Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
5194/19.9T8STB.E1.S1
Nº Convencional: 4.ª SECÇÃO
Relator: JÚLIO GOMES
Descritores: DESPEDIMENTO
EXTINÇÃO DO POSTO DE TRABALHO
Data do Acordão: 10/12/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA.
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO.
Sumário :

Sendo o trabalhador contratado para exercer a atividade de supervisão de comerciais com a categoria de chefe de secção ou chefe de vendas, sem que tal categoria tenha sido alterada durante a vigência do contrato, tem o direito a exercer tais funções que correspondem ao seu genuíno posto de trabalho, para efeitos de uma eventual extinção do posto de trabalho, mesmo que esteja a exercer outras funções.

Decisão Texto Integral:


Processo n.º 5194/19.9T8STB.E1.S1

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça,

1. Relatório

AA (Autor) intentou a presente ação especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, manifestando, por via da apresentação do requerimento a que alude o artigo 98.º - C do Código de Processo do Trabalho, a sua oposição ao despedimento promovido por “DHL Express Portugal, Lda.” (Ré)

Realizado o julgamento foi proferida sentença com o seguinte teor:

“Destarte, julgo totalmente improcedente a presente ação, absolvendo a R./Entidade Empregadora DHL EXPRESS PORTUGAL, LDA., do pedido formulado pelo Requerente AA, sem prejuízo do pagamento que lhe é devido e liquidado a favor do A./trabalhador na quantia ilíquida de € 24.909,24 (vinte e quatro mil novecentos e nove euros e vinte e quatro cêntimos)”.

Inconformado o Autor interpôs recurso de apelação.

O Tribunal da Relação de Évora veio a proferir Acórdão que julgou o recurso de apelação procedente e, consequentemente, declarou a ilicitude do despedimento e condenou a Ré “DHL Express Portugal, Lda.” a pagar ao Autor AA: a) uma indemnização substitutiva da reintegração equivalente a 30 dias de retribuição base e diuturnidades, contada até ao trânsito em julgado da decisão final; b) as retribuições base e diuturnidades que a Autora deixou de auferir desde a data do despedimento e até ao trânsito em julgado da decisão final, incluindo subsídios de férias e de Natal, mas com dedução das importâncias referidas nas alíneas a) e c) do n.º 2 do artigo 390.º do Código do Trabalho, o que será liquidado no respetivo incidente; e c) juros de mora à taxa legal, desde a citação quanto à condenação supra da al. a) e desde a liquidação quanto à condenação supra da al. b)”.

Foi agora a Ré que inconformada interpôs recurso de revista. Nesse recurso defende que o despedimento do Autor por extinção do posto de trabalho foi lícito por estarem preenchidos todos os requisitos legais (Conclusão EEEEE) e, subsidiariamente, caso se entenda que o despedimento foi ilícito que a indemnização ao Autor se deveria quedar pelos 15 dias de retribuição base por cada ano de antiguidade ou fração e não ser fixada nos 30 dias, como fez o Acórdão recorrido (Conclusão MMMMM).

Relativamente à alegada licitude do despedimento, a Recorrente começa por sublinhar (Conclusões GG e seguintes) o papel limitado do controlo jurisdicional dos motivos invocados pelo empregador, tratando-se de critérios de gestão empresarial que não podem ser sindicados pelo tribunal e devem por este ser respeitados, sendo que seria, inclusive, inconstitucional a intromissão do juiz na apreciação dos fundamentos que justificaram a decisão de gestão empresarial.

Afirma, seguidamente, que “a extinção do posto de trabalho inicialmente ocupado pelo A./ Recorrido teve por fundamento os factos decorrentes da reestruturação orgânica e funcional operada pela R./Recorrente, na segunda metade de 2016, que implicou a divisão do seu negócio em duas unidades funcionais perfeitamente autónomas entre si: (i) a DHL Express, responsável por assegurar a distribuição de mercadoria por via aérea e (ii) a DHL Parcel, encarregue de garantir a distribuição de encomendas por via terrestre” (Conclusão OO), com a eliminação do posto de trabalho inicialmente ocupado pelo trabalhador.

A Recorrente sublinha que se não procedeu nesse momento a uma extinção do posto de trabalho foi porque quis privilegiar a manutenção da relação laboral (Conclusão RR) e teria sido acordada com o trabalhador uma alteração do objeto contratual (SS).

Na Conclusão RR afirma-se, com efeito, o seguinte:

“Cumpre, ainda, notar que, no decorrer deste processo, aR./Recorrente envidou todos os seus esforços para conservar o vínculo laboral do A./Recorrido, e se não iniciou logo nessa altura um processo formal de extinção do posto de trabalho do A./Recorrido com vista ao seu despedimento, foi por privilegiar uma abordagem que permitisse a manutenção da relação laboral entre as partes, designadamente, aferindo se o A./Recorrido estaria disponível para aceitar uma mudança de funções para um outro posto de trabalho, sem prejuízo da respetiva categoria profissional e estatuto remuneratório”.

