Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 7.ª SECÇÃO | ||
Relator: | NUNO PINTO OLIVEIRA | ||
Descritores: | PROPRIEDADE INDUSTRIAL REGISTO DE MARCA CONFUSÃO DENOMINAÇÃO DE ORIGEM NULIDADE DE ACÓRDÃO OMISSÃO DE PRONÚNCIA | ||
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Data do Acordão: | 07/06/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA (PROPRIEDADE INTELECTUAL) | ||
Decisão: | NEGADA | ||
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Sumário : | Não estando provada nenhuma sugestão de que os produtos sejam originários de alguma região abrangida por determinada indicação geográfica ou de que, através de tais produtos, se tente tirar partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio de determinada denominação de origem, não há infracção das regras sobre indicações geográficas do art. 13.º, n.º 1, do Regulamento (UE) n.º 1151/2012 e/ou do art. 306.º, n.ºs 1 e 4, do Código da Propriedade Industrial. | ||
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Decisão Texto Integral: | ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. — RELATÓRIO 1. APOMA — Associação de Produtores de Ovos Moles de Aveiro instaurou acção declarativa de condenação contra Calé — Indústria e Comércio, Lda., e AA, pedindo que os Réus sejam condenados a: 1) Cessar de imediato o fabrico, comercialização, publicitação ou qualquer outra forma de utilização do doce Sardinhas de Peniche ou Sardinhas Doces de Peniche; 2) Cessar de imediato o fabrico, comercialização, publicitação ou qualquer outra forma de utilização do doce Carapaus Doces da Nazaré; 3) Abster-se de fabricar, comercializar, publicitar ou qualquer outra forma de utilização ou qualquer doce que apresente uma apresentação e/ou formato similar às figuras de hóstia dos Ovos Moles de Aveiro; 4) Providenciar a remoção das Sardinhas de Peniche ou Sardinhas Doces de Peniche de outros eventuais estabelecimentos onde os mesmos se encontrem à venda; 5) Providenciar a remoção dos Carapaus Doces da Nazaré de outros eventuais estabelecimentos onde os mesmos se encontrem à venda; 6) Remover todo e qualquer publicidade a este produto, quer física, quer on-line, inclusive, no estabelecimento dos RR. (na parte exterior ou interior), na página do Facebook da pastelaria e outras redes sociais; 7) A pagar solidariamente à A. uma indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais invocados, os quais pela sua dimensão, gravidade e continuação da actividade dos RR. não podem todavia ser por ora determinados e liquidados, remetendo-se assim a sua liquidação para momento oportuno em sede de execução de sentença; 8) A pagar à A. montante correspondente ao valor que os RR. enriqueceram com a venda dos doces Sardinhas de Peniche e Carapaus da Nazaré, a título de enriquecimento sem causa, nos termos do artigo 479° do C.C, que não podem todavia ser por ora determinados e liquidados, remetendo-se assim a sua liquidação para momento oportuno ou em sede de liquidação de sentença; 9) [A] pagar, a título de sanção pecuniária compulsória, nos termos do n.° 4 do art.° 338.°-! do Código de Propriedade Industrial, a quantia de 1000,00 (mil euros), por cada dia de atraso no cumprimento da sentença que vier a ser proferida; 10) A publicação da decisão em jornal de grande circulação nacional, nos termos do artigo 350° do CPI; 11) A apensação aos presentes autos do procedimento cautelar que correu no ... Juízo deste tribunal sob o n° 333/18....; 12) Ordenar a remoção do vídeo junto como DOC. 21 no R.l à CM TV. 2. Os Réus contestaram, defendendo-se por impugnação e por excepção, e requereram a condenação da Autora como litigante de má fé. 3. Em despacho saneador, foi julgada procedente a excepção de ilegitimidade processual do Réu AA. 4. O Tribunal de 1.º instância julgou a acção improcedente e absolveu a Ré Calé — Indústria e Comércio, Lda., do pedido. 5. Inconformada, a Autora APOMA — Associação de Produtores de Ovos Moles de Aveiro interpôs recurso de apelação. 6. O Tribunal da Relação confirmou, por unanimidade, a decisão proferida pelo Tribunal de 1.º instância. 7. Inconformada, a Autora APOMA — Associação de Produtores de Ovos Moles de Aveiro interpõs recurso de revista. 8. Finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões: I. O presente recurso reveste a natureza de recurso de revista excepcional, devendo o mesmo ser admitido e apreciado porquanto se encontram verificados os pressupostos previstos na al. a) e b) do art.º 672 do CPC, designadamente: por estar em causa resolver uma dúvida sobre a aplicação do direito cuja dilucidação pelo Supremo Tribunal de Justiça, pela sua relevância jurídica, ineditismo e novidade é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito; Em segundo lugar, por estarem em causa interesses de particular relevância social; II. A questão que se discute nos autos é complexa e inédita no nosso ordenamento jurídico português no que respeita ao domínio das Indicações Geográficas Protegidas, pois não está em causa o nome geográfico dos Ovos Moles de Aveiro IGP mas sim o seu formato exterior da apresentação tradicional das formas de hóstia com motivos marítimos; III. As IGPs e DOPs têm um regime próprio previsto no Código de Propriedade Industrial (doravante designado abreviadamente de “CPI”), que se diferencia claramente das marcas, sobretudo a nível do seu âmbito de proteção. Tal ocorre porque a sua função principal é garantir a qualidade dos produtos e evitar a sua degenerescência; IV. No que respeita em específico aos produtos alimentares, como os doces tradicionais objeto dos autos, aplica-se, além do 306.º do CPI, o Regulamento da U.E. n.º 1151/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho de 21 de novembro de 2012 relativo aos regimes de qualidade dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios; V. O acórdão recorrido concluiu que não existiu imitação das marcas figurativas de certificação, concluindo, consequentemente, que não existiria “sugestão” aos Ovos Moles de Aveiro nos termos previstos nas alíneas a) do 306.º do CPI, aplicando e interpretando indevidamente este preceito como se tratasse “da imitação” de uma marca, assente no pressuposto da confundibilidade; VI. A questão relevante consiste em saber: se o âmbito de proteção dos produtos (sejam eles alimentares ou não) protegidos por IGP ou DOP, abrangem a apresentação visual dos mesmos, designadamente, para efeitos de sugestão, mesmo que, em alguns usos possa não existir confusão quanto à origem geográfica dos produtos. Ou seja, se o termo “SUGIRA” previsto no art.º 306.º, al. a) pode resultar do formato tridimensional do produto protegido por DOP ou IGP e se a mesma pode ocorrer quando a verdadeira origem dos produtos seja mencionada e ainda que não exista risco de confusão; VII.A questão formulada tem, assim, uma enorme relevância jurídica, mas também relevância e repercussão social visto o impacto que tem na actividade desenvolvida pelos produtores de produtos tradicionais e regionais, protegidos por IGPs cuja aparência seja fundamental, como será o caso (além do caso dos autos) da grande maioria das IGPs de produtos artesanais (como são exemplos os Lenços de Namorados de Viana IGP e Camisola Poveira – Póvoa de Varzim IGP, onde a parte visual ou estética dos produtos impera; VIII. A interpretação e aplicação do art.º 306, al. a) e do art.º 13, al. b) do Regulamento e consequente análise do mesmo com os critérios do regime das marcas, como o fez o Tribunal Recorrido esvaziará em grande parte a utilidade do regime das IGPs de produtos artesanais ao ser conivente com a criação de produtos similares desde que a denominação geográfica sob o qual o produto é usado afaste a confusão com o local protegido pela IGP; IX. A permissão de um produto como as Sardinhas de Peniche e Carapaus da Nazaré não só afectam os produtores de Ovos Moles de Aveiro, os comerciantes dos mesmos, mas prejudica através da sua vulgarização e evocação os próprios Ovos moles de Aveiro, um produto tradicional português de renome, de que qualquer cidadão português tem orgulho. Consequentemente, lesa o património cultural e gastronómico nacional; X. Verificou-se uma total omissão de pronúncia à luz do art.º 615.º, al. d), ex vi do art.º 663.º, n.º 2 do CPC, considerando que o Tribunal Recorrido não se pronunciou sobre uma questão absolutamente fundamental da acção e recurso – a figura jurídica da evocação prevista na al. b) do art.º 13 do Regulamento da U.E. n.º 1151/2021, que se tornou no âmbito do direito da União Europeia e nos acórdãos do TJUE, um critério essencial na apreciação na tutela concedida às DOPs/IGPs; XI. Ocorreu um erro na apreciação feita pelo TRL relativamente à violação do art.º 13.º do Regulamento citada ao entender que os produtos em causa não são “comparáveis” quando se está claramente perante produtos idênticos – doces; XII. O segundo erro consistiu no facto de o Tribunal a Quo ter partido da “análise feita sobre a possibilidade de imitação” de marcas para concluir que não há violação do art.º 13.º, al. a), b) e c) do Regulamento e do art.º 306.º, al. a) do CPI, preceitos que regulam apenas e somente as DOPs e IGPs; XIII. Impunha-se que o tribunal analisasse a existência de evocação da IGP, prevista na al. b) do art.º 13.º do Regulamento referido, sendo que existe já jurisprudência uniforme da U.E. que esclarece que pode existir evocação sem que haja qualquer risco de confusão; XIV. Existiria sempre evocação da IGP dos Ovos Moles de Aveiro devido: às elevadas semelhanças visuais, face à coincidência de serem doces, também revestido em hóstia, com um formato 3D de um peixe, recheio alaranjado, com o rebordo ou recorte de 3 a 5 mm; devido ao facto de serem apresentados como produtos regionais; à força distintiva e notoriedade que têm as figuras de hóstia 3D de motivo marítimo dos Ovos Moles de Aveiro e ainda à coincidência de todo o modo de produção, utilizando as folhas de hóstia, os ferros, as prensas, a forma como são depois enchidos, prensados e recortados; XV. O tribunal recorrido faz uma interpretação e aplicação errada do art.º 238 do CPI, ao comparar as caixas e as marcas Sardinhas de Peniche, Carapaus da Nazaré e com a dos Ovos Moles de Aveiro, em vez dos produtos em si e, em segundo lugar, ao desconsiderar a comercialização a avulso e fora da caixa que pode ser feita dos doces, como acontece a qualquer doce (seja regional ou não) quando são revendidos para pastelarias fora do local de origem (ex: pastelarias para turistas em Lisboa), onde as Sardinhas Doces poderão surgir em bandejas, sem caixas e qualquer outra identificação, ao lado de Pastéis de Tentúgal ou revendidos para restaurantes, onde são servidos individualmente; XVI. Face às elevadas semelhanças entre as marcas 3D de certificação da Recorrente e os doces Sardinhas de Peniche e identidade de produtos, resulta uma inevitável confusão, agravada pela notoriedade e reputação das marcas da Recorrente, pelo que tais doces constituem efectivamente imitação ao abrigo do art.º 238.º do CPI; XVII.Assim, o acórdão recorrido enferma do vício de erro na interpretação e aplicação das normas jurídicas constantes do disposto no art.º 238.º do CPI e na desconsideração dos critérios e princípios comummente adoptados em matéria de direito marcário pela doutrina e jurisprudência: a relevância da impressão global e desconsideração das diferenças insignificantes; os factores agravantes da notoriedade e prestígio dos Ovos Moles de Aveiro (nos formatos de hóstia típicos); o facto de serem produtos do mesmo género e apresentados como doces regionais; XVIII. O acórdão recorrido fez ainda uma interpretação e aplicação incorrecta do art.º 306, n.º 4 do CPI, pois os produtos em análise fazem um uso indirecto da IGP e a sua coexistência no mercado prejudicam os Ovos Moles de Aveiro IGP ao provocar a sua vulgarização e diluição da distintividade das suas figuras em hóstia e consequentemente geram a perda de valor e prestígio dos mesmos. 9. A Ré Calé — Indústria e Comércio, Lda., contra-alegou, pugnando pela inadmissibilidade e, subsidiariamente, pela improcedência do recurso. 10. Finalizou a sua contra-alegação com as seguintes conclusões: 1. Carece a Recorrente de razão nas alegações por ela apresentadas no presente recurso de revista excecional. 2. Entende a Recorrida não ser merecedora de qualquer reparo a Douta Decisão proferida pelo Tribunal a quo, a qual entende a Recorrida ser justa, adequada e legalmente fundamentada, tendo mantido, sem voto de vencido, a já Douta Sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância. DA INADMISSIBILIDADE DO RECURSO DE REVISTA EXCECIONAL: 3. Ora, no âmbito da presente ação declarativa de condenação, o Tribunal de 1.ª instância julgou, e bem, no nosso entendimento, a ação improcedente e não provada, absolvendo a Ré, ora Recorrida, do pedido. 4. Inconformada com esta decisão, dela veio recorrer a Autora, aqui Recorrente, através da interposição do respetivo Recurso de Apelação, sendo que o Tribunal da Relação de Lisboa, mediante Douto Acórdão proferido em 21/12/2022, julgou improcedente a referida apelação e, em consequência, negou provimento ao recurso e confirmou, sem voto de vencido, a sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª instância. 5. Com efeito, estamos perante uma dupla conformidade decisória, a qual, nos termos do n.º 3 do art. 671.º do Código de Processo Civil (doravante designado com a sigla CPC), obsta à admissibilidade do recurso de revista normal e à reapreciação e conhecimento do objeto do Acórdão da Relação. 6. Em face do exposto, a Autora fundamentou a interposição do recurso de revista excecional com base nos requisitos das alíneas a) e b) do n.º 1 do art. 672.º do CPC. 7. Porém, ao contrário do que alega a Recorrente, e no que concerne à alínea a), a verdade é que o invocado preceito legal não tem qualquer aplicabilidade ao caso ora em apreço pois não estamos aqui perante uma dúvida sobre a aplicação do direito cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, 8. assim como, no que concerne à alínea b), não se verifica estarem em causainteresses de particular relevância social, isto é, interesses importantes da comunidade e valores que se sobrepõem ao mero interesse das partes, ou seja, com invulgar impacto para o tecido social e para a comunidade, em geral. 