Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
191/17.1JELSB.L1-A.S1
Nº Convencional: 5.ª SECÇÃO
Relator: ANTÓNIO GAMA
Descritores: RECURSO PARA FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
TRÂNSITO EM JULGADO
TEMPESTIVIDADE
PRAZO DE INTERPOSIÇÃO DE RECURSO
REJEIÇÃO
Data do Acordão: 06/23/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO DE FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA (PENAL)
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Sumário :
O prazo de três dias úteis previsto no artigo 139.º/5º, CPC, apenas releva para o efeito de determinação do trânsito em julgado, se for exercido o direito conferido por tal norma.
Decisão Texto Integral:

Processo n. º 191/17.1JELSB.L1-A.S1

(Recurso extraordinário para fixação de jurisprudência)

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça:

I.

1. AA, arguido, interpôs recurso extraordinário para fixação de jurisprudência do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido em 14.12.2021, transitado em julgado, alegando encontrar-se em oposição com o acórdão do Tribunal da Relação de Évora de «06.10.2020, Proc. Nº 90/16.4JASTB.E1, Relator Desembargador Gomes de Sousa, publicado em www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/70627fe95d8a4cf3802586070039b6f2?OpenDocument».

2. No requerimento alega em conclusão (transcrição):

«1. O Douto Acórdão ora recorrido transitou em julgado.

2. Tendo sido suscitada pelo recorrente a questão do valor probatório das escutas telefónicas, veio o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa pronunciar-se sobre a matéria no acórdão agora sub judice, adoptando a posição de «que a intercepção de conversas telefónicas não constitui um mero meio de obtenção de prova, mas sim e, também, um meio de prova».

3. Acontece, porém, que o Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 06-10-2020, Proc. Nº 90/16.4JASTB.E1, Relator Desembargador Gomes de Sousa, publicado em www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/70627fe95d8a4cf3802586070039b6f2?OpenDocument, entende, tal como o ora recorrente, que as escutas telefónicas não são um meio de prova, são um meio de obtenção de prova. São uma forma de obter prova, não são a prova.

4. É neste Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 06-10-2020, Proc. Nº 90/16.4JASTB.E1, que o recorrente fundamenta o presente recurso para fixação de jurisprudência, propugnando a solução aí defendida, que subscreve integralmente.

5. Estamos, pois, perante manifesta oposição de julgados, com soluções antagónicas, no domínio da mesma legislação e, ademais, com identidade de situações de facto.

6. Pelo que estão reunidos todos os pressupostos para a admissão do presente recurso extraordinário de fixação de jurisprudência.

Em consequência, deve o presente recurso ser admitido considerado procedente e, em consequência, ser fixada jurisprudência no sentido de que as escutas telefónicas não são um meio de prova, são um meio de obtenção de prova; são uma forma de obter prova, mas não são a prova».

3. O Ministério Público junto do Tribunal da Relação de Lisboa respondeu nos seguintes termos (transcrição):

«1. O Recorrente não identificou, como lhe era exigível, os aspectos de identidade que alegadamente determinam a contradição invocada entre o Acórdão recorrido e o Acórdão fundamento.

2. O Acórdão Recorrido e o Acórdão Fundamento não se pronunciam sobre idênticas situações de facto, e como tal, não estamos perante dois acórdãos que, relativamente à mesma questão de direito, assentem em soluções opostas expressas.

3. A duas decisões apresentam distintos enquadramentos jurídicos à luz dos contornos da factualidade nelas apreciadas, pelo que, e de acordo com a nossa Jurisprudência mais conceituada, o Acórdão Recorrido e o Acórdão Fundamento não decidem em termos opostos sobre a mesma questão de direito.

4. Não se verifica, pois, a oposição de julgados pretendida pelo Recorrente.

5. Termos em que se tem de concluir pela não verificação dos requisitos legais previstos no artigo 437.º do Código de Processo Penal, por não estarmos perante dois acórdãos que, relativamente à mesma questão de direito, assentem em soluções opostas expressas.

6. O que constitui causa de rejeição do recurso, por inadmissibilidade legal, nos termos dos artigos 414.º n.º 2 e 420.º n.º 1 al. b), do C. de Processo Penal.

