Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
233/09.4TBVNC.G1.S2
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: OLIVEIRA VASCONCELOS
Descritores: BALDIOS
ACÇÃO DE CONDENAÇÃO
AÇÃO DE CONDENAÇÃO
ÓNUS DA PROVA
REGISTO PREDIAL
PRESUNÇÕES LEGAIS
ACÇÃO DE REIVINDICAÇÃO
AÇÃO DE REIVINDICAÇÃO
ÓNUS DE ALEGAÇÃO
USO COMUNITÁRIO
APRECIAÇÃO DA PROVA
EXAME CRÍTICO DAS PROVAS
FUNDAMENTOS
PODERES DA RELAÇÃO
MODIFICABILIDADE DA MATÉRIA DE FACTO
FACTO EXTINTIVO
FACTO IMPEDITIVO
ACTO INÚTIL
ATO INÚTIL
Data do Acordão: 01/12/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL - RELAÇÕES JURÍDICAS / EXERCÍCIO E TUTELA DE DIREITOS / PROVAS - DIREITOS REAIS / DEFESA DA PROPRIEDADE.
DIREITO DOS REGISTOS E NOTARIADO - REGISTO PREDIAL.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - ESPÉCIES DE ACÇÕES QUANTO AO FIM ( ESPÉCIES DE AÇÕES QUANTO AO FIM ) - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / SENTENÇA / RECURSO DE REVISTA / ADMISSIBILIDADE DA REVISTA
Doutrina:
- Jaime Gralheiro, Comentário à Nova Lei dos Baldios, 2002, 53, 63-65.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 342.º, 1311.º.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 10.º, N.ºS 1, 2 E 3, 607.º, N.º 4, 671.º, N.º 3, 672.º, N.º 4.
CÓDIGO DE REGISTO PREDIAL (CRPRED): - ARTIGO 7.º.
Sumário :
I - Para que se possa considerar que a Relação analisou criticamente a prova e especificou os fundamentos da sua convição no domínio da matéria de facto (como se lhe exige, por força do n.º 4 do art. 607.º do CPC), é necessário que o julgador explicite qual o processo racional que utilizou.

II - Deve ser caracterizada como uma ação declarativa de condenação a causa em que a autora peticiona que se declare que a ré não é legítima possuidora dos terrenos que ocupa por estes fazerem parte dos baldios que a primeira administra e a condenação na sua devolução, na demolição de construções nela edificados e no pagamento de uma indemnização.

III - Os bens integrantes dos baldios podem ser defendidos através de ações de reivindicação, cabendo ao autor, nesse caso, o ónus de alegação e prova dos factos que as sustentam (designadamente, a integração de uma determinada parcela em terrenos baldios e sua afectação ao uso comunitário) e ao réu que detenha ou possua esses bens, o ónus de alegação e prova de factos impeditivos e extintivos desse direito.

IV - Não tendo a autora demonstrado que a área reivindicada integrava os terrenos baldios por si administrados e que a mesma era utilizada comunitariamente, é inútil a discussão sobre o título invocado pela ré para recusar a restituição, tanto mais que aquela não logrou ilidir a presunção de propriedade derivada do registo predial.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:



Em 2009.10,10, no então Tribunal Judicial da Comarca de Vila Nova de Cerveira, a Junta de Freguesia de Vila Nova de Cerveira, intentou a presente ação declarativa contra AA - Investimentos Imobiliários e Turísticos, S.A.


Pediu

a) - se declarasse que a ré não é dona nem legítima possuidora da parcela de terreno com a configuração e delimitação assinalada a cor laranja na planta que se junta como doc. nº 26 e do caminho em terra batida, com o trajeto e configuração assinalado a amarelo na planta que se junta como doc. nº 27, e, em consequência

b) - se declarasse que a parcela de terreno com a configuração e delimitação assinalada a cor laranja na planta que se junta como doc. nº 26 e o caminho em terra batida, com o trajeto e configuração assinalado a amarelo na planta que se junta como doc. nº 27, constituem terrenos baldios que são possuídos, utilizados e geridos pelos moradores da freguesia de Vila Nova de Cerveira, segundo os usos e costumes, com direito ao seu uso e fruição.

c) - se condenasse a ré a reconhecer o direito de uso e fruição dos moradores da freguesia de Vila Nova de Cerveira sobre a parcela de terreno com a configuração e delimitação assinalada a cor laranja na planta que se junta como doc. nº 26 e o caminho em terra batida, com o trajeto e configuração assinalado a amarelo na planta que se junta como doc. nº 27,

d) - se condenasse a ré a demolir todas as construções e obras que fez na parcela de terreno com a configuração e delimitação assinalada a cor laranja na planta que se junta como doc. nº 26, concretamente os muros de vedação de pedra, de blocos de cimento e as vedações com esteios e com rede construídos e o portão colocado no referido caminho em terra batida, e a entregá-la imediatamente à A. completamente livre e devoluta.

e) - se condenasse Ré a pagar à A. a indemnização a liquidar ulteriormente quanto aos prejuízos e danos materiais sofridos com a sua conduta e até efetiva desocupação e entrega, danos que por se encontrarem em curso são neste momento indetermináveis,

f) - e se condenasse a Ré a pagar à A., a título de sanção pecuniária compulsória (artº 829-A do Cód. Civil), uma quantia a fixar pelo Tribunal, por cada dia de atraso na entrega da parcela de terreno com a configuração e delimitação assinalada a cor laranja na planta que se junta como doc. nº 26, após o trânsito em julgado da decisão final.