9. A nosso ver, este recurso não poderá ser admitido, uma vez que carece de fundamentação idónea que justifique a verificação de qualquer um dos dois requisitos invocados pela Recorrente para atestar a excecional viabilidade da interposição do recurso de revista, nos presentes autos. 10. Deste modo, a revista excecional é, como o seu próprio nome indica, excecional, sendo que, a reforma dos recursos em processo civil, realizada pelo DL n.º 303/2007, de 24 de agosto, procurou, como se lê no seu preâmbulo, a «…racionalização do acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, acentuando-se as suas funções de orientação e uniformização da jurisprudência», pelo que não se deve vulgarizar ou banalizar o acesso ao recurso de revista. 11. Nesse sentido, as alíneas a) e b) do n.º 2 do art. 672.º do CPC impõem ao Recorrente o cumprimento do ónus de indicar as razões da relevância em causa, jurídica ou social, isto é, as razões pelas quais a apreciação da questão, pela sua relevância, é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, assim como indicar as razões pelas quais os interesses em causa têm particular relevância social, respetivamente, cuja não observância acarreta a rejeição do recurso. 12. No que concerne ao fundamento da alínea a) do n.º 1 do art. 672.º do CPC, invocada pela Recorrente como fundamento do presente recurso de revista excecional, são subsumíveis situações em que a questão jurídica suscitada apresente um caráter paradigmático e exemplar, transponível para outras situações, assumindo relevância noutras questões e situações, para além daquela em que se encontram as partes envolvidas. 13. No que concerne ao fundamento da alínea b) do n.º 1 do art. 672.º do CPC, estão em causa interesses de particular relevo social, que naturalmente se sobrepõem ao mero interesse da parte da admissibilidade do terceiro grau de jurisdição. 14. Isto posto, estamos perante duas situações que dão ao Supremo Tribunal de Justiça uma vasta margem decisória, na medida em que o legislador utiliza cláusulas gerais, recorrendo a conceitos indeterminados, cuja verificação deve ser feita na apreciação preliminar referida no n.º 3 do art. 672º do C.P.C., cumprindo ao Tribunal de revista formular um juízo de valor sobre o relevo jurídico e sobre o relevo social existente. 15. Ora, da leitura das conclusões do recurso de revista excecional interposto e ao qual se responde, e apesar de haver menção à alegada “questão relevante”, a alegação das razões justificativas da pretensão da Recorrente, não é, no nosso entendimento, impactante o suficiente para desencadear uma clara necessidade de apreciação pelo Supremo Tribunal de Justiça, mediante o recurso de revista excecional, incumprindo a Recorrente o ónus de alegação da exposição concreta, sob pena de rejeição, das razões pelas quais os interesses em causa são de particular relevo jurídico, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do art. 672.º do CPC. 16. Saliente-se que, o discurso da aqui Recorrente tem vindo a ser alterado, substancialmente, com o decurso da pendência judicial, isto é, desde a instauração do procedimento cautelar até ao momento, sendo que, aquando da interposição do recurso de revista excecional, a aqui Recorrente atribui, pela primeira vez, relevância extrema ao termo «SUGIRA» e admite que essa sugestão, alegada ou pretensamente ilícita, possa resultar apenas do formato tridimensional dos produtos alimentares, aqui em apreço, 17. mesmo quando não exista risco de confusão e mesmo quando a verdadeira origem dos produtos seja mencionada, o que aliás já admite. 18. Saliente-se que, a Autora, aqui Recorrente, já na petição inicial, começou a disparar para todos os lados, e após ter disparado para a imitação, para a evocação que, conforme já referimos, não existem, e disparou ainda para a responsabilização da Recorrida, sem sequer invocar qualquer dano, e para o enriquecimento sem causa, e agora decidiu, por último, disparar para a interpretação do termo «sugestão» e a sua aplicabilidade ao caso concreto… 19. Com efeito, e de modo a tentar, residual e desesperadamente, privilegiar os seus interesses, a Recorrente decidiu, agora, alterar a sua estratégia processual, de modo absolutamente extemporâneo, uma vez que, no momento processual próprio, nunca foi alegada pela Recorrente esta inédita estratégia, interpretação ou subsunção jurídica dos factos, sem qualquer cabimento factual ou legal, no nosso entendimento, desde logo porque ao Supremo Tribunal de Justiça, enquanto Tribunal de Revista, apenas cabe reapreciar juridicamente as decisões proferidas pelas duas instâncias imediatamente inferiores. 20. Assim sendo, de momento, e de acordo com a mais recente visão da Recorrente, expressa em sede de recurso de revista excecional, não existe risco de confusão entre os Ovos Moles de Aveiro e as Sardinhas Doces de Peniche e os Carapaus da Nazaré, sendo a verdadeira origem dos produtos em causa mencionada, apenas existindo, de acordo com a Recorrente, «sugestão» quanto à apresentação visual dos mesmos, designadamente quanto ao formato tridimensional do produto protegido por DOP ou IGP, que a mesma pretende seja, agora, apreciada pelo Supremo Tribunal de Justiça, mas em relação ao que jamais requereu anterior apreciação, em momento próprio, pelo Tribunal de 1ª Instância. 21. Saliente-se ainda que, e ao contrário do que vem vertido na pág. 12 das alegações de recurso da Recorrente, dizer que os Ovos Moles de Aveiro só têm motivos marítimos é totalmente falso, porquanto conforme, aliás, consta do caderno de especificações existem muitas outras figuras de Ovos Moles de Aveiro, constantes do caderno de especificações, para além dos motivos marítimos, designadamente frutos secos, barrica, bóia e castanha. 22. Do mesmo modo, quem invoca a alínea b) do n.º 1 do supramencionado artigo, terá de expor, sob pena de rejeição, as razões concretas pelas quais os interesses em causa são de particular relevância social, ónus que a nosso ver também não foi cumprido, já que o acórdão recorrido, obviamente, não causa qualquer alarme social e não põe, de todo, em causa a confiança da comunidade na realização da justiça pelos Tribunais nacionais. 23. Parece-nos, SEM DÚVIDA, um exagero o número IX das Conclusões das Alegações da Recorrente, quando a Recorrente afirma que o douto acórdão leva a uma lesão do “património cultural e gastronómico nacional”. 24. E mais ainda, quando a Recorrente decide lançar mão do exemplo da Camisola Poveira, e de todas as repercussões resultantes da reprodução da mesma (que nada tem que ver com o caso em apreço), para justificar o interesse coletivo e o alarme social que necessitava de expor para cumprir, in casu, o ónus legalmente exigível pela alínea b) do nº 1 do art. 672º do CPC. 25. Com efeito, a Recorrente serve-se do recurso de revista excecional porque não concorda, uma vez mais, com a decisão proferida, nos presentes autos e no âmbito do recurso de apelação interposto, limitando-se a afastar-se da interpretação e da aplicação das regras de direito levadas a cabo pela Relação e pelo Tribunal de 1.ª instância, quanto aos factos considerados como provados, não argumentando, todavia, no sentido de preenchimento dos conceitos indeterminados de “relevância jurídica” e “relevância social” e não conseguindo subsumir a situação às hipóteses suprarreferidas, conforme lhe era exigível. 26. Não se vislumbra, pois, uma argumentação sólida e convincente, da Recorrente, a este respeito, pelo que se conclui pelo não cumprimento pela Recorrente do ónus a que aludem as alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 672.º do CPC, quanto à admissibilidade do recurso de revista excecional. 27. Posto isto, é manifesto o não preenchimento dos pressupostos para a admissibilidade do recurso de revista excecional interposto pela aqui Recorente. 28. EM FACE DO EXPOSTO, atenta a inadmissibilidade, do presente recurso excecional de revista, deverá o mesmo ser rejeitado, com todas as consequências legais daí decorrentes. NÃO PROCENDENDO, MAS SEM PRESCINDIR, DA INTRODUÇÃO E ENQUADRAMENTO BREVE DO CASO: 29. Antes do mais, a aqui Recorrente pretendeu convencer o Tribunal de que a Ré havia pretendido confundir o Tribunal com a cor das Sardinhas de Peniche e dos Carapaus Doces da Nazaré, o que, obviamente, não é verdade. 30. Saliente-se que, no nosso modesto entendimento e salvo o devido respeito, a embalagem da Sardinha Doce de Peniche devia ter sido junta no âmbito do procedimento cautelar e só não o foi porquanto o mandatário da Ré, aqui Recorrida, à data, entendeu que não a deveria juntar, assim como entendeu que não deveria abordar uma série de questões relevantes, no nosso entendimento, em sede de defesa, para a apreciação da verdade material relativa à questão em apreço, razão pela qual, em face disso, vimos ser proferida a sentença de decretamento da providência cautelar requerida, nos moldes em que o foi, em absoluto prejuízo da Recorrida e da Justiça, 31. Acresce que, em sede de procedimento cautelar, infelizmente, a Ré, aqui Recorrida, também não arrolou as necessárias testemunhas, tendo apenas arrolado uma testemunha que depôs sobre algo que nem sequer sabia do que se tratava, de tal modo que, infelizmente, a mesma não conseguiu trazer ao Tribunal a oportunidade de conhecer a verdade dos factos e o que efetivamente se passava. 32. Posto isto, por essa razão, o Tribunal da Relação não teve mais do que manter a decisão que havia sido proferida pelo Tribunal a quo, porque efetivamente, em sede de defesa, a aqui Recorrida não havia apresentado, com o devido respeito, a melhor defesa em relação aos mesmos factos. 33. Em face do exposto, foi agora pretensão da aqui Recorrida, em sede de ação declarativa e processo principal, mostrar o que efetivamente se passava porque, na realidade, a verdade dos factos não é de todo aquilo que veio alegado no procedimento cautelar e na petição inicial, 34. e daí as embalagens das Sardinhas Doces de Peniche e dos Carapaus Doces da Nazaré, tal como dos Ovos Moles de Aveiro e dos Caramujos do Luso, terem sido juntas aos autos, no início da audiência de julgamento, de modo a mostrar ao Tribunal a realidade dos factos em apreço nos presentes autos, isto é, o que são as Sardinhas de Peniche, os Carapaus Doces da Nazaré e os Ovos Moles de Aveiro. 35. Acrescente-se ainda que, quando essas embalagens foram juntas aos autos, não foram as mesmas impugnadas pela aqui Recorrente, sendo que, além do mais, a aqui Recorrida já havia alegado em sede de contestação que as mesmas iriam ser juntas em audiência de julgamento, atenta a delicadeza do produto, pelo que não constituiu a sua junção qualquer surpresa nem motivo de admiração para quem quer que seja, muito menos para a A., aqui Recorrente. 36. É ainda de salientar que, em audiência de julgamento, o Sr. Dr. BB, representante legal da APOMA, aqui Recorrente, referiu que as Sardinhas de Peniche mudaram de cor posteriormente, inicialmente eram mais esbranquiçadas e que depois mudaram de cor. 37. E mudaram de cor, durante um pequeno hiato de tempo, de junho de 2018 até abril de 2019, momento em que deixaram de ser produzidas, em cumprimento da decisão judicial que foi proferida por este Tribunal, no âmbito do aludido procedimento cautelar, e que a aqui Recorrida, efetivamente cumpriu. 38. De facto, a aqui Recorrida esteve a tentar aperfeiçoar a cor da Sardinha Doce de Peniche, porque o resultado que pretendia obter era um doce num molde de uma real sardinha. 39. Sucede que, uma sardinha é cinzenta, esverdeada e não branca, pelo que, e conforme resulta da prova documental e testemunhal produzida, jamais seria pretensão da Ré comercializar a Sardinha Doce de Peniche branca e, portanto, o que a Recorrida pretendeu foi aperfeiçoar, aprimorar e obter uma cor que, de facto, se aproximasse de uma sardinha real, até que conseguiu efetivamente alcançar o cinzento esverdeado da Sardinha Doce de Peniche. 40. O mesmo procedimento foi realizado em relação aos Carapaus Doces da Nazaré, pela R..., Lda.: obter um molde de um real carapau e afinar a cor da hóstia para o cinzento, de modo a assemelhar o doce ao real carapau, o que foi, efetivamente, alcançado, de igual modo, com sucesso. 41. Saliente-se ainda que o Carapau Doce da Nazaré, já existia, e aliás, foi registado pela R..., Lda., conforme se extrai do doc. nº 8, junto com a Contestação, em janeiro de 2018. 42. É de facto, e por muito que se pretenda dizer o contrário, uma criação da R..., Lda., isto é, da Escola Profissional da Nazaré, que criou este doce e portanto nem sequer pode aqui ser imputada qualquer responsabilidade à aqui Recorrida pela criação, produção e comercialização desse produto, uma vez que não foi a aqui Recorrida que, por um lado, o criou e, por outro lado, que beneficia dessa criação, apenas se limitando a, também, o comercializar. 43. Certo é que, quando foi instaurado o procedimento cautelar contra a aqui Recorrida, nunca em momento algum a aqui Recorrente veio invocar a existência do Carapau Doce da Nazaré e a sua eventual confundibilidade com os Ovos Moles de Aveiro, tal como ao longo de todo o procedimento cautelar até mesmo à prolação da sentença e mesmo durante a inquirição das testemunhas que aí foi produzida, e o que é certo é que bem sabia, a aqui Recorrente, da existência do mesmo. 44. E tanto assim é que é a própria aqui Recorrente que, em sede de petição inicial deste processo declarativo, designadamente nos artigos 196º a 198º, e mesmo nos artigos 89º a 91º da petição inicial, entra em contradição, 45. uma vez que, não obstante começar por alegar que a aqui Recorrida depois de ter sido objeto de uma decisão judicial proibitiva da comercialização de qualquer produto confundível com a Sardinha Doce de Peniche, criou, após a prolação da sentença no âmbito do procedimento cautelar, e passou a comercializar um produto que bem sabia proibido, 46. é a própria aqui Recorrente que alega ser conhecedora da existência desse produto em data anterior à aludida sentença proferida no âmbito do referido procedimento cautelar. 