Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
224/09.5PAOLH.S1
Nº Convencional: 3ª SECÇÃO
Relator: OLIVEIRA MENDES
Descritores: BURLA
CONCURSO DE INFRACÇÕES
CÚMULO JURÍDICO
FALSIFICAÇÃO
FINS DAS PENAS
IMAGEM GLOBAL DO FACTO
MEDIDA CONCRETA DA PENA
PENA ÚNICA
Data do Acordão: 03/14/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Área Temática:
DIREITO PENAL - CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DO FACTO / ESCOLHA E MEDIDA DA PENA / PUNIÇÃO DO CONCURSO DE CRIMES.
Doutrina:
- Eduardo Correia, Comissão Revisora do Código Penal, Acta da 28ª, Sessão realizada em 14 de Abril de 1964.
- Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, 290/292.
- Jescheck, Tratado de Derecho Penal Parte General (4ª edição), 668.
Legislação Nacional:
CÓDIGO PENAL (CP): - ARTIGO 77.º, N.ºS 1 E 2.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 08.03.05, 09.11.18, 11.02.23 E 13.02.06, PROFERIDOS NOS PROCESSOS N.ºS 114/08, 702/08. 3GDGDM. P1.S1, 429/03. 2PALGS.S1 E 639/10.6PBDIS.S1.
Sumário :
I - Segundo o n.º 1 do art. 77.º do CP, na medida da pena são considerados em conjunto, os factos e a personalidade do agente, o que significa que o cúmulo jurídico de penas não é uma operação aritmética de adição, nem se destina, tão só, a quantificar a pena conjunta a partir das penas parcelares cominadas.

II - Com a fixação da pena conjunta pretende-se sancionar o agente, não só pelos factos individualmente considerados, mas também e especialmente pelo respectivo conjunto, não como mero somatório de factos criminosos, mas enquanto revelador da dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do agente, visto que a lei manda que se considere, em conjunto, (e não unitariamente) os factos e a personalidade do agente.

III -Na determinação concreta da pena conjunta é importante a averiguação sobre se ocorre ou não ligação entre os factos em concurso, bem como a indagação da natureza ou tipo de relação entre os factos, sem esquecer o número, a natureza e a gravidade dos crimes praticados e das penas aplicadas, tudo ponderado em conjunto com a personalidade do agente, tendo em vista a obtenção de uma visão unitária do conjunto dos factos, que permita aferir se o ilícito global é ou não produto de tendência criminosa do agente, bem como fixar a medida concreta da pena tendo presente o efeito dissuasor e ressocializador que essa pena irá exercer sobre aquele.

IV -O arguido foi condenado como autor material de 11 crimes de falsificação de documento e de 3 crimes de burla relativamente a factos perpetrados sequencialmente, entre Janeiro e Março de 2009, através dos quais pretendia entrar na posse de bens e valores alheios, o que conseguiu quanto a 1 computador, 2 LCD, 1 monitor e 1 telemóvel.

V - Tendo em consideração o número de crimes perpetrados, o quantum das penas singulares impostas e o efeito da pena sobre o comportamento futuro do recorrente, actualmente com 35 anos, nada há a censurar à pena conjunta de 6 anos de prisão.
Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

No âmbito do processo supra referenciado, do 1º Juízo Criminal de Faro, o arguido AA, com os sinais dos autos, foi condenado como autor material, em concurso real, de onze crimes de falsificação de documento e de três crimes de burla na pena conjunta de 6 anos de prisão[1].

 O arguido interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.

É do seguinte teor o segmento conclusivo da respectiva motivação[2]:
1. A pena única de 6 anos de prisão é excessiva, sendo adequada, no entender do arguido, a pena única de 4 anos de prisão.
2. Este, desde que está detido, tem modificado o seu comportamento, com vista a poder levar uma vida normal depois de cumprida a sua pena.
3. No E.P. de Pinheiro da Cruz, o arguido mantém um comportamento adequado às normas vigentes, denotando interesse em valorizar-se ao nível pessoal, tendo frequentado um curso de formação, completado o 9º ano de escolaridade, mantendo ainda actividade ocupacional de bar e frequentando as aulas de música.
4. O arguido mantém uma relação estreita com os seus familiares (nomeadamente ex-companheira, filha e irmão), que o visitam regularmente no estabelecimento prisional.
5. Ao invés da pena única de 6 anos de prisão, que é excessiva e redutora da viabilidade de reinserção social, a pena única de 4 anos permite-lhe retomar mais cedo as suas relações profissionais e familiares em liberdade, para o que conta com o apoio da família.
6. Deverá ser efectuado cúmulo jurídico dessa pena com as que já foram aplicadas ao arguido.
7. No douto Acórdão recorrido, não foi tida devidamente em conta a alínea e) do artº 71º do C. Penal.

Na contra-motivação apresentada o Ministério Público formulou as seguintes conclusões:

1. Condenado, em cúmulo jurídico, na pena de 6 anos de prisão, o recorrente considera tal pena “excessiva” e defende a aplicação de uma “pena única de 4 anos de prisão”.

2. O arguido foi condenado na pena referida em cúmulo das penas que lhe foram aplicadas:

       pela prática de 1 crime de falsificação p. e p. no art. 256, nºs: 1 e 3 do CP, a pena de 1 ano e 6 meses de prisão;

       pela prática de 10 crimes de falsificação ps. e ps. no art. 256, nº: 1 do CP, as penas de 10 meses de prisão por cada um deles;

       pela prática de 3 crimes de burla ps. e ps. no art. 217, nº:1 do CP, as penas de 12 meses de prisão, 12 meses de prisão e 13 meses de prisão.

       As penas destes crimes somam 12 anos e 11 meses de prisão.

3. Por outro lado, e conforme (melhor) consta da matéria de facto fixada, o arguido já foi condenado pela prática de 1 crime de violência doméstica, 1 crime de falsificação de documento, 1 crime de resistência e coacção sobre funcionário, 3 crimes de roubo qualificado, 1 crime de roubo e 2 crimes de abuso de confiança, em cúmulo, na pena de 11 anos de prisão – processo 479/09.5JAFAR deste mesmo Tribunal; foi ainda condenado pela prática de 1 crime de abuso de confiança na pena de 300 dias de multa – processo 463/09.9GCFAR deste mesmo Tribunal.  

