Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
488/11.4TTVFR.P1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: FERNANDES DA SILVA
Descritores: PODERES DE COGNIÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
FACTOS CONCLUSIVOS
CONTRATO DE TRABALHO A TERMO
MOTIVO JUSTIFICATIVO
Data do Acordão: 01/14/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Área Temática:
DIREITO DO TRABALHO - CONTRATO DE TRABALHO / MODALIDADES DO CONTRATO DE TRABALHO.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS.
ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA / SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA / COMPETÊNCIA.
Doutrina:
- A. Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 13.ª Edição, p. 313 e ss.; Direito do Trabalho, 16.ª Edição, Almedina, Outubro de 2012, p. 262 e ss..
- João Leal Amado, Contrato de Trabalho, Coimbra Editora, p. 92.
- Júlio Gomes, Direito do Trabalho, vol. I, p. 580 e ss..
- M. Rosário Palma Ramalho, ‘Direito do Trabalho’, Parte II, 3.ª Edição, p. 227 e ss..
- Pedro Romano Martinez, Direito do Trabalho, 5.ª Edição, 2010, Almedina, p. 701 e ss..
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 674.º, N.º3, 682.º, N.º1, 2, 3.
CÓDIGO DO TRABALHO REVISTO/C.T. DE 2009: - ARTIGOS 140.º, N.ºS1, 2 ALÍNEA F), E 5, 141.º, N.º1, ALÍNEA E) E N.º 3, 147.º, N.º 1, ALÍNEA C).
LEI N.º 62/2013, DE 26 DE AGOSTO: - ARTIGO 46.º
LOFTJ, NA REDACÇÃO DA LEI N.º 52/2008, DE 28 DE AGOSTO: - ARTIGO 33.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-DE 23.9.2009, PROC. N.º 238/06.7TTBRG.S1, CONSULTÁVEL EM WWW.DGSI.PT ;
-DE 19.4.2012, PROC. N.º 30/08.4TTLSB.L1.S1;
-DE 23.5.2012, PROC. N.º 240/10.4TTLMG.P1.S1, CONSULTÁVEL EM WWW.DGSI.PT .
Sumário :
I. O Supremo Tribunal de Justiça apenas conhece, por regra, de matéria de direito.
Constitui questão de índole jurídica saber se determinada resposta a factualidade alegada assume, ou não, natureza conclusiva, havendo-se por não escrita a proposição que se reconduza à mera formulação de um juízo de valor sobre matéria que se integre no thema decidendum.

II. O contrato de trabalho a termo (resolutivo) é um contrato especial, de uso excepcional, sujeito a forma escrita, dela devendo constar, além de outras, a indicação do termo estipulado e do motivo justificativo da contratação, este com menção expressa dos factos que o integram, de modo a estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado.

III. Cumpre este requisito legal a indicação, no clausulado do contrato, cujos termos permitam a sindicabilidade dos fundamentos invocados para a contratação precária e a verificação da relação entre o motivo invocado e o termo estabelecido, em que expressamente se consignou que o mesmo é celebrado para prover ao acréscimo excepcional da actividade decorrente do lançamento de uma campanha promocional, com a duração inicialmente estimada em seis meses.
Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

                                                           I.

1.

AA, com os demais sinais dos Autos, intentou no Tribunal do Trabalho de Santa Maria da Feira, em Julho de 2011, a presente acção de processo comum contra «Banco BB, S.A.», com sede em Lisboa, pedindo, a final, a condenação da Ré a:

- Reconhecer que era por tempo indeterminado o contrato de trabalho que celebrou com o A.;

- Reintegrá-lo no seu posto de trabalho, com todos os direitos, incluindo os inerentes à sua categoria profissional e à sua antiguidade;

- Pagar-lhe as retribuições que deixou de receber, desde o seu despedimento e até à decisão final, com juros moratórios, à taxa legal, calculados sobre cada uma das prestações pedidas e contados a partir do respectivo vencimento.

Alegou para o efeito, em síntese, que:

- Trabalhou pela primeira vez na R., no Balcão de ..., desde 12 de Março até 24 de Agosto de 2009, tendo para tal estabelecido um contrato com a ‘CC, Empresa de Trabalho Temporário, Ld.ª’ (cf. doc. 3);

- Após um curto interregno, reiniciou o seu trabalho na R., no Balcão da Av. ..., n.º ..., Porto, onde prestou serviço desde 21 de Setembro de 2009;

- Em Novembro de 2009, na sequência de reuniões havidas com a Ré, o A. foi convidado pela referida ‘CC’ para rescindir o seu contrato de trabalho, a produzir efeitos a partir do dia 24 de Novembro de 2009, dia em que o A. prestou o seu último dia de trabalho nas referidas instalações da R., na Av. ..., Porto;

- No dia 25 de Novembro de 2009, o A. continuou a prestar o seu trabalho à R., sem qualquer hiato e desempenhou sempre as mesmas funções em qualquer dos referidos balcões da Ré (…, Av. ... e …), sob a direcção e orientação imediata do gerente e do subgerente do respectivo balcão, integrados nos quadros de pessoal da Ré;

- O A. exerceu sempre na Ré funções próprias da sua actividade comercial normal; porém, os contratos referiam que se tratava de “acréscimo excepcional de actividade de empresa, com carácter temporário”; foram renovados e, por carta datada de 12.04.2011, a R. comunicou ao A. que “o contrato de trabalho a termo certo celebrado com V. Ex.ª em 25-11-2009 terá o seu termo em 24-05-2011”;

- Não houve acréscimos excepcionais de actividade na Ré relacionadas com a “maior procura de bens ou serviços” em virtude das campanhas “Soluções de Poupança ...” ou Super Conta Ordenado”;

- A Ré recorre sistematicamente aos contratos a termo, directamente ou por intermédio duma empresa de trabalho temporário, como forma de ingresso da esmagadora maioria dos trabalhadores nos seus quadros;

- Por isso e face aos factos acima alegados, o contrato de trabalho entre o A. e a Ré é um contrato sem termo;

- A R., com o descrito procedimento de extinção do contrato individual de trabalho que mantinha com o A., promoveu um verdadeiro despedimento sem justa causa e sem processo disciplinar, não havendo nem tendo sido invocada qualquer outra razão válida para a extinção do contrato.

Termina afirmando que, reconhecendo-se a nulidade da cláusula que fixa a duração temporária do contrato individual de trabalho do A., deve a presente acção ser julgada provada e procedente, com a consequente condenação da R.

A Ré, devidamente notificada, contestou.

 Aduziu, em resumo útil, que:

- Prevendo um aumento temporário da actividade nos balcões onde as campanhas estavam em curso e onde estavam a ter aceitação, celebrou com a ‘CC’ contratos de utilização de trabalho temporário, na sequência dos quais o A. foi colocado ao serviço da Ré, primeiro no balcão de ..., Santa Maria da Feira, e, posteriormente, no balcão do Porto – Av. ..., ....

- Com efeitos a 25.08.2009, foi denunciado o respectivo contrato de utilização de trabalho temporário celebrado com a CC, Ld.ª e, consequentemente, esta denunciou o contrato de trabalho a termo incerto celebrado com o A., com efeitos no dia 25.08.2009.

- A partir do dia 25.08.2009, o A. não mais prestou a sua actividade no balcão de ..., por nessa data ter cessado o acréscimo de actividade neste balcão e que motivou a celebração do contrato de utilização de trabalho temporário e a consequente contratação do A.

- E, com efeitos a 24.11.2009, foi denunciado o outro contrato de utilização de trabalho temporário celebrado com a CC, Ld.ª, que denunciou o contrato de trabalho a termo incerto celebrado com o A., com efeitos no dia 24.11.2009.

- A partir do dia 24.11.2009, o A. não mais prestou a sua actividade no balcão do Porto – Av. ..., ... – por nessa data ter cessado o acréscimo de actividade neste balcão e que motivou a celebração do contrato de utilização de trabalho temporário e a consequente contratação do A.

- A prestação da actividade do A. à R. teve uma duração de aproximadamente sete meses e meio, no total, tendo esta sido prestada pelo A. de forma descontínua, sempre como trabalhador da ‘CC’ e nunca da Ré.

- É, pois, inequívoco que a prestação de trabalho pelo A., no âmbito de trabalho temporário, se encontra devida e suficientemente fundamentada em necessidades temporárias da Ré, pelo que o recurso a este tipo de contratação é legalmente admissível.

- No final do mês de Novembro de 2009, considerando o aumento temporário de trabalho existente e não sendo sustentável a laboração com o quadro de pessoal permanente no balcão de L... (Av. …), a Ré celebrou o contrato de trabalho a termo em causa nos presentes autos, colocando o A. nesse balcão, atribuindo-lhe a categoria de empregado bancário, sem função específica ou de enquadramento.

- E porque os efeitos da campanha, em termos de solicitações em alguns balcões da Ré, se fizeram sentir por cerca de mais 6 meses, o contrato de trabalho celebrado com o A. foi renovado por um período de 6 meses, ou seja, até 24.11.2010.