47. Na verdade, é a própria aqui Recorrente que alega, no art. 91º da Petição Inicial, que o Carapau Doce da Nazaré era anterior à aludida sentença proferida no âmbito do procedimento cautelar, uma vez que havia sido apresentado na bolsa de turismo de Lisboa em março de 2018. 48. Desde logo, daí resulta até um manifesto abuso do direito da aqui Recorrente, alegando, em sede de petição inicial, que sabia que esse produto já estava a ser comercializado também desde meados de 2018 (nada alegando, a esse respeito, no requerimento inicial do procedimento cautelar instaurado contra a aqui Recorrida, permitindo, desse modo, que o Carapau Doce da Nazaré continuasse a ser produzido), 49. reclamando, posteriormente, em sede de petição inicial, que a aqui Recorrida deveria ser responsabilizada porque passou a produzir e comercializar, após a prolação da aludida sentença, esse produto, bem sabendo a aqui Recorrente da falsidade desta afirmação. 50. Para além disto, a própria APOMA, aqui Recorrente, não obstante não vir invocar a produção e a comercialização pela Recorrida desse produto, em sede de procedimento cautelar, é a própria Recorrente que, em sede de requerimento inicial ainda do procedimento cautelar, junta os documento nºs 23, 32 e o 33, para comprovar que também existe um Carapau Doce da Nazaré, mas em relação ao qual nada peticiona. III) DA ALEGADA NULIDADE DA OMISSÃO DE PRONÚNCIA: 51. Entende a Recorrente que o Tribunal Recorrido não se pronunciou sobre uma questão absolutamente fundamental da ação e recurso – a figura jurídica da evocação prevista na al. b) do art. 13º do Regulamento da U.E. n.º 1151/2021, sendo que não aceita a Recorrida tal alegação. 52. Conforme resulta, amplamente dissecado, da prova documental e testemunhal produzida nos presentes autos, é óbvio que não existe qualquer confundibilidade, imitação ou evocação entre os produtos em causa nos presentes autos, 53. sendo realçado no Douto Acórdão recorrido os objetos juntos aos autos, em relação aos quais a Recorrente nada impugnou, designadamente as embalagens e os doces das Sardinhas Doces de Peniche, do Carapau doce da Nazaré, dos Ovos Moles de Aveiro, dos Caramujos do luso, do Peixe e do Peixão, 54. mencionando na página 16 que «não há forma mais perfeita de aferição da realidade a avaliar do que o próprio contacto directo com essa realidade. Neste contexto, não pode nem deve este Tribunal da Relação de Lisboa deixar de dar o devido relevo ao contacto directo e não intermediado do Tribunal «a quo» e menos atender a uma eleição interessada e parcial de meios demonstrativos não incidente sobre a globalidade da instrução realizada, conforme proposto no recurso.» 55. e na página 18, que «A aferição foi feita em função de elementos coevos e não tinha o Tribunal que realizar qualquer averiguação histórica já que a alegação relevante, atenta a natureza do pedido, convocava a ponderação reportada ao momento mais próximo do da avaliação da pretensão. (…) Se do próprio facto provado constam imagens das caixas referidas e seu conteúdo, como afirmar que tal realidade não é, afinal, existente? Não se divisa, da análise dos autos, erro de juízo do Tribunal «a quo», emergente do facto de este ter extraído dos elementos instrutórios que ponderou dados deles não constantes. Antes se verifica que o mesmo atendeu aos componentes demonstrativos de que dispunha até por contacto físico directo.» 56. Sucede que, não obstante a Recorrida alegar que «nem uma palavra é referida sobre a evocação, instituto previsto na al. b)», na realidade, no Acórdão Recorrido ficou mencionado que “tem que se concluir que não estamos perante produtos comparáveis ou uso parasitário de nome em termos geradores de enfraquecimento ou diluição de reputação de Indicação Geográfica Protegida, para os efeitos do disposto na al. a) do n.º 1 do art.13.º do Regulamento EU n.º 1151/2012 não se preenchendo, também, seguramente, à luz do apurado e dito, as previsões das alíneas b) a d) do mesmo número e artigo.” (negrito e sublinhado nossos), 57. pelo que é completamente falso referir que o Tribunal da Relação de Lisboa se descurou no seu dever de pronúncia, não se aplicando o disposto no art. 615.º, al. d) ex vi do art. 663.º, n.º 2 do CPC. 58. Na realidade, a própria Recorrente contradiz-se mais adiante, designadamente na página 15 das suas Alegações, referindo que: «…o tribunal ter partido da “análise feita sobre a possibilidade de imitação” de marcas para concluir que não há violação do art.º 13.º, al. a), b) e c) do Regulamento e do art.º 306.º, al. a) do CPI, preceitos que regulam apenas e somente as DOPs e IGPs.» 59. Com efeito, é evidente que a ora Recorrente, que sempre alegou e defendeu a existência de evocação, não se conforma com o modo como foram apreciadas as questões em apreço nos presentes autos, bem como com a matéria de facto dada como provada, IV) DA ALEGADA ERRADA INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO DO ART. 306.º AL. A) DO CPI E DA ALEGADA OMISSÃO DA APLICAÇÃO E ANÁLISE DA ALÍNEA B) DO ART. 13.º DO REGULAMENTO N.º 1151/2012: 60. Ora, conforme já supra mencionado, por muito que a Recorrente, pretenda alegar nos presentes autos que existe evocação na aceção da al. b) do art. 13.º do Regulamento, no que concerne às Sardinhas de Peniche, quer na versão inicial esbranquiçada, quer na alegada nova versão acinzentada, bem como no que concerne aos Carapaus da Nazaré, não consegue demonstrar tal evocação, porque não existe. 61. A este respeito, e se não nos quisermos ater, APENAS, às caixas dos doces, juntas aos autos, salientemos a importância da análise do doc. nº 17, junto com a Contestação, que consiste numa fotografia dos quatro doces: Sardinha Doce de Peniche, Carapau Doce da Nazaré, Peixinho e Peixão dos Ovos Moles de Aveiro. 62. Ora, de facto, todos são doces, e, de facto, regionais. 63. Desde logo, a figura do peixão tem o tamanho de um dedo indicador e, além de branco, tem uma textura rugosa e com escamas, e a figura do peixinho tem o tamanho de um dedo mendinho e branco, sendo o recheio das referidas figuras dos Ovos Moles de Aveiro, doce de ovos. 64. Por seu turno, o Carapau Doce da Nazaré e a Sardinha Doce de Peniche nada têm a ver com o peixinho e o peixão dos Ovos Moles de Aveiro, 65. sendo a Sardinha de Peniche do tamanho real de uma sardinha, cinzenta esverdeada e lisa, com recheio de doce de ovos e biscoito comprido crocante de amêndoa (de modo a simular a espinha de uma real sardinha), 66. e o Carapau Doce da Nazaré do tamanho real de um carapau, cinzento escuro e liso, com recheio de doce de ovos, crumble e doce de morango. 67. Em face exposto, e conforme resulta, amplamente, da análise cuidada da prova documental e testemunhal produzida nos presentes autos, no caso em apreço é óbvio que não existe qualquer confundibilidade, imitação ou evocação, pelo que não são, efetivamente, produtos comparáveis. 68. Aliás, conforme resulta da Contestação e dos pontos n.ºs 42, 43 e 45 da factualidade dada como provada, existem outras receitas de doces com cremes feitos à base de ovos e açúcar, assim como outos doces regionais com formas tridimensionais de peixe e outros motivos marítimos, sendo indicados, a título exemplificativo, desde logo, a Senhora Sardinha, a Sardinha de Ofir e a Sardinha de Trancoso. 69. Portanto, peixes, na doçaria e nos salgados, há muitos, pelo que, a Recorrente não pode ter a pretensão, como parece ter, de, a partir do momento em que tem um peixinho e, residual e excecionalmente, um peixão à venda como figuras de Ovos Moles de Aveiro, oprimir qualquer produtor, a nível nacional ou até mesmo internacional, de utilizar a figura de um peixe, seja ele qual for, para qualquer tipo de doce. 70. Todavia, reitere-se que, o recheio das Sardinhas Doces de Peniche, e até mesmo do Carapau Doce da Nazaré, nada tem a ver com o recheio dos Ovos Moles de Aveiro. 71. Com a Sardinha de Peniche, a Recorrida procurou a máxima aproximação a uma sardinha real, desde o aspeto exterior (ao criar um molde de uma sardinha real) ao recheio que compõe o doce, sendo que, para esse efeito, a Recorrida teve a preocupação de munir-se das pessoas certas para este processo rigoroso de criação, munindo-se de pessoas especializadas na área, conforme resultou provado, da Escola Profissional de Peniche que, na realidade, auxiliaram a Recorrida, desde logo, a criar o molde de uma sardinha real, a procurar a cor mais aproximada da sardinha real, 72. e a criar algo que é de facto diferenciador, criando-lhe uma espécie de espinha no meio, uma espinha inovadora que assemelhasse o doce a uma verdadeira sardinha, depois de o comer, isto porque quando o consumidor compra desconhece o seu recheio. 73. Na verdade, o biscoito crocante de amêndoa que é colocado dentro da Sardinha de Peniche faz toda a diferença no que respeita ao recheio do doce, que nada tem que ver com os Ovos Moles de Aveiro, que apenas possuem um singelo doce de ovos. 74. Não estamos aqui a falar de um processo arcaico em que temos uma confeitaria qualquer que decide criar um doce diferente, para pôr à venda no mercado, sem o mínimo de critério, estudo e ensaios. 75. Ora, com efeito, tal processo culminou apenas no ano de 2019, altura em que a Recorrida alcançou a cor pretendida, mas, pouco tempo depois, foi impedida de produzir e comercializar o produto. 76. Por seu turno, é importante não olvidar que, também os Carapaus Doces da Nazaré sofreram alterações na sua tonalidade ao longo do tempo, de modo a assemelhar o doce ao real carapau. 77. Aqui chegados, reitera-se, a Recorrente não pode ter a pretensão de que na realidade ovos moles são os de Aveiro e mais nenhuns, procurando, dessa forma, ter, em absoluto, o monopólio da produção e comercialização dos ovos moles, enquanto produto alimentar, procurando proibir e limitar a liberdade de concorrência de terceiros dessa forma, em relação ao referido recheio de ovos moles, enquanto produto alimentar que é. 78. Parece-nos também ser conveniente alertar este Tribunal para a circunstância de a testemunha arrolada pela Autora, ora Recorrente, Dr.ª CC, secretária geral da APOMA desde 2001, no depoimento por si prestado em audiência de julgamento, quando confrontada com a questão da confundibilidade, ter referido que conseguia distinguir a sardinha doce, o carapau doce e os ovos moles, mas se calhar uma criança não. 79. Perante tal depoimento, será de questionar o seguinte: quem é o consumidor médio? Quem é aquele que nós devemos atender para considerar se existe confundibilidade ou não? Será uma criança que vai comprar o doce? Ou, pelo contrário, será um adulto? A Dr.ª CC diz expressamente isto: eu conseguia distinguir, mas se calhar uma criança não. 80. Assim sendo, no seio de cerca de quarenta produtores de Ovos Moles de Aveiro, conforme resulta, também, da factualidade provada, existem apenas duas pastelarias que produzem e comercializam o peixão, o que nos permite concluir pelo caráter residual da importância desta figura nos Ovos Moles de Aveiro. 81. Na realidade, o peixão quase nem é visto como sendo uma figura produzida e comercializada enquanto Ovo Mole de Aveiro, constante de todas as caixas de Ovos Moles de Aveiro, ao contrário do peixinho. 82. Por tudo o já exposto, cumpre concluir pela total ausência de evocação pois que, obviamente, as Sardinhas doces de Peniche e os Carapaus da Nazaré em nada colidem com o valor económico e cultural dos Ovos Moles de Aveiro, 83. sendo de tamanhos diferentes, 84. com cores e recheios diferentes, 85. comercializados em caixas originais e identitárias do doce, 86. com DENOMINAÇÕES diferentes, fazendo clara remissão para as regiões de Peniche e da Nazaré, reproduzindo produtos afamados das mesmas, a sardinha e o carapau, respetivamente, 87. sendo produzidos e comercializados nessas áreas geográficas, bem distintas da área geográfica de Aveiro. 88. Não há, efetivamente, qualquer tipo de dano para os Ovos Moles de Aveiro, uma vez que a Sardinha Doce de Peniche e o Carapau Doce não conflituam e não estabelecem, obviamente, qualquer concorrência com os Ovos Moles de Aveiro. 89. Concorrência desleal, é manifesta a sua inexistência, sendo de salientar a total ausência de evocação, de imitação, de concorrência desleal e de responsabilidade da Ré, aqui Recorrida, no que quer que seja. 90. Por tudo o já exposto, obviamente, as Sardinhas doces de Peniche e os Carapaus da Nazaré em nada colidem com o valor económico e cultural dos Ovos Moles de Aveiro, sendo distintos em tamanho, cor, sabor, reproduzem produtos afamados nas regiões de Peniche e da Nazaré, como marca distintiva destas, não sendo as mesmas associadas à região de Aveiro. 91. De igual modo, em face de tudo o supra exposto, resta-nos concluir que inexiste qualquer erro na interpretação e aplicação do art. 306.º, al. a) do CPI e omissão da aplicação e análise da alínea b) do art. 13.º, do Regulamento (EU) n.º 1151/2012. V) DA ALEGADA ERRADA INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO DO ART. 238.º DO CPI: 92. Invoca a Recorrente que os Tribunais de 1.ª e 2.ª instância não efetuaram a análise comparativa de forma correta e desconsideraram indevidamente a matéria provada relativa ao facto de as Sardinhas de Peniche e os Carapaus da Nazaré serem vendidos avulso, fora das caixas/embalagens e publicitados em diversos formatos, sem as caixas. 93. Porém, não pode a aqui Recorrida concordar com tal alegação, porquanto totalmente carecida de fundamento. 94. Conforme ficou demonstrado nos autos, a Recorrida sempre teve um especial zelo em ter a caixa das Sardinhas Doces de Peniche, junto do próprio produto, para que a mesma seja bem visível e percetível pelos consumidores, desde logo pelo interesse comercial que, obviamente, daí resulta para a aqui Recorrida, 95. sendo que, situação contrária tão pouco é verosímil já que a caixa das Sardinhas Doces de Peniche, cujo design faz alusão à imagem de uma lata de conservas de sardinha, foi especialmente concebida para acondicionar aquele doce, 96. constituindo, na realidade, para a Recorrida, uma mais valia na comercialização do referido produto, já que tal caixa é bastante apelativa e apreciada pela grande generalidade dos consumidores, conforme resultou demonstrado nos próprios autos, através da prova testemunhal e documental. 