Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
571/19.8T8AVR.P1.S1
Nº Convencional: 3.ª SECÇÃO
Relator: LOPES DA MOTA
Descritores: RECURSO PENAL
CONCURSO DE INFRAÇÕES
CONHECIMENTO SUPERVENIENTE
FURTO QUALIFICADO
ROUBO
CONDUÇÃO SEM HABILITAÇÃO LEGAL
CÚMULO JURÍDICO
COMPETÊNCIA
PENA ÚNICA
MEDIDA CONCRETA DA PENA
Data do Acordão: 07/06/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO
Sumário :
I – Discordando da medida da pena, recorre o arguido do acórdão do tribunal coletivo que, em cúmulo, lhe aplicou a pena única de 11 anos de prisão, pela prática de 15 crimes de furto qualificado, 9 crimes de condução perigosa de veículo rodoviário e de roubo, porte de arma proibida e falsas declarações.

II – Foram aplicadas mais duas penas únicas, de 13 anos e de 5 anos e 6 meses de prisão, pretendendo o arguido que os crimes que integram um desses cúmulos passem a incluir-se no conjunto de crimes e que foi aplicada a pena única de 11 anos, agora impugnada.

III – O Supremo Tribunal de Justiça fixou jurisprudência no sentido de que o momento temporal a ter em conta para a verificação dos pressupostos do concurso de crimes em caso de conhecimento superveniente “é o do trânsito em julgado da primeira condenação por qualquer dos crimes em concurso” (acórdão de fixação de jurisprudência n.º 9/2016, DR I, n.º 111, de 9.6.2016), excluindo-se, assim, as penas aplicadas a crimes cometidos depois da data do trânsito, os quais, em caso de concurso com outros cometidos posteriormente a essa mesma data, poderão dar lugar à aplicação de diferentes penas únicas.

IV – Sendo de afastar o “cúmulo por arrastamento”, conforme jurisprudência deste tribunal de há muitos anos unânime, após alguma aceitação de solução oposta, haverá que proceder a dois ou mais cúmulos autónomos, cujas penas se “acumulam materialmente”, em execução sucessiva (artigo 63.º do Código Penal). Sendo a data do trânsito em julgado da primeira condenação o momento temporal a ter em conta para a verificação dos pressupostos do concurso de crimes (art.º 30.º, n.º 1, do CP), a que corresponde uma pena única (art.º 77.º, n.ºs 1 e 2, do CP), os crimes praticados antes dessa data e os crimes praticados depois dela formam dois conjuntos de crimes distintos, a que, em conhecimento superveniente do concurso (art.º 78.º, n.º 1, do CP), devem ser aplicadas penas únicas distintas.

V - Em caso de conhecimento superveniente do concurso a determinação da pena única efetua-se através de uma nova sentença que efetue o cúmulo jurídico, mediante realização de audiência e das diligências necessárias (artigo 472.º do CPP), sendo territorialmente competente para o efeito o tribunal da última condenação, o que pressupõe a competência material e funcional desse tribunal, por ter aplicado uma das penas em concurso, nos termos do artigo 471.º do CPP. Sendo a pena máxima do concurso superior a 5 anos de prisão, da competência do tribunal da comarca funcionar em tribunal coletivo (artigo 14.º, n.º 2, al. b), do CPP), tal competência pertence ao Juízo Central Criminal da comarca (artigos 471.º, n.º 1, do CPP e 118.º e 134.º da LOSJ – Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto).

VI – Nos termos do artigo 77.º, n.º 1, do CP, o agente é condenado numa única pena para cuja determinação, seguindo-se os critérios da culpa e da prevenção (artigo 71.º), são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente (critério especial do n.º 1 do artigo 77.º, in fine).

VII – Na avaliação da personalidade inclui-se a consideração das condições económicas e sociais, reveladoras das necessidades de socialização, da sensibilidade à pena, da suscetibilidade de por ela ser influenciado e das qualidades da personalidade manifestadas no facto, nomeadamente a falta de preparação para manter uma conduta lícita, relevando a natureza e o número de crimes cometidos, de modo a verificar-se se os factos, no seu conjunto, são suscetíveis de revelar uma tendência criminosa ou meramente ocasionais.

VIII – Vistos no seu conjunto, em atenção a estes critérios, os factos e as suas circunstâncias, reveladoras da (ainda jovem) personalidade neles projetada, mostram que as condições pessoais, económicas e sociais do arguido evidenciam elevadíssimas e prementes necessidades de socialização, que o modo como os factos foram praticados exibem um grau muito elevado de ilicitude e de intensidade do dolo e uma evidente falta de preparação para manter uma conduta lícita, fatores que, revelando a gravidade dos factos, são decisivos para determinação da medida concreta da pena em vista da satisfação das exigências de prevenção especial.

IX – São também elevadas as necessidades de prevenção geral, em especial no que se refere aos crimes de furto qualificado em residências, sendo, em alguns deles, vítimas pessoas idosas, atendendo aos sentimentos de insegurança gerados pela sua frequência, cuja ponderação se comporta nos limites da culpa, evidenciada pelas demais circunstâncias relevantes nos termos do artigo 71.º do Código Penal, agora referidas aos factos na sua globalidade.

X – Tendo em conta a moldura abstrata da pena aplicável aos crimes em concurso – de 3 a 25 anos de prisão – e os fatores relevantes mencionados, em particular o critério especial definido no artigo 77.º, n.º 1, do Código Penal, não se encontra fundamento que possa constituir motivo de discordância quanto à medida da pena aplicada, a qual se encontra justificada pela diversidade, frequência, número e concreta gravidade dos factos, no seu conjunto, sem ocorrer violação dos critérios de adequação e proporcionalidade, na consideração das necessidades de proteção dos bens jurídicos e de reintegração que a sua aplicação visa realizar (artigo 40.º do Código Penal).

Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça:



I.  Relatório

1. AA, arguido, com a identificação que consta dos autos, interpõe recurso do acórdão de 11 de janeiro de 2022, proferido pelo tribunal coletivo do Juízo Central Criminal ... (Juiz ...), do Tribunal Judicial da Comarca ..., que, em conhecimento superveniente do concurso, lhe aplicou uma pena única de 11 (onze) anos de prisão, procedendo ao cúmulo jurídico das penas aplicadas nos seguintes processos:

1. 84/13.... (Juízo Central ...),

2. 263/12.... (Juízo Central ...),

3. 214/12.... (Juízo Local ...),

4. 63/13.... (Juízo Central ...),

5. 298/15.... (Juízo Local ...),

6. 11/14.... (Juízo Local ...),

7. 65/14.... (Juízo Local ...),

8. 107/14.... (Juízo Local ...),

9. 7/14... (Juízo Central ...),

10. 58/14.... (Juízo Local ...),

11. 50/14.... (Juízo Local ...),

12. 1/15.... (Juízo Local ...),

13. 585/15.... (Juízo Local ...),

14. 613/15.... (Juízo Local ...),

15. 619/15.... (Juízo Local ...),

16. 322/15.... (Juízo Local ...),

17. 682/15.... (Juízo Local ...),

18. 167/15.... (Juízo Local ...) – pelo crime praticado em 29.11.2015,

19. 46/15.... (Juízo Local ...) e

20. 12/15.... (Juízo Central ...) – pelos crimes praticados em 21.09.2015, 29.09.2015, 14.11.2015, 19.11.2015 e 29.11.2015.

2. Discordando da não inclusão, no cúmulo, de penas aplicadas em outros processos, indicados nos n.ºs 1 a 15 da fundamentação de facto, e da medida da pena, pugnando pela sua redução para medida não superior a 7 (sete) anos de prisão, apresenta motivação que termina com as seguintes conclusões (transcrição):

“1.ª As penas referidas nos números 1 a 15 da fundamentação de facto (I-A) incluídas no acórdão cumulatório proferido no âmbito do processo n.º 117/11...., do Juízo Central Criminal ..., em que foi determinada a pena cumulativa de 13 (treze) anos de prisão, deveria ter sido desmanchado e as penas parcelares incluídas no mesmo, deveriam ter sido integradas para efeito de cúmulo no acórdão recorrido.

2.ª As penas referidas nos números 1 a 15 da fundamentação de facto (I-A) incluídas no acórdão cumulatório proferido no âmbito do processo n.º 117/11...., do Juízo Central Criminal ..., em que foi determinada a pena cumulativa de 13 (treze) anos de prisão, deveria ter sido desmanchado e as penas parcelares incluídas no mesmo, deveriam ter sido integradas para efeito de cúmulo no acórdão recorrido.

3.ª Por decisão transitada em julgado em 02.03.2012, foi o arguido condenado no âmbito do processo n.º 75/11...., do Juízo Local Criminal ..., pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, extinta pelo pagamento em 2015 (ponto 3).

4.ª Ora, quando o arguido praticou estes factos, já havia praticado os crimes que motivaram as demais condenações referidas no ponto 15.1, ou seja na decisão cumulatória proferida no processo n.º 117/11...., do Juízo Central Criminal ..., por acórdão transitado em julgado em 28.09.2020, em que foi determinada a pena cumulativa de 13 (treze anos) anos de prisão.

Quando o arguido sofreu a condenação referida no ponto 16, (crime de furto qualificado, pena 3 anos de prisão), por decisão transitada em julgado em 14.12.2015, já tinha praticado, não apenas o crime que motivou tal condenação, mas também os crimes de que resultaram as condenações indicadas em 17 a 37.

6.ª Posteriormente a 14.12.2015, quando o arguido foi condenado no processo indicado no ponto 39, por decisão transitada em julgado em 08.04.2016, já tinha praticado, não apenas o crime que motivou tal condenação, mas também os crimes de que resultaram as condenações indicadas em 40 a 44.

7.ª Todas estas condenações consideradas na decisão cumulatória proferida no processo 12/15...., do Juízo Central Criminal ..., sendo determinada pelo Supremo Tribunal de Justiça, a pena cumulativa de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão.

8.ª Destes factos resulta que deviam ter sido tomadas em consideração todas as condenações enunciadas em I da fundamentação de facto, pois estão todas em relação de concurso superveniente.

9.ª Assim não sendo o arguido terá que cumprir 29 (vinte e nove) anos e 6 (seis) meses de prisão, resultantes do cumprimento de três penas unitárias sucessivas de 11 anos de prisão fixada nos presentes autos, 13 anos de prisão fixada em cúmulo no processo n.º 117/11.... e 5 anos e 6 meses de prisão fixada em cúmulo no processo 12/15.....

10.ª Houve assim, por parte do tribunal recorrido, erro na aplicação do direito, por violação do art.º 78.º do Código Penal.

11.ª Finalidades de prevenção – nunca finalidades absolutas de retribuição e expiação – podem justificar e legitimar a pena, sendo que em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa.

12.ª Tal interpretação decorre do chamado princípio da referência constitucional ou princípio da congruência ou da analogia substancial entre a ordem axiológica constitucional e a ordem dos bens jurídicos (Prof. Figueiredo Dias, As Consequências jurídicas do Crime, pp. 72-73).

13.ª Esse princípio da culpa significa não só que não há pena sem culpa, mas que a culpa decide na medida da pena, ou seja a culpa não constitui apenas o pressuposto fundamento da validade da pena, mas a medida da culpa afirma-se como limite máximo da mesma pena.

14.ª Ao depararmo-nos com o disposto no art.º 71.º, n.º 2 do CP, percebemos facilmente que era intenção do legislador que ao determinar-se a pena, deveria o julgador em primeiro lugar escolher os fins das penas, pois só a partir deles se podem ajuizar os factos do caso concreto relevantes para a determinação da pena e a valoração que lhes deve ser dada.

15.ª Dispõe o art.º 40.º, n.º 1 do CP, sobre as finalidades da punição, que são a protecção dos bens jurídicos, mas também, e não num plano de subalternidade a protecção e reintegração do arguido na sociedade.

16.ª A prevenção está ligada à necessidade comunitária de punição do caso concreto sendo que só se torna justificável a aplicação de uma pena se esta for realmente necessária, e quando necessária, esta deverá ser sempre aplicada na medida exata da sua necessidade e sempre subordinada a uma proibição do excesso.

17.ª Quando estamos perante uma pena excessiva, ainda que tenha sido considerada necessária, que ultrapasse o juízo de censura que o agente causador do crime mereça, essa pena é injusta.

18.ª Neste caso, entende o recorrente que o Tribunal recorrido teve principalmente em conta a função retributiva da pena, olvidando-se da função ressocializadora da mesma que tenderia a considerar que as finalidades da punição deverão ser executadas com o sentido pedagógico e ressocializador.

19.ª Sr. Procurador-Geral-Adjunto Dr. Eduardo Maia Costa referiu no seu artigo “ressocialização de delinquente: Evolução e Destino” em que defende uma visão liberal e humanista, alicerçada na acentuação das medidas alternativas à prisão e na reinserção social dos delinquentes, no pressuposto, enunciado oficialmente, de que não é a gravidade das penas que constitui o antídoto eficaz ao alastramento do crime.

20.ª O STJ tem vindo a considerar impor-se um dever especial de fundamentação na elaboração da pena conjunta, não se podendo fixar a decisão cumulatória pelo emprego de fórmulas genéricas, tabelares ou conclusivas, sem reporte a uma efetiva ponderação abrangente da situação global e relacionação das condutas apuradas com a personalidade do agente, seu autor.