- Porque os efeitos da campanha em termos de solicitações em alguns balcões da Ré se fizeram sentir por cerca de mais 6 meses, e porque, consequentemente, se manteve o acréscimo de actividade nos balcões em causa, o contrato de trabalho celebrado com o A. foi renovado por um período de 6 meses, ou seja, até 24.05.2011.

- Não foi violada qualquer disposição relativa à celebração e admissibilidade da celebração de contratos de trabalho a termo certo, designadamente o artigo 141.º do C.T.

- No início de Abril de 2011, a Ré começou a constatar que, face às efectivas necessidades de trabalho, o A. começava a estar excedentário no balcão de L... – Avenida …, tendo concluído que no final do mês de Maio (ou seja, no termo da renovação em vigor) a necessidade temporária que havia fundamentado a contratação do A. terminaria, tendo o mesmo caducado.

- Tendo a Ré denunciado assim o contrato de trabalho a tempo certo celebrado com o A. por meio de comunicação escrita, dirigida ao A. no dia 12 de Abril de 2011, com efeitos à data do seu termo, ou seja, o dia 24 de maio de 2011.

- Com a caducidade do contrato de trabalho foram liquidados todos os créditos laborais decorrentes da cessação do contrato, bem como a compensação correspondente a dois dias de retribuição base por cada mês de duração do contrato.

Termina dizendo que a presente acção deverá ser julgada totalmente improcedente, por não provada, absolvendo-se a Ré dos pedidos formulados pelo A.

                                                          ___

Tramitada, discutida e julgada a causa, proferiu-se sentença, que julgou a presente acção totalmente improcedente e, em consequência, absolveu o R. do pedido.

2.

Irresignado, o A. interpôs recurso de Apelação para o Tribunal da Relação do Porto, que o julgou improcedente pelo Acórdão prolatado a fls. 409-461, confirmando-se, por maioria, a sentença impugnada.

(A deliberação tem voto de vencido, ut fls. 462-3).

Ainda inconformado, insurge-se contra o assim ajuizado mediante a presente Revista, cuja motivação remata alinhando a seguinte síntese conclusiva:

I.      Deve ser declarada como não escrita, de acordo com o disposto no artigo 646.° do CPC (de 1961), a matéria ínsita nos artigos 40.°, 41.°, 56.°, 63.° e 65.° da matéria de facto assente, dado que em todos estes casos estamos perante matéria vaga, genérica e conclusiva.

I.1. Artigo 40.°: O conteúdo deste artigo é absolutamente vago, e não tem qualquer relação com o caso em apreço. Vejamos: quais são e quais foram as vezes em que a Ré tem/teve necessidade de aumentar o seu número de trabalhadores, e quais os balcões em que tal se verificou.

E em que campanhas? Do que consta do artigo 33.° da matéria assente, temos um elenco de 11 campanhas lançadas pela Ré, no qual nem se encontra incluída a campanha ‘...’, que terá justificado a celebração do contrato de utilização de trabalho temporário de 12/03/2009 a 24/0812009 (Cfr. factos assentes número 5 e 6).

I.2. Artigo 4l.°: o vertido neste artigo não contém qualquer facto, mas apenas uma conclusão jurídica, ou seja: a Recorrida por ter acréscimo de trabalho contrata temporariamente trabalhadores especializados.

Ora, esta é uma conclusão jurídica, baseada no disposto no art. 140.°, n.º 1, e 140.°, n.º 2, alínea f), do CT.

Esta não deve ser uma conclusão a incluir na matéria assente, mas antes uma conclusão que o Tribunal deve (ou não) alcançar através da matéria de facto (a qual seria, exemplificativamente, a seguinte: Após o lançamento da campanha XXX, o balcão da Recorrida em xxx verificou um aumento de xxx clientes diários! Cada cliente demora, em média, xx minutos a ser atendido! O Balcão da Recorrida tinha xx trabalhadores a exercer funções de atendimento à data do lançamento da campanha XXXX! Com o aumento de clientes foi necessário ter mais um trabalhador, atento o período de tempo diário de atendimento ao público! O Trabalhador é contratado para atender o público no balcão de XXXX.)

1.3. Artigo 56.°: O facto aqui vertido pode até ser verdadeiro, mas não pode ter qualquer relevo para os presentes autos. É que a Recorrida não pode contratar trabalhadores, para fazer face a necessidades determinadas pelo acréscimo de trabalho, sem indicar que necessidades são essas.

 De novo se reitera o invocado quanto ao artigo 4l.°: esta é uma conclusão que se deve ancorar em factos.

I.4. Artigo 63.°: Esta é, de novo, uma conclusão.

Dizer-se que o Autor estava excedentário é concluir que por consideração ao número de trabalhadores existentes e ao trabalho que havia para fazer, o Autor não tinha trabalho. Sabendo-se o número de trabalhadores e a quantidade de trabalho, concluir-se-ia, ou não, que o Autor estava excedentário.

I.5. Artigo 65.°: (que corresponde ao artigo 37.° da Petição Inicial): atenta a repartição do ónus da prova – que determina que impende sobre a Recorrida a prova dos factos que justificam a aposição do termo ao contrato em apreço, de acordo com o disposto no artigo 140.º, n.º 5, do CT – este facto é inócuo.

II. Para que se possa afirmar a validade do termo resolutivo aposto ao contrato é necessário (arts. 141.º e 147.º do CT):

1.      Que se explicitem suficientemente no texto do contrato (com menção expressa) factos reconduzíveis a uma das hipóteses previstas no art. 140.° do Código do Trabalho (em que o legislador considera lícita a celebração do contrato de trabalho a termo);

2.      Que o texto permita estabelecer a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado;

3.      Que seja demonstrada a relação entre as funções a desempenhar pelo trabalhador e a causa justificativa do termo, e, ainda,

4.      Que os factos ali relatados tenham correspondência com a realidade.

III. No presente caso, se é possível averiguar da veracidade da existência do lançamento da campanha indicada aquando da contratação do Recorrente, assim como da duração previsível desse lançamento, tal já não sucede com o último requisito: não é possível, quer para o Recorrente, quer em Juízo, averiguar-‑se da veracidade da relação existente entre a contratação do Recorrente e o aumento excepcional da actividade decorrente do lançamento da tal campanha, pois esta relação não consta do contrato.

IV. De facto, este é um requisito formal de elevado relevo, uma vez que o trabalhador contratado a termo tem que ser contratado para colmatar a necessidade temporária que justifica esta forma excepcional de contratos de trabalho.

V.     No caso em apreço, esta descrição da relação entre o alegado aumento excepcional da actividade, decorrente do lançamento da tal campanha, e a contratação do trabalhador é exigível para que se pudesse, em Juízo, verificar se o Recorrente foi desempenhar funções que apresentavam alguma relação com o fundamento invocado.

Ora, dizer-se que o Trabalhador é contratado para exercer funções inerentes à categoria de empregado bancário, sem função específica de enquadramento, não é suficiente.

VI. Como refere a Exm.ª Senhora Desembargadora, na exposição do seu voto de vencida, o teor do contrato escrito não permite concluir pela existência dessa relação, já que aí não se diz que o Autor foi contratado para efectuar a dita campanha ou se foi substituir trabalhador encarregue da mesma, sendo certo que a matéria provada não releva para efeitos de concretização do motivo justificativo da contratação do Autor, na medida em que a mesma não consta do texto do documento do contrato de trabalho a termo.

VII. A factualidade vinda de expor qualifica-se no disposto na alínea c) do n.º 1 do art. 147.º do CT, pelo que deverá o contrato de trabalho em apreço ser qualificado como contrato sem termo.

VIII. Não consta, dos factos assentes, qualquer um que demonstre a alteração do volume de trabalho, para mais no balcão de L..., após o lançamento da campanha 'Poupança Cresce Mais' (note-se que o que é dado por provado mais não é do que uma conclusão, ou seja, que por ser necessário, entre outras, contactar clientes, fazer a apresentação e a explicação do produto oferecido na campanha, elaborar simulações e proceder ao preenchimento electrónico de propostas de adesão …houve um acréscimo do trabalho já existente no balcão de L....

 Contudo, não se pode concluir da existência deste acréscimo só porque foi necessário proceder àquelas actividades relacionadas com a campanha 'Poupança Cresce Mais', por inexistência de demonstração do trabalho que existia antes da campanha.)

IX. A natureza de excepcionalidade do acréscimo de actividade desaparece ao considerarmos os factos assentes constantes dos artigos 32.°, 33.°, 34.°, 35.° e 39.°, ademais se concatenados com os factos assentes 6.° e 8.°.

X.      Atente-se que a Recorrida lança as campanhas sucessivamente, sendo que estas fazem parte do seu marketing habitual e representam uma prática habitual da Recorrida. Da conjugação do artigo 33.° com o artigo 6.°, verificamos a identificação de 13 campanhas da Recorrida, as quais, de acordo com o facto assente do artigo 32.°, são lançadas sucessivamente.

