Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
96/20.9PHOER.L1.S1
Nº Convencional: 3.ª SECÇÃO
Relator: PAULO FERREIRA DA CUNHA
Descritores: RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA
ACORDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
ACLARAÇÃO
QUESTÃO NOVA
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
INCONSTITUCIONALIDADE
NULIDADE
METADADOS
INDEFERIMENTO
Data do Acordão: 05/04/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: ACLARAÇÃO INDEFERIDA
Sumário :
I. Considerando a estrutura processual penal, a natureza e objetivo dos recursos, é entendimento unânime que os mesmos consubstanciam verdadeiros “remédios jurídicos”, no sentido em que o seu único objetivo é apurar da adequação e legalidade das decisões sob recurso. Como tal, não se destinam os recursos a conhecer questões novas, i. e., que não tenham sido anteriormente apreciadas pelo tribunal recorrido (Cf. Acórdãos do STJ, de 8 de março de 2007, processo n.º 447/07 e de 2 de maio de 2007, processo n.º 1243/07).           

II. Não obstante na decisão da 1.ª Instância se fazer menção, ao elencar todos os elementos de prova constantes dos autos, ao registo de tráfego da operadora relativo aos cartões, a verdade é que o Tribunal não baseia a sua convicção, no que respeita à matéria de facto, no referido meio de prova, encontrando-se profusamente fundamentada quer na prova testemunhal, quer nos demais elementos documentais, não se fazendo qualquer referência a esse registo como sendo relevante para a decisão acerca da factualidade provada e não provada.

Acresce que tal matéria não é de conhecimento oficioso (artigo 126.º, n.º 3 do CPP), por não consubstanciar nulidade insanável.

Por outro lado, o ora invocado foi efetuado em requerimento autónomo e totalmente independente das alegações de recurso apresentadas, pelo que, em face disso, não integra o seu objeto.

Nesta medida, tratando-se de matéria nova nunca anteriormente invocada, nem referida no âmbito das alegações de recurso anteriormente apresentadas, não teria a mesma de ser apreciada no acórdão reclamado, por extravasar o objeto do recurso e os poderes de cognição deste Tribunal.

Como tal, em face do exposto, julgou-se improcedente a nulidade invocada pelos recorrentes.

III. Invocando um dos recorrentes que no acórdão proferido não teria sido apreciada a alegada inconstitucionalidade dos artigos 428.º e 141.º, n.os 4 e 5 do CPP, arguida nas suas alegações de recurso, tal realmente se não verificou. O acórdão em causa pronunciou-se, excluindo do âmbito de apreciação do recurso, nomeadamente, as inconstitucionalidades relativamente às quais o recorrente entende existir omissão de pronúncia (Cf. Acórdão do STJ, de 16 de fevereiro de 2022, Proc. n.º 333/14.9TELSB.L1-A.S1). Rejeitar também é pronunciar-se. De forma aliás ponderosa, porque liminar.

IV. Da mesma forma, inexiste também qualquer omissão de pronúncia no que respeita às nulidades de que padeceria o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, invocadas pelo Recorrente nas suas alegações de recurso.

No acórdão reclamado é fundamentada, de forma compreensível, a decisão de confirmar o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, validando-se a sua decisão, nomeadamente, quanto à matéria de facto, a qual não se encontrava inquinada por qualquer vício, sendo jurisprudência dominante neste Supremo Tribunal de Justiça que, para efeitos de omissão de pronúncia, o relevante é apreciar se o tribunal conheceu, ou não, as questões que são objeto do recurso, não lhe incumbindo apreciar e rebater, de forma exaustiva, os argumentos em que os sujeitos processuais se apoiam para sustentar a sua pretensão (Cf. v.g. Acórdão do STJ, de 24 de março de 2021, Proc. n.º 1144/19.0T9PTM.E1.S1). Assim, inexiste, também, nessa parte, qualquer omissão de pronúncia.

V. Após ser proferida uma decisão final, e inexistindo a possibilidade de se interpor recurso ordinário, os interessados apenas poderão reagir contra as nulidades da sentença/acórdão expressamente indicadas no artigo 379.º CPP, bem como solicitar a correção da decisão, quando não tiver sido observado ou não tiver sido integralmente observado o disposto no artigo 374.º CPP, ou na situação de a mesma conter erro, lapso, obscuridade ou ambiguidade cuja eliminação não importe modificação essencial.

É manifesto que a alegação de uma inconstitucionalidade, nesta fase, não é processualmente admissível, não se integrando na previsão de nenhum dos mencionados normativos (cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 26 de outubro de 2016, processo n.º 1642/15.5YRLSB-A.S1). Mais concretamente, no que respeita às eventuais nulidades da decisão, importa clarificar que a hipotética aplicação de uma norma inconstitucional não consubstancia qualquer uma das causas de nulidade da decisão previstas nas alíneas a) a c) do n.º 1 do artigo 379.º do CPP.

Assim, o presente incidente pós-decisório não é o momento adequado para proceder à invocação de qualquer inconstitucionalidade, a qual necessariamente deverá ser alegada, em sede de recurso, para o Tribunal Constitucional (cf. ainda o artigo 70.º, n.º 1 da Lei do Tribunal Constitucional. Além de jurisprudência uniforme do Supremo Tribunal de Justiça, também a do Tribunal Constitucional, v.g. Acórdão n.º 50/2018). Só para o Tribunal Constitucional poderia recorrer-se, verificados os respetivos requisitos, mas sempre se refira que inexiste qualquer inconstitucionalidade, nos termos pretendidos pelo recorrente.

VI. Quanto à alegada omissão de pronúncia sobre as questões levantadas relativas à condenação do arguido pela prática dos crimes de burla informática e de furto na forma tentada, insiste-se que a rejeição parcial do recurso, designadamente, no caso, com base na dupla conforme, consubstancia, ela própria, uma decisão.

Como tal, inexiste qualquer omissão de pronúncia, pelo que improcede a referida invocação.

Ademais, no que respeita à invocação de inconstitucionalidade, e como se referiu supra, o presente incidente pós-decisório não é o meio processualmente adequado para proceder à mesma, por não se integrar no elenco taxativamente estabelecido nos artigos 379.º e 380.º do CPP, pelo que não se aprecia a mesma. Nesta medida, em face do exposto, julga-se improcedente a reclamação apresentada.

VII. Acordou-se assim em indeferir a arguição de nulidades e as reclamações apresentadas pelos recorrentes.          

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça


I

Relatório



1. Após a prolação de acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, a 31.01.2023, vieram os arguidos AA e BB, por requerimentos datados, respetivamente, de 13.02.2023 e de 15.02.2023, apresentar reclamação ao referido aresto, arguindo nulidades e inconstitucionalidades do mesmo.


2. O recorrente AA fê-lo, em suma, nos seguintes termos, considerando que:

-   O Tribunal a quo não se pronunciou sobre o Requerimento apresentado pelo Recorrente em 12/07/2022, com a referência ...80, posterior às alegações de recurso, onde invoca ter sido utilizada, pelo Tribunal de 1.ª Instância, uma prova proibida, em conformidade com o teor do Acórdão n.º 268/2022, de 19 de abril de 2022, que declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, do artigo 9.º da Lei n.º 38/2008, de 17 de julho;

-     Não se pronunciou também sobre a inconstitucionalidade invocada dos artigos 428.º e 141.º, n.os 4 e 5 do CPP;

-     Afirma, ainda, existir omissão de pronúncia por o acórdão reclamado não ter conhecido sobre as nulidades de que padecia o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, invocadas pelo Recorrente nas suas alegações de recurso;

-     O arguido invoca também a inconstitucionalidade dos artigos 425.º, n.º 1, alínea c) e n.º 4 e 379.º, n.º 2, todos do Código de Processo Penal e 608.º do Código de Processo Civil, quando interpretados no sentido que “[s]endo admitido Recurso ordinário para o Supremo Tribunal de Justiça, não é admissível recurso do acórdão do tribunal da Relação que decidiu não se verificarem nulidades que o arguido imputou à decisão da 1ª instância, por se verificar um caso de dupla conforme” e no sentido em que “[s]endo admitido Recurso Ordinário para o Supremo Tribunal de Justiça, não está este Tribunal obrigado a conhecer da Nulidade por Omissão de Pronúncia imputada ao Acórdão do Tribunal da Relação”;

-    Finalmente, entende o recorrente que há omissão de pronúncia, uma vez que o Tribunal estava obrigado a conhecer dos recursos, na parte relativa à sua condenação pela prática dos crimes de burla informática e de furto, na forma tentada;

-      Invocando a inconstitucionalidade dos artigos 400.º, n.º 1, alínea e), e 432.º, n.º 1, alínea b), ambos do Código de Processo Penal, na redação introduzida pela Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro, na interpretação segundo a qual não é admissível recurso, para o Supremo Tribunal de Justiça, de acórdãos proferidos em recurso, pelas Relações, que, inovatoriamente face à absolvição ocorrida em 1.ª Instância, condenem os arguidos em pena de prisão efetiva.


3. Por seu turno, o recorrente BB invocou a omissão de pronúncia do acórdão reclamado, alegando que o Tribunal a quo não se havia pronunciado sobre requerimento por si apresentado em 13.07.2022, com a referência ...47, em que defende que, no caso sub judice, quer o Tribunal de 1.ª Instância, quer o Tribunal da Relação, utilizaram, nos termos do artigo 4.º da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, prova proibida.


Após colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir em Conferência.


II

Fundamentação

A

Enquadramento Geral



1. O cerne das questões levantadas reconduz-nos à omissão de pronúncia. Sem prejuízo do que infra se dirá mais em concreto, relativamente ao caso sub judice, tenham-se presentes alguns parâmetros gerais, que são pano de fundo fundamentador.


2. Como foi explanado, inter alia, no Acórdão do STJ proferido no Proc. nº 35/18.7GBVVC. E1.S1, de 10-02-2020, a completude e cabal fundamentação e decisão de um Acórdão não dependem de uma exauriente análise de todos e quaisquer argumentos (ou mesmo eventuais excursos e obter dicta) das alegações das partes, mas de uma resposta clara, compreensível, lógica e fundamentada às questões efetivamente fundantes colocadas, em geral já de si resumidas em Conclusões das alegações apresentadas. Deve haver uma resposta direta e cabal do Tribunal decisor ao thema decidendum. Por uma questão, desde logo, de economia processual, celeridade na resposta e omissão devida de atos inúteis. Havendo profusa jurisprudência que o atesta.

Já Santi Romano, num texto certeiro (Glissez mortels, n’appuyez pas, no seu Frammenti di un Dizionario Giuridico, Milão, Giuffrè, 1947, p. 117), chamava a atenção para o caráter fastidioso e inútil, além de juridicamente imprudente (e contrário ao caráter da nossa disciplina), a dissecação microscópica (“de um cabelo em três”), para além da exatidão e precisão e da visão sintética e integral. Não poupa críticas essa “subtileza”. E já Loysel, nas clássicas Institutes coutumières, dizia que quem melhor sintetiza prova melhor: qui mieux abreuve, mieux preuve.  