É certo que passado um ano recriou o posto de trabalho inicialmente ocupado pelo trabalhador, mas tal nada teria de invulgar (Conclusão WW) e o trabalhador não se candidatou a este posto de trabalho (Conclusão VV).

A este propósito, acrescenta que “não se verificou qualquer necessidade em oferecer ao A./Recorrido o posto de trabalho por si inicialmente ocupado aquando da sua recriação na unidade Express, o que, diga-se de passagem, não corresponde a qualquer obrigação legal da R./Recorrente, na qualidade de empregadora” (Conclusão XX; negrito e sublinhado no original).

Em todo o caso, o trabalhador teria passado ocuparopostodetrabalho de K... (Conclusão AAA) e teria sido esse o posto de trabalho a ser extinto.

Tal extinção teria sido gradual e teria passado por duas fases. Em uma primeira fase a Recorrente decidiu que não se justificava manter na unidade da DHL Parcel uma carteira de grandes clientes (Conclusão BBB), implicando a extinção de funções de K... nessa divisão.

Em uma segunda fase as funções de ... ter-se-iam também praticamente esvaziado (Conclusão GGG), o que resultaria de razões de mercado (Conclusões III e HHH).

O empregador nega que tenha agido com qualquer intenção de esvaziar as funções do trabalhador com o escopo de o despedir e reitera que tal esvaziamento resultou de decisões de gestão que uma empresa é livre de tomar e que não seriam sindicáveis: em bom rigor, “a R./Recorrente limitou-se a implementar e adaptar ao respetivo mercado um conjunto de decisões gestionárias adotadas internacionalmente pelo grupo DHL de que faz parte, as quais implicaram um redesdobramento do seu negócio em duas unidades autónomas: a DHL Parcel e a DHL Express” (Conclusão AAAA).

Defende igualmente que todo este encadear de funções exercidas pelo trabalhador e progressivo esvaziamento das mesmas – ou sua diluição por outros trabalhadores – é, em si mesmo, prova cabal e suficiente de que não existia outro posto de trabalho compatível com a qualificação profissional do trabalhador (Conclusões FFFF e HHHH).

O empregador conclui, assim, que estão “perfeitamente identificados no caso os motivos de mercado e estruturais que justificaram a decisão gestionária de extinguir o posto de trabalho do A./Recorrido, nada tendo o presente processo de abusivo, fraudulento ou discricionário” (Conclusão LLLL; negritos e sublinhado no original), estando em seu entender demonstrada a impossibilidade de subsistência da relação de trabalho (Conclusão MMMM).

Finalmente – “à cautela e por estrito dever de patrocínio” (Conclusão PPPP) – insurge-se contra o montante indemnizatório a que foi condenado e defende que, mesmo que o despedimento venha a ser considerado ilícito, não se justifica o cálculo da indemnização com base nos 30 dias de retribuição base por cada ano de antiguidade ou fração.

Com efeito, não só o empregador teria sempre tentado manter a relação laboral (Conclusão KKKKK), invocando, ainda, que “a doutrina tem reconduzido o grau de ilicitude substancial àqueles despedimentos que são promovidos tendo por base uma ação discriminatória do empregador, nomeadamente quando promovidos por motivos ideológicos, políticos ou religiosos, situação que não poderia estar mais distante daquela verificada nos presentes autos” (Conclusão NNNNN).

O Autor contra-alegou defendendo que, caso o recurso viesse a ser admitido, o mesmo deveria ser julgado improcedente. Nas suas contra-alegações afirmou, designadamente, o seguinte:

“No caso em apreço, a cadeia de decisões do empregador iniciou-se pela colocação do Autor num outro posto de trabalho, alegadamente porque o seu posto de trabalho tinha sido extinto, continuando, sucessivamente, com a retirada das funções compreendidas nesse novo posto de trabalho e entregando-as a outros trabalhadores, ao mesmo tempo que voltava a criar o posto inicial do Autor e a colocar nele um outro trabalhador, e terminou com a extinção desse novo posto de trabalho em que colocara o Autor e o processo de despedimento deste” (Conclusão 14)

E

“Neste encadeamento de decisões, ao não se mostrar justificada a racionalidade da decisão de extinguir o posto de trabalho inicial do Autor, bem como a racionalidade de o voltar a criar e nele colocar um outro trabalhador e não o Autor que possuía a experiência de cerca de sete anos naquele local, a Ré não conseguiu provar que inexistiam postos de trabalho compatíveis com a categoria profissional do Autor, ou seja, não foi possível formular um juízo objetivo de inviabilidade de recolocação do Autor em posto de trabalho alternativo, atento o encadeado de decisões tomadas pela entidade empregadora, as quais diretamente conduziram ao despedimento daquele. Acresce que, de igual modo, não se mostra justificada a racionalidade da decisão gestionária de retirar funções do novo posto de trabalho do Autor, entregando-as a outros trabalhadores da empresa, esvaziando, desse modo, o conteúdo funcional do posto de trabalho deste”.