21.ª O critério especial fornecido pelo art.º 77.º, n.º 1, do CP, significa que este específico dever de fundamentação de aplicação de uma pena conjunta, não pode estar dissociado da questão da adequação da pena à culpa concreta global.

22.ª O respeito pelo princípio da proporcionalidade e da proibição do excesso, que deve presidir à fixação da pena conjunta, tornando-se fundamental a necessidade de ponderação entre a gravidade do facto global e a gravidade da pena conjunta (Ac. STJ de 18-01-2012).

23.ª Como se refere no Ac. do STJ de 10-09-2009, Proc. n.º 26/05.8SOLSB-A.S1 – 5.ª, - a pena conjunta situar-se-á até onde a empurrar o efeito expansivo sobre a parcelar mais grave, das outras penas, e um efeito repulsivo que se faz sentir a partir do limite da soma aritmética de todas as penas.

24.ª Ora, esse efeito repulsivo prende-se necessariamente com uma preocupação de proporcionalidade. Proporcionalidade entre o peso relativo de cada parcelar, em relação ao conjunto de todas elas.

25.ª Se a pena parcelar é uma entre muitas outras semelhantes, o peso relativo do crime que traduz é diminuto em relação ao ilícito global, e portanto, só uma fração menor dessa pena parcelar deverá contar para a pena conjunta.

26.ª Ora, as penas parcelares que integram o cúmulo são todas muito semelhantes, sendo a mais alta de 3 anos

27.ª Com exceção do crime de condução sem habilitação legal, as condutas do arguido inscrevem-se dentro do mesmo campo de actuação (crimes contra o património).

28.ª Os montantes de que apoderou não foram expressivos.

29.ª Consta no relatório social, que o condenado goza de apoio familiar, quer da sua companheira quer da família alargada.

30.ª O condenado é jovem, tendo apenas 27 anos de idade.

31.ª O instituto do cúmulo jurídico, por oposição ao do cúmulo material, é um instituto cuja aplicação tem, entre outras, finalidades que favorecem o condenado, pois a pena aplicada será sempre menor do que o somatório das penas parcelares.

32.ª A pena única de 11 (catorze) anos de prisão aplicada ao condenado é claramente exagerada e desproporcional à gravidade dos factos, pois trata-se de crimes contra o património, em que estão em causa quantias pequenas. Com o devido respeito, Meritíssimos Juízes Conselheiros, são aplicadas a homicidas e a traficantes penas substancialmente menores.

33.ª Como é que uma pena destas pode levar um jovem a acreditar na justiça e motivar-se para a sua reinserção social.

34.ª A pena mais grave que integra o concurso é de 3 anos de prisão.

35.ª A actividade criminosa do arguido deve ser enquadrada numa média/pequena criminalidade, muito longe da grande criminalidade, violenta e organizada.

36.ª Neste caso, entende o recorrente que o Tribunal recorrido teve principalmente em conta a função retributiva da pena, olvidando-se da função ressocializadora da mesma que tenderia a considerar que as finalidades da punição deverão ser executadas com o sentido pedagógico e ressocializador.

37.ª Devendo em consequência a pena única aplicada ao recorrente em cúmulo jurídico superveniente ser reformulada e fixada em montante que V. Ex.ªs, Venerandos Juízes Conselheiros, doutamente fixarão, mas nunca superior a 7 (sete) anos de prisão.

38.ª Houve por parte do tribunal recorrido errada aplicação dos art.ºs 78.º, 40.º, n.ºs 1 e 2 e 71.º, 77.º, todos do C.P.

Termos em que,

Deve o presente recurso merecer provimento e em consequência:

- Ser revogada a decisão proferida e ser substituída por outra que inclua na determinação da pena única, todas as condenações sofridas pelo arguido constantes no ponto I da fundamentação de facto.

Caso assim se não entenda;

- Deve pena única aplicada ao arguido em cúmulo jurídico superveniente ser reformulada e fixada em montante não superior a 7 (sete) anos de prisão.”

3. O Ministério Público, pela Senhora Procuradora da República no tribunal recorrido, apresentou resposta, no sentido da improcedência do recurso, dizendo (transcrição parcial nas partes mais diretamente relevantes):

- Quanto ao âmbito do concurso:

“(…) os crimes abrangidos pelo acórdão cumulatório da fundamentação de facto I-A, proferido no âmbito do processo com o NUIPC 117/11.... e os crimes abrangidos pelo acórdão cumulatório da fundamentação de facto I-C, proferido no âmbito do processo com o NUIPC 12/15...., não estão numa situação de concurso com os crimes constantes da fundamentação de facto I-B que, nestes autos, foram alvo de uma pena única, em cúmulo jurídico, porque não foram todos cometidos antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles (…) visto o trânsito em julgado determinar o limite até ao qual é possível unificarem-se as respetivas penas.

É a primeira decisão transitada em julgado que determinará o instante a partir do qual já não será possível aglomerar outras penas em cúmulo jurídico, porque, desde o momento em que o arguido é condenado por uma decisão transitada em julgado e é alvo de uma advertência formal sobre as regras jurídicas, fica obrigado a agir conforme o direito, não podendo invocar desconhecimento daquelas regras e assim se desculpabilizar. (…)

No caso em apreço, a primeira condenação ocorrida em I-A transitou em julgado em 02.03.2012.

Já em I-B, a primeira condenação transitou em julgado em 14.12.2015.

E em I-C a primeira condenação transitou em julgado em 08.04.2016.

São, por isso, como muito bem salienta o douto acórdão recorrido, “estas as datas que assinalam o fim de um ciclo e o início de novos períodos de consideração de relação de concurso para efeito de fixação de penas únicas”. (…)

Relativamente ao primeiro ciclo (I-A, com ressalva da condenação referida em 12) e ao terceiro (I-C), foram já proferidas decisões cumulativas das respetivas penas, nenhuma razão existindo para que tais cúmulos sejam desfeitos.

Já no que respeita ao ciclo a que se referem as condenações indicadas em I-B (12 e 16 a 37) e à decisão cumulativa referida em 38, porque adveio, entretanto, o conhecimento da prática pelo arguido dos crimes indicadas em 24 e 52 (processo 65/14....) e em 25 e 53 (processo 107/14....), tornou-se necessário proceder à formação de uma nova pena única que abarcasse as que foram alvo da decisão referida em 38 e as penas aplicadas ao arguido naqueles dois processos. (…)

A não aceitação do chamado cúmulo por arrastamento impede, pois, que as penas dos processos respeitantes a factos subsequentes à primeira decisão transitada em julgado sejam integradas no cúmulo” [citando, a este propósito, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 19.5.2010, 11.5.2011, 18.1.2012 e 28.11.2012].

Conclui-se, assim, que, ao contrário do que o recorrente pretende fazer crer, as penas das condenações enunciadas em I-A, I-B e I-C da fundamentação de facto não estão todas em relação de concurso superveniente, não tendo sido violado o art.º 78.º do Código Penal. (…).”

- Quanto à medida da pena única

“(…) nenhum reparo merece a douta decisão ora posta em crise. (…)

Perante a panóplia de crimes imputados ao recorrente e as penas parcelares que lhe foram aplicadas pela prática de cada um desses ilícitos, a pena única de onze anos de prisão encontrada no douto acórdão recorrido foi mais do que justa e adequada. (…)

(…) os limites da pena única se situam entre os 3 (três) e os 44 (quarenta e quatro) anos de prisão, muito embora se tenha de atender ao limite máximo inultrapassável de 25 anos de prisão.

Atendendo apenas às penas que compõem a pena única de onze anos de prisão que lhe foi aplicado no douto acórdão recorrido, o arguido praticou, num período que durou pouco mais de três anos, mais concretamente, entre 03.06.2012 e 29.11.2015, um crime de falsidade de declaração, um crime de falsidade de depoimento na forma continuada, catorze crimes de furto qualificado, dois crimes de furto simples, um crime de furto simples na forma tentada, um crime de roubo, no qual não se coibiu de abordar e confrontar um casal de septuagenários, nove crimes de condução sem habilitação legal e dois crimes de detenção de arma proibida.

As exigências de prevenção geral são muito expressivas, atenta a frequência com que os crimes de furto, roubo e de condução sem habilitação legal são praticados no seio da nossa comunidade, o alarme social que lhes anda associado e o sentimento de insegurança que causam na vida dos cidadãos.

O dolo é direto, pois que o arguido representou claramente todos os factos criminosos e atuou com vontade de os realizar.

Antes de ser preso não estava integrado socialmente pois que, como foi dado por provado, “mantinha um estilo de vida itinerante, passando alguns períodos junto do agregado da sua família de origem em ... ou junto de outros familiares da companheira noutras regiões do ..., com situação laboral e económica irregular e precária, não lhe sendo conhecidos hábitos de trabalho.”

“O arguido apresenta-se como um indivíduo com competências pessoais e sociais reduzidas, imaturo na sua forma de pensar, com dificuldades de descentração e nas tomadas de decisão, nas quais prevalecem os seus interesses imediatos, evidenciando fraco sentido crítico perante as suas ações e trajecto de vida.”

A relação com a sua família de origem, nomeadamente com a mãe, oito irmãos, sobrinhos e primos, era distante antes de, em Setembro de 2018, ingressar no Estabelecimento Prisional ... onde, no entanto, passou a beneficiar de visitas daqueles.

Vimos, assim, que o recorrente não está, nem social, nem familiarmente e nem profissionalmente inserido, pelo que são elevadas as exigências de prevenção especial.

Quando praticou os factos englobados na decisão cumulatória, alvo do presente recurso, contava já com um extenso registo criminal pela prática, entre outros, de crimes contra o património.

O mesmo chegou até a cumprir pena de prisão efetiva, o que demonstra que nem a circunstância de ter estado enclausurado lhe serviu de advertência para arrepiar caminho e enveredar por um modo de vida lícito, conforme às regras do direito, o que releva negativamente na apreciação da culpa.

Como bem refere o acórdão recorrido, "no período de três anos e meio, praticou trinta crimes, ofendendo bens jurídicos de diversa natureza, vitimando directamente não menos de vinte e duas pessoas, das quais várias idosas (ofendidos nos crimes de roubo e de furto), sendo metade desses crimes (quinze) de furto em residências e um de roubo, ascendendo o ilegítimo benefício patrimonial global obtido pelo arguido a não menos de trinta mil euros, mas também portando ou usando o arguido em distintas ocasiões armas de fogo e outras, conduzindo sem habilitação legal em nove situações diversas, por duas vezes prestando falsas declarações visando mitigar a sua responsabilização criminal.”

O grau de ilicitude é, pois, muito elevado.

Assim, as concretas circunstâncias da prática dos crimes em causa, com relevância ao nível da formulação dos juízos de ilicitude e culpa, valoradas à luz dos critérios previstos nos arts. 40.º, 71.º e 77.º, do Código Penal, para a determinação da pena, permitem concluir que a pena unitária, de onze anos de prisão efetiva, concretamente aplicada ao recorrente se mostra justa e adequada, tendo em conta a moldura abstrata do concurso, dando expressão acertada às exigências de prevenção especial e geral, com pleno respeito pelos limites da culpa.

Na verdade, a pena única encontrada situa-se abaixo da metade da pena.

Não podemos esquecer as elevadíssimas exigências de prevenção geral e que importa fazer sentir na comunidade em geral que estes comportamentos não são toleráveis pela Ordem Jurídica.

Consideramos, pois, e em suma, que o tribunal a quo valorou devidamente os critérios estabelecidos nos artigos 40.º, 47.º, n.º 2 e 71.º, todos do Código Penal, fixando a pena única aplicada ao recorrente de forma adequada e ajustada às exigências de prevenção, à culpa e às demais circunstâncias previstas nesses preceitos legais, não sendo a mesma excessiva.

O douto acórdão recorrido não violou quaisquer normas constitucionais, do Código Penal ou do Código de Processo Penal.

Nesta conformidade, deve negar-se provimento ao recurso e manter-se, nos seus precisos termos, a pena única de onze anos de prisão efetiva aplicada ao recorrente (…).

4. Remetido o processo ao Tribunal da Relação ..., o Senhor Juiz Desembargador relator proferiu despacho a mandar remeter os autos ao Supremo Tribunal de Justiça, por o recurso se limitar a matéria de direito e ser dirigido a este tribunal, corrigindo-se o lapso cometido no envio do processo àquele tribunal.

5. Recebidos, foram os autos com vista ao Ministério Público, para os efeitos do disposto no artigo 416.º do CPP, tendo o Senhor Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal emitido parecer, também no sentido da improcedência do recurso, em concordância com a Senhora Procuradora da República no tribunal recorrido, nos seguintes termos (transcrição):

«(…)

Dir-se-á, antes de mais, que a precisão e exaustividade dos argumentos aduzidos na resposta da Exma. Colega – que se acompanha inteiramente – nos dispensam de maiores considerandos. (…)

(…) quanto à pena concreta, dir-se-á que, no caso deste específico cúmulo jurídico, o quantum oscilaria entre os 3 anos e os 44 anos de prisão, não podendo, como é óbvio, ultrapassar o limite de 25.

Verifica-se, pois, que o Tribunal fixou a pena única acrescentando, ao limite mínimo, menos de um quarto da diferença entre a pena parcelar mais alta e a soma aritmética de todas elas.

E repare-se que o arguido possui um vastíssimo currículo criminal, de nada tendo servido as anteriores condenações em penas da mais variada natureza.