4. O art. 77, nº:1 do CP determina que, no cúmulo jurídico, “na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente”.

       E assim, “na valoração da personalidade do autor deve atender-se, antes de tudo, a saber se os factos são expressão de uma inclinação criminosa ou só constituem delitos ocasionais …; um dos critérios fundamentais para aferição da culpa, em sentido global, é o da determinação da intensidade da ofensa, a dimensão do bem (ou bens) jurídico ofendido, com profundo significado quando se trata da violação de bens eminentemente pessoais …; igualmente deve ser expressa a determinação da tendência para a actividade criminosa …; importa, ainda em sede de prevenção geral, verificar o significado do conjunto de actos praticados em termos de perturbação da paz e segurança dos cidadãos …” (ac STJ de 14/10/2009, proc 328/07.9GFVFX)

5. Atentos os critérios referidos, analisados e sopesados no seu conjunto os factos praticados pelo arguido e o seu significado no modo de vida e valores assumidos pelo mesmo, só se pode concluir que a pena que lhe foi aplicada se justifica em absoluto.

       Como refere o acórdão, “considerando em conjunto os factos praticados pelo arguido, nomeadamente o número elevado de crimes cometidos num curto espaço temporal (dois meses) e as condenações sofridas pelo arguido pela prática de outros tipos de crime, alguns de grande gravidade..., entende-se adequado condenar o arguido na pena única de 6 anos de prisão”.

6. As circunstâncias invocadas pelo recorrente não justificam a aplicação de uma pena inferior à que lhe foi fixada.

       O acórdão ponderou devidamente o critério legal e estabeleceu a pena justa e adequada.      

7. Consequentemente, o recurso não merece provimento, devendo ser mantido o acórdão recorrido.

O Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu o seguinte parecer:

I A única questão submetida a reexame é a medida da pena única.

Alega o recorrente que «no E.P. …, tem um comportamento adequado às normas vigentes, denotando interesse em valorizar-se ao nível pessoal…», «…mantém ainda actividade ocupacional de bar e frequenta as aulas de música», bem como «…uma relação estreita com os seus familiares … o que constitui um indicativo nítido de que terá apoio para retomar a sua actividade pessoal e profissional em liberdade.».

    Defende com estes fundamentos a redução da pena única para 4 anos de prisão, «que deverá ser aplicada com as restantes que já lhe foram aplicadas».

II Respondeu o Ministério Público (1130-1134) que, acompanhando a fundamentação do acórdão recorrido, defende a improcedência do recurso, considerando, nomeadamente, o número de crimes (14), curto espaço temporal em que foram cometidos e antecedentes criminais do arguido.

III A pena única ora em reexame virá a ter uma existência efémera, perante o cúmulo que (ao que se nos afigura, necessariamente) se terá que vir a proceder com as demais condenações já transitadas (sendo a 1ª de 7 de Julho de 2011, no processo 463/09.9GCFAR, ou seja, posterior à prática dos crimes da condenação ora em apreço).

    Reveste, pois, pouco interesse útil (nomeadamente para o arguido) a disputa sobre a pena única, que não condicionará futuros cúmulos (o mesmo não sucederia se impugnasse a medida das penas parcelares).

   Não obstante, e embora se acompanhe a fundamentação do acórdão recorrido nas considerações sobre a personalidade do arguido retratada nos crimes das demais condenações, e exigências de prevenção, entendemos que a pena única merece ser reduzida.

    A pena de 6 anos situa-se sensivelmente a meio da moldura do concurso de 1 ano e 6 meses a 12 anos e 11 meses. Representa um acréscimo ao mínimo da moldura de quase metade da soma das demais penas.

    Os crimes em causa (3 de burla e 11 de falsificação) embora tutelem interesses relevantes, não são dos que se situam no nível superior da categoria axiológica da hierarquia dos tipos legais.

    Por outro lado, embora os factos praticados nos demais processos dêem nota de um perfil negativo de personalidade, é, igualmente, certo que quando praticou os factos ora em apreço, ainda não tinha sofrido qualquer daquelas condenações.

    E, nesta medida, sopesando o facto de, desde 2007, ter vindo a revelar comportamentos de desrespeito por bens com tutela penal (com condenações por crimes de abuso de confiança, roubo, falsificação de documento, violência doméstica, resistência e coacção sobre funcionário), bem como manifestar «pouco sentido crítico em relação ao estilo de vida que mantinha anteriormente, negando tendencialmente o dano e as repercussões dos crimes cometidos bem como a existência de vítimas» (ponto 65 – fls. 1074), propendemos para uma pena mais próxima dos 4 anos, ainda justa e adequada à luz dos princípios da culpa e da necessidade da prevenção, afastando-se a possibilidade de opção por uma pena de substituição.

O arguido não respondeu.

Colhidos os vistos legais, cumpre agora decidir.

                                 

Única questão colocada no recurso é a da medida da pena conjunta, que o recorrente AA entende deve ser reduzida para 4 anos de prisão.

O tribunal colectivo considerou provados os seguintes factos:

No dia 25 de Abril de 2006, BB, perdeu a sua carteira na cidade de Loulé, a qual continha diversos documentos de identificação pessoal, designadamente o seu bilhete de identidade, carta de condução, cartão de contribuinte, além de cheques e cartões bancários.

No período compreendido entre 25 de Abril de 2006 e 27 de Janeiro de 2009, em data, local de forma não concretamente apurados, AA entrou na posse de vários documentos pessoais de BB, designadamente do seu Bilhete de Identidade, Cartão de Contribuinte e o seu Número de Identificação Bancária (00000000000000000000), correspondente à conta bancária com o nº 000000000000, sedeada na instituição de crédito Banco.............. SA.

Após, AA pegou no Bilhete de Identidade de BB, retirou a fotografia deste e colocou a sua própria fotografia no local a esta destinado, com o intuito de se deslocar a vários estabelecimentos comerciais da região algarvia e, na posse dos documentos supra referidos, adquirir produtos a crédito, em nome e por conta de BB.

