Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
533/14.1TBPFR.P2.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: ABRANTES GERALDES
Descritores: CONFIANÇA PARA FUTURA ADOÇÃO
PROMOÇÃO E PROTEÇÃO DE MENORES
AUDIÇÃO DOS MENORES
Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 10/18/2018
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL – DIREITO DA FAMÍLIA / ADOPÇÃO / CONFIANÇA COM VISTA A FUTURA ADOPÇÃO.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGO 1978.º, N.ºS 1, ALÍNEA D) E 4.
LEI DE PROTECÇÃO DE CRIANÇAS E JOVENS EM PERIGO, APROVADA PELA LEI 147/99, DE 01-09: - ARTIGOS 3.º, 4.º, N.º 1, ALÍNEA C), 35.º, 62.º-A E 84.º.
REGIME GERAL DO PROCESSO TUTELAR CÍVEL, APROVADO PELA LEI N.º 141/15, DE 08-09: - ARTIGOS 4.º, 5.º E 35.º, N.º 3.
Referências Internacionais:
CONVENÇÃO EUROPEIA SOBRE DIREITOS DA CRIANÇA (CEDC): - ARTIGO 12.º, N.º 4.
Sumário :
I. Justifica-se a medida de confiança de quatro menores com vista a futura adoção numa situação em que designadamente se verifica o seguinte:

- Uma prolongada situação de incumprimento das responsabilidades parentais por parte de cada um dos progenitores, praticamente desde que os menores nasceram, sem perspetivas de melhoria, apesar da intervenção de entidades assistenciais, quer na fase em que interveio a CPCJ, quer depois da entrada em tribunal do processo judicial de promoção e proteção de menores;

- O internamento dos menores em estabelecimento desde há cerca de 4 anos, sem que tivessem surtido efeito medidas de correção do comportamento dos progenitores com vista a assumirem as suas responsabilidades parentais;

- O insucesso de medidas complementares que, num processo judicial instaurado em 2014, foram determinadas pela Relação em 2016, visando possibilitar a modificação estrutural do comportamento dos progenitores e evitar a medida de confiança dos menores com vista a futura adoção;

- A ausência de qualquer familiar em condições de assumir as responsabilidades parentais;

- A verificação de que aquela medida é a única suscetível de proteger os menores e tutelar os seus superiores interesses.

II. Num tal contexto, não se consideram violados os princípios por que se regem os processos de promoção e de proteção de menores, designadamente o da proporcionalidade e o da prevalência da família biológica.

III. Tão pouco se consideram violados os princípios da igualdade e da não discriminação em função do território onde habitam os progenitores e os menores quando se verifica que entidades assistenciais que exercem aí a sua atividade se interessaram, sem sucesso, pelo reforço da capacidade de ambos os progenitores cumprirem as responsabilidades parentais.

IV. A audição dos menores com menos de 12 anos de idade no âmbito de processos de promoção e de proteção deve ser casuisticamente analisada, não se revelando obrigatória nem necessária numa situação em que:

- Os menores tinham 9, 8, 5 e 3 anos de idade na data e que foi realizado o debate na 1ª instância que precedeu a sentença da 1ª instância;

- O processo está pendente em tribunal judicial há cerca de 4 anos;

- Há 3 anos que os menores se encontram numa situação de acolhimento institucional;

- E, de acordo com os factos apurados, evidenciam “sinais de sofrimento, com manifestações físicas e emocionais decorrentes do impacto da institucionalização prolongada”, estando “extremamente carentes de atenção individualizada”.

Decisão Texto Integral:
I - O MINISTÉRIO PÚBLICO instaurou processo especial de promoção e proteção de menores relativo aos menores:

- AA,

- BB,

- CC

e

- DD,

filhos de EE e de FF.

Em 15-5-14, foi aplicada aos menores AA, BB e CC a medida de apoio junto dos pais, pelo período de um ano.

Por despacho de 18-6-15, foi aplicada aos menores AA, BB e CC, a título provisório, a medida de acolhimento institucional.

Por despacho de 24-6-15, foi proferido despacho que confirmou a retirada do menor DD do agregado familiar dos pais pela CPG de ….

A Segurança Social propôs a aplicação aos 4 menores da medida de confiança com vista a futura adoção.

Foi determinada a notificação do Ministério Público e dos pais, nos termos previstos no art. 114° da LPCJP.

O Ministério Público apresentou alegações, propondo a aplicação aos menores da medida de confiança com vista a futura adoção.

A mãe dos menores, FF, pronunciou-se no sentido da prorrogação, por um ano, da medida de acolhimento residencial e o pai dos menores, EE, pronunciou-se no sentido da manutenção da medida de acolhimento residencial.

Foi realizado o debate judicial.

Foi proferida sentença que aplicou aos 4 menores a medida de confiança ao Centro de Apoio à Família, com vista a futura adoção, a durar até que seja decretada a adoção ou, excecionalmente, até que seja revista a medida; e inibiu os pais dos menores do exercício das responsabilidades parentais, proibindo as visitas por parte da família biológica aos menores, sem prejuízo da autorização concedida para os contactos entre irmãos.

Os pais dos menores interpuseram recurso de apelação e a Relação, por acórdão de 15-9-16, decidiu:

“Tendo em conta os elementos de prova recolhidos nos autos, os factos supra descritos, os princípios da prevalência da família e da interferência proporcional e mínima do Estado, sobretudo na limitação de direitos fundamentais de pais e filhos, julga-se:

a)Que deve manter-se atualmente a medida de promoção e proteção de acolhimento institucional, conjugada com apoio junto dos progenitores, se viverem em conjunto, ou separadamente, se viverem separados, por um ano, com avaliações de 4 em 4 meses, enquanto se consolida a aquisição pelos mesmos de competências, ficando eles obrigados a colaborar nesse processo, nos termos a seguir enumerados;

b) Que deve ampliar-se o plano de intervenção de forma a:

1 - Manter as visitas dos progenitores;

2 - Para além das visitas institucionais, permitir, com carácter progressivo, a ida e convivência dos menores com os pais uma vez por semana (num dos dias do fim-de-semana), primeiro, só durante o dia, depois alargando-se essa convivência a pernoitas com os progenitores, salvo de houver resultados negativos das idas antecedentes;

3 - Apoiar os pais na consolidação e estabilidade da sua convivência comum ou, se for caso disso, separadamente e, eventualmente, com o terceiro empenhado no apoio ao agregado familiar;

4 - Ajudar os pais a discernir o que deve e não deve fazer-se no relacionamento com os filhos.

Pelo exposto, julgando inverificados os pressupostos de legalidade estrita para a substituição da medida de acolhimento institucional pela medida de proteção de confiança com vista à adoção, revoga-se a decisão em crise, e:

1. Prorroga-se a medida de acolhimento institucional dos menores por mais um ano, com avaliações de 4 em 4 meses, e determina-se que esta seja executada em conjugação com as medidas anteriormente expostas.

2. Determina-se que se execute o seguinte plano de intervenção de apoio aos menores e aos pais:

a) Devem-se programar as saídas dos menores com os pais para fora da instituição, para além das visitas institucionais, nos termos supra referidos;

b) Devem apoiar-se os pais na consolidação e estabilização da sua convivência comum, ou ajudá-los, caso se verifique que o seu relacionamento acabou, a assumirem as suas responsabilidades parentais no contexto que vier a ser apurado, sem prejuízo da recuperação do parente de quem a mãe fala na sua alegação para este projeto de vida;

No apoio aos pais e a eventual terceira pessoa, poderá recorrer-se, nomeadamente, à intervenção de uma equipa de proximidade (como a Mundos de Vida), com vista:

- A ultrapassar ou minimizaras limitações habitacionais dos progenitores;

- A manter atividade profissional dos mesmos e aumentar a sua autonomização financeira;

- A ultrapassar as limitações de educação e de capacidade identificadas nos relatórios periciais (nomeadamente proporcionando-lhes condições práticas de imitação e referenciação a pessoas organizadas);

3. Determinar que o plano de intervenção:

- Deve ser de execução simples e adaptado às capacidades dos pais;

- Deve ser apoiado economicamente, em caso de necessidade;

- Deve ser executado com proximidade;

4. Nomear o IRS como entidade coordenadora da medida, em parceria:

a) Com a Casa de Acolhimento "Centro de Apoio à Família'', sobretudo quanto ao referido em 2. a) e b) supra;

b) Com as entidades públicas ou privadas convenientes, nomeadamente a Mundos de Vida e o CAFAP (Centro de Apoio Familiar e Aconselhamento Parental).

5. Deve solicitar-se ao ISS e à Casa de Acolhimento a remessa de informação de avaliação sobre a execução do plano em 90 dias”.

As entidades envolvidas na situação (a EMAT e o Centro de Acolhimento) procuraram executar o plano traçado, tendo a EMAT concluído que estavam esgotadas todas as possibilidades de intervenção em sede de promoção e proteção com vista ao desenvolvimento das competências parentais a fim de os menores regressarem para junto dos pais, propondo a aplicação da medida de confiança dos menores a uma instituição com vista a futura adoção.

Foi dado cumprimento ao disposto no art. 114°, n° 1, da LPCJP.

Foram apresentadas alegações pelo Ministério Público que concluiu pela aplicação aos menores da medida de proteção de confiança a instituição com vista a adoção.

Foram juntas as alegações dos pais dos menores, concluindo o pai pela aplicação da medida de acolhimento em instituição em conjunto com o plano de intervenção decretado; e concluindo a mãe no mesmo sentido e, caso assim não se entenda, pela aplicação de outra medida como a de acolhimento familiar ou de acompanhamento civil.

Foi realizado o debate judicial.

De seguida, foi proferida nova sentença que aplicou de novo aos menores a medida de confiança a instituição Santa Casa da Misericórdia de …de … (Centro de Apoio à Família) com vista a futura adoção, com duração até que seja decretada a adoção ou, excecionalmente, até que seja revista.

Os pais dos menores apelaram separadamente e os menores aderiram aos recursos interpostos pelos seus pais.

O Ministério Público contra-alegou, pugnando pela improcedência dos recursos.

A Relação julgou improcedentes ambos os recursos e confirmou a sentença.

Ambos os pais dos menores interpuseram recurso de revista, os quais foram admitidos como revistas excecionais. Em cada um deles suscitam-se, no essencial, as seguintes questões:

- Nulidade por omissão de pronúncia quanto à apreciação da impugnação da decisão da matéria de facto, por forma a concluir-se que não foi dado cumprimento ao acórdão da Relação de 15-11-16, uma vez que o recorrente, no recurso de apelação, indicou com exatidão as passagens relevantes dos depoimentos gravados;

- O tribunal valorou depoimento indireto, devendo ser ouvidos os vizinhos que prestaram declarações;

- Impugna a decisão de confiança dos menores com vista a adoção, uma vez que os factos provados não legitimam as conclusões de que os pais dos menores puseram em perigo os menores ou demonstraram manifesto desinteresse por eles, sendo manifesto o erro de julgamento quanto á violação do princípio da atualidade;

- Não existe matéria que permita aferir se o défice parental se mantém ou se foi dirimido, tanto mais que os relatórios sociais apontam para melhorias significativas, justificando decisão diversa;

- Foi violado o princípio da proporcionalidade da medida de confiança com vista a futura adoção, a qual é excessiva, desadequada e desproporcional, sendo de determinar como único recurso depois de esgotadas as demais medidas possíveis;

- Foi violado o princípio constitucional da igualdade e da não discriminação em função do território onde o progenitor habita, considerando que nesta não existem instituições e associações capazes de darem o apoio que os pais precisam;

- Foi violado o princípio da responsabilidade parental e da prevalência da família, uma vez que não está demonstrado que os progenitores sejam atualmente incapazes ou ineptos para prover aos cuidados básicos dos menores, de forma autónoma ou com intervenção e ajuda de terceiros;

- Foi violado o princípio da prevalência da família, porquanto não foram dados aos progenitores meios e apoios que se impõem num Estado de Direito e que teriam se residissem noutra zona do país e não foram ponderadas medidas que não impliquem o corte dos vínculos parentais, como a medida de acolhimento familiar ou apadrinhamento civil;

- São fortíssimos os laços entre os menores e os seus progenitores que implicam que se impeça a confiança para futura adoção;

- Os menores, apesar de representados por defensores, nunca foram ouvidos ao longo do processo, o que viola o disposto nos arts. 12º e 13º da Conv. Europeia sobre Direitos da Criança e o art. 5º do RGPTC.

Houve contra-alegações por parte do Ministério Público, no sentido da confirmação do acórdão recorrido.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.


II – Factos que as instâncias consideraram provados:

1. A menor AA nasceu a 6-5-08 e é filha de EE e de FF.

2. A menor BB nasceu a 16-7-09 e é filha de EE e de FF.

3. O menor CC nasceu a 29-8-12 e é filho de EE e de FF.

4. O menor DD nasceu a 13-6-14 e é filho de EE e de EE.

5. Em 29-10-08, a situação da família foi comunicada à CPCJ de …, na sequência de uma participação crime feita pela progenitora contra o progenitor, onde refere ter sido por várias vezes agredida por este, tendo sido encaminhada para a Segurança Social, juntamente com a menor AA, onde lhes foi proporcionado alojamento.

6. Na altura, a progenitora estava desempregada e o progenitor fazia uns "biscates" na construção civil, sem efetuar descontos, e beneficiavam de proteção de RSI.

7. Entretanto, a AA foi integrada numa ama da Segurança Social.

8. A progenitora voltou para junto do progenitor.

9. O processo foi arquivado junto da Comissão, para além do mais, por se ter entendido que a relação do casal estava mais equilibrada.