Com efeito, a omissão de pronúncia, geradora até de nulidade da decisão (e justamente, quando realmente se verifique) está em correspondência direta com o dever imposto ao juiz no sentido de o mesmo ter de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas (v.g.) aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução (ou resposta) dada a outra.

Tal não significa, porém, que o juiz se tenha de ocupar de todas as considerações feitas pelas partes, já que são coisas diferentes deixar de conhecer de questão de que devia conhecer e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento, ou razão produzida nos autos.

Em consequência, a nulidade por omissão de pronúncia apenas se verificará nos casos em que a omissão de conhecimento, relativamente a cada questão efetiva e recortadamente (em geral nas Conclusões) suscitada, é absoluta, ou quando se tenham descurado as razões e argumentos invocados pelas partes (e não, por exemplo, quando a apreciação das questões fundamentais à justa decisão da lide tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras).

Vejam-se, neste sentido, a título meramente exemplificativo, os arestos do Supremo Tribunal de Justiça de 07-04-2016, Proc. 6500/07.4TBBRG.G2.S3, de 31-05-2016, de 15-02-2017, Proc. 3254/13.9TBVCT.G1.S1, e de 22-01-2019, Proc. 432/15.0T8PTM.E1.S1.


3. Dispõe o artigo 379, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Penal que “é nula a sentença quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.”. Abarca o normativo, evidentemente, quer a omissão de pronúncia quer a situação (simétrica), do excesso de pronúncia.

Por sua vez, preceitua o artigo 374.º do mesmo diploma legal, relativamente ao conteúdo da sentença, que a mesma se inicia por um relatório, ao qual se segue “a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal” (n.º 2).

Ademais, dispõe o artigo 425.º, n.º 4, do CPP que é correspondentemente aplicável aos acórdãos proferidos em recurso o disposto no artigo 379.º do mesmo diploma.

Face aos normativos atrás enunciados, e para o que agora interessa,“a omissão de pronúncia significa, fundamentalmente, ausência de posição ou de decisão do tribunal sobre matérias em que a lei imponha que o juiz tome posição expressa. Tais questões são aquelas que os sujeitos processuais interessados submetam à apreciação do tribunal (art. 660.º, n.º 2, do CPC), e as que sejam de conhecimento oficioso, isto é, de que o tribunal deve conhecer, independentemente de alegação e do conteúdo concreto da questão controvertida, quer digam respeito à relação material, quer à relação processual” (cf. Ac. deste STJ de 24 de outubro de 2012, processo n.º 2965/06.0TBLLE.E1).


4. Assim, estando em causa uma decisão, as exigências de pronúncia e fundamentação dos acórdãos devem sofrer as devidas adaptações em função do objeto e do âmbito do recurso, pelo que a omissão de pronúncia apenas ocorrerá quando o tribunal deixou de se pronunciar sobre uma questão que devia ter apreciado, seja a mesma suscitada pelas partes em recurso, ou de conhecimento oficioso (artigos 425.º, n.º 4 e 379 do Código de Processo Penal).

Note-se que

 “as questões a decidir não se confundem com considerações, argumentos, motivos, razões ou juízos de valor produzidos pelas partes: a estes não tem o tribunal que dar resposta especificada ou individualizada, mas apenas aos que directamente contendam com a substanciação da causa de pedir e do pedido. Não ocorre a nulidade, por omissão de pronúncia, se não forem consideradas, na sentença, linhas de fundamentação jurídica que as partes hajam invocado”. (Ac. deste STJ de 9 de dezembro de 2014, Revista n.º 75/07.1TBCBT.G1.S1 - 1.ª Secção, acessível in www.stj.pt/jurisprudencia/sumários de acórdão/ Civil - Ano de 2014).

Não se pode, assim, confundir, cabal decisão e fundamentação do quid sub judicio com facúndia, e prolixidade. Nem decisão clara e suficiente (em termos gerais, e pressupondo um auditório generalizado) com persuasão concreta do recorrente. Ora,

 “o dever de fundamentação, na dimensão que lhe é conferida enquanto princípio fundamental decorrente do artigo 205.º, n.º 1, da CRP, e como manifestação do direito a um processo equitativo, nos termos do artigo 6.º da CEDH, implica que o tribunal de recurso, conhecendo das questões que lhe são colocadas, explicite os motivos pelos quais julga procedente ou improcedente o recurso.

Este dever de fundamentação insere-se numa exigência do moderno processo penal, com dupla finalidade: extraprocessualmente, ao constituir condição de legitimação externa da decisão, pela possibilidade que permite de verificação dos pressupostos, critérios, juízos de racionalidade e de valor e motivos que a determinaram, e intraprocessualmente, realizar o objectivo de reapreciação da decisão por via do sistema de recursos.”

[…] E sobretudo, prosseguindo:

“A falta de fundamentação não se confunde, ou não pode ter a mesma dimensão compreensiva, da falta de convencimento que essa fundamentação opera no destinatário. Para este, a fundamentação pode não ser suficiente para os fins que prossegue e que anseia da decisão do órgão jurisdicional, mas esta perspectiva não pode obumbrar o fim constitucional do dever de fundamentação” (Ac. deste STJ de 23 de maio de 2018, proferido no Proc.º n.º 630/13.0PBGMR.1.S2 - 3.ª secção, sumário disponível em www.stj/jurisprudência/acórdãos/sumários de acórdãos/Criminal - Ano de 2018.” (Ac. deste STJ de 14 de maio de 2020, proferido no Proc.º n.º 498/18.0YRLSB.S1).


5. Por vezes ocorre que se invoca a omissão de pronúncia com base em um qualquer tipo de insatisfação do recorrente com a cabal resposta do Tribunal aos problemas suscitados, nomeadamente, apenas, por eventual não diálogo com o pormenor ou a totalidade de argumentos invocados. Neste caso, trata-se de manifestações não de uma objetividade de situações decorrente de forma fática dos acórdãos postos em crise, mas de uma interpretação do recorrente apenas. Não raro se trata, meramente, de manifestação de discordância com os factos dados como provados, com a fundamentação, ou com a sentença, envolta em argumentação que afirma omissão de pronúncia. 

Obviamente nestes casos os recursos não poderão proceder.



B

Do Caso e do Direito



1. Vieram os arguidos AA e BB invocar que o acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça em 31 de janeiro de 2023, é nulo, por omissão de pronúncia, nos termos dos artigos 379.º, n.º 1, alínea c) e n.º 2, do Código de Processo Penal, por alegadamente não ter apreciado os requerimentos anteriormente juntos pelos referidos recorrentes, em que defendiam ter sido utilizada um meio de prova proibida.

Invocam os recorrentes que há omissão de pronúncia em virtude de o acórdão não ter apreciado a questão de ter sido utilizada uma prova proibida, o que havia sido invocado nos seus requerimentos datados de 12 e 13 de julho de 2022.

O que foi apresentado após as respetivas alegações de recurso, encontrando-se, inclusivamente, já o processo distribuído neste Supremo Tribunal de Justiça.

2. Invoca o recorrente AA, nesse âmbito, em suma, que:

«Para a identificação e colocação dos Arguidos no local da prática do crime e bem assim, para posteriormente, detenção do Arguido BB, foram fundamentais os registos de tráfego da Operadora ALTICE, de fls. 413 a 616.

4º - Com efeito no seu Acórdão fls. 23 e seguintes e seguintes o Tribunal descreve a prova que se socorreu para dar como provada a matéria de facto.

5º - A fls. 25 o Tribunal de 1ª instância descreve expressamente que teve em atenção e considerou para dar como provada a matéria de facto:

“- Registo de tráfego da operadora ALTICE, relativo aos cartões ...84 e ...53, fls. 413 a 616”

6º - Analisando os referidos documentos constatamos que os mesmos contêm as localizações dos telemóveis dos arguidos entre os dias 01/04/2020 e o dia 14/04/2020.

7º - Os referidos metadados foram guardados ao abrigo da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho.

8º - Em 24/02/2022 foi proferido Acórdão pelo Tribunal da Relação de Lisboa, o qual condenou o Recorrente numa pena de 23 (vinte e três) anos e 6 (seis) meses de prisão.

9º - Em 02/04/2022 o Arguido Recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça.

10º - Acontece, porém, que no dia 03 de junho de 2022 foi publicado no Diário da República, 1ª série, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 268/2022 no qual se decidiu:

a) Declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante do artigo 4º da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, conjugada com o artigo 6º da mesma lei, por violação do disposto nos n.º 1 e 4 do artigo 35º e do n.º 1 do artigo 26º, em conjugação com o n.º2 do artigo 18º, todos da Constituição;

b) Declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma do artigo 9º da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, relativa à transmissão de dados armazenados às autoridades competentes para investigação, deteção e repressão de crimes graves, na parte em que não prevê uma notificação ao visado de que os dados conservados foram acedidos pelas autoridades de investigação criminal, a partir do momento em que tal comunicação não seja suscetível de comprometer as investigações nem a vida ou integridade física de terceiros, por violação do disposto no n.º1 do artigo 35º e do n.º1 do artigo 20º, em conjugação com o n.º2 do artigo 18º, todos da Constituição.”

11º - O Recorrente nunca foi notificado de que os dados conservados foram acedidos pelas autoridades de investigação criminal.

12º - Não restam quaisquer dúvidas que no caso sub judice quer o Tribunal de 1ª instância, quer o Tribunal da Relação utilizaram, nos termos do artigo 4º da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, prova proibida.

Termos em que, considerando que o Acórdão n.º 268/2022, de 19/04/2022, publicado no Diário da República, Iª série, em 03 de junho de 2022. tem força obrigatória, deve o presente processo ser remetido ao Tribunal de 1ª instância para que suprida a referida inconstitucionalidade e proibição de prova, seja proferido novo Acórdão em conformidade.»


Da mesma forma, refere o recorrente BB que:

«Para a identificação e colocação dos Arguidos no local da prática do crime e bem assim, para posteriormente, detenção do aqui Recorrente, BB, foram fundamentais os registos de tráfego da Operadora ALTICE, de fls. 413 a 616.

Com efeito no seu Acórdão fls. 23 e seguintes, o Tribunal descreve a prova que se socorreu para dar como provada a matéria de facto.

A fls. 25 o Tribunal de 1ª instância descreve expressamente que teve em atenção e considerou para dar como provada a matéria de facto:

“- Registo de tráfego da operadora ALTICE, relativo aos cartões ...84 e ...53, fls. 413 a 616”

Ao realizar uma análise ponderada aos referidos documentos constatamos que os mesmos contêm as localizações dos telemóveis dos Arguidos entre os dias 01/04/2020 e o dia 14/04/2020.

Os referidos metadados foram guardados e conservados ao abrigo da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho.