Assim, em 26 de Janeiro de 2009, AA dirigiu-se à loja W......, sita no estabelecimento comercial Modelo, nesta cidade de Faro, munido do Bilhete de Identidade já adulterado e do Cartão de Contribuinte pertencentes a BB, tendo sido atendido pelo funcionário Nicolau Santos, com o objetivo de requerer a adesão ao cartão com o mesmo nome daquela loja, o qual lhe foi recusado por não ter apresentado o NIB correspondente.

Em 27 de Janeiro de 2009, AA, acompanhado de CC, deslocou-se à mesma loja e requereu novamente a adesão aquele cartão, fazendo-se acompanhar dos documentos referidos e do NIB de uma conta titulada por BB, tendo-lhe sido emitido e entregue o cartão W...... solicitado, com um plafond de € 750 (setecentos e cinquenta euros).

Na mesma data e fazendo uso desse cartão, com o nome de BB,AAadquiriu, a crédito 1 (um) computador portátil, da marca Compaq,  modelo C060, com o número de série 2CE8389JMY, no valor de € 499.00 (quatrocentos e noventa e nove euros), tendo da mesma forma, no dia 29/01/2009, adquirido a crédito 1 (um) telemóvel da marca Nokia, modelo 6210, com o IMEI 00000000000000 e o número de cartão ( 351) 000000C, no valor de € 239.90 (duzentos e trinta e nove euros e noventa cêntimos).

Para o efeito, preencheu e assinou a proposta de adesão ao cartão W......, emitida pela a instituição de crédito EE Banco de Crédito ao Consumo, S.A, apondo pelo seu próprio punho o nome BB no campo destinado à assinatura, como se fosse este que estivesse a assinar o referido documento, tendo assim obrigado aquele ao pagamento da quantia supra referida, montante que a EE S. A. despendeu e que não foi pago, total ou parcialmente à mesma.

No dia 30 de Janeiro de 2009, AA, acompanhado de CC, munido dos documentos referidos e apresentando-se como BB, dirigiu-se novamente à mesma loja W......, tendo sido atendido pelo funcionário DD, e adquiriu a crédito um LCD da marca Philips, modelo 000000000000, com o número de série 4J490846334316, no valor de € 799,00 (setecentos e noventa e nove euros).

Para o efeito, AA apôs, pelo seu próprio punho, o nome BB, no campo destinado à assinatura, na proposta de crédito apresentada pela instituição de crédito EE Banco de Crédito ao Consumo, através do referido estabelecimento comercial, como se fosse este que estivesse assinar o referido documento.

Deste modo, o arguido celebrou, por intermédio do estabelecimento comercial fornecedor dos produtos, um contrato de crédito com a instituição de crédito CEE, S. A., com o nº 000000/00000, referente ao processo nº 000000, no valor de € 799 (setecentos e noventa e nove euros), de acordo com o qual obrigou BB ao pagamento daquele valor de 18 prestações mensais, autorizando o débito direto das mesmas na conta correspondente ao NIB0000000000000000, sedeada na instituição de crédito Banco.............. S. A., montante que esta entidade despendeu, não tendo sido paga à mesma qualquer das prestações.

Nos meses de Janeiro e Fevereiro, AA, acompanhado de CC, munido dos documentos referidos e apresentando-se como BB, dirigiu-se ao estabelecimento comercial Staples 0ffice Center, sito em Pontes de Marchil, E.N. 125, nesta comarca de Faro e adquiriu vários produtos a crédito, designadamente:

. Em 27 de Janeiro de 2009:

- 1 (um) computador portátil, da marca ACER, modelo AS6920G- 584G32BN, no valor de € 899,00 (oitocentos e noventa e nove euros) e

- 1 (um) monitor TFT, da marca ASUS, modelo MK24H 24, no valor de € 459,00 (quatrocentos e cinquenta e nove euros);

. Em 29 de Janeiro de 2009:

- um computador portátil, da marca COMPAQ, modelo CQ6O-151EM, no valor de € 479,00 (quatrocentos e setenta e nove euros) e

- um computador portátil, da marca ACER, modelo AS6920G-584G32BN, no valor de € 899.00 (oitocentos e noventa e nove euros);

. Em 30 de Janeiro de 2009:

- 1 (um) monitor TFT, da marca HP, modelo W2408H24, no valor de € 389 (trezentos e oitenta e nove euros),

- 1 (um) computador portátil, da marca TOSHIBA SATELLITE, modelo A200-2B7, no valor de € 599.00 (quinhentos e noventa e nove euros);

- 1 (um) computador portátil, da marca COMPAQ, modelo CQ60 - 151EM, no valor de € 479,00 (quatrocentos e setenta e nove euros);
. Em
11 de Fevereiro de 2009:

- 2 (dois) computadores portáteis, da marca COMPAQ, modelo CQ6O- 151EM, no valor de € 359.25 (trezentos e cinquenta e nove euros e vinte e cinco cêntimos) cada;

- 1 (um) telemóvel, da marca Nokia, modelo 6288, no valor de € 139.90 (cento e trinta e no e euros e noventa cêntimos).

Para o efeito, AA apôs, pelo seu próprio punho, o nome BB, no campo destinado à assinatura, nas propostas de crédito apresentadas pela instituição de crédito infra referidas, através do referido estabelecimento comercial, como se fosse este que estivesse assinar os referidos documentos.

                 Deste modo, nas situações ocorridas nos dias 27 de Janeiro e 11 de Fevereiro de 2009, os arguidos celebraram, por um lado, por intermédio do estabelecimento comercial fornecedor dos produtos, 2 (dois) contratos de crédito com a instituição de crédito B.......... SA, com os n.°s 0000000000000 (24MH07070) e 000000000000 (24MH07155), no valor de € 1.358,00 (mil, trezentos e cinquenta e oito euros) e € 858,40 (oitocentos e cinquenta e oito euros e quarenta cêntimos), respetivamente, nos quais obrigou BB ao pagamento daqueles valores em 12 (doze) prestações mensais, autorizando o débito direto das mesmas na conta correspondente ao NIB0000000000000000, sedeada na instituição de crédito B................, SA., montante aquele que o SS........ despendeu, não tendo sido paga à mesma, total ou parcialmente, a referida quantia.