10. Em Novembro de 2009, tal processo foi reaberto, tendo sido instaurado igualmente processo a favor da menor BB, uma vez que o agregado familiar estava numa situação de despejo iminente, sem água e sem luz.

11. Continuavam a beneficiar de RSI.

12. A CPO solicitou apoio às "GG" em géneros alimentares e leite, o que foi concedido.

13. Em Janeiro de 2010, a ama da AA reportou à CPO a falta de higiene/banho da menor.

14. Nessa altura, a AA permanecia na ama até cerca das 19.30 h, sendo que o horário estipulado era até às 17.30 h, por a mãe não trabalhar.

15. Era frequente ser o patrão do pai a ir buscá-la com autorização do pai.

16. Na altura, o rendimento do agregado familiar era de cerca de € 700,00, proveniente de RSI e prestações familiares.

17. Em 28-1-10, foi aplicada às menores a medida de apoio junto dos pais, pelo período de 6 meses.

18. Em 7-3-10, a progenitora apresentou nova denúncia contra o progenitor, alegando ter sido agredida, tendo a GNR sido chamada ao local.

19. Na altura, o progenitor apresentava-se alcoolizado e apelidava a progenitora de “puta” e “vaca”.

20. Apresentava um hematoma na cabeça, proveniente de uma pancada na cabeça que a progenitora lhe deu com uma garrafa de vidro.

21. A AA e a BB encontravam-se em casa, em duas camas distintas, e choravam.

22. Em Abril de 2010, após a mudança de casa do agregado familiar, a progenitora recusou uma visita domiciliária das técnicas da CPO.

23. Em 19-7-10, a medida de apoio junto dos pais aplicada pela CPCJ foi prorrogada por 6 meses.

24. Em 28-7-10, as ajudantes de ação direta do Núcleo Local de Inserção de … reportaram que, visando acompanhar o agregado de forma mais próxima, com o objetivo de tratar questões relacionadas com a gestão da vida quotidiana, não conseguiram contactar os progenitores, pois deslocaram-se a casa dos mesmos e estes, estando em casa, não abriram a porta.

25. Na altura, era frequente deslocarem-se ao café e deixarem as menores sozinhas em casa.

26. Em Agosto de 2010, as referidas ajudantes de ação direta conseguiram contactar a progenitora, tendo-lhes esta relatado que se mantinham os conflitos entre o casal, que o progenitor lhe batia frequentemente e que pretendia separar-se dele, mas que pretendia ficar na casa com as filhas, sendo o companheiro a sair.

27. Admitiu, na altura, que deixava as menores sozinhas para ir ao café.

28. A casa encontrava-se, no momento, muito desorganizada e suja.

29. Em Novembro de 2010, a progenitora solicitou o apoio da CPG por ter sido ameaçada pelo progenitor.

30. Nessa altura, e após intervenção da CPG, os progenitores comunicaram que iriam continuar a viver juntos, comprometendo-se a alterar os seus comportamentos.

31. Em Janeiro de 2011, a progenitora solicitou apoio na sequência de um episódio de violência com o progenitor, tendo sido acolhida com as menores, em vaga de emergência, sendo certo que, poucos dias depois, regressaram a casa.

32. Na mesma altura, as amas da AA e da BB reportaram que as menores apresentavam negligência ao nível da higiene e do vestuário, sendo por vezes uma das amas quem lhes dava banho e lavava a sua roupa.

33. A AA denotava, na altura, precisar de ser estimulada ao nível da linguagem, motricidade fina, autonomia e interiorização de regras.

34. Os pais não levavam às amas alimentos para as menores.

35. Em 1-2-11, a medida de apoio junto dos pais aplicada pela CPG foi prorrogada por 6 meses.

36. Em Fevereiro de 2011, mantinham-se as lacunas referentes à desorganização e falta de higiene na casa do agregado familiar.

37. As menores não frequentavam as amas, por os pais não disporem de alimentos para mandar às mesmas, nos termos acordados.

38. Em Junho de 2011, as menores apresentaram melhorias nas suas condições de higiene, mantendo-se, no entanto, a falta de higiene e organização do espaço habitacional.

39. A progenitora melhorou a sua colaboração em relação às visitas domiciliárias e participou com interesse nas ações de formação no âmbito da medida de RSI.

40. Em 20-6-11, a medida de apoio junto dos pais aplicada pela CPCJ foi prorrogada por 6 meses.

41. Nessa altura, as menores frequentavam novamente as amas, porque a sua alimentação passou a ser feita pelos serviços, recebendo as amas um subsídio para o efeito.

42. Em 9-1-12, por terem sido ultrapassados os 18 meses de intervenção da CPCJ, e tendo-se considerado que as fragilidades do agregado familiar poderiam ser trabalhadas no âmbito do acompanhamento da medida de RSI, foi deliberado arquivar os processos referentes às menores.

43. Em Abril de 1013, o processo referente às menores foi reaberto, tendo sido igualmente instaurado processo a favor do CC.

44. Na altura, a AA e a BB apresentavam lacunas ao nível da higiene, como um problema persistente de pediculose.

45. Na mesma altura, na sequência de uma discussão entre os progenitores, a progenitora atirou um copo ao progenitor, o qual acertou na BB, tendo-lhe feito um corte e hematoma na testa.

46. A progenitora limpou o ferimento da menor com uma toalha, não tendo providenciado por qualquer tratamento médico.

47. A progenitora solicitou a ajuda dos serviços para o tratamento da pediculose das menores, tendo estas sido acompanhadas por uma enfermeira da Unidade de Cuidados à Comunidade e pelas ajudantes de Ação Direta, durante cerca de 3 semanas.

48. No âmbito da ação "Acompanhamento na Educação dos Menores", foi constatado que os progenitores utilizavam como práticas punitivas a agressão física, tais como bofetadas.

49. O CC frequentava a ama, onde apresentava lacunas ao nível da higiene.

50. O agregado familiar beneficiava do acompanhamento de proximidade das Ajudantes de Ação Direta, com vista a serem sensibilizados para a adequada organização e higiene habitacional, assim como gestão adequada do orçamento familiar, sem que se verificasse uma evolução positiva.

51. A situação de pediculose continuada apresentada pelas menores levava ao seu isolamento escolar, por os outros pais pretenderem impedir o contágio dos seus filhos.

52. A escola, em parceria com a assistente social da "… 2000", realizou esforços para a melhoria da situação.

53. As menores relatavam na escola episódios frequentes da mãe lhes bater e de o pai bater na mãe.

54. Os pais nunca compareceram na escola, nem em reuniões previamente agendadas.

55. As menores levavam por vezes como lanche iogurtes fora de prazo, com datas bastante distanciadas.

56. Em 20-5-13, foi aplicada aos menores a medida de apoio junto dos pais, pelo período de 6 meses.

57. Em Julho de 2013, foi reportada a impossibilidade de proceder às visitas domiciliárias, por a mãe não se encontrar em casa.

58. Em 21-11-13, foi prorrogada por seis meses a medida de apoio junto dos pais.

59. No ano letivo de 2013/2014, as menores passaram a frequentar o Jardim de Infância da Escola Básica de …, onde continuaram a apresentar falta de higiene generalizada, mantendo-se o estado permanente de pediculose.

60. Apresentavam forte desconcentração e desatenção, pelo que foi tentado o contacto com os progenitores, através de recados escritos e contactos telefónicos, mas sem quaisquer resultados.

61. Em Janeiro de 2014, mantinha-se o acompanhamento aos progenitores através das Ajudantes de Ação Direta, no âmbito das ações de "apoio à organização da vida quotidiana" e "acompanhamento na educação das crianças".

62. Mantinha-se igualmente a dificuldade de contactar os progenitores.

63. O menor CC apresentava igualmente problemas de pediculose e de falta de higiene, sendo a ama quem lhes dava banho e tratava da troca de roupas.

64. Em Janeiro de 2014, os progenitores continuavam a sair durante a noite, deixando os menores sozinhos em casa, os quais, apercebendo-se de que estavam sozinhos, choravam.

65. Em Fevereiro de 2014, a AA e a BB eram acompanhadas pelo Serviço de Apoio à Família da Escola Básica de ….

66. Mantinha-se, nessa altura, a falta de cuidados ao nível da higiene e a pediculose constante.

67. Na altura, a AA relatava com bastante frequência que o pai batia na mãe, "que o pai e outros homens iam a umas mulheres que são umas vacas", que "a mãe estava na cama a namorar e a pinar com o HH, mas que o pai não podia saber" e que "estava a dar na televisão homens e mulheres sem roupa a pinar".

68. Relatou ainda que "ficava sozinha em casa, à noite, a tomar conta dos irmãos, enquanto a mãe ia ao café".

69. Em 7-4-14, a CPJC deliberou remeter o processo a Tribunal.

70. Em 15-5-14, foi aplicada aos menores AA, BB e CC a medida de apoio junto dos pais, pelo prazo de um ano e a rever em 6 meses.

71. Em 10-6-15, cerca das 4 horas da manhã, a progenitora chamou a GNR a casa do casal, alegando que o progenitor a ameaçara de que a matava, referindo que o mesmo chegava frequentemente a casa alcoolizado a altas horas da noite.

72. A progenitora estava, no momento, alcoolizada.

73. O progenitor acedeu ao pedido da GNR de sair, no momento, de casa.

74. Na altura, a residência apresentava-se suja e desarrumada.

75. Durante a ocorrência destes factos, os quatro menores estavam acordados e a andar pela casa de forma desorientada e a chorar.

76. O CC gritou, a chorar "oh pai, não batas na mãe", ao que esta respondeu, aos gritos, "cala-te filho da puta", tendo-se ouvido uma estalada e a criança a chorar novamente.

77. Quando a GNR abordou as vizinhas, a progenitora ameaçou-as, dizendo que tinham a cabeça a prémio e os dias contados.

78. Em Junho de 2015 o espaço habitacional mantinha graves lacunas ao nível da higiene e arrumação, encontrando-se roupa suja acumulada no chão, grande quantidade de louça com restos de comida na banca e diverso vestuário e sapatos espalhados pela casa.

79. Na altura, a progenitora estava desempregada há mais de dois anos.

80. O progenitor trabalhava, não fazendo descontos para o sistema de proteção da Segurança Social.

81. O agregado auferia € 465,66 mensais de prestação de RSI e € 211,14 de prestações familiares.

82. Ambos os progenitores mantinham, à data, hábitos alcoólicos.

83. A AA e a BB eram agredidas pelos progenitores, sendo que pelo menos a progenitora incitava as menores a esconder o sucedido.

84. A mãe deitava por vezes as menores sem lhes dar de jantar.

85. Tratava-as frequentemente por “putas” e “vacas”.

86. Em 18-6-15, foi aplicada aos menores AA, BB e CC, a título provisório, a medida de acompanhamento institucional, pelo período de 6 meses.

87. Na mesma altura, a CPCJ retirou o menor DD do agregado familiar, decisão que foi confirmada judicialmente no âmbito do processo apenso.

88. Aquando da sua institucionalização, a AA assumia-se como cuidadora dos irmãos, relatando que, quando os pais entravam em conflito, juntava os irmãos todos no mesmo quarto.

89. Atualmente, já interiorizou que há outras pessoas que assumem a tarefa de cuidar dos irmãos.

90. É uma criança inteligente, mas com dificuldades de concentração.

91. A BB apresenta comportamentos de desafio e oposição, tendo dificuldade em aceitar a imposição de regras.

92. A AA e a BB utilizavam com frequência a expressão “putas” e “vacas”, não entendendo a desadequação de tal linguagem.

93. O CC denota instabilidade e agressividade, estando a receber apoio ao nível da pedopsiquiatria.

94. O DD apresentava lacunas ao nível da estimulação, tendo evoluído de forma positiva.

95. Os menores reconhecem-se como irmãos e mantém vínculos afetivos entre si.

96. Desde o início do acolhimento, os progenitores apresentaram postura de colaboração com a equipa técnica da casa de acolhimento, relativamente ao agendamento das visitas.

97. Têm cumprido o plano de visitas estipulado que prevê uma visita semanal.

98. As crianças mostram-se ansiosas em relação às visitas dos pais, e a AA e a BB pedem com frequência para telefonar aos pais.

99. O CC fica choroso no fim das visitas, o que não acontece com o DD.

100. No decurso das visitas, os progenitores demonstraram uma interação adequada com os filhos, visível através de manifestações de afeto e recurso a brincadeiras adequadas à idade dos menores.

101. Nos aniversários da BB e do DD tiveram o cuidado de trazer bolo e prendas para as crianças, não descurando a atenção aos outros filhos.

102. Denotam alguma dificuldade em impor regras e limites, embora tenham demonstrado interesse pelas rotinas diárias dos filhos.

103. Os menores não têm noção do motivo da retirada da casa dos pais.

104. Mantêm vínculos afetivos com os progenitores, os quais não são passíveis de comprometer o sucesso da adoção.

105. Os progenitores são ambos divorciados e vivem em união de facto há mais de 10 anos, tendo nascido 4 filhos deste relacionamento, sendo que nenhum dos 4 filhos resultou de planeamento.

106. A progenitora é filha de pais separados e apresenta uma história pessoal sugestiva de disfuncionalidade familiar, acusando a mãe de ter casado com um seu namorado e de lhe ter ficado com o filho mais velho. Concluiu o 6º ano de escolaridade aos 14 anos e exerceu a profissão de …, com uma carreira contributiva irregular e curta.