Em 24/02/2022 foi proferido Acórdão pelo Tribunal da Relação de Lisboa, o qual condenou o Recorrente numa pena de 21 (vinte e um) anos e 6 (seis) meses de prisão.

Em consequência, em 30/03/2022 o Arguido recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça.

Acontece, porém, que no dia 03 de junho de 2022, portanto, depois de proferido e transitado aquele douto acórdão pelo Tribunal da Relação de Lisboa - foi publicado no Diário da República, 1ª série, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 268/2022 no qual se decidiu:

a) Declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante do artigo 4º da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, conjugada com o artigo 6º da mesma lei, por violação do disposto nos n.º 1 e 4 do artigo 35º e do n.º 1 do artigo 26º, em conjugação com o n.º 2 do artigo 18º, todos da Constituição;

b) Declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma do artigo 9º da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, relativa à transmissão de dados armazenados às autoridades competentes para investigação, deteção e repressão de crimes graves, na parte em que não prevê uma notificação ao visado de que os dados conservados foram acedidos pelas autoridades de investigação criminal, a partir do momento em que tal comunicação não seja suscetível de comprometer as investigações nem a vida ou integridade física de terceiros, por violação do disposto no n.º1 do artigo 35º e do n.º1 do artigo 20º, em conjugação com o n.º2 do artigo 18º, todos da Constituição.”

O Recorrente nunca foi notificado de que os dados conservados foram acedidos pelas autoridades de investigação criminal.

Não restam quaisquer dúvidas que no caso sub judice quer o Tribunal de 1ª instância, quer o Tribunal da Relação utilizaram, nos termos do artigo 4º da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, prova proibida.

Quando foi prolatado os doutos acórdãos (22/06/2021 e 24/02/2022) que condenou o Recorrente, não tinha sido ainda publicada no Diário da República, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 268/2022.

Razão pela qual, evidentemente, nem a 1ª Instância nem a Relação, ao pronunciar-se sobre metadados que foram guardados e conservados ao abrigo da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, não podia ter ponderado nem, muito menos, aplicado – como não ponderou e aplicou – a inconstitucionalidade que foi declarada e publicada em Diário da República acerca desse diploma.

Regime, todavia, que consubstancia lei penal mais favorável.

Na verdade, dele resulta, por comparação com a lei vigente ao tempo do acórdão e por este aplicada, que o Recorrente nunca foi notificado de que os dados conservados foram acedidos pelas autoridades de investigação criminal e que a prova utilizada, nos termos do artigo 4º da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, é proibida.

Esta alteração inculca, como se disse e por comparação com o derrogado, um regime legal mais favorável ao arguido.

Face ao Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 268/2022, o tribunal tem de declarar inconstitucional a prova que sustentou os respetivos Acórdãos com base na Lei n.º 32/2008, de 17 de julho e considerar essa prova proibida.

Decorre desta possibilidade que o juízo final da avaliação do quadro em que assenta a inconstitucionalidade da prova respeitante aos metadados que foram guardados e conservados ao abrigo da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, se tornou mais favorável ao condenado: o tribunal

pode agora – e não podia antes – optar por considerar essa prova nula e, em consequência, proibida.

Estão, assim, reunidas as condições que permitem a reabertura da audiência para aplicação retroativa da lei penal mais favorável, nos termos do artº 371º-A, CPP.

Sobeja a questão de saber qual o tribunal competente para reabrir a audiência, nos termos do artº 371º-A, CPP.

Questão que, no entender do Requerente, terá de resolver-se a favor do tribunal de primeira instância.

Se outras razões não houvesse, assim o imporia o direito ao recurso da decisão que aplique (ou não aplique) a nova lei mais favorável.

NESTES TERMOS REQUER:

- se ordene que o processo baixe à primeira instância, para que o Tribunal de 1ª Instância aplique ao Arguido a lei penal mais favorável resultante da publicação do Acórdão n.º 268/2022, de 19/04/2022, publicado no Diário da República, Iª série, em 03 de junho de 2022, para que suprida a referida inconstitucionalidade e proibição de prova, seja proferido novo Acórdão em conformidade.

SEM PRESCINDIR,

e por mera cautela, o Arguido vai requerer diretamente ao Tribunal de 1ª Instância a reabertura da audiência, nos termos e pelas razões que ficaram expostas.»


Pronunciou-se por sua vez o Ministério Público, alegando que:

“(…) lida a motivação da decisão sobre a matéria de facto do tribunal de 1.ª instância que foi praticamente confirmada pelo TRL, verifica-se que os alegados metadados de nada serviram para a formação da convicção do tribunal no sentido de que os arguidos, atuando conjuntamente, cometeram o crime horrendo do homicídio da própria mãe do AA.

A localização dos telemóveis dos arguidos em nada contribuiu para a decisão da matéria de facto, sendo certo que os próprios arguidos confessaram parcialmente a prática do crime e as suas motivações.”

Ora, estabelece o artigo 410.º, n.º 1 do Código de Processo Penal que «[s]empre que a lei não restringir a cognição do tribunal ou os respectivos poderes, o recurso pode ter como fundamento quaisquer questões de que pudesse conhecer a decisão recorrida».

Tendo em conta a estrutura processual penal, a natureza e objetivo dos recursos, é entendimento unânime que os mesmos consubstanciam verdadeiros “remédios jurídicos”, no sentido em que o seu único objetivo é apurar da adequação e legalidade das decisões sob recurso. Como tal, em consequência, não se destinam os recursos a conhecer questões novas, que não tenham sido anteriormente apreciadas pelo tribunal recorrido[1].

Nesta medida, o recurso permite a reapreciação (e não apreciação ex novo) de decisões de uma instância inferior, ou seja, numa «fórmula impressiva, no recurso não se decide, com rigor, uma causa, mas apenas questões específicas e delimitadas que tenham já sido objecto de decisão anterior pelo tribunal a quo e que um interessado pretende ver reapreciadas»[2].

Assim, os recursos visam alterar as sentenças recorridas e não criar decisões sobre matéria nova, pelo que, no recurso que seja interposto para este Supremo Tribunal, de acórdão que tenha sido proferido, em recurso, pelo Tribunal da Relação, os recorrentes não poderão, de forma inovatória, colocar questões que não foram alegadas no âmbito do recurso anterior, interposto para a Relação[3], só podendo este recurso para o Supremo Tribunal de Justiça basear-se

«na discordância perante os fundamentos que sustentam o decidido neste acórdão, e os que constam da decisão da 1.ª instância, já sufragados pelo tribunal superior, posto que os recursos visam o reexame da decisão impugnada e não da decisão que foi objecto de reexame pela decisão impugnada»[4].


Desta forma,

«[c]onstitui princípio básico e elementar em matéria de recursos o de que a impugnação de decisão judicial visa a modificação da mesma, por via do reexame da matéria nela apreciada, e não a criação de decisão sobre matéria nova, estando o tribunal de recurso limitado nos seus poderes de cognição às questões que, tendo sido objecto ou devendo ter sido objecto da decisão recorrida, sejam submetidas à sua apreciação, isto é, constituam objecto da impugnação, o qual em processo penal se define e delimita através das conclusões formuladas na motivação de recurso»[5].           

Tendo em consideração os recursos interpostos pelos recorrentes do acórdão proferido pela 1.ª Instância para o Tribunal da Relação de Lisboa, os mesmos não fazem qualquer menção à questão, agora invocada, de terem sido utilizadas provas proibidas, sendo que esse teria sido o momento processualmente adequado para o efeito (não sendo necessário que houvesse o respaldo prévio de uma decisão constitucional). Diga-se em abono da verdade o que parece ser uma evidência, mas poderá contribuir para o mais cabal esclarecimento desta particular questão: prova proibida seria prova proibida já, não se tornou proibida meramente por virtude do Acórdão do Tribunal Constitucional, publicado em 3 de junho de 2022. O acórdão da 1.ª instância é de 22.6.2021, o da Relação de Lisboa é de 24.2.2022, são-lhe anteriores, mas não teria sido necessária a declaração prévia da inconstitucionalidade à alegação do que se crê (julga-se, plausivelmente, que já se crê, não se tendo sido colhido de surpresa pelo Acórdão referido – ou já se teria considerado se nisso se houvesse pensado) ser prova proibida. O Acórdão em causa declara, não transmuta nem cria ex novo uma realidade de ilegalidade (quando exista, o que não é o caso, aliás). Portanto, é perfeitamente razoável e legal que se requeira uma anterior invocação. Não se pode considerar o Acórdão como um bónus ou um prémio a quem não tenha considerado explicitamente o que nele se consagra.

E sempre se refira que, não obstante na decisão da 1.ª Instância se fazer menção, ao elencar todos os elementos de prova constantes dos autos, ao “Registo de tráfego da operadora ALTICE, relativo aos cartões ...84 e ...53, fls. 413 a 616”, a verdade é que o Tribunal não baseia a sua convicção, no que respeita à matéria de facto, no referido meio de prova, encontrando-se profusamente fundamentada quer na prova testemunhal, quer nos demais elementos documentais, não se fazendo qualquer referência a esse registo como sendo relevante para a decisão acerca da factualidade provada e não provada.

Acresce que tal matéria não é de conhecimento oficioso, em conformidade com o regime previsto no artigo 126.º, n.º 3 do Código de Processo Penal, por não consubstanciar nulidade insanável.


Desta forma, tal questão encontra-se vedada ao conhecimento ulterior, i.e., pelo atual Tribunal de recurso, não podendo os recorrentes vir agora suscitar a mesma, pois que, se assim não fosse, estar-se-ia a abrir a porta ao julgamento de uma questão nova, ao invés de indagar da legalidade e adequação da decisão proferida pelo tribunal inferior[6].

Nesta senda,

«a questão colocada — relativa à declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, decorrente do acórdão do Tribunal Constitucional n.º 268/2022 — agora no recurso interposto para este Supremo Tribunal de Justiça constitui questão que não foi anteriormente colocada, pelo que não há como apreciar a decisão inexistente do Tribunal da Relação; por isso, sendo questão inovatória (como aliás o recorrente salientou) nunca poderia ser do conhecimento deste Supremo Tribunal de Justiça. Na verdade, cabe a este Supremo Tribunal analisar da maior ou menor exatidão das decisões prolatadas pelos Tribunais da Relação (ou pelos Tribunais de 1.ª instância quando estamos perante um recurso per saltum); não tendo havido pronúncia no acórdão recorrido sobre uma qualquer questão, não pode em recurso analisar-se criticamente a decisão dado que não há o que analisar, por não ocorreram quaisquer considerações que possam ser suscetíveis de apreciação, por inexistência de objeto de apreciação»[7].


E ainda, no mesmo sentido:

«Portanto, vem agora o recorrente, neste recurso para o STJ, em primeiro lugar, suscitar uma questão nova, que não colocou na Relação.