97. Em face do exposto, salvo o devido respeito por opinião contrária, tendo em consideração a prova documental e testemunhal produzida, é pois completamente falso que as Sardinhas de Peniche sejam divulgadas ou comercializadas, sem que se faça referência, precisamente, à denominação Sardinhas de Peniche, mediante, nomeadamente e no próprio interesse da Recorrida, a aposição da respetiva caixa, junto do produto. 98. O Tribunal de 1ª Instância observou todo o produto, desde o seu aspeto visual até ao seu interior e as embalagens nas quais os pastéis são comercializados, 99. sendo que, após esse “exame físico” e a prova produzida nos autos, salvaguardando-se através do recurso ao critério do homem médio, o acórdão recorrido afirmou claramente que “não é prefigurável, nesse contexto, um consumidor tão desatento, distraído e desinteressado em saber o que come que não veja as substanciais diferenças de conjunto. Nem se diga que o risco afinal se concretizará se o produto da Recorrida for vendido à unidade e fora das caixas que o identifiquem por referência a Peniche (ou Nazaré). É assim, desde logo, porque a sua cor, detalhe e estrutura (presença de uma «espinha» em material que não tem a natureza de doce de ovos e que se apresenta estrutura sólida e aparenta pretender emular a natureza) nada têm em comum com o produto da Recorrente.” 100. Com efeito, dúvidas não poderão restar que, qualquer consumidor de mediana atenção e escassamente esforçado em termos analíticos no momento do consumo, ao adquirir tal doce, sabe que está a comprar as Sardinhas Doces de Peniche ou os Carapaus da Nazaré, inexistindo, por tudo o já supra exposto, qualquer suscetibilidade de confusão, erro, associação ou SUGESTÃO (esta última alegação trazida agora pela 1ª vez ao processo, pela Recorrente, em sede de recurso de revista excecional). 101. Pelo exposto, resta-nos concluir que inexiste qualquer erro na interpretação e aplicação das diversas alíneas do art. 238.º do CPI. VI) DA ALEGADA INCORRECTA APLICAÇÃO DO REGIME PREVISTO NO ART. 306.º, N.º 4 DO CPI E DO ALEGADO RISCO DE DILUIÇÃO E VULGARIZAÇÃO DOS OVOS MOLES DE AVEIRO IGP: 102. Entende a Recorrente que o acórdão recorrido fez ainda uma interpretação incorreta do art. 306º, nº 4 do CPI e da al. a) do art. 13º do Regulamento da U.E. n.º 1151/2012, ao concluir que não foi feito uso da IGP e que nem resulta afetado o caráter distintivo e o prestígio da IGP. 103. Porém, ardilosamente, a Recorrente não menciona que, na realidade, e há, pelo menos cerca de um século, produzem-se e comercializam-se doces exatamente iguais aos Ovos Moles de Aveiro, na zona da Mealhada, denominados de Caramujos do Luso, conforme o próprio representante legal da Autora referiu e várias testemunhas durante a audiência de julgamento assim o admitiram, sem que tenha sido manifestada qualquer oposição pela Autora, aqui Recorrente. 104. De facto, em relação aos Caramujos do Luso, em que a evocação é absoluta ou a imitação absoluta, não existe um único processo judicial instaurado contra a empresa que produz e comercializa os Caramujos do Luso, S..., Lda., os quais continuam a ser produzidos e comercializados a nível nacional, e não apenas regional. 105. A aqui Recorrida, no nosso modesto entendimento, fez algo que se revelou importantíssimo para este Tribunal bem decidir, munido de todos os elementos possíveis, em prol da descoberta da verdade material, que foi, designadamente, a junção aos autos, em audiência de discussão e julgamento, de uma embalagem dos doces denominados de Caramujos do Luso, contendo os referidos doces. 106. Ora, os Caramujos do Luso, mais não são do que verdadeiros «Ovos Moles de Aveiro», numa perfeita e fiel reprodução dos Ovos Moles de Aveiro (desconhecendo, mas suspeitando, no entanto, se, pelo contrário, são os Ovos Moles de Aveiro uma reprodução dos Caramujos do Luso), 107. cujo sabor é idêntico ao dos «Ovos Moles de Aveiro», os ingredientes utilizados na sua confeção são os mesmos e os formatos de hóstia são, aliás, os mesmos que constam no Caderno de Especificações dos Ovos Moles de Aveiro, pelo que, no confronto entre os Ovos Moles de Aveiro e os Caramujos do Luso, não existe, efetivamente, qualquer diferença entre ambos, sendo relevante salientar a proximidade geográfica dos Caramujos do Luso a Aveiro. 108. Na realidade, todas as testemunhas arroladas pela Autora e legais representantes das partes foram confrontadas com os Caramujos do Luso, que lhes foram exibidos em sede de audiência de julgamento, e ficaram em dúvida se seriam Ovos Moles de Aveiro, dada a manifesta confundibilidade entre os Ovos Moles de Aveiro e os Caramujos do Luso, as quais, de forma espontânea, tiveram necessidade de fechar a caixa para ver o que é que aí vinha mencionado. 109. Porém, convenientemente, a Recorrente olvida-se de mencionar que a S..., Lda. produz e comercializa as mesmíssimas figuras dos Ovos Moles de Aveiro, as quais foram registadas em data anterior aos registos das marcas feitas pela APOMA, aqui Recorrente, dos Ovos Moles de Aveiro, sendo essa, provavelmente, a razão pela qual não existe nenhum processo judicial instaurado pela aqui Recorrente contra a S..., Lda.. 110. Com efeito, verifica-se aqui a existência de uma guerra aberta, infundada e injustificada, da aqui Recorrente em relação à aqui Recorrida por doces (as Sardinhas Doces de Peniche e os Carapaus Doces da Nazaré) que nada têm de semelhante com os Ovos Moles de Aveiro, mediante o recurso a diversos meios processuais: procedimento cautelar, ação judicial e recursos. 111. Em face do exposto, saliente-se que as Sardinhas Doces de Peniche são de Peniche e os Carapaus Doces da Nazaré são da Nazaré, e a própria designação e denominação dos doces isso afirma, sem qualquer margem de confusão ou alusão a Aveiro ou a qualquer outra região nacional distinta, nunca tendo a Recorrida dito ou procurado o contrário, nunca pretendendo imitar, tomar partido da notoriedade ou prestígio dos Ovos Moles de Aveiro, 112. sendo que através da mera análise, singela, das embalagens e das Sardinhas Doces de Peniche, bem como do Carapau Doce da Nazaré, conclui-se que não existe qualquer elemento figurativo que se possa associar aos Ovos Moles de Aveiro ou a Aveiro, 113. ao contrário do que se verifica com os Caramujos do Luso, cujas figuras, cor, recheio e tamanho são exatamente iguais aos Ovos Moles de Aveiro, suscetíveis de inegável confundibilidade e, no entanto, nada foi feito pela aqui Recorrente. 114. A aqui Recorrida limitou-se a criar a Sardinha Doce de Peniche, sendo o ex-libris da região de Peniche a sardinha, pelo que, foi precisamente, por essa razão, que a aqui Recorrida pretendeu criar um doce alusivo à região, e, por isso, denominado de doce Regional, aliás, apoiada, conforme resultou provado, testemunhalmente, em audiência de julgamento, pelo Município de Peniche. 115. Era exatamente isso que a aqui Recorrida pretendia, um produto regional, à semelhança de tantos outros, sendo que existe também, por exemplo, o doce denominado de «rendas», que também é um produto regional de Peniche, e que também foi abordado pelas testemunhas nos presentes autos. 116. Nunca a aqui Recorrida pretendeu dizer que as Sardinhas Doces de Peniche seriam um produto de Aveiro, assim como também nunca pretendeu, obviamente, comercializar as Sardinhas Doces de Peniche em Aveiro, sendo que, naturalmente, a comercialização da Sardinha Doce de Peniche sempre será apenas em Peniche porque é ali que a sardinha existe, em Peniche e nunca em Aveiro. 117. Acrescente-se ainda que o cliente de Aveiro, não é, de todo, o cliente de Peniche. 118. O mesmo sucede com o Carapau Doce da Nazaré, em que o que a R..., Lda. sempre pretendeu foi a produção e comercialização de um produto regional da Nazaré e o cliente da Nazaré não é, de todo, o cliente de Aveiro, 119. Com efeito, a indicação da proveniência dos produtos Sardinhas de Peniche e Carapau Doce da Nazaré, é clara e inequívoca e remete o consumidor, direta, inequívoca e unicamente, para as cidades de Peniche e da Nazaré, respetivamente. 120. Além disso, não será despiciendo salientar que, os “Ovos Moles de Aveiro - IGP” obedecem a uma descrição, método de produção, características particulares e área de produção, que os distingue dos «ovos moles» de outras proveniências geográficas e receitas culinárias, pelo que, o produto que é efetivamente protegido pela Indicação Geográfica Protegida «Ovos-Moles de Aveiro» é apenas aquele que vem descrito no respetivo “Caderno de Especificações”, publicado no Jornal Oficial da União Europeia C 170/10, de 23/05/2015. 121. Posto isto, o direito de exclusividade da Recorrente recai sobre esse produto específico, porém não lhe confere o direito de impedir o fabrico e comercialização por terceiros do produto alimentar «ovos-moles» ou de outros produtos de doçaria feitos com «ovos-moles» ou semelhantes a estes – i.é., feitos com gemas de ovos, água e açúcar. 122. Na verdade, e por comparação aos Ovos Moles de Aveiro, as Sardinhas Doces de Peniche, e mesmo os Carapaus Doces da Nazaré, são de tamanhos diferentes, cores diferentes, recheios diferentes, nomes diferentes, caixas diferentes, indicações absolutamente diferentes e produzidos e comercializados em áreas geográficas totalmente diferentes, Peniche e Nazaré, respetivamente. 123. Saliente-se que, a aqui Recorrida chamou a atenção deste tribunal para a Teoria da Distância porque efetivamente faz todo o sentido a análise e aplicabilidade da Teoria da Distância em relação aos presentes autos, 124. não só em relação à figura do biscoito que a Ré alegou nos arts. 198º e ss. da Contestação, exatamente igual na classe 30 dos biscoitos à figura do peixinho dos Ovos Moles de Aveiro, 125. mas além disso, em relação aos Caramujos do Luso que, na realidade, é uma marca anterior e exatamente igual aos Ovos Moles de Aveiro, 126. pelo que, em face do exposto, efetivamente nunca poderia a aqui Recorrente avançar com o presente processo judicial contra a aqui Recorrida. 127. Em face do exposto, obviamente não resultou provado, porque inexiste, a vulgarização e diluição da distintividade das figuras dos Ovos Moles de Aveiro IGP pelos doces Sardinhas de Peniche e Carapaus da Nazaré, e consequentemente a perda de valor e prestígio dos mesmos. 128. Posto isto, cumpre concluir que inexiste erro na interpretação e aplicação do art. 306.º, n.º 4 do CPI. Confirmando a douta decisão proferida pelo Tribunal a quo, negando provimento ao recurso, farão V.Exas. inteira e sã JUSTIÇA! 11. O recurso de revista excepcional foi admitido pela Formação prevista no art. 672.º, n.º 3, do Código de Processo Civil. 12. Como o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do Recorrente (cf. arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. art. 608.º, n.º 2, por remissão do art. 663.º, n.º 2, do Código de Processo Civil), as questões a decidir, in casu, são as seguintes: I. — se o acórdão recorrido é nulo, por omissão de pronúncia; II. — se a Ré, agora Recorrida, Calé — Indústria e Comércio, Lda., lesou os direitos protegidos pelo art. 238.º do Código da Propriedade Industrial; III. — se, ainda que não tenha lesado os direitos protegidos pelo art. 238.º, a Ré, agora Recorrida, infringiu as regras sobre denominações de origem e indicações geográficas do art. 13.º, n.º 1, do Regulamento (UE) n.º 1151/2012 e/ou do art. 306.º, n.ºs 1 e 4, do Código da Propriedade industrial. II. — FUNDAMENTAÇÃO OS FACTOS 13. O acórdão recorrido deu como provados os factos seguintes (de que foram eliminadas as imagens): 1. A A. é uma associação de direito privado sem fins lucrativos que tem como objectivo a salvaguarda da protecção do modo de produção e comercialização do produto “Ovos Moles de Aveiro”, cfr. respectiva escritura de constituição e ‘Estatutos’ juntos como doc. 25 da petição inicial a fls. 33v-40 dos autos e Caderno de Especificações e Obrigações de Ovos Moles de Aveiro’ junto COITIO doc. n.° 1 do requerimento inicial a fls. 23-76 do procedimento cautelar apenso, que se dão por reproduzidos. 2. A A. é titular dos seguintes registos de marcas, cfr. does. 8 e 9 do requerimento inicial juntos a fls. 168-169 do procedimento cautelar apenso, que se dão por reproduzidos, e consulta do site do INPI em https://iustica.qov.pt/ Registos/PropriedadeIndustrial/Marca: — marca de certificação (tridimensional) n.° 572180 […], requerida em 26.10.2016, concedida em 25.09.2017 para assinalar ‘doçaria na classe 30 da Classificação de Nice e descrita quanto aos respectivos elementos figurativos nos termos da Classificação de Viena, como ‘tonéis ou barris deitados’ (classe 19.1.5), ‘quadrados de chocolate, amêndoas torradas e cobertas, confeitos, ou outros bombons’ (excepto 8.1.23’ (classe 8.1.22) e ‘pequenos recipientes cilíndricos (por exemplo tubos para pílulas, boiões, caixas para conservas, bocais)’ (classe 19.3.1); — marca (tridimensional) n.° 572181 […], requerida em 26.10.2016, concedida em 25.09.2017 para assinalar ‘doçaria’ na classe 30 da Classificação de Nice e descrita quanto aos respectivos elementos figurativos como ‘mariscos de concha (ostras, mexilhões, bivalves, outras conquilhas)' na classe 3.9.18 da Classificação de Viena; — marca (tridimensional) n.° 572323 […], requerida em 27.10.2016, concedida em 25.09.2017 para assinalar ‘doçaria’ na classe 30 da Classificação de Nice e descrita quanto aos respectivos elementos figurativos como ‘garrafas ou frascos de secção horizontal circular ou elíptica’ na classe 19.7.1 da Classificação de Viena; — marca (tridimensional) n.° 572324 […], requerida em 27.10.2016, concedida em 25.09.2017 para assinalar ’doçaria’ na classe 30 da Classificação de Nice e descrita quanto aos respectivos elementos figurativos como ‘mariscos de concha (ostras, mexilhões, bivalves, outras conquilhas)’ na classe 3.9.18 da Classificação de Viena; — marca (tridimensional) n.