Alegou

em resumo, que

- à data da criação da Assembleia de Compartes houve delegação dos poderes de administração dos baldios na Junta de freguesia;

- em Cerveira existem vários montes – Monte BB, Monte CC, Monte DD ou DD - contíguos entre si, constituídos por vários prédios rústicos, compostos de mato e pinhal, montes esses que estão submetidos o Regime Florestal parcial, inserindo-se no Perímetro Florestal das Serras de Vieira e Monte EE;

- tais montes têm a área global de 142,7 hectares e a configuração da planta junta à petição inicial;

- há mais de 1, 5, 10, 15, 20, 30, 50, 100, 200 e mais anos, desde tempos imemoriais, que os moradores da freguesia de Vila Nova de Cerveira vêm utilizando colectivamente os terrenos que constituem os referidos montes, Monte BB, Monte CC, Monte DD ou DD, sempre lhes tendo sido permitido o livre acesso a tais montes, os quais se encontravam cruzados por vários carreiros de passagem a pé e por caminhos públicos;

- os terrenos que constituem os montes do BB, Monte CC, Monte DD constituem terrenos baldios, que são geridos pelos moradores da freguesia de Vila Nova de Cerveira;

- a ré é dona de um empreendimento que foi construído nos prédios que constituíam a Quinta da …, com a área total de 9,57 hectares, alegando quais as confrontações da referida unidade predial.

- a ré tem vindo a ocupar uma parcela de terreno baldio localizada a poente desse empreendimento, de que é proprietária, ocupando uma parcela de terreno com a área de 20,1 hectares que sempre foi gerida, possuída e utilizada colectivamente pelos moradores de Cerveira, violando os direitos de uso e fruição dos moradores da freguesia de Vila Nova de Cerveira sobre os terrenos baldios dos indicados Montes.


Contestando

e também em resumo, a ré alegou que

- a autora não é parte legítima;

- da freguesia de Cerveira não foi submetida qualquer parcela a terreno baldio no perímetro florestal das Serras de Vieira e Monte EE, deste modo questionando a existência de terrenos baldios na área da circunscrição da freguesia de Cerveira;

- os prédios rústicos referidos na petição inicial estão inscritos a favor da Junta de Freguesia, o que se traduz num contrassenso;

- os terrenos ou são baldios e não são de ninguém, devendo constar de cadastro ou inventário de baldios, que não existe, ou pertencem à Junta de Freguesia;

- da análise dos documentos relativos a esses mesmos prédios rústicos, verifica-se que a área está longe de atingir os 142,7 hectares referidos na petição inicial, além de que, pelas confrontações, verifica-se a existência de inúmeros particulares nas zonas que compõem os montes do BB, CC e DD;

- existe uma justificação notarial efetuada em 1990 pela qual a Câmara Municipal se declara dona de um prédio rústico sito nos Lugares de Chã de ..., Chão … e Por Trás do Espírito Santo e que confronta com a Quinta FF, não obstante a escritura de justificação, afirmando considerar tal prédio baldio;

- ao contrário do alegado pela autora, os montes referidos na petição inicial não são contíguos entre si, uma vez que, não obstante o Monte AA confrontar com a Chá de Vilar, em parte, o Monte BB está separado do Monte AA através de propriedades privadas;

- não é verdade o que a autora alega quanto à utilização isolada ou coletiva, dos montes em causa, com as configurações indicadas na petição inicial;

- é dona da totalidade do prédio denominado Quinta FF e dos demais terrenos anexos onde já edificou diversas moradias na sequência de loteamento aprovado;

- não obstante a Quinta FF pudesse ter a configuração descrita no documento nº 25 junto com a petição inicial, o certo é que a R. adquiriu muitos outros terrenos adjacentes a essa propriedade;

- alega ainda a R. o modo de aquisição das suas propriedades.


Houve réplica, tendo na mesma a autora procedido à alteração e modificação do pedido, alegando que em face da alegação da ré, de que parte dos terrenos que se encontra a ocupar foram adquiridos pela seus anteriores proprietários, e que, já que tratando-se de negócios jurídicos de terrenos baldios, são nulos, impondo-se a declaração de nulidade ou ineficácia dos referidos negócios jurídicos.


Por despacho de fls. 661 e 662, foi admitida a ampliação do pedido formulado pela autora e foi esta convidada a fazer intervir como réus as pessoas mencionadas na contestação e que procederam à transmissão dos prédios para a ré, o que aquela fez por requerimento de fls. 667 a 669 e que foi admitido.