Esqueceu o recorrente que os recursos destinam-se a apreciar a decisão de que se recorre (neste caso o acórdão do Tribunal da Relação ... impugnado) e não para apreciar questões novas que não foram colocadas no Tribunal recorrido, ressalvado aquelas que devam ser conhecidas oficiosamente, o que não é o caso.

Assim, se o recorrente pretendia (mesmo por adesão à fundamentação do recurso do co-arguido AA) colocar as mesmas questões daquele recorrente (no sentido de considerar que o Tribunal a quo validou e utilizou elementos de prova cuja invalidade constitui proibição de prova, nos termos do artigo 126.º, n.ºs 1 e 2, al. c), e 3, do CPP e que implicaria, nos termos do artigo 122.º, n.º 1, do CPP, a invalidade de todos os atos por esta afetados, sendo o acórdão condenatório igualmente nulo, por as provas em que se baseia serem nulas) deveria as ter apresentado no recurso para a Relação.

Não o tendo feito (por opção da defesa), como devia, perante a Relação, não pode agora suscitar novas questões no recurso para o STJ.

Em conclusão: incumbindo ao STJ rever a decisão da Relação, não existindo decisão da Relação sobre as questões que o recorrente alega (mesmo por adesão ao recurso do co-arguido), não pode o mesmo pedir o seu reexame no recurso ora em apreço.».[8]

           

Da mesma forma, ainda, pode ler-se no Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 3 de novembro de 2022[9]:

«[n]o recurso para o TRL não foi suscitada esta questão, que dela não conheceu. Assim, a questão posta é nova, pois relativamente a ela não discretearam os sujeitos processuais, não se cumpriu naquela instância o contraditório, nem sobre ela se pronunciou a decisão recorrida o que é, num processo de estrutura contraditória, pressuposto do recurso nessa parte, pois, o tribunal superior, repete-se, não se pronuncia, salvo caso de questões de conhecimento oficioso, sobre questões novas.».

           

Por outro lado, o ora invocado foi efetuado em requerimento autónomo e totalmente independente das alegações de recurso apresentadas, pelo que, em face disso, não integra o seu objeto.

Nesta medida, tratando-se de matéria nova nunca anteriormente invocada, nem referida no âmbito das alegações de recurso anteriormente apresentadas, não teria a mesma de ser apreciada no acórdão reclamado, por extravasar o objeto do recurso e os poderes de cognição deste Tribunal.

Como tal, em face do exposto, julga-se improcedente a nulidade invocada pelos recorrentes.

3. Ademais, o recorrente AA invoca, ainda, que no acórdão proferido não foi apreciada inconstitucionalidade dos artigos 428.º e 141.º, n.os 4 e 5 do Código de Processo Penal, arguida nas suas alegações de recurso.

Ora, quanto a essa matéria, no acórdão em causa, proferido a 31 de janeiro de 2023, escreveu-se que:

“A propósito da arguição de nulidades o AC do STJ de 29 de abril de 2020, processo nº 753/18.0JABRG.G1. S1, salienta que:

«O Tribunal Constitucional, nos Acórdãos n.º 659/2011, de 21/12; n.º 194/2012, de 18/04, e n.º 240/2014, de 6/03, decidiu julgar não inconstitucional a interpretação dos artigos 432.º, alínea b) e 400.º, n.º 1, alínea f), do CPP, com o sentido de ser “irrecorrível o acórdão proferido pelas Relações que contenha nulidade invocada em recurso, por não consagrar aquele normativo a exceção do recurso no caso de arguição de nulidade de acórdão”[10]. (sublinhado nosso)

No Acórdão n.º 659/2011 do Tribunal Constitucional expendeu-se: “em caso de recurso relativo a decisão condenatória, seja com fundamento em nulidades processuais, seja com fundamento em erros de julgamento atinentes ao fundo da causa, o seu objeto apelante de um terceiro grau de jurisdição será sempre o acórdão condenatório em si próprio”.

Mais adiante: “Com uma reapreciação jurisdicional, independentemente do seu resultado, revela-se satisfeito esse direito de defesa do arguido, pelo que a decisão do tribunal de recurso já não está abrangida pela exigência de um novo controle jurisdicional. E o facto de, na sequência dessa reapreciação, terem sido arguidas nulidades do acórdão do Tribunal da Relação não constitui motivo para se considerar que estamos perante uma primeira decisão sobre o thema decidendum, relativamente à qual é necessário garantir também o direito ao recurso.

Com efeito, a circunstância de os recorrentes terem arguido nulidades do acórdão do Tribunal da Relação não modifica o objeto do processo uma vez que, tal como a decisão da 1.ª instância, o acórdão do Tribunal da Relação que sobre ela recai limita-se a verificar se o arguido pode ser responsabilizado pela prática do crime que estava acusado e, na hipótese afirmativa, a definir a pena que deve ser aplicada, o que se traduz num reexame da causa.

O Acórdão do Tribunal da Relação constitui, assim, já uma segunda pronúncia sobre o objeto do processo, pelo que não há que assegurar a possibilidade de aceder a mais uma instância de controle, a qual resultaria num duplo recurso, com um terceiro grau de jurisdição”.

O Tribunal Constitucional na Decisão Sumária n.º 206/2016 e no Acórdão n.º 110/2016, decidiu: “se a norma questionada (artº 400º, 1, f) do CPP) tem natureza adjetiva, é irrelevante o tipo de ilegalidade (erro de julgamento ou nulidade) que atinja a decisão recorrida, estando garantido o direito ao recurso - em processo penal - mediante o duplo grau de jurisdição, mostram-se satisfeitas as garantias de defesa constitucionalmente consagradas”

A Constituição da República não garante ao arguido um segundo grau de recurso em matéria penal, ou seja, o direito a submeter toda e qualquer condenação e as inerentes questões a uma segunda ou dupla sindicância num terceiro grau de jurisdição, perante o Tribunal do topo da hierarquia judicial criminal. A “Constituição penal” consagrando o direito ao recurso não estabelece a obrigatoriedade de consagração de que um duplo grau de recurso. No regime processual penal o princípio regente é, com algumas exceções, o do grau único de recurso.

Do quadro constitucional e normativo resulta que o arguido tem direito à reapreciação da sua condenação, em qualquer das suas vertentes, tanto em matéria de facto como de direito. Impugnando o julgamento da matéria de facto, seja através da valoração das provas, ou dos mecanismos processualmente previstos – máxime: nulidades, designadamente, omissão de diligências essenciais, falta ou insuficiência de fundamentação, vícios lógicos da decisão, omissão de pronúncia, presunção de inocência ou in dubio pro reo -, e simultaneamente a aplicação do direito, o recurso é apreciado e decidido pelo tribunal de 2ª instância, indiferentemente da medida da pena e de o veredicto recorrido ter sido proferido por tribunal singular ou coletivo».

Conforme constitui jurisprudência do STJ, «A irrecorribilidade é extensiva a toda a decisão, aí se incluindo as questões relativas a toda a atividade decisória que lhe subjaz e que conduziu à condenação, nela incluída a da fixação da matéria de facto» (AC de 04DEZ19, processo nº 354/13.9IDAVR.P2.S1, Relator Manuel Augusto de Matos).

Pelo exposto, não é admissível recurso do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, que decidiu não se verificarem nulidades que o arguido imputou à decisão condenatória da 1ª instância, por se verificar um caso de dupla conforme, pelo que o recurso terá que ser rejeitado nesta parte.

            (…)

Com efeito, os recorrentes vieram impugnar perante este Supremo Tribunal de Justiça a matéria de facto - conclusões LX a LXXXVII - tal como a impugnaram no TRL – conclusões XXIX a XCIV.

Como supra se referiu o art. 434º, do CPP define os poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça, consagrando que «Sem prejuízo do disposto nos nºs 2 e 3 do artigo 410.º, o recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça visa exclusivamente o reexame de matéria de direito».

Citando o AC do STJ de 29 de abril de 2020, processo nº 753/18.0JABRG.G1.S1, quando o condenado impugna perante a 2ª Instância decisão de tribunal coletivo ou do júri – assim terá de ser sempre que se insurge contra a decisão em matéria de facto - e a Relação a confirma, integralmente ou a reduz (confirmação in mellius), não se admite recurso em segundo grau, perante terceira jurisdição, a não ser que a pena aplicada, parcelar ou única, seja em medida superior a 8 anos de prisão.

Nestes casos, a admissibilidade de recurso de acórdão confirmatório, restrita à sindicância da matéria de direito, está também circunscrita ao reexame da qualificação jurídica dos factos e à determinação da pena, ou, em caso de concurso de crimes, à dosimetria da pena única.

Todas as questões de facto e as questões de direito que não interfiram com a qualificação jurídica dos factos e/ou a dosimetria da pena fixada em medida superior a 8 anos de prisão, não podem ser reapreciadas outra vez, num terceiro grau de jurisdição.

Este regime de acesso ao STJ, através de um duplo grau de recurso, foi modelado pelo legislador “enquanto via de prossecução de outros direitos e interesses constitucionalmente tutelados, como sucede com a própria eficácia do sistema penal, que tem como condição a emissão de um julgamento final e definitivo em tempo razoável”.

No entendimento consolidado do Tribunal Constitucional “é de reconhecer, assim, como interesse público legitimador da restrição do direito ao recurso, a necessidade de racionalizar o acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, por forma a impedir a paralisação do órgão, reservando a intervenção do tribunal cimeiro da orgânica judicial aos casos de maior merecimento penal, desde que preservado o núcleo essencial das garantias de defesa. Como se sublinhou no Acórdão n.º 324/2013 (que se debruçou sobre a mesma dimensão normativa aqui em análise, …)”.

No caso, os arguidos AA e BB - condenados pela prática de um crime homicídio agravado nas penas de 23 e 21 anos de prisão, respetivamente - podem recorrer em 2º grau, perante o STJ, visando a sindicância da qualificação jurídica do homicídio e da medida da pena, tal como o fizeram, uma vez que foram condenados numa pena superior a 8 anos de prisão.

Contudo, o recorrente inconformado com a confirmação pela Relação, incluindo o indeferimento das nulidades arguidas, persistiu em discutir de novo o julgamento da matéria de facto e a valoração das provas, insurgindo-se contra a convicção do Tribunal Coletivo.

Como acima se referiu o art. 434º, do CPP define os poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça, consagrando que «(…) o recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça visa exclusivamente o reexame de matéria de direito, sem prejuízo do disposto nas alíneas a) e c) do n.º 1 do artigo 432.º»

No supra citado AC do STJ de 29 de abril de 2020, processo nº 753/18.0JABRG.G1. S1, relator Nuno Gonçalves, que seguimos de perto, e que importa de novo salientar, afirma-se o seguinte:

«O legislador da Lei n.º 59/98, com a alteração do regime da admissibilidade de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, quis harmonizar objetivos de economia processual com a necessidade de limitar a intervenção do STJ a casos de maior gravidade. Como se justifica na Proposta de Lei n.º 157/VII, que esteve na origem daquele diploma normativo “os casos de pequena e média criminalidade não devem, por norma, chegar ao Supremo Tribunal de Justiça”.