Por outro lado, para o efeito descrito nas situações ocorridas em 29 e 30 de Janeiro de 2009, AA celebrou, por intermédio do estabelecimento comercial fornecedor dos produtos, 2 (dois) contratos de crédito com a instituição de crédito Banco C....., SA, com
os n°s 0000000 e 00000000, no valor de
1.378 (mil, trezentos e setenta e oito euros) e de € 1.467 (mil, quatrocentos e sessenta e sete euros), respetivamente, nos quais obrigou BB ao pagamento daqueles valores em 12 (doze) e em 18 (dezoito) prestações mensais,
respetivamente, autorizando o débito direto das mesmas na conta correspondente ao NIB0000000000000000, sedeada na instituição de crédito Banco.............. SA., montante que aquela instituição despendeu, não tendo sido paga à mesma, total ou parcialmente, a referida quantia.

Em 11 de Fevereiro de 2009, AA, acompanhado de CC, munido dos documentos referidos e apresentando-se como BB, deslocou-se ao estabelecimento comercial RR....... do Retail Park, sito na Guia - Albufeira e adquiriu, a crédito, os seguintes produtos:

 • 1 (um) LCD, da marca LG, modelo 37 LG 5000 FHD, no valor de € 699,00 (seiscentos e noventa e nove euros);

• 1 (um) LCD, da marca LG, modelo 37 LG 2000, no valor de € 575,00
(quinhentos e setenta e cinco euros);

• 1 (um) computador portátil TOSHIBA, modelo A200-2B7, no valor de € 599 (quinhentos e noventa e nove euros).

Para o efeito, AA apôs, pelo seu próprio punho, o nome BB, no campo destinado à assinatura, na proposta de crédito apresentada pela instituição de crédito Banco C......, SA., através do referido estabelecimento comercial, corno se fosse este que estivesse assinar o referido documento.

Deste modo, o arguido celebrou, por intermédio do estabelecimento comercial fornecedor dos produtos, um contrato de crédito com a instituição de crédito Banco C......, S.A. com o n° 0000000000000, no valor de € 1.873.00 (mil, oitocentos e setenta e três euros), no qual obrigou BB ao pagamento, em 11 (onze) prestações mensais, autorizando o débito direto das mesmas na conta correspondente ao NIB0000000000000000, sedeada na instituição de crédito Banco.............. SA. tendo entregue a quantia restante - € 5 (cinco euros) — em numerário, tendo aquela quantia de € 1.8734 sido despendida pela C......, à qual não foi paga, total ou parcialmente, a mesma.

Em 16 de Fevereiro de 2009, AA, acompanhado de CC, munido dos documentos referidos e apresentando-se como BB, dirigiu-se à loja W...... do estabelecimento comercial Algarve Shopping, sito na Guia — Albufeira e adquiriu 2 (dois) LCD’s, marca Samsung, modelo LE26A457, com os números de série SN72923K101216 e SN72923HK5101244, pelo preço unitário de € 429 (quatrocentos e vinte e nove euros).

Para o efeito, AA apôs, pelo seu próprio punho, o nome BB, no campo destinado à assinatura, na proposta de crédito apresentada pela instituição de crédito EE, S. A. através do referido estabelecimento comercial, como se fosse este que estivesse assinar o referido documento.

Deste modo, o arguido celebrou, por intermédio do estabelecimento comercial fornecedor dos produtos, um contrato de crédito com a instituição de crédito EE, SA, com o n° 000000000000000 no valor de € 858 (oitocentos e cinquenta e oito euros), no qual obrigou BB ao pagamento daquele valor em 12 (doze) prestações
mensais, autorizando o débito direto das mesmas na conta correspondente ao NIB 0000000000000 0, sedeada na instituição de crédito Banco.............. S. A.

Porém, a EE recusou o pagamento referido em 20, tendo a W...... ficado desapossada do montante correspondente ao preço de aquisição dos bens. 

Em 18 de Fevereiro de 2009, AA, acompanhado de CC, munido dos documentos referidos e apresentando-se corno BB, dirigiu-se à loja Jumbo, sita no estabelecimento comercial F.............., E.N. 125, nesta cidade de Faro, onde foram atendidos pela funcionária JJ e requisitaram o cartão com o nome da mesma loja, com o plafond de € 150 (cento e cinquenta euros).

Para o efeito, AA preencheu e assinou, por intermédio do estabelecimento comercial fornecedor dos produtos, uma proposta de adesão ao referido cartão Jumbo, emitido pela instituição de crédito n........ -Instituição Financeira de Crédito, SA, apondo, pelo seu próprio punho, o nome BB, no campo destinado à assinatura, tendo adquirido vários produtos, que pagou com o referido cartão.

No dia 19 de Fevereiro de 2009, AA,  munido dos documentos referidos e apresentando-se como BB, deslocou-se à loja Ensitel, sita no estabelecimento comercial F.............., E.N. 125, nesta cidade de Faro, tendo sido atendidos pelas funcionárias HH e II a, e preencheu um “Formulário de adesão a serviços de comunicações da «PT Comunicações, SA»”, designadamente ao serviço de televisão Meo Rase, Sport Tv (3 canais) e canais TVCine.

Para o efeito, AA apôs, pelo seu próprio punho, o nome BB, no campo destinado à assinatura do formulário supra mencionado, como se fosse este que estivesse assinar o referido documento.

No dia seguinte, o arguido adquiriu, em numerário, nesta mesma loja, um Kit Meo Box Sat + Sma com o IMEI 000000000000 e o número de produto ENTME00001, pelo preço de € 79,00 (setenta e nove euros), de forma a poder aceder ao serviço a que previamente aderira.

usufruiu deste serviço sem ter a intenção de proceder a qualquer pagamento desde o início do contrato, sendo devedor no início de Março de 2010 da quantia de € 588,31 (quinhentos e oitenta e oito euros e trinta e um cêntimos), acrescida de juros, referente a mensalidades em atraso.

No mês de Fevereiro de 2009, AA, munido dos documentos referidos e apresentando-se como BB, deslocou-se à agência da Penha da Caixa Geral de Depósitos e solicitou a emissão de um cartão de crédito LA CARD VISA, cartão esse que foi emitido e lhe foi entregue.