A chamada GG, Lda, uma vez citada, veio fazer seus os articulados da ré.


A fls. 692 e 693, vieram os chamados HH e mulher fazer seus os articulados da ré, dizendo ainda que o prédio urbano inscrito na matriz sob o art. 771 foi por eles adquirido ao anterior proprietário, II e mulher, e o prédio rústico inscrito na matriz sob o art. 404 foi por eles comprado a JJ e mulher.


Por despacho de fls. 712 e 713, foi a autora convidada a vir concretizar a matéria alegada na petição inicial relativamente ao que efetivamente reivindica, sem mera remissão para as plantas, o que aquela fez.


Proferido despacho saneador – onde a autora foi considerada parte legítima - fixada a matéria assente e elaborada a base instrutória, foi realizada audiência de discussão e julgamento.


Em 2014.04.28, foi proferida sentença, em que se julgou a ação improcedente.


A autora apelou, sem êxito, pois a Relação de Guimarães, por acórdão de 2015.02.25, confirmou a decisão recorrida.


Novamente inconformada, a autora deduziu revista.


Em 2015.10.29, proferido acórdão em que se decidiu revogar o acórdão recorrido “no segmento em que se decidiu não proceder à reapreciação dos depoimentos invocados pelo apelante, determinando que a Relação proceda à integral apreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto “.


Em 2016.05.02, foi proferido novo acórdão na Relação de Guimarães, em que se julgou novamente improcedente o recurso e confirmou a sentença recorrida.


Mais uma vez inconformada, a autora deduziu recurso de revista normal e, subsidiariamente, excecional.

Pela relatora do processo na Relação não foi admitida aquela.

Pela formação a que se refere o nº3 do artigo 672º do Código de Processo Civil, foi admitida a revista excecional, com base na alínea a) do nº1 do artigo 672º do Código de Processo Civil, com o esclarecimento que não estando admitida aquela revista normal, as questões sobre a matéria de facto encontravam-se definitivamente resolvidas.


A recorrente apresentou as respectivas alegações e conclusões.

A recorrida contra alegou, pugnando pela manutenção do acórdão recorrido.

Cumpre decidir.


As questões


Tendo em conta que

- o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões neles insertas, salvo as questões de conhecimento oficioso - arts. 684º, nº3 e 690º do Código de Processo Civil;

- nos recursos se apreciam questões e não razões;

- os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido

são os seguintes os temas das questões propostas para resolução:

A) – Matéria de facto

B) – Ónus da prova e presunção.


Os factos


São os seguintes os factos que foram dados como provados nas instâncias:

Por acordo das partes e /ou provados por documento

1. Encontra-se junta aos autos uma ata de reunião de compartes com o teor constante de fls. 29, onde se incluem os seguintes dizeres: “Ata n.º 1 Nos catorze dias do mês de Julho do ano de mil novecentos e noventa e nove, reuniram na Junta de Freguesia de Vila Nova de Cerveira, os compartes desta freguesia, para se proceder à eleição dos seguintes órgãos. 1.º Assembleia de compartes (…)”

2. Encontra-se junta aos autos uma ata de reunião da assembleia dos compartes com o teor constante de fls. 30, onde se incluem os seguintes dizeres: “Ata número quatro Aos vinte dias do mês de Julho de 2007 (…), reuniu pela segunda vez a assembleia dos compartes da freguesia de Vila Nova de Cerveira (…). Ponto Dois: Delegar na Junta de Freguesia poderes para administrar os baldios; (…), proposta esta que posta à votação foi aprovada por unanimidade”.

3. Encontra-se junta aos autos uma ata de reunião da assembleia dos compartes com o teor constante de fls. 34, onde se incluem os seguintes dizeres: “Minuta da Ata da Reunião Realizada no Dia 19 de Março de 2008: Aos dezanove dias do mês de Março de dois mil e oito (…), reuniu (…) a assembleia de compartes dos baldios da freguesia de Vila Nova de Cerveira, com os seguintes pontos na ordem de trabalhos (…). Ponto Três: Deliberar sobre a renovação da delegação dos poderes de administração dos compartes na Junta de Freguesia, em relação à totalidade da área do baldio, para representar a Assembleia de Compartes em todos os atos administrativos e judiciais. (…) Relativamente ao terceiro ponto da ordem de trabalhos a assembleia deliberou (por unanimidade) renovar proposta esta que posta à votação foi aprovada por unanimidade a delegação dos poderes de administração dos compartes na Junta de Freguesia (…)”.

4. Na freguesia de Vila Nova de Cerveira existem, entre outros, os montes conhecidos por “Monte BB”, “Monte CC” e “Monte da DD” ou “ DD”.