Em cumprimento do disposto no artigo 87.º n.º 3 do CPT o Ministério Público emitiu Parecer no sentido da improcedência do recurso.

2. Fundamentação

De Facto

Foi a seguinte a matéria dada como provada nas instâncias:

1. Em 15/04/2019, a R. comunicou ao A. a necessidade e a intenção de extinguir o respetivo posto de trabalho de K... (“K...”), nos termos do artigo 369.º do Código do Trabalho (“CT”) (Cfr. documento n.º 1).

2. A referida comunicação inicial foi entregue em mão ao ora A. por BB, ..., na referida data – i.e., 15/04/2019 (Idem, documento n.º 1),

3. E, nesse mesmo dia, foi remetida cópia ao A. dessa comunicação por correio registado com aviso de receção, que chegou ao conhecimento do ora A. em 16/04/2019 (Cfr. documento n.º 2).

4. Inexistindo uma Comissão de Trabalhadores, uma Comissão Intersindical ou uma Comissão Sindical, não foi enviada cópia da comunicação inicial a tais entidades.

5. Não sendo o ora A. representante sindical, também não foi enviada cópia da comunicação inicial a qualquer Associação Sindical.

6. Em 14/05/2019, a R. emitiu a decisão final de despedimento, nos termos do n.º 1 do artigo 371.º do CT, conforme documento 4 junto com a contestação, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais (alterado pelo Tribunal da Relação).

7. A referida decisão final foi entregue por mão própria ao ora A., (Idem, documento n.º 3), que nessa mesma data tomou conhecimento.

8. Na mesma data, a R. enviou à ACT, por carta registada com aviso de receção, cópia da decisão final remetida ao A., em cumprimento do n.º 3 do artigo 371.º do CT (Cfr. documentos n.º 4, 5 e 6).

9. Na decisão final remetida ao A. foi referido pela R. que esta produziria os seus efeitos em 28/07/2019, respeitando o período de prévio aviso legal aplicável ao A. de 75 (setenta e cinco) dias.

10. Foram liquidadas a favor do A. as quantias a seguir discriminadas, após dedução dos devidos descontos legais (Cfr. documento n.º 7 e 8):

i) Vencimento base (28 dias): €2.380,00 (dois mil trezentos e oitenta euros);

ii) Diuturnidades: €81,20 (oitenta e um euros e vinte cêntimos);

iii) Formação profissional não ministrada: €600,30 (seiscentos euros e trinta cêntimos);

iv) Subsídio de férias: €2.637,00 (dois mil seiscentos e trinta e sete euros);

v) Proporcionais de subsídio de férias: €1.509,95 (mil quinhentos e nove euros e noventa e cinco cêntimos);

vi) Proporcionais de retribuição de férias: €1.509,95 (mil quinhentos e nove euros e noventa e cinco cêntimos);

vii) Proporcionais de subsídio de Natal: €1.509,95 (mil quinhentos e nove euros e noventa e cinco cêntimos);

viii) Compensação por cessação do contrato de trabalho: € 14.680,89 (catorze mil seiscentos e oitenta euros e oitenta e nove cêntimos).

ix) Foram liquidadas a favor do A. a quantia ilíquida de € 24.909,24 (vinte e quatro mil novecentos e nove euros e vinte e quatro cêntimos) – (documento n.º 7).

11. Em 25/07/2019, foram entregues em mão ao A. (i) o recibo final; (ii) o certificado de trabalho; e (iii) a declaração de situação de desemprego (Modelo RP 5044); (Cfr. documento n.º 7 e documentos n.ºs 9 e 10).

12. A R. dedica-se à prestação de serviços de transporte expresso.

13. O Grupo Deutsche Post DHL é composto, designadamente, pelos DHL “Express”; “Parcel”; “...” e “...”.

14. O A. foi admitido pela R. mediante contrato de trabalho celebrado a 22/02/2010, para exercer as funções de Area Field Sales Manager South, tendo a categoria contratual de Chefe de Secção (Cfr. documento n.º 11).

15. Ao A. cabia, então, e no essencial, a supervisão da equipa de Field Sales (comerciais de terreno), desempenhando as referidas funções na área geográfica denominada “Área Sul”, compreendida do Algarve a Leiria.