Entre os dias 27 a 30 de Março de 2009, com o cartão de crédito referido no número anterior, AA efetuou levantamentos em numerário em máquinas ATM e efetuou compras e realizou, juntamente com CC, compras na loja L....., sita no estabelecimento comercial F.............., E.N. 125, nesta cidade de Faro, estas no valor de € 393 (trezentos e noventa e três euros), num total, entre levantamentos e compras, de € 1.383,11.

Na loja L....., enquanto AA aguardava à porta da mesma, CC apresentou o cartão de crédito LA CARD VISA para pagamento dos produtos que adquiriu, afirmando às Funcionárias do estabelecimento, FF e GG que o cartão era do seu cunhado.

Uma vez que CC era cliente habitual daquela loja L....., as funcionárias não suspeitaram que aquele cartão de crédito LA CARD VISA tivesse entrado na sua posse de forma ilícita.

O arguido AA quis apropriar-se ilegitimamente de documentos alheios que entraram na sua posse de forma não concretamente apurada, bem sabendo que os mesmos não lhe pertenciam e que não tinha autorização do respetivo proprietário, o que efetivamente conseguiu.

O arguido quis também falsificar o bilhete de identidade, através da aposição da sua própria fotografia no local a esta destinado do bilhete de identidade pertencente a BB, com o intuito de o utilizar e assumindo a identidade daquele, bem sabendo a qualidade do documento em causa, com a intenção simultânea de obter para si um beneficio ilegítimo, causar prejuízo ao ofendido BB e de preparar a execução de outro crime, pondo em causa a fé pública e a segurança no tráfego jurídico, objetivos que logrou atingir.

Com as condutas descritas, o arguido quis ainda utilizar documento alterado nos termos supra expostos e abusar da assinatura do ofendido BB para falsificar as propostas de contratos de crédito e de cartões de crédito emitidos pelas instituições de crédito supra referidas, bem conhecendo a qualidade desses documentos e apondo nos mesmos, pelo próprio punho do arguido AA, uma assinatura como se a mesma tivesse sido feita por BB, com a intenção dupla de obter para si próprio um beneficio patrimonial ilegítimo e de prejudicar o ofendido, intentos que almejou alcançar.

Com as condutas descritas, o arguido, colocando astuciosamente em erro os funcionários dos estabelecimentos comerciais onde foram adquiridos os produtos a crédito, fazendo-os crer que estavam perante BB, o verdadeiro titular dos documentos pessoais apresentados, o que causou de forma direta, prejuízos patrimoniais a todas as instituições de crédito supra referidas, nos termos atrás expostos e, de forma reflexa, a BB, objetivos que logrou atingir.

O arguido AA agiu de forma livre e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.

Dos pedidos de indemnização civil (exclusivamente)

O cliente da Caixa Geral de Depósitos, BB, informou a mesma de movimentos irregulares efetuados, tendo esta confirmado a existência desses movimentos.

Perante a reclamação do cliente, que demonstrou ser alheio a tais movimentos, a CGD acionou os mecanismos de cancelamento das operações em curso e o seguro associado ao cartão LA Card, tendo recuperado parte das verbas, no valor de € 983,11.

A CGD não logrou recuperar dois movimentos de cash-advance, no valor total de 400 €, valor que acabou por repor na conta de BB.

O Banco B... ..P... S. A. (sociedade incorporante por fusão de CEE S. A. E C....S. A.) é uma instituição financeira que se dedica à concessão de crédito para aquisição de bens de consumo.

Não foi paga qualquer prestação referente ao crédito referido em 5 a 7, pelo que a EE (agora B...) deixou de receber o montante de mutuado de € 738,90 e juros acordados).

Não foi paga qualquer prestação referente ao crédito referido em 8 a 10, no montante mensal de € 51,84, pelo que deixou de receber € 933,12.

Não foi paga qualquer prestação referente ao crédito referido em 15 a 17, no montante mensal de € 187,30, pelo que deixou de receber o montante de € 2.060,30.

A demandante Banco SS........ S. A. é uma sociedade comercial anónima que se dedica à atividade de financiamento de aquisição a crédito.

Os documentos referidos em 11 dos factos provados (cópia do bilhete de identidade de BB, mas com a fotografia do arguido, cartão de contribuinte e NIB da conta de BB no BES) foram remetidos ao SS........ pelo fornecedor dos bens, juntamente com as propostas dos contratos de crédito.

A demandante veio a aprovar as propostas de crédito.

Com o cumprimento total dos contratos referidos em 12, a demandante Banco SS........ iria receber a quantia de € 2.276,40, valor correspondente ao total de financiamento (€ 2.216,40) e encargos, valor que não lhe foi devolvido até à data.

A demandante acreditou na regularidade dos contratos de crédito celebrados e no respetivo regular cumprimento dos mesmos.

Da discussão da causa

Natural de Beja, o arguido AA é o mais novo de seis filhos de um casal de etnia cigana, tendo a sua evolução pessoal ocorrido em meio socio-económico desfavorecido.

O ambiente familiar de que desfrutou, marcado de forma traumática pelo falecimento do progenitor quando tinha 13 anos de idade, constituiu igualmente uma agravante nas condições de vida do grupo familiar e um fator condicionante do seu processo de socialização.

Neste contexto, cresceu a acompanhar a mãe na venda ambulante em mercados e feiras, situação que aliada à desvalorização do próprio processo educativo escolar por parte do agregado, não permitiu que adquirisse algumas competências pessoais e sociais, tendo completado apenas o 2º ciclo.

O seu percurso laboral, é bastante incaracterístico e caracterizado pela frequente alteração de área de trabalho, normalmente com carácter sazonal, tendo adquirido ao longo dos anos maior experiência profissional como vendedor ambulante e no comércio de viaturas automóveis usadas.

Em 2003, aparentemente por fatores associados à obtenção de melhores condições de vida, desloca-se com a mãe para o Algarve, passando a residir com esta no Concelho de Faro.