5. Foi posto à deliberação da Câmara de Vila Nova de Cerveira, em reunião havida em 23/7/1887, o requerimento de um morador de Vila Nova de Cerveira, de nome KK, a solicitar que lhe fosse concedida uma licença para fazer uma sementeira de pinhões no sítio de Chão de Vilar, por detrás do Monte BB.

6. Foi posto à deliberação da Câmara de Vila Nova de Cerveira em reunião havida em 21/4/1892 o requerimento de um morador de Vila Nova de Cerveira, de nome LL, …, a solicitar o aforamento de uma porção de terreno baldio, sito no Lugar da Chão do Espírito Santo, onde já tinha edificado duas barracas, uma para manipulação e outra para depósito de fogo e pólvora, edificadas em virtude do alvará de licença daquela Cama Municipal de Vila Nova de Cerveira com data de 15 de Setembro de 1884.

7. Foi posto à deliberação da Câmara de Vila Nova de Cerveira, em reunião havida em 10/4/1946, o requerimento de um morador de Vila Nova de Cerveira, de nome MM (…), a solicitar que lhe fosse concedida uma licença para abrir um poço no monte baldio, situado ao Norte da Quinta do Espírito Santo, situada em Vila Nova de Cerveira, a qual era propriedade do requerente, e junto de uma presa que recebia a água das minas das Cabacinhas, a fim de assim poder ser abastecida de água a referida Quinta, que foi deferido por deliberação da Câmara de 24/4/1946.

8. Foi posto à deliberação da Câmara de Vila Nova de Cerveira, em reunião havida em 22/10/1949, o requerimento de um morador da freguesia de Vila Nova de Cerveira, de nome NN, a solicitar que lhe fosse concedida uma licença para cortar vinte metros cúbicos de cantaria no Monte BB em Vila Nova de Cerveira, requerimento que foi deferido.

9. Foi posto à deliberação da Câmara de Vila Nova de Cerveira, em reunião havida em 4/10/1950, o requerimento de um morador da freguesia de Vila Nova de Cerveira, de nome OO, a solicitar que lhe fosse concedida autorização para poder cortar e retirar do Monte BB, em Vila Nova de Cerveira, dez metros cúbicos de alvenaria, durante o prazo de quatro meses, que foi deferido, fixando-se um mês de prazo para retirar a pedra.

10. Foi posto à deliberação da Câmara de Vila Nova de Cerveira, em reunião havida em 17/9/1952, o requerimento de um morador da freguesia de Vila Nova de Cerveira, de nome PP, a solicitar que lhe fosse concedida licença para poder retirar dez metros cúbicos de cantaria do monte denominado “DD”, em Vila Nova de Cerveira, requerimento que foi deferido.

11. Foi posto à deliberação da Câmara de Vila Nova de Cerveira, em reunião havida em 29/10/1952 o requerimento de um morador da freguesia de Vila Nova de Cerveira, de nome OO, a solicitar que lhe fosse concedida autorização para retirar do Monte BB, em Vila Nova de Cerveira, quinze metros cúbicos de cantaria, dentro do prazo de sessenta dia, que foi deferido, fixando-se o prazo quarenta dias.

12. Foi posto à deliberação da Câmara de Vila Nova de Cerveira em reunião havida em 4/3/1953, o requerimento de um morador da freguesia de Vila Nova de Cerveira, de nome QQ, a solicitar que lhe fosse concedida autorização para retirar do monte denominado “BB”, em Vila Nova de Cerveira, quinze metros cúbicos de cantaria, pelo prazo de sessenta dias, que foi deferido, fixando-se o prazo quarenta dias.

13. Foi posto à deliberação da Câmara de Vila Nova de Cerveira, em reunião havida em 30/9/1953, o requerimento de um morador da freguesia de Vila Nova de Cerveira, de nome RR, a solicitar que lhe fosse concedida uma licença para retirar oito metros cúbicos de cantaria, do Monte BB, em Vila Nova de Cerveira, durante o prazo de sessenta dias, que foi deferido, fixando-se o prazo quarenta dias.

14. Em 21 de Julho de 1956, SS, industrial, morador na Rua …, na cidade do Porto, apresentou um manifesto na Secretaria da Câmara Municipal de Vila Nova de Cerveira dando conta que tinha descoberto por simples inspeção da superfície a existência de minério de cassitérité, no sítio denominado BB, freguesia e concelho de Vila Nova de Cerveira, sendo a propriedade em que se efetuou a descoberta terrenos baldios e encontra-se no ponto de partida a antiga capela em ruínas, denominada BB, e confronta do Nordeste com a Capela da Senhora da Encarnação, ao Sudoeste com o Lugar de … e do Poente com o concelho de Vila Nova de Cerveira. O ponto de partida determina-se pela pelas coordenadas planas ortogonais referidas à meridiana e sua perpendicular com origem no Castelo de São Jorge em Lisboa e são: à meridiana sinal menos trinta e três mil e cem metros e à perpendicular sinal menos trezentos e cinquenta e oito mil e quatrocentos metros.