Ideário reafirmado na Proposta de Lei n.º 77/XII(1.ª) (GOV), que deu lugar à Lei n.º 20/2013. Explicitando-se os motivos da visada clarificação expende-se queera essencial delimitar o âmbito dos recursos para o Supremo, preservando a sua intervenção para os casos de maior gravidade”.

No Acórdão n.º 659/2011 do Tribunal Constitucional expendeu-se:em caso de recurso relativo a decisão condenatória, seja com fundamento em nulidades processuais, seja com fundamento em erros de julgamento atinentes ao fundo da causa, o seu objeto apelante de um terceiro grau de jurisdição será sempre o acórdão condenatório em si próprio

(…)

O Acórdão do Tribunal da Relação constitui, assim, já uma segunda pronúncia sobre o objeto do processo, pelo que não há que assegurar a possibilidade de aceder a mais uma instância de controle, a qual resultaria num duplo recurso, com um terceiro grau de jurisdição”.

No entendimento consolidado do Tribunal Constitucional “é de reconhecer, assim, como interesse público legitimador da restrição do direito ao recurso, a necessidade de racionalizar o acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, por forma a impedir a paralisação do órgão, reservando a intervenção do tribunal cimeiro da orgânica judicial aos casos de maior merecimento penal, desde que preservado o núcleo essencial das garantias de defesa. Como se sublinhou no Acórdão n.º 324/2013 (que se debruçou sobre a mesma dimensão normativa aqui em análise, …)”.

O Supremo Tribunal de Justiça tem a natureza de um tribunal de revista, versando os recursos que lhe sejam dirigidos exclusivamente matéria de direito. (art. 434º, do CPP).

No que respeita à matéria de facto compete ao Tribunal da Relação, nos termos do art. 428º, do CPP, «As relações conhecem de facto e de direito».

Assim sendo quanto ao conhecimento da matéria de facto não é da competência deste Supremo Tribunal.

Relativamente aos vícios previstos nas alíneas a), b) c), do nº 2, do art.º 410º do CPP é jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal que tais vícios são atinentes a matéria de facto e, por isso, o tribunal de recurso não conhece dos mesmos a pedido do recorrente, com exceção dos casos previstos art. 432º, nº1, alíneas a) e c), do CPP, em que o recorrente os pode invocar, ou seja;

«a) De decisões das relações proferidas em 1.ª instância, visando exclusivamente o reexame da matéria de direito ou com os fundamentos previstos nos nºs 2 e 3 do artigo 410.º;

c) De acórdãos finais proferidos pelo tribunal do júri ou pelo tribunal coletivo que apliquem pena de prisão superior a 5 anos, visando exclusivamente o reexame da matéria de direito ou com os fundamentos previstos nos nºs 2 e 3 do artigo 410.º»

Neste sentido, no caso em apreço, os vícios a que alude o art. 410º, do CPP, não podem ser fundamento de recurso, mas exclusivamente de conhecimento a título oficioso se os vícios resultarem do texto da decisão recorrida, por si só, ou conjugada com as regras da experiência comum [11], uma vez que os recursos em causa nos autos, não se enquadram na previsão normativa das citadas alíneas a) e c), do nº2, do art. 410º, do CPP.

Contudo, sempre se dirá, em conhecimento oficioso, que do texto da decisão recorrida por si só ou conjugada com as regras da experiência comum não existem quaisquer dos vícios contemplados no citado art. 410º, nºs 2 e 3, pelo que se mostra definitivamente assente a matéria de facto.

O acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa conheceu da matéria de facto, ao abrigo do disposto no art. 428º, do CPP, que define os poderes de cognição dos Tribunais da Relação, «As relações conhecem de facto e de direito».

Tal constitui uma concretização da garantia do duplo grau de jurisdição em matéria de facto - reapreciação por um Tribunal superior das questões relativas à ilicitude e à culpabilidade.

O recurso em matéria de facto não constitui, contudo, uma reapreciação total pelo Tribunal de recurso do complexo de elementos de prova produzidos e que serviram de fundamento à decisão recorrida, mas apenas poderá ter como objeto uma reapreciação autónoma do Tribunal de recurso sobre a razoabilidade da decisão tomada pelo Tribunal “a quo” quanto aos pontos de facto que o Recorrente considere incorretamente julgados, na base, para tanto, da avaliação das provas que, na indicação do Recorrente, imponham decisão diversa da recorrida ou determinado a renovação das provas nos pontos em que entenda que deve haver renovação da prova (cfr. Ac. do STJ de 20.01.2010, in www.stj.pt/jurisprudência/sumários de acórdãos).

O recurso da matéria de facto perante a Relação não é, assim, um novo julgamento em que a 2.ª instância aprecia toda a prova produzida e documentada em 1ª instância, como se o julgamento não existisse, tratando -se antes de um remédio jurídico, destinado a colmatar erros de julgamento, que devem ser indicados precisamente com menção das provas que demonstram esses erros e não indiscriminadamente, de forma genérica, quaisquer eventuais erros.

“O julgamento efetuado pela Relação é de via reduzida, de remédio para deficiências factuais circunscritas, confinadamente a pontos específicos, concretamente indicados, não valendo uma impugnação genérica, repousando em considerações mais ou menos alargadas ou simplesmente abrangentes da leitura pessoal, unilateralista e interessada que os sujeitos processuais fazem das provas e do resultado a que devam chegar” (cfr. Ac. STJ, de 27 de janeiro de 2009, processo n.º 3978/08 -3.ª”).

Por conseguinte, o recurso da matéria de facto destina-se apenas à reapreciação da decisão proferida em primeira instância em pontos concretos e determinados. Tem como finalidade a reapreciação de “questões de que pudesse conhecer a decisão recorrida” (cfr. designadamente o art. 410º., nº.1 do CPP).

Porém, o recurso não tem por finalidade nem pode ser confundido com um "novo julgamento" da matéria de facto, assumindo-se antes como um “remédio” jurídico para deficiências factuais circunscritas.

“I - O processo não é um palco onde, sem qualquer limite temporal, se podem praticar quaisquer atos, e a esmo, sem submissão a regras ou limites, sob pena de se afetar o encadeamento lógico em que se traduz, em ordem a atingir-se um objetivo final pré definido.

II - A função do recurso no quadro institucional que nos rege é a de remédio para correção de erros in judicando ou in procedendo, em que tenha incorrido a instância recorrida, processo de reapreciação pelo tribunal superior de questões já decididas e não de resolução de questões novas.

(…)

VIII - Quando, então, impugne a decisão proferida ao nível da matéria de facto tal impugnação faz-se por referência à matéria de facto efetivamente provada ou não provada e não àqueloutra que o recorrente, colocado numa perspetiva interessada, não equidistante, com o devido respeito, em relação àquilo que o tribunal tem para si como sendo a boa solução de facto, entende que devia ser provada. Por isso, segundo os termos da lei, a impugnação é restrita à “decisão proferida”, e realmente prolatada, e não a qualquer realidade virtual, de sobreposição da sua convicção probatória, pessoal, intimista e subjetiva, à convicção desinteressada formada pelo tribunal.

IX - Por força da natureza do recurso da matéria de facto para a Relação, que não é um novo julgamento, um julgamento repetível in totum, mas um julgamento parcial assim estruturado de acordo com a vontade do legislador ordinário, dentro da órbita de poderes de configuração que o constitucional lhe confere.

X - A garantia de um duplo grau de jurisdição de recurso em sede de matéria de facto não é a repetição por inteiro das audiências, o que se harmoniza inteiramente com o princípio de que não está consagrado no nosso direito, um direito ilimitado ao recurso” (cfr. Ac. STJ de 21-3-2012, proc. 130/10.0 JAFAR.F1.S1).

Relativamente à violação do princípio in dubio pro reo:

O princípio in dubio pro reo, princípio de prova, corolário do princípio da presunção de inocência do arguido, constitucionalmente consagrado, no art. 32º, nº2, da CRP, impõe que o julgador valore sempre a favor do arguido um non liquet - na decisão de factos incertos, a dúvida favorece o réu, e ainda que em processo penal não é admitida a inversão do ónus da prova.

«Na verdade, e em primeiro lugar, o princípio da presunção de inocência do arguido isenta-o do ónus de provar a sua inocência, a qual parece imposta (ou ficcionada) pela lei, o que carece de prova é o contrário, ou seja, a culpa do arguido, concentrando a lei o esforço probatório na acusação.

Em segundo lugar, do referido princípio da presunção de inocência do arguido (embora não exclusivamente dele) decorre um princípio in dubio pro reo, princípio que, procurando responder ao problema da dúvida na apreciação do caso criminal (não a dúvida sobre o sentido da norma, mas a dúvida sobre o facto), e partindo da premissa de que o juiz não pode terminar o julgamento com um non liquet, determina, que na dúvida quanto ao sentido em que aponta a prova feita, o arguido seja absolvido».[12]

Assim sendo, os recursos interpostos pelos recorrentes para este Supremo Tribunal de Justiça, do acórdão do Tribunal de Relação de Lisboa, impugnando a matéria de facto fixada por este Tribunal, são também rejeitados, por inadmissibilidade da impugnação em matéria de facto, nos termos dos arts.  420º, n.º 1,alínea b), 414º n.º 2 e 434º do CPP.

            (…)

O Tribunal da Relação de Lisboa, como supra se referiu, conheceu das nulidades arguidas pelos recorrentes, relativamente ao recurso interposto do acórdão do Tribunal Coletivo do Juízo Central Criminal de Cascais, motivo pelo qual não pode este Supremo Tribunal conhecer das arguidas nulidades do acórdão da 1ª Instância, que se prendem com a matéria de facto, sendo que se mostra assegurado o direito ao duplo grau de jurisdição.

No caso sub judice o recorrente interpôs recurso da decisão condenatória da 1ª Instância para o Tribunal da Relação de Lisboa, invocando as nulidades supra referidas, bem como impugnou a matéria de facto.

O Tribunal da Relação do Lisboa conheceu das nulidades arguidas pelo recorrente, bem como da matéria de facto impugnada, julgando improcedente nessa parte o recurso, confirmando o acórdão da 1ª Instância.

O recorrente veio de novo arguir as mesmas nulidades, neste Supremo Tribunal de Justiça, que respeitam a questões de facto e valoração da prova, não podem ser conhecidas, quer porque se referem à decisão de facto, quer porque já foram especificadamente apreciadas pelo acórdão da Relação, e indeferidas, sobre elas se formando a denominada dupla conforme

Quanto à impugnação da matéria de facto foi reexaminada pelo Tribunal da Relação a decisão da 1ª Instância, pelo que esta com esta reapreciação ficou cabalmente assegurado o direito do arguido ao recurso.