Parece-nos, pois, que o aresto fez uma adequada interpretação dos critérios contidos nas disposições conjugadas dos art.ºs 40º, n.º 1 e 71º, n.º 1 e 2, als. a) a c), e) e f) do Código Penal.

Atendeu-se, cremos, à vantagem da reintegração tão rápida quanto possível do arguido em sociedade; sem se esquecer, porém, que a pena deve visar também, de forma equilibrada, a protecção dos bens jurídicos e a prevenção especial e geral, neste caso particularmente relevantes.

Com efeito, as fortíssimas exigências de prevenção e a gravidade (e reiteração criminosa) do comportamento do arguido tinham, em conformidade e de acordo com os critérios acima referidos, de ser traduzidos em pena correspondente à medida da sua culpa; o que o tribunal recorrido conseguiu com uma pena única inteiramente justa e que respeita as finalidades visadas pela punição.

Assim, concluindo, dir-se-á que o douto acórdão recorrido não merece censura, pelo que o recurso deverá improceder.”

6. Notificado para responder, nos termos do artigo 417.º, n.º 2, do CPP, o arguido nada disse.

7. Colhidos os vistos e não tendo sido requerida audiência, o recurso foi remetido à conferência – artigos 411.º, n.º 5, e 419.º, n.º 3, alínea c), do CPP.

II. Fundamentação

O acórdão recorrido

8. O tribunal coletivo deu como provados os seguintes factos (transcrição):

“I.

O arguido sofreu condenações:

A.

1. por decisão transitada em julgado em 28.02.2011, pela prática em 26.01.2011 de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de sessenta dias de multa à razão diária de cinco euros, extinta por pagamento em 27.02.2012 (32/11...., Juízo Local de ...);

2. por decisão transitada em julgado em 19.01.2012, pela prática em 04.09.2010 de um crime de violência depois da subtracção, na pena de nove meses de prisão substituída por duzentos e setenta dias de multa à razão diária de sete euros e cinquenta cêntimos, extinta por prescrição em 03.03.2017 (644/10...., Juízo Central ...);

3. por decisão transitada em julgado em 02.03.2012, pela prática em 18.08.2011 de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de cento e cinquenta dias de multa, extinta por pagamento em 2015 (75/11...., Juízo Local ...);

4. por decisão transitada em julgado em 18.04.2012, pela prática em 26.07.2011 de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de cento e cinquenta dias de multa à razão diária de cinco euros, que em 2012 foi substituída por trabalho a favor da comunidade e está extinta, desde 22.12.2014, por pagamento da multa (520/11...., Juízo Local ...);

5. por decisão transitada em julgado em 30.01.2015, pela prática em 25.11.2011 de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de quatro meses de prisão, suspensa na sua execução por um ano, com regime de prova, vindo a suspensão a ser revogada e a pena extinta por cumprimento em 04.08.2020 (906/11...., Juízo Local ..., e 282/16.... Tribunal de Execução de Penas ...);

6. por decisão transitada em julgado em 02.02.2015, pela prática em 04.10.2011, de um crime de roubo, na pena de prisão de dois anos e três meses, suspensa na sua execução por igual período de tempo, vindo a suspensão a ser revogada por decisão transitada em julgado em 13.10.2016 (365/11...., Juízo Central ...);

7. por decisão transitada em julgado em 02.02.2015, pela prática em 27.07.2011 de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de oito meses de prisão, suspensa na sua execução por um ano, já extinta desde 2016 sem que tenha ocorrido revogação da suspensão (521/11...., Juízo Local ...);

8. por decisão transitada em julgado em 27.03.2015, pela prática em 07.07.2010 de três crimes de roubo, na pena de três anos e seis meses de prisão, suspensa na sua execução com regime de prova, suspensão essa revogada por decisão transitada em julgado em 18.11.2016 (203/11...., Juízo Central ...);

9. por decisão transitada em julgado em 08.06.2015, pela prática em 23.08.2011 de crime de roubo, na pena de seis meses de prisão, substituída por cento e oitenta dias de multa à razão diária de seis euros, extinta desde 09.09.2015, por pagamento (643/11...., BB);

10. por decisão transitada em julgado em 11.09.2015, pela prática em 22.08.2011 de um crime de roubo, na pena de dezoito meses de prisão, suspensa na sua execução com condição ressarcitória, vindo a suspensão a ser revogada por decisão transitada em julgado em 06.05.2019 (241/11...., CC);

11. por decisão transitada em julgado em 30.09.2015, pela prática em 23.08.2011 de um crime de roubo, na pena de um ano e seis meses de prisão, suspensa na sua execução com regime de prova, suspensão essa que foi revogada por decisão transitada em julgado em 16.02.2017 (452/11...., Juízo Central ...);

12. por decisão transitada em julgado em 06.07.2012, pela prática em 04.04.2012 de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de três meses de prisão, suspensa na sua execução, já extinta desde 2013, sem que tenha ocorrido revogação da suspensão (49/12...., Juízo Local ...);

13. por decisão transitada em julgado em 13.06.2016, pela prática em 17.08.2011 de três crimes de roubo, nas penas parcelares de dois anos e seis meses de prisão e, em cúmulo jurídico destas, na pena unitária de quatro anos de prisão efectiva (512/11...., Juízo Central ...);

14. por decisão transitada em julgado em 13.06.2016, pela prática em 21.10.2010 de um crime de furto qualificado na forma tentada, na pena de dez meses de prisão efectiva (700/10...., Juízo Central ...) e

15. por decisão transitada em julgado em 06.06.2019, pela prática em 10.05.2011 de um crime de furto qualificado na forma tentada, na pena de dois anos de prisão efectiva (117/11...., Juízo Central ...).

15.1. No âmbito do processo n.º 117/11...., do Juízo Central Criminal ..., por acórdão transitado em julgado em 28.09.2020, foi conhecido supervenientemente o concurso dos crimes que foram objecto das condenações atrás indicadas em 3, 4, 5, 6, 8, 9, 10, 11, 13 e 15, sendo determinada a pena cumulativa de treze anos de prisão.

B.

16. por decisão transitada em julgado em 14.12.2015, pela prática em 30.01.2013 de um crime de furto qualificado, na pena de três anos de prisão, suspensa na sua execução com regime de prova, vindo a suspensão a ser revogada por decisão transitada em julgado em 18.12.2017 (84/13...., Juízo Central ...);

17. por decisão transitada em julgado em 03.10.2016, pela prática em 14.05.2012 de um crime de tentativa de furto qualificado, na pena de dois anos de prisão, suspensa na sua execução com regime de prova, declarada extinta por decisão de 26.11.2018, sem que tenha ocorrido revogação da suspensão (7/14...., Juízo Local ...);

18. por decisão transitada em julgado em 08.07.2016, pela prática em 03.06.2012 de um crime de roubo, na pena de três anos de prisão efectiva (263/12...., Juízo Central ...);

19. por decisão transitada em julgado em 22.06.2016, pela prática em 27.06.2012 de um crime de furto qualificado, na pena de dois anos e dois meses de prisão (214/12...., Juízo Local ...);

20. por decisão transitada em julgado em 31.10.2018, pela prática em 02.03.2013 de um crime de furto qualificado, na pena de três anos de prisão (63/13...., Juízo Central ...);

21. por decisão transitada em julgado em 06.06.2016, pela prática em 14.03.2013 e em 04.03.2014 de dois crimes de falsificação, nas penas parcelares de um ano de prisão, relativamete a cada um dos crimes, e na pena cumulativa de um ano e seis meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período e já declarada extinta, sem que tenha ocorrido revogação da suspensão, por decisão de 13.06.2018 (90/14...., DD);

22. por decisão transitada em julgado em 13.09.2016, pela prática em 12 e 13.03.2014 de um crime de falsidade de depoimento ou declaração, na pena de três meses de prisão efectiva (298/15...., Juízo Local ...);

23. por decisão transitada e julgado em 01.01.2018, pela prática em 20.01.2014 de um crime de furto qualificado, na pena de três anos de prisão efectiva (11/14...., Juízo Local ...);

24. por decisão proferida em 26.01.2021, transitada em julgado em 25.02.2021, pela prática em 04.02.2014 de um crime de furto qualificado, na pena de dois anos e cinco meses de prisão (65/14...., Juízo Local ...)

25. por decisão transitada em julgado em 28.04.2014, pela prática em 11.03.2014 de um crime de furto qualificado, na pena de dois anos e seis meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, vindo a suspensão a ser revogada por decisão transitada em julgado em 12.04.2021 (processo 107/14...., do Juízo Local ...);

26. por decisão transitada em julgado em 18.04.2016, pela prática em 11.06.2014 e em 11.07.2014 de dois crimes de furto qualificado, nas penas parcelares, respectivamente, de dois anos e seis meses e de um ano de prisão e, em cúmulo destas, na pena unitária de dois anos e onze meses de prisão efectiva (7/14..., Juízo Central ...);

27. por decisão transitada em julgado em 22.02.2016, pela prática em 20.06.2014 de um crime de furto qualificado, na pena de dezasseis meses de prisão, suspensa na sua execução com regime de prova, vindo a suspensão a ser revogada por decisão de 29.03.2019, transitada em julgado em 13.05.2019 (58/14...., EE);

28. por decisão transitada em julgado em 05.10.2016, pela prática em 31.07.2014 de um crime de condução sem habilitação legal e de um crime de falsidade de declaração, nas penas, respectivamente, de doze meses e de quatro meses de prisão (50/14...., Juízo Local ...);

29. por decisão transitada em julgado em 22.03.2018, pela prática em 07.01.2015 de um crime de furto qualificado, na pena de vinte meses de prisão (1/15...., Juízo Local ...);

30. por decisão transitada em julgado em 02.05.2017, pela prática em 27.09.2015 de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de quinze meses de prisão (585/15...., Juízo Local ...);

31. por decisão transitada em julgado em 29.09.2016, pela prática em 16.10.2015 de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de seis meses de prisão (613/15...., Juízo Local ...);

32. por decisão transitada em 13.11.2017, pela prática em 29.10.2015 de um crime de furto qualificado, na pena de 8 meses de prisão (619/15...., do Juízo Local ...);

33. por decisão transitada em julgado em 02.02.2016, pela prática em 30.10.2015 de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de oito meses de prisão a cumprir em 48 períodos de 36 horas, aos fins-de-semana (322/15...., Juízo Local ...);

34. por decisão transitada em julgado em 16.09.2016, pela prática em 21.11.2015 de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de catorze meses de prisão (682/15...., Juízo Local ...);

35. por decisão transitada em julgado em 11.11.2016, pela prática (para além de outro crime em 21.12.2015) em 29.11.2015 de um crime de furto qualificado, na pena de dois anos de prisão (167/15...., Juízo Local ...);

36. por decisão transitada em julgado em 08.09.2017, pela prática em 29.11.2015 de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de oito meses de prisão efectiva (46/15...., Juízo Local ...);

37. por decisão transitada em julgado em 01.04.2019, proferida no processo 12/15...., do Juízo Central ..., foi condenado pela prática (para além de outros três crimes, praticados em 2016):

- em 21.09.2015, em 29.09.2015 e em 14.11.2015 de três crimes de condução sem habilitação legal, nas penas de dez meses de prisão relativamente a cada um deles,

- em 21.09.2015 e em 14.11.2015 de dois crimes de detenção de arma proibida, nas penas, respectivamente, de dezoito e de catorze meses de prisão,

- em 29.09.2015, em 19.11.2015 e em 29.11.2015 de três crimes de furto, o primeiro qualificado, o segundo e o terceiro simples (desqualificados em razão do valor), nas penas, respectivamente, de dezoito, doze e doze meses de prisão,

- em 29.11.2015 de um crime de furto simples (desqualificado em razão do valor) na forma tentada, na pena de seis meses de prisão.

38. No processo 12/15...., do Juízo Central Criminal ..., por acórdão cumulativo transitado em julgado em 04.06.2021, foi – para além do mais – conhecido supervenientemente o concurso dos crimes que foram objecto das condenações atrás indicadas nos processos n.ºs 84/13.... (JCC ...), 263/12.... (JCC ...), 214/12.... (JLC ...), 63/13.... (JC ...), 298/15.... (JLC ...), 11/14.... (JLC ...), 7/14.... (JC ...), 58/14.... (JLC ...), 50/14.... (JCG ...), 1/15.... (JCG ...), 585/15.... (JCG ...), 613/15.... (JCG ...), 619/15.... (JLC ...) 322/15.... (JCG ...), 682/15.... (JCG ...), 167/15.... (JCG ...), 46/15.... (JCG ...) e 12/15.... (JCC ...) – factos anteriores a 14.12.2015, sendo determinada, pelo Supremo Tribunal de Justiça, a pena cumulativa de 10 (dez) anos de prisão.

C.