XI. De acordo com o dicionário Priberam (disponível em www.priberam.pt) a palavra excepcional significa:

1. Em que há excepção. 2. Relativo a excepção.

 3. Excêntrico; anormal.

XII. Ora, se a Recorrida recorre habitualmente a campanhas promocionais, se as campanhas implicam um aumento de trabalho, não é possível que a consequência expectável de um acto normal seja anormal; de outro modo: não é possível que o aumento de trabalho decorrente de cada campanha se apresente como um aumento excepcional da actividade da Recorrida, mas tão-somente como um volume de trabalho expectável e corrente face à actividade normal da Recorrida.

XIII. Em conclusão: não só os factos assentes não demonstram o acréscimo de actividade do balcão de L..., como não demonstram qualquer excepcionalidade na actividade desenvolvida; antes demonstrando a sua natureza ordinária.

XIV. Por conseguinte, o fundamento invocado pela Recorrida não encontra adesão à realidade, violando o contrato de trabalho em apreço o n.º 3 do art. 141.° do CT e, consequentemente, por força do disposto no art. 147.°, n.º 1, alínea c), do CT, deve o contrato em referência ser considerado um contrato sem termo, com as consequências que abaixo se invocam.

XV. O Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, no âmbito do processo 151/11.6TTVNG.Pl, aos 28/01/2013, cuja Relatora foi a Exm.ª Senhora Desembargadora EE Costa Pinto (junto a final) apresenta argumentação que corrobora o antedito (em caso em tudo idêntico ao presente):

No caso "sub judice " resulta da factualidade apurada que a R. é uma instituição de crédito e exerce a actividade bancária e que, no âmbito da actividade bancária promove diversas campanhas, com vista à promoção dos seus produtos e à fidelização dos seus clientes, assim como à angariação de novos clientes, tendo lançado uma Campanha Promocional denominada 'Poupança Cresce Mais' que consistia, essencialmente, na captação de recursos de clientes e consequente fidelização destes.

Ficou ainda provado que, para que a campanha tivesse a aceitação e o êxito projectados, era necessário que os Balcões da ré desenvolvessem um conjunto de actividades promocionais e de esclarecimento dos contornos da mesma e do produto oferecido, quer junto dos clientes já fidelizados, quer junto de potenciais clientes a angariar e que, no âmbito destas actividades, seria necessário, entre outras, contactar clientes, fazer a apresentação e a explicação do produto oferecido na campanha, elaborar simulações, proceder ao preenchimento electrónico de propostas de adesão, etc.

Mais ficou provado que a designada 'Poupança Cresce Mais' era 'idêntica a outras aplicações financeiras' lançadas antes e depois daquela e promovidas aos balcões da ré, como 'prática habitual ou corrente da sua normal actividade' e que nos finais de 2010 estavam em curso ou disponíveis nos balcões da ré diversas campanhas, o que, desde logo, nos faz questionar se, perante esta evidente inclusão da campanha em causa na normal e corrente actividade da recorrente, poderá considerar-se que a mesma deu azo a uma 'necessidade temporária' da empresa, tal como é exigido pelo número 1 do artigo 140.º do Código do Trabalho.

Sabido como é que a lei, para além das situações específicas de dinamização do investimento empresarial ou do fomento do emprego (número 4 do artigo 140.º) apenas autoriza a celebração de contratos precários em ordem à satisfação de necessidades meramente transitórias das empresas, não se justifica um contrato que – sem que se provem outros factos demonstrativos, por exemplo, de que a campanha em causa se distingue das demais e tem de algum modo associado um acréscimo temporário de trabalho – se destine a fazer face a um trabalho que constitui prática habitual ou corrente da normal actividade da empresa.

(...)

Em suma, a matéria de facto provada não demonstra que o contrato a termo celebrado entre as partes se tenha destinado a fazer face ao lançamento de uma campanha que acarretasse em termos de trabalho uma 'necessidade temporária da empresa', cabendo concluir que não se verificam, na realidade, os factos que consubstanciam o motivo invocado no texto da contratação a termo e, em consequência, a hipótese legal a que os mesmos reconduzem.

XVI. No mesmo sentido, o douto Acórdão da Relação do Porto, de 18/02/2013, cuja Relatora foi a Exm.ª Senhora Desembargadora, Dr.ª Fernanda Soares, (disponível em www.dgsi.pt) refere o seguinte:

Com efeito, a celebração de contratos de prestação de serviços – em regra, de natureza temporária – não constitui razão, nem pode fundamentar, por si só, a contratação a termo certo do trabalhador.

 Se assim for entendido, então, a Ré encontraria justificação para apenas celebrar contratos de trabalho a termo certo ficando, deste modo, dispensada de celebrar contratos de trabalho por tempo indeterminado, o que, e salvo o devido respeito, constitui fraude à lei [concretamente às disposições que regem a contratação por tempo indeterminado] e viola o direito à segurança no emprego consagrado no artigo 53.° da Constituição da República Portuguesa.

Na verdade, e em face da matéria provada, resulta que a Ré recorreu à contratação a termo para satisfazer os seus serviços «concretamente definidos nos contratos de prestação de serviços», que executa, com o fundamento de que eles não são duradouros.

Só que esses mesmos serviços, que ela diz não serem duradouros, constituem o seu escopo social, a sua actividade, que nada tem de precário, a não ser que ela, Ré, seja extinta [está provado que as funções exercidas pela Autor passaram a ser desempenhadas, após a cessação do seu contrato de trabalho, por trabalhador da Ré, com vínculo contratual sem termo – n.º 15 da matéria de facto].

Ora, se a Ré tem no seu quadro de pessoal trabalhadores contratados por tempo indeterminado, como parece resultar da matéria de facto dada como provada, então, carecia ela de igualmente fazer consignar, no contrato a termo certo celebrado com o Autor, a razão da não atribuição a um daqueles trabalhadores da execução das tarefas que atribuiu ao aqui recorrido, tarefas essas, que constituem, como já salientado, o seu objecto social.

Por tais fundamentos, não estamos com a apelante quando ela diz que «o requisito da desconformidade entre a actividade a prestar pelo trabalhador e a actividade habitual do empregador integra-se na outra situação prevista nesse preceito legal, a da execução de tarefa ocasional». (Negrito e sublinhado nossos).

XVII. E ainda o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 14-02-2013, cujo Relator foi o Exm.º Senhor Conselheiro, Dr. António Leones Dantas (disponível em www.dgsi.pt), citando o acórdão recorrido, refere o seguinte:

Na celebração de contratos de prestação de serviços temporários, no contexto de uma empresa que se dedica à prestação de serviços a terceiros, por natureza temporários, tem o empregador que demonstrar (uma vez que lhe incumbe o ónus da prova – art. 130.º, n.º 1) por que razão, no âmbito dessa sua actividade, aquela concreta prestação de serviços representa uma necessidade ocasional, temporária, da sua actividade a justificar a necessidade, para a sua satisfação, da contratação a termo certo do trabalhador.

XVIII. Face ao antedito, impunha-se que a Recorrida demonstrasse por que é que, neste cenário, o lançamento da campanha "Poupança Cresce Mais" se apresentava como uma necessidade temporária e como circunstância promotora de um acréscimo excepcional da sua actividade.

XIX. Não só isso não foi feito no contrato de trabalho em apreço, como da prova produzida não resulta qualquer aumento de actividade na sequência do lançamento da campanha em referência.

XX. Por tudo o acabado de expor, constata-se que a Recorrida violou o disposto no art. 140.°, n.ºs 1 e 2, na alínea e) do n.º 1 do art. 141.º do Código do Trabalho, pelo que, nos termos do disposto nas alíneas b) e c) do n.º 1 do art. 147.º do Código do Trabalho, deverá ser considerado sem termo o contrato de trabalho celebrado entre a Recorrente e a Recorrida, aos 25/1112010.

XXI. Declarando-se sem termo o contrato de trabalho em crise neste recurso, deverá este Excelso Supremo Tribunal de Justiça retirar as consequências peticionadas pelo Recorrente na Petição Inicial, e que se passam a indicar:

XXI.1. Declarar como ilícito despedimento o acto de denúncia para operar a caducidade do contrato de trabalho a termo certo perpetrado pela Recorrida;

XXI.2. Ordenar a reintegração do Recorrente no seu posto de trabalho, com todos os direitos, incluindo os inerentes à sua categoria profissional e antiguidade;

XXI.3. Condenar a Recorrida a pagar ao Recorrente as retribuições que o mesmo deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão final;

XXI.4. Condenar a Recorrida a pagar os juros moratórios à taxa legal sobre cada uma das prestações pedidas, desde o respectivo vencimento até efectivo pagamento;

XXI.5. Condenar a Recorrida a suportar as custas do processo.

XXII. Ao não ter decidido assim, o douto Acórdão em crise violou as seguintes normas: art. 646.° do CPC (de 1961), alíneas a), b) e c) do n.º 1 do art. 147.°, art. 141.°, n.º 3, art. 140.°, n.ºs 1 e 2, alínea f), todos do CT.

Termina pedindo que seja dado provimento ao presente recurso, e, em consequência, seja revogado o douto Acórdão em crise, condenando-se a Recorrida nos termos peticionados.