16. No âmbito do desempenho dessas funções, o A. reportava a CC, ....

17. Em 01/01/2017, a R. procedeu a uma reorganização do seu negócio, com repercussões na divisão dos seus serviços e na orgânica da sua estrutura, que foi oportunamente comunicada ao A., em 29/09/2016 (Cfr. documento n.º 12).

18. A R. autonomizou o negócio Express, essencialmente constituído por Express - UN (unidade de negócio), que passou a focar-se na disponibilização de soluções de distribuição premium – rede aérea – ; do negócio Parcel – UN (unidade de negócio) do Grupo Deutsche Post DHL, criado para especialização em soluções de distribuição economy – rede terrestre –, nos mercados B2B (i.e., “...”) e B2C (i.e., “...”).

19. A R. divide-se, desde então e até à presente data, nas seguintes duas divisões: i) a divisão Express (“DHL Express”) e ii) a divisão Parcel (“DHL Parcel”), que se dedicam às atividades expresso acima referidas.

20. A R. encontra-se, inclusivamente, a analisar a possibilidade de constituir uma sociedade comercial autónoma para a prossecução desse objeto social distinto por parte da sua divisão “DHL Parcel”.

21. Com a referida autonomização dos negócios em 01/01/2017, deixou de existir na divisão “DHL Express” o posto de trabalho ocupado pelo ora A., uma vez que, atenta a dimensão do negócio, a R. optou por extinguir nessa altura a supervisão por áreas geográficas.

22. Não foi criado na divisão “DHL Parcel” um posto de trabalho idêntico ao que até então o A. ocupava, uma vez que a “DHL Parcel” ficou com cerca de 1/3 da estrutura da equipa de vendas total do negócio Express, o que correspondia a 4 (quatro) comerciais de terreno e 2 (dois) comerciais por telefone, todos a reportar diretamente ao ..., DD.

23. Tendo em vista a manutenção do seu vínculo laboral, em lugar de proceder, então, a uma extinção do posto de trabalho, foram atribuídas ao A. novas funções: concretamente, de “K...” na divisão “DHL Parcel”, mantendo o A. a mesma categoria profissional de Chefe de Vendas e as mesmas condições salariais e tendo o A. passado a reportar ao já referido DD, ....

24. O A. foi convidado e aceitou integrar um novo projeto na “DHL Parcel”, ambicioso e desafiante, no qual teve um papel preponderante na implementação com sucesso de novos produtos (alterado pelo Tribunal da Relação).

25. No âmbito desse novo posto de trabalho que passou a ocupar, ao A. cabia, por um lado, e enquanto K... (“K...”), o desenvolvimento de uma carteira de grandes clientes (“key accounts”) e, por outro lado, enquanto ... (“...”), dar suporte na resolução de temas relativos ao desenvolvimento de negócio de Clientes Top (grandes clientes) da sua conta e de carteiras transversais a outros Departamentos, tais como de Operações, Apoio ao Cliente (“Customer Service”), e Informática.

26. No seu recibo de vencimento no canto superior esquerdo, consta a sigla “DHL” (em caixa alta) e “DHL Parcel” (em destaque inferior) e n.º de contribuinte .... (Cfr. fls. n.º 279).

27. Decorrido um ano sobre a separação do negócio, a R. fez uma avaliação da divisão e da reorganização do seu negócio, bem como das estruturas e postos de trabalho afetos a cada uma das divisões.

28. Tendo constatado que não se encontravam reunidos os critérios para manter na “DHL Parcel” uma carteira de key accounts em Portugal, quer pelo número diminuto de clientes (5 [cinco] clientes), quer pela respetiva dimensão (com um orçamento anual de € 328.682,00 em 2017).

29. A “DHL Parcel” extinguiu, por essa razão, em janeiro de 2018, a referida carteira de grandes clientes, tendo os clientes que já existiam sido integrados nas carteiras dos comerciais das respetivas zonas geográficas.

30. O A. deixou de ter funções de K..., e passou a estar exclusivamente concentrado nas suas funções de ... e de desenvolvimento de negócio, designadamente, na análise e implementação de soluções não standard ou incidências de Serviço em clientes, sendo estes despoletados pelas vendas ou não; em conjunto com os outros Departamentos tais como, Operações, IT (“Tecnologias de Informação”), CS (“Customer Service”) e FIN (“Financeiro”).

31. Aquando da autonomização do negócio Parcel, em 01/01/2017, as funções de ... ocupavam metade do tempo do A., uma vez que então se lançaram vários produtos novos, entre eles o B2C (“...”) a nível ibérico, e exista muito trabalho de implementação, não só no Departamento de Vendas, mas também nos Departamentos de Customer Service e de Informática.