V. Exªs, porém, decidirão como fôr de Justiça!».

4. Neste Supremo Tribunal de Justiça o PGA promoveu o seguinte:

«(…) o acórdão recorrido foi notificado ao Ministério Público em 16.12.2021 e aos ilustres mandatários dos arguidos, por via electrónica em 15.12.2021, daqui resultando presumirem-se os arguidos notificados no dia 20.12.2021 (primeiro dia útil seguinte).

Assim sendo, aquela decisão colegial, por não admitir recurso ordinário nem ter sido objecto de reclamação nem de arguição de nulidades, transitou em julgado decorridos 10 dias após aquela data de 20.12.2021, ou seja, no dia 30 de Dezembro de 2021, pese embora o período das férias judiciais então em curso já que se trata de processo com arguidos presos – artigos 103.º, n.º 1 e 2, alínea a), e 104.º, n.º 2, do C.P.P.

Deste modo, sendo o prazo de interposição deste recurso extraordinário o de 30 dias, a contar do trânsito em julgado do acórdão proferido em último lugar, tal prazo findou no passado dia 31 de Janeiro (2ª feira, 1º dia útil seguinte ao do termo do prazo, 29/01-sábado, cfr. artigo 138.º, n.º 2, do C.P.C., ex vi do artigo 104.º, n.º 1, do C.P.P.).

Sucede que o recurso foi apresentado, como já referido, no dia 1 de Fevereiro de 2022, 1º dia útil após o termo do prazo legalmente previsto.

Assim, haverá lugar ao pagamento de multa que, por não ter sido imediato, dá origem ao acréscimo de uma penalização de 25% do valor da multa, tratando-se, como se trata, de acto praticado por mandatário, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 107.º-A, alínea a), do C.P.P., e 139.º, n.º 6, este do C.P.C».

5. Foi liquidada a multa, mas não procedeu o requerente ao seu pagamento.

6. Na vista a que se refere o art. 440.º/1, o Ministério Público sustentou o seguinte:

«Importa, pois, verificar a data em que efectivamente teve lugar o trânsito em julgado do acórdão de que foi interposto o presente recurso extraordinário de fixação de jurisprudência, independentemente do que possa vir certificado nos autos a tal respeito (sendo que na informação prestada em 17.02.2022, cfr. referência Citius 166827, se encontra a menção de que o acórdão ora sob recurso transitou em julgado em 19.01.2022).

Ora, resulta dessa mesma informação que o acórdão recorrido foi notificado ao Ministério Público em 16.12.2021 e aos ilustres mandatários dos arguidos, por via electrónica em 15.12.2021, daqui resultando presumirem-se os arguidos notificados no dia 20.12.2021 (primeiro dia útil seguinte).

Assim sendo, aquela decisão colegial, por não admitir recurso ordinário nem ter sido objecto de reclamação nem de arguição de nulidades, transitou em julgado decorridos 10 dias após aquela data de 20.12.2021, ou seja, no dia 30 de Dezembro de 2021, pese embora o período das férias judiciais então em curso já que se trata de processo com arguidos presos – artigos 103.º, n.º 1 e 2, alínea a), e 104.º, n.º 2, do C.P.P.

Deste modo, sendo o prazo de interposição deste recurso extraordinário o de 30 dias, a contar do trânsito em julgado do acórdão proferido em último lugar, tal prazo findou no passado dia 31 de Janeiro (2ª feira, 1.º dia útil seguinte ao do termo do prazo, 29/01/2022-sábado, cfr. artigo 138.º, n.º 2, do C.P.C., ex vi artigo 104.º, n.º 1, do C.P.P.).

Sucede que o recurso foi apresentado, como já referido, no dia 1 de Fevereiro de 2022, ou seja, no 1.º dia útil após o termo do prazo legalmente previsto para o efeito. Nessa medida, foi o recorrente notificado para proceder ao pagamento da multa devida pela prática do acto processual em causa, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 107.º-A, alínea a), do C.P.P., e 139.º, n.º 6, este do C.P.C.

Mostra-se decorrido o prazo estipulado para o efeito e não foi paga a multa devida (cfr. informação de 19.04.2022, com a referência 10787371), o mesmo é dizer não se poder ter por validamente praticado o acto de interposição deste recurso extraordinário de fixação de jurisprudência no tempo em que o foi, e, consequentemente ser o mesmo extemporâneo.