15. Foi posto à deliberação da Câmara de Vila Nova de Cerveira, em reunião havida em 5/12/1956, o requerimento de um morador da freguesia de Vila Nova de Cerveira, de nome TT, a solicitar que lhe fosse concedida uma licença para retirar seis metros cúbicos de cantaria e dez metros cúbicos de alvenaria no monte denominado “BB”, em Vila Nova de Cerveira, que foi deferido, fixando-se o prazo quarenta dias.

16. Foi posto à deliberação da Câmara de Vila Nova de Cerveira, em reunião havida em 20/11/1957, o requerimento de um morador da freguesia de Vila Nova de Cerveira, de nome RR, a solicitar que lhe fosse concedida uma licença para retirar do monte denominado “DD”, catorze metros cúbicos de cantaria, que foi deferido, fixando-se o prazo sessenta dias.

17. Foi posto à deliberação da Câmara de Vila Nova de Cerveira, em reunião havida em 5/11/1958, o requerimento de um morador da freguesia de Vila Nova de Cerveira, de nome UU, a solicitar que lhe fosse concedida autorização para retirar, como retirou, vinte e cinco metros cúbicos de alvenaria do monte BB, necessitando de vinte dias de prazo, que lhe foi deferido.

18. Foi posto à deliberação da Câmara de Vila Nova de Cerveira, em reunião havida em 2/11/1960, o requerimento de um morador da freguesia de Vila Nova de Cerveira, de nome PP, a solicitar que lhe fosse concedida uma licença para cortar e retirar do monte denominado “BB”, em Vila Nova de Cerveira, cinco metros cúbicos de cantaria, necessitando de trinta dias de prazo, que lhe foi deferido.

19. A Ré AA é dona e legítima possuidora de um empreendimento turístico, denominado “Quinta FF”, que foi construído e está implantado nos prédios que constituíam uma unidade predial conhecida como “Quinta FF” ou “Quinta das FF”, que se encontravam inscritos na matriz predial da freguesia de Vila Nova de Cerveira, sob os artigos 61º Urbano e 1103º Rústico e descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Cerveira sob o nº 00116/191186-Vila Nova de Cerveira (extrato do Livro nº 9.600, fls. 42 B 25), do qual foram desanexados vários prédios, concretamente, o prédio atualmente inscrito na matriz predial da freguesia de Vila Nova de Cerveira sob o artigo 1044º Rústico e descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Cerveira sob o nº 00396/19920623-Vila Nova de Cerveira, do qual por sua vez também já foram desanexados outros prédios, concretamente, o prédio atualmente inscrito na matriz predial da freguesia de Vila Nova de Cerveira sob o artigo 406º Rústico e descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Cerveira sob o nº 00522/071295-Vila Nova de Cerveira, e ainda o prédio atualmente omisso na matriz predial da freguesia de Vila Nova de Cerveira mas descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Cerveira sob o nº 00736/130103-Vila Nova de Cerveira.

20. A “Quinta das FF” ou “Quinta FF” onde se encontra implantado o empreendimento turístico da Ré AA tem a área global de cerca de 9,57 hectares.

21. Por contrato promessa de compra e venda datado de 9 de Maio de 1990, a Ré AA prometeu comprar ao Sr. JJ e mulher, Srª Dª VV, que prometeram vender à AA, aqui Ré, livre de ónus e encargos e pelo preço de 260.000 contos, o prédio denominado “Quinta FF, BB e DD”, composto e casa de habitação, com a superfície coberta de 76 m2, logradouro de 300 m2, terra de lavradio, mato e pinheiros com a área de 127.000 m2, situado no lugar do mesmo nome, freguesia e concelho de Vila Nova de Cerveira, que faz parte do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Cerveira sob a ficha nº 00116/191186 e inscrito na matriz predial urbana sob o artº 61 e na matriz predial rústica sob os arts 406, 408, 409 e 442.

22. Por escritura pública outorgada em 24/9/1998 no Terceiro Cartório Notarial do Porto, a sociedade “GG, Limitada” declarou vender à ré AA, e esta declarou comprar, o prédio urbano composto de terreno para construção, com a área de 17.000 m2, sito no Lugar de … ou C… ... da freguesia e concelho de Vila Nova de Cerveira, descrito na Conservatória do Registo predial de Vila Nova de Cerveira sob o n.º 114.

23. Por escritura pública outorgada em 2/12/1999 no Cartório Notarial de Vila Nova de Cerveira, HH e XX declararam ceder à ré AA, por permuta, o prédio urbano sito na Encosta do Espírito Santo, registado na Conservatória sob a ficha nº 00640 da referida freguesia e inscrito na matriz predial sob o artº 771.

24. Por escritura pública outorgada em 6/1/2000 no Cartório Notarial de Vila Nova de Cerveira, JJ e mulher, VV, declararam ceder à ré AA, por permuta, o prédio rústico, situado no Lugar de Espírito Santo e Chão de Vilar, denominado “Quinta FF”, composto por mato, descrito na Conservatória do Registo predial de Vila Nova de Cerveira sob o n.º 116 e inscrito na matriz predial sob os arts. 429 e 441.