32. Eliminado pelo Tribunal da Relação.

33. Após analisar a sua estrutura e necessidades de negócio, a “DHL Parcel” verificou que também as funções de ... estavam totalmente esvaziadas, uma vez que, decorridos 2 (dois) anos desde a autonomização do negócio da “DHL Parcel”, os produtos comercializados já se encontram plenamente implementados, não havendo novos produtos a implementar, e sendo as atualizações de características e de destinos geridos a nível Ibérico

34. Desde janeiro de 2018 e até sensivelmente 31-12-2018, o Autor exerceu funções de ..., a que acresceram, em virtude do esvaziamento dessas funções, entre janeiro de 2018 e 9 de outubro de 2018, funções de suporte ao Departamento de Marketing, fazendo a ponte entre a equipa ibérica de produto e as operações e comunicações locais, composta por 3 (três) pessoas sitas em ..., ... (alterado pelo Tribunal da Relação).

35. Tal ocorreu porque as colegas EE, 2º Oficial (“...”) e FF, Promotora de vendas de 1ª (“...”), se encontravam ausentes no gozo das respetivas licenças de parentalidade, tendo o Autor, transitoriamente, apoiado na consolidação das referidas funções de ... (alterado pelo Tribunal da Relação).

36. As referidas colegas voltaram ao serviço, tendo o A. terminado a sua substituição nas tarefas que aquelas desempenhavam.

37. Deixaram de existir as funções de ... nas estruturas da DHL Parcel Portugal e da DHL Parcel Ibérica, tendo o Departamento de Vendas passado a assumir os temas de Clientes com os diversos departamentos envolvidos.

38. Eliminado pelo Tribunal da Relação.

39. A divisão “DHL Express” também já extinguiu a posição de ... em novembro de 2018, pelas mesmas razões apresentadas.

40. Na R. existem 4 (quatro) trabalhadores com a categoria convencional de Chefe de Secção, a saber:

41. Na divisão “DHL Express”, em concreto, no seu ...”:

i. A Sr.ª GG, que ocupa o posto de trabalho de Area FieldSales Manager North (“FSALES MGR NORTE”);

ii. O Sr. HH, que ocupa o posto de trabalho de Area FieldSales Manager South (“FSALES MGR SUL”); e

iii. O Sr. II, que ocupa o posto de trabalho de ... (“TLSLS MGR”).

42. Na divisão “DHL Parcel”, apenas o A. ocupava o posto de trabalho de K... e ....

43. Eliminado pelo Tribunal da Relação.

44. Os postos de trabalho de FSALES MGR NORTE e FSALES MGR SUL encontram-se dentro do ... e aos trabalhadores que os ocupam compete, nas respetivas zonas geográficas (i.e., Zona Norte, a norte do paralelo acima da cidade de Leiria para o interior; e Zona Sul, abaixo do mesmo) assegurar o cumprimento do orçamento de vendas de serviços DHL Express pela sua equipa de FieldSales, bem como supervisionar a dita equipa de FieldSales (Cfr. documento n.º 13).

45. O posto de trabalho de TLSLS MGR, que se encontra dentro do mesmo ...”, e, em concreto, ao trabalhador que o ocupa, compete, em síntese, assegurar o cumprimento do orçamento de ... com oferta de serviços DHL Express ao mercado, bem como supervisionar a equipa de ... e ... (Ibidem documento n.º 13).

46. O posto de K... da divisão DHL Parcel, dedica-se a desenvolver uma carteira de grandes clientes (“key accounts”), e a dar suporte na resolução de temas relativos ao desenvolvimento de negócio de serviços Parcel para Clientes Top (grandes clientes) da sua conta e de carteiras transversais a outros Departamentos, tais como de Operações, Apoio ao Cliente, e Informática (Cfr. documento n.º 14).

47. Cabia ao A., designada, mas não exclusivamente, no seu âmbito funcional:
Identificar e receber inputs dos diferentes Departamentos, de problemas recorrentes de serviço de Clientes específicos ou comuns a vários Clientes da DHL Parcel:
a) Identificar “root causes”, apurar opções de resolução e implementar as ações acordadas para melhorar o serviço e assegurar a sustentabilidade dos planos de melhoria para evitar a sua recorrência;
b) Propor e controlar a implementação das ações de resolução definidas no comité CFB - Customer First Board;
c) Apoio na implementação de novos Clientes e novos negócios em Clientes Existentes nos produtos B2C ou B2B;
d) Organizar e participar em reuniões de implementação de soluções em Clientes com necessidades especificas em termos de serviço.
e) Apoiar na revisão de conteúdos de Marketing para os Clientes, na perspetiva do negócio;
f) Desenvolver soluções para clientes regionais ou locais, que envolvam SOP (“Service Operations Process”) específicos para a sua implementação, coordenando as necessidades do Clientes com as soluções disponíveis em todos os departamentos envolvidos. (Cfr. documento n.º 15).