Pelo exposto, de harmonia com disposto nos arts. 432º n.º 1 al. b) e 400º n.º 1 al. f) do CPP, por não ser legalmente admissível recurso para o STJ das questões que a Relação confirmou, e quanto à matéria de facto, uma vez que o Supremo Tribunal conhece apenas de direito, (art. 434º, do CPP), também não é admissível recurso, motivo pelo qual nesta parte o recurso terá de ser rejeitado, nos termos dos arts. 414 º, nº 2 e 420 º, nº 1, al. b), do CPP, pois, o facto de ter sido admitido, não vincula o Tribunal Superior (art. 414 º, nº 3 do CPP).

3.1.4. O recorrente AA invoca ainda que o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa enferma da nulidade por omissão de pronúncia, nos termos e para os efeitos dos arts 374º nº 2 e 379 nº1 al c) e 2 do C.P.P.

Os fundamentos invocados prendem-se com a questão de no entender do recorrente AA, o Tribunal da Relação não se ter pronunciado sobre os factos que deveriam ter sido julgados como não provados, ou seja no fundo, imputa ao acórdão do Tribunal da Relação a omissão do conhecimento da matéria de facto.

Vejamos:

No acórdão recorrido afirma-se o seguinte:

Relativamente à nulidade imputada ao acórdão do Tribunal da Relação por não ter conhecido da impugnação da matéria de facto que o recorrente AA impugnou, pode ler-se o seguinte no acórdão sob recurso:

            (…)

Como supra se referiu o recorrente AA veio arguir a nulidade do acórdão do TRL por omissão de pronúncia, porquanto no seu entender o Tribunal “a quo” não conheceu da impugnação da matéria de facto.

O art. 379º., nº1, al. c), do CPP, consagra que:

«É nula a sentença:

c) Quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento».

No caso, analisando o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, designadamente do que acima se deixou transcrito, conclui-se que o Tribunal da Relação de Lisboa conheceu da impugnação da matéria de facto, em todas as vertentes indicadas pelo recorrente nas conclusões de recurso, reexaminando a prova produzida em audiência e documentada, nos termos do art. 428º, do CPP, não existindo qualquer omissão de pronúncia.

Com efeito, o Ministério Público no recurso que interpôs do acórdão do Tribunal Coletivo para o Tribunal da Relação de Lisboa, também impugnou a matéria de facto nos termos do art. 412º, do CPP, tendo o Tribunal de 2ª Instância apreciado e reexaminado a matéria de facto, alterando-a em certos pontos que constam do acórdão.

Pelo exposto, improcede nesta parte o recurso do arguido AA.”


Ora, no que respeita às inconstitucionalidades invocadas nas alegações de recurso, referentes aos artigos 428.º, 141.º, 358.º, todos do Código de Processo Penal, o acórdão reclamado tomou efetivamente posição sobre as mesmas.

De facto, o acórdão em causa teve o entendimento que muitos dos fundamentos constantes do recurso interposto pelo recorrente, nas quais se incluem as referidas inconstitucionalidades, respeitavam a matéria de facto ou a questões abrangidas pelo instituto da dupla conforme, por já terem sido apreciadas em 2.ª Instância, o que, como tal, não poderia ser reapreciado por este Tribunal. Nesta medida, o acórdão reclamado decidiu que a admissibilidade do recurso se encontrava restrita à sindicância da matéria de direito, encontrando-se “circunscrita ao reexame da qualificação jurídica dos factos e à determinação da pena, ou, em caso de concurso de crimes, à dosimetria da pena única. Todas as questões de facto e as questões de direito que não interfiram com a qualificação jurídica dos factos e/ou a dosimetria da pena fixada em medida superior a 8 anos de prisão, não podem ser reapreciadas outra vez, num terceiro grau de jurisdição” (página 50), pelo que excluiu do âmbito de apreciação do recurso, nomeadamente, as inconstitucionalidades relativamente às quais o recorrente entende existir omissão de pronúncia.

Ora, “[o]mitir pronúncia sobre determinada questão é, simplesmente, nada dizer sobre a mesma, não tomar sobre essa concreta questão, substantiva ou processual, qualquer posição, expressa ou implícita”[13], não podendo equivaler nem a uma discordância acerca da forma como é juridicamente tratada a questão invocada, ou, como sucede aqui, quando a mesma é rejeitada. Rejeitar é pronunciar-se. De forma aliás ponderosa, porque liminar.

Na verdade, o acórdão toma posição expressa, afastando as questões de inconstitucionalidade invocadas pelo recorrente, por entender que as mesmas não deverão ser apreciadas por este Tribunal. Desta forma, apenas se imporia o conhecimento das inconstitucionalidades alegadas caso se tivesse admitido e analisado o recurso nessa parte. Assim, não tendo sido conhecido o objeto do recurso, ficou prejudicado o conhecimento de todas as questões ali colocadas, onde estas se incluíam[14].

Tendo sido proferida decisão sobre as questões invocadas, no sentido de não apreciação das mesmas, por não serem legalmente admissíveis, existe pronúncia, no sentido da sua rejeição. Como tal, se tal decisão de rejeição é ou não correta e legalmente adequada tal consubstancia uma apreciação acerca do acerto do conteúdo decisório (um problema de mérito), não equivalendo a uma omissão de pronúncia.

Assim sendo, e tendo em mente que

“[o]missão de pronúncia significa, na essência, ausência de posição ou de decisão do tribunal em caso ou sobre matérias em que a lei imponha que o juiz tome posição expressa sobre questões que lhe sejam submetidas[15],

não ocorrerá essa omissão

“se o tribunal decide não poder conhecer de questões suscitadas pelo recorrente (…), por as respectivas decisões terem transitado em julgado. Uma coisa é ignorar a questão suscitada; coisa radicalmente diferente é julgar que a coisa suscitada não pode ser conhecida por força do caso julgado sobre ela formado”[16].

Como tal, tendo o Tribunal decidido não conhecer das questões invocadas, não existe a omissão de pronúncia invocada.

4. Da mesma forma, inexiste também qualquer omissão de pronúncia no que respeita às nulidades de que padeceria o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, invocadas pelo Recorrente nas suas alegações de recurso.

De facto, o acórdão reclamado entendeu que o do Tribunal da Relação de Lisboa não padecia de qualquer nulidade, encontrando-se fundamentado de modo adequado e suficiente. Referiu-se, então, nessa sede, nomeadamente, que:

analisando o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, designadamente do que acima se deixou transcrito, conclui-se que o Tribunal da Relação de Lisboa conheceu da impugnação da matéria de facto, em todas as vertentes indicadas pelo recorrente nas conclusões de recurso, reexaminando a prova produzida em audiência e documentada, nos termos do art. 428º, do CPP, não existindo qualquer omissão de pronúncia.

Com efeito, o Ministério Público no recurso que interpôs do acórdão do Tribunal Coletivo para o Tribunal da Relação de Lisboa, também impugnou a matéria de facto nos termos do art. 412º, do CPP, tendo o Tribunal de 2ª Instância apreciado e reexaminado a matéria de facto, alterando-a em certos pontos que constam do acórdão”.

           

Nesta medida, no acórdão reclamado é fundamentada, de forma compreensível, a decisão de confirmar o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, validando-se a sua decisão, nomeadamente, quanto à matéria de facto, a qual não se encontrava inquinada por qualquer vício, sendo jurisprudência dominante neste Supremo Tribunal de Justiça que, para efeitos de omissão de pronúncia, o relevante é apreciar se o tribunal conheceu, ou não, as questões que são objeto do recurso, não lhe incumbindo apreciar e rebater, de forma exaustiva, os argumentos em que os sujeitos processuais se apoiam para sustentar a sua pretensão[17].

De referir apenas, quanto ao voto de vencido constante do acórdão reclamado, e que o recorrente cita no seu requerimento, que o mesmo aprecia a eventual omissão de pronúncia do acórdão do Tribunal da Relação (que entende existir, ao contrário da posição maioritária que obteve vencimento), nada referindo acerca do teor do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, agora reclamado.

Desta forma, em face do exposto, inexiste, também, nessa parte, qualquer omissão de pronúncia.

5. Vem, ainda, o recorrente AA invocar que:

«(…) sempre serão inconstitucionais os artigos 379º, n.º1, alínea c), 425º, n.º4 e 379º, n.º2, todos do C.P.Penal e 608º do C.P.C., quando interpretados no sentido que:

“Sendo admitido Recurso ordinário para o Supremo Tribunal de Justiça, não é admissível recurso do acórdão do tribunal da Relação que decidiu não se verificarem nulidades que o arguido imputou à decisão da 1ª instância, por se verificar um caso de dupla conforme.”

Ou no sentido que:

“Sendo admitido Recurso Ordinário para o Supremo Tribunal de Justiça, não está este Tribunal obrigado a conhecer da Nulidade por Omissão de Pronúncia imputada ao Acórdão do Tribunal da Relação.”

Tais interpretações violam os artigos 2º, 20º, 32º, n.º1, todos da Constituição da República Portuguesa.»


Ora, no que respeita à nulidade da sentença/acórdão, estabelece o artigo 379.º do Código de Processo Penal que:

“1 - É nula a sentença:

a) Que não contiver as menções referidas no n.º 2 e na alínea b) do n.º 3 do artigo 374.º ou, em processo sumário ou abreviado, não contiver a decisão condenatória ou absolutória ou as menções referidas nas alíneas a) a d) do n.º 1 do artigo 389.º-A e 391.º-F;

b) Que condenar por factos diversos dos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver, fora dos casos e das condições previstos nos artigos 358.º e 359.º;

c) Quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.

2 - As nulidades da sentença devem ser arguidas ou conhecidas em recurso, devendo o tribunal supri-las, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º 4 do artigo 414.º”.

Acresce que, nos termos do artigo 380.º do Código de Processo Penal, se prevê que:

“1 - O tribunal procede, oficiosamente ou a requerimento, à correcção da sentença quando:

a) Fora dos casos previstos no artigo anterior, não tiver sido observado ou não tiver sido integralmente observado o disposto no artigo 374.º;
b) A sentença contiver erro, lapso, obscuridade ou ambiguidade cuja eliminação não importe modificação essencial.

2 - Se já tiver subido recurso da sentença, a correcção é feita, quando possível, pelo tribunal competente para conhecer do recurso.”

           

Por seu turno, recordem-se as remissões para os artigos 379.º e 380.º constantes do artigo 425.º, n.º 4 do Código de Processo Penal.


Assim, após ser proferida uma decisão final, e inexistindo a possibilidade de se interpor recurso ordinário, os interessados apenas poderão reagir contra as nulidades da sentença/acórdão expressamente indicadas no referido artigo 379.º, bem como solicitar a correção da decisão, quando não tiver sido observado ou não tiver sido integralmente observado o disposto no artigo 374.º, ou na situação de a mesma conter erro, lapso, obscuridade ou ambiguidade cuja eliminação não importe modificação essencial.