39. por decisão transitada em julgado em 08.04.2016, pela prática em 01.02.2016 de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de nove meses de prisão, a cumprir em 54 períodos de dias livres (16/16...., Juízo Local ...);

40. por decisão transitada em julgado em 11.11.2016 – para além do já referido em B.-35) pela prática em 21.12.2015 de um crime de furto qualificado, na pena de dois anos e seis meses de prisão (167/15...., Juízo Local ...);

41. por decisão transitada em julgado em 24.05.2018, pela prática em 23.12.2015 de um crime de desobediência e de um crime de condução sem habilitação legal, nas penas, respectivamente, de oito meses de prisão e de dezoito meses de prisão (188/15...., Juízo Local ...);

42. por decisão transitada em julgado em 07.06.2018, pela prática em 22.02.2016 de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de um ano e quatro meses de prisão (78/16...., Juízo Local ...);

43. por decisão transitada em julgado em 15.03.2017, pela prática em 05.03.2016 de um crime de furto simples, na pena de quatro meses de prisão, declarada extinta por cumprimento em 04.04.2020 (33/16...., Juízo Local ... e 282/16...., Tribunal de Execução ...);

44. por decisão transitada em julgado em 01.04.2019, proferida no já referido processo 12/15...., do Juízo Central ..., foi condenado (para além de outros crimes, praticados em 2015, já atrás referidos em B.37) pela prática:

- em 28.01.2016 de um crime de furto qualificado, na pena de catorze meses de prisão,

- em 13.02.2016 de um crime de furto qualificado, na pena de dezoito meses de prisão, e

- em 25.02.2016 de um crime de furto qualificado, na pena doze meses de prisão.

45. No processo 12/15...., do Juízo Central Criminal ..., por acórdão cumulativo transitado em julgado em 04.06.2021, foi – para além do cúmulo referido em 38 – conhecido supervenientemente o concurso dos crimes que foram objecto das condenações atrás indicadas nos processos 16/16.... (JCG ...), 167/15.... (JCG ...) – factos posteriores a 14.12.2015, 188/15.... (JCG ...), 78/16.... (JCG ...), 33/16.... (JCG ...) e 12/15.... (JCC ...) – factos posteriores a 14.12.2015, sendo determinada, pelo Supremo Tribunal de Justiça, a pena cumulativa de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão.

II

Acerca factualidade demonstrada nos processos enumerados em B.:

46. Como já referido em 16, no processo 84/13.... o arguido foi condenado numa pena de 3 anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, vindo a suspensão a ser revogada por decisão já transitada em julgado.

Tal condenação foi consequente à prática pelo arguido, em 30.01.2013, de um crime de furto qualificado, em síntese praticado conjugando o arguido vontades e esforços com mais três pessoas, entrando por escalamento e através de uma janela numa residência em ..., pertencente a FF, onde remexeu móveis e de onde retirou objectos em ouro no valor global de €2.500,00 e um telemóvel, que fez seus, como livre e voluntariamente pretendeu.

47. No processo indicado em 18, 263/12...., o arguido foi condenado numa pena de 3 anos de prisão efectiva.

Essa condenação foi consequente à prática pelo arguido, em 03.06.2012, de um crime de roubo, em síntese praticado conjugando o arguido vontades e esforços com mais uma pessoa, saltando um deles de um automóvel (conduzido pelo outro numa rua em ...) para o reboque de um tractor onde seguiam um homem e uma mulher septuagenários, arrancando um brinco e um fio em outro que a mulher então usava, regressando ao automóvel onde ambos fugiram levando o fio, no valor de €1.000,00, que fizerem seu, mediante o uso da força física e intimidação, como livre e voluntariamente pretenderam.

48. No processo 214/12...., indicado em 19, o arguido foi condenado numa pena de 2 anos e 2 meses de prisão.

Foi tal condenação consequência da prática pelo arguido em, 27.06.2012, de um crime de furto qualificado, em síntese praticado conjugando o arguido vontades e esforços com mais duas pessoas, que distraíram a dona da casa enquanto o arguido entrou numa residência em ..., pertencente a GG e HH, de onde retirou objectos em ouro no valor global de €400,00 e um telemóvel, que fez seus, como livre e voluntariamente pretendeu.

49. No processo 63/13...., indicado em 20, ao arguido foi aplicada a pena de 3 anos de prisão.

A condenação foi consequente à prática, em 02.03.2013, de um crime de furto qualificado, em suma praticado conjugando o arguido vontades e esforços com outra pessoa para entrar na residência de II, em ..., remexer móveis e dali retirar objectos em ouro e dinheiro, no valor global de cerca de €10.200,00, que fizeram seus, como livre e voluntariamente pretenderam.

50. No processo indicado em 22, 298/15...., o arguido foi condenado numa pena de 3 meses de prisão.

Tal condenação foi consequente à prática, em 12 e 13.03.2014, de um crime de falsidade de depoimento, na forma continuada, consubstanciado em o arguido, nas aludidas datas, pretendendo fazer-se passar por pessoa sem quaisquer antecedentes criminais, depois de advertido do dever de responder com verdade acerca da identificação, ter dito a Inspector da Polícia Judiciária e, depois, a Juiz de Instrução Criminal, ser “JJ”, filho de KK e LL, natural de ..., nascido a .../.../1991, identificação esta que o arguido representou como falsa, tendo agido livre e voluntariamente e sabendo proibida a sua conduta.

51. No processo 11/14...., referido em 23, o arguido foi condenado na pena de 3 (três) anos de prisão.

A condenação foi motivada pela prática, em 20.01.2014, de um crime de furto qualificado, em síntese praticado conjugando o arguido vontades e esforços com mais duas pessoas, que distraíram o dono da casa enquanto o arguido entrou numa residência em ..., ..., pertencente a MM, então de cerca de 85 anos de idade, do interior dessa residência retirando objectos em ouro de valor não inferior a €1.300,00, numerário em valor não inferior a €1.500,00, uma pistola 6.35 e vinte munições, no valor global de €400,00 e um telemóvel, que fez seus, como livre e voluntariamente pretendeu.

52. No processo 65/14...., indicado em 24, o arguido foi condenado na pena de 2 (dois) anos e 5 (cinco) meses de prisão.

Essa condenação foi consequente à prática, em 04.02.2014 de um crime de furto qualificado, em síntese praticado conjugando o arguido vontades e esforços com mais duas pessoas, que vigiaram enquanto o arguido entrou por uma varanda numa residência em ..., pertencente a NN e OO, do interior dessa residência retirando objectos em ouro de valor não inferior a €5.000,00, que fez seus, como livre e voluntariamente pretendeu.

53. No processo referido em 25, 107/14...., foi aplicada ao arguido uma pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão (inicialmente suspensa na sua execução, mas sendo a suspensão revogada por decisão transitada em julgado).

Tal condenação foi consequente à prática, em 11.03.2014, de um crime de furto qualificado, em síntese praticado conjugando o arguido vontades e esforços com mais três pessoas, duas das quais vigiaram enquanto o arguido e a outra entraram por uma porta de sacada numa residência em ..., ..., pertencente a PP, tendo o arguido entrado no quarto onde esta se encontrava descansar e daí retirado um guarda-jóias com objectos no valor global de €300,00, abandonando a casa quando a ofendida acordou e gritou, levando consigo os referidos objectos, que fez seus, como livre e voluntariamente pretendeu.

54. No processo referido em 26, 7/14..., o arguido foi condenado numa pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão e outra de 1 (um) ano de prisão.

A primeira dessas penas foi consequente à prática em 11.06.2014 de um crime de furto qualificado, em síntese praticado pelo arguido transpondo um muro e entrando por uma janela numa residência em ..., EE, pertencente a QQ, tendo retirado de uma gaveta de uma cómoda que estava num quarto objectos em ouro de valor não concretamente determinado mas seguramente superior a €102,00, que o arguido fez seus, como livre e voluntariamente pretendeu.

E a segunda foi consequente à prática em 11.07.2014 de outro crime furto qualificado, este numa residência em ..., pertencente a RR, onde o arguido entrou, tendo de móveis de um quarto objectos em ouro de valor não concretamente determinado mas seguramente superior a €102,00, que o arguido fez seus, como livre e voluntariamente pretendeu.

55. No processo 58/14...., indicado em 27, o arguido foi condenado numa pena de 16 (dezasseis) meses de prisão, suspensa na sua execução com regime de prova, vindo a suspensão a ser revogada por decisão transitada em julgado.

Tal condenação foi consequente à prática, em 20.06.2014, de um crime de furto qualificado, em síntese praticado conjugando o arguido vontades e esforços com outra pessoa, que conduziu o automóvel usado na deslocação até uma residência em ..., EE, pertencente a SS e GG, a que o arguido acedeu transpondo o muro, remexendo gavetas num quarto e daí retirado a quantia de €600,00, em notas do BCE, e objectos em prata no valor de cerca de €300,00, dinheiro e objectos que o arguido fez seus, como livre e voluntariamente pretendeu (vindo o arguido, posteriormente a restituir os objectos aos ofendidos).

56. No processo 50/14...., referido em 28, o arguido foi condenado numa pena de 12 (doze) meses de prisão e numa pena de 4 (quatro) meses de prisão.

Essas condenações foram consequentes à prática em 31.07.2014, respectivamente, de um crime de condução sem habilitação legal e de um crime de falsidade de declaração, em síntese praticados pelo arguido mediante a condução de um automóvel em via pública de ..., não tendo habilitação legal para o efeito, o que sabia ser proibido; e, nesse contexto, não ter acatado inicialmente ordem de paragem de Militares da Guarda Nacional Republicana mas acabando por se imobilizar em ..., após o que repetidamente disse chamar-se JJ, mesmo depois de advertido que não podia faltar à verdade a respeito da identificação, identificação esta que o arguido representou como falsa, tendo agido livre e voluntariamente e sabendo proibida a sua conduta, pretendendo evitar a responsabilização pela condução sem carta.

57. No processo indicado em 29, 1/15...., foi aplicada ao arguido a pena de 20 (vinte) meses de prisão.

Tal condenação foi consequente à prática pelo arguido, em 07.01.2015, de um crime de furto qualificado, perpetrado, em síntese, conjugando o arguido vontades e esforços com outra pessoa, que com o arguido entrou numa residência em ..., pertencente a TT, dessa residência retirando a quantia de €2.000,00 e dois objectos em ouro de valor não concretamente apurado, dinheiro e objectos que o arguido e seu acompanhante fizeram seus, como livre e voluntariamente pretenderam (vindo posteriormente a restituir um dos objectos à ofendida).

58. No processo referido em 30, 585/15...., o arguido foi condenado na pena de 15 (quinze) meses de prisão.

A condenação foi consequente à prática pelo arguido em 27.09.2015 de um crime de condução sem habilitação legal, em síntese mediante a condução de um automóvel ligeiro em via pública de ..., não tendo o arguido habilitação legal para o efeito, tendo agido livre e voluntariamente e sabendo proibida a sua conduta.

59. No processo 613/15...., referido em 31, o arguido foi condenado na pena de 6 (seis) meses de prisão.

A condenação foi consequente à prática pelo arguido em 16.10.2015 de um crime de condução sem habilitação legal, em síntese mediante a condução de um automóvel ligeiro em estrada municipal de ..., não tendo o arguido habilitação legal para o efeito, tendo agido livre e voluntariamente e sabendo proibida a sua conduta.

60. No processo 619/15...., referido em 32, o arguido foi condenado na pena de 8 (oito) meses de prisão.

Tal condenação foi consequente à prática pelo arguido, em 29.10.2015, de um crime de furto qualificado, perpetrado, em síntese, conjugando o arguido vontades e esforços com mais duas pessoas, uma das quais distraiu a atenção de GG enquanto o arguido se introduzia na residência deste, sita em ..., do interior da qual retirou relógios e objectos em ouro no valor global de €4.350,00, que arguido e seus acompanhantes fizeram seus, como livre e voluntariamente pretenderam.

61. No processo referido em 33, 322/15...., o arguido foi condenado na pena de 8 (oito) meses de prisão (a cumprir em 48 períodos de 36 horas, aos fins-de-semana).

A condenação foi consequente à prática pelo arguido em 30.10.2015 de um crime de condução sem habilitação legal, em síntese mediante a condução de um automóvel ligeiro em estrada nacional, em ..., não tendo o arguido habilitação legal para o efeito, tendo agido livre e voluntariamente e sabendo proibida a sua conduta.

62. No processo 682/15...., como referido em 34, foi aplicada ao arguido a pena de 14 (catorze) meses de prisão.

A condenação foi consequente à prática pelo arguido em 21.11.2015 de um crime de condução sem habilitação legal, em síntese mediante a condução de um automóvel ligeiro em rua pública de ..., não tendo o arguido habilitação legal para o efeito, tendo agido livre e voluntariamente e sabendo proibida a sua conduta.

63. No processo 167/15...., como já indicado em 35, foi aplicada ao arguido (para além de outra pena por crime praticado em 21.12.2015) uma pena de 2 (dois) anos de prisão.

A condenação foi motivada pela prática, em 29.11.2015, de um crime de furto qualificado, em síntese praticado pelo arguido mediante entrada numa residência, sita em ..., ..., pertencente GG e UU, então septuagenários, que ainda surpreenderam o arguido no interior da residência, momento em que o arguido fugiu, levando consigo €65,00 que encontrara depois de remexer gavetas e carteira, quantia que fez sua, como livre e voluntariamente pretendeu, tal como pretendeu aproveitar-se da fragilidade dos ofendidos.

64. No processo referido em 36, 46/15...., o arguido foi condenado na pena de 8 (oito) meses de prisão efectiva.

Tal condenação foi motivada pela prática pelo arguido, em 29.11.2015, de um crime de condução sem habilitação legal, em síntese mediante a condução de um automóvel ligeiro em rua pública de ..., não tendo o arguido habilitação legal para o efeito, tendo agido livre e voluntariamente e sabendo proibida a sua conduta.