° 572325 […], requerida em 27.10.2016, concedida em 25.09.2017 para assinalar 'doçaria' na classe 30 da Classificação de Nice e descrita quanto aos respectivos elementos figurativos como 'mariscos de concha (ostras, mexilhões, bivalves, outras conquilhas)’ na classe 3.9.18 da Classificação de Viena; — marca (tridimensional) n.° 572326 […], requerida em 27.10.2016, concedida em 25.09.2017 para assinalar ‘doçaria’ na classe 30 da Classificação de Nice e descrita quanto aos respectivos elementos figurativos como ‘mariscos de concha (ostras, mexilhões, bivalves, outras conquilhas)’ na classe 3.9.18 da Classificação de Viena; — marca (tridimensional) n.° 572327 […], requerida em 27.10.2016, concedida em 25.09.2017 para assinalar 'doçaria' na classe 30 da Classificação de Nice e descrita quanto aos respectivos elementos figurativos como 'mariscos de concha (ostras, mexilhões, bivalves, outras conquilhas)’ na classe 3.9.18 da Classificação de Viena; — marca (tridimensional) n.° 572328 […], requerida em 27.10.2016, concedida em 25.09.2017 para assinalar ‘doçaria’ na classe 30 da Classificação de Nice e descrita quanto aos respectivos elementos figurativos como 'mariscos de concha (ostras, mexilhões, bivalves, outras conquilhas)' na classe 3.9.18 da Classificação de Viena; — marca (tridimensional) n.° 572329 […], requerida em 27.10.2016, concedida em 25.09.2017 para assinalar 'doçaria’ na classe 30 da Classificação de Nice e descrita quanto aos respectivos elementos figurativos nos termos da Classificação de Viena, como 'pães longos, “baguettes’" (classe 8.1.3) e ‘mariscos de concha (ostras, mexilhões, bivalves, outras conquilhas)' (classe 3.9.18); — marca (tridimensional) n.° 572330 […], requerida em 27.10.2016, concedida em 25.09.2017 para assinalar ‘doçaria’ na classe 30 da Classificação de Nice e descrita quanto aos respectivos elementos figurativos como ‘frutos com casca (amêndoas, amendoins, cacau, nozes, avelãs, etc.)’ na classe 5.7.6 da Classificação de Viena; — marca (tridimensional) n.° 572331 […], requerida em 27.10.2016, concedida em 25.09.2017 para assinalar 'doçaria' na classe 30, doçaria e descrita quanto aos respectivos elementos figurativos como 'peixes, animais tendo a forma de um peixe’ na classe 3.9.1 da Classificação de Viena, cfr. doc. 8 do requerimento inicial junto a fls. 167v-168 do procedimento cautelar apenso, que se dá por reproduzido; — marca (tridimensional) n.° 572332 […], requerida em 27.10.2016, concedida em 25.09.2017 para assinalar 'doçaria' na classe 30 e descrita quanto aos respectivos elementos figurativos como ‘peixes, animais tendo a forma de um peixe’ na classe 3.9.1 da Classificação de Viena, cfr. doc. 9 do requerimento inicial junto a fls. 168v-169 do procedimento cautelar apenso, que se dá por reproduzido. 3. A A. é ainda titular da Indicação Geográfica Protegida OVOS MOLES DE AVEIRO n.° CE: PT-PG1-005-0518-03.01.2006 [Regulamento (CE) n.° 510/2006 do Conselho - publicado no Jornal Oficial da EU de 22.07.2008] para 'Produtos de padaria, pastelaria, confeitaria ou da indústria de bolachas e biscoitos’, por si requerida e concedida pela Comissão Europeia em 7.04.2009, cfr. docs. 6 e 7 do requerimento inicial juntos a fls. 77-78v do procedimento cautelar apenso, que se dão por reproduzidos. 4. Do Caderno de Especificações e Obrigações de Ovos Moles de Aveiro’ supra dado por reproduzido (ponto 1 do presente enunciado de factos) consta designadamente o seguinte: '[ . . .] II.1 - Definição do produto Entende-se por Ovos Moles de Aveiro o produto obtido pela junção de gema de ovo a uma calda de açúcar (fig. 1), seguindo o modo de confecção tradicional que se encontra descrito neste Caderno de especificações e cuja área geográfica de produção, transformação e acondicionamento se encontra adiante delimitada. [...] os Ovos Moles de Aveiro podem apresentar-se: •em barricas de madeira (fig. 2) ou de porcelana (fig. 3): •envolvidos em hóstia (fig. 4). II.2 - Características da Matéria Prima Os Ovos Moles de Aveiro têm como matérias primas, exclusivamente: •Gema de ovo [...] Açúcar de cana branco refinado [...] Água [...] •Hóstia [ . . .] II.3.1 - Caracteristicas Físicas e sensoriais II.3.1.1 -Ovos Moles de Aveiro [...] Textura: uniforme, sem grânulos de açucar ou de gema de ovo. [...] II..3.1.2- Hóstia [...] Cor: homogénea, experimentando várias tonalidades entre o branco e o creme, opaca. III.1 - Área Geográfica de Produção da Matéria Prima [...] Hóstias (obreias) A própria apresentação em formas com motivos lagunares ligados à ria de Aveiro e ao rio Vouga- peixes, navalheira ou lingueirão, mexilhão, conchas, búzios, barricas, bóia marítima ou ganafa, berbigões, barrica de aduela ou dorna, amêijoas (fig. 44 a 56), são factores de ligação absoluta à área geográfica. Os únicos elementos inspirados na flora local, a noz e a castanha (fig. 48, 51) são também prova inequívoca da ligação á região, uma vez que são frutos provenientes de árvores autóctones que aí crescem espontaneamente. […] Ovos Moles de Aveiro em hóstia. As formas de hóstia apresentam motivos lagunares alusivos a esta Região, existindo, no entanto, duas excepções: a noz e a castanha. As fotografias seguintes representam as diferentes figuras de hóstia com o respectivo nome […] 5. Os Ovos Moles de Aveiro são um doce de origem conventual que constitui uma referência indubitável na cozinha tradicional portuguesa, consistindo em doces típicos da região de Aveiro, cujo ingrediente principal é a gema de ovo, obtido pela junção de gemas cruas a uma calda de açúcar seguindo o modo de confecção tradicional, e podendo apresentar-se tal qual envolvidos em hóstias (ou obreiras) moldadas em formas com motivos lagunares ou frutos secos, ou acondicionados em barricas de madeira ou de porcelana pintadas com motivos alusivos à região de Aveiro, 6. A produção destes doces envolve, em primeira linha, o fabrico das placas em hóstia, para fabrico das quais os produtores têm de ter na sua posse ferros com determinados formatos como os abaixo reproduzidos (Retirado de: Ovos Molles de Aveiro 500 anos, Associação de Produtores de Ovos Moles de Aveiro, 2013, p. 57), cfr. p. 25 e seguintes do doc. 1 supra dado por reproduzido (ponto 1 do presente enunciado de factos): […] 7. Numa segunda fase do processo de produção, a massa de ovos moles é enformada nas hóstias, que são posteriormente prensadas, após colagem, depois separadas e recortadas com tesoura ou guilhotina, cfr. imagens abaixo reproduzidas [Retirado da obra citada (nota de rodapé 1), p. 94]: 8. Fazem parte das características dos Ovos Moles de Aveiro as formas de hóstia com os seguintes motivos lagunares ligados à ria de Aveiro e ao rio Vouga: peixes, navalheira ou lingueirão, mexilhão, conchas, búzios, barricas, bóia marítima ou garrafa, berbigões, barrica de aduela ou dorna, amêijoas. 9. Para além desses motivos lagunares (ponto 8 do presente enunciado de factos), os Ovos Moles de Aveiro apresentam-se também na forma de noz e castanha, elementos inspirados na flora local, frutos provenientes de árvores autóctones que criam espontaneamente nessa zona. 10. Essas figuras (ponto 8 e 9 do presente enunciado de factos) encontram-se explanadas no Caderno de Especificações e Obrigações de Ovos Moles de Aveiro, junto como doc. 1 e supra dado por reproduzido (ponto 1 do presente enunciado de factos). 11. De acordo com a obra ‘História dos Ovos Moles de Aveiro’ de Nuno Rosmaninho e Jorge Pacheco dos Santos, junta como doc. 3 do requerimento inicial a fls. 81-166v do procedimento cautelar apenso, que se dá por reproduzido, o fabrico dos Ovos Moles de Aveiro dentro das hóstias data do primeiro terço do século XX. 12. Desde essa altura (ponto 11 do presente enunciado de factos) que os Ovos Moles de Aveiro em invólucro de obreiras são utilizados e com as figuras constantes do ponto 4 do presente enunciado de factos, que aqui se dão por reproduzidas, cfr. doc. 1 supra dado por reproduzido e doc. 10 do requerimento inicial junto a fls. 169v- 170 do procedimento cautelar apenso, que se dá por reproduzido. 13. Conforme resulta do conhecimento público e geral e da história do património gastronómico-cultural português, os Ovos Moles de Aveiro gozam de excepcional notoriedade e reputação, remontando o seu fabrico e método de produção ao século XIX, altura em que eram confeccionados nos conventos da região de Aveiro, nomeadamente no Mosteiro de Jesus de Aveiro, onde também eram confeccionadas as hóstias. 14. A IGP OVOS MOLES DE AVEIRO é reconhecida pela generalidade dos consumidores portugueses. 15. Os produtos com essa denominação são mencionados em clássicos da literatura portuguesa como “Os Maias” de Eça de Queirós, sendo reconhecidos pelas suas características e formas, cfr. referências mencionadas no doc. 2 do requerimento inicial junto a fls. 189-250 do procedimento cautelar apenso, que se dá por reproduzido, e doc. 3 supra dado por reproduzido (ponto 11 do presente enunciado de factos). 16. Na lista compilada pela redacção do Notícias Magazine de 1.000 coisa que valem a pena em Portugal, intitulada ‘Mil motivos para orgulho nacional’ , figuram em 10° lugar os ‘Ovos Moles de Aveiro’, aí se mencionando que A fórmula deste famoso doce deve-se às freiras dos vários conventos existentes em Aveiro até ao século XIX- as religiosas usavam as claras dos ovos para passar a ferro os hábitos. /As gemas, para não serem desperdiçadas, eram usadas como base para o doce’, cfr. doc. 4 do requerimento inicial junto a fls. 76v-77 do procedimento cautelar apenso, que se dá por reproduzido. 17. No artigo publicado em 30.05.2013 na versão online do Jornal da Mealhada intitulado ‘Leitão é a imagem de marca do centro de Portugal’ menciona-se que A nível gastronómico, o Leitão da Bairrada e os Ovos Moles de Aveiro são as imagens de marca do centro de Portugal, segundo o "relatório de avaliação da imagem de marca e notoriedade da marca Centro de Portugal" apresentado recentemente pelo IPAM Lab de Aveiro (Escola de Marketing), que teve por base mais de oitocentas entrevistas presenciais válidas’, cfr. doc. 5 do requerimento inicial junto a fls. 167 do procedimento cautelar apenso, que se dá por reproduzido. 18. A R. Calé - Indústria e Comércio, Lda. é uma sociedade constituída em 12.02.1990 de que são sócios-gerentes AA e DD, que se dedica ao ‘fabrico e comercialização de produtos alimentares’ - cfr. doc. 1 da oposição junto a fls. 97v-101 dos autos - e explora um estabelecimento de pastelaria em Peniche denominado “Calé”, constando do respectivo site https://qrupocale.pt/ designadamente o seguinte: “[...] Engrandecido por uma nova geração, o Grupo Calé ampliou a sua oferta de panificação no desenvolvimento de pães inovadores, nomeadamente o Pão do Mareo Pão d’Algas e também a nível de confeitaria tradicional, criando doces típicos como as Sardinhas de Peniche, os Biscoitos de Peniche, o Pastel d´Algas e o Pelicano. SARDINHA DE PENICHE Sardinha fresca que não vem do mar, é a novidade que temos para si. Ideal para oferecer a amigos e familiares como lembrança desta terra de sardinha, Peniche. O doce apresenta-se em forma de sardinha. E é recheado com doce d’ovos e uma “espinha” crocante de amêndoa.” 19. A R. é titular do registo da marca nacional n.° 560624 […], solicitado em 20.02.2016 e concedido em 30.01.2017 para assinalar ‘produtos de pastelaria; produtos de pastelaria de amêndoa’ na classe 30 da Classificação de Nice, cfr. docs. 2 a 6 da contestação juntos a fls. 101v-104 e 132v-138 dos autos, que se dão por reproduzidos. 20. A R. fabrica e comercializa um produto de pastelaria (que inclui, no site suprareferido, na categoria de bolos/especialidades) que denomina SARDINHAS DE PENICHE, por vezes também designado de SARDINHAS DOCES DE PENICHE, constituído pela forma de um peixe alongado, com revestimento de hóstia cor cinzenta e recheio de doce de ovos e um crocante de amêndoa no lugar da espinha: […] 21. O produto aberto tem a seguinte apresentação: […] 22. Estes doces foram comercializados na pastelaria da R. em caixas de 6 unidades, como a junta aos autos e ao procedimento cautelar apenso (fotos infra) de cuja tampa consta a marca nacional n.° 560624 […], sendo esporadicamente também retirados da caixa para consumo avulso ao balcão pelos clientes, cfr. docs. 13 a 15 do requerimento inicial juntos a fls. 172-173v e objecto junto a fls. 333 do procedimento cautelar apenso e nestes autos em sede de audiência e doc. 6-A da contestação junto a fls. 143v-144 dos autos, que se dão por reproduzidos: […] 23. Tendo sido nomeadamente divulgados em eventos culturais e gastronómicos e on-line no site da Comunidade Intermunicipal do Oeste, no site e na página do Facebook da R. e no Tripadvisor, onde por vezes apareceram fora da caixa e sem referência à designação ‘Sardinhas de Peniche’, cfr. docs. 16 a 19 do requerimento inicial juntos a fls. 174-177 do procedimento cautelar apenso, que se dão por reproduzidos. 24. O produto foi apresentado no programa “Manhã CM” no canal da CM TV, disponível em: https://www.crniornal.pt/multimedia/videos/detalhe/sardinhas-docesde peniche e no vídeo junto como doc. 20 do requerimento inicial junto a fls. 255 do procedimento cautelar apenso, que se dá por reproduzido e do qual foi extraída a captura de ecrã seguinte: […] 25. Bem como no canal de televisão TVI24, disponível no link: https://tvi.iol-Pt/videosmaisvistos/sardinhas-de-peniche-saltaram-do-mar-para-apastelaria/5ae9a76d0 cf2c09c9a15bd4b?fbclid=lwAR2Tvpf5r6oS9n5ot0JzPfqqqpqCHHoM0NANKkzFv38p5fx8 Uaah8c2veaQ e no vídeo junto como doc. 21 do requerimento inicial no procedimento cautelar apenso, que se dá por reproduzido. 26. Sendo apresentado como um produto regional. 