48. Eliminado pelo Tribunal da Relação.

49. Antes do início deste processo, a R. favoreceu a abordagem negocial junto do ora A., tendo-lhe proposto a celebração de um acordo de revogação do contrato de trabalho.

50. A HR Coordinator da “DHL Parcel”, BB, propôs ao A., em 01/02/2019 de fevereiro de 2019, o pagamento de uma compensação no montante de €30.000,00 (trinta mil euros) e a cessação do contrato de trabalho no final desse mês de fevereiro.

51. O A. rejeitou tal proposta.

 52. Malograda a via negocial, a Ré dispensou o Autor de comparecer ao serviço desde 07/02/2019 e até à data de cessação, em 28/07/2019 (Cfr. documento n.º 16).

53. A R. foi notificada pela ACT – ... para apresentação de documentos e apuramento de quantias relativas à presente extinção de posto de trabalho (Cfr. documento n.º 21),

54. Respondeu à referida autoridade, em 26/07/2019, remetendo os documentos solicitados (Cfr. documento n.º 22),

55. A ACT informou que: - “O Trabalhador AA não solicitou qualquer pedido de parecer à Autoridade para a s Condições do Trabalho (ACT), nos termos previstos na Lei, pelo que não houve tomada de posição desta Autoridade” e que “em cumprimento da Lei, a empresa DHL Express Portugal comunicou a decisão de despedimento por extinção do posto de trabalho”. (Cfr. fls. n.º 265).

56. O A. não transmitiu à R. qualquer Parecer que contrariasse o despedimento por extinção do posto de trabalho.

57. O Trabalhador AA, recebeu subsídio de desemprego, no valor de 500,00 euros por mês, no período 2019/11/04 a 2020/05/03 e auferiu de retribuições, nos meses de Janeiro a Dezembro de 2020, o montante de 24.156,51 euros. (Cfr. fls. n.º 238 e ref.ª ...80)

58. O Autor auferia a retribuição mensal de base de €2.550,00, acrescida de diuturnidade no montante mensal de €86,20.

De Direito

A questão colocada no presente recurso de revista respeita apenas à licitude ou ilicitude do despedimento por extinção do posto de trabalho do Autor e, caso a resposta seja no sentido da ilicitude do mesmo, as consequências da referida ilicitude.

O primeiro ponto que importa assinalar é o de que o empregador pretendeu extinguir o posto de trabalho do Autor que seria “o posto de trabalho de K... (“K...”)” (facto 1).

Mas seria esse efetivamente o posto de trabalho do Autor?

O conceito de posto de trabalho parece assumir significados diversos dependendo da teleologia das normas que o invocam. Nesta matéria de despedimento por extinção do posto de trabalho está em jogo essencialmente um conjunto de funções – o próprio n.º 2 do artigo 368.º refere-se a postos de trabalho de conteúdo funcional idêntico – embora não se possa, à partida excluir que também interessem outros fatores (como por exemplo, a localização geográfica caso se trate de estabelecimentos espacialmente dispersos, aspeto que, no entanto, não assume relevância no caso dos autos). Normalmente atende-se às funções que o trabalhador exerce no momento em que é despedido – tendo a lei até o cuidado de prever a situação em que ele foi transferido para o posto de trabalho que é extinto recentemente, ou seja, nos três meses anteriores ao início do procedimento para despedimento (n.º 3 do artigo 368.º). Mas o caso vertente coloca um problema que se coloca a montante – haverá que atender às funções que o trabalhador concretamente exerce quando ele tinha, no fim de contas, direito a realizar outras?

O Autor foi contratado, a 22/02/2010, “para exercer as funções de Area Field Sales Manager South, tendo a categoria contratual de Chefe de Secção (Cfr. documento n.º 11)” (facto 14), cabendo-lhe no essencial a supervisão da equipa de comerciais no terreno (facto 15).

A 01/01/2017 a empresa procedeu a uma reorganização da sua atividade passando a existir duas divisões, a DHL Express e a DHL Parcel.

Sublinhe-se que se trata de duas “divisões” dentro da mesma pessoa jurídica, ainda que se contemple a possibilidade de virem a ser pessoas jurídicas distintas (facto 20).

Com a reorganização de 2017 o empregador sustenta que poderia ter feito cessar o contrato de trabalho por ter extinguido o posto de trabalho do Autor (que não existia na DHL Express, nem na DHL Parcel).