65. No processo referido em 37, 12/15...., o arguido foi condenado (para além de outras penas por crimes praticados 2016) nas penas de:

- (10) dez meses de prisão, pela prática de crime de condução sem habilitação legal em 21.09.2015, porquanto o arguido, em síntese, conduziu o automóvel ligeiro ..-EA-.. até à Rua ..., em ..., não sendo titular de carta de condução ou título equivalente;

- (18) dezoito meses de prisão, pela prática de crime de detenção de arma proibida em 21.09.2015, em síntese porque o arguido, na data e no local acabados de referir, não tendo qualquer autorização legal de uso e ou porte de armas, tinha na sua posse um bastão extensível, uma arma de fogo longa de tiro a tiro (insusceptível de manifesto ou registo, por estar viciada), uma arma de fogo longa de repetição com um silenciador acoplado e treze munições da carabina, com a qual efectuou vários disparos, na presença de outras pessoas e atingindo dois veículos estacionados;

- (10) dez meses de prisão, pela prática de crime de condução sem habilitação legal em 29.09.2015, em síntese por o arguido ter conduzido o mencionado ..-EA-.. até à Rua ..., em ..., não sendo titular de carta de condução ou título equivalente;

- (18) dezoito meses de prisão, pela prática de crime de furto qualificado em 29.09.2015, porquanto o arguido, em síntese, na data e local acabados de referir, dirigiu-se à residência de VV e dali retirou €50,00 em notas do BCE e um guarda-jóias contendo vários objectos em ouro e prata com valor total de cerca de €400,00, levando consigo e fazendo suas tais quantia e objectos apesar de ainda ter sido surpreendido pela ofendida;

- (10) dez meses de prisão, pela prática de crime de condução sem habilitação legal em 14.11.2015, em síntese por o arguido ter conduzido o automóvel ligeiro ..-..-RJ em rua pública de ..., até um parque de estacionamento, não sendo titular de carta de condução ou título equivalente;

- (14) catorze meses de prisão, pela prática de crime de detenção de arma proibida em 14.11.2015, em síntese porque o arguido, na data e no local acabados de referir, ter no interior do automóvel uma pistola 6.35 e oito munições do mesmo calibre, apesar de continuar a não ter qualquer autorização legal de uso e ou porte de armas;

- (12) doze meses de prisão, pela prática de crime de furto simples (desqualificado em razão do valor) em 19.11.2015, porquanto, em síntese, o arguido, conjugando vontades e esforços com outra pessoa, entrou na residência de WW, sita em ..., ..., e retirou do interior de um dos quartos uma aliança e um anel em ouro de valor não concretamente apurado, que fez seus;

- (12) doze meses de prisão, pela prática de crime de furto simples (desqualificado em razão do valor) em 29.11.2015, em síntese por se ter demonstrado que o arguido entrou na residência de XX, sita em ..., ..., e dali retirou, fazendo seus, €20,00, uma carteira e três anéis em ouro cujo valor não foi possível apurar;

- (6) seis meses de prisão, pela prática de crime de furto simples (desqualificado em razão do valor), na forma tentada em 29.11.2015¸ porquanto, em síntese, o arguido, na sequência do referido no parágrafo anterior, dirigiu-se a residência contígua, pertencente a YY (mãe de XX), chegando a introduzir-se em tal residência, de que pretendia retirar objectos de valor, só não o fazendo porque surgiu irmã de YY, que gritou e a quem o arguido empurrou com força para o chão, após o que fugiu do local,

sendo que, nas nove situações, o arguido agiu de forma livre, deliberada e consciente, sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.

III

Acerca da personalidade e condições de vida do arguido:

66. O arguido nasceu e cresceu integrado em agregado familiar numeroso, com estilo de vida itinerante, carências económicas e recurso à mendicidade como forma de garantir a sobrevivência, tendo ficado órfão de pai com doze anos de idade.

67. Nesse contexto familiar e económico, a formação escolar do arguido foi desvalorizada, tendo o arguido frequentado a escola por curto período de tempo, sem que tenha adquirido competências escolares para além de escrever o nome.

68. Algum tempo depois do falecimento do pai, o arguido rompeu o relacionamento com a mãe (por não aceitar novo relacionamento afectivo da mãe) e iniciou ele próprio união marital com uma jovem da sua idade, integrando o agregado familiar desta (residente em ...), união essa que manteve até aos dezoito anos de idade da qual nasceram duas filhas, actualmente com cerca de nove e onze anos de idade, de que o arguido se distanciou depois da separação.

69. Após, o arguido iniciou novo relacionamento afectivo, que mantém, e foi viver com a nova companheira e filho para casa da mãe daquela, em ..., sendo a subsistência do seu agregado assegurada através de prestações sociais.

70. Antes da reclusão, o arguido mantinha um estilo de vida itinerante, passando alguns períodos junto do agregado da sua família de origem em ... ou junto de outros familiares da companheira noutras regiões do ..., com situação laboral e económica irregular e precária, não lhe sendo conhecidos hábitos de trabalho, embora refira ter trabalhado em agricultura desde a adolescência e também em comércio de ....

71. O arguido apresenta-se como um indivíduo com competências pessoais e sociais reduzidas, imaturo na sua forma de pensar, com dificuldades de descentração e nas tomadas de decisão, nas quais prevalecem os seus interesses imediatos, evidenciando fraco sentido crítico perante as suas ações e trajecto de vida.

72. Apesar de ser distante a relação com a sua família de origem, nomeadamente com a mãe, oito irmãos, sobrinhos e primos, desde que em Setembro de 2018 ingressou no Estabelecimento Prisional ... passou a beneficiar de visitas daqueles.”

Âmbito e objeto do recurso

9. O recurso tem, pois, por objeto um acórdão proferido pelo tribunal coletivo que aplicou uma pena de prisão superior a 5 anos. Visa exclusivamente o reexame de matéria de direito, da competência deste tribunal (artigos 432.º, n.º 2, e 434.º do CPP), sem prejuízo do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 432.º, na redação introduzida pela Lei n.º 94/2021, de 21 de dezembro, segundo o qual se pode recorrer com os fundamentos previstos nos n.ºs 2 e 3 do artigo 410.º, que não vêm invocados.

O âmbito do recurso, que circunscreve os poderes de cognição deste tribunal, delimita-se pelas conclusões da motivação (artigos 402.º, 403.º e 412.º do CPP), sem prejuízo dos poderes de conhecimento oficioso, se for caso disso, em vista da boa decisão do recurso, de vícios da decisão recorrida a que se refere o artigo 410.º, n.º 2, do CPP (acórdão de fixação de jurisprudência n.º 7/95, DR-I, de 28.12.1995), de nulidades não sanadas (n.º 3 do mesmo preceito) e de nulidades da sentença (artigo 379.º, n.º 2, do CPP, na redação da Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro), que não se verificam.

Mostram-se satisfeitos os requisitos impostos pelos artigos 374.º e 375.º do CPP, nomeadamente quanto à fundamentação em matéria de facto e em matéria de direito, bem como quanto à escolha e determinação da medida da pena, não se revelando qualquer dos vícios de decisão a que se refere o artigo 410.º, n.º 2, do CPP, os quais, na previsão deste preceito, devem resultar do texto da decisão recorrida, por si só ou em conjugação com as regras da experiência, e não ocorrem nulidades não sanadas que devam ser conhecidas.

10. Tendo em conta as conclusões da motivação do recurso, este Tribunal é, pois, chamado a apreciar e decidir:

(a) Se a operação de cúmulo jurídico deve incluir as penas aplicadas nos processos indicados nos n.ºs 1 a 15 da fundamentação de facto; e

(b) Se a pena única aplicada, de 11 anos de prisão, foi determinada em violação do disposto no artigo 77.º, n.º 1, do Código Penal e se, tendo-o sido, deve ser reduzida para medida não superior a 7 anos de prisão.

Da determinação superveniente da pena do concurso de crimes – âmbito e pressupostos

11. Nos termos do n.º 1 do artigo 77.º do Código Penal, quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa única pena, na qual são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente. De acordo com o artigo 78.º, n.ºs 1 e 2, do mesmo diploma, esta regra é aplicável quando, após o trânsito em julgado de uma decisão condenatória por qualquer desses crimes, se mostrar, perante condenações transitadas em julgado, que o agente praticou, anteriormente àquela condenação, outro ou outros crimes, sendo a pena que já tiver sido cumprida descontada no cumprimento da pena única aplicada ao concurso de crimes.

Decidindo controvérsia jurisprudencial a propósito do momento temporal a ter em conta para a verificação dos pressupostos do concurso de crimes em caso de conhecimento superveniente, este Supremo Tribunal de Justiça fixou jurisprudência no sentido de que tal momento “é o do trânsito em julgado da primeira condenação por qualquer dos crimes em concurso” (acórdão de fixação de jurisprudência n.º 9/2016, DR I, n.º 111, de 9.6.2016).  

O trânsito em julgado de uma condenação penal é, pois, no âmbito do concurso de crimes, o limite temporal para a delimitação dos crimes a que é aplicável uma pena única, excluindo desta as penas aplicadas a crimes cometidos depois da data do trânsito, os quais, em caso de concurso com outros cometidos posteriormente a essa mesma data, poderão dar lugar à aplicação de diferentes penas únicas [assim, entre outros, os acórdãos de 18.5.2022, no proc. 2711/20.5T8STR.E1.S1, de 21.02.2018, no proc. 775/12.4T3NT.S2, em www.dgsi.pt, e de 4.7.2019, em reiteração de jurisprudência constante deste Tribunal, e de 12.02.2018 (Raul Borges), com exaustiva indicação de jurisprudência, ECLI:PT:STJ:2018:734.14.2PCLRS.S1.CB].

No caso de haver crimes em concurso com outros crimes que, contrariamente, não estão em concurso entre si, não é possível efetuar um único cúmulo. Sendo de afastar o “cúmulo por arrastamento”, conforme jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça de há muitos anos unânime, após alguma aceitação de solução oposta, haverá que proceder a dois cúmulos autónomos, cujas penas se “acumulam materialmente”, em execução sucessiva (artigo 63.º do Código Penal), integrando-se a “pena-charneira”, que “arrastaria” as demais penas, no cúmulo a que houver lugar em função da data do trânsito em julgado da primeira condenação. Citando abundante jurisprudência e doutrina a este propósito, diz-se no acórdão de 11.4.2018 (Maia Costa), Proc. 15/14.1GDLLE.S1, que se acompanha: “VI - A resposta da doutrina sempre foi no sentido de não admitir a figura do “cúmulo por arrastamento”. Já na jurisprudência persistiu durante vários anos a orientação oposta, sufragada aliás por este STJ. Contudo, desde há muitos anos que a jurisprudência deste Tribunal é unânime na rejeição da figura do “cúmulo por arrastamento”. VII - Na verdade, não só seria absurdo que a prática de mais um crime servisse de expediente para a fusão num único concurso de um conjunto de penas que, não fora essa outra condenação, deveriam ser cumpridas em termos de sucessão, ou seja, em acumulação material, como a solução é contra legem, pois o art.º 77.º, n.º 1, do CP claramente determina a impossibilidade de proceder a um único cúmulo quando haja uma decisão condenatória transitada a interromper uma sequência de crimes. VIII - Nesse caso, a pluralidade de crimes não constituirá um concurso, mas sim uma sucessão, eventualmente acrescendo a agravante qualificativa da reincidência, se se verificarem os pressupostos do art.º 75.º do CP. Doutra forma, ou seja, se todas as penas, fossem anteriores, fossem posteriores ao trânsito, entrassem num único concurso, “arrastadas” pela pena-charneira, beneficiaria o arguido injustamente do regime do cúmulo jurídico de penas, mais favorável obviamente do que o da acumulação material, um benefício que ele certamente não mereceria por ter desprezado a “solene advertência” para o condenado não cometer novos crimes, que a condenação transitada encerra. IX - Recapitulando: em caso de pluralidade de crimes, o trânsito da primeira condenação por qualquer deles impede a formação de um único concurso de crimes com os que foram praticados posteriormente a esse trânsito, pelo que há que proceder a dois cúmulos: um entre as penas anteriores ao trânsito da primeira condenação; outro referente às penas correspondentes a factos posteriores a esse trânsito. Essas duas penas conjuntas deverão ser cumpridas sucessivamente”.

12. A determinação da pena única efetua-se através de uma nova sentença que efetue o cúmulo jurídico, mediante realização de audiência e das diligências necessárias (artigo 472.º do CPP), sendo territorialmente competente para o efeito o tribunal da última condenação – o que pressupõe a competência material e funcional, por ter aplicado uma das penas em concurso (assim, o citado acórdão de 11.4.2018, Proc. 15/14.1GDLLE.S1, bem como os acórdãos de 24.10.2012, Proc. 316/07.5GBSTS.S2,  de 10.4.2014, Proc. 540/07.0PCOER-A.S1, de 21.2.2018, Proc. 775/12.4T3NT.S2, e de 4.7.2019, Proc. 1037/14.8GEALM-A.S1, www.dgsi.pt) –, nos termos do artigo 471.º do CPP, o qual “por ser o último a intervir em tempo e na cadeia das condenações, dispõe dos elementos de ponderação mais completos e atualizados, nomeadamente, quanto aos factos e que, portanto, a todas as luzes, é o que está em melhor plano para colher a visão que se quer de panorâmica completa e atual do trajeto de vida do arguido”, sendo irrelevante a data do respetivo trânsito [acórdão de 6.1.2010, Proc. 98/04.2GCVRM-A.S1 (Pereira Madeira), em www.dgsi.pt].