O Banco/R. respondeu, concluindo, por sua vez, no sentido de que a situação dos Autos correspondeu a um acréscimo excepcional de actividade, resultante do lançamento de um novo produto por parte da recorrida, pelo que tal acréscimo constituiu uma necessidade temporária da empresa, susceptível de justificar a contratação a termo.

                                                         ___

Já neste Supremo Tribunal, o Exm.º Procurador-Geral Adjunto, tomando posição, emitiu proficiente parecer no sentido da confirmação do Acórdão impugnado, texto que, notificado aos litigantes, não suscitou reacção.

Visando a preparação da deliberação, foi previamente distribuída cópia do projecto de solução aos Exm.ºs Juízes-Adjuntos.

Cumpre ora conhecer.

                                                         ___

3.

O objecto o recurso.

São questões a dilucidar e resolver, como decorre da formulação de síntese – por onde se afere e delimita, por via de regra, o thema decidendum, ut arts. 634.º/4 e 639.º/1 do C.P.C. – a seguintes:

- A decisão de facto (matéria vaga, genérica e conclusiva) vs. matéria de direito. Poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça.

- Validade formal do contrato a termo.

                                                         ___

                                                               

                                                          II.

                                          Fundamentação

4.De Facto.

Vem estabelecida esta factualidade:

1. A Ré é uma instituição de crédito e exerce a actividade bancária.

2. A Ré participou nas negociações e outorgou o ACT para o sector bancário.

3. O Sindicato dos Bancários do Norte declarou que o Autor é seu associado desde 08.11.2007 (documento de fls. 13, que se dá por reproduzido).

4. O ‘ISVOUGA – Instituto Superior de Entre o Douro e Vouga’ declarou que o Autor frequentou nesse estabelecimento o curso de “Gestão de Empresas” e concluiu a respectiva licenciatura no ano de 2008 (documento de fls. 14, que se dá por reproduzido).

5. O Autor trabalhou na Ré, no Balcão de ... – Feira, desde 12 de Março até 24 de Agosto de 2009, tendo para tal estabelecido um contrato com a ‘CC, Empresa de Trabalho Temporário, Ld.ª’ (documento de fls. 15 a 17, que se dá por reproduzido).

6. Do contrato celebrado, datado de 12.03.2009, consta como cláusula 1.ª que “O presente contrato tem por motivo justificativo o disposto na alínea f) do n.º 2 do art. 140.º e n.º 1 do art. 175.º do Código do Trabalho, particularmente por acréscimo excepcional da actividade da empresa, com carácter temporário, resultante da maior procura de bens ou serviços em virtude da Campanha de Soluções de Poupança “...”, actualmente em curso, que canalizará grande parte dos recursos humanos já existentes para o lançamento da campanha, havendo um aumento de volume de trabalho por via directa e indirecta.”

7. Após um curto interregno entre 26.08.2009 e 21.09.2009, reiniciou o seu trabalho na Ré, no Balcão da Av. ..., no Porto, onde prestou serviço desde 21 de Setembro de 2009 (documento de fls. 18 e 19, que se dá por reproduzido).

8. Do contrato celebrado, datado de 21.09.2009, consta como cláusula 1.ª que “O presente contrato tem por motivo justificativo o disposto na alínea f) do n.º 2 do art. 140.º e n.º 1 do art. 175.º do Código do Trabalho, particularmente por acréscimo excepcional da actividade da empresa, com carácter temporário, resultante da maior procura de bens ou serviços em virtude da Campanha Super Conta Ordenado, actualmente em curso, que canalizará grande parte dos recursos humanos já existentes para o lançamento da campanha, havendo um aumento de volume de trabalho por via directa e indirecta.”

9. Na vigência desse contrato, em Novembro de 2009, a Ré solicitou ao Autor que enviasse o seu curriculum para a DRH – Direcção de Recursos Humanos.

10. Na sequência, a Ré chamou o Autor para uma reunião, em Coimbra, com Rita Themudo, Directora da DRH-Norte.

11. Ocorreu ainda uma segunda reunião com DD, Director Comercial duma área que a Ré designa de “N...”, a qual engloba Santa Maria da Feira.

12. O dia 24 de Novembro de 2009 foi o dia em que o Autor prestou o seu último dia de trabalho nas instalações da Ré, na Av. ..., no Porto.

13. No dia seguinte passou a prestar o seu trabalho à Ré no Balcão de L....

14. O Autor desempenhou sempre as mesmas funções em qualquer dos balcões da Ré.

15. O Autor exerceu as funções de caixa, no âmbito das quais fazia transferências bancárias, recebimentos e pagamentos, e administrativas.

16. No balcão de ... e da Av. ..., Porto, as funções de “caixa” foram exercidas sem continuidade.

17. Desde o início e por todo o tempo que trabalhou nas instalações da Ré, o Autor exerceu funções sob a direcção e orientação imediata do gerente e do subgerente do respectivo balcão, integrados nos quadros de pessoal da Ré.

18. Desde o início, a Ré atribuiu a Autor o código de “utilizador” …, código este que foi mantido no Balcão da Av. ..., o qual em Novembro de 2009, quando passou para L..., foi alterado para …, bem como uma password (esta com a obrigação de alteração pelo Autor) de acesso ao sistema informático, por forma a desempenhar as suas funções.

19. Quando o Autor passou do balcão da Av. ... para o balcão de L..., no dia 25 de Novembro de 2009, a Ré, por intermédio do respectivo gerente, apresentou ao Autor um novo “contrato de trabalho a termo certo” para que este o assinasse (documento de fls. 79 a 84, que se dá por reproduzido).

20. O Autor assinou o contrato.

21. Nesse contrato previa-se que o Autor era admitido “para o exercício das funções correspondentes à categoria profissional de empregado bancário, sem função específica de enquadramento”.

22. O contrato previa a produção de efeitos a partir de 25.11.2009 e que era celebrado “pelo prazo de seis meses, com termo em 24.05.2010”.

23. No número 2 da cláusula 11.ª constava que “o contrato é celebrado com fundamento na alínea f), do n.º 2 do artigo 140.º do Código do Trabalho, para prover ao acréscimo excepcional da actividade do Primeiro Contraente resultante do lançamento da campanha ‘Poupança Cresce Mais’, o qual se estima ter a duração estabelecida no número anterior”.

24. O Autor continuou com o mesmo horário de trabalho desde o começo do trabalho nas instalações da Ré, fixado das 8h30 às 16h30, com uma hora de intervalo para o almoço.

25. A Ré integrou o Autor no "grupo I" e no “nível 5", previstos nas cláusulas 4.ª e 5.ª do ACT.

26. Ultimamente, a Ré pagava ao Autor o salário base de € 848,80, a que acrescia um subsídio de refeição no valor de € 9,03 por cada dia de trabalho efectivo.

27. Por exercer funções de “caixa” recebia mensalmente um “acréscimo a título de falhas” no valor de 134,63 €, por mês (documento de fls. 85, que se dá por reproduzido).

28. A retribuição mensal era paga em dobro pelas férias e pelo Natal.

29. Por cartas datadas de 12.04.2010 e 11.10.2010, a Ré comunicou ao Autor que “o seu Contrato de Trabalho de Termo Certo se renovará por um período igual ao inicialmente estabelecido” (documentos de fls. 22 e 23, que se dão por reproduzidos).

30. Por carta datada de 12.04.2011, a Ré comunicou ao Autor que “o contrato de trabalho a termo certo celebrado com V. Ex.ª em 25-11-2009 terá o seu termo em 24-05-2011” (documentos de fls. 24, que se dá por reproduzido).

31. Desde 25.05.2011, a Ré nunca mais deu trabalho ao Autor nem lhe pagou retribuições, considerando extinto o contrato de trabalho.

32. As “campanhas” são sucessivamente lançadas e fazem parte do marketing habitual da Ré.

33. A Ré lançou campanhas como “Super …”, “Conta …”, “Super …”, “Campanha”, “Soluções …”, “Super …”, “Campanha …”, “Poupança …”, “Fiscal 2010”, “Ordenados …”, “Soluções Integradas”, “…”.

34. Correspondem a propostas de aplicações financeiras para cativar as poupanças dos clientes do Banco.

35. Trata-se duma prática habitual da Ré.

36. Aquando da saída do Autor, a Ré transferiu para o mesmo local de trabalho outra trabalhadora, de nome EE, que passou a exercer genericamente as mesmas funções de que o Autor se ocupava, funções de “caixa”.

37. Transferiu, para o mesmo balcão, outro trabalhador, de nome FF, o qual exerce funções de “gestor de clientes”.

38. Quando o Autor estava ao serviço, o balcão de L... tinha cinco trabalhadores ao serviço e, depois, com a integração daqueles dois trabalhadores passou a ter seis.

39. No âmbito da actividade bancária, a Ré promove diversas campanhas, com vista à promoção dos seus produtos e à fidelização dos seus clientes, assim como à angariação de novos clientes.