Foi aí que em 2005 estabeleceu relacionamento afetivo com a ex-companheira, CC, de que resultou o nascimento de uma filha que tem presentemente dois anos, tendo fixado residência em Loulé.

Até à sua autonomização do agregado de origem em 2005, os contactos com o sistema de justiça, cingiam-se, num passado mais ou menos longínquo, aos problemas com a venda ambulante e envolvimento em crimes de contrafação.

Esse percurso tendencialmente normativo, viria contudo a sofrer um retrocesso importante a partir daí, com a adoção por parte do arguido de um modo de vida desregrado e comportamentos desviantes que determinaram vários processos judiciais.

Anteriormente à sua prisão, o arguido residia com a ex-companheira (CC) em Armajões - Loulé, numa casa tipo moradia com logradouro, de características rurais, propriedade herdada pelo elemento feminino do casal, valorada como detentora de adequadas condições de habitabilidade.

A manutenção do agregado era assegurada com base em lucros incertos provenientes do comércio de viaturas usadas e venda ambulante em feiras e mercados de vestuário e calçado.

O arguido tende, neste aspeto, a dar uma imagem sobrevalorizada de si próprio e do seu modo de vida pessoal e familiar, negando desta forma a existência de qualquer problemática comportamental, vitimando-se face á sua situação jurídico-penal.

No projeto que preconiza para a liberdade, perspetiva reintegrar o agregado familiar de origem, mantendo-se inalteradas as condições para a sua reinserção, quer relativamente à zona de residência, como das condições económicas de apoio.

A mãe constitui o seu principal suporte familiar, sendo os rendimentos do agregado provenientes da reforma que aufere e da ajuda económica proporcionada por um outro filho que reside em local próximo e das duas filhas que são emigrantes na Suíça.

Ao nível laboral, AA pretende retomar a atividade laboral da venda ambulante e comércio de viaturas usadas, situação que não se afigura de todo fácil, tendo presente as dificuldades económicas supervenientes ao início da atividade e à débil condição de apoio dos familiares.

No E.P. de Pinheiro da Cruz, o arguido vem revelando um comportamento adequado às normas vigentes, denotando ainda interesse em valorizar-se ao nível pessoal, dado que frequentou um curso de formação e completou o 9° ano de escolaridade.

Mantém presentemente atividade ocupacional no serviço de bar e frequenta as aulas de música, não tendo beneficiado até ao momento de medidas de flexibilização da pena dada a indefinição da sua situação jurídico-penal, sendo visitado com regularidade pelos familiares, nomeadamente ex-companheira, filha e irmão.

AA revela dificuldades ao nível do raciocínio consequencial, manifestando pouco sentido crítico em relação ao estilo de vida que mantinha anteriormente, negando tendencialmente o dano e as repercussões dos crimes cometidos bem como a existência de vítimas.

A arguida CC é oriunda de um agregado familiar com um estrato sócio-económico e cultural desfavorecido mas que envidou esforços no sentido de assegurar uma adequada transmissão de valores/regras sociais aos descendentes.

Não obstante a arguida afirmar deter o 12° ano de escolaridade, segundo a irmã apenas concluiu o 2° ciclo de escolaridade, registando um comportamento escolar normativo.

Aos dezoito anos de idade, e na sequência de uma gestação não planeada, CC contraiu matrimónio, passando a residir na atual morada, propriedade dos sogros, referenciados como detentores de um quadro sócio-económico favorecido.

Pese embora a arguida caracterizar o relacionamento com o cônjuge em moldes bastante favoráveis, dos contactos efetuados ressaltou uma dinâmica disfuncional, decorrente de uma gestão inadequada das receitas do núcleo familiar - na globalidade asseguradas pelos sogros, dado que o cônjuge desenvolvia atividade laboral para aqueles -, por parte de CC, traduzida na aquisição compulsiva de artigos de vestuário/peças de ouro.

Há cerca de dez anos, e após o falecimento do cônjuge — sendo que este já não coabitava com a arguida havia algum tempo, tendo, por motivos de saúde, retornado, juntamente com a filha ao agregado de origem, que já acolhia o filho primogénito -, CC registou um agravamento do consumo de bebidas alcoólicas, hábito que, aparentemente, desenvolvera recentemente, não apresentando um quotidiano estruturado, privilegiando o convívio social circunstancial em recintos de diversão e/ou vivenciando relacionamentos efémeros.

Nesse contexto, a própria assume ter gasto, em 3 meses, cerca de 70.000 Euros, resultantes da partilha de bens, tendo a sogra adquirido a parte da herança que lhe correspondia, por falecimento do cônjuge.

À data dos factos subjacentes ao presente processo, a arguida residia, havia alguns anos, com o co-arguido, na morada indicada nos autos, correspondente a uma habitação — integrada numa quinta, onde existem outros espaços habitacionais arrendados, propriedade da sogra e dos filhos mais velhos de CC -, que, não obstante requerer obras de manutenção, detém adequadas condições de habitabilidade.

O relacionamento marital foi caracterizado como disfuncional, com recursos vários ao hospital de Faro, por agressão.

Ao nível económico, a arguida subsistia com uma pensão de viuvez no valor de 140 Euros — por vezes acrescida de montante referente ao arrendamento de uma divisão da habitação -, dedicando-se o companheiro à venda ambulante de artigos de calçado/vestuário.

Socialmente, a arguida e o companheiro não mantinham relações de convívio consistentes, sendo mencionados situações de consumo de bebidas alcoólicas e/ou produtos estupefacientes.

Aquando da reclusão do companheiro, CC encontrava-se no 2° mês de gestação, tendo posteriormente, registado um longo período de internamento hospitalar por motivos de infeção pulmonar, sendo apoiada por elementos do agregado do ex-companheiro aquando da alta hospitalar.

Contudo, CC, gradualmente desvinculou-se desse enquadramento, tendo em Julho de 2010 — tinha a filha, cerca de 3 meses de idade -, solicitado à Ação Social da Câmara Municipal de Loulé apoio alimentar, sendo nesse contexto que a CPCJ iniciou intervenção junto de CC e filha, que se mantém na atualidade, mediante acordo de promoção e proteção da menor.