Como se extrai dos autos, o processo em que foi proferido o acórdão recorrido, registado no Juízo Central Criminal ... (Juiz ...) com o n.º 571/19..., resulta de certidão extraída do processo comum singular n.º 11/14...., do Juízo Local ..., ambos do Tribunal Judicial da Comarca ..., no qual foi posteriormente verificado que o Juízo Local ..., da mesma comarca, por sentença proferida em 26.01.2021 no processo 65/14...., transitada em 25.02.2021, aplicou ao arguido a pena de 2 anos e 5 meses de prisão, relativa a factos praticados em 4.2.2014 (posteriormente ao trânsito em julgado, em 2.3.2012, da sentença proferida no processo 75/11....). Sendo este o “tribunal da última condenação”, cabia-lhe, por conseguinte, determinar e aplicar a pena única do concurso, por conhecimento superveniente, nos termos do artigo 471.º do CPP. Porém, sendo a pena máxima superior a 5 anos de prisão, da competência do tribunal da comarca funcionar em tribunal coletivo (artigo 14.º, n.º 2, al. b), do CPP), tal competência pertence, assim, ao Juízo Central Criminal ... (artigos 471.º, n.º 1, do CPP e 118.º e 134.º da LOSJ – Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto, com as alterações posteriores).

13. Convocando o regime de punição do concurso de crimes, por conhecimento superveniente do concurso, estabelecido nos artigos 77.º e 78.º do Código Penal, com as alterações decorrentes da Lei n.º 59/2007, de 4 de setembro, e jurisprudência relevante, nomeadamente a fundamentação do acórdão de fixação de jurisprudência n.º 9/2016 (DR 1.ª série, n.º 111, de 9.6.2016) – mas não o seu dispositivo: “O momento temporal a ter em conta para a verificação dos pressupostos do concurso de crimes, com conhecimento superveniente, é o do trânsito em julgado da primeira condenação por qualquer dos crimes em concurso”, – bem como quanto à não consideração, na formação da pena única, das penas de prisão parcelares suspensas na sua execução e declaradas extintas (casos dos processos indicados nos pontos 12, 17 e 21 da matéria de facto), e à consideração de penas de prisão suspensas na sua execução cuja suspensão foi revogada (casos dos processos indicados nos pontos 16, 25 e 27), concluiu o tribunal a quo no sentido de:

(a) Não incluir no cúmulo jurídico realizado no acórdão recorrido as penas correspondentes aos crimes enumerados na parte A (pontos 1 a 15), com exceção do indicado no ponto 12 (Proc. 49/12...., relativo a factos praticados em 4.4.2012), que foram objeto do acórdão de 13.7.2020, proferido no processo 117/11...., do Juízo Central Criminal ... (Juiz ...), transitado em julgado em 28.9.2020 (ponto 15.1 da matéria de facto), que efetuou o cúmulo jurídico das penas aplicadas nos processos aí identificados, condenando o arguido a pena única de 13 anos de prisão, por factos praticados em data anterior a 2.3.2012 (que é a data do trânsito em julgado da primeira condenação, no processo 75/11....);

b) Incluir no cúmulo jurídico efetuado no acórdão recorrido as penas correspondentes aos crimes enumerados na parte B (pontos 16 a 37) e ao crime indicado no ponto 12, da parte A (Proc. 49/12...., relativo a factos praticados em 4.4.2012), praticados entre 2.3.2012 e 14.12.2015 (data do trânsito da primeira condenação por esses crimes, no processo 84/13....), aplicando-lhe a pena única de 11 anos de prisão, alterando, assim, nesta parte, o anteriormente decidido no processo 12/15...., do Juízo Central Criminal ... (Juiz ...) (ponto 38 da matéria de facto), em que lhe havia sido aplicada a pena de 10 anos de prisão, por entretanto ter havido conhecimento da prática dos crimes indicados nos pontos 24 e 25, em relação de concurso com os incluídos nesta decisão do tribunal de ...;

c) Não incluir no cúmulo jurídico realizado no acórdão recorrido as penas correspondentes aos crimes enumerados na parte C (pontos 39 a 44), a que foi aplicada a pena única de 5 anos e 6 meses de prisão, por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20.5.2021, transitado em julgado em 4.6.2021, que alterou a pena determinada no acórdão de 18.6.2020, proferido no processo 12/15...., do Juízo Central Criminal ... (Juiz ...) (ponto 38 da matéria de facto), por factos praticados entre 14.12.2015 e 8.4.2016 (data da primeira condenação, no processo 16/16...., por crimes posteriores àquela data).

14. Considerou-se, assim, no acórdão recorrido:

«Fundamentação de direito:

Acerca dos pressupostos legais da realização de cúmulo jurídico de penas, importa ter presente o estabelecido no artigo 77.º do Código Penal: “1 - Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa única pena. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente. 2 - A pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e 900 dias tratando-se de pena de multa; e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes. 3 - Se as penas aplicadas aos crimes em concurso forem umas de prisão e outras de multa, a diferente natureza destas mantém-se na pena única resultante da aplicação dos critérios estabelecidos nos números anteriores. 4 - As penas acessórias e as medidas de segurança são sempre aplicadas ao agente, ainda que previstas por uma só das leis aplicáveis.”

E, acerca dos pressupostos legais do conhecimento superveniente do concurso de crimes (aliás, da determinação superveniente da pena do concurso: cfr. MARIA JOÃO ANTUNES, “Penas e Medidas de Segurança”, reimp., 2018, pág.s 651 e sgs.), cumpre observar o estatuído no artigo 78.º do Código Penal: “1 - Se, depois de uma condenação transitada em julgado, se mostrar que o agente praticou, anteriormente àquela condenação, outro ou outros crimes, são aplicáveis as regras do artigo anterior, sendo a pena que já tiver sido cumprida descontada no cumprimento da pena única aplicada ao concurso de crimes. 2- O disposto no número anterior só é aplicável relativamente aos crimes cuja condenação transitou em julgado. 3 - As penas acessórias e as medidas de segurança aplicadas na sentença anterior mantêm-se, salvo quando se mostrarem desnecessárias em vista da nova decisão; se forem aplicáveis apenas ao crime que falta apreciar, só são decretadas se ainda forem necessárias em face da decisão anterior.”

Constata-se que quando, por decisão transitada em julgado em 02.03.2012, o arguido foi condenado no âmbito do processo referido em 3, já havia praticado os crimes que motivaram as demais condenações referidas em 15.1.

Posteriormente à referida data, quando o arguido sofreu a condenação referida em 16, por decisão transitada em julgado em 14.12.2015, já tinha praticado, não apenas o crime que motivou tal condenação, mas também os crimes de que resultaram as condenações indicadas em 17 a 37, i.e., todas consideradas na decisão referida em 38 e ainda as indicadas em 24 (a que por último transitou em julgado, em 25.02.2021, proferida no processo 65/14.... do Juízo Local ..., desta Comarca ...) e em 25 (processo 107/14...., do Juízo Local ...).

E ainda posteriormente a 14.12.2015, quando o arguido foi condenado no processo indicado em 39, por decisão transitada em julgado em 08.04.2016, já tinha praticado, não apenas o crime que motivou tal condenação, mas também os crimes de que resultaram as condenações indicadas em 40 a 44, todas consideradas na decisão referida em 45.

Destas constatações não decorre que deva considerar-se que todas as condenações enunciadas em I estão em relação de concurso relevante nos termos das citadas disposições legais.

No Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 9/2016, de 09.06.2016 (DR n.º 111/2016, Série I), foi uniformizada jurisprudência no sentido de que “o trânsito em julgado obsta a que sejam cumuladas com as penas aplicadas nos crimes cometidos até esse trânsito outras penas aplicadas por crimes que vieram a ser praticados em momento posterior a esse mesmo trânsito, funcionando o trânsito em julgado de qualquer das decisões como uma barreira excludente dos crimes praticados subsequentemente.”

Como referido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04.11.2015, proferido no processo 303/08.6GABNV-B.E1.S1 (consultado em www.dgsi.pt), “(…) o momento temporal decisivo para o estabelecimento de relação de concurso (ou a sua exclusão) é o trânsito em julgado de qualquer das decisões, sendo esse o momento em que surge, de modo definitivo e seguro, a solene advertência ao arguido.

O trânsito em julgado obstará a que com essa infracção ou outras cometidas até esse trânsito, se cumulem infracções que venham a ser praticadas em momento posterior a esse mesmo trânsito, que funcionará assim como barreira excludente, não permitindo o ingresso no círculo dos crimes em concurso, dos crimes cometidos após aquele limite.

A primeira decisão transitada será assim o elemento aglutinador de todos os crimes que estejam em relação de concurso, englobando as respectivas penas em cúmulo, demarcando as fronteiras do círculo de condenações objecto de unificação.

A partir desta data, em função dessa condenação transitada deixam de valer discursos desculpabilizantes das condutas posteriores, pois que o(a) arguido(a) tendo respondido e sido condenado(a) em pena de prisão por decisão passada em julgado, não pode invocar ignorância acerca do funcionamento da justiça penal, e porque lhe foi dirigida uma solene advertência, teria de agir em termos conformes com o direito, “cortando” com as anteriores condutas. Persistindo, se se mostrarem preenchidos os demais requisitos, o/a arguido(a) poderá inclusive ser considerado(a) reincidente.

Esta data marca o fim de um ciclo e o início de um novo período de consideração de relação de concurso para efeito de fixação de pena única.

A partir de então, havendo novos crimes cometidos desde tal data, desde que estejam em relação de concurso, terá de ser elaborado com as novas penas um outro cúmulo e assim sucessivamente.

A partir desta barreira inultrapassável afastada fica a unificação, podendo os subsequentes crimes integrar outros cúmulos, formando-se outras penas conjuntas autónomas, de execução sucessiva”.

No presente caso, as “datas que marcam o fim de um ciclo e o início de novos períodos de consideração de relação de concurso para efeito de fixação de penas únicas” são as do trânsito em julgado das já mencionadas condenações nos processos referidos em 3, em 16 e em 39, 02.03.2012, 14.12.2015 e 08.04.2016, sendo que os crimes indicados em I-B (16 a 37) – bem como o indicado em 12 – foram praticados posteriormente a 02.03.2012 mas antes de 14.12.2015 e os indicados em I-C (39 a 44) foram praticados em datas posteriores a 14.12.2015 mas anteriores a 08.04.2016.

Relativamente ao primeiro ciclo (I-A, com ressalva da condenação referida em 12) e ao terceiro (I-C), foram já proferidas decisões cumulativas das penas, como enunciado em 15.1. e em 45, sendo que nenhuma alteração de circunstâncias ocorreu susceptível de legitimar a ineficácia do caso julgado formado relativamente a tais decisões.

Veja-se, a propósito, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04.11.2015, proferido no processo 303/08.6GABNV-B.E1.S1 (consultado em www.dgsi.pt): “Como se extrai dos acórdãos de 26-03-2014, processo n.º 31/09.5GAVNH.S1-3.ª e de 10-12-2014, processo n.º 18/10.5GBLMG.S1, do mesmo relator, citando o acórdão de 27 de Junho de 2001, processo n.º 1790/01-3.ª, SASTJ, n.º 52, pág. 48 “O caso julgado relativo à formação do cúmulo jurídico entre as penas de um processo vale rebus sic stantibus, ou seja, nas circunstâncias que estiverem na base da sua formação. Se as circunstâncias se alterarem por, afinal, do concurso fazer parte outro crime e outra pena, há uma modificação que altera a substância do concurso e a respectiva moldura penal, com a consequente alteração da pena conjunta. Daí que, não subsistindo as mesmas circunstâncias ou elementos que presidiram à formação da primitiva pena única, o caso julgado em que esta se traduziu tenha de ficar sem efeito, adquirindo as penas parcelares nela contidas toda a sua autonomia para a determinação da nova moldura penal do concurso”.

Diversamente sucede relativamente ao ciclo a que respeitam as condenações indicadas em I-B (16 a 37 – e também a mencionada em 12) e à decisão cumulativa referida em 38, uma vez que a tal decisão sobreveio o conhecimento da prática pelo arguido dos crimes indicadas em 24 e 52 (processo 65/14.8GCETR) e em 25 e 53 (107/14.7GBAND).

Cumpre, portanto, proceder à formação de nova pena única, que englobe não apenas as que foram objecto da decisão referida em 38, mas também as penas em que o arguido foi condenado nos dois processos por último referidos.”

15. Como se vê, o acórdão recorrido aplicou devidamente os critérios legais de determinação dos conjuntos dos crimes em relações de concurso (artigo 78.º, n.º 1, do Código Penal), a que devem ser aplicadas penas conjuntas (artigo 77.º, n.ºs 1 e 2), em conformidade com a jurisprudência fixada no acórdão 9/2016 deste Supremo Tribunal de Justiça.

Sendo a data do trânsito em julgado da primeira condenação (2.3.2012) o momento temporal a ter em conta para a verificação dos pressupostos do concurso de crimes (art.º 30.º, n.º 1, do CP), a que corresponde uma pena única (art.º 77.º, n.ºs 1 e 2, do CP), os crimes praticados antes dessa data e os crimes praticados depois dela (entre 2.3.2012 e 14.12.2015) formam dois conjuntos de crimes distintos, a que, em conhecimento superveniente do concurso (art.º 78.º, n.º 1, do CP), devem ser aplicadas duas penas únicas.