Atendendo ao exposto e ao teor dos citados artigos, é manifesto que a alegação de uma inconstitucionalidade, nesta fase, não é processualmente admissível, não se integrando na previsão de nenhum dos mencionados normativos[18]. Mais concretamente, no que respeita às nulidades da decisão, importa clarificar que a eventual aplicação de uma norma inconstitucional não consubstancia qualquer uma das causas de nulidade da decisão previstas nas alíneas a) a c) do n.º 1 do artigo 379.º do Código de Processo Penal.

Nesta medida, o presente incidente pós-decisório não é o momento adequado para proceder à invocação de qualquer inconstitucionalidade, a qual necessariamente deverá ser alegada, em sede de recurso, para o Tribunal Constitucional.

De facto, o artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional estabelece, no seu n.º 1, quais as decisões dos tribunais que são recorríveis para esse Tribunal, não podendo as partes, após a prolação de decisão, vir invocar, em requerimento ulterior, sob a aparência de invocação de nulidade de acórdão, uma inconstitucionalidade nunca antes referida, de forma, nomeadamente, a abrir caminho ao recurso previsto no referido artigo 70.º, n.º 1, alínea b) [que prevê que: «[c]abe recurso para o Tribunal Constitucional, em secção, das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo»].

Efetivamente, é jurisprudência uniforme do Supremo Tribunal de Justiça, que

 “[o] incidente previsto no art. 380.º, do CPP não é o meio processual adequado de denúncia ou invocação de inconstitucionalidades, sendo meio próprio o recurso para o TC, reunidos que estejam os requisitos e condicionalismos legalmente exigíveis”[19].

No mesmo sentido vem decidindo o Tribunal Constitucional, constando do Acórdão n.º 50/2018, que,

“[o] aresto prolatado pelo Supremo Tribunal de Justiça não conhece nem aprecia de qualquer pretensa desconformidade normativa do Código de Processo Penal face à Lei Fundamental. Apenas ulteriormente, por via de uma reclamação arrimada em pretensas nulidades do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, o recorrente suscita pela primeira vez uma questão de constitucionalidade normativa resultante da concatenação dos artigos 400.º, n.º 1, alínea f), 414.º, n.º 2, 420.º, n.º 1, alínea b) e 432.º, n.º 1, alínea b), todos do Código de Processo Penal. Porém, como constitui jurisprudência constante deste Tribunal, os incidentes pós-decisórios não são a sede adequada para suscitar ex novo questões de constitucionalidade sobre as quais o Tribunal recorrido não se pronunciou”[20].

           

Desta forma, entendendo o recorrente que há fundamento para tal, e estando preenchidos os demais requisitos legais, deverá recorrer para o Tribunal Constitucional, com vista à invocação da referida inconstitucionalidade, sendo notório que o presente procedimento não é o meio processualmente adequado para o efeito.

6. Sem prejuízo do que fica dito, sempre se refira que inexiste qualquer inconstitucionalidade, nos termos pretendidos pelo recorrente.

De facto, no que respeita à necessidade de existir um terceiro grau de jurisdição, a recorribilidade da decisão verifica-se tendo em conta os dois fatores legalmente previstos – a confirmação (ou não) da decisão da 1.ª Instância e, ainda, a pena concretamente aplicada. Não são fatores de apreciação da recorribilidade os fundamentos, em concreto, invocados pelos recorrentes, ou quaisquer nulidades que eventualmente viciem a referida decisão.

A opção legislativa é manifesta no sentido de entender que os casos que representam uma menor relevância criminal, em face da pena em causa, e que já tenham sido apreciados – e confirmados – por uma instância de recurso, não poderão beneficiar de um terceiro grau de jurisdição, independentemente de qualquer fundamento recursivo ou vício que tais decisões padeçam (ou se crê que assim possa ocorrer). Não estabelecendo a Lei qualquer tipo de exceção a esse nível, nunca poderia ser o Tribunal a, casuisticamente, interpretar e decidir quais os vícios ou inconstitucionalidades arguidas pelos recorrentes que poderiam merecer a necessidade de nova apreciação e correção. Ubi lex non distinguit nec nos distinguere debemus.

Dispõe o artigo 32.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa que «[o] processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso».

Entende-se que, nesta senda,

«[a] LC nº 1/97 incluiu expressamente como candidato positivo das garantias de defesa o direito ao recurso (nº 1, II parte). Trata-se de explicitar que, em matéria penal, o direito de defesa pressupõe a existência de um duplo grau de jurisdição, na medida em que o direito ao recurso integra o núcleo essencial das garantias de defesa constitucionalmente asseguradas. Na falta de especificação, o direito ao recurso traduz-se na reapreciação da questão por um tribunal superior, quer quanto à matéria de direito quer quanto à matéria de facto»[21].

           

Tal direito ao recurso encontra-se, também, reconhecido em instrumentos internacionais que vigoram na ordem interna e vinculam internacionalmente o Estado Português (artigos 14.º, n.º 5, do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, das Nações Unidas, e 2.º do Protocolo n.º 7 à Convenção para a Proteção dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais, do Conselho da Europa, que, na sua formulação, deixam aos Estados-Partes margem de conformação nesta matéria)[22].

Tal normativo consagra a necessidade de ser assegurado o direito ao recurso, mas do seu teor não resulta que tenha de existir um triplo grau de jurisdição, conforme é, aliás, jurisprudência unânime do Tribunal Constitucional[23]. Assim, das normas constitucionais não decorre, em nenhum momento, a obrigatoriedade de haver lugar a um duplo grau de recurso, independentemente dos termos do processo que esteja em causa e dos concretos fundamentos invocados pelo recorrente, permitindo-se ao legislador ordinário uma margem de discricionariedade para definir os limites do acesso a esse triplo grau de jurisdição.

Entendendo-se, assim, que o acesso a um segundo grau de recurso resulta da plena liberdade do legislador, a sua limitação, nomeadamente através da gravidade das penas aplicáveis e o instituto da dupla conforme, não ofende o direito ao recurso que se encontra constitucionalmente garantido.

Não havendo tal imposição constitucional de existência de um terceiro grau de jurisdição, não haverá qualquer inconstitucionalidade, independentemente das circunstâncias, em concreto, que fundamentam o recurso e dos termos constantes da decisão recorrida. Não é, assim, violador de qualquer norma constitucional, nomeadamente do referido artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa, a inexistência de possibilidade de recurso, mesmo quando são invocadas nulidades da decisão.

Acresce que, ao contrário do que refere o recorrente, o acórdão reclamado conheceu da nulidade de omissão de pronúncia por si invocada, relativamente ao acórdão do Tribunal da Relação, pelo que não se vislumbra, também, a existência de qualquer inconstitucionalidade quanto a essa matéria.

7. Invoca, ainda, o recorrente, uma outra omissão de pronúncia, alegando que o Supremo Tribunal de Justiça, no seu acórdão, não tomou posição sobre as questões alegadas relativas à condenação do arguido pela prática dos crimes de burla informática e de furto na forma tentada.

Sucede que, como se referiu supra, a rejeição parcial do recurso, com base na dupla conforme, consubstancia, ela própria, uma decisão, pelo que não poderemos afirmar estar perante uma omissão de pronúncia. Desta forma, é manifesto que não se poderá considerar que o acórdão reclamado não conheceu do recurso relativo aos mencionados crimes quando emitiu pronúncia no sentido de o mesmo não dever ser conhecido, rejeitando-o expressamente.

Como tal, inexiste qualquer omissão de pronúncia, pelo que improcede a referida invocação.

Ademais, sempre se refira que, independentemente da adequação ou não da decisão proferida, a mesma não é sindicável ou corrigível nesta sede, fora do condicionalismo previsto nos artigos 379.º e 380.º do Código de Processo Penal.

Assim, sendo proferida a decisão, fica de imediato esgotado o poder jurisdicional do juiz relativamente à matéria da causa, em conformidade com o disposto no artigo 613.º, n.º 1 do Código de Processo Civil. Sem prejuízo desse princípio, o artigo 379.º do Código de Processo Penal elenca taxativamente os casos de nulidade da sentença, vício que poderá ser suprido pelo tribunal, mesmo após a prolação da decisão.

Acresce que, no que respeita, concretamente, à correção de erros materiais, o artigo 380.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Penal prevê expressamente que “[o] tribunal procede, oficiosamente ou a requerimento, à correcção da sentença quando a sentença contiver erro, lapso, obscuridade ou ambiguidade cuja eliminação não importe modificação essencial”.

Como tal, o juiz ficará impedido de proceder a qualquer alteração ao teor da sentença, a não ser que a mesma contenha algum erro, lapso, obscuridade ou ambiguidade evidentes, cuja eliminação não importe a modificação essencial do seu teor, pelo que nunca essa correção poderá influir no sentido decisório do acórdão anteriormente proferido. Assim, os erros de julgamento não poderão ser passíveis de correção por via do artigo 380.º do Código de Processo Penal, por a sua supressão representar necessariamente uma modificação essencial ao anteriormente decidido.

Da mesma forma, das nulidades da sentença enumeradas no referido artigo 379.º resulta que aqui não se inclui

“o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário. Pode dizer-se que a formulação dos arts. 379.° e 380.° do CPP é tributária deste entendimento, dados os termos apertados em que está configurada a nulidade da sentença e, fora dos casos de nulidade, a sua correcção, também esta em termos taxativos e sem nunca admitir «modificação essencial» do decidido”[24].

De facto, o regime previsto no Código de Processo Penal diverge manifestamente do processual civil, onde se estabelece expressamente a possibilidade de as partes requererem a reforma da sentença quando, por manifesto lapso do juiz, tenha ocorrido erro na determinação da norma aplicável ou na qualificação jurídica dos factos (artigo 616.º, n.º 2, alínea a) do Código de Processo Civil). Contudo, inexistindo qualquer lacuna legal, porquanto o regime penal estabelece de forma expressa quais os vícios e os lapsos que poderão ser supridos pelo tribunal, após a prolação da sentença, não haverá lugar à aplicação subsidiária do regime civil. A qual, sendo subsidiária, não pode ser utilizada em caso de existência, como é o caso, de previsão no ordenamento jurídico-penal.

É que o regime processual penal

“arreda inapelavelmente – pelo menos no entendimento jurisprudencial (claramente) dominante neste Supremo Tribunal – a possibilidade da reforma quanto a erro manifesto, de direito ou de facto, e, no tocante à rectificação de erros materiais – para o que dispõe da norma, específica, do art.º 380º –, apenas admite eliminação do «erro, lapso, obscuridade ou ambiguidade» até ao ponto em que «não importe modificação essencial» do decidido”[25].

Da mesma forma,

“[a] sentença ou acórdão em processo penal não admitem reforma. O regime consagrado no CPC a tal respeito não tem aplicação no processo penal.