Pelo exposto, entende-se que o recurso extraordinário para fixação de jurisprudência deverá ser rejeitado, em conferência, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 438.º, n.º 1, 440.º, n.º 3 e 4, e 441.º, n.º 1, 1ª parte, todos do C.P.P.

7. Porque o M.º P.º suscitou questão nova, no exercido do contraditório, o requerente veio dizer:

«(…) tratando-se de decisão irrecorrível, era susceptível de reclamação até ao dia 4 de Janeiro de 2022. De facto, o prazo de 10 dias concedido para a reclamação terminava a 30 de Dezembro de 2021, a ela acrescendo o prazo de 3 dias úteis no decurso dos quais a reclamação podia ainda ser apresentada – cfr. artigo 139º do CPC e artigo 107º-A do CPP. Pelo que a reclamação poderia efectivamente ter sido apresentada até ao dia 4 de Janeiro de 2022. Sendo, pois, certo que, exactamente por essa razão, o trânsito em julgado não poderia nunca ocorrer antes disso. Como bem se decidiu no Douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13-12-2011, Proc. Proc. n.º 2738/01 - 5.ª Secção, Relator Conselheiro Carmona da Mota (consultável em www.pgdlisboa.pt/jurel/stj_mostra_doc.php?nid=12184&codarea=2), no qual se diz:

«Para que se opere o trânsito em julgado de uma decisão, que fazer acrescer aos prazos normais de interposição de recurso, e/ou arguição de nulidades e similares, o prazo máximo de condescendência fixado no art.º 145.º do CPC para a prática do acto com multa»

Vale isto por dizer que o presente recurso para fixação de jurisprudência poderia ter sido interposto até dia 03 de Fevereiro de 2022. Tendo sido interposto em 01 de Fevereiro de 2022, é tempestivo».

8. Colhidos os vistos e após conferência cumpre decidir, decisão que na fase preliminar do recurso se circunscreve a aquilatar da sua admissibilidade ou rejeição (art. 441.º, CPP).

II.

1. Os arts. 437.º/1/2/3 e 438.º/1/2, do CPP, assim como a jurisprudência pacífica deste STJ (PEREIRA MADEIRA, Código de Processo Penal, Comentado, 2021, p. 1402), fazem depender a admissibilidade do recurso extraordinário para fixação de jurisprudência dos seguintes pressupostos:

a) Formais:

1. Legitimidade do recorrente;

2. Interposição do recurso no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado do acórdão recorrido;

3. Identificação do acórdão com o qual o acórdão recorrido se encontra em oposição (acórdão fundamento), com menção do lugar da publicação, se publicação houver;

4. Trânsito em julgado do acórdão fundamento.

b) – Substanciais:

1. Que os acórdãos respeitem à mesma questão de direito;

2. Sejam proferidos no domínio da mesma legislação;

3. Assentem em soluções opostas a partir de idêntica situação de facto;

4. Que as decisões em oposição sejam expressas.

2. Quanto a estes dois últimos requisitos - soluções opostas a partir de idêntica situação de facto; decisões em oposição expressas -, constitui jurisprudência assente deste Supremo Tribunal que só havendo identidade de situações de facto nos dois acórdãos é possível estabelecer uma comparação que permita concluir, quanto à mesma questão de direito, que existem soluções jurídicas opostas, bem como é necessário que a questão decidida em termos contraditórios seja objeto de decisão expressa, isto é, as soluções em oposição têm de ser expressamente proferidas (ac. STJ 30.01.2020, proc. n.º 1288/18.6T8CTB.C1-A.S1, 5.ª, ac. STJ 11.12.2014, proc. 356/11.0IDBRG.G1-A.S1 – 5.ª) acrescendo que, de há muito, constitui também jurisprudência pacífica no STJ que a oposição de soluções entre um e outro acórdão tem de referir-se à própria decisão, que não aos seus fundamentos (ac. STJ 30.01.2020, proc. n.º 1288/18.6T8CTB.C1-A.S1, 5.ª, ac. de 13.02.2013, Proc. 561/08.6PCOER-A.L1.S1).

3. O recorrente tem legitimidade e interesse em agir, dado que a decisão recorrida negou provimento ao recurso que interpôs da sua condenação em matéria penal pelo tribunal de primeira instância, em 8 (oito) anos de prisão, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado (art. 21.º/1, e 24.º/al. j, DL 15/93).

