o ilustre representante do Ministerio Publico, alegando que o mesmo se encontra em oposição - relativamente aos dois referidos pontos - com os acordãos, tambem deste Supremo Tribunal, de 21 de Janeiro de 1948, no citado Boletim, n. 5, pagina 143, e de 18 de Junho de 1937, na Colecção Oficial, ano 36, pagina 213, porquanto se decidira:


Naquele, que o crime de ofensas corporais voluntarias e homicidio voluntario, não eram crimes da mesma natureza para efeitos de reincidencia, e neste, que a agravação da pena se fazia - dado o disposto nos artigos 56 e 459 da Reforma Prisional -, de harmonia com o preceituado nos artigos 91 e 92 do Codigo Penal, aumentando-se a sua duração, mas suprimindo-se a prisão no lugar do degredo, ordenada no artigo 100, por inexequivel.


A oposição entre os acordãos citados e manifesta, como ja foi julgado pelo acordão de secção de 2 de Fevereiro de 1949, a folhas 141.
Consequentemente, e porque todos os acordãos transitaram em julgado e foram proferidos no dominio da mesma legislação, ha que tomar conhecimento do recurso e decidir.


E assim:


Por assento deste Supremo Tribunal, de 12 de Julho de 1949 - publicado no ja citado Boletim, n. 14, pagina 81, - foi decidido que os crimes de ofensas corporais voluntarias e homicidio voluntario não são crimes da mesma natureza para efeitos de reincidencia, pelo que o presente processo tem de voltar a secção para se lhe aplicar o dito assento.


Firmou-se, assim, doutrina em sentido contrario ao que se julgou no acordão recorrido, doutrina que neste momento cumpre acatar.
Desta forma, e porque a verificação da agravante da reincidencia e pressuposto da 2 questão suscitada no presente recurso, poderia, a primeira vista, entender-se que ele ficava sem objectivo, não havendo, consequentemente, que proferir qualquer assento.


Mas não.


Com efeito, verificando-se a existencia de conflito de jurisprudencia quanto a aplicabilidade dos ns. 1 a 4, inclusive, dos artigos 100 do Codigo Penal e 14 da Lei de 1 de Julho de 1867, ha que resolve-lo.


Impõe-se, assim, decidir quais as regras de agravação das penas dos ns. 1 a 4 do artigo 55 e 1 a 4 do artigo 57 do Codigo citado, ocorrendo a reincidencia.
Ora a agravação especial das penas de prisão maior seguida de degredo, previstas nos ns. 1 a 4 do artigo 55 e das aplicaveis em alternativa, previstas em os ns. 1 a 4 do artigo 57, encontrava-se estabelecida nos ns. 1 a 4 do artigo 100, e consistia na fixação dum periodo de prisão no lugar do degredo.
Como o revela esta forma de agravamento, a pena de degredo era cumprida em liberdade, pois de outro modo não se compreenderia que a prisão no degredo por certo tempo, fosse agravamento de pena.
Sucede, porem, que hoje, em consequencia dos artigos 56 e 459 da Reforma Prisional, o degredo cumpre-se nas Penitenciarias da metropole como prisão maior, reduzido de um terço na duração, tornando-se, por isso, impossivel o seu agravamento atraves da imposição do cumprimento de parte dele em prisão -, pois e neste regime que, na totalidade, e cumprido.
Ha, portanto, incompatibilidade entre os ns. 1 a 4 do artigo 100 do Codigo Penal e 14 da Lei de 1 de Julho de 1867 com os artigos 56 e 459 da Reforma Prisional, - incompatibilidade de natureza que obsta a possibilidade da aplicação simultanea das duas ordens de disposições, devendo, por isso, aqueles preceitos considerarem-se tacitamente revogados por estes.


Deixou assim a agravação da pena, no caso de reincidencia de poder fazer-se, na metropole, quanto a crimes comuns, segundo as regras especiais, estabelecidas naquelas disposições, em consequencia da revogação do preceito legal que as continha; so podendo fazer-se, presentemente, de harmonia com as regras gerais de agravação quando concorra aquela agravante, ou sejam, as regras da 2 parte dos paragrafos 1 e 3 do artigo 91 e do 92 do Codigo Penal e 11 da lei de 1 de Julho de 1867, aumentando-se a duração da prisão maior celular ate mais 2 anos e a pena fixa de degredo ate mais 3.


Pelas razões expostas, firma-se o seguinte assento:


Estão revogados para a Metropole, em crimes comuns, os ns. 1 a 4 do artigo 100 do Codigo Penal e artigo 14 da Lei de 1 de Julho de 1867, sendo a agravação neles prevista efectuada nos termos da 2 parte dos paragrafos 1 e 3 dos artigos 91 e do 92 do mesmo Codigo e artigo 11 daquela Lei.
Sem imposto de justiça.



Lisboa, 03 de Julho de 1950

Antonio de Magalhães Barros (Relator) - Jose de Abreu Coutinho - Lencastre da Veiga - Campelo de Andrade -
- Bordalo e Sa - A. Bartolo - Jaime de Almeida Ribeiro - Pedro de Albuquerque - Roberto Martins - Artur A. Pereira - Rocha Ferreira (Vencido nos termos em que, pelo Ministerio Publico, foram postas as questões consideradas em conflito, o conhecimento da segunda ficou prejudicado pelo da primeira, ja decidida e a que deu lugar o assento de 12 de Julho de 1949.


Alem disso, não havia conflito de jurisprudencia a resolver, visto no acordão invocado para confronto se ter tratado das agravantes de sucessão e acumulação de crimes e no acordão recorrido se tratar da de reincidencia.
Por isso, entendi que se devia considerar findo o recurso). - Raul Duque (Vencido em parte. Versa o acordão duas questões - referindo-se a primeira a serem havidos ou não como crimes da mesma natureza para efeitos de reincidencia, os crimes de ofensas corporais voluntarias, e de homicidio voluntario e a segunda a agravação de penas por motivo de reincidencia.
Relativamente a primeira, bem decidiu o acordão, visto o assento de 12 de Julho de 1949 que tem de ser aplicado em termos devidos.
Quanto a segunda, discordo inteiramente. A questão esta mal posta. Não ha conflito nem foi declarada a existencia de oposição pela secção respectiva e so depois de tal suceder e que o Pleno poderia pronunciar-se.
Do que no acordão que se invocou se tratava, era de agravação de pena por motivo de agravante de sucessão e de acumulação de crimes e não de reincidencia, como dele se ve e a cuja doutrina se não atendeu com precisão. As questões são diversas. Ora não havendo conflito não poderia tirar-se qualquer assento sem reconhecimento previo da existencia de tal conflito).
- Alvaro Ponces (Vencido; ainda hoje se mantem o degredo, como logo se alcança do n. 24 do relatorio da Reforma Prisional e dos artigos 109 e 460 desta Organização.


O artigo 137 do Decreto-Lei n. 26643 preve o degredo com prisão.
E a execução da pena a cumprir nas Colonias obedece ao regime das cadeias e penitenciarias destinadas a presos de dificil correcção - artigo 139.
Posteriormente a Reforma Prisional publicaram-se diplomas que mandam aplicar a prisão no lugar do degredo.


O Supremo Tribunal de Justiça não funciona como orgão legislativo do Estado e não pode revogar claros preceitos legais.
A prisão no lugar do degredo encontra-se em varios artigos do Codigo Penal, em punição de crimes graves - artigos 351, 355, 356, 433 e outros.
A doutrina do assento vai dificultar seriamente a aplicação deste preceitos).
- A. Cruz Alvura (Vencido pelos mesmos fundamentos do voto que imediatamente antecede).