40. Por vezes, a Ré, aquando do lançamento de campanhas e durante a sua duração, tem necessidade de aumentar o número de trabalhadores nos balcões onde a promoção das campanhas e a afluência do público às mesmas é mais expressiva, para fazer face a acréscimo de trabalho decorrente do aumento de clientela para as referidas campanhas.

41. Assim, recorre à contratação temporária de trabalhadores especializados.

42. Em Março de 2009, foi lançada pela Ré a terceira fase da campanha de Soluções … “...”.

43. A Ré teve assim necessidade de adequar o seu quadro de pessoal ao lançamento da 3.ª fase da campanha, sem desestabilizar as equipas dos diversos balcões.

44. Prevendo um aumento temporário da actividade nos balcões onde a Campanha estava em curso e onde estava a ter aceitação, a Ré celebrou com a ‘CC’ um contrato de utilização de trabalho temporário, em 12.03.2009, quando decidiu que iria lançar a 3.ª fase da campanha (documento de fls. 75 e 76, que se dá por reproduzido).

45. Na sequência do contrato de utilização celebrado, a ‘CC’ colocou o Autor ao serviço da Ré, tendo este sido colocado no balcão de ..., Santa Maria da Feira.

46. A duração da campanha é avaliada consoante os níveis de aceitação e procura dos clientes ou potenciais clientes da Ré.

47. No segundo trimestre de 2009, a Ré havia lançado a Campanha “Super …”, a qual consistia na atribuição de um conjunto de condições favoráveis por contrapartida da fidelização do ordenado dos clientes.

48. Neste contexto a Ré celebrou, em 21.09.2009, com a ‘CC’ um novo contrato de utilização de trabalho temporário (documento de fls. ... e 78, que se dá por reproduzido).

49. O Autor foi novamente colocado pela ‘CC’ ao serviço da Ré, agora no balcão do Porto – Av. ..., tendo iniciado a sua actividade nesse balcão no dia 21.09.2009.

50. A duração da campanha seria avaliada consoante os níveis de aceitação e procura dos clientes ou potenciais clientes da Ré.

51. O Autor, após a sua saída, não foi substituído por qualquer trabalhador.

52. No âmbito da sua actividade, a Ré lançou no segundo semestre de 2009 a campanha promocional denominada “Poupança …”, que consistia na captação de recursos de clientes e consequente fidelização destes.

53. Para que esta campanha tivesse a aceitação e o êxito projectados, era necessário que os balcões da Ré desenvolvessem actividades promocionais e de esclarecimento dos contornos da mesma e do produto oferecido, quer junto dos clientes já fidelizados, quer junto de potenciais clientes a angariar.

54. No âmbito destas actividades, seria necessário, entre outras, contactar clientes, fazer a apresentação e a explicação do produto oferecido na campanha, elaborar simulações e proceder ao preenchimento electrónico de propostas de adesão.

55. O que fez que houvesse um acréscimo do trabalho já existente em diversos balcões, nomeadamente o de L....

56. O balcão de L...[1] solicitou um trabalhador para fazer face a necessidades determinadas pelo acréscimo de trabalho.

57. A campanha podia terminar a qualquer momento, após a primeira avaliação da sua viabilidade económica prevista para o final do 1.º semestre de 2010.

58. Da avaliação realizada em meados de 2010 resultou que as condições especiais atribuídas aos clientes no primeiro ano corresponderam aos objectivos traçados pela Ré e, em consequência, a campanha foi prorrogada por mais seis meses, altura em que seria efectuada nova avaliação.

59. O contrato de trabalho celebrado com o Autor foi renovado por um período de 6 meses, até 24.11.2010.

60. Após nova avaliação da Campanha “Poupança …”, efectuada no 3.º trimestre de 2010, a Ré concluiu que a mesma continuava a ter boa aceitação junto dos clientes do Banco e decidiu manter a atribuição de tais condições especiais por mais seis meses, altura em que seria efectuada nova avaliação.

61. O contrato de trabalho celebrado com o Autor foi renovado por um período de 6 meses, até 24.05.2011[2].

62. Em Março de 2009, o número total de trabalhadores contratados a termo ao serviço da Ré era de 212, num total de 5.580 trabalhadores, e em Maio de 2011 era de 109, num total de 5.686 trabalhadores.

63. O Autor estava excedentário no balcão de L....

64. A Ré denunciou o contrato de trabalho a tempo certo celebrado com o Autor, por meio de comunicação escrita, dirigida ao Autor no dia 12 de Abril de 2011, com efeitos à data de 24 de Maio de 2011 (documento de fls. 24, que se dá por reproduzido).

65. No balcão de L...,[3] o Autor não foi substituir qualquer trabalhador permanente da Ré, nem após a sua saída foi substituído por qualquer trabalhador da Ré.

66. Com a cessação do contrato de trabalho, a Ré pagou ao Autor férias e subsídio de férias e de Natal e a quantia de € 1.410,31, a título de compensação pela cessação.

                                                          __

5. – Os Factos e o Direito.

O Acórdão sub specie, enfrentando as duas questões colocadas pelo recorrente, desatendeu a pretendida alteração da decisão da matéria de facto e considerou validamente cessado o contrato a termo, licitamente outorgado entre os litigantes.

Confirmou, por isso – por maioria, como se disse já – a sentença recorrida.

O recorrente reedita as questões que incluiu no objecto da Apelação:

1.ª - Não se conforma com o facto de não se ter determinado como não escrita a matéria ínsita nos pontos 40.º, 41.º, 56.º, 63.º e 65.º da factualidade assente, no pressuposto entendimento de que em todos estes casos estamos perante matéria vaga, genérica e conclusiva;

2.ª – Não se resigna com o facto de a deliberação sob protesto não só considerar que o contrato a termo em causa é formalmente válido, como ainda que se encontra materialmente demonstrado.

Conhecendo.

. - Como se sabe, a intervenção do Supremo Tribunal, no que concerne à determinação dos contornos do quadro de facto relevante, é assaz limitada, mesmo residual.

A sua vocação matricial (a isso se restringindo os seus poderes de cognição) é o conhecimento da matéria de direito, como se proclama/va no art. 33.º da LOFTJ, na redacção da Lei n.º 52/2008, de 28 de Agosto, e ora consta do art. 46.º da Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto.

Nos termos da atinente disciplina adjectiva (seja a constante das normas do C.P.C., na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, seja nas homólogas do novo C.P.C., na formulação aportada pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, vigentes desde 1.9.2013 e imediatamente aplicáveis às acções declarativas pendentes, como no caso, ex vi do seu art. 5.º, n.º 1), a decisão proferida pelo tribunal recorrido quanto à matéria de facto não pode ser alterada, por via de regra.

Ressalva-se o caso excepcional previsto no n.º 3 do art. 674.º, como se determina no n.º 2 do actual art. 682.º (correspondente ao art. 729.º/2 da anterior Codificação), ou seja: o eventual erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de recurso de revista, a não ser que haja ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova.

A apertada sindicabilidade do Supremo Tribunal de Justiça cinge-se, pois, à apreciação acerca da (i)observância das identificadas regras de direito material probatório.

Fora desse cenário, o Supremo Tribunal aplica definitivamente, aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, o regime jurídico que julgue adequado, só voltando o processo àquele tribunal se/quando se entenda que a decisão de facto pode e deve ser ampliada, em ordem a constituir base suficiente para a decisão de direito, ou quando ocorram contradições na decisão sobre a matéria de facto que inviabilizem a decisão jurídica do pleito – n.ºs 1 e 3 do art. 682.º do NCPC (n.ºs 1 e 3 do anterior art. 729.º).  

Aduz o impetrante que os factos identificados deveriam ter sido dados por não escritos, à luz do disposto no art. 646.º do C.P.C. de 1961 …aplicável ao caso em apreço.

Dispunha concretamente o n.º 4 desta previsão (que não foi mantida, ao menos em termos de directa correspondência, na disciplina homóloga da nova Codificação[4]) que se têm por não escritas as repostas do Tribunal sobre questões de direito …e bem assim como as dadas sobre factos que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes.

Não se contempla/va a circunstância de se tratar - …como no caso se invoca – de matéria (respostas de facto) vaga, genérica e conclusiva.

Foi-se consolidando, porém, na produção jurisprudencial – …por se ter admitido que assume feição de recorte jurídico a operação de escrutinar se determinada proposição de facto tem ou não natureza conclusiva –, o entendimento de que ([5]) não porque tal preceito contemple expressamente a situação de sancionar como não escrito um facto conclusivo, mas (…) porque, analogicamente, aquela disposição é de aplicar a situações em que em causa esteja um facto conclusivo, as quais, em rectas contas, se reconduzem à formulação de um juízo de valor que se deve extrair de factos concretos, objecto de alegação e prova, e desde que a matéria se integre no thema decidendum.”  

Reportando-nos aos pontos de facto controvertidos – e tendo como aferidor diferencial a consabida distinção conceptual entre matéria/questão de facto e matéria/questão de direito –, importa saber se o que neles se contém encerra, em si, a resposta à questão, a sua solução jurídica.