A partir de 2017 o trabalhador passou a exercer outras funções que não as de chefe de vendas. Sublinhe-se que a lei permite, em certos casos, a mudança de categoria do trabalhador inclusive para uma categoria inferior (artigo 119.º do CT). Não se deve confundir a tolerância do trabalhador que se encontra numa situação de subordinação jurídica e por vezes psicológica face ao empregador com um acordo tácito. Mas no caso concreto é patente que não houve uma mudança de categoria. Aliás o próprio empregador assume, nas suas alegações que manteve a categoria contratual do trabalhador e tal resulta provado (facto 23).

Ora, e independentemente da extrema profusão de classificações doutrinais sobre categoria, o artigo 118.º n.º 1 do CT estabelece que o trabalhador deve, em princípio, exercer as funções correspondentes à atividade para que foi contratado. Essa atividade era a de chefe de vendas e supervisão das equipas no terreno e não houve, ao contrário do que pretende o empregador, qualquer alteração do objeto contratual, nem se deve interpretar assim a aceitação pelo trabalhador de outras funções, seja no intuito de preservar a sua relação laboral, seja em substituição de Colegas. Em suma, e como já se disse, não está provado qualquer acordo para alterar a categoria do trabalhador que se manteve.

O empregador afirma, nas suas alegações, que é certo que passado um ano recriou o posto de trabalho inicialmente ocupado pelo trabalhador, mas tal nada teria de invulgar (Conclusão WW) e o trabalhador não se candidatou a este posto de trabalho (Conclusão VV), acrescentando que “não se verificou qualquer necessidade em oferecer ao A./Recorrido o posto de trabalho por si inicialmente ocupado aquando da sua recriação na unidade Express, o que, diga-se de passagem, não corresponde a qualquer obrigação legal da R./Recorrente, na qualidade de empregadora” (negritos e sublinhados no original).

Mas não o podemos acompanhar. Tendo-se mantido intocada a categoria do trabalhador não se vê porque é que este teria que se recandidatar para exercer as funções que eram, no fim de contas, aquelas para que tinha sido contratado e a que o empregador tinha, em princípio, o dever de o afetar.

Como a este propósito se pode ler no Acórdão recorrido:
“[E]m data não concretamente apurada, na divisão DHL Express tinham sido novamente criadas as funções de Area FieldSales Manager, quer da zona norte quer da zona sul, cuja extinção levara o Autor a aceitar as funções K... na divisão DHL Parcel. Atente-se que o Autor, em 22-02-2010, foi expressamente contratado para exercer as funções de Area Field Sales Manager South, com a categoria de chefe de seção. Também as pessoas que passaram a exercer essas funções tinham a categoria de chefes de seção, passando a exercer as funções para as quais o Autor tinha sido contratado, ou seja, na zona sul, o Sr. HH, desconhecendo-se em que contexto foi o mesmo colocado nessas funções.
Na realidade, não consta da matéria factual dada como provada, nem consta da decisão de despedimento, quais foram os motivos de gestão que levaram à extinção do posto de trabalho do Autor em janeiro de 2017, nem quais foram as razões de gestão que levaram, posteriormente, em data não concretamente apurada, a criar novamente esse posto de trabalho e estranhamente em não colocar no mesmo o Autor, numa função que exercera durante cerca de sete anos”.
Com efeito se o Autor desempenhava as funções de Area Field Sales Manager South antes da reorganização da empresa em duas divisões, tendo sido contratado para exercer essa atividade tinha direito a regressar à mesma quando ela fosse novamente criada, já que o seu contrato de trabalho nunca cessou. E o que se verifica é que existiam na Ré à data do despedimento do Autor, quatro chefes de secção (um dos quais era o Autor) e um deles exercia precisamente as funções de Area Field Sales Manager South.
Ora sendo certo que não foram as funções de chefia e de supervisão que o Autor tinha direito de exercer porque para elas fora contratado – sem prejuízo de lei permitir, por exemplo, o ius variandi, mas a título temporário – que foram extintas, sendo que tão pouco foi explicado qual o critério de seleção do Autor entre os quatro chefes de secção existentes (artigo 368.º, n.º 2 do CT) há que concluir pela ilicitude do despedimento por extinção do posto de trabalho.