Na atualidade, CC encontra-se inscrita no Centro de Emprego, beneficiando de Rendimento Social de Inserção — cujo valor destina-se ao pagamento do infantário da filha -, movimentando-se num quadro de precariedade económica, na medida em que para além do valor da pensão de viuvez, apenas aufere do abono de família no valor de 40 Euros.

Não obstante a ausência de um enquadramento sócio-familiar securizante — sendo que a sua única irmã, embora denote sentimentos de afeto, evidencia sentimentos de mágoa decorrentes da sua própria situação económica precária, aparentemente por ter sido vítima de ações da arguida e co-arguido -, CC tem canalizado os seus afetos para a filha, preocupando-se com o seu bem estar.

Nesse contexto, aparentemente a arguida tem priorizado as necessidades da filha, relativamente à preocupação que sempre evidenciou relativamente à sua imagem/apresentação, solicitando peças de vestuário já usadas.

Por Acórdão proferido em 19/07/2010, no processo comum coletivo nº 479/09.5JAFAR, do 1º juízo criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, transitado em julgado em 18/07/2011, foi o arguidoAA condenado pela prática, em 06/06/2009, de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152º, nº 1, al. b) e nº 2 do Código Penal, em 02/03/2007, de um crime de falsificação de documento. P. e p. pelo art. 256º, nº 1, al. c) do C. P., em 06/06/2009, de um crime de resistência e coação sobre funcionário. P. e p. pelo art. 347º do c. P., em 27/09/2009, de um crime de roubo qualificado, p. e p. pelo art. 210º, nº 2, al. b) e 204º, nº 2, al. f), ambos do C. P., em 02/03/2007, de um crime de abuso de confiança, p. e p. pelo art. 205º, nº 1 do Código Penal, em 26/09/2009, de um crime de roubo qualificado, p. e p. pelos arts. 210º, nº 2, al. b) e 204º, nº 2, al. f), em 08/01/2009, de um crime de abuso de confiança, p. e p. pelo art. 205º, nº 1 do Código Penal, em 15/09/2009, de um crime de roubo qualificado, p. e p. pelo at. 210º, nº 2, al. b) e 204º, nº 2, al. f), ambos do C. P. e em 27/09/2009, de um crime de roubo, p. e p. pelo art. 210º, nº 1 do Código Penal, na pena única de 11 anos de prisão.

Por sentença proferida em 07/06/2011, no processo comum singular nº 463/09.9GCFAR, deste 1º juízo criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, transitada em julgado em 07/07/2011, foi o arguido condenado pela prática, em 28/06/2009, de um crime de abuso de confiança, p. e p. pelo art. 205º, nº 1 e 4, al. a) do C. P., com referência ao art. 202º, al. a) do mesmo diploma legal, na pena de 300 dias de multa, á taxa diária de € 5, num total de € 1500.

Por sentença proferida em 18/05/2006, no processo comum singular nº 488/05.3GBLLE, do 2º juízo criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Loulé, transitada em julgado em 06/06/2006, foi a arguida CC condenada pela prática, em 24/11/2004, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo art. 292º, nº 1 do C. P., na pena de 75 dias de multa, á taxa diária de € 2 e na pena acessória de proibição de conduzir pelo período de 3 meses e 20 dias, penas que foram declaradas extinta pelo cumprimento, respetivamente em 24/11/2006 e 05/03/2008.

Por sentença proferida em 27//02/2007, no processo comum singular º 1411/04.8GBLLE, do 1º juízo criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Loulé, transitada em julgado em 17/09/2007, foi a arguida CC condenada pela prática, em 27/12/2004, de um crime de injúria agravada, p. e p. pelos arts. 181º e 184º do C. P. e um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos arts. 143º, nº 1, 146º e 132º, nº 2, al. a) do C. P., na pena única de 210 dias de multa, á taxa diária de € 4, o que perfaz o montante global de € 840.

                                  

O recorrente AA apenas impugna, como já deixámos consignado, a pena conjunta, que entende dever ser reduzida para 4 anos de prisão, alegando que, encontrando-se preso em cumprimento de pena, tem assumido em clausura um comportamento consonante com as regras penitenciárias, mantendo-se activo e ocupado, tendo já frequentado um curso de formação e completado o 9º ano de escolaridade. Mais invoca manter um relacionamento estreito com os seus familiares, nomeadamente com a filha, o irmão e a ex-companheira, com o apoio dos quais conta, o que lhe vai permitir uma ressocialização mais célere.

Decidindo, dir-se-á.

A pena conjunta através da qual se pune o concurso de crimes, segundo o texto do n.º 2 do artigo 77º do Código Penal, tem a sua moldura abstracta definida entre a pena mais elevada das penas parcelares e a soma de todas as penas em concurso, não podendo ultrapassar 25 anos, o que equivale por dizer que no caso vertente a respectiva moldura varia entre o mínimo de 1 ano e 6 meses de prisão e o máximo de 12 anos e 11 meses de prisão.

Segundo preceitua o n.º 1 daquele artigo, na medida da pena são considerados em conjunto, os factos e a personalidade do agente, o que significa que o cúmulo jurídico de penas não é uma operação aritmética de adição, nem se destina, tão só, a quantificar a pena conjunta a partir das penas parcelares cominadas[3]. Com efeito, a lei elegeu como elementos determinadores da pena conjunta os factos e a personalidade do agente, elementos que devem ser considerados em conjunto.

Como esclareceu o autor do Projecto do Código Penal, no seio da respectiva Comissão Revisora[4], a razão pela qual se manda atender na determinação concreta da pena unitária, em conjunto, aos factos e à personalidade do delinquente, é de todos conhecida e reside em que o elemento aglutinador da pena aplicável aos vários crimes é, justamente, a personalidade do delinquente, a qual tem, por força das coisas, carácter unitário, de onde resulta, como ensina Jescheck[5], que a pena única ou conjunta deve ser encontrada a partir do conjunto dos factos e da personalidade do agente, tendo-se em atenção, em primeira linha, se os factos delituosos em concurso são expressão de uma inclinação criminosa ou apenas constituem delitos ocasionais sem relação entre si, sem esquecer a dimensão da ilicitude do conjunto dos factos e a conexão entre eles existente, bem como o efeito da pena sobre o comportamento futuro do delinquente.