Pelo que, em reposta à primeira questão, se deve concluir que a operação de cúmulo jurídico levada a efeito no acórdão recorrido não deve incluir as penas aplicadas nos processos indicados nos n.ºs 1 a 15 da fundamentação de facto, excetuando a pena aplicada no processo indicado no n.º 12 (Proc. 49/12...., relativo a factos praticados em 4.4.2012), como decidido.

Termos em que improcede o recurso nesta parte.

Quanto à pena única

16. A determinação da pena única mostra-se fundamentada nos seguintes termos (transcrição nas partes diretamente relevantes):

“No cúmulo a realizar, de acordo com os pressupostos temporais já referido, integrar-se-iam todas as penas indicadas em I-B e também em 12, porque respeitantes a crimes praticados depois de 02.03.2012 e antes de 14.12.2015.

Todavia, relativamente a penas de suspensão de execução de prisão já declaradas extintas sem que a suspensão tenha sido revogada (nos termos do disposto no artigo 57º, n.º 1, do Código Penal) – como sucede relativamente às indicadas em 12, 17 e 21 – a sua exclusão do cúmulo vem sendo o entendimento jurisprudencial maioritário.

A pena de prisão substituída não foi cumprida, não podendo, por isso, ser descontada na pena única, suscitando – pelo menos – muito sérias dúvidas a possibilidade de encontrar critério equitativo que permitisse determinar em que medida as cumpridas penas substitutivas da prisão deveriam ser descontadas numa pena única de prisão efectiva (nos termos do artigo 81º do Código Penal: “se a pena imposta por decisão transitada em julgado for posteriormente substituída por outra, é descontada nesta a pena anterior, na medida em que já estiver cumprida”; “se as penas anterior e posterior forem de diferente natureza, é feito na nova pena o desconto que parecer equitativo”).

Nos casos das penas de prisão que foram substituídas pela suspensão da sua execução (com ou sem condições) e que foram declaradas extintas sem que tenha ocorrido revogação da suspensão, há que ponderar que o condenado cumpriu as penas de substituição, não dando motivos, pelo menos naquele período a que respeitava a suspensão, para que o Tribunal lhe revogasse a mesma e determinasse o cumprimento de efectiva prisão.

Não pode descurar-se o princípio da confiança e de garantia de estabilidade e paz jurídica do condenado: confiança que foi validamente transmitida ao condenado, que não chegou a cumprir a pena de prisão que lhe foi aplicada porque se absteve de adoptar comportamento contrário ao Direito e, sendo esse o caso, não incumpriu de modo censurável outras condições a que tenha sido sujeita a suspensão, criando expectativa legítima visando a futura extinção da pena de prisão aplicada; e estabilidade e paz jurídicas relativamente à declaração da extinção da(s) pena(s) pelo Tribunal, quando não se verificaram motivos para a sua revogação (cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 27.06.2016, no proc. n.º 10/07.7GAVCT-A.G1, consultado em www.dgsi.pt).

Por estas razões, não serão integradas no cúmulo as penas relativas às condenações indicadas em 12, 17 e 21, mas antes todas as indicadas em II.”

Determinação da pena única relativa ao concurso dos crimes referidos em II:

Por força do disposto no artigo 77º, n.º 2, do Código Penal, a pena unitária aplicável ao concurso tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão, e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes.

São assim tais limites os de 3 (três) a 44 (quarenta e quatro) anos, todavia com o limite inultrapassável de 25 anos de prisão.

Importa aqui notar que as penas que ora relevam são as penas originárias de prisão, que não as penas por que algumas delas foram substituídas (designadamente suspensão da execução da prisão que veio a ser revogada – como sucedeu relativamente às penas referidas em 16, 25 e 27), sendo que será em relação à pena cumulativa a determinar que o Tribunal avaliará da eventual verificação dos pressupostos legais para a sua substituição (cfr. FIGUEIREDO DIAS, “Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, 1993, pág. 295).

Entre os referidos limites, na determinação da pena unitária, cumpre considerar em conjunto os factos e a personalidade do agente (artigo 77º, n.º 1), à luz dos critérios de prevenção e culpa de determinação da medida da pena enunciados nos artigos 40º e 71º do Código Penal.

No já citado Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04.11.2015, esclarece-se:

“No que concerne à determinação da pena única, deve ter-se em consideração a existência de um critério especial na determinação concreta da pena do concurso, segundo o qual serão considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente (…).

Como se lê em Figueiredo Dias, Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, § 420, págs. 290/1, estabelecida a moldura penal do concurso, a determinação, dentro dos limites daquela, da medida da pena conjunta do concurso será encontrada em função das exigências gerais de culpa e de prevenção, mas nem por isso se dirá com razão que estamos perante uma hipótese normal de determinação da medida da pena, pois a lei fornece, para além dos critérios gerais de medida da pena contidos no art. 72.º-1 (actual artigo 71.º-1), um critério especial contido no artigo 78.º (actual artigo 77.º), n.º 1, 2.ª parte, segundo o qual «na determinação concreta da pena [do concurso] serão considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente».

(…)

E no § 421, págs. 291/2, acentua o mesmo Autor que na busca da pena do concurso, “Tudo deve passar-se como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma «carreira») criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta”.

Acrescenta ainda: “De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização)”.

(…)

Como se extrai do acórdão deste Supremo Tribunal de 6 de Maio de 2004, in CJSTJ 2004, tomo 2, pág. 191, a propósito dos critérios a atender na fundamentação da pena única, nesta operação o que releva e interessa considerar é, sobretudo, a globalidade dos factos em interligação com a personalidade do agente, de forma a aquilatar-se, fundamentalmente, se o conjunto dos factos traduz uma personalidade propensa ao crime, a dar indícios de projecto de uma carreira, ou é antes, a expressão de uma pluriocasionalidade que não encontra a sua razão de ser na personalidade do arguido, mas antes numa conjunção de factores ocasionais, sem repercussão no futuro.

(…)

Na consideração dos factos (do conjunto dos factos que integram os crimes em concurso) está ínsita uma avaliação da gravidade da ilicitude global, como se o conjunto de crimes em concurso se ficcionasse como um todo único, globalizado, que deve ter em conta a existência ou não de ligações ou conexões e o tipo de ligação ou conexão que se verifique entre os factos em concurso (…)”.

Atentos tais critérios, importa, concretamente, valorar conjuntamente a factualidade referida em II, que aqui se dá por reproduzida, notando-se que de tal factualidade resulta que o arguido, no período de três anos e meio, praticou trinta crimes, ofendendo bens jurídicos de diversa natureza, vitimando directamente não menos de vinte e duas pessoas, das quais várias idosas (ofendidos nos crimes de roubo e de furto), sendo metade desses crimes (quinze) de furto em residências e um de roubo, ascendendo o ilegítimo benefício patrimonial global obtido pelo arguido a não menos de trinta mil euros, mas também portando ou usando o arguido em distintas ocasiões armas de fogo e outras, conduzindo sem habilitação legal em nove situações diversas, por duas vezes prestando falsas declarações visando mitigar a sua responsabilização criminal.

Perante o sumariado, há que considerar que a ilicitude global é acentuada.

Porém, releva também a muito modesta condição sócio-cultural do arguido (cfr. factos enunciados em III), com repercussão no concreto juízo de censura que a sua global conduta justifica, bem como que os crimes foram praticados quando o arguido tinha, aproximadamente, entre dezanove e vinte e dois anos de idade, o que, atenta a rápida evolução da personalidade que a idade do arguido ainda consente, atenua a negatividade da perspectiva de prevenção especial que inculcaria apenas a consideração da tendência deliquente revelada nos crimes praticados (não apenas nos que são objecto do presente conhecimento superveniente do concurso, mas também nos anteriores, referidos em I-A, bem como nos posteriores, indicados em I-B).

Considerando os indicados critérios e factores, bem como a decisão referida em 38 e o estabelecido no artigo 8º, n.º 3, do Código Civil (“nas decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito”), conclui este Tribunal Colectivo pela adequação de pena unitária de 11 (onze) anos de prisão.

À pena agora fixada acrescem as penas unitárias determinadas nas decisões referidas em 15.1 (pena de 13 anos de prisão fixada no processo n.º 117/11...., do Juízo Central Criminal ...) e em 45 (pena de 5 anos e 6 meses de prisão, fixada no segundo cúmulo realizado no processo 12/15...., do Juízo Central Criminal ..., relativo a crimes praticados em datas posteriores a 14.12.2015 – al. b) do dispositivo do acórdão cumulativo proferido no processo 12/15....).”

17. A pena única corresponde a uma pena conjunta resultante das penas aplicadas aos crimes em concurso segundo um princípio de cúmulo jurídico, seguindo-se o procedimento normal de determinação e escolha das penas – que, em caso de conhecimento superveniente, se encerrou definitivamente, quanto às penas que o integram, com o trânsito em julgado da decisão relativamente a cada uma delas, nos processos em que foram aplicadas, havendo que anular cúmulos jurídicos anteriores que tenham sido efetuados relativamente a parte das penas que devem integrar o cúmulo por conhecimento posterior das relações de concurso –, a partir das quais se obtém a moldura penal do concurso (pena aplicável), que tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas, não podendo ultrapassar 25 anos, tratando-se de pena de prisão, e, como limite mínimo, a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes (artigo 77.º, n.º 2, do Código Penal).

Assim definida a moldura do concurso, deve o tribunal determinar a pena conjunta, seguindo os critérios da culpa e da prevenção (artigo 71.º do Código Penal) e o critério especial fixado na segunda parte do n.º 1 do artigo 77.º do Código Penal, segundo o qual na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, isto é, a personalidade do agente manifestada no facto, em que se incluem, designadamente, as condições económicas e sociais deste, reveladoras das necessidades de socialização, a sensibilidade à pena, a suscetibilidade de por ela ser influenciado e as qualidades da personalidade manifestadas no facto, nomeadamente a falta de preparação para manter uma conduta lícita. O substrato da medida da pena, devendo incluí-los, não pode, pois, bastar-se com os factos que constituem os elementos do tipo de ilícito ou do tipo de culpa, sendo necessário atender às circunstâncias que, deles não fazendo parte, possam depor a favor do agente ou contra ele, nos termos do n.º 2 do artigo 71.º do Código Penal (como se afirmou no acórdão de 19.2.2020, Proc. n.º 161/10.0GHSTC.E2.S1, em www.dgsi.pt, e na jurisprudência nele citada).

18. Recordando jurisprudência constante deste Supremo Tribunal e o que se consignou em acórdãos anteriores, com a fixação da pena conjunta pretende-se sancionar o agente, não só pelos factos individualmente considerados, mas também, e especialmente, pelo seu conjunto, enquanto revelador da dimensão e gravidade global do comportamento do agente. Há que atender ao conjunto de todos os factos cometidos pelo arguido e ao fio condutor presente na repetição criminosa, procurando estabelecer uma relação desses factos com a personalidade do agente, tendo-se em conta a caracterização desta, com sua projeção nos crimes praticados, levando-se em consideração a natureza destes e a verificação ou não de identidade dos bens jurídicos violados, tudo isto «tendo em vista descortinar e aferir se o conjunto de factos praticados é a expressão de uma tendência criminosa, isto é, se significará já a expressão de algum pendor para uma “carreira”, ou se, diversamente, a repetição comportamental dos valores estabelecidos emergirá antes e apenas de fatores meramente ocasionais» [assim, o citado acórdão de 18.5.2022, Proc. 2711/20.5T8STR.E1.S1, retomando-se o que se afirmou em anteriores acórdãos, nomeadamente no acórdão de 2.12.2012, Proc. 923/09.1T3SNT.L1.S1, de 21.11.2018, ECLI:PT:STJ:2018:114.14.0JACBR. A.S1.73, citando-se, entre outros, os acórdãos de 06-02-2008 (Proc. n.º 4454/07), de 18.1.2012, Proc. 34/05.9PAVNG.S1 (Raul Borges), de 14.07.2016 e de 17.06.2015 (Proc. 4403/00.2TDLSB.S1) (Pires da Graça) e 488/11.4GALNH (Maia Costa), em www.dgsi.pt].

Citando e repetindo o afirmado em anteriores decisões: “Tudo deve passar-se, por conseguinte, como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma «carreira») criminosa, ou tão-só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido a atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta». «A personalidade do agente – se bem que não a personalidade no seu todo, mas só a personalidade manifestada no facto», – «é um factor da mais elevada importância para a medida da pena e que para ela releva, tanto pela via da culpa como pela via da prevenção» (Figueiredo Dias, loc. cit., p. 291).

19. Nos termos do artigo 40.º do Código Penal, que se refere às finalidades das penas, “a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade” e “em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa”.

Estabelece o n.º 1 do artigo 71.º do Código Penal que a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, devendo o tribunal atender a todas as circunstâncias relacionadas com o facto praticado (facto ilícito típico) e com a personalidade do agente (manifestada no facto), relevantes para avaliar da medida da pena da culpa e da medida da pena preventiva, que, não fazendo parte do tipo de crime (proibição da dupla valoração), deponham a favor do agente ou contra ele considerando, nomeadamente, as indicadas no n.º 2 do mesmo preceito. A consideração destes fatores por referência à globalidade dos factos, na determinação da pena única, em cúmulo jurídico, não implica, como se tem observado, violação do princípio da proibição da dupla valoração relativamente a fatores anteriormente tidos em conta na determinação das penas singulares aplicadas aos crimes em concurso,

Como se tem afirmado, encontra este regime os seus fundamentos no artigo 18.º, n.º 2, da Constituição, segundo o qual «a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos». A privação do direito à liberdade, por aplicação de uma pena (artigo 27.º, n.º 2, da Constituição), submete-se, tal como a sua previsão legal, ao princípio da proporcionalidade ou da proibição do excesso, que, como é sabido, se desdobra nos subprincípios da necessidade ou indispensabilidade – segundo o qual a pena privativa da liberdade se há-de revelar necessária aos fins visados, que não podem ser realizados por outros meios menos onerosos –, adequação – que implica que a pena deva ser o meio idóneo e adequado para a obtenção desses fins – e da proporcionalidade em sentido estrito – de acordo com o qual a pena deve ser encontrada na “justa medida”, impedindo-se, deste modo, que possa ser desproporcionada ou excessiva (cfr. Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. I, notas aos artigos 18.º e 27.º).

20. Retomando considerações produzidas em acórdãos anteriores (por todos, o acórdão de 16.2.2022, Proc. 160/20.4GAMGL.S1, em www.dgsi.pt, e convocando, da doutrina, Anabela M. Rodrigues, A Determinação da Medida da Pena Privativa da Liberdade, Os Critérios da Culpa e da Prevenção, Coimbra Editora, 2014, pp. 611-678, e Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, 3.ª reimp., Coimbra Editora, 2011, pp. 232-357):

A projeção destes princípios na determinação da pena justifica-se pela necessidade de proteção do bem jurídico tutelado pela norma incriminadora violada, em conformidade com um critério de proporcionalidade entre a gravidade da pena e a gravidade do facto praticado, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção (artigos 40.º e 71.º do Código Penal). A aplicação da pena exige que o agente do crime tenha agido com culpa, devendo ser censurado pela violação do dever de atuar de acordo com o direito e “pelas qualidades desvaliosas da personalidade que se exprimem no facto”, o que se requer como pressuposto e cujo grau se impõe como limite da pena (artigo 40.º, n.º 2).

Para a medida da gravidade da culpa há que, de acordo com o artigo 71.º, considerar os fatores reveladores da censurabilidade manifestada no facto, nomeadamente, nos termos do n.º 2, os fatores capazes de fornecer a medida da gravidade do tipo de ilícito objetivo e subjetivo – fatores indicados na alínea a), primeira parte (grau de ilicitude do facto, modo de execução e gravidade das suas consequências), e na alínea b) (intensidade do dolo ou da negligência) – e os fatores a que se referem a alínea c) (sentimentos manifestados no cometimento do crime e fins ou motivos que o determinaram) e a alínea a), parte final (grau de violação dos deveres impostos ao agente), bem como os fatores atinentes ao agente, que têm que ver com a sua personalidade – fatores indicados na alínea d) (condições pessoais e situação económica do agente), na alínea e) (conduta anterior e posterior ao facto) e na alínea f) (falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto).

Na consideração das exigências de prevenção, destacam-se as circunstâncias relevantes em vista da satisfação de exigências de prevenção geral – traduzida na proteção do bem jurídico ofendido mediante a aplicação de uma pena proporcional à gravidade dos factos, reafirmando a manutenção da confiança comunitária na norma violada – e, sobretudo, de prevenção especial, as quais permitem fundamentar um juízo de prognose sobre o cometimento, pelo agente, de novos crimes no futuro, e assim avaliar das suas necessidades de socialização. Incluem-se aqui as consequências não culposas do facto [alínea a), v.g. frequência de crimes de certo tipo, insegurança geral ou pavor causados por uma série de crimes particularmente graves], o comportamento anterior e posterior ao crime [alínea e), com destaque para os antecedentes criminais] e a falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto [alínea f)]. O comportamento do agente [circunstâncias das alíneas e) e f)] adquire particular relevo para determinação da medida concreta da pena em vista da satisfação das exigências de prevenção especial, em função das necessidades individuais e concretas de socialização do agente, devendo evitar-se a dessocialização.

Como se tem sublinhado, é na determinação e consideração destes fatores que deve avaliar-se a concreta gravidade da lesão do bem jurídico protegido pela norma incriminadora, materializada na ação levada a efeito pelo arguido pela forma descrita nos factos provados, de modo a verificar se a pena aplicada respeita os mencionados critérios de adequação e proporcionalidade que devem pautar a sua aplicação (cfr., entre outros, os acórdãos de 26.06.2019, Proc. 174/17.1PXLSB.L1.S1, 9.10.2019, Proc. 24/17.9JAPTM-E1.S1, e de 3.11.2021, Proc. 875/19.0PKLSB.L1.S1, cit.). Devendo, por conseguinte, a operação de determinação da pena alhear-se de considerações de natureza geral pressupostas pelo legislador na identificação dos bens jurídicos protegidos, na construção dos tipos legais de crime e no estabelecimento das molduras das penas, assim se assegurando o respeito pelo princípio da proibição da dupla valoração de fatores relevantes para a determinação da medida da pena (como se observou, designadamente, nos acórdãos de 18.5.2022, Proc. 2711/20.5T8STR.E1.S1, e de 16.2.2022, Proc. 160/20.4GAMGL.S1, www.dgsi.pt).

21. Consigna-se no acórdão recorrido, em valoração da factualidade no seu conjunto, que desta “resulta que o arguido, no período de três anos e meio, praticou trinta crimes, ofendendo bens jurídicos de diversa natureza, vitimando directamente não menos de vinte e duas pessoas, das quais várias idosas (ofendidos nos crimes de roubo e de furto), sendo metade desses crimes (quinze) de furto em residências e um de roubo, ascendendo o ilegítimo benefício patrimonial global obtido pelo arguido a não menos de trinta mil euros, mas também portando ou usando o arguido em distintas ocasiões armas de fogo e outras, conduzindo sem habilitação legal em nove situações diversas, por duas vezes prestando falsas declarações visando mitigar a sua responsabilização criminal”, o que revela a “acentuada ilicitude global” do facto.

Como nele se sublinha, “releva também a muito modesta condição sócio-cultural do arguido (cfr. factos enunciados em III), com repercussão no concreto juízo de censura que a sua global conduta justifica, bem como que os crimes foram praticados quando o arguido tinha, aproximadamente, entre dezanove e vinte e dois anos de idade, o que, atenta a rápida evolução da personalidade que a idade do arguido ainda consente, atenua a negatividade da perspectiva de prevenção especial que inculcaria apenas a consideração da tendência deliquente revelada nos crimes praticados (não apenas nos que são objecto do presente conhecimento superveniente do concurso, mas também nos anteriores, referidos em I-A, bem como nos posteriores, indicados em I-B)”.

22. O acórdão recorrido levou também em conta a decisão referida no ponto 38 da matéria de facto – acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20.5.2021, que conheceu de recurso interposto do acórdão proferido no processo n.º 12/15..., do Juízo Central Criminal ..., que reduziu, de 12 para 10 anos de prisão, a pena única anteriormente aplicada aos crimes em concurso, com exceção dos mencionados nos pontos 24 e 25 da matéria de facto, cujo conhecimento superveniente determinou a realização do novo cúmulo pelo acórdão agora recorrido (https://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2021:12.15. 0GBSTR.E1.S1.BC).

Considerou-se nesse acórdão que: “a maioria dos crimes perpetrados pelo arguido são da mesma natureza, crimes contra o património – furto qualificado, sendo que no caso do 1.º bloco foi ainda condenado por 1 crime de roubo, e com excepção destes, os crimes de falsidade de depoimento (este extinto por cumprimento), falsas declarações e desobediência (crime contra a realização da justiça), e de detenção de arma proibida (crime contra a vida e integridade física)”; “a sua prática ocorreu no período decorrido entre 2012 e 2016”; “as penas sofridas pelo arguido no âmbito dos referidos processos têm idêntica natureza- penas de prisão - sendo de registar que aqueles em que foi condenado em pena suspensa, as mesmas foram revogadas”; “as condutas ilícitas são, em tudo, similares, revelando uma repetição que não abona em favor do arguido”; ”as exigências de prevenção geral são muito elevadas, por se entender que os crimes contra o património e contra bens pessoais são os mais praticados no nosso país e provocam grande alarme social na comunidade”; “o grau de ilicitude refletido no facto e no desvio de valores impostos pela ordem jurídica é médio-elevado em todas as situações, considerando que não existem elementos não compreendidos no tipo que agravem as condutas do arguido”; “a intensidade do dolo é elevada porque o arguido atuou sempre com dolo direto porquanto representou os factos criminosos e atuou com intenção de os realizar”; “o valor dos bens subtraídos leva a considerar graves as consequências das condutas”; “quanto à conduta anterior aos crimes relevam negativamente os extensos antecedentes criminais, donde, apesar da juventude do arguido, à data da prática dos factos, avultam anteriores condenações por crime da mesma natureza, o que significa que as advertências traduzidas naquelas penas para que encetasse uma conduta em conformidade com o direito de nada lhe serviram”; e que “a favor do arguido apenas podem ser consideradas as seguintes circunstâncias: a sua postura em audiência de cúmulo; a sua juventude”.

23. Os crimes agora incluídos no mesmo conjunto (pontos 24, 25, 52 e 53 da matéria de facto), em concurso com os abrangidos pelo cúmulo jurídico anterior, são dois crimes de furto qualificado, cometidos de modo idêntico, no mesmo período de tempo, e, tal como aqueles, em comparticipação com outras pessoas, a que foram aplicados penas de 2 anos e 5 meses de prisão e de 2 anos e 6 meses de prisão, esta suspensa na sua execução, posteriormente revogada devido à prática de outros crimes no período de suspensão.

24. Quanto ao comportamento anterior e posterior aos crimes evidenciam-se, em particular, as circunstâncias de o arguido, nascido a .../.../1994, atualmente com 28 anos de idade, ter cometido anteriormente à primeira condenação, um conjunto de crimes de idêntica natureza – crimes de roubo, furto qualificado e de condução sem habilitação legal – a que foi aplicada uma pena única de 13 anos de prisão (crimes indicados nos pontos 1 a 11 e 13 a 15 da matéria de facto), e de, posteriormente à condenação pelos crimes considerados no acórdão recorrido, ter continuado a repetir a prática de crimes semelhantes (pontos 39 a 44 e 45 da matéria de facto), a que foi aplicada a pena de 5 anos e 6 meses  de prisão, o que torna evidente uma particular insensibilidade às penas anteriormente aplicadas e incapacidade para motivar o seu comportamento em conformidade com o direito.

Vistos no seu conjunto, os factos e as suas circunstâncias, reveladoras da (ainda jovem) personalidade neles projetada, evidenciam que as condições pessoais, económicas e sociais do arguido são reveladoras de elevadíssimas e prementes necessidades de socialização, que o modo como os factos foram praticados mostram um grau muito elevado de ilicitude e de intensidade do dolo e uma evidente falta de preparação para manter uma conduta lícita, fatores que, como anteriormente se notou, revelando a gravidade dos factos, são decisivos para determinação da medida concreta da pena em vista da satisfação das exigências de prevenção especial.

São também elevadas as necessidades de prevenção geral, em especial no que se refere aos crimes de furto qualificado em residências, atendendo aos sentimentos de insegurança gerados pela sua frequência, cuja ponderação se comporta nos limites da culpa, evidenciada pelas demais circunstâncias relevantes nos termos do artigo 71.º do Código Penal, agora referidas aos factos na sua globalidade.

25. Assim, tendo em conta a moldura abstrata da pena aplicável aos crimes em concurso – de 3 a 25 anos de prisão – e os fatores relevantes acima expostos, em particular, o critério especial definido no artigo 77.º, n.º 1, do Código Penal, não se encontra fundamento que possa constituir motivo de discordância quanto à medida da pena aplicada, a qual se encontra justificada pela diversidade, frequência, número e concreta gravidade dos factos, no seu conjunto, sem ocorrer violação dos critérios de adequação e proporcionalidade, na consideração das necessidades de proteção dos bens jurídicos e de reintegração que a sua aplicação visa realizar (artigo 40.º do Código Penal).

Não procede, por conseguinte, a alegação de que “houve por parte do tribunal recorrido errada aplicação dos art.ºs 78.º, 40.º, n.ºs 1 e 2 e 71.º, 77.º, todos do C.P”.

Pelo que, também nesta parte, se conclui pela improcedência do recurso.

Quanto a custas

26. Nos termos do disposto no artigo 513.º do CPP (responsabilidade do arguido por custas), só há lugar ao pagamento da taxa de justiça quando ocorra condenação em 1.ª instância e decaimento total em qualquer recurso. A taxa de justiça é fixada entre 5 e 10 UC, tendo em conta a complexidade do recurso, de acordo com a tabela III anexa ao Regulamento das Custas Processuais.

III. Decisão

27. Pelo exposto, acordam os juízes da 3.ª Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em julgar improcedente o recurso interposto pelo arguido AA.

Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 5 UC.


Supremo Tribunal de Justiça, 6 de julho de 2022.


José Luís Lopes da Mota (relator)

Maria da Conceição Simão Gomes

Nuno António Gonçalves

(assinado digitalmente)