 

O Acórdão recorrido acrescenta, na sua fundamentação, o seguinte:
“No caso em apreço, a cadeia de decisões do empregador iniciou-se pela colocação do Autor num outro posto de trabalho, alegadamente porque o seu posto de trabalho tinha sido extinto, continuando, sucessivamente, com a retirada das funções compreendidas nesse novo posto de trabalho e entregando-as a outros trabalhadores, ao mesmo tempo que voltava a criar o posto inicial do Autor e a colocar nele um outro trabalhador, e terminou com a extinção desse novo posto de trabalho em que colocara o Autor e o processo de despedimento deste. Neste encadeamento de decisões, ao não se mostrar justificada a racionalidade da decisão de extinguir o posto de trabalho inicial do Autor, bem como a racionalidade de o voltar a criar e nele colocar um outro trabalhador e não o Autor que possuía a experiência de cerca de sete anos naquele local, a Ré não conseguiu provar que inexistiam postos de trabalho compatíveis com a categoria profissional do Autor, ou seja, não foi possível formular um juízo objetivo de inviabilidade de recolocação do Autor em posto de trabalho alternativo, atento o encadeado de decisões tomadas pela entidade empregadora, as quais diretamente conduziram ao despedimento daquele. Acresce que, de igual modo, não se mostra justificada a racionalidade da decisão gestionária de retirar funções do novo posto de trabalho do Autor, entregando-as a outros trabalhadores da empresa, esvaziando, desse modo, o conteúdo funcional do posto de trabalho deste.

É, assim, evidente que não conseguiu a Ré demonstrar o preenchimento do requisito previsto no art. 368.º, n.º 1, al. b) e n.º 4, do Código do Trabalho, competindo-lhe a ela tal prova, sendo, desse modo, ilícito o despedimento do Autor”.

Também quanto a este aspeto se adere à fundamentação do Acórdão recorrido. Com efeito, a atribuição de outras funções, não correspondentes à categoria do trabalhador, que depois foram esvaziadas sucessivamente, não é, em si mesma, e como pretende o empregador, uma demonstração da impossibilidade de manter a relação laboral. Tal impossibilidade deve, de resto, aferir-se tendo em conta a empresa independentemente das “divisões” nela existentes, que não são pessoas jurídicas autónomas.

Sublinhe-se, ainda, que não descortinamos qualquer inconstitucionalidade nesta sede. A Constituição consagra o direito à propriedade privada e à liberdade de iniciativa económica, mas também contém uma proibição de despedimentos sem justa causa, o que implica a necessidade para o legislador ordinário de encontrar uma solução de compromisso entre princípios e valores tendencialmente conflituantes. Assim, o empregador tem a liberdade de efetuar a reorganização que muito bem entenda, criar as “divisões” no seio da empresa que considere mais adequadas e eficientes e extinguir, em consequência, postos de trabalho. Todavia tem de agir com transparência, indicando os motivos objetivos da sua conduta, respeitando os critérios legais de seleção dos trabalhadores abrangidos por um despedimento por extinção do posto de trabalho e demonstrar a cessação do contrato de trabalho é necessária pela impossibilidade de manutenção da relação laboral.

Sendo, pois, ilícito despedimento por extinção do posto de trabalho resta apreciar o último pedido do Recorrente que defende que seria, em todo o caso, mais adequada uma indemnização que se quedasse pelos 15 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano de antiguidade ou fração.

O artigo 391.º n.º 1 do CT estabelece que o montante da indemnização substitutiva da reintegração (e o trabalhador optou por esta indemnização) deve ser fixado pelo Tribunal entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano de antiguidade ou fração, atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude decorrente da ordenação estabelecida no artigo 381.º

O Acórdão recorrido considerou que a retribuição base e diuturnidades do trabalhador (facto 58) correspondiam a um valor relativamente elevado no quadro nacional e muito superior ao salário mínimo, mas por outro lado, considerou elevado o grau de ilicitude da conduta do empregador, dizendo, a este respeito, o seguinte:

“[R]evela-se este [grau de ilicitude] bastante significativo, visto que a mesma adotou diversos comportamentos gestionários que não se mostram fundamentados em termos de uma gestão racional, tendo tais comportamentos aparentado ser seu único objetivo o culminar no despedimento do Autor, pelo que se revela adequado que se aponte para uma indemnização acima do seu ponto médio”.

Antes de mais, observe-se que, mesmo que se considere superior, em princípio, o grau de ilicitude de um despedimento “devido a motivos políticos, ideológicos, étnicos ou religiosos, ainda que com invocação de motivo diverso” (alínea a) do artigo 381.º do CT), não foi atingido neste caso o valor máximo de 45 dias, ficando a indemnização pelos 30 dias por cada ano de antiguidade ou fração.

E o comportamento do empregador, independentemente de aparentar ter tido ou não como único objetivo despedir o trabalhador (o que não se nos afigura demonstrado), representou, ainda assim, uma violação grave e reiterada dos direitos deste e um comportamento patentemente contrário à boa fé que deve inspirar as partes na execução do contrato de trabalho.

Mantém-se, assim, a decisão do Acórdão recorrido quanto ao valor da indemnização substitutiva da reintegração.

3. Decisão: Negada a revista, confirmando-se o Acórdão recorrido

Custas pelo Recorrente

Lisboa, 12 de outubro de 2022

Júlio Gomes (Relator)

Francisco Marcolino

Ramalho Pinto