27. No seu modo de elaboração são utilizados moldes desenvolvidos em colaboração com o Instituto Politécnico de Leiria e a Escola Superior de Tecnologia do Mar e produzidos para o efeito pela firma de Peniche Penivapor, Montagens de Vapor Unipessoal, Lda. e folhas de hóstia da associada da A., Avozinha- Hóstias para Ovos Moles, Lda., sendo depois as figuras recortadas com uma tesoura, cfr. doc. 6-B da contestação junto a fls. 145v-148 dos autos que se dá por reproduzido e ilustrado nos vídeos juntos como does. 20 e 21 supra dados por reproduzidos (pontos 24 e 25 do presente enunciado de factos), de que se extraíram as seguintes capturas de ecrã: […] 28. No artigo do Jornal Gazeta das Caídas (versão online) sobre as sardinhas doces produzidas pela Requerida é referido que: "A Sardinha Doce de Peniche é parecida com os ovos moles, mas feita num molde de uma sardinha real”, cfr. doc. 23 do requerimento inicial junto a fls. 184-185 do procedimento cautelar apenso, que se dá por reproduzido. 29. No programa supra-referido da CMTV (ponto 24 do presente enunciado de factos) foi colocada a legenda “ovos moles com “espinha” crocante de amêndoa", tendo ao minuto 00.35 o jornalista afirmado: "lá dentro estão os ovos moles”, cfr. doc. 20 do requerimento inicial supra dado por reproduzido (ponto 24 do presente enunciado de factos). 30. No site da Tripadvisor com a referência temporal 2018, o produto surge legendado como "Sardinhas de Peniche. Ovos moles com uma espinha de amêndoa em forma de sardinha”, cfr. doc. 19 do requerimento inicial junto a fls. 177 do procedimento cautelar apenso, que se dá por reproduzido. 31. Num artigo de 30.08.2018 do Jornal das Caídas, disponível em https://Qazetacaldas.com/sociedade/ia-imaginou-as-sardinhas-e-os-carapaus-doces-pois -seguem-se-os-ianquizinhos-e-as-petingas-doces/, consta designadamente o seguinte, cfr. doc. 23 do requerimento inicial junto a fls. 184-185 do procedimento cautelar apenso, que se dá por reproduzido: “O grupo Calé tem inovado nos últimos anos, tornando-se famoso pela criação do pão de algas, pão do mar, pastéis pelicanos e bolachas com renda de bilros comestível. Mas os seus responsáveis- o casal AA e DD - não ficaram por aqui e continuaram a criar doces. Já lançaram a sardinha e o carapau doce, que hoje apresentamos, e na calha estão, entre muitos outros, o jaquinzinho e a petinga. [. . .] A Sardinha Doce de Peniche é parecida com os ovos moles, mas feita num molde de uma sardinha real. No interior tem um doce de ovos (com redução de açúcar) e uma espinha feita de crocante de amêndoa que suaviza o doce. [...} Por fim, veio o "Carapau Doce da Nazaré", que nasceu de uma parceria com a Escola Profissional da Nazaré e que é vendido num quiosque, bem junto ao museu-vivo onde as peixeiras vendem o carapau seco e enjoado. Mas desengane-se o leitor se pensa que o Carapau Doce é igual à sardinha, mas num molde diferente. Apesar das semelhanças- ambos são inspirados em peixes e ambos feitos em moldes reais- também têm muitas diferenças e a maior é o sabor. É que os Carapaus Doces da Nazaré são uma criação que surge em parceria com a Escola Profissional da Nazaré, que queria um doce que remetesse para a praia. O recheio é de doce de ovos (para lembrar a Bola de Berlim), doce de morango (que remete para o gelado Perna de Pau) e crumble (para dar uma ideia de areia). Tudo isto envolvido numa hóstia cinzenta da cor do carapau. Para o futuro estão previstos novos lançamentos de doces. Nas Caídas a empresa já patenteou alguns e irá apresentar novidades ainda este ano. Em Peniche será lançada a Petinga (sardinha em ponto pequeno) e o SuperTubos. E na Nazaré também será lançado o Jaquinzinho (um carapau doce mais pequeno) e um outro doce que irá simbolizar algo típico daquela vila.” 32. Na sentença proferida em 2.04.2019 no procedimento cautelar apenso que precedeu a presente acção e correu termos sob o n° 333/18.0YHLSB, constante de fls. 342-353 dos respectivos autos e que se dá por reproduzida, menciona-se designadamente o seguinte (ênfase aditado): '[...] Dos pontos 17 a 21 da matéria de facto constam factos que indiciam a necessidade de "descolar" as SARDINHAS DE PENICHE dos reputados OVOS MOLES DE AVEIRO: são parecidos com ovos moles mas em forma de sardinha. [...] [ ] O consumidor ao deparar-se com os doces em forma de peixe, com recheio de doce de oiros e moldada em hóstia esbranquiçada será remetido para os OVOS MOLES DE AVEIRO [ ...]. [...] a evocação dos produtos protegidos pela IGP por um produto que é confundível com um desses produtos mas sem o controlo das suas qualidades, afigura-se susceptível de prejudicar a IG e a sua excepcional distintividade. […]’ 33. No acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 7.11.2019 proferido em sede de apelação da dita sentença cautelar (ponto 32 do presente enunciado de factos), constante de fls. 601-626v dos respectivos autos, que se dá por reproduzida, menciona-se designadamente o seguinte (ênfase aditado): “'[...] Um consumidor medianamente atento deste tipo de produto, perante o doce da apelante (Sardinhas de Peniche) detecta semelhanças no conjunto dos seus componentes, sobretudo no aspecto exterior, em forma de peixe, em formato 3D, com o mesmo tipo de recorte, efectuado com tesoura, com revestimento em hóstia esbranquiçada, mas também quanto ao seu interior, ambos com doce de cor laranja, à base de ovos- doce de ovos/ovos moles […]’ Repete-se que a confundibilidade se verifica ao nível do conjunto dos componentes (formato do peixe, em 3D, com recheio de doce de ovos/ovos moles, revestimento em hóstia esbranquiçada)”. 34. Na Bolsa de Turismo de Lisboa de 2018, que decorreu entre 28 de Fevereiro e 4 de Março desse ano, foi apresentado o produto CARAPAU DOCE DA NAZARÉ, abaixo reproduzido, fabricado pela Escola Profissional da Nazaré, com quem a R. tem uma parceria, cfr. does. 27 e 34 da petição inicial juntos a fls. 40v e 43-43v dos autos e vídeo junto como doc. 29, que se dão por reproduzidos: […] 35. O referido vídeo (ponto 34 do presente enunciado de factos) mostra a apresentação do produto feita pelo chef EE e aluno FF, no canal de televisão SIC perante a apresentadora GG e comediante HH, sendo possível perceber que existiu a intenção de criar um doce regional que fosse atractivo e marcasse a diferença pois não existe nenhum doce típico da Nazaré, dele constando designadamente as seguintes declarações dos referidos intervenientes (em itálico infra), cfr. doc. 29 supra dado por reproduzido: [ao minuto 0:06] respondem à GG que não foram eles (referindo-se à Escola Profissional) que inventaram, mas que 'ajudaram no processo de desenvolvimento", - [ao minuto 1:17 a GG refere: ‘isto faz-me lembrar um bocadinho aqueles doces de Aveiro...não é? Isto é hóstia também?" - Chef EE: ‘não há aqui a questão da imitação’. 36. O CARAPAU DOCE DA NAZARÉ ostenta o formato de um peixe, com recheio de doce de ovos, doce de morango e crumble revestido a hóstia acinzentada, cfr. objectos juntos abaixo ilustrados, vídeo junto como doc. 30 da petição inicial e does. 31 e 32 da petição inicial juntos a fls. 41v-42 dos autos, que se dão por reproduzidos. 37. Na sua confecção são utilizadas folhas de hóstia fabricadas pela referida A..., Lda. (ponto 27 do presente enunciado de factos), nas quais é colocado o recheio, sendo depois as folhas prensadas com prensas metálicas e por fim os peixes recortados com uma tesoura, cfr. vídeo junto como doc. 30 supra reproduzido (ponto 36 do presente enunciado de factos) e seguinte captura de ecrã dele extraída: 38. Os CARAPAUS DOCES DA NAZARÉ são um produto relativamente recente com cerca de 2 anos à data da propositura da presente acção, dos quais o primeiro foi de desenvolvimento do produto, sendo apresentado como produto original, cfr. doc. 29 supra dado por reproduzido (ponto 34 do presente enunciado de factos). 39. São vendidos em caixas de seis unidades como a junta aos autos onde figura a marca nacional n° 594187 […], registada desde 26.03.2018 em nome de R..., Lda., abaixo ilustrada e que se dá por reproduzida, sendo por vezes consumidos avulso, cfr. doc. 28 da petição inicial junto a fls. 41 dos autos, que se dá por reproduzido: […] 40. No artigo da revista ‘Evasões’ relativo a este doce refere-se que ‘O segredo é um doce de ovos que vai preencher um lugar na doçaria regional’, cfr. doc. 32 supra dado por reproduzido (ponto 36 do presente enunciado de factos). 41. Numa mensagem colocada com data de 15.03.2018 no site do ‘Jornal das Caídas’ (https://iornaldascaldas.pt/) menciona-se designadamente o seguinte, cfr. doc. 34 da petição inicial junto a fls. 43-43v dos autos, que se dá por reproduzido: ‘A Escola Profissional da Nazaré (EPN) apresentou o “carapau Doce da Nazaré”, um novo produto para a gastronomia local, durante uma sessão de degustação que decorreu na Bolsa de Turismo de Lisboa, junto do stand promocional do Município da Nazaré. Novo doce inspirado num peixe bastante consumido na Nazaré. "É uma criação que o consumidor irá conhecer num ponto de venda, em breve”, anunciou II, administrador da EPN. Inspirado num peixe bastante consumido e pescado na Nazaré (o carapau), o novo doce "reúne memórias” e pretende entrar no circuito gastronómico “como um novo elemento na doçaria local”. [...] “É um passo muito importante na criação de doçaria própria e de excelência”, disse o autarca sobre uma iniciativa que nasce de uma parceria com o Grupo Calé e o Município da Nazaré […]’. 42. Os cremes feitos à base de ovos e açúcar (ovos moles/doces de ovos) integram a receita de vários doces regionais portugueses e estrangeiros (designadamente de Espanha, Chile, Cuba, Venezuela e México), como os ‘PAPOS DE ANJO’ de Amarante abaixo ilustrados, os ‘OVOS MOLES’ do Algarve e os ‘PASTÉIS DE TENTUGAL’, cfr. does. 10, 11 e 14 a 16 da contestação juntos a fls. 111v-124 dos autos, que se dão por reproduzidos. 43. As folhas de hóstia são usadas na confecção de vários doces, incluindo doces regionais portugueses com formas tridimensionais de peixe e outros motivos marinhos, como os ‘CARAMUJOS DO LUSO’ juntos aos autos, de que se extraíram as seguintes imagens e se dão por reproduzidos: […] 44. A sardinha e a sua pesca têm grande relevância na economia local de Peniche, realizando-se aí anualmente o “festival da sardinha de Peniche”, cfr. doc. 13 da contestação junto a fls. 107v-110 dos autos, que se dá por reproduzido. 45. Encontram-se registadas as seguintes marcas assinalando nomeadamente produtos de ‘confeitaria’ elou ‘doçaria’, cfr. does. 14 a 16 da contestação juntos a fls. 104v-107 dos autos, que se dão por reproduzidos: - marca nacional n.° 389034 SARDINHAS DOCES DE TRANCOSO, solicitada em 17.03.2005 e concedida em 17.02.2006, da titularidade de Prisca- Alimentação, S.A.; - - marca nacional n.° 539700 SARDINHA D’OFIR DA CONFEITARIA PÃ-PÃ, solicitada em 1.12.2014 e concedida em 16.06.2015, da titularidade de Dias Ferreira & C.a, Lda.; - marca nacional n.° 575693 […], solicitada em 11.01.2017 e concedida em 29.05.2017 para assinalar 'alimentos à base de cacau; alimentos que contêm cacau [como elemento principal]; aperitivos à base de confeitarias; aroma de alcaçuz para confeitaria; artigos de confeitaria cobertos de chocolate; biscoitos aromatizados; bolachas de farinha de trigo integral [graham]; bolachas de confeitaria para cozer; bolinhos doces com uma suave cobertura à base de feijão açucarado [nerikiri]; bolinhos doces de arroz triturado (mochi-gashi); bombons [doçaria]; bombons de chocolate com recheio tipo creme; coberturas para bolos; cremes à base de cacau sob a forma de pastas para barrar; decorações de confeitaria para bolos; decorações para bolos feitas de guloseimas; glacés para confeitaria; sucedâneo de leite creme; alimentos de massa seca; bolas de massa recheadas de fruta ou carne; bolinhos à base de farinha; bolinhos de massa à base de farinha; massa alimentar contendo ovos; massa alimentar contendo recheios; massa alimentarem forma de conchas’, da titularidade de Cruz & Corado, Lda.. 46. O doce SARDINHAS DE PENICHE da R. contém na sua composição os seguintes ingredientes: açúcar, ovos, água, farinha trigo tipo 55, amêndoa, limão, canela e óleo vegetal, cfr. Ficha Técnica do Produto e seguinte menção na parte inferior da respectiva embalagem, juntas como doc. 6-A da contestação supra dado por reproduzido (ponto 22 do presente enunciado de factos): 47. Encontra-se registada desde 2.05.1994 a marca de registo internacional n.° 618143 da titularidade de averbamento no INPI, protegida em Portugal para assinalar 'biscoitos' na classe 30, Kambly S.A. Spécialités de Biscuits Suisses, cfr. respectivo site do INPI em https://iustica.qov.pt/Reqistos/Propriedade-lndustrial/Marca.. 48. Os Ovos Moles de Aveiro são vendidos em embalagens como as juntas aos autos, que dão por reproduzidas, onde figura o sinal […], como ilustram asseguintes imagens extraídas das ditas embalagens: […] 49. A Sardinha de Peniche e o Carapau Doce da Nazaré diferem entre si no formato, tamanho, tonalidade e pormenores anatómicos, mas apresentam ambos a ‘pele’ mais lisa e escura que a dos Ovos Moles de Aveiro em forma de ‘peixinho’ ou de ‘peixão’, cfr. seguinte imagem extraída do doc. 17 da contestação junto a fls. 162v dos autos, que se dá por reproduzido: […] 50. Na Assembleia Geral Ordinária da A. de 6.04.2010 foi designadamente deliberado que a referida associada desta, A..., Lda. (pontos 27 e 37 do presente enunciado de factos), ‘pode produzir e comercializar hóstias com os formatos desejados, sempre que sejam diferentes das figuras que constam do Caderno de Especificações dos Ovos Moles de Aveiro- IGP, e desde que não as designe de hóstias para Ovos Moles’, cfr. doc. 6-C da contestação junto a fls. 154-156 dos autos, que se dá por reproduzido. 51. No processo de inquérito n° 129/18.9EACBR que correu termos no Departamento de Investigação e Acção Penal da Procuradoria da República da Comarca de Aveiro, consta o Parecer’ com a ref.