(…) As nulidades da sentença têm um regime específico concentrado no art. 379.º do CPP. Não sendo aplicável o regime das nulidades consagradas no CPC.”[26]


Em face do exposto, e atendendo às normas constantes do Código de Processo Penal, um lapso na apreciação jurídica da causa não é passível de correção em fase pós-decisória, pois que tal implica necessariamente uma modificação essencial da mesma.

Nesta medida,

“quanto à alegação de que o recurso deveria ter sido admitido – dado que há uma decisão inovatória no Tribunal da Relação pelo que, entende o recorrente, não é defensável que se considere a decisão irrecorrível com base no disposto no art. 400.º, n.º 1, als. d) e e), do CPP — não pode mais este Supremo Tribunal de Justiça conhecer desta questão uma vez que se encontra esgotado o poder jurisdicional”[27].

No mesmo sentido,

“[s]e o erro constante de acórdão deste STJ sobre a data da prática dos factos de um processo pode e deve ser corrigido na sequência de reclamação deduzida pelo arguido, o mesmo não acontece em relação ao erro de direito traduzido na exclusão do cúmulo de penas da pena aplicada naquele processo originado pelo aludido erro.

II - A eliminação desse erro de direito, conduzindo a uma modificação ao nível da pena, importaria "modificação essencial", o que o art. 380.º, n.º 1, al. b), do CPP, não permite.

III - Nessa parte está esgotado o poder jurisdicional deste tribunal, nos termos do art. 613.º, n.º 1, do CPC, aplicável por força do art. 4.º, do CPP, sendo que a norma do n.º 2 daquele preceito, nomeadamente na parte referente à reforma da sentença, não tem aplicação no processo penal, por aí não haver lacuna sobre a matéria”[28].

Assim sendo,

“[s]e o recurso era admissível e não ocorria circunstância que obstasse ao seu conhecimento, o que então houve foi um erro de julgamento, que não pode ser reparado nesta sede” uma vez que “[p]roferida a decisão sobre os três recursos considerados no acórdão reclamado, esgotou-se sobre a respectiva matéria o poder jurisdicional deste STJ, nos termos do art. 613.º, n.º 1, do CPC, aplicável por força do art. 4.º do CPP, só podendo ser rectificada ou invalidável em função da verificação de qualquer das anomalias previstas no art. 380.º, n.º 1, do CPP, designadamente «erro, lapso, obscuridade ou ambiguidade cuja eliminação não importe modificação essencial», ou de nulidade elencada no art. 379.º, n.º 1, aplicável por força do art. 425.º, n.º 4, todos do CPP, não havendo espaço, por ausência de caso omisso, para aplicação de qualquer disposição do n.º 1 do art. 615.º do CPC” [29].

Ademais, no que respeita à invocação de inconstitucionalidade, e como se referiu supra, o presente incidente pós-decisório não é o meio processualmente adequado para proceder à mesma, por não se integrar no elenco taxativamente estabelecido nos artigos 379.º e 380.º do Código de Processo Penal, pelo que não se aprecia a mesma.

Nesta medida, em face do exposto, julga-se improcedente a reclamação apresentada.


III

Dispositivo



Termos em que, decidindo em Conferência, na 3.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça se acorda em indeferir a arguição de nulidades e as reclamações apresentadas pelos recorrentes BB e AA.

Custas pelos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC’s.


Supremo Tribunal de Justiça, 4 de maio de 2023


Dr. Paulo Ferreira da Cunha (Relator)

Dr.ª Maria Teresa Féria de Almeida (Juíza Conselheira Adjunta)

Dr. José Luís Lopes da Mota (Juiz Conselheiro Adjunto)

______

[1] Neste sentido, entre outros, acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 8 de março de 2007, processo n.º 447/07, relatado pelo Conselheiro Simas Santos, disponível em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/01/criminal2007.pdf.
[2] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de maio de 2007, processo n.º 1243/07, relatado pelo Conselheiro Pires da Graça, disponível em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/01/criminal2007.pdf.
[3] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 5 de janeiro de 2015, processo n.º 3216/04, relatado pelo Conselheiro Sousa Fonte, disponível em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/01/Criminal2015.pdf.
[4] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de maio de 2007, processo n.º 1243/07, relatado pelo Conselheiro Pires da Graça, disponível em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/01/criminal2007.pdf.
[5] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de maio de 2007, processo n.º 1239/07, relatado pelo Conselheiro Oliveira Mendes, disponível em
https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/01/criminal2007.pdf.
[6] Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 11 de maio de 2005, processo n.º 1122/05, relatado pelo Conselheiro Sousa Fonte, e de 23 de junho de 2005, processo n.º 1274/05, relatado pelo Conselheiro Quinta Gomes, disponíveis em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/01/criminal2005.pdf. Neste sentido, ainda, entre outros, acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 9 de junho de 2005, processo n.º 3992/04, relatado pelo Conselheiro Pereira Madeira, onde consta que «[u]ma questão que não foi objecto de conhecimento pelo acórdão recorrido é uma questão nova de que o Supremo não pode conhecer em recurso, que, como se sabe, é um meio de corrigir o que foi decidido e, não, um processo de obter decisões novas», disponível em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/01/criminal2005.pdf.
[7] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 29 de setembro de 2022, processo n.º 264/18.3PKLRS.L1.S1, relatado pela Conselheira Helena Moniz, disponível em
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/8f88716c391bf166802588cd002f41de?OpenDocument
[8] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 17 de fevereiro de 2022, processo n.º 18/20.7JELSB.L1.S1, relatado pela Conselheira Carmo Silva Dias, disponível em
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/40675953cf6c556d802587f0004506ec?OpenDocument
[9] Processo n.º 19/20.5JBLSB.L1.S1, relatado pelo Conselheiro António Gama, disponível em
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/e47f4c807213cd16802588ef003d009d?OpenDocument
[10] In www.tribunalconstitucional.pt/tc/acórdãos/
[11] V. Ac. do STJ de 27MAI10, Proc.º n.º 11/04.7GCABT.C1.S1, Relator: Conselheiro Pires da Graça; Ac. do STJ de 27JUN012, Proc.º 127/10.0JABRG.G2.S1, Relator: Conselheiro Santos Cabral; Ac. do STJ de 18ABR13, Proc.º 180/05.9JACBR.C1.S1, Relatora: Conselheira Isabel Pais Martins.
[12] Rui Patrício, O princípio da presunção de inocência do arguido na fase de julgamento no atual processo penal português, Lisboa, Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, 2000, pp. 93-94.
[13] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16 de fevereiro de 2022, proc. n.º 333/14.9TELSB.L1-A.S1, relatado pelo Conselheiro Nuno Gonçalves, disponível em:
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/0a2acc33a572eee6802587ec005f89dd?OpenDocument.
[14] Neste sentido, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 23 de junho de 2022, proc. n.º 17/07.4MAFIG.C2.S1-A.S1, relatado pela Conselheira Helena Moniz, disponível em:
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/e170c5b27cd56e4b8025886b0030719e?OpenDocument
[15] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 4 de janeiro de 2017, proc. n.º 2039/14.0JAPRT.P1.S1, relatado pelo Conselheiro Pires da Graça, disponível em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/06/criminal_sumarios_2017.pdf.
[16] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18 de janeiro de 2017, proc. n.º 736/03.4TOPRT.P2.S1, relatado pelo Conselheiro Sousa Fonte, disponível em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/06/criminal_sumarios_2017.pdf.
[17] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24 de março de 2021, proc. n.º 1144/19.0T9PTM.E1.S1, relatado pela Conselheira Conceição Gomes, disponível em:
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/08bd5dc576064e39802586d50038e1cc?OpenDocument
[18] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 26 de outubro de 2016, processo n.º 1642/15.5YRLSB-A.S1, relatado pelo Conselheiro Manuel Braz, disponível em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/01/criminal2016.pdf.
[19] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 27 de fevereiro de 2020, processo n.º 736/03.4TOPRT.P2.S1, relatado pelo Conselheiro Júlio Pereira, disponível em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2021/02/criminal_sumarios_-2020.pdf. Neste sentido, ainda, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 19 de abril de 2017, processo n.º 13827/12.1TDPRT.P1-B.S1, relatado pelo Conselheiro Oliveira Mendes, disponível em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/06/criminal_sumarios_2017.pdf, aí se referindo que «[o] incidente de arguição de nulidade de sentença ou acórdão não é o meio processual adequado para a arguição de inconstitucionalidades, anomias estas cuja via própria de arguição é, o recurso, no caso para o TC», bem como o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 13 de janeiro de 2022, processo n.º 4/21.0GAADV.S1, relatado pela Conselheira Adelaide Sequeira, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/2f9634eeda6c4872802587e3003aabdc?OpenDocument.
[20] Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 50/2018, de 31 de janeiro de 2018, relatado pela Conselheira Maria Clara Sottomayor, disponível em https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20180050.html.
[21] Cfr. CANOTILHO, Gomes/MOREIRA, Vital, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, 4.ª Edição, Coimbra, Almedina, 2007, p. 516.
[22] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30 de outubro de 2019, processo n.º 455/13.3GBCNT.C2.S1, relatado pelo Conselheiro Lopes da Mota, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/b6d54695bc7a58e1802584a3005d70c3?OpenDocument.
[23] Acórdãos do Tribunal Constitucional n.os 64/2006, de 24 de janeiro de 2006, relatado pela Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza, disponível em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20060064.html?impressao=1, 659/2011, de 21 de dezembro de 2011, relatado pelo Conselheiro João Cura Mariano, disponível em https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20110659.html e 290/2014, de 26 de março de 2014, relatado pelo Conselheiro João Cura Mariano, disponível em https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20140290.html.
[24] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 29 de março de 2012, processo n.º 1239/03.2GCALM.L1.S1, relatado pelo Conselheiro Sousa Fonte, disponível em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/01/criminal2012.pdf.
[25] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24 de junho de 2021, proc. n.º 156/19.9T9STR-A.S1, relatado pelo Conselheiro Eduardo Loureiro, disponível em:
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/aba9d3e467a784c0802587030036eee4?OpenDocument
[26] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16 de fevereiro de 2022, proc. n.º 333/14.9TELSB.L1-A.S1, relatado pelo Conselheiro Nuno Gonçalves, disponível em:
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/0a2acc33a572eee6802587ec005f89dd?OpenDocument.
[27] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 23 de junho de 2022, processo n.º 17/07.4MAFIG.C2.S1, relatado pela Conselheira Helena Moniz, disponível em
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/e170c5b27cd56e4b8025886b0030719e?OpenDocument.
[28] Neste sentido, acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 14 de abril de 2016, processo n.º 7846/11.2TAVNG-B.S1, relatado pelo conselheiro Manuel Braz, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/-/24A2DFDCF5C978FB8025807A00384555.
[29] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 20 de dezembro de 2017, processo n.º 570/09.8TAVNF-C.P1-A.S3, relatado pelo Conselheiro Manuel Braz, disponível em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/06/criminal_sumarios_2017.pdf.