Na afirmativa, a proposição será conclusiva (na perspectiva dilucidada) se exprimir uma valoração jurídico-subsuntiva essencial, devendo ser expurgada, por isso.

Não assim, no caso contrário.

A materialidade questionada respeita, como se constata no descrito contexto, à caracterização de um dos requisitos da admissibilidade do contrato de trabalho a termo resolutivo, concretamente o da satisfação de necessidades temporárias da empresa.

Tudo revisto, diremos que, pese embora a sua perfectível formulação (enquanto expressão de um genuíno juízo de facto), as identificadas proposições não só não envolvem (…todas, e de modo igualmente inequívoco) meros juízos conclusivos e/ou de valor, como, por outra banda – e decisivamente – o seu teor não pode ser havido como matéria de direito integrada no thema decidendum.

 Em tais proposições de facto não se contém, na explicitada dimensão, a resposta à questão jurídica constante da hipótese legal de subsunção.

As mesmas constituirão, enquanto tais, e não obstante, simples elementos de facto ponderáveis, em maior ou menor medida, na densificação da correspondente premissa.

Com efeito:

O que consta dos referidos pontos da fundamentação de facto (desde logo nos items 40.º e 41.º) é tão-só que a R., aquando do lançamento de campanhas e durante a sua duração, teve necessidade de aumentar o número dos seus trabalhadores, recorrendo, para fazer face ao acréscimo de trabalho resultante do aumento conjuntural da clientela, à contratação temporária de trabalhadores especializados.

Nesse pressuposto e dinâmica, plasmou-se depois, sob o item/facto 56.º, que, concretamente, o balcão de L... solicitou um trabalhador para o efeito.

Não tendo o A. ido substituir qualquer trabalhador permanente da R. nesse balcão de L..., nem tendo sido substituído, após a sua saída, por qualquer outro trabalhador da R., o mesmo passou a estar aí excedentário.

É isso que se espelha nos demais pontos 63.º e 65.º.

Esta constatação lógica apenas reflecte, em síntese, a compreensível realidade de facto que lhe está subjacente…como claramente flui e se consignou, aliás, na análise desenvolvida no Aresto sub iudicio aquando da reapreciação da prova adrede oferecida pela apelante.

Só isso…

…O que não implica, nos seus termos e como sua necessária decorrência, a solução jurídica do caso protagonizado.

questão de direito a operação de interpretação e aplicação da lei).

Em suma:

As questionadas proposições não são meras asserções conclusivas, antes factos, a considerar como tal, pelo que improcedem as atinentes conclusões da motivação recursória da Revista.

                                                 __

Não se vendo prefigurada qualquer das situações acauteladas no n.º 3 do art. 682.º do NCPC, será, pois, com suporte no quadro de facto estabelecido que vai dirimir-se a questão axial suscitada na presente Revista.

                                                          __

 

. Do contrato de trabalho a termo certo.

Enquadramento normativo (breve nota).

A questão decidenda integra-se na problemática maior do comummente chamado contrato a termo (resolutivo).

Não obstante os sinais dos tempos, a vocação original de perdurabilidade do contrato de trabalho mantém-se hodiernamente, sendo a celebração do contrato de trabalho a termo reservada exclusivamente à satisfação de necessidade/s temporária/s da empresa e pelo período estritamente necessário à satisfação dessa/s necessidade/s – art. 140.º, n.º 1, do Código do Trabalho revisto/C.T. de 2009, previsão homóloga à constante do art. 129.º/1 do Código do Trabalho de 2003.

Servindo-nos, esquematicamente, do ensinamento constante das lições de Pedro Romano Martinez (‘Direito do Trabalho’, 5.ª Edição, 2010, Almedina, pg. 701/ss.), diremos que a admissibilidade do contrato a termo assenta, basicamente, em três fundamentos: o primeiro, constante de uma cláusula geral (o enunciado do n.º 1 do art. 140.º do CT/2009 - …‘satisfação de necessidade temporária da empresa’); os demais, acessoriamente previstos, enformam as hipóteses legais plasmadas nas duas alíneas do n.º 4 da norma.

Assim, a razão primordial da sua celebração – sempre excepcional, por consabidos motivos – pressupõe, por um lado, a verificação da transitoriedade do trabalho a efectuar; visa, por outro lado, a salvaguarda da redução do risco empresarial, em situações específicas, e, por fim, viabiliza a promoção/desenvolvimento de políticas activas de emprego.

A disciplina desta modalidade[6] do vínculo juslaboral vem contemplada no art. 139.º e ss. do Código do Trabalho de 2009.

 

Importa reter basicamente – na senda do regime legal anterior – que a contratação a termo (qualificada dogmaticamente por alguns autores como um contrato de trabalho especial[7]), sendo sempre excepcional, está sujeita a forma escrita, constituindo alguns dos seus elementos verdadeiras formalidades ad substantiam ou ad essentiam, cuja omissão tem como cominação a sua conversão automática em contrato por tempo indeterminado.

Referimo-nos, de entre elas, à omissão (ou insuficiência) da indicação do termo estipulado e do respectivo motivo justificativo, cabendo ao empregador a prova dos factos que determinam a sua celebração – arts. 140.º/5 e 141.º, n.º 1, alínea e) e n.º 3 e art. 147.º, n.º 1, alínea c).

Quanto a esta, a exigência da indicação do respectivo motivo justificativo, – tornada mais rigorosa por conhecidas razões, que entroncam, relembre-se, no propósito que determinou o legislador a intervir na LCCT através da Lei n.º 38/96, de 31 de Agosto, e, depois, pela Lei n.º 18/2001, de 3 de Julho –, preceitua o n.º 3 do citado art. 141.º que, para o referido efeito, a indicação do motivo justificativo do termo deve ser feita com menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado.

Com o postulado requisito (indicação do motivo justificativo) visa-‑se, consabidamente, um duplo objectivo: a verificação externa da conformidade da situação concreta com a hipótese legal ao abrigo da qual se contratou, por um lado; por outro, a averiguação acerca da realidade e adequação da justificação invocada face à duração estipulada, porquanto o contrato a termo – nas palavras de Monteiro Fernandes[8]…só pode ser (validamente) celebrado para certos (tipos de) fins e na medida em que estes o justifiquem.

(Sobre a génese/escopo, vicissitudes/evolução histórica e relevância dogmática do instituto, a doutrina fez já a adequada recensão – cfr., inter alia, A. Monteiro Fernandes, ‘Direito do Trabalho’, 13.ª Edição, pg. 313 e ss., com mais desenvolvimentos na 16.ª Edição, Almedina, Outubro de 2012, pg. 262/ss.; Maria do Rosário Palma Ramalho, ‘Direito do Trabalho’, Parte II, pg. 227/ss., e Júlio Gomes, ‘Direito do Trabalho’, vol. I, pg. 580/ss.).

Isto posto.

                                                          __

.A equação do caso decidendo.

Como flui da factualidade estabelecida, as partes litigantes outorgaram num contrato de trabalho a termo certo, ficando consignado no respectivo documento de suporte que o mesmo tem por motivo justificativo o disposto na alínea f) do n.º 2 do art. 140.º, particularmente por acréscimo excepcional da actividade da empresa, com carácter temporário, resultante da maior procura de bens ou serviços em virtude da Campanha de Soluções de poupança ‘...’, actualmente em curso, que canalizará grande parte dos recursos humanos já existentes para o lançamento da Campanha, havendo um aumento de volume de trabalho por via directa e indirecta’.

Quando o A. passou do balcão da Av. ... para o balcão de L..., no dia 25.11.2009, foi-lhe apresentado um novo ‘contrato de trabalho a termo certo’, pelo prazo de seis meses, que assinou, no qual se previa que o A. era admitido ‘para o exercício de funções correspondentes à categoria profissional de empregado bancário, sem função específica de enquadramento’, constando no n.º 2 da sua cl.ª 11.ª que ‘o contrato é celebrado com fundamento na alínea f) do n.º 2 do art. 140.º do Código do Trabalho, para prover ao acréscimo excepcional da actividade do Primeiro Contraente, resultante do lançamento da campanha “Poupança Cresce Mais”, o qual se estima ter a duração estabelecida no número anterior.’

 

É a validade formal deste último convénio que vem questionada.

As Instâncias coincidiram na solução.

O Acórdão sujeito, analisando e interpretando a factualidade relevante, expendeu, no desenvolvimento da respectiva fundamentação jurídica, as seguintes considerações (transcrição apenas parcial):

Conforme já foi referido, é a própria lei que admite a celebração de contrato de trabalho a termo certo no caso de acréscimo excepcional de actividade da empresa – alínea f), do n.º 2, do artigo 140.º, do C.T. de 2009.

E, como consta do contrato celebrado entre o A. e a Ré, ‘o contrato é celebrado com fundamento na alínea f), do n.º 2 do artigo 140.º do Código do Trabalho, para prover ao acréscimo excepcional da actividade do Primeiro Contraente resultante do lançamento da campanha ‘…’, a qual se estima ter a duração estabelecida no número anterior.’