ª DREAJ/DAJ/124/2020 de 24.08.2020, no qual se indica designadamente o seguinte, cfr. doc. 35 da petição inicial junto a fls. 203v-213 dos autos, que se dá por reproduzido: '[...] este produto vulgarmente designado por “ovos moles” poderá ser confeccionado e comercializado em qualquer lugar por quem tenha o conhecimento técnico adequado, sem que, por isso, possa incorrer no ilícito criminal por violação e uso ilegal de indicação geográfica protegida nos termos do artigo 324°, do CPI. Porém, a famosa apresentação deste produto em barricas de madeira ou faiança pintadas com desenhos que remetem para a Ria de Aveiro ou moldado por massa de hóstia branca com diferentes formas, que reproduzem os símbolos tradicionais da região de Aveiro, são uma característica específica e muito comum da aparência dos produtos certificados como IGP, ambas descritas no seu caderno de especificações, e que são tradicionalmente associadas pelo consumidor nacional à secular especialidade portuguesa que é típica da região de Aveiro. Por isso, mesmo que não ostente qualquer referência geográfica cremos que a comercialização de “ovos moles”, “doce de ovos" ou “doces regionais" em barricas com imagens alusivas àquela região ou envoltos em hóstia, ainda que com uma configuração diferente da prevista no caderno de especificações, poderá, mais a mais na área geográfica da produção de Ovos Moles de Aveiro, induzir o consumidor a estabelecer uma conexão imediata e espontânea com o produto de doçaria tradicional da região de Aveiro. […]’ 52. O formato de Ovos Moles de Aveiro envolvido em hóstia mais comercializado é a ‘barrica’, seguido da ‘amêijoa’. 53. O formato ‘peixinho’ dos Ovos Moles de Aveiro é comercializado por vários produtores, sendo o designado ‘peixão’ mais raramente usado e apenas comercializado por 3 das 43 associadas da A., entre as quais a Pastelaria Avenida. 54. Aveiro é normalmente associada ao bacalhau, biqueirão e bivalves (amêijoas, ostras…). 55. Peniche é normalmente associada à sardinha e a Nazaré ao carapau. 56. No recheio dos Ovos Moles de Aveiro são utilizados apenas gemas de ovos frescos, água e açúcar. 57. O formato ‘peixão’ dos Ovos Moles de Aveiro e respectivo recheio têm a seguinte aparência, visível no doc. 22 do requerimento inicial junto a fls. 177v-178 do procedimento cautelar apenso que se dá por reproduzido: […] O DIREITO 14. A primeira questão consiste em averiguar se o acórdão recorrido é nulo, por omissão de pronúncia. 15. A questão é suscitada pela suscitada pela Autora, agora Recorrente, na conclusão X do recurso de revista. X. Verificou-se uma total omissão de pronúncia à luz do art.º 615.º, al. d), ex vi do art.º 663.º, n.º 2 do CPC, considerando que o Tribunal Recorrido não se pronunciou sobre uma questão absolutamente fundamental da acção e recurso – a figura jurídica da evocação prevista na al. b) do art.º 13 do Regulamento da U.E. n.º 1151/2021, que se tornou no âmbito do direito da União Europeia e nos acórdãos do TJUE, um critério essencial na apreciação na tutela concedida às DOPs/IGPs. 16. Ora, a questão suscitada no recurso de apelação consistia em averiguar se a Ré tinha lesado os bens jurídicos protefidos pelo art. 13.º do Regulamento (UE) n.º 1151/21 e/ou pelo art. 306.º, n.º 1, alínea a), e n.º 4, do Código da Propriedade Industrial. O risco de evocação era aí só um argumento ou consideração e, ainda que o risco de evocação fosse aí algo mais que um argumento ou consideração, sempre o Tribunal da Relação lhe teria dado resposta, ao apreciar o risco de associação. 17. O Supremo Tribunal de Justiça tem entendido, constantemente, que deve distinguir-se entre os argumentos e as questões: aos argumentos, ou às considerações deduzidas pelas partes, o tribunal não tem de dar resposta especificada ou individualizada [1]; às questões, sim. “Para efeitos de nulidade de sentença/acórdão há que não confundir ‘questões’ com considerações, argumentos, motivos, razões ou juízos de valor produzidos pelas partes nos seus articulados, e aos quais o tribunal não tem obrigação de dar resposta especificada ou individualizada, sem com isso incorrer em omissão de pronúncia” [2]. 18. Como ensinava José Alberto dos Reis, “[s]ão, na verdade coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzido pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” [3]. 19. Ora, em primeiro lugar, a alegada questão elencada pela Autora, agora Recorrente, era só um argumentos ou consideração — o acórdão recorrido não tinha de lhe dar uma resposta especificada ou individualizada e, como não tivesse de lhe dar uma resposta especificada ou individualizada, não procede (nunca poderia proceder) a arguição da nulidade. 20. Em segundo, ainda que o risco de evocação fosse algo mais que um argumento ou que uma consideração, sempre o Tribunal da Relação lhe teria dado resposta, ao apreciar o risco de associação — concluindo concluir que “os pontos comuns são muito escassos e pouco valorizáveis face ao peso consistente e muito flagrante das diferenças”. 21. O Tribunal da Relação explicava que o risco de associação não se verificaria se o produto da Ré fosse vendido dentro de caixas, atentas as “diferenças substanciais ao nível das formas, das cores, das denominações e das indicações de proveniência” e não se verificaria, tão-pouco, se o produto da Ré fosse vendido fora das caixas, por duas razões: — por um lado, “porque a sua cor, detalhe e estrutura (presença de uma «espinha» em material que não tem a natureza de doce de ovos e que apresenta estrutura sólida e aparenta pretender emular a natureza) nada têm em comum com o produto da Recorrente”, — por outro lado, porque, “sendo o produto da Recorrida acondicionado em caixas e certamente vendido em caixas ou colocado para venda, em forma avulsa, em balcões que o identifiquem (não havendo razões nem factos provados que permitam crer que a Recorrida venda o seu produto a granel, sem nome, disfarçado, de forma clandestina e menos com referência ao produto da Recorrente), nenhuma razão subsiste para que […] consumidor médio pense estar a consumir ovos moles de Aveiro”. 22. O raciocínio desenvolvido pelo acórdão recorrido, ao apreciar a associação e o risco de associação, procde a pari para a evocação e para o risco de evocação: o consumidor médio apreende “normalmente uma marca como um todo, não procedendo a uma análise das suas diferentes particularidades”; ora, existindo “diferenças substanciais ao nível das formas, das cores, das denominações e das indicações de proveniência”, “[n]ão é prefigurável, nesse contexto, um consumidor tão desatento, distraído e desinteressado em saber o que come que não veja as substanciais diferenças de conjunto”. 23. Em resposta á primeira questão, dir-se-á, por isso que não se encontra razão alguma para anular o acórdão recorrido, por omissão de pronúncia. 24. A segunda questão consiste em determinar se a Ré lesou os direitos da protegidos pelo art. 238.º do Código da Propriedade Industrial. 25. A Autora, agora Recorrente, suscita a questão nas conclusões XV, XVI e XVII do recurso de revista: XV. O tribunal recorrido faz uma interpretação e aplicação errada do art.º 238 do CPI, ao comparar as caixas e as marcas Sardinhas de Peniche, Carapaus da Nazaré e com a dos Ovos Moles de Aveiro, em vez dos produtos em si e, em segundo lugar, ao desconsiderar a comercialização a avulso e fora da caixa que pode ser feita dos doces, como acontece a qualquer doce (seja regional ou não) quando são revendidos para pastelarias fora do local de origem (ex: pastelarias para turistas em Lisboa), onde as Sardinhas Doces poderão surgir em bandejas, sem caixas e qualquer outra identificação, ao lado de Pastéis de Tentúgal ou revendidos para restaurantes, onde são servidos individualmente; XVI. Face às elevadas semelhanças entre as marcas 3D de certificação da Recorrente e os doces Sardinhas de Peniche e identidade de produtos, resulta uma inevitável confusão, agravada pela notoriedade e reputação das marcas da Recorrente, pelo que tais doces constituem efectivamente imitação ao abrigo do art.º 238.º do CPI; XVII.Assim, o acórdão recorrido enferma do vício de erro na interpretação e aplicação das normas jurídicas constantes do disposto no art.º 238.º do CPI e na desconsideração dos critérios e princípios comummente adoptados em matéria de direito marcário pela doutrina e jurisprudência: a relevância da impressão global e desconsideração das diferenças insignificantes; os factores agravantes da notoriedade e prestígio dos Ovos Moles de Aveiro (nos formatos de hóstia típicos); o facto de serem produtos do mesmo género e apresentados como doces regionais. 26. O art. 215.º do Código da Propriedade Industrial define as marcas de certificação ou de garantia: 1. — Uma marca de certificação ou de garantia é um sinal determinado pertencente a uma pessoa singular ou coletiva que controla os produtos ou os serviços ou estabelece normas a que estes devem obedecer, no que respeita ao material, modo de fabrico dos produtos ou de prestação dos serviços, qualidade, precisão ou outras características dos produtos ou serviços, com exceção da respetiva origem geográfica. 2 — Este sinal serve para ser utilizado nos produtos ou serviços submetidos àquele controlo ou para os quais as normas foram estabelecidas. 3. — Aplica-se às marcas de certificação ou de garantia o disposto nos n.ºs 2 e 3 do artigo anterior. 27. Embora a definição das marcas de certificação ou de garantia apresente algumas especificidades, o regime da imitação ou da usurpação de marca do art. 238.º deve aplicar-se-lhes: 1. — A marca registada considera-se imitada ou usurpada por outra, no todo ou em parte, quando, cumulativamente: a) A marca registada tiver prioridade; b) Sejam ambas destinadas a assinalar produtos ou serviços idênticos ou afins; c) Tenham tal semelhança gráfica, figurativa, fonética ou outra que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão, ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto. 2. — Para os efeitos da alínea b) do número anterior: a) Produtos e serviços que estejam inseridos na mesma classe da classificação de Nice podem não ser considerados afins; b) Produtos e serviços que não estejam inseridos na mesma classe da classificação de Nice podem ser considerados afins. 3 - Considera-se imitação ou usurpação parcial de marca o uso de certa denominação de fantasia que faça parte de marca alheia anteriormente registada. 28. O acórdão recorrido confirmou aquilo que dissera o Tribunal de 1.º instância — que, em concreto, não havia risco de confusão ou, sequer, risco de associação entre as marcas da Autora e o produto da Ré. 29. O texto do art. 238.º do Código da Propriedade Industrial equipara expressamente o risco de associação e o risco de confusão e acórdão do STJ de 25 de Março de 2004 — processo n.º 03B3971 — esclarece que “[o] risco de confusão abrange também o risco de associação: existe risco de confusão não só quando os consumidores podem ser induzidos a tomar uma marca por outra e, consequentemente, um produto por outro, mas também quando, distinguindo embora os sinais, ligam um ao outro e, em consequência, um produto ao outro, acreditando erradamente tratar-se de marcas e produtos pertencentes a sujeitos com relações de coligação ou licença, ou de marcas comunicando análogas qualidades dos produtos”. 30. O Supremo Tribunal de Justiça tem considerado, constantemente, que deve atender-se a uma dupla semelhança: em primeiro lugar, deve atender-se à semelhança entre os elementos que constituem a marca e, em segundo lugar, à semelhança entre os produtos ou serviços designados pela marca (pelo conjunto dos elementos que constituem a marca) [4]. 31. Entre os critérios relevantes para a decisão sobre a confundibilidade estão o de que “[a] imitação de marca deve ser apreciada, menos pelas dissemelhanças que ofereçam os diversos pormenores isoladamente, do que pela semelhança que resulta do conjunto dos elementos que constituem a marca” [5] [6] e o de que, na apreciação da semelhança ou dissemelhança que resulta do conjunto dos elementos que constituem a marca, deve ser aplicado o padrão ou standard do consumidor médio [7], i.e., deve considerar-se a perspectiva de um “homem médio com a diligência normal de um consumidor representativo da massa geral do público” [8]. 32. Ora o conjunto dos elementos que caracteriza a marca da Autora, agora Recorrente, é diferente do conjunto dos elementos que caracteriza os produtos designados como Carapau doce da Nazaré, Sardinhas de Peniche ou Sardinhas doces de Peniche — designadamente, quanto ao aspecto, quanto á cor e quanto ao recheio.. Em primeiro lugar, o aspecto ou o desenho dos doces em forma de peixe é diferente — o peixinho e o peixão de Aveiro são desenhados de modo (muito) mais simples, sem pormenores, o Carapau doce da Nazaré e as Sardinhas doces de Peniche de modo mais pormenorizado [9]; em segundo lugar, a cor dos doces em forma de peixe é diferente — o peixinho e o peixão dos Ovos moles de Aveiro são (muito) mais claros, o Carapau doce da Nazaré e as Sardinhas doces de Peniche são mais escuros (mais cinzentos) [10] — e, em terceiro lugar, o recheio é diferente: enquanto que, “[n]o recheio dos Ovos Moles de Aveiro são utilizados apenas gemas de ovos frescos, água e açúcar” [11], os Carapaus doces da Nazaré têm um recheio de doce de ovos, de doce de morango e de crumble [12] e as Sardinhas doces de Peniche têm um recheio de doce de ovos, com uma espinha de crocante de amêndoa [13]. 33. As diferenças quanto ao aspecto, quanto à cor e quanto ao recheio dos doces são essenciais — tão essenciais que um “homem médio com a diligência normal de um consumidor representativo da massa geral do público” não correrá o risco de os associar, como “marcas e produtos pertencentes a sujeitos com relações de coligação ou licença” ou como “marcas comunicando análogas qualidades dos produtos”. 34. Em termos em tudo semelhantes aos do acórdão recorrido, contsta-se que “[n]ão se verifica o risco de erro, associação ou confusão ao qual o legislador quis obviar através da norma apreciada” e que tal risco não se verifica, “[s]obretudo, se tomarmos em consideração o facto de o consumidor médio apreender normalmente uma marca como um todo, não procedendo a uma análise das suas diferentes particularidades”. 35. Em resposta à segunda questão, dir-se-á que, em concreto, não há risco de confusão ou, sequer, risco de associação entre as marcas da Autora e o produto da Ré. 36. Em consequência, a Ré, agora Recorrida, não lesou os direitos da protegidos pelo art. 238.º do Código da Propriedade Industrial. 37. A terceira questão consiste em averiguar se, ainda que não tenha lesado os direitos protegidos pelo art. 238.