25. Por escritura pública outorgada em 9/2/2001 no Sexto Cartório Notarial do Porto, HH e XX declararam dar à ré AA, por troca, o prédio rústico denominado Encosta do Hospital, sito na freguesia e concelho de Vila Nova de Cerveira, registado na Conservatória sob a ficha nº 00132 e inscrito na matriz predial sob o artº 404.

26. Por escritura pública outorgada em 24/1/2002 no Cartório Notarial de Vila Nova de Cerveira, ZZ e mulher, AAA, devidamente representados, declararam vender à ré AA, e esta declarou comprar, o prédio rústico sito no Lugar da Devesa ou Chão de Vilar, freguesia e concelho de Vila Nova de Cerveira, composto por terreno de mato, com a área de 4.667 m2, registado na Conservatória sob o número 9377 do livro B-24 e inscrito na matriz predial sob o artº 428.

Da discussão da causa:

27. Existem vários prédios rústicos compostos de mato e pinhal, que se encontram inscritos na respectiva matriz predial a favor da Junta de Freguesia de Vila Nova de Cerveira, nomeadamente, sob os artigos 392º, 394º, 395º e 403º e que se inserem no Monte BB, DD e Monte CC – cfr. matéria do quesito 3.

28. Desde há mais de 1, 5, 10, 15, 20, 30, 50, 100, 200 e mais anos que excedem a memória dos vivos, e pelo menos até aos finais da década de 70, que os moradores da freguesia de Vila Nova de Cerveira vêm utilizando colectivamente parte de terrenos inseridos nos montes referidos em D) para apascentação de gados, produção e corte de matos e lenhas e corte e extração de pedra, neles procedendo, sob orientação dos Serviços Florestais, a vários cortes de madeira – cfr. matéria do quesito 4.

29. E utilizavam os vários carreiros de passagem a pé e caminhos que cruzavam os montes referidos em D) para acederem aos mais diversos lugares da freguesia, inclusive com animais, à vista de toda a gente, sem oposição de quem quer que seja, de forma ininterrupta e pacífica, na convicção de que esses terrenos de monte estavam afetos a logradouro comum dos moradores da freguesia de Vila Nova de Cerveira – cfr. matéria dos quesitos 5 a 9.

30. O terreno onde o morador referido em E) pretendia levar a cabo a referida sementeira de pinhões e os moradores referidos em J) e P) pretendiam retirar, como retiraram, cantaria, integravam, como integram, o monte conhecido como “DD” – cfr. matéria do quesito 10

31. A porção de terreno baldio para a qual o morador referido em F) pretendia o aforamento, onde o morador referido em G) pretendia abrir o poço, onde os moradores referidos em H), K), L), M), O), R) pretendiam cortar, como cortaram, a cantaria, onde os moradores referidos em I), O), Q) pretendiam cortar e retirar, como cortaram e retiraram, alvenaria, onde o morador referido em N) descobriu a existência de minério, integravam, como integram, o monte conhecido por “BB” – cfr. matéria do quesito 11.

32. No ano de 1980, a Câmara Municipal de Vila Nova de Cerveira procedeu à iluminação do monte do “BB” através da colocação de vários focos – cfr. matéria do quesito 12.

33. Em Março de 1981, a Câmara Municipal de Vila Nova de Cerveira construiu uma estrada pública, desde a via de acesso à Capela de Nossa Senhora da Encarnação, sita na freguesia de …, ao Lugar do Areal, em Vila Nova de Cerveira, numa extensão de mais de 500 metros – cfr. matéria do quesito 13

34. A Ré procedeu à construção de muros de vedação, à colocação de esteios e rede, à renovação da rede já existente aquando da sua aquisição, à colocação de um portão, tudo nas propriedades que tem registadas em seu nome – cfr. matéria dos quesitos 17, 18, 19, 20, 21 e 22.

35. A Ré AA procedeu ou mandou proceder ao corte ou abate de várias centenas de árvores, nomeadamente, eucaliptos, pinheiros bravos e mimosas, existentes na parcela de terreno referida em 15.º - cfr. matéria do quesito 23.

36. Os prédios referidos de U) a Z) situam-se na parcela referida em 15.º -e são ocupados pela R.- cfr. matéria do quesito 16 e 27.

37. A Ré procedeu à terraplanagem da parcela de terreno referida em 29. – cfr. matéria do quesito 29


Os factos, o direito e o recurso


Na sentença proferida na 1ª instância julgou-se a ação improcedente porque se entendeu que, competindo à autora a prova de que os terrenos adquiridos pela ré, ao tempo do seu primeiro registo, fossem baldios, não o conseguiu fazer, pelo que não conseguiu ilidir a presunção derivada do registo de que beneficiava a ré.