No entanto, conforme consta do n.º 3 do citado artigo 141.º do C.T., ‘a indicação do motivo justificativo do termo deve ser feita pela menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado’, pois a respectiva falta ou insuficiência implicam a invalidade do termo, considerando-se que foi celebrado um contrato de trabalho sem termo (n.º 1, c), do artigo 147.º do mesmo CT).

Daqui decorre que, na invocação do motivo, não basta remeter para a previsão legal, pois torna-se necessário fazer referência à situação concreta, devendo estabelecer-se, na redacção da cláusula, uma relação entre o motivo invocado e o termo estipulado.        

(…)

O motivo justificativo do contrato a termo terá de ser indicado no documento que suporta o próprio contrato, sob pena de se considerar nula a estipulação do prazo e, nessa medida, tornar o contrato por tempo indeterminado.

(…)

Por fim, é necessário que os factos invocados para a celebração do contrato a termo sejam verdadeiros.

A este propósito consta da sentença recorrida que:

“Do contrato celebrado entre as partes consta como motivo da aposição do termo, “o contrato é celebrado com fundamento na alínea f), do n.º 2 do artigo 140º do Código do Trabalho, para prover ao acréscimo excepcional da actividade do Primeiro Contraente resultante do lançamento da campanha ‘…’, o qual se estima ter a duração estabelecida no número anterior”.

Face ao teor de tal cláusula, não pode deixar de se considerar que a justificação do termo aposto neste contrato obedece ao formalismo legal, encontrando-se o motivo justificativo do termo expressamente referido – lançamento de campanha, com invocação da relação entre a justificação invocada e o termo estipulado – tempo de vigência da campanha.

Assim, o contrato a termo celebrado entre as partes é formalmente válido.

Atenta a alegação de facto do Autor, cumpre analisar se o motivo justificativo era real ou se o mesmo foi utilizado falsamente para poder o Réu recorrer à contratação a termo, situação em que a consequência é a requerida pelo Autor – considerar-se o contrato de trabalho celebrado entre as partes sem termo – art. 147.º do Código do Trabalho.

Para a apreciação de tal questão releva a matéria de facto descrita sob os pontos 32. a 36. (se bem que relativamente a este importa ter em conta que não se trata de substituição do Autor, como consta da resposta à matéria de facto), 39. a 41. e 52. a 61.

Analisada tal matéria de facto, resulta que não obstante o lançamento de campanhas ser prática corrente da actividade do Réu e fazerem parte do seu marketing habitual, por vezes, aquando do lançamento das mesmas e durante a sua duração, o mesmo tem necessidade de aumentar o número de trabalhadores nos balcões onde a promoção das campanhas e a afluência do público às mesmas é mais expressiva (porque não têm igual expressão em todos os balcões), para fazer face a acréscimo de trabalho decorrente quer do aumento de clientela para as referidas campanhas, quer do desenvolvimento de actividades promocionais, de esclarecimento e de angariação.

No que se refere ao caso concreto do Autor, o Réu logrou provar que no segundo semestre de 2009 lançou a Campanha Promocional denominada “…” que consistia na captação de recursos de clientes; que, para que a Campanha tivesse a aceitação e o êxito projectados, era necessário que os Balcões da Ré desenvolvessem actividades promocionais e de esclarecimento dos contornos da mesma e do produto oferecido, quer junto dos clientes já fidelizados, quer junto de potenciais clientes a angariar, sendo necessário contactar clientes, fazer a apresentação e a explicação do produto oferecido na Campanha, elaborar simulações e proceder ao preenchimento electrónico de propostas de adesão; que tal fez que houvesse um acréscimo do trabalho já existente em diversos Balcões, nomeadamente o de L...; que o próprio balcão de solicitou trabalhador para fazer face a necessidades determinadas pelo acréscimo de trabalho.

Mais logrou provar que a campanha, podendo terminar a qualquer momento, tinha a primeira avaliação da sua viabilidade económica prevista para o final do 1.º semestre de 2010; que dessa avaliação resultou que as condições especiais atribuídas aos clientes no primeiro ano corresponderam aos objectivos traçados pela Ré e a campanha foi prorrogada por mais seis meses; que, por isso, foi renovado o contrato com o Autor; que, após nova avaliação efectuada no 3.º trimestre de 2010, a Ré concluiu que a mesma continuava a ter boa aceitação junto dos clientes do Banco e decidiu manter a atribuição de tais condições especiais por mais seis meses, tendo renovado o contrato com o Autor.

Mais resulta que a Ré comunicou a cessação do contrato, por escrito e com antecedência, depois de terminada a campanha.

Por todo o exposto, verifica-se que o contrato de trabalho a termo celebrado fazia menção expressa a motivo justificativo para a sua celebração, que o mesmo se verificava aquando da celebração e renovação do contrato, não resultando dos autos elementos que permitam concluir pela falsidade do motivo justificativo.

Nestes termos conclui-se que a partes se encontravam ligadas entre si por contrato de trabalho a termo certo, que cessou de forma válida nos termos do disposto nos arts. 343.º/a), 344.º/1 e 2 do Código do Trabalho, pelo que improcede a acção.

Após esta transcrição dos termos da fundamentação da sentença que sindicou, prossegue a narrativa:                                                       

“Ora, face à matéria de facto apurada, não podemos deixar de acompanhar a sentença recorrida.

Na verdade, a redacção da cláusula do contrato respeitante ao motivo do termo encontra-se devidamente concretizada, ou seja, dela consta o motivo – para prover ao acréscimo excepcional da actividade do primeiro contraente –, concretizando-se o mesmo ao referir que resulta do lançamento da campanha “poupança cresce mais” e, por fim, estabelecendo a relação entre aquele motivo e a duração do contrato, ao consignar-se que se estima que tal acréscimo da actividade tenha a duração estabelecida no número anterior, isto é, a duração de 6 meses (a mesma duração do contrato), sem esquecer que o A. foi contratado para exercer as funções de empregado bancário, sem função específica de enquadramento.

Assim, a fundamentação constante do contrato em análise contém factos que estabelecem a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado, ou seja, factos dos quais se retira o porquê da estipulação do prazo de 6 meses.

Desta forma, o contrato celebrado permite que seja efectuado o controlo supra referido, que seja sindicada a fundamentação bem como a sua veracidade e, desta forma, que se conclua que tal contrato celebrado entre o A. e Ré se encontra previsto no n.º 1 do artigo 140.º do C.T. e conforme as exigências previstas nos n.ºs 1 e 3, do artigo 141.º do C.T.

Como se refere no acórdão desta Relação[9], ao que julgamos, inédito, e a propósito de idêntica questão, ‘[d]este modo, além de o motivo invocado se reconduzir a um caso em que o legislador considera lícita a celebração do contrato de trabalho a termo (o lançamento de uma campanha que se estima ter a duração de 6 meses prefigura-se no texto como uma “necessidade temporária da empresa” e integra a hipótese legal do artigo 140.º, n.º 1 do Código do Trabalho), mostram-se explicitados no contrato factos recondutíveis a tal motivo [o lançamento da campanha com uma concreta identificação: “…”] e o texto permite ainda estabelecer “a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado”, em conformidade com o que estabelece o artigo 141.º, n.º 1, alínea e) e n.º 3 do Código do Trabalho>>.

O contrato é, assim, formalmente válido porque conforme com os requisitos exigidos no artigo 141.º do C.T.

                                                                   

Mas, como já referimos, cumpre ainda indagar se o motivo invocado e o prazo estabelecido são verdadeiros.

Da matéria de facto apurada resulta que as “campanhas” são sucessivamente lançadas e fazem parte do marketing habitual da Ré; a Ré lançou campanhas como “… …”, “Conta …”, “…”, “…”, “…”, “Campanha …”, “…”, “…”, “…”, “…”, “…”, que correspondem a propostas de aplicações financeiras para cativar as poupanças dos clientes do Banco e trata-se duma prática habitual da Ré.