º, a Ré infringiu as regras sobre denominações de origem e indicações geográficas do art. 13.º, n.º 1, do Regulamento (UE) n.º 1151/2012 e/ou do art. 306.º, n.ºs 1 e 4, do Código da Propriedade industrial. 38. A Autora, agora Recorrente, suscita a questão nas conclusões II-IX e XI-XIV do recurso de revista: II. A questão que se discute nos autos é complexa e inédita no nosso ordenamento jurídico português no que respeita ao domínio das Indicações Geográficas Protegidas, pois não está em causa o nome geográfico dos Ovos Moles de Aveiro IGP mas sim o seu formato exterior da apresentação tradicional das formas de hóstia com motivos marítimos; III. As IGPs e DOPs têm um regime próprio previsto no Código de Propriedade Industrial (doravante designado abreviadamente de “CPI”), que se diferencia claramente das marcas, sobretudo a nível do seu âmbito de proteção. Tal ocorre porque a sua função principal é garantir a qualidade dos produtos e evitar a sua degenerescência; IV. No que respeita em específico aos produtos alimentares, como os doces tradicionais objeto dos autos, aplica-se, além do 306.º do CPI, o Regulamento da U.E. n.º 1151/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho de 21 de novembro de 2012 relativo aos regimes de qualidade dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios; V. O acórdão recorrido concluiu que não existiu imitação das marcas figurativas de certificação, concluindo, consequentemente, que não existiria “sugestão” aos Ovos Moles de Aveiro nos termos previstos nas alíneas a) do 306.º do CPI, aplicando e interpretando indevidamente este preceito como se tratasse “da imitação” de uma marca, assente no pressuposto da confundibilidade; VI. A questão relevante consiste em saber: se o âmbito de proteção dos produtos (sejam eles alimentares ou não) protegidos por IGP ou DOP, abrangem a apresentação visual dos mesmos, designadamente, para efeitos de sugestão, mesmo que, em alguns usos possa não existir confusão quanto à origem geográfica dos produtos. Ou seja, se o termo “SUGIRA” previsto no art.º 306.º, al. a) pode resultar do formato tridimensional do produto protegido por DOP ou IGP e se a mesma pode ocorrer quando a verdadeira origem dos produtos seja mencionada e ainda que não exista risco de confusão; VII.A questão formulada tem, assim, uma enorme relevância jurídica, mas também relevância e repercussão social visto o impacto que tem na actividade desenvolvida pelos produtores de produtos tradicionais e regionais, protegidos por IGPs cuja aparência seja fundamental, como será o caso (além do caso dos autos) da grande maioria das IGPs de produtos artesanais (como são exemplos os Lenços de Namorados de Viana IGP e Camisola Poveira – Póvoa de Varzim IGP, onde a parte visual ou estética dos produtos impera; VIII. A interpretação e aplicação do art.º 306, al. a) e do art.º 13, al. b) do Regulamento e consequente análise do mesmo com os critérios do regime das marcas, como o fez o Tribunal Recorrido esvaziará em grande parte a utilidade do regime das IGPs de produtos artesanais ao ser conivente com a criação de produtos similares desde que a denominação geográfica sob o qual o produto é usado afaste a confusão com o local protegido pela IGP; IX. A permissão de um produto como as Sardinhas de Peniche e Carapaus da Nazaré não só afectam os produtores de Ovos Moles de Aveiro, os comerciantes dos mesmos, mas prejudica através da sua vulgarização e evocação os próprios Ovos moles de Aveiro, um produto tradicional português de renome, de que qualquer cidadão português tem orgulho. Consequentemente, lesa o património cultural e gastronómico nacional; […] XI. Ocorreu um erro na apreciação feita pelo TRL relativamente à violação do art.º 13.º do Regulamento citada ao entender que os produtos em causa não são “comparáveis” quando se está claramente perante produtos idênticos – doces; XII. O segundo erro consistiu no facto de o Tribunal a Quo ter partido da “análise feita sobre a possibilidade de imitação” de marcas para concluir que não há violação do art.º 13.º, al. a), b) e c) do Regulamento e do art.º 306.º, al. a) do CPI, preceitos que regulam apenas e somente as DOPs e IGPs; XIII. Impunha-se que o tribunal analisasse a existência de evocação da IGP, prevista na al. b) do art.º 13.º do Regulamento referido, sendo que existe já jurisprudência uniforme da U.E. que esclarece que pode existir evocação sem que haja qualquer risco de confusão; XIV. Existiria sempre evocação da IGP dos Ovos Moles de Aveiro devido: às elevadas semelhanças visuais, face à coincidência de serem doces, também revestido em hóstia, com um formato 3D de um peixe, recheio alaranjado, com o rebordo ou recorte de 3 a 5 mm; devido ao facto de serem apresentados como produtos regionais; à força distintiva e notoriedade que têm as figuras de hóstia 3D de motivo marítimo dos Ovos Moles de Aveiro e ainda à coincidência de todo o modo de produção, utilizando as folhas de hóstia, os ferros, as prensas, a forma como são depois enchidos, prensados e recortados. 39. O art. 13.º do n.º 1, do Regulamento (UE) n.º 1151/2012 dispõe: As denominações registadas são protegidas contra: a) Qualquer utilização comercial direta ou indireta de uma denominação registada para produtos não abrangidos pelo registo, quando esses produtos forem comparáveis aos produtos registados com essa denominação, ou quando tal utilização explorar a reputação da denominação protegida, inclusive se os produtos forem utilizados como ingredientes; b) Qualquer utilização abusiva, imitação ou evocação, ainda que a verdadeira origem dos produtos ou serviços seja indicada, ou que a denominação protegida seja traduzida ou acompanhada por termos como «género», «tipo», «método», «estilo» ou «imitação», ou similares, inclusive se os produtos forem utilizados como ingredientes; c) Qualquer outra indicação falsa ou falaciosa quanto à proveniência, origem, natureza ou qualidades essenciais do produto, que conste do acondicionamento ou da embalagem, da publicidade ou dos documentos relativos ao produto em causa, bem como contra o acondicionamento do produto em recipientes suscetíveis de dar uma impressão errada sobre a origem do produto; d) Qualquer outra prática suscetível de induzir o consumidor em erro quanto à verdadeira origem do produto. 40. Em complemento do art. 13.º do n.º 1, do Regulamento (UE) n.º 1151/2012, art. 306.º, n.ºs 1 e 4, do Código da Propriedade industrial dispõe: 1. — O registo das denominações de origem ou das indicações geográficas confere o direito de impedir: a) A utilização, por terceiros, na designação ou na apresentação de um produto, de qualquer meio que indique, ou sugira, que o produto em questão é originário de uma região geográfica diferente do verdadeiro lugar de origem; b) A utilização que constitua um ato de concorrência desleal, no sentido do artigo 10-bis da Convenção de Paris tal como resulta da Revisão de Estocolmo, de 14 de julho de 1967; c) O uso por quem, para tal, não esteja autorizado pelo titular do registo. […] 4. — É igualmente proibido o uso de denominação de origem ou de indicação geográfica com prestígio em Portugal, ou na União Europeia, para produtos sem identidade ou afinidade sempre que o uso das mesmas procure, sem justo motivo, tirar partido indevido do caráter distintivo ou do prestígio da denominação de origem ou da indicação geográfica anteriormente registada, ou possa prejudicá-las [14]. 41. O acórdão recorrido confirmou aquilo que dissera o Tribunal de 1.º instância — que, em concreto, não havia sugestão de que os produtos da Ré fossem originários da região de Aveiro ou de que, através dos produtos da Ré, se procurasse tirar partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio da denominação de origem Aveiro. 42. Entendeu-se que os produtos da Autora e não eram comparáveis aos produtos da Ré e que, ainda que fossem produtos comparáveis, nada nos Carapaus doces da Nazaré ou nas Sardinhas doces de Peniche evocava os Ovos moles de Aveiro. 43. A Autora, agora Recorrente, alega que os produtos são idênticos — doces — e que, sendo produtos idênticos, os Carapaus doces da Nazaré ou as Sardinhas doces de Peniche evocam os Ovos moles de Aveiro: “devido: às elevadas semelhanças visuais, face à coincidência de serem doces, também revestido em hóstia, com um formato 3D de um peixe, recheio alaranjado, com o rebordo ou recorte de 3 a 5 mm; devido ao facto de serem apresentados como produtos regionais; à força distintiva e notoriedade que têm as figuras de hóstia 3D de motivo marítimo dos Ovos Moles de Aveiro e ainda à coincidência de todo o modo de produção, utilizando as folhas de hóstia, os ferros, as prensas, a forma como são depois enchidos, prensados e recortados”. 44. O argumento pressupõe ou, em todo o caso, dá a aparência de pressupor que todo e qualquer doce de ovos cuja apresentação esteja ligada a motivos marítimos — ou, dentro dos motivos marítimos, a peixes — evoque os Ovos moles de Aveiro. 45. Ora não é e não deve ser assim: em Portugal, os doces de ovos são doces regionais de um conjunto significativo de localidades [15]; entre os motivos usados para a decoração dos doces regionais estão, frequentemente, motivos marítimos, como os peixes [16], entre os motivos marítimos usados para a decoração dos doces regionais da Nazaré e de Peniche, explica-se e justifica-se que estejam os carapaus e as sardinhas [17]. 46. Em lugar de uma evocação dos Ovos moles de Aveiro, os Carapaus doces da Nazaré e as Sardinhas doces de Peniche são só doces de ovos em que, autonomamente, se representa a relação das populações de duas localidades com o mar. 47. Em resposta á terceira questão, dir-se-á que, em concreto, não há evocação dos produtos protegidos pela indicação de origem protegida Ovos moles de Aveiro [18]. 46. Em consequência, a Ré, agora Recorrida, não infringiu as regras sobre indicações geográficas do art. 13.º, n.º 1, do Regulamento (UE) n.º 1151/2012 e/ou do art. 306.º, n.ºs 1 e 4, do Código da Propriedade industrial. III. — DECISÃO Face ao exposto, nega-se provimento ao recurso e confirma-se o acórdão recorrido. Custas pela Autora APOMA — Associação de Produtores de Ovos Moles de Aveiro. Lisboa, 6 de Julho de 2023 Nuno Manuel Pinto Oliveira (relator) José Maria Ferreira Lopes Manuel Pires Capelo ____ [1] Como se escreve, designadamente, no sumário acórdão do STJ de 27 de Março de 2014, no processo n.º 555/2002.E2.S1, “[p]ara efeitos de nulidade de sentença/acórdão há que não confundir ‘questões’ com considerações, argumentos, motivos, razões ou juízos de valor produzidos pelas partes nos seus articulados, e aos quais o tribunal não tem obrigação de dar resposta especificada ou individualizada, sem como isso incorrer em omissão de pronúncia”. [2] Cf. designadamente o acórdão do STJ de 27 de Março de 2014 — processo n.º 555/2002.E2.S1. [3] José Alberto dos Reis, Código de Processo Civil anotado, vol. V — Artigos 658.º a 720.º, Coimbra Editora, Coimbra, 1984 (reimpressão), pág. 143. [4] Cf. designadamente acórdão do STJ de 12 de Novembro de 2020 — processo n.º 320/17.5YHLSB.L2.S1. [5] Cf. acórdãos do STJ de 3 de Novembro de 1981 — processo n.º 069396 —, de 31 de Março de 1998 — processo n.º 98A180 —, de 26 de Junho de 2000 — processo n.º 00A1604 —, de 12 de Dezembro de 2002 — processo n.º 02A3030 —, de 18 de Março de 2003 — processo n.º 03A545 —, de 25 de Março de 2004 — processo n.º 03B3971 —, de de 12 de Novembro de 2020 — processo n.º 320/17.5YHLSB.L2.S1 — ou de 29 de Setembro de 2021 — processo n.º 422/17.8YHLSB.L1.S1. [6] Ideia que é de quando em quando expressa através da fórmula “[é] por intuição sintética e não por dissecção analitica que deve proceder-se a comparação das marcas” [cf. acórdãos do STJ de 3 de Novembro de 1981 — processo n.º 069396 — e de 18 de Março de 2003 — processo n.º 03A545]. [7] Cf. acórdãos do STJ de 13 de Maio de 1997 — processo n.º 96A609 —, de 31 de Março de 1998 — processo n.º 98A180 —, de 26 de Junho de 2000 — processo n.º 00A1604 —, de 25 de Março de 2004 — processo n.º 03B3971 —, de 12 de Julho de 2005 — processo n.º 05B2005 —, de 17 de Abril de 2008 — processo n.º 08A375 —, de 20 de Dezembro de 2017 — processo n.º 144/11.3TYLSB.L2.S2 — ou de de 29 de Setembro de 2021 — processo n.º 422/17.8YHLSB.L1.S1. [8] Expressão do acórdão do STJ de 29 de Setembro de 2021 — processo n.º 422/17.8YHLSB.L1.S1. [9] Cf. facto dado como provado sob o n.º 49. [10] Cf. facto dado como provado sob o n.º 49: “A Sardinha de Peniche e o Carapau Doce da Nazaré […] apresentam ambos a ‘pele’ mais lisa e escura que a dos Ovos Moles de Aveiro em forma de ‘peixinho’ ou de ‘peixão’”. [11] Cf. facto dado como provado sob o n.º 56. [12] Cf. facto dado como provado sob o n.º 36. [13] Cf. facto dado como provado sob o n.º 20. [14] Sobre os antecedentes do art. 13.º, n.º 1, do Regulamento (UE) n.º 1151/2012 e do art. 306.º, n.ºs 1 e 4, do Código da Propriedade industrial, vide por todos Alberto Francisco Ribeiro de Almeida, “Os interesses causantes do regime jurídico da denominação de origem”, in: Douro. Estudos e documentos, vol. 4.º (1999), págs. 61-81. [15] Cf. facto dado como provado sob o n.º 42: “Os cremes feitos à base de ovos e açúcar (ovos moles/doces de ovos) integram a receita de vários doces regionais portugueses e estrangeiros (designadamente de Espanha, Chile, Cuba, Venezuela e México), como os ‘PAPOS DE ANJO’ de Amarante […], os ‘OVOS MOLES’ do Algarve e os ‘PASTÉIS DE TENTUGAL’ […]”. [16] Cf. factos dados como provados sob os n.º 43 e 45. [17] Cf. factos dados como provados sob os n.ºs 54 e 55. [18] Ou seja: ainda que os produtos fossem comparáveis, por serem doces, ou por serem doces revestidos em hóstia, ainda que os produtos tenham a semelhança resultante de terem o formato tridimensional de um peixe, ainda que o formato tridimensional de um peixe evoque motivos marítimos e ainda que os motivos marítimos estejam presentes nos ovos moles de Aveiro, os concretos produtos agora considerados — carapaus doces e sardinhas doces — não evocam os ovos moles de Aveiro, no sentido do art. 13.º, n.º 1, do Regulamento (UE) n.º 1151/2012 e do art. 306.º, n.ºs 1 e 4, do Código da Propriedade Industrial. |