No acórdão recorrido, julgou-se a ação improcedente porque, rejeitando-se a impugnação da matéria de facto deduzida pela autora recorrente e aceitando a matéria fixada na sentença recorrida, entendeu-se que “não tendo a apelante feito prova de que as parcelas de terreno em discussão nestes autos (…) são terrenos baldios” e “verificando-se que os prédios que integram as referidas parcelas de terreno se encontram registados a favor da ré, AA -Investimentos Imobiliários e Turísticos, S.A., beneficia esta da presunção do direito de propriedade derivada do registo, nos termos do artº 7º do Código de Registo Predial, sendo à autora, ora apelante, que incumbia o ónus de ilidir tal presunção legal nos termos do que dispõe o nº2 do artº 350º do Código Civil, por apresentação de prova em contrário, o que não logrou realizar, no caso sub judice”.

 

A) Matéria de facto


Entende a recorrente que “o Tribunal da Relação de Guimarães não usou corretamente os poderes de alteração/modificação que lhe eram/são conferidos pelos artigo 662º do Código de Processo Civil (…) não tendo (…) reapreciado verdadeiramente, como podia e devia, a decisão da matéria de facto impugnada, concretamente, não procedeu verdadeiramente à reapreciação da prova testemunhal gravada”.

Cremos, no entanto, que não tem razão.


Desde logo, há que dizer que a questão relacionada com a “envolvência jurídica concernente à reapreciação da matéria de facto” já está definitivamente resolvida, conforme resulta do decidido no acórdão proferido pela formação deste Supremo a que e se refere o nº3 do artigo 671º do Código de Processo Civil e tendo em conta o disposto no nº4 do artigo 672º do mesmo diploma.

De qualquer forma, sempre se dirá o seguinte.


Para se considerar que a Relação fez uma análise crítica das provas e especificou os fundamentos que foram decisivos para a sua convicção, conforme é exigido pelo disposto no n.º4 do artigo 607º do Código de Processo Civil, aplicável por força do n.º2 do artigo 653º do mesmo diploma, é necessário que o julgador explicite as razões que objectivamente o determinaram a ter ou não por averiguado determinado facto, em revelar qual o raciocínio lógico que o conduziu à resposta, qual o processo racional que utilizou.


Ora, no acórdão recorrido e no capítulo intitulado de “reapreciação da matéria de facto” foi feita uma análise da prova – nomeadamente testemunhal – naqueles termos, na medida em que se reapreciou o depoimento de algumas testemunhas e reanalisou a prova documental, revelando, através daquelas reapreciação ou reanálise, o raciocínio que conduziu a manutenção da apreciação da matéria de facto feita pela 1ª instância.


Desta forma, mesmo que a questão ainda não estivesse decidida, haveria que se concluir que a reapreciação da matéria de facto teria sido feita no acórdão recorrido.


B) Ónus da prova e presunção de registo


A recorrente entende que “tratando-se, como se trata de uma ação declarativa de apreciação negativa, em que está em causa a ocupação por privado confinante com terrenos baldios de uma parte desses terrenos (baldios), os quais não são susceptíveis de apropriação privada, por estarem fora do comércio jurídico, não deve haver lugar à presunção do direito de propriedade dos terrenos em causa a favor do privado confinante pelo simples facto deste constar, no registo predial, como titular do direito de propriedade do prédio confinante com o baldio”.


Vejamos.


De acordo como disposto no nº 1 do artigo 10º do Código de Processo Civil, existem duas grandes categorias de ações: declarativas ou executivas.

E de acordo com o nº2 do mesmo artigo, aquelas podem ser se simples apreciação, de condenação ou constitutivas.

Finalmente, de acordo como nº3, também desse artigo, tendo em conta a sua finalidade, as ações podem ser de simples apreciação – se visam “obter unicamente a declaração da existência ou inexistência de um direito ou de um facto” – de condenação – se visam “exigir a prestação de uma coisa ou de um facto, pressupondo ou prevendo a violação de um direito” – e constitutivas – se visam “autorizar uma mudança na ordem jurídica existente”.


Disto resulta que todas as ações envolvem o reconhecimento da existência ou inexistência de um direito.


Se o autor, após o reconhecimento da existência ou não existência do direito e face a uma situação de incerteza, não pretende mais que a declaração formal dessa existência ou inexistência do direito, a ação respetiva é de mera apreciação (positiva ou negativa).


Se o autor, além desse reconhecimento, pretende se ordene ao réu a realização de uma prestação correspondente à sua pretensão, a ação diz-se de condenação.


Ora, no caso concreto em apreço, a autora pede o reconhecimento que a ré “não é dona nem legítima possuidora” de terrenos que alegou serem ocupados pela ré e fazerem parte de baldios por si administrados, pedindo que sejam demolidas todas as construções e obras que ela teria feito numa dessas parcelas, assim como a pagar-lhe uma indemnização pelos “prejuízos e danos materiais sofridos com a sua conduta e até efetiva desocupação e entrega”.