4. Em tema de tempestividade do recurso, a questão a decidir no caso, consiste em saber quando transita em julgado a decisão, concretamente, se nesse cômputo entra em linha de conta «o prazo de 3 dias úteis no decurso dos quais a reclamação podia ser apresentada», como sustenta o recorrente, ou se, como sustenta o M.º P.º, esse prazo não entra em linha de conta quando, como no caso, o acórdão recorrido não foi objeto de reclamação nem de arguição de nulidades.

5. A primeira parte do n.º 1 do artigo 441º do Código de Processo Penal manda rejeitar o recurso para fixação de jurisprudência se ocorrer motivo de inadmissibilidade ou o tribunal concluir pela não oposição de julgados. O CPP estabelece, em caso de rejeição do recurso, que o acórdão se limita a identificar o tribunal recorrido, o processo e os sujeitos processuais e a especificar sumariamente os fundamentos da decisão (art. 420.º/2, ex vi art. 448º).

6. No caso verifica-se motivo de rejeição do recurso. Vejamos:

As decisões judiciais consideram-se transitadas em julgado logo que não sejam suscetíveis de recurso ordinário, sendo que no caso de decisões inimpugnáveis, como sucede relativamente ao acórdão recorrido, o trânsito ocorre findo o prazo para arguição de nulidades ou apresentação de pedido de correção da sentença, ou seja, o prazo-regra fixado no art. 105º/1, CPP, dez dias (ac. STJ de 25.06.2009, disponível em www.dgsi.pt).

À contagem dos prazos para a prática de atos processuais aplicam-se as disposições da lei do processo civil (art. 104.º/1, CPP). De acordo com o art. 138.º/1, CPC, que o prazo processual, estabelecido por lei é contínuo, suspendendo-se, no entanto, durante as férias judiciais, salvo se a sua duração for igual ou superior a seis meses ou se tratar de atos a praticar em processos que a lei considere urgentes. E, no n.º 2, quando o prazo para a prática do ato processual terminar em dia em que os tribunais estiverem encerrados, transfere-se o seu termo para o 1.º dia útil seguinte. Finalmente, no n.º 4, diz-se que o regime dos números anteriores, se aplica aos prazos para a propositura de ações.

7. Em matéria de regras gerias de notificações o artigo 113.º/11/12, CPP,º estabelece que, as notificações ao advogado ou ao defensor nomeado, quando outra forma não resultar da lei, são feitas por via eletrónica, nos termos a definir em portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça, ou, quando tal não for possível, nos termos das alíneas a), b) e c) do n.º 1, ou por telecópia; quando efetuadas por via eletrónica, as notificações presumem-se feitas no terceiro dia posterior ao do seu envio, quando seja útil, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja.

8. O acórdão recorrido foi notificado ao Ministério Público em 16.12.2021 e aos mandatários dos arguidos, por via eletrónica em 15.12.2021, daqui resultando presumirem-se os arguidos notificados no dia 20.12.2021 (segunda feira, primeiro dia útil seguinte). Assim, a decisão recorrida, por não admitir recurso ordinário (art. 400.º/1/f, CPP), nem ter sido objeto de reclamação nem de arguição de nulidades, transitou em julgado decorridos 10 dias após aquela data de 20.12.2021, ou seja, no dia 30 de dezembro de 2021, pese embora o período das férias judiciais então em curso já que se trata de processo com arguidos presos (artigos 103.º/1/2/a, e 104.º/2, CPP.

9. Aqui, entra a discordância do recorrente, citando o acórdão STJ de 13.12.2001 – e não de 2011, como por lapso refere – que seguindo a conhecida posição de Abílio Neto, no Código de Processo Civil Anotado, decidiu, e passamos a transcrever o ponto II do seu sumário, que «para que se opere o trânsito em julgado de uma decisão, há que fazer acrescer aos prazos normais de interposição de recurso, e/ou arguição de nulidades, o prazo máximo de condescendência fixado no art. 145.º», agora 139.º, CPC.