Posição também defendida por Figueiredo Dias[6], ao referir que a pena conjunta deve ser encontrada, como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique, relevando, na avaliação da personalidade do agente sobretudo a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade, sem esquecer o efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro daquele, sendo que só no caso de tendência criminosa se deverá atribuir à pluriocasionalidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura da pena conjunta.

Adverte no entanto que, em princípio, os factores de determinação da medida das penas singulares não podem voltar a ser considerados na medida da pena conjunta (dupla valoração), muito embora, «aquilo que à primeira vista possa parecer o mesmo factor concreto, verdadeiramente não o será consoante seja referido a um dos factos singulares ou ao conjunto deles: nesta medida não haverá razão para invocar a proibição de dupla valoração»[7].

Daqui que se deva concluir, como concluímos, que com a fixação da pena conjunta se pretende sancionar o agente, não só pelos factos individualmente considerados, mas também e especialmente pelo respectivo conjunto, não como mero somatório de factos criminosos, mas enquanto revelador da dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do agente, visto que a lei manda se considere e pondere, em conjunto, (e não unitariamente) os factos e a personalidade do agente. Como doutamente diz Figueiredo Dias, como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado.

Importante na determinação concreta da pena conjunta será, pois, a averiguação sobre se ocorre ou não ligação ou conexão entre os factos em concurso, bem como a indagação da natureza ou tipo de relação entre os factos, sem esquecer o número, a natureza e gravidade dos crimes praticados e das penas aplicadas, tudo ponderando em conjunto com a personalidade do agente referenciada aos factos[8], tendo em vista a obtenção de uma visão unitária do conjunto dos factos, que permita aferir se o ilícito global é ou não produto de tendência criminosa do agente, bem como fixar a medida concreta da pena dentro da moldura penal do concurso, tendo presente o efeito dissuasor e ressocializador que essa pena irá exercer sobre aquele[9].

Analisando os factos verifica-se estarmos perante concurso de onze crimes de falsificação e três crimes de burla, perpetrados sequencialmente, entre Janeiro e Março de 2009, através dos quais o arguido AA pretendia entrar na posse de bens e valores alheios, sendo certo que em resultado dos crimes cometidos o arguido conseguiu entrar na posse de um computador, dois LCD, um monitor e um telemóvel. A relação existente entre os crimes é patente, visto que na génese de todos eles está a apetência do arguido pela obtenção fácil de bens e valores alheios, tendo sido executados de forma homogénea.

Antes e depois da prática destes factos, entre Março de 2007 e Setembro de 2009, muitos outros factos delituosos foram cometidos pelo arguidoAA, pelos quais já foi condenado, concretamente, quatro crimes de roubo, sendo três qualificados, três crimes de abuso de confiança, um crime de violência doméstica, um crime de resistência e coacção sobre funcionário e um crime de falsificação.

Perante este quadro factual, o qual reflecte uma personalidade desprovida de valores éticos, há que concluir que o arguido AA é portador de tendência criminosa.

A gravidade do ilícito global, tendo em vista as suas consequências, ou seja, o mal do crime, é de grau médio.

Tudo devidamente ponderado, tendo em consideração o número de crimes perpetrados, o quantum das penas singulares impostas e o efeito da pena sobre o comportamento futuro do recorrente AA, actualmente com 35 anos de idade, nada há a censurar à pena conjunta de 6 anos de prisão.

                                         *

Termos em que se acorda negar provimento ao recurso.

Custas pelo recorrente, fixando em 5 UC a taxa de justiça.

Lisboa, 14 de Março de 2013

Oliveira Mendes (Relator)

Maia Costa              

__________________


[1] - São as seguintes as penas singulares aplicadas:
- 1 ano e 6 meses de prisão pela autoria de um crime de falsificação, previsto e punível pelo artigo 256º, n.ºs 1, alíneas c) e e), do Código Penal;
- 10 meses de prisão pela autoria de cada um de dez crimes de falsificação, previstos e puníveis pelo artigo 256º, n.º 1, alíneas c) e e), do Código Penal;
- 12 meses de prisão pela autoria de cada um de dois crimes de burla, previstos e puníveis pelo artigo 217º, n.º 1 do Código Penal;
- 13 meses de prisão pela autoria de um crime de burla, previsto e punível pelo artigo 217º, n.º 1, do Código Penal.

[2] - O texto que a seguir se transcreve, tal como os demais que adiante se irão transcrever, correspondem ipsis verbis aos constantes do processo.

[3] - O nosso legislador penal não adoptou o sistema da absorção (punição com a pena concreta do crime mais grave), o sistema de acumulação material (soma das penas com mera limitação do limite máximo), nem o sistema da exasperação ou agravação da pena mais grave (elevação da pena mais grave, através da avaliação conjunta da pessoa do agente e os singulares factos puníveis, elevação que não pode atingir a soma das penas singulares nem o limite absoluto legalmente fixado), tendo mantido todas as opções possíveis em aberto.

[4] - Acta da 28ª Sessão realizada em 14 de Abril de 1964.

[5] - Tratado de Derecho Penal Parte General (4ª edição), 668.

[6] - Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, 290/292.
[7] - Proibição de dupla valoração defendida por Eduardo Correia no seio da Comissão Revisora do Código Penal e ali maioritariamente aceite, ao ser rejeitada proposta apresentada pelo Conselheiro Osório no sentido de os critérios gerais de determinação da medida da pena serem também aplicáveis à determinação da pena única – acta já atrás referida.
[8] - Personalidade referenciada aos factos, ou seja, reflectida nos factos, visto que estes, como resultado da vontade e actuação do delinquente, espelham a sua forma de pensar e o seu modo de ser, o seu temperamento, carácter e singularidade, isto é, a sua personalidade.

[9] - Tem sido este o entendimento por nós assumido, como se pode ver, entre muitos outros, nos acórdãos deste Supremo Tribunal de 08.03.05, 09.11.18, 11.02.23 e 13.02.06, proferidos nos Processos n.ºs 114/08, 702/08. 3GDGDM. P1.S1, 429/03. 2PALGS.S1 e 639/10.6PBDIS.S1.