Tendo em conta o que acima ficou referido sobre as diversas espécies de ações de acordo com o seu fim, parece não poder haver dúvidas que estamos perante uma ação de condenação e não de simples apreciação, uma vez que a autora não invoca qualquer situação de incerteza e não se limita a pedir o reconhecimento do direito que invoca, pede também a condenação da ré a “entregar” a parcela que ocupa “completamente livre e devoluta”, assim como a demolição e indemnização referidas.


Conforme diz Jaime Gralheiro “in” Cometário à Nova Lei dos Baldios, 2002, a folhas 53 “baldios são bens comunitários afetos à satisfação das necessidades primárias dos habitantes de uma circunscrição administrativa ou parte dela e cuja propriedade pertence à comunidade formada pelos utentes de tais terrenos que os receberam dos seus antepassados, para, usando-os de acordo com as suas necessidades e apetências, os transmitirem aos seus vindouros


Conforme também refere o mesmo autor, na obra citada, em nota existente a página 63, “o termo “propriedade” está aqui usado em sentido muito lato, pois, em boa verdade, o baldio não é propriedade de ninguém, senão que está, apenas, afeto à satisfação de determinadas necessidades comunitárias, que se corporizam ou encabeçam na “comunidade local”.


De qualquer modo, parece não oferecer dúvidas que os bens pertencentes aos baldios podem ser defendidos através das ações comuns de reivindicação, nomeadamente, a mencionada no artigo 1311º do Código Civil – neste sentido, o mesmo autor na mesma obra, a páginas 64 e 65.


Sendo assim e de acordo com o disposto naquele artigo e com o disposto no artigo 342º do mesmo diploma, competiria à autora alegar e provar os factos constitutivos do direito que invoca sobre a parcela em causa e que esta se encontrava na posse ou detenção da ré.


E a esta, caso a autora tivesse demonstrado a titularidade desse direito e que a parcela se encontrava na posse ou detenção da ré, competiria a prova de qualquer facto impeditivo ou extintivo do direito da autora, ou seja, que possuía a parcela por virtude de um direito real ou obrigacional que lhe permitisse recusar a restituição, que legitimaria a sua posse e não restituição.


Ora, no caso concreto em apreço, a autora não logrou demonstrar o direito que invocou, conforme bem se salientou nas instâncias.


Na verdade, a autora alegou que toda a área de terreno dos montes conhecidos por Monte BB, Monte CC e Monte DD, inserindo-se no Perímetro Florestal das serras de Viera e Monte EE, com a área global de 142,7 hectares, tem sido utilizada coletivamente pelos moradores de Vila Nova de Cerveira e constitui terrenos baldios, sendo que a ré se encontrava a ocupar uma parcela desses terrenos baldios, com a área de 20,1 hectares, localizada a poente do empreendimento turístico de que é proprietária – cfr. artigos 5º, 6º, 13º, 71ºe 79º da petição inicial.


Ora, não de provou que a área global das parcelas que alegadamente pertenciam ao baldio tivesse aquela área – reposta negativa ao ponto 1º da Base Instrutória.

Nem se provou que os moradores tivessem utilizado coletivamente a totalidade dessa área, apenas se provando que utilizaram parte dela – resposta restritiva ao ponto 4º da Base Instrutória.

Também não se provou que dos referidos montes fizesse parte uma parcela de terreno localizada a poente do referido empreendimento turístico, com a área de 10,52 hectares, ocupada pela ré – resposta negativa aos pontos 15º, 29º e 32º da Base Instrutória.


Concluímos, pois, que não se demonstrou que a ré ocupasse qualquer área de terreno que estivesse incluída nos terrenos baldios a que a autora se arroga administradora.

Dito doutra forma, não se demonstrou que o terreno ocupado pela ré possa ser classificado como baldio.


Sendo assim, não se tendo demonstrado o direito invocado pela autora – de que os terrenos em causa eram terrenos baldios - a consequência necessária é a improcedência dos pedidos formulados pela autora e a absolvição da ré.


Daí a inutilidade de pronúncia sobre se esta possuía qualquer título que legitimasse a sua posse ou detenção que lhe permitisse recusar a restituição, pois esta questão pressupunha, como se disse, que estivesse demonstrado que os terenos eram baldios, o que, como também já ficou referido, não ficou demonstrado.


De qualquer modo, mesmo que se tivesse que conhecer a questão, sempre se teria que concluir pelo reconhecimento do direito de propriedade da ré sobre a parcela em causa, por força da presunção de propriedade derivada do registo, estabelecida no artigo 7º do Código de Registo Predial, tendo em conta que a autora não teria logrado elidir essa presunção, uma vez que não ficou demonstrado que a parcela fazia parte dos terrenos baldios por si administrados.

 

Concluímos, pois, não merecer censura o acórdão recorrido.


A decisão


Nesta conformidade, acorda-se em negar a revista, confirmando-se o acórdão recorrido.

Custas pela recorrente.


Lisboa, 12 de Janeiro de 2017

Oliveira Vasconcelos (Relator)

Fernando Bento

João Trindade