No entanto, apurou-se, ainda, que no âmbito da actividade bancária, a Ré promove diversas campanhas, com vista à promoção dos seus produtos e à fidelização dos seus clientes, assim como à angariação de novos clientes; por vezes a Ré, aquando do lançamento de campanhas e durante a sua duração, tem necessidade de aumentar o número de trabalhadores nos balcões onde a promoção das campanhas e a afluência do público às mesmas é mais expressiva, para fazer face a acréscimo de trabalho decorrente do aumento de clientela para as referidas campanhas; no âmbito da sua actividade, a Ré lançou no segundo semestre de 2009 a campanha promocional denominada “…”, que consistia na captação de recursos de clientes e consequente fidelização destes; para que esta campanha tivesse a aceitação e o êxito projectados era necessário que os balcões da Ré desenvolvessem actividades promocionais e de esclarecimento dos contornos da mesma e do produto oferecido, quer junto dos clientes já fidelizados, quer junto de potenciais clientes a angariar; no âmbito destas actividades seria necessário, entre outras, contactar clientes, fazer a apresentação e a explicação do produto oferecido na campanha, elaborar simulações e proceder ao preenchimento electrónico de propostas de adesão; o que fez (com) que houvesse um acréscimo do trabalho já existente em diversos balcões, nomeadamente o de L...; o balcão de L... solicitou um trabalhador para fazer face a necessidades determinadas pelo acréscimo de trabalho; a campanha podia terminar a qualquer momento, após a primeira avaliação da sua viabilidade económica prevista para o final do 1.º semestre de 2010; da avaliação realizada em meados de 2010 resultou que as condições especiais atribuídas aos clientes no primeiro ano corresponderam aos objectivos traçados pela Ré e, em consequência, a campanha foi prorrogada por mais seis meses, altura em que seria efectuada nova avaliação; o contrato de trabalho celebrado com o Autor foi renovado por um período de 6 meses, até 24.11.2010; após nova avaliação da Campanha “…”, efectuada no 3.º trimestre de 2010, a Ré concluiu que a mesma continuava a ter boa aceitação junto dos clientes do Banco e decidiu manter a atribuição de tais condições especiais por mais seis meses, altura em que seria efectuada nova avaliação e o contrato de trabalho celebrado com o Autor foi renovado por um período de 6 meses, até 24.05.2011.

Significa isto que a Ré logrou provar, como lhe competia (n.º 5 do art. 140.º do C.T.) que lançou a campanha “…” e que as necessidades inerentes à sua concretização originaram um acréscimo do trabalho no balcão de L..., que solicitou um trabalhador para fazer face ao mesmo, local onde o A. foi colocado.

Mas tal necessidade da Ré era temporária, o acréscimo da sua actividade foi excepcional?

É que ‘a lei autoriza a celebração de contratos precários em ordem à satisfação de necessidades transitórias das empresas.

(…) Nesta lógica, se a necessidade é transitória, o correspondente contrato de trabalho pode ser temporário; se a necessidade for permanente, então já o contrato deverá ser de duração indeterminada’[10].

Pese embora o lançamento de campanhas faça parte do marketing habitual da Ré, face aos restantes factos apurados somos levados a concluir que a campanha em causa originou um acréscimo excepcional ou temporário do trabalho.

Na verdade, apurou-se que a Ré, por vezes, aquando do lançamento de campanhas e durante a sua duração, tem necessidade de aumentar o número de trabalhadores nos balcões onde a sua promoção e a afluência do público às mesmas é mais expressiva, para fazer face a acréscimo de trabalho decorrente do aumento de clientela para as referidas campanhas, o que ocorreu com a campanha e balcão em causa onde foi colocado o A., sendo que a mesma podia terminar a qualquer momento após o decurso do prazo fixado no contrato e respectiva avaliação.

Só que não terminou ao fim de seis meses, antes foi objecto de avaliação e prorrogação e com ela o contrato do A. foi alvo de duas renovações, conforme cartas juntas a fls. 22 e 23, por períodos iguais ao inicialmente estabelecidos e mantendo-se as restantes condições do contrato e, assim, em conformidade com o disposto no n.º 3 do artigo 149.º do C.T.  

Face ao que ficou dito, temos de concluir que o motivo e o prazo apostos no contrato e nas renovações são verdadeiros e, consequentemente, o contrato a termo celebrado entre o A. e a Ré é válido e cessou nos termos legais, por caducidade. (Bold agora).

                                                       ____

Tudo revisto e ponderado, temos por correctamente feitas a análise e interpretação dos factos atinentes.

 Ratificamos, nos seus traços gerais, a fundamentação jurídica expendida, a que, para além do já antedito, nada mais, de relevante, há a acrescentar.

Sufraga-se, pois, a solução eleita.

Daí que soçobrem, consequentemente, as razões aduzidas em contrário.

Vale dizer – em refutação final, ora mais compreensiva e convincente, como se deseja …e se concederá, sem embargo do reconhecido empenho dialéctico patenteado – que se mostram objectivados, no caso, de modo bastante, os requisitos legais que legitimaram a vinculação precária de que se lançou mão, maxime a concretizada relação entre a justificação invocada e o termo estipulado.

Isso resulta, de forma clara, da factualidade acima reeditada.

Embora contratado para o exercício de funções sem enquadramento específico, mas correspondentes à categoria profissional de empregado bancário, (na prática o A. desempenhou sempre as mesmas funções de ‘caixa’ e administrativas, no âmbito das quais fazia transferências bancárias, recebimentos e pagamentos), a sua contratação encontra demonstrado fundamento no (invocado) aumento conjuntural da actividade da R. directamente decorrente do lançamento da/s identificada/s campanha/s de marketing.

Esta/s (a última, de que se cuida, a campanha ‘…’), podendo terminar a qualquer momento, viu a sua justificação prolongada após a avaliação efectuada no 3.º trimestre de 2010, renovando-se o contrato de trabalho celebrado com o A. por um (novo) período de seis meses, até 24.5.2011, sendo que, no balcão em que se encontrava colocado, o A. não foi substituir qualquer trabalhador permanente da Ré, nem após a sua saída foi substituído por qualquer trabalhador da mesma.

Não vemos, pois, que mais do que isso fosse exigível para o efeito em causa.

Acerca da questionada veracidade do motivo invocado – e para além das tarefas instrumentais reportadas nos items 53.-55. da FF[11] -, dir-se-á, complementarmente, que não é a circunstância de a R., no âmbito do seu marketing habitual, lançar campanhas sucessivamente que retira à actividade assim implementada a natureza de necessidade temporária da empresa.

Não sendo esse o seu objecto social, as diversas campanhas de promoção dos seus produtos e/ou serviços visam um objectivo comercial, que, podendo terminar a qualquer momento, implicitam, como é razoável admitir-‑se, uma actividade transitória, que, no caso, se mostra perfeitamente recortada/factualizada, com flui, v.g., dos pontos 52., 55. e 56. da FF.

(Vai neste mesmo sentido a atenta análise constante do ‘parecer’ do Exm.º Procurador-Geral Adjunto, indutora da conclusão plasmada em c., fls. 606, a que nos reportamos, dando-a aqui por reproduzida).

[Uma nota final parentética para consignar que o entendimento jurisprudencial relativo à interpretação e aplicação das normas jurídicas em causa, subjacente nos Arestos identificados na motivação recursória, é inteiramente coincidente com preconizada na presente deliberação.

Diversos são, sim, em bom rigor, os contornos de facto de cada um dos casos aí versados e, consequentemente, a sua interpretação e subsunção].

Contrariamente ao propugnado pelo postulante, não foi violado o disposto nas normas em causa, como dilucidado ficou, de modo bastante.

Tudo tratado, do essencial que nos cumpria conhecer, vamos terminar.

                                                          __

                                                            III.

     DECISÃO

       Nos termos e com os fundamentos expostos, delibera-se negar a Revista e confirmar o Acórdão impugnado.        

Custas a cargo do recorrente.

(Anexa-se sumário).                                      

                                                         ****

Lisboa, 14 de Janeiro de 2015

Fernandes da Silva (Relator)

Gonçalves Rocha

António Leones Dantas

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[1] - Aditou-se a palavra L... que, certamente por lapso, foi omitida, tendo em conta o constante do artigo 43 da contestação para o qual se remete na decisão sobre a matéria de facto.
[2] - Por lapso constava 24/11/2010, o que se retira dos factos n.ºs 59 e 60 e da decisão sobre a matéria de facto que remete para os artigos 55º e 56.º da contestação e para o documento de fls. 23.
[3]  - Constava balcão de L…, certamente por lapso originado pela contestação, uma vez que o A. exercia as suas funções no balcão de L....
[4] – Ante a sua eliminação, que não consta da disciplina correspondente do Novo C.P.C., cremos poder manter-se o mesmo entendimento das coisas interpretando, a contrario sensu, o actual n.º 4 do art. 607.º, segundo o qual, na fundamentação da sentença, o Juiz declara quais os factos que julga provados…
([5]) - Usamos as palavras do paradigmático Acórdão desta Secção, de 23.9.2009, tirado na Revista n.º 238/06.7TTBRG.S1, consultável no site da DGSI.PT, secundadas por outros diversos Arestos, dentre eles, o prolatado no Proc. n.º 30/08.4TTLSB.L1.S1, de 19.4.2012 e também o citado na motivação recursória (Proc. n.º 240/10.4TTLMG.P1.S1, de 23.5.2012).
[6] - Terminologia usada pelo legislador de 2009 na sistemática do actual Código do Trabalho, cuja Secção IX é subordinada à epígrafe ‘Modalidades de contrato de trabalho’.
[7]  - Assim M. Rosário Palma Ramalho, ‘Direito do Trabalho’, Parte II, 3.ª Edição, pg. 227.
[8] - ‘Direito do Trabalho’, 13.ª Edição, pg. 319.
[9] - Processo n.º 151/11.6TTVNG.P1, 4ª secção, relatado pela Exm.ª Desembargadora Dr.ª Maria José Costa Pinto.
[10] João leal Amado, Contrato de Trabalho, Coimbra Editora, pág. 92.
[11] - FF = Fundamentação de Facto.