10. Essa não tem sido a posição atualmente seguida no STJ, nas diversas seções – Criminais, Cíveis e Social –; diversamente, vem sendo entendido que para efeito de determinação do trânsito em julgado o prazo de três dias úteis previsto no nº 5, do artigo 139º, CPC, apenas releva, se efetivamente for exercido o direito conferido por tal norma (coincidentes na solução ainda que não na fundamentação, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de fevereiro de 2004, proferido no processo nº 03A4156 (VI - O prazo suplementar de três dias a que se refere o art.º 145º, n.º 5, do Cód. Proc. Civil, não se soma ao prazo de interposição de recurso ou de reclamação para efeito de determinação da data do trânsito em julgado da decisão judicial, apenas destruindo os efeitos do caso julgado já produzido se no decurso desses três dias for praticado algum ato processual nos termos referidos em tal dispositivo, e que mostra claramente que o legislador continua a considerar o prazo inicialmente fixado para a prática dos atos processuais, nomeadamente para a interposição de recurso ou reclamação, como um prazo autónomo que se mantém inalterado, apenas concedendo por mera tolerância condicional um outro, subsequente, em condições que indica, mas que não impede que o primeiro se extinga. Ou seja, a concessão desse prazo suplementar de três dias não constitui alargamento do prazo que existia, mas o aditamento de um outro prazo que tem por objetivo apenas o de destruir os efeitos do caso julgado já produzido pela decisão no termo do prazo de dez dias, na condição de no decurso dos três dias úteis subsequentes ser praticado o acto processual nas circunstâncias determinadas no mesmo dispositivo, funcionando assim como uma espécie de condição resolutiva que origina que, decorrido o dito prazo de três dias sem a prática do acto processual ou sem o pagamento da multa apesar da sua prática, a decisão se considere definitiva desde o termo do prazo de dez dias para reclamação ou recurso, reportando-se o trânsito em julgado a esse termo, já ficando porém esse trânsito nessa data sem efeito se algum ato processual for efetivamente praticado no dito prazo suplementar nas condições indicadas naquele dispositivo), e de 15 de Novembro de 2006, proferido no processo nº 06S1732 (É certo que o n.º 5 do artigo 145.º [agora 139.º] do Código de Processo Civil permite que, independentemente de justo impedimento, o ato processual sujeito a prazo perentório possa ainda ser praticado depois de decorrido esse prazo, desde que a prática do ato ocorra dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo perentório, ficando a sua validade dependente do pagamento de multa. No mesmo sentido os acórdãos STJ de 27.05.2021, de 11.03.2021, de 22.09.2016, de 18.02.2010, de 25.06.2009, de 2.07.2009, de 27.11.2008, de 23.01.2008, de 17.01.2007 (seções criminais).

11. Não entrando em linha de conta o prazo de três dias, porque não usado, sendo o prazo de interposição deste recurso extraordinário o de 30 dias, a contar do trânsito em julgado do acórdão proferido em último lugar, tal prazo findou no passado dia 31 de Janeiro (términus inicial em 29.01.2022, sábado, passou para a 2ª feira, 1.º dia útil seguinte 31.01.2022, art. 138.º/2, C.P.C., ex vi art. 104.º/1, CPP).

12. Interposto o recurso de fixação de jurisprudência no dia 1 de fevereiro de 2022, ocorreu no 1.º dia útil, após o termo do prazo legalmente previsto para o efeito (art. 438.º/1, CPP). Notificado para proceder ao pagamento da multa devida pela prática do ato processual em causa, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 107.º-A/a, CPP e 139.º/6, CPC, o requerente sustentou a posição já referida e deixou decorrer o prazo estipulado para o efeito e não pagou a multa devida (cf. informação de 19.04.2022, com a referência 10787371). Assim, a interposição do presente recurso extraordinário de fixação de jurisprudência não foi tempestiva, mas verificou-se depois de decorrido o prazo legal, o que constitui motivo de inadmissibilidade legal do mesmo, conducente à sua rejeição (arts 438.º/1, 440.º/3/4, e 441.º/1, 1ª parte, CPP).

III.

Nestes termos e com tais fundamentos, acorda-se em rejeitar o recurso.

Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 7 UCs a que acresce o pagamento de 4 UCs a título de sanção processual – artigos 448º e 420º, n.º 3.

*

Supremo Tribunal de Justiça 23 de junho de 2022.

António Gama (Relator)

Orlando Gonçalves

Eduardo Loureiro (Presidente de Seção)