107. A progenitora tem mais 2 filhos, um de 16 anos, que vive com o pai e não vê há cerca de 4 anos, e uma menina de 10 anos, que vive com os padrinhos em F…, e com quem não contacta pessoalmente há cerca de 4 anos.

108. A progenitora evidenciou à observação um nível intelectual situado na média inferior, alterações visuo-percetivas e de memória, de relevo, comprometendo a sua capacidade de aprendizagem.

109. Revela uma personalidade imatura, pouco reflexiva, insegura e passiva, a sua capacidade para efetuar escolhas e tomar decisões prejudicada pela ansiedade, depressão, pelo comprometimento emocional dos processos de análise e de resolução de problemas.

110. Apresenta dificuldades no planeamento e na sequenciação da sua ação, dificuldades em lidar com informação complexa, apresenta ainda sintomatologia clínica que justifica que seja alvo de acompanhamento psiquiátrico e psicológico.

111. A progenitora mantém há 8 anos uma relação disfuncional onde diz ter sido vítima de violência doméstica a partir do 1º ano de coabitação.

112. Manifesta uma problemática emocional relevante e que interfere com a sua adaptação ao quo característico das vítimas de violência doméstica.

113. O progenitor é o mais novo de uma fratria de dois irmãos, concluiu a 4ª classe aos 12 anos, tendo começado a trabalhar na construção civil com essa idade e, posteriormente trabalhou no ramo automóvel como … e voltou a trabalhar na construção civil.

114. O progenitor apresenta evidência de abuso de abuso de álcool a condução sob o efeito de substâncias, bem como, aparentemente, comportamento não responsável ao lidar com as penalizações sofridas.

115. O progenitor tem mais duas filhas, das quais nem sequer sabe as idades, nunca tendo contribuído para as despesas das mesmas.

116. Revela falta de envolvimento e compreensão das suas responsabilidades enquanto pai.

117. Apresenta uma personalidade pouco diferenciada, reduzido capital escolar e educativo.

118. É egocêntrico, pouco reflexivo e não tem noção do impacto do seu comportamento sobre os menores e sobre os outros, apresentando um nível cognitivo situado na média inferior, apresentando ainda um comportamento controlador da companheira.

119. O progenitor trabalha atualmente na empresa II, S.A., como servente da construção civil.

120. Aufere o salário mensal de € 530,00, acrescido de subsídio de refeição e duodécimos do subsídio de férias e de Natal.

121. Não existe qualquer membro da família alargada dos progenitores disposto a acolher os menores.

122. Em 21-12-16, os progenitores mantinham a residência na mesma habitação camarária onde foram realojados em Julho de 2014, um apartamento de tipo T-3, com boas condições a nível estrutural.

123. No dia 20-12-16, em visita domiciliária, a Equipa Técnica da Casa de acolhimento verificou que a habitação estava praticamente na mesma desde a última visita realizada e reportada aos autos, mantêm-se as infiltrações de humidade e as paredes sujas e riscadas, os quartos das crianças cheios de peluches muito sujos em resultado do pó acumulado e da humidade.

124. A casa estava muito fria e os progenitores só dispõem de um pequeno aquecedor que raramente utilizam para não agravar a despesa de eletricidade, mas a habitação estava organizada e mobilada com o essencial.

125. O progenitor mantém a atividade laboral, mas tem exercido a mesma fora do distrito do …, o que o obriga a passar, frequentemente, a semana fora, regressando a casa ao fim de semana.

126. A progenitora despediu-se, no dia 10-1-17, da fábrica de confeção têxtil, onde exercia funções de …, sendo que no dia 11 do mesmo mês iniciou atividade laboral noutra fábrica de confeção têxtil, como costureira, onde esteve à experiência até ao dia 10-2-17, contudo não soube precisar o valor do salário que iria auferir.

127. No dia 29-1-17, os progenitores foram informados de que a Equipa Técnica do Projeto Escolhas "Percursos (de)Talhados" teria possibilidade de realizar intervenção com os mesmos ao nível das competências parentais, tendo os mesmos evidenciado disponibilidade e interesse para a intervenção.

128. No dia 2-2-17, a TSS e Coordenadora do Projeto, contactou a Equipa Técnica da CA e confirmou o atendimento com a progenitora no dia 1 do mesmo mês.

129. De acordo com o relatório social de 8-2-17, os progenitores continuam a visitar regularmente os filhos na casa de acolhimento no Domingo, das 15 às 16 h, sendo assíduos e pontuais, sendo que nas suas visitas mostram interesse e afeto, embora continuem a evidenciar dificuldades ao nível das competências parentais.

130. As 4 crianças manifestam contentamento com as visitas dos pais.

131. Contudo, as 4 crianças têm vindo a evidenciar problemas de comportamento, sendo a AA "é muito perturbadora nas aulas"; o CC e a BB estão a ser acompanhados em consultas de pedopsiquiatria no Centro Hospitalar do …, sendo as consultas da BB semanais.

132. A primeira saída dos pais com as crianças para o exterior ocorreu para o exterior ocorreu no dia 18-12-16, com supervisão da TSS da CA, aquando da ida das crianças da CA a um espetáculo de Natal no Pavilhão Multiusos de …, para o qual foram convidados os progenitores das crianças acolhidas, sendo que no recinto do espetáculo, os menores ficaram ao cuidado dos progenitores, de modo a que fosse possível observar-se a interação entre pais e filhos num contexto externo à instituição.

133. A TSS da CA observou que os progenitores apresentaram dificuldades na imposição de regras e limites aos filhos, assim como na gestão dos seus comportamentos, sobretudo da BB e do CC, os quais desobedeceram continuamente às orientações dos pais.

134. A Técnica da CA observou o esforço feito pelos progenitores para atender a todos os pedidos dos filhos (compraram-lhes gorros de Natal, participaram nas atividades lúdicas que existiam no recinto e compraram-lhes lanches), assim como para manter uma postura e discurso adequados à situação.

135. A primeira saída das crianças com os pais para o exterior, sem supervisão, dada a proximidade da época natalícia, e em resultado do requerido pelos progenitores, ocorreu no Natal de 2016.

136. Segundo a Equipa Técnica da CA, no dia 24-12-16 os progenitores compareceram pontualmente na CA e as crianças saíram com os pais para passar o fim-de-semana, conforme previsto, manifestando um enorme entusiamo.

137. No dia 25-12-16, à chegada à CA, as crianças estavam tranquilas e visivelmente felizes; a AA, a BB e o CC despediram-se adequadamente dos pais, sem chorar, mas o DD chorou bastante com a separação.

138. Durante esse dia, o CC e o DD manifestaram recusa em realizar a refeição e choraram, sendo que a AA e a BB mantiveram um comportamento adequado.

139. Nos dias subsequentes à ida das crianças a casa, foi notória a instabilidade a nível comportamental.

140. A pessoa responsável pelo OTL de férias, frequentado pela AA e pela BB, informou que as crianças mantiveram um comportamento muito instável durante o dia, pois, para além da agitação motora, terão sido agressivas, física e verbalmente, entre si e com o grupo de pares, além de terem utilizado inúmeros palavrões com insultos dirigidos uma à outra.

141. As crianças foram chamadas à atenção pela Técnica da CA e a progenitora foi informada de toda a situação.

142. Durante a restante semana, a AA e o DD foram estabilizando, mas a BB e o CC mantiveram algumas alterações comportamentais, tais como, comportamentos de desafio e oposição, birras e verbalizações desadequadas à sua faixa etária, que, com o controlo do adulto e imposição de limites, foram sendo corrigidas e atenuadas.

143. A segunda saída das crianças com os pais para o exterior, sem supervisão, em resultado do requerido pelos progenitores, ocorreu na passagem de ano de 2016/17.

144. Segundo a Equipa Técnica da CA, nos dias 31-12-16, as crianças voltaram a sair com os progenitores para passarem o Ano Novo, conforme previsto. No dia 1-1-17, as crianças regressaram à CA bem cuidadas ao nível da higiene pessoal, mas denotando alguns sinais de instabilidade emocional, sendo que a AA despediu-se adequadamente dos pais, mas a BB, o CC e o DD demonstraram maior resistência ao momento de despedida, chorando.

145. Nesse dia, a progenitora informou a Técnica do Serviço Social da CA sobre duas situações que terão ocorrido em casa. O CC apresentava uma pequena nódoa negra na orelha direita e, de acordo com a progenitora, teria sido por ter caído "num buraco"; e o DD apresentava a mão inchada porque, de acordo com a progenitora, teria entalado a mão na porta do carro.

146. Na noite de Domingo, o DD demorou a adormecer, chorando e chamando pela mãe, assim como o CC, que chamava pelo pai. O DD apresentava uma pequena mancha no pescoço, do lado esquerdo, além do rabinho bastante assado, tendo-se queixado inúmeras vezes com dores durante a noite.

147. A AA e a BB, sobretudo a última, mantiveram comportamentos desafiadores e agitação motora.

148. Porque se suscitaram dúvidas relativamente às situações relatadas, estas foram exploradas junto das crianças no final do dia de Domingo e durante o dia de Segunda-Feira.

149. Na sequência destas visitas a casa dos pais, a Equipa Técnica da CA, com a colaboração a Equipa Educativa, apurou que as crianças verbalizaram junto da Equipa Educativa que, relativamente à orelha do CC, terá sido o pai que puxou a orelha da criança porque estava a portar-se mal no carro.

150. Quando o CC contou esta situação, a AA chamou-lhe "mentiroso" e ficou bastante transtornada.

151. Questionada diretamente sobre o porquê dessa reação, começou a chorar e confirmou o que o CC disse, afirmando que "a mãe disse para não contar, senão não íamos mais a casa".

152. Posteriormente, o CC verbalizou que ia sentado no banco da frente do carro e terá começado "a bater com os pés". A AA acrescentou que "o pai parou o carro e puxou a orelha do CC, mas ele ia a portar-se mal. Ele fez bem, não fez?".

153. A BB afirmou que o pai diz muitas asneiras e que quando o CC se porta mal, o pai diz "que merda é esta?".

154. O CC afirmou que, no carro, o pai e a mãe estariam zangados e que o pai chamou "filha da puta à mãe". Para além destas situações, o CC afirmou "eu andei de mota" e, segundo a BB ele "foi com o JJ de mota ao café (...) não levava capacete".

155. No dia 2-1-17, a progenitora contactou a CA para ter conhecimento de como as crianças se tinham comportado desde o regresso de casa. A Técnica de Serviço Social da CA informou que os comportamentos das mesmas se mantiveram instáveis, sendo que a instabilidade é visível sobretudo na BB e no CC.

156. A progenitora foi questionada sobre a assadura do DD, tendo esta informado que poderá ter sido "dos chocolates que comeu". A TSS questionou igualmente relativamente à mancha que a criança apresentava na parte de trás do pescoço, tendo a progenitora manifestado desconforto com a questão e justificado que "a única explicação que poderá ser é que o meu homem tenha raspado com o cigarro, sem querer".

157. Durante o contacto, a progenitora afirmou ser difícil estar atenta a todos os filhos "porque sei os filhos que tenho e eles não param".

158. Neste contacto, a progenitora voltou a afirmar que relativamente à orelha do CC, este "caiu à entrada no rego de escorrer a água" e acrescentou que "correu tudo bem a vinda a casa, não houve nada de mal" e questionou a Técnica se iria dar-se continuidade às saídas das crianças.

159. Foi-lhe transmitido que as visitas iriam manter-se na CA, como habitual, uma vez que houve autorização apenas para saídas nos períodos festivos de Natal e Ano Novo.

160. A progenitora mostrou-se transtornada face ao que lhe foi transmitido pela TSS da CA, afirmando que "até chorei a querer protegê-los para que nada lhes acontecesse e não consegui" e que se sentia "triste por os meninos terem ido assim".

161. De seguida, a progenitora falou com as crianças ao telefone, tendo-se percebido pelas verbalizações da AA que o DD "pode estar assim [com assadura] por ter bebido um copo cheio de coca-cola".

162. No dia 3-1-17, a Educadora Social da CA questionou o CC sobre o que teria sucedido à sua orelha, tendo este respondido de imediato "caí num buraco". Quando a técnica devolveu a questão em forma de interrogação, a criança afirmou que o pai "puxou-me a orelha e eu caí (...) portei-me mal".

163. Posteriormente, afirmou a uma colaboradora da Equipa Educativa que estaria a portar-se mal no carro e que o pai terá parado a viatura e puxado a sua orelha.

164. No dia 8-1-17, no final da visita dos progenitores às crianças, a psicóloga da CA realizou entrevista com os mesmos para esclarecimento das situações supra mencionadas.

165. Inicialmente, os progenitores negaram a existência de qualquer situação que pudesse ter colocado em causa o bem-estar físico e emocional das crianças.

166. Todavia, confrontados com as verbalizações das mesmas, não negaram a ocorrência de qualquer uma das situações, sendo que relativamente ao hematoma na orelha do CC reiteram a versão de que a criança caiu num "rego" em casa da D. KK, onde fizeram o jantar e almoço de Natal e Ano Novo, mas negaram qualquer agressão do progenitor à criança. Confirmaram que, nas deslocações de carro, o CC, embora na sua cadeira de transporte, era quem ocupava o lugar de passageiro da frente, enquanto a AA e a BB ocupavam o banco de trás, assim como a progenitora que transportava o DD ao colo.

167. Relataram que o CC adotava um comportamento agitado durante as deslocações, movimentando-se perigosamente, colocando os pés no tablier e abrindo a janela e, enquanto a progenitora repreendia a criança, sensibilizando-a para parar, o progenitor, por seu lado, dizia-lhe para "deixar o menino".

168. Confrontados os progenitores com a situação em que o CC terá andado de mota, sem capacete, com o JJ, filho da D. KK, aqueles desvalorizaram a situação, referindo que "não andou mais de 100 metros".

169. No que tange à assadura no rabo do DD, a progenitora referiu que pode ter sido originada por alguns descuidos alimentares, como consumo de chocolates, refrigerantes, etc., por a criança ter comido sopa com alho francês, ou por ter usado fraldas do supermercado …

170. Relativamente à marca no pescoço, a progenitora manteve a versão de que poderia ter sido o progenitor a fazê-la com a ponta do cigarro, sem intenção.

171. O progenitor adotou uma postura defensiva, afirmando que não fuma na presença das crianças, negando qualquer responsabilidade da sua parte, atribuindo-a a pessoas amigas com as quais interagiram no fim-de-semana.

172. Foi ainda abordado o episódio em que o DD entalou a mão na porta do carro, tendo os progenitores afirmado que as crianças estavam constantemente a pedir para ir para dentro do automóvel e que, num desses episódios, a BB terá fechado a porta do carro, não se apercebendo que o DD ainda tinha a mão por perto.

173. Os progenitores assumiram a falta de cuidado e responsabilidade para com a supervisão das crianças no fim-de-semana, mas foi notória a dificuldade de ambos em perceber a gravidade de cada uma das situações e identificar os comportamentos para lidar e/ou resolver as mesmas.

174. Os progenitores atribuem as dificuldades sentidas ao facto de terem a seu cargo 4 crianças, com idades muito próximas, utilizando essa justificação para se desculpabilizarem.

175. Esta postura de desresponsabilização dos progenitores é transmitida pelos mesmos aos menores, gerando-lhes ansiedade e dúvidas relativamente aos motivos do acolhimento.

176. O progenitor continuou a evidenciar consumo abusivo de álcool, associado a ciúmes exacerbados, agravado pela instabilidade conjugal e pelos conflitos geralmente desencadeados e intensificados pelas atitudes provocatórias da progenitora.

177. Todavia, a progenitora, junto dos técnicos, apresenta um discurso adequado e conhecedor das necessidades básicas das crianças, no dia-a-dia, mas tem uma postura contraditória, revelando baixas competências parentais.

178. Dos comportamentos das crianças, evidencia-se que a BB e o CC mantiveram até à data comportamentos instáveis e de oposição, assim como verbalizações agressivas e insultuosas direcionadas quer para o grupo de pares, quer para os adultos, em contexto institucional e em contexto escolar.

179. Em consequência das saídas das crianças com os pais, nas festividades de Natal e passagem de ano em 2016/17, foram suspensas tais saídas, mas mantiveram-se as visitas na CA com supervisão e continuaram a ser trabalhadas as competências parentais dos progenitores no contexto da visita dos mesmos na CA, com as limitações inerentes ao facto de as visitas só poderem ocorrer ao Domingo devido à situação laboral do progenitor.

180. Os progenitores dos menores, desde 2010, têm vindo a ser acompanhados pela equipa técnica do RSI, sendo que o acompanhamento contemplava um plano de intervenção prévia, visitas domiciliárias semanais realizadas pelas auxiliares de ação direta, cujos objetivos incidiam na gestão do orçamento familiar, organização doméstica, economia familiar, higiene pessoal, sensibilização do cumprimento de cuidados de saúde e sensibilização para a melhoria de dinâmica conjugal e familiar, todavia, desde Outubro de 2015 que o agregado não tem colaborado com a intervenção daquela equipa e com as visitas agendadas com a progenitora dos menores.

181. No dia 23-2-17, a Coordenadora do Projeto Escolhas "Percursos (de) Talhados - E6G" remeteu informação à CA por correio eletrónico com o seguinte:

"No dia 20 desde mês (segunda feira) logo pela manhã uma moradora do bairro (que vive de frente com a D. FF) solicitou os nossos serviços e em ponto de conversa esta informou-me que de sábado para domingo a filha acordou com o barulho de pessoas a discutirem na rua, quando veio espreitar à janela viu a D. FF a discutir com o marido e mais um casal. Mais tarde a (...) moradora no prédio da D. FF, veio-nos pedir ajuda e contou o que tinha acontecido. Que acordou com uma "discussão tão feia" ao ponto da D. FF partir o vidro do carro do marido e nesta confusão toda, estava um casal que segundo esta dormem sempre de sábado para domingo em casa deles. (...), pois todos os fins-de-semana é a mesma confusão. Disse ainda que a D. FF está por casa (por isso aquela informação que lhe passou de já estar a trabalhar é falsa) e que ela, até ele chegar, nunca se vê na rua nem se ouve barulho, só mesmo da TV, mas no momento em que ele chega a casa tratam-se bastante mal (...)".

182. Posteriormente, a Equipa Técnica da CA elaborou um Plano de Intervenção para a prevenção da negligência e promoção das competências parentais, remetido aos autos, na sequência do qual foi autorizada a saída das crianças com os pais durante a Páscoa, de 16 a 17-4-17, de acordo com o plano traçado.

183. A ida das crianças a casa na Páscoa correu bem, tendo as crianças regressado à CA bem cuidadas e calmas.

184. Em reunião com a Equipa Técnica da CA no dia 2-5-17, foi apurado que os progenitores quando orientados cumprem o plano de intervenção, mas quando deixam de ser orientados voltam ao início, não assimilam as orientações enquanto mudanças a serem implementadas.

185. Os progenitores não mostram evolução porque não interiorizam as novas práticas, mostram resistência a adquirir novos hábitos e apurou-se que o casal que pernoitava em casa dos progenitores seria a madrinha do DD e o companheiro.

186. No início do passado mês de Maio de 2017, pela SS e a Equipa Técnica da CA foi decidido que se autorizasse a saída das crianças para passar o fim-de-semana com os progenitores, quinzenalmente, com pernoita e nos fins-de-semana em que as crianças permanecessem na CA, dar-se-ia continuidade à supervisão e monitorização das visitas e, nesse contexto, proceder-se-ia à realização de atendimento com os progenitores, no sentido de se perceber quais as dificuldades sentidos pelos mesmos, trabalhando-se estratégias que lhes permitissem ultrapassar as dificuldades.

187. Desde 6-5-17, foram monitorizadas as saídas com os progenitores, com a colaboração da Equipa do Programa Escolhas "Percursos (de) Talhados - E6G" e nos fins-de-semana em que as crianças permaneceram na CA, deu-se continuidade à supervisão e monotorização das visitas nesse contexto.

188. No dia 11-5-17, a Equipa Técnica da CA recebeu informação por correio eletrónico da Equipa "Percursos (de) Talhados - E6G", da qual constava que:

"Na sequência do vosso pedido de informação acerca da situação do agregado dos menores AA, (…) BB, CC e DD, dado que os progenitores, FF e EE, não frequentam as atividades desenvolvidas pelo projeto no conjunto habitacional de junto dos moradores do bairro para averiguar informações acerca da dinâmica familiar.

Segundo os vizinhos, as confusões na habitação dos progenitores mantêm-se de forma muito frequente, sendo mais acentuadas ao fim-de-semana, quando se juntam com outro casal, sendo possível perceber que se encontram alterados e que consomem bebidas alcoólicas. Segundo os relatos, as discussões entre o casal são frequentes e é comum durante as mesmas a FF abrir a porta do apartamento e vir para as escadas do prédio, sendo por isso possível aos restantes moradores aperceberem-se das conversas entre os dois.

189. No dia 9-5-17, pelas 16 h, foi realizada uma visita domiciliária pelos técnicos da SS, sem aviso prévio, à habitação dos progenitores. A progenitora abriu a porta, mostrando-se desde logo muito aflita pela presença das técnicas do projeto, solicitando que a visita fosse realizada noutra altura, pois, ainda não tinha arrumado a casa, dado que estava a acabar de ver a telenovela e que tencionava fazê-lo logo de seguida e informou que o marido se encontrava a dormir, pois teria trabalhado durante a noite.

190. A casa apresentava-se em geral bastante desarrumada e suja, com um cheiro intenso, denotando desleixo e falta de cuidados regulares.

191. A cozinha estava desorganizada, com vários objetos espalhados e apresentando loiça suja acumulada na mesa, lava-loiça e balcão; a sala estava igualmente desarrumada, com roupa e outros objetos acumulados. A progenitora alegou que a máquina da roupa se teria estragado no dia anterior, o que justificava a desarrumação e as roupas acumuladas e verificavam-se ainda caixas vazias de bolo e outros itens, que a progenitora referiu serem da festa que preparou para a AA no fim-de-semana.

192. A casa de banho apresentava-se relativamente limpa e organizada; o quarto do CC e do DD tinha as camas feitas e estava minimamente organizado e o quarto da AA e da BB estava desarrumado, tinha as camas por fazer, sendo que a progenitora referiu que tencionava tirar os lençóis para os lavar, mas que ainda não o tinha feito porque a máquina não estava a funcionar; a habitação, apesar de reunir condições estruturais adequadas, não é limpa, arejada nem organizada regularmente.

193. O Projeto tem conhecimento de que a progenitora efetuou recentemente um pedido junto da Câmara Municipal de … para lhe ser atribuída uma casa para si e para os filhos, justificando que pretende separar-se do marido.

194. Esgotadas todas as possibilidades de intervenção na área de residência dos progenitores, a Equipa Técnica da CA deu início à implementação de um plano de intervenção, definido de acordo com as necessidades identificadas no agregado, onde foram trabalhadas as competências parentais dos progenitores, no contexto da visita dos mesmos aos filhos na CA.

195. Os dinamizadores do Plano de Intervenção foram: a Drª LL (Psicóloga), a Drª MM (Educadora Social), o Dr. NN (Psicólogo - Estagiário OPP), a Drª OO (Assistente Social - Estagiária IEFP), tendo sido os objetivos gerais do plano de intervenção promover uma parentalidade de sucesso que envolva respostas sensíveis às necessidades das crianças; explorar técnicas da educação não coercivas e estratégias de atenção positiva; treinar competências de comunicação com os progenitores, no sentido de definir regras, limites, punições e recompensas adequadas às necessidades das crianças; promover estratégias de regulação emocional e resolução de problemas; desenvolver estratégias parentais que promovam competências socio-afetivas nas crianças; sensibilizar os progenitores para o exercício do poder parental de forma responsável; proporcionar soa progenitores um espaço de partilha de ideias, experiências e dificuldades enquanto "educadores".

196. O Plano de Intervenção da Técnica da CA consistiu na intervenção através da supervisão discreta e neutra relativamente às interações familiares das visitas dos progenitores às crianças na CA, monitorizando as evoluções conseguidas e que pudessem ter reflexos no tipo de interação estabelecida.

197. E no final de cada visita dar aos progenitores informações sobre os seus progressos, assim como sobre os aspetos que precisam de ser trabalhados e o efeito dos mesmos na dinâmica familiar.

198. Com vista a uma parentalidade positiva, foram implementadas: em 26-2-17 foi realizada visita na CA com:

a) observação das dinâmicas familiares;

b) identificação de comportamentos parentais (des)adaptados;

c) feedback e psico-educação supervisionado pela Drª PP.

199. Em 5-3-17, foi realizada visita na CA com:

a) observação das dinâmicas familiares e aplicação dos conhecimentos adquiridos na sessão anterior;

b) feedback e psico-educação, supervisionada pelo Dr. NN.

200. Em 12-3-17, foi realizada visita na CA com:

a) observação das dinâmicas familiares e aplicação dos conhecimentos adquiridos na sessão anterior;

b) feedback e psico-educação, supervisionada pela Drª MM.

201. Em 19-3-17, foi realizada visita na CA com:

a) observação das dinâmicas familiares e aplicação dos conhecimentos adquiridos na sessão anterior;

b) feedback e psico-educação, supervisionada pela Drª PP.

202. Em 26-3-17, foi realizada visita na CA com:

a) observação das dinâmicas familiares e aplicação dos conhecimentos adquiridos na sessão anterior;

b) feedback e psico-educação, supervisionada pela Drª OO.

203. Em 2-4-17, foi realizada visita na CA com:

a) observação das dinâmicas familiares e aplicação dos conhecimentos adquiridos na sessão anterior;

b) feedback e psico-educação, supervisionada pela Drª OO.

204. Em 7-4-17, foi realizada visita no exterior da Instituição (Parque de …) com:

a) observação das dinâmicas familiares, em contexto natural, e aplicação dos conhecimentos adquiridos na sessão anterior;

b) feedback e psico-educação, supervisionada pela Drª PP e o Dr. NN.

205. Em 9-4-17, foi realizada visita na CA com:

a) observação das dinâmicas familiares e aplicação dos conhecimentos adquiridos na sessão anterior;

b) feedback e psico-educação, supervisionada pelo Dr. NN.

206. Em 4-4-17, foi realizada visita no exterior da CA, sem supervisão, (apenas no horário da visita - 15h às 16h) tendo em vista:

a) refletir com os progenitores sobre as dificuldades sentidas na dinâmica familiar durante a saída com as crianças;

b) monitorizar o comportamento das crianças após saída com os progenitores;

c) analisar o testemunho de cada criança sobre a dinâmica familiar aquando a visita no exterior; supervisionada pela Drª OO.

207. Em 15-4-17 a 16-4-17, foi realizada saída das crianças para passar o período festivo da Páscoa com os progenitores, em casa, sem supervisão, tendo em vista:

a) avaliação da dinâmica familiar em meio natural de vida, através da recolha de testemunho e análise do comportamento das crianças;

b) avaliar o progresso das competências parentais dos progenitores;

c) identificação de fatores de risco e de fatores de proteção.

208. Em 4-5-17, a equipa técnica concluiu haver necessidade de consolidação das competências parentais dos progenitores e da estabilidade da relação do casal, sendo que desde o início da implementação do Programa os progenitores têm vindo a manifestar resistência à mudança, nomeadamente, no que se refere à aquisição de estratégias e comportamentos adequados às necessidades das crianças, sendo que se verificam fragilidades ao nível da imposição de regras e limites e da supervisão e controlo das crianças.

209. Os progenitores não dão continuidade às estratégias sugeridas pelos técnicos, voltando a adotar os comportamentos observados antes da implementação do Programa.

210. Da informação de 26-7-17 resulta que os menores iniciaram saídas quinzenais com os progenitores no fim-de-semana de 6 e 7-5-17, conforme estipulado no Plano de Intervenção para a prevenção da negligência e promoção de competências parentais desenvolvido pela Equipa Técnica da Casa de Acolhimento.

211. Desde essa data, foram monitorizadas as saídas com os progenitores com colaboração da Equipa do Programa Escolhas "Percursos (de) Talhados - E6G".

212. Nos fins-de-semana em que as crianças permaneceram na CA deu-se continuidade à supervisão e monitorização das visitas neste contexto, sendo que das informações recolhidas e das observações em contexto institucional resulta que os progenitores não denotam evolução positiva no que se refere à aquisição de estratégias e comportamentos adequados às necessidades das crianças, verificando-se fragilidades ao nível da imposição de regras e limites e da supervisão e controlo das crianças, tendo-se verificado que, na ausência dessas orientações, os progenitores não dão continuidade às estratégias sugeridas, voltando a adotar os comportamentos observados antes da implementação do Programa.

213. No dia 25-7-17, a Equipa Técnica da CA recebeu informação por e-mail da Equipa da "Percursos (de) Talhados - E6G", da qual consta que: "(...) duas moradoras do bairro vizinhas da D. FF informaram-se que no sábado [dia 22-7-17, dia de saída das crianças com os progenitores], houve mais uma vez problemas entre o casal. Segundo elas, o marido da D. FF que está a trabalhar no Algarve (vem aos fins-de-semana) agrediu a D. FF e as crianças só gritavam com medo. Informaram que a D. FF como não se pode vingar nele depois vinga-se nas crianças começando aos berros com elas. Durante a semana dizem que a D. FF mete homens dentro de casa, inclusive o vizinho de cima onde ficam durante a noite a verem filmes pornográficos".

214. A Equipa Técnica da CA realizou um breve atendimento com a AA, sendo que abordada diretamente sobre o que teria sucedido no último Sábado, após saída da CA, espontaneamente relatou que os pais discutiram à sua frente e dos irmãos "e nós choramos (...) o pai disse à mãe que eu [AA] era filha de outro pai (...) que está em França (...) eu fiquei cheia de medo quando ele disse isso (...) a BB disse que não é minha irmã verdadeira (...) a mãe chamou a vizinha para dizer que eu [AA] não sou filha de outro pai (...) ela [a vizinha] disse que eu era filha doutro pai (...) a mãe chamou-lhe mentirosa".

215. Posteriormente, a progenitora terá dito ao progenitor para se acalmar e "não fazer isso em frente a nós [crianças]". De seguida terão ido para "o trabalho do pai (...) a minha mãe decidiu que era melhor irmos todos (...) brincamos lá".

216. Os progenitores omitiram a situação à Equipa Técnica da CA, no atendimento realizado no Domingo dia 24-7-17, aquando do regresso, e as crianças não abordaram esse assunto até serem questionadas diretamente.

217. Por decisão judicial de 28-7-17, as saídas das crianças com os progenitores foram suspensas por se ter considerado que o Plano de Intervenção para a prevenção da negligência e promoção das competências parentais desenvolvido pela Equipa Técnica da CA, não estava a ter resultados desejáveis e que as mesmas saídas comprometiam o bem-estar emocional das crianças.

218. Mantêm-se, desde essa data, as visitas em contexto institucional, semanalmente, ao Domingo, das 15h às 16h, com supervisão da Equipa Técnica da CA, sendo que a progenitora tem visitado os filhos semanalmente e o progenitor só o faz quinzenalmente por motivos laborais.

219. A AA encontra-se a frequentar o 4º ano de escolaridade na Escola EB1 de …, pertencente ao Agrupamento de Escolas n° 1 de ….

220. Encontra-se ainda inscrita no Centro de Saúde de Gondomar-Unidade de Saúde Familiar (USF) Renascer, tendo como médica assistente a Drª QQ.

221. Na consulta de Avaliação Global de Saúde (AGS) do dia 21-6-17, a Drª QQ informou que a AA apresenta um desenvolvimento normativo, embora o seu peso esteja acima do que é adequado, tendo aconselhado a manutenção de uma alimentação saudável e a prática de atividade física e encaminhou a AA para as especialidades de Otorrinolaringologia, Estomatologia, Pedopsiquiatria e Dermatologia no Centro Hospitalar do Porto.

222. A consulta de Otorrinolaringologia decorreu no dia 21-7-17, onde foi aconselhada a realizar limpeza nasal, diariamente.

223. A consulta de Pedopsiquiatria decorreu no dia 24-8-17, com a Drª RR, tendo encaminhado a menor para avaliação psicológica.

224. A AA beneficia de acompanhamento em Terapia da Fala no Hospital Escola da Universidade ….

225. A BB encontra-se a frequentar o 2º ano de escolaridade na Escola EB 1 de …, pertencente ao Agrupamento de Escolas n° 1 de ….

226. Encontra-se inscrita no Centro de Saúde de … - USF Renascer, tendo como médica assistente a Drª QQ, sendo que a última consulta de AGS ocorreu no dia 8-11-17, apresentando um desenvolvimento físico global adequado à faixa etária.

227. A BB iniciou acompanhamento na especialidade de Pedopsiquiatria no Centro Hospitalar do Porto, no dia 7-11-16, com a Drª SS, e, desde essa data, beneficia de consultas regulares, inicialmente com periodicidade quinzenal e atualmente com periodicidade mensal.

228. De acordo com a informação médica de 29-6-17, a BB fez avaliação psicológica - avaliação projetiva de relações familiares, apresentando a mesma dificuldade em aceitar limites educativos, em receber ordens, dificuldade em encontrar soluções para situações que lhe surgem, dirigindo a agressividade à distância às figuras parentais e evidência de rivalidade fraterna e com os pares.

229. Em Agosto de 2017, a BB beneficiou de Avaliação do Desenvolvimento Cognitivo com a Drª TT, revelando a existência de competências cognitivas de base que lhe permitem uma adaptação positiva a diferentes desafios contextuais e a aquisição de novas aprendizagens, todavia, foram verificadas algumas características no seu perfil cognitivo que poderá colocar um entrave à concretização desse mesmo potencial em atividades da vida diária, nomeadamente no contexto académico, conduzindo a processos de frustração com estratégias de evitamento e fuga.

230. Na consulta de pedopsiquiatria de 8-9-17, e na sequência das consultas anteriores e da agudização da sintomatologia apresentada pela criança, a BB iniciou medicação antidepressiva, sendo que a adaptação da criança à toma da medicação foi avaliada em consulta em 15-9-17 e reavaliada nas consultas posteriores de Outubro e Novembro, não se registando necessidade de alterações ao Plano Terapêutico definido.

231. O CC mantém-se integrado no Jardim-de-Infância de …, pertencente ao Agrupamento de Escolas n° 1 de ….

232. Encontra-se inscrito no Centro de Saúde de … - USF R…, tendo como médica assistente a Drª QQ, e a última consulta de AGS decorreu no dia 18-10-17, sendo que o CC apresenta um desenvolvimento global normativo com necessidade de manter os apoios terapêuticos de que já beneficia.

233. O CC iniciou acompanhamento na especialidade de Pedopsiquiatria no Centro Hospitalar do … no dia 4-4-16, com a Drª UU, o qual se mantém até à data, sendo que os progenitores foram envolvidos no acompanhamento às consultas e têm comparecido às mesmas juntamente com as Técnicas da CA.

234. De acordo com o Relatório Médico de 12-6-17, o CC foi observado na consulta, na qual foi constatado que o mesmo apresenta dificuldades na motricidade fina, na linguagem expressiva, na atenção, na representação gráfica corporal e autorregulação em determinados contextos, apresentando num primeiro contacto alguma inibição, sendo por vezes difícil de envolver, revela pouco prazer na relação e no jogo.

235. No mesmo relatório de Pedopsiquiatria, sublinha-se a necessidade de intervenção pela Terapia Ocupacional/Integração Sensorial, com a área da Linguagem a necessitar também de estimulação, com pouco prazer na relação e no jogo, cujo projeto de vida se torna urgente definir, uma vez que tem áreas de desenvolvimento afetadas.

236. Na entrevista com os pais, foi constatado que estes têm muitas dificuldades em aceitar a falha no processo emocional/educativo dos filhos no exterior.

237. Em 29-8-17 iniciou a consulta questionando os progenitores acerca das mudanças ocorridas desde a última consulta, tendo a progenitora informado da cessação de visitas e procurado responder às questões colocadas pela médica; já o progenitor adotou uma postura defensiva, optando por não responder às questões colocadas pela médica ou dando respostas evasivas.

238. A Drª UU sublinhou a importância de ser assegurado ao CC o acompanhamento por uma figura de referência na CA, preferencialmente do sexo masculino, sendo que o teste projetivo aplicado demonstrava que a criança tem um desenvolvimento cognitivo adequado à faixa etária e manifestava vontade de mudar, evidenciando também marcada rivalidade fraterna e dificuldade no controlo dos impulsos agressivos, sendo ainda constatado que o progenitor é indicado como figura de referência.

239. O CC iniciou acompanhamento em Terapia Ocupacional e Terapia da Fala na C..., Ldª, em 9-11-16, o qual se mantém até à data, com sessões semanais de ambas as áreas.

240. O DD integrou, no início do presente ano letivo, o Jardim-de-Infância de ..., pertencente ao Agrupamento de Escoais n° 1 de ....

241. Encontra-se inscrito no Centro de Saúde de Gondomar - Unidade de Saúde familiar (USF) Renascer, tendo como médica assistente a Drª QQ, e teve a última consulta de AGS no dia 28-6-17, sendo que mesmo apresenta uma evolução estalo-ponderal adequada à sua faixa etária, mas dada a instabilidade do mesmo a nível sócio-emocional, pautada por birras exacerbadas e agressividade nas suas reações e verbalizações em situação de frustração, foi o mesmo encaminhado para Pedopsiquiatria.

242. O DD iniciou acompanhamento em consultas de Pedopsiquiatria no Centro Hospitalar do …, no dia 7-8-17, com a Drª UU, e a próxima consulta ficou agendada para o dia 13-11-17, tendo os progenitores sido convocados.

243. Em 4-9-17, o DD foi avaliado psicologicamente pela Drª VV, tendo sido encaminhado para o Hospital de Dia.

244. Os menores têm vindo a evidenciar sinais de sofrimento, com manifestações físicas e emocionais decorrentes do impacto da institucionalização prolongada e mostram-se extremamente carentes de atenção individualizada, sendo bastante recetivos, correspondendo à troca de afetos com outras figuras de referência na CA.

245. Atualmente, o progenitor encontra-se a trabalhar numa empresa de construção civil com vínculo contratual, exercendo a atividade laboral em …, deslocando-se a casa quinzenalmente, aos fins-de-semana.


Não se provaram outros factos com interesse para a decisão da causa, designadamente não se provou que:

- A progenitora está disposta a realizar qualquer mudança na sua vida que lhe permita recuperar os filhos;

- A situação de conflito conjugal entre os progenitores foi motivada pela escassez de meios económicos e pela situação de desemprego e já se mostra ultrapassada;

- As ordens emanadas da Relação não foram tidas em conta pelos serviços de intervenção técnica;

- A intervenção se limitou a um único atendimento que partiu da iniciativa da progenitora;

- Não foram realizados mais atendimentos e as ações de formação não se realizaram.


III – Decidindo:

1. Suscitam os recorrentes a nulidade por omissão de pronúncia quanto à apreciação da impugnação da decisão da matéria de facto, por forma a concluir-se, através da reapreciação desta matéria, que não teria sido dado cumprimento ao primeiro acórdão da Relação.

No referido acórdão a Relação determinou, além do mais, o seguinte:

“Tendo em conta os elementos de prova recolhidos nos autos, os factos supra descritos, os princípios da prevalência da família e da interferência proporcional e mínima do Estado, sobretudo na limitação de direitos fundamentais de pais e filhos, julga-se:

a) Que deve manter-se atualmente a medida de promoção e proteção de acolhimento institucional, conjugada com apoio junto dos progenitores, se viverem em conjunto, ou separadamente, se viverem separados, por um ano, com avaliações de 4 em 4 meses, enquanto se consolida a aquisição pelos mesmos de competências, ficando eles obrigados a colaborar nesse processo, nos termos a seguir enumerados;

b) Que deve ampliar-se o plano de intervenção de forma a:

1 - Manter as visitas dos progenitores;

2 - Para além das visitas institucionais, permitir, com carácter progressivo, a ida e convivência dos menores com os pais uma vez por semana (num dos dias do fim-de-semana), primeiro, só durante o dia, depois alargando-se essa convivência a pernoitas com os progenitores, salvo de houver resultados negativos das idas antecedentes;

3 - Apoiar os pais na consolidação e estabilidade da sua convivência comum ou, se for caso disso, separadamente e, eventualmente, com o terceiro empenhado no apoio ao agregado familiar;

4 - Ajudar os pais a discernir o que deve e não deve fazer-se no relacionamento com os filhos.

Pelo exposto, julgando inverificados os pressupostos de legalidade estrita para a substituição da medida de acolhimento institucional pela medida de proteção de confiança com vista à adoção, revoga-se a decisão em crise, e:

1. Prorroga-se a medida de acolhimento institucional dos menores por mais um ano, com avaliações de 4 em 4 meses, e determina-se que esta seja executada em conjugação com as medidas anteriormente expostas.

2. Determina-se que se execute o seguinte plano de intervenção de apoio aos menores e aos pais:

a) Devem-se programar as saídas dos menores com os pais para fora da instituição, para além das visitas institucionais, nos termos supra referidos;

b) Devem apoiar-se os pais na consolidação e estabilização da sua convivência comum, ou ajudá-los, caso se verifique que o seu relacionamento acabou, a assumirem as suas responsabilidades parentais no contexto que vier a ser apurado, sem prejuízo da recuperação do parente de quem a mãe fala na sua alegação para este projeto de vida;

No apoio aos pais e a eventual terceira pessoa, poderá recorrer-se, nomeadamente, à intervenção de uma equipa de proximidade (como a Mundos de Vida), com vista:

- A ultrapassar ou minimizaras limitações habitacionais dos progenitores;

- A manter atividade profissional dos mesmos e aumentar a sua autonomização financeira;

- A ultrapassar as limitações de educação e de capacidade identificadas nos relatórios periciais (nomeadamente proporcionando-lhes condições práticas de imitação e referenciação a pessoas organizadas);

3. Determinar que o plano de intervenção:

- Deve ser de execução simples e adaptado às capacidades dos pais;

- Deve ser apoiado economicamente, em caso de necessidade;

- Deve ser executado com proximidade;

4. Nomear o IRS como entidade coordenadora da medida, em parceria:

a) Com a Casa de Acolhimento "Centro de Apoio à Família'', sobretudo quanto ao referido em 2. a) e b) supra;

b) Com as entidades públicas ou privadas convenientes, nomeadamente a Mundos de Vida e o CAFAP (Centro de Apoio Familiar e Aconselhamento Parental).

5. Deve solicitar-se ao ISS e à Casa de Acolhimento a remessa de informação de avaliação sobre a execução do plano em 90 dias”.

Ora, a matéria a que os recorrentes se reportam decorre, no essencial, de documentos e relatórios que foram juntos aos autos, tendo a Relação considerado que eram suficientes para aquilatar de que modo tinham sido cumpridas as diretrizes fixadas pelo seu acórdão anterior.

Ademais, saber se foram ou não foram cumpridas tais diretrizes acaba por constituir uma conclusão que deve extrair-se de outros factos com os quais a Relação se confrontou, tendo esta verificado ser desnecessário o acesso a outros meios de prova.

Como resulta dos autos, as entidades envolvidas na situação procuraram executar o plano traçado, ainda que tenham concluído que estavam esgotadas todas as possibilidades de intervenção em sede de promoção e proteção com vista ao desenvolvimento das competências parentais a fim de os menores regressarem para junto dos pais, acabando por propor a aplicação da medida de confiança dos menores a uma instituição com vista à sua futura adoção.

Acresce ainda que, como refere a Relação no segundo acórdão que agora está sob recurso, nenhum dos recorrentes impugnou os factos que a 1ª instância considerou provados e que estão identificados nos pontos 123, 127 a 129, 132, 135, 136, 143, 144, 164, 179, 180 a 182, 186, 187, 190, 195 a 209, 211 a 213, 215 e 219.

De tais pontos constam as diligências que foram feitas depois daquele primeiro acórdão da Relação, no sentido de recuperação por parte dos progenitores da possibilidade de empreenderem o exercício das suas responsabilidades parentais.

Ora, era a partir desses pontos que se poderia aquilatar se foram ou não realizadas ou tentadas diligências juntos dos mesmos, nos termos que foram determinados pela Relação. Não tendo sido impugnados, não se deteta efetivamente qual o interesse que existiria na reapreciação de prova testemunhal, relativamente ao cumprimento ou incumprimento por parte das instituições das determinações anteriores que constavam do acórdão da Relação.

O facto de as instâncias terem valorado depoimentos indiretos não é suscetível de impugnação perante este Supremo Tribunal, já que se trata de matéria sujeita à livre apreciação das instâncias.

Improcede por isso a arguida nulidade.


2. No que respeita à apreciação do mérito dos recursos, apresenta-se-nos a necessidade de reapreciar o modo como as instâncias regularam os interesses relativos a quatro menores, filhos biológicos dos recorrentes.

Este prolongado processo iniciou-se na instância judiciária em Abril de 2014, no âmbito do qual foi proferida uma primeira sentença da 1ª instância que decretou a medida de confiança com vista à adoção.

Todavia, no subsequente recurso de apelação, a Relação, sem deixar de reconhecer a gravidade da situação em que os menores se encontravam aquando da sua institucionalização e a gravidade do risco que corriam se acaso fossem entregues aos cuidados dos progenitores, decidiu, por acórdão de 15-9-16, ou seja, proferido há mais de 2 anos, que ainda haveria que aprofundar a situação. Assim, a par da revogação da sentença naquela parte, determinou a prorrogação da medida de acolhimento institucional dos menores por mais um ano, com avaliações de 4 em 4 meses, e especificou o tipo de medidas que deveriam ser adotadas e posteriormente avaliadas.

Segundo o referido acórdão, tais medidas seriam integradas num plano de apoio aos menores e aos progenitores e contaria com a programação de saídas dos menores com os pais para fora da instituição, para além das visitas no âmbito institucional. Ademais, deveriam apoiar-se os referidos progenitores na consolidação e estabilização da sua convivência comum, ou ajudá-los, caso se verificasse que o seu relacionamento acabou, a assumirem as suas responsabilidades no contexto que viesse a ser apurado, com intervenção de uma equipa de proximidade com vista a serem ultrapassadas ou minimizadas as limitações habitacionais dos progenitores, a manterem a atividade profissional, a aumentar a sua autonomização financeira e a ultrapassarem as limitações de educação e de capacidade identificadas nos relatórios periciais (nomeadamente proporcionando-lhes condições práticas de imitação e referenciação a pessoas organizadas).

Teve a Relação o especial cuidado de determinar que tal plano de intervenção fosse de execução simples e adaptado às capacidades dos pais, apoiado economicamente, em caso de necessidade e executado com proximidade.

Em suma, ante a gravidade pressentida dos efeitos da medida de confiança dos menores com vista à sua futura adoção, com o corte de relações com os progenitores, a Relação acabou por decretar uma solução que deu aos progenitores uma derradeira oportunidade (depois das medidas não judiciais e judiciais que já haviam sido adotadas) de recuperarem os seus poderes e deveres para com os seus 4 filhos que na altura tinham 8, 7, 4 e 2 anos de idade, respetivamente.

O modo como os progenitores ora recorrentes (in)cumpriram as suas responsabilidades parentais resulta bem evidente da pormenorizada descrição dos factos que ocorreram antes e depois do momento em que o processo de proteção de menores deu entrada no tribunal, depois das vicissitudes que foram apuradas no âmbito do processo que correu junto da competente CPCJ, e até depois de lhes ter sido proporcionada aquela última oportunidade.

Não importa recuar demasiado, basta que nos centremos na situação em que os progenitores agora se encontram, depois do primeiro acórdão da Relação, e nos confrontemos com as alternativas que se colocam quanto ao futuro dos seus filhos menores.

Obviamente que o passado mais longínquo não é indiferente para avaliar a medida que mais se ajusta à concreta situação em que os menores se encontram, no pressuposto de que qualquer medida deve ser guiada pelos seus interesses que ganham supremacia relativamente a outros, designadamente ao interesse que porventura os progenitores invoquem quanto à manutenção do statu quo, sendo de notar a este respeito que nem sequer reclamam a reposição integral das suas responsabilidades parentais.

Não importa, no entanto, focar em demasia esse passado, a não ser quando porventura acabe por acentuar uma situação de incapacidade prolongada para o exercício das responsabilidades parentais e a necessidade de encontrar uma via que proporcione aos menores um futuro mais seguro, sem os inconvenientes que uma qualquer situação de institucionalização determina.

Para o efeito e considerando o interregno na determinação desse futuro que foi provocada pelo primeiro acórdão da Relação de 15-9-16, bastará no essencial apreciar o comportamento dos progenitores neste período mais recente, depois da prorrogação da situação de acolhimento institucional dos menores, em conjugação com as medidas de apoio dos seus pais na consolidação e estabilização da sua convivência comum.

O resultado é bem evidenciado – mais uma vez – pelo rol de factos que se apuraram depois daquele aresto, confirmando-se uma manifesta incapacidade de em conjunto ou isoladamente garantirem o cumprimento dos seus deveres para com os menores conexos com as facetas vitais da educação, da saúde, do bem-estar, do crescimento equilibrado e do futuro dos mesmos.

O que a matéria de facto agora vem confirmar, depois daquela que, referente à fase anterior, já deixava bem evidenciada, é uma profunda incapacidade, ou vontade, de qualquer deles adequar a sua conduta de modo a que os seus filhos possam crescer com equilíbrio e sem os sobressaltos provocadas pelas múltiplas carências de que continuariam a padecer se acaso fosse revogada a medida de acolhimento institucional.

É verdade que nenhum dos progenitores pretende, por agora, a recuperação integral das responsabilidades parentais, pronunciando-se no sentido da prorrogação da situação de acolhimento dos menores na instituição onde se encontram desde Junho de 2015 ou, sem qualquer base de apoio, a confiança a familiares que não identificam nem surgiram em qualquer passo deste arrastado processo

Mas mesmo aquela medida não pode ser, sem mais, chancelada, pois não pode olvidar-se que o acolhimento institucional deve ter uma natureza transitória, sendo notoriamente prejudicial aos interesses dos menores a sua perduração para além de certos limites que temos por ultrapassados neste momento.

Sem questionar de modo algum as condições de que os menores beneficiam na instituição que os acolhe, a par dos esforços de cada um dos profissionais no sentido de lhes proporcionarem os instrumentos para uma educação saudável e um crescimento equilibrado, não podemos olvidar que constitui um direito essencial, que não deverá ser negado a qualquer menor, encontrar um ambiente familiar que faculte uma atenção individualizada de que eles se encontram notoriamente carentes.

Deste modo, antecipando a decisão, dir-se-á desde já que se justifica inteiramente, no interesse primacial dos menores, a confirmação da decisão das instâncias que se traduziu na determinação da confiança dos menores mesmos com vista a sua futura adoção.

A gravidade da medida (multiplicada pelo número de menores) justifica considerações adicionais a partir da matéria de facto apurada e dos preceitos jurídicos aplicáveis.


3. Atentemos em primeiro lugar no quadro jurídico em que se inscreve a situação dos menores:

Segundo o art. 3º da Lei 147/99, de 1-9:

1. A intervenção para promoção dos direitos e proteção da criança e do jovem em perigo tem lugar quando os pais, o representante legal ou quem tenha a guarda de facto ponham em perigo a sua segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento, ou quando esse perigo resulte de ação ou omissão de terceiros ou da própria criança ou do jovem a que aqueles não se oponham de modo adequado a removê-lo.

2 - Considera-se que a criança ou o jovem está em perigo quando, designadamente, se encontra numa das seguintes situações:


c) Não recebe os cuidados ou a afeição adequados à sua idade e situação pessoal;


f) Está sujeita, de forma direta ou indireta, a comportamentos que afetem gravemente a sua segurança ou o seu equilíbrio emocional;

”.

Já nos termos do art. 4º, a intervenção externa deve ser orientada por diversos princípios, de que se salientam os seguintes:

“…

a) Interesse superior da criança e do jovem - a intervenção deve atender prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do jovem, nomeadamente à continuidade de relações de afeto de qualidade e significativas, sem prejuízo da consideração que for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes no caso concreto;


c) Intervenção precoce - a intervenção deve ser efetuada logo que a situação de perigo seja conhecida;

d) Intervenção mínima - a intervenção deve ser exercida exclusivamente pelas entidades e instituições cuja ação seja indispensável à efetiva promoção dos direitos e à proteção da criança e do jovem em perigo;

e) Proporcionalidade e atualidade - a intervenção deve ser a necessária e a adequada à situação de perigo em que a criança ou o jovem se encontram no momento em que a decisão é tomada e só pode interferir na sua vida e na da sua família na medida do que for estritamente necessário a essa finalidade;

f) Responsabilidade parental - a intervenção deve ser efetuada de modo que os pais assumam os seus deveres para com a criança e o jovem;


h) Prevalência da família - na promoção dos direitos e na proteção da criança e do jovem deve ser dada prevalência às medidas que os integrem em família, quer na sua família biológica, quer promovendo a sua adoção ou outra forma de integração familiar estável;


k) Subsidiariedade - a intervenção deve ser efetuada sucessivamente pelas entidades com competência em matéria da infância e juventude, pelas comissões de proteção de crianças e jovens e, em última instância, pelos tribunais”.

Pela ordem da sua gravidade, são permitidas as seguintes medidas de proteção referidas no art. 35º:

1 - As medidas de promoção e proteção são as seguintes:

a) Apoio junto dos pais;

b) Apoio junto de outro familiar;

c) Confiança a pessoa idónea;

d) Apoio para a autonomia de vida;

e) Acolhimento familiar;

f) Acolhimento residencial;

g) Confiança a pessoa selecionada para a adoção, a família de acolhimento ou a instituição com vista à adoção.


                      No que respeita à medida de confiança dos menores com vista a futura adoção, determina o art. 1978º do CC que a mesma pressupõe que se encontrem seriamente comprometidos os vínculos afetivos próprios da filiação, pela verificação objetiva de alguma das situações nele descritas, entre as quais sobressaem as ações ou omissões que ponham “em perigo grave a segurança, a saúde, a formação, a educação e o desenvolvimento da criança”, sendo a situação avaliada tendo prioritariamente em conta os “direitos e interesses da criança”.

                      O art. 62.º-A daquela Lei, com a epígrafe “medida de confiança a pessoa selecionada para a adoção, a família de acolhimento ou a instituição com vista a adoção”, estabelece que:

                      1 - Salvo o disposto no número seguinte, a medida de confiança a pessoa selecionada para a adoção, a família de acolhimento ou a instituição com vista a adoção, dura até ser decretada a adoção e não está sujeita a revisão.

                      2 - A título excecional a medida é revista, nos casos em que a sua execução se revele manifestamente inviável, designadamente quando a criança atinja a idade limite para a adoção sem que o projeto adotivo tenha sido concretizado.


                      5 - Em caso de confiança a instituição ou família de acolhimento, o curador provisório é, de preferência, quem tenha um contacto mais direto com a criança, devendo, a requerimento do organismo de segurança social ou da instituição particular autorizada a intervir em matéria de adoção, a curadoria provisória ser transferida para o candidato a adotante, logo que selecionado.

                      6 - Sem prejuízo do disposto no número seguinte, aplicada a medida prevista no n.º 1, não há lugar a visitas por parte da família biológica ou adotante.

                      7 - Em casos devidamente fundamentados e em função da defesa do superior interesse do adotando, podem ser autorizados contactos entre irmãos”.


                      4. As palavras empregues pelo legislador ganham um especial relevo quando se trata de apreciar o modo como pretendeu regular os interesses que rodeiam os menores em situação de risco.

                      Devendo privilegiar-se a realidade que emerge dos factos que se apurarem, importa que não se corra o risco de colocar no mesmo plano interesses que o legislador colocou em planos diferenciados. Tratando-se de menores desprotegidos e em situação de perigo, não devem subestimar-se os riscos que os rodeiam nem deve subverter-se a tutela dos seus interesses, apelando, até à exaustão, a outros interesses ou objetivos situados em plano secundário.

                      Nesta matéria poderemos afirmar que a necessidade de proteção dos menores é de natureza absoluta, devendo ceder outros interesses subjetivos. Com efeito, a situação de desproteção que é própria de quem ainda não atingiu a maioridade apenas pode ser ultrapassada, atenuada ou mitigada por uma intervenção das entidades a quem está confiada a sua tutela, com natural possibilidade de intervenção moderadora dos tribunais, sempre orientados pelo superior interesse dos menores.

                      Por isso, sob pena de esvaziamento do conteúdo normativo, os tribunais devem extrair das normas que regem a matéria o que verdadeiramente delas resulta, correspondendo ao objetivo final do legislador, com apoio constitucional, de tutela dos menores de tenra idade em situação de maior vulnerabilidade, de modo que apurando-se ou confirmando-se que se encontram numa situação de elevado risco que coloque em causa o seu futuro, se adotem as medidas que melhor sirvam os seus interesses.


                      5. Respigando da matéria de facto os factos recentes com maior relevo para o caso constata-se o seguinte:

                      A progenitora mantém há 8 anos uma relação disfuncional onde diz ter sido vítima de violência doméstica a partir do 1º ano de coabitação.

                      Manifesta uma problemática emocional relevante e que interfere com a sua adaptação ao quo característico das vítimas de violência doméstica.

                      O progenitor apresenta evidência de abuso de álcool e condução sob o efeito de substâncias, bem como comportamento não responsável ao lidar com as penalizações sofridas.

                      Revela falta de envolvimento e compreensão das suas responsabilidades enquanto pai e apresenta uma personalidade pouco diferenciada, reduzido capital escolar e educativo. É egocêntrico, pouco reflexivo e não tem noção do impacto do seu comportamento sobre os menores e sobre os outros, apresentando um nível cognitivo situado na média inferior, apresentando ainda um comportamento controlador da companheira.

                      Não existe qualquer membro da família alargada dos progenitores disposto a acolher os menores.

                      Os progenitores dos menores, desde 2010, têm vindo a ser acompanhados pela equipa técnica do RSI, sendo que o acompanhamento contemplava um plano de intervenção prévia, visitas domiciliárias semanais realizadas pelas auxiliares de ação direta, cujos objetivos incidiam na gestão do orçamento familiar, organização doméstica, economia familiar, higiene pessoal, sensibilização do cumprimento de cuidados de saúde e sensibilização para a melhoria de dinâmica conjugal e familiar, todavia, desde Outubro de 2015 que o agregado não tem colaborado com a intervenção daquela equipa e com as visitas agendadas com a progenitora dos menores.

                      Em 21-12-16, os progenitores mantinham a residência na mesma habitação camarária onde foram realojados em Julho de 2014, um apartamento de tipo T-3, com boas condições a nível estrutural.

                      No dia 29-1-17, foram informados de que a Equipa Técnica do Projeto Escolhas Percursos (de)Talhados teria possibilidade de realizar intervenção com os mesmos ao nível das competências parentais, tendo os mesmos evidenciado disponibilidade e interesse para a intervenção.

                      Depois de uma primeira saída controlada com os menores, no Natal de 2016, os menores denotaram nos dias subsequentes alguma agitação, o que igualmente ocorreu na saída no fim do ano de 2016/17, aí com alguns percalços que evidenciaram mais uma vez a incapacidade dos progenitores para lidarem com as exigências de 4 menores de tenra idade e transmitir-lhes os valores de uma educação equilibrada.

                      Aliás, depois de uma fase de negação, os progenitores assumiram a falta de cuidado e responsabilidade para com a supervisão das crianças no fim-de-semana, tornando-se notória a dificuldade de ambos em perceber a gravidade de cada uma das situações e identificar os comportamentos para lidar e/ou resolver as mesmas.

                      A postura de desresponsabilização dos progenitores é transmitida pelos mesmos aos menores, gerando-lhes ansiedade e dúvidas relativamente aos motivos do acolhimento.

                      O progenitor continuou a evidenciar consumo abusivo de álcool, associado a ciúmes exacerbados, agravado pela instabilidade conjugal e pelos conflitos geralmente desencadeados e intensificados pelas atitudes provocatórias da progenitora.

                      A progenitora, junto dos técnicos, apresenta um discurso adequado e conhecedor das necessidades básicas das crianças, no dia-a-dia, mas tem uma postura contraditória, revelando baixas competências parentais.

                      Em consequência das saídas das crianças com os pais, nas festividades de Natal e passagem de ano em 2016/17, foram suspensas tais saídas, mas mantiveram-se as visitas na CA com supervisão e continuaram a ser trabalhadas as competências parentais dos progenitores no contexto da visita dos mesmos na CA, com as limitações inerentes ao facto de as visitas só poderem ocorrer ao Domingo devido à situação laboral do progenitor.

                      Em reunião com a Equipa Técnica da CA no dia 2-5-17, foi apurado que os progenitores quando orientados cumprem o plano de intervenção, mas quando deixam de ser orientados voltam ao início, não assimilam as orientações enquanto mudanças a serem implementadas.

                      Os progenitores não mostram evolução porque não interiorizam as novas práticas, mostram resistência a adquirir novos hábitos e apurou-se que o casal que pernoitava em casa dos progenitores seria a madrinha do DD e o companheiro.

                      No início do passado mês de Maio de 2017, pela SS e a Equipa Técnica da CA foi decidido que se autorizasse a saída das crianças para passar o fim-de-semana com os progenitores, quinzenalmente, com pernoita e nos fins-de-semana em que as crianças permanecessem na CA, dar-se-ia continuidade à supervisão e monitorização das visitas e, nesse contexto, proceder-se-ia à realização de atendimento com os progenitores, no sentido de se perceber quais as dificuldades sentidos pelos mesmos, trabalhando-se estratégias que lhes permitissem ultrapassar as dificuldades.

                      Desde 6-5-17, foram monitorizadas as saídas com os progenitores, com a colaboração da Equipa do Programa Escolhas Percursos (de) Talhados e nos fins-de-semana em que as crianças permaneceram na CA, deu-se continuidade à supervisão e monotorização das visitas nesse contexto.

                      Mas logo no dia 11-5-17, a Equipa Técnica da CA recebeu informação por correio eletrónico da Equipa "Percursos (de) Talhados - E6G", da qual constava que:

                      "Na sequência do vosso pedido de informação acerca da situação do agregado dos menores AA, BB, CC e DD, dado que os progenitores, FF e EE, não frequentam as atividades desenvolvidas pelo projeto no conjunto habitacional de junto dos moradores do bairro para averiguar informações acerca da dinâmica familiar.

                      Segundo os vizinhos, as confusões na habitação dos progenitores mantêm-se de forma muito frequente, sendo mais acentuadas ao fim-de-semana, quando se juntam com outro casal, sendo possível perceber que se encontram alterados e que consomem bebidas alcoólicas. Segundo os relatos, as discussões entre o casal são frequentes e é comum durante as mesmas a FF abrir a porta do apartamento e vir para as escadas do prédio, sendo por isso possível aos restantes moradores aperceberem-se das conversas entre os dois.

                      No dia 9-5-17, pelas 16 h, foi realizada uma visita domiciliária pelos técnicos da SS, sem aviso prévio, à habitação dos progenitores. A progenitora abriu a porta, mostrando-se desde logo muito aflita pela presença das técnicas do projeto, solicitando que a visita fosse realizada noutra altura, pois, ainda não tinha arrumado a casa, dado que estava a acabar de ver a telenovela e que tencionava fazê-lo logo de seguida e informou que o marido se encontrava a dormir, pois teria trabalhado durante a noite.

                      A casa apresentava-se em geral bastante desarrumada e suja, com um cheiro intenso, denotando desleixo e falta de cuidados regulares. A cozinha estava desorganizada, com vários objetos espalhados e apresentando loiça suja acumulada na mesa, lava-loiça e balcão; a sala estava igualmente desarrumada, com roupa e outros objetos acumulados. A progenitora alegou que a máquina da roupa se teria estragado no dia anterior, o que justificava a desarrumação e as roupas acumuladas e verificavam-se ainda caixas vazias de bolo e outros itens, que a progenitora referiu serem da festa que preparou para a AA no fim-de-semana. A casa de banho apresentava-se relativamente limpa e organizada; o quarto do CC e do DD tinha as camas feitas e estava minimamente organizado e o quarto da AA e da BB estava desarrumado, tinha as camas por fazer, sendo que a progenitora referiu que tencionava tirar os lençóis para os lavar, mas que ainda não o tinha feito porque a máquina não estava a funcionar; a habitação, apesar de reunir condições estruturais adequadas, não é limpa, arejada nem organizada regularmente.

                      Esgotadas todas as possibilidades de intervenção na área de residência dos progenitores, a Equipa Técnica da CA deu início à implementação de um plano de intervenção, definido de acordo com as necessidades identificadas no agregado, onde foram trabalhadas as competências parentais dos progenitores, no contexto da visita dos mesmos aos filhos na CA.

                      Com vista a uma parentalidade positiva, foram implementadas diversas visitas por técnicos de diversas especialidades na intervenção sócio-edicativa.

                      Em 4-5-17, a equipa técnica concluiu haver necessidade de consolidação das competências parentais dos progenitores e da estabilidade da relação do casal, sendo que desde o início da implementação do Programa os progenitores têm vindo a manifestar resistência à mudança, nomeadamente, no que se refere à aquisição de estratégias e comportamentos adequados às necessidades das crianças, sendo que se verificam fragilidades ao nível da imposição de regras e limites e da supervisão e controlo das crianças.

                      Porém, os progenitores não dão continuidade às estratégias sugeridas pelos técnicos, voltando a adotar os comportamentos observados antes da implementação do Programa.

                      Nos fins-de-semana em que as crianças permaneceram na CA deu-se continuidade à supervisão e monitorização das visitas neste contexto, sendo que das informações recolhidas e das observações em contexto institucional resulta que os progenitores não denotam evolução positiva no que se refere à aquisição de estratégias e comportamentos adequados às necessidades das crianças, verificando-se fragilidades ao nível da imposição de regras e limites e da supervisão e controlo das crianças, tendo-se verificado que, na ausência dessas orientações, os progenitores não dão continuidade às estratégias sugeridas, voltando a adotar os comportamentos observados antes da implementação do Programa.

                      A Equipa Técnica da CA realizou um breve atendimento com a AA que relatou um episódio em que os pais discutiram à sua frente e dos irmãos "e nós choramos (...) o pai disse à mãe que eu [AA] era filha de outro pai (...) que está em França (...) eu fiquei cheia de medo quando ele disse isso (...) a BB disse que não é minha irmã verdadeira (...) a mãe chamou a vizinha para dizer que eu [AA] não sou filha de outro pai (...) ela [a vizinha] disse que eu era filha doutro pai (...) a mãe chamou-lhe mentirosa".

                      Por decisão judicial de 28-7-17, as saídas das crianças com os progenitores foram suspensas por se ter considerado que o Plano de Intervenção para a prevenção da negligência e promoção das competências parentais desenvolvido pela Equipa Técnica da CA, não estava a ter resultados desejáveis e que as mesmas saídas comprometiam o bem-estar emocional das crianças.

                      Na entrevista com os pais, foi constatado que estes têm muitas dificuldades em aceitar a falha no processo emocional/educativo dos filhos no exterior.

                      Em 29-8-17 iniciou a consulta questionando os progenitores acerca das mudanças ocorridas desde a última consulta, tendo a progenitora informado da cessação de visitas e procurado responder às questões colocadas pela médica; já o progenitor adotou uma postura defensiva, optando por não responder às questões colocadas pela médica ou dando respostas evasivas.

                      Os menores têm vindo a evidenciar sinais de sofrimento, com manifestações físicas e emocionais decorrentes do impacto da institucionalização prolongada e mostram-se extremamente carentes de atenção individualizada, sendo bastante recetivos, correspondendo à troca de afetos com outras figuras de referência na CA.

                      Em contraposição com os factos que se apuraram, não se apuraram outros factos que os recorrentes alegaram:

                      - Que a progenitora está disposta a realizar qualquer mudança na sua vida que lhe permita recuperar os filhos;

                      - Que a situação de conflito conjugal entre os progenitores foi motivada pela escassez de meios económicos e pela situação de desemprego e já se mostra ultrapassada.


                      6. Privilegiando os factos que ocorreram depois do primeiro acórdão da Relação de 15-9-16 (proferido há mais de dois anos), mas sem olvidar os factos pregressos que já haviam sido avaliados pelo tribunal de 1ª instância e que naquele aresto foram avaliados pela Relação, chegamos à conclusão de que nenhum dos progenitores reúne condições para suportar as responsabilidades relativamente a qualquer dos menores (nem a todos em conjunto), desde a criança mais velha (agora com 10 anos) até ao irmão mais novo (agora com 4 anos).

                      Independentemente da imputação subjetiva a cada um dos progenitores, ou a ambos, da situação em que os menores se encontram, a matéria de facto revela que não demonstram capacidades para desempenharem o cargo que legal e biologicamente lhes pertence e, mais grave ainda, não revelam competências mínimas para modificarem os seus comportamentos por forma a ajustá-los às exigências do desenvolvimento são e equilibrado dos filhos.

                      O Estado apenas deve intervir nas relações de paternidade/filiação em casos excecionais, designadamente quando os pais, por ação ou omissão, “ponham em perigo a segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento” (art. 1978º, nº 1, al. d), do CPC). O objetivo de tal intervenção deve ser orientado pela promoção dos direitos das crianças e dos jovens que se encontrem em situação de perigo, nomeadamente quando “não recebam os cuidados ou a afeição adequados à sua idade e situação pessoal” ou estejam sujeitos a “comportamentos que afetem gravemente a sua segurança ou o seu equilíbrio emocional” (art. 3º da Lei 147/99, de 1-9).

                      As circunstâncias que rodeiam os quatro menores a que se reporta este processo especial de promoção e de proteção são bem reveladoras de uma realidade caracterizada pela incúria dos seus progenitores, pela falta de cuidados mínimos, pela desconsideração da fragilidade física e psicológica dos menores, pela incapacidade de lhes transmitirem valores e darem garantias de um crescimento saudável e de um nível educacional que os prepare para a vida de adultos.

                      Trata-se de uma situação que acaba por ser mais grave do que aquela por que estarão a atravessar os outros dois filhos de cada um dos progenitores, frutos de outros relacionamentos. Como resulta da matéria de facto, cada um dos progenitores tem dois filhos de outros relacionamentos anteriores, os quais estão a ser criados e educados noutros ambientes familiares, não existindo entre eles e os ora recorrentes quaisquer laços afetivos ou qualquer comunicação.

                      Existem deficiências de ordem estrutural que afetam cada um dos progenitores e porventura algumas delas nem lhes serão subjetivamente imputáveis. Mas não é a imputação subjetiva que está em causa neste tipo de processos, nem se trata aqui de apreciar se porventura alguma das atuações integra algum tipo legal de crime, envolvido na designação geral de “violência doméstica”. Trata-se apenas de avaliar, tanto quanto possível de forma objetiva, a partir da realidade que pôde ser verificada pelas entidades e profissionais intervenientes e pelas instâncias judiciárias, se aos progenitores ainda resta alguma possibilidade de reatarem com os seus filhos o relacionamento normal ou se, ao invés, perante o quadro fáctico que se nos apresenta, se impõe uma medida que determine para os menores a modificação da infraestrutura em que poderão crescer.

                      A matéria de facto provada, associada aos relatórios que servem de prova instrumental e conjugada com os antecedentes que rodearam a convivência dos progenitores com os seus filhos menores, antes de ter sido adotada a medida de acolhimento institucional, em 18-6-15, revela bem a necessidade de se adotar uma medida que, superando a que foi experimentada de acolhimento institucional e ultrapassando mesmo as tentativas de apoio junto dos progenitores com vista à aquisição de competências parentais, avance no sentido da estabilização do futuro dos menores que apenas é proporcionada, in casu, pela medida de confiança com vista a futura e eventual adoção.

                      O facto de que, como está provado, os menores têm vindo a evidenciar sinais de sofrimento, com manifestações físicas e emocionais decorrentes do impacto da institucionalização prolongada e mostram-se extremamente carentes de atenção individualizada, sendo bastante recetivos, correspondendo à troca de afetos com outras figuras de referência na CA” é bem demonstrativo, por um lado, da necessidade de se adotar uma medida diversa daquela que está a ser exercitada e, por outro, da urgência dessa medida, como forma de satisfazer as expetativas que os menores já criaram quanto a uma solução que ultrapasse a situação de acolhimento institucional.


                      7. Perante factos com tamanha gravidade, não encontra o menor motivo a alegação de cada um dos progenitores de que não está legitimada a conclusão de que puseram em perigo os menores ou demonstraram manifesto desinteresse por eles.

                      Esse perigo é real e está bem evidenciado e nem as tentativas de o superar ganharam corpo, antes demonstraram que os progenitores não reúnem definitivamente condições para assumirem uma responsabilidade tão importante para a vida dos menores como é a sua educação equilibrada e segura em todos os aspetos, desde os mais básicos relacionados com a saúde, a alimentação ou a proteção.

                      Contrariamente ao que também alegam, nenhum dos relatórios realizados aponta uma modificação estrutural e positiva do comportamento de cada um deles, mantendo-se as mesmas deficiências e vícios que determinaram a intervenção inicial, malgrado os esforços de diversos profissionais do serviço social ou da área da saúde infantil.

                      Repare-se que, tendo sido feitas algumas tentativas de reaproximação dos progenitores aos seus filhos, os resultados foram negativos, como se descreve nos diversos relatórios, desde aquele que relatou o que se passou na passagem do ano de 2016/2017 (de 6-4-17) (fls. 637 e ss.), passando pelo de 26-7-17 (fls. 690 e ss.) que informou da cessação da medida de saída dos menores da instituição com os progenitores, até ao de 10-11-17 (fls. 707 e ss.) que culminou com a proposta de confiança dos menores com vista a adoção, reafirmando a proposta que já constara do relatório entregue antes de ter sido proferida a primeira sentença no tribunal de 1ª instância.

                      De modo algum se pode considerar violado o princípio da proporcionalidade, pois que, neste contexto e decorrido que está um largo período que se traduziu em apoio junto dos pais e em acolhimento institucional dos menores, com simultânea tentativa de reforço das capacidades dos progenitores, a medida de confiança com vista a futura adoção é a única que defende os interesses dos menores. Estes interesses, por outro lado, não quedam satisfeitos com a manutenção da medida de acolhimento institucional, já que nenhum menor pode ser “condenado” a passar toda a sua vida, até atingir a maioridade, em instituições como aquela em que agora se encontram.

                      Insiste-se que não está em causa o modo como essa instituição tem cumprido os seus deveres para com os menores, substituindo-se à dupla de progenitores que falhou na sua missão essencial. Simplesmente todos compreendem - a começar pelas instituições como aquela que acolheu os menores – que a medida de internamento deve ser temporária, não podendo nem devendo eternizar-se quando se mostre viável outra alternativa que proporcione aos menores (enquanto ainda é tempo) um agregado familiar que lhes proporcione o carinho e os cuidados que merecem e lhes transmita os valores que os progenitores não conseguiram ou não quiseram transmitir.

                      Não se diga, como defendem os recorrentes, numa atitude de desresponsabilização, na linha de continuidade do que já foi detetado pelos técnicos de apoio social, que está a ser violado o princípio constitucional da igualdade e da não discriminação em função do território onde o progenitor habita. Pelo contrário, na área da sua residência habitual os progenitores tiveram da parte do Estado e das instituições de natureza social e da área da saúde infantil um importante apoio que não quiseram aproveitar no sentido de reverterem a situação a seu favor, recuperando o livre exercício das responsabilidades parentais.

                      Igualmente cede a alegação de que sai violado o princípio da responsabilidade parental e da prevalência da família. Contrariamente ao que afirmam, a matéria de facto apurada revela à exaustão a sua incapacidade ou inaptidão para proverem aos cuidados básicos dos menores, de forma autónoma ou mesmo com intervenção e ajuda de terceiros.

                      Do mesmo passo improcede a alegação de que sai violado o princípio da prevalência da família, já que fracassaram todas as tentativas no sentido de ganharem competências que revelaram não possuir desde que se iniciou a intervenção junto da família. Decorridos cerca de 9 anos depois de aberto o procedimento junto da CPCJ, 4 anos depois de instaurado o processo judicial e 3 anos sobre o acolhimento institucional dos menores, apenas se pode concluir que a situação em que os recorrentes se encontram não mostra sinais de modificação positiva que seja compatível com a educação de qualquer dos quatro filhos menores e ainda menos da fratria completa.

                      Afastando mais um dos diversos argumentos dos recorrentes, nem sequer existe qualquer elemento da família alargada que porventura pudesse ocupar-se da responsabilidade que eles não assumiram, de modo a proporcionar aos menores o seu desenvolvimento são e equilibrado, sem o corte definitivo com a família paterna, como o possibilitaria o art. 1978º, nº 4, do CC.

                      Aliás, este argumento em prol do acolhimento familiar ou do apadrinhamento é vazio de conteúdo, já que em lado algum se observa a existência de algum familiar ou de outra pessoa que esteja disposta ou reúna as condições para acolher os menores fora de uma medida com efeitos mais vastos de confiança para futura adoção.

                      Em concreto, para além de estar provada a ausência de qualquer familiar que aceitasse aquela responsabilidade, não surge identificado em qualquer dos diversos relatórios que foram elaborados ou nas alegações dos recorrentes qualquer outra pessoa que, fora de um quadro de futura adoção, se apreste a cuidar dos menores num contexto familiar.


                      8. Suscitam os recorrentes a alegada preterição do direito de audição dos menores.

                      O facto de guardarem esta questão para um recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça revela bem que não os move propriamente a defesa de putativos interesses dos menores que porventura tenham sido desconsiderados, antes a ideia de evitarem, a todo o custo, a confirmação da medida de confiança para adoção que foi decretada pelas instâncias. Num processo que está pendente no tribunal desde Abril de 2014, a referida questão não foi por eles suscitada, nem pelos Exmºs defensores que foram designados para patrocinarem os menores, em qualquer das duas fases processuais na 1ª instância e nos dois recursos de apelação que foram interpostos de cada uma das sentenças que concluiu pela medida de confiança dos menores com vista a futura adoção.

                      Tal questão poderia obter deste Supremo Tribunal de Justiça uma resposta formal que passasse pela integração da preterição da alegada obrigatoriedade da audiência dos menores no capítulo das nulidades processuais, para daí se extrair a extemporaneidade da arguição em sede de alegação no recurso de revista.

                      Seguiremos, porém, uma via que aposta antes em argumentos de ordem substancial que nos parecem ajustados às circunstâncias do caso.

                      Nesta perspetiva, confrontamo-nos com o disposto no art. 12º, nº 4, da Conv. Europeia sobre Direitos da Criança, segundo o qual cada Estado Contratante deveria aditar medidas legislativas no sentido de “obter a opinião das crianças e dar -lhes informação adequadas”, prosseguindo o objetivo de encorajar a promoção do exercício dos seus direitos.

                      Tal foi concretizado no nosso ordenamento jurídico mediante a consagração do que está previsto no art. 4º, nº 1, al. c), da Lei 147/99, de 1-9, alvo de desenvolvimento no art. 84º, segundo o qual “as crianças e os jovens são ouvidos pela comissão de proteção ou pelo juiz sobre as situações que deram origem à intervenção e relativamente à aplicação, revisão ou cessação de medidas de promoção e proteção, nos termos previstos nos arts. 4º e 5º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, aprovado pela Lei nº 141/15, de 8-9”.

                      É por esta via que somos remetidos para o disposto no art. 4º da Lei nº 141/05, de 8-9, que regula o processo tutelar cível, onde se prescreve que a “criança com capacidade de compreensão dos assuntos em discussão, tendo em atenção a sua idade e maturidade, é sempre ouvida sobre as decisões que lhe digam respeito, preferencialmente com o apoio da assessoria técnica ao tribunal, sendo garantido, salvo recusa fundamentada do juiz, o acompanhamento por adulto da sua escolha sempre que nisso manifeste interesse”.

                      Por seu lado, o art. 35º, nº 3, concretiza tal dever, prescrevendo que, “a criança com idade superior a 12 anos ou com idade inferior, com capacidade para compreender os assuntos em discussão, tendo em atenção a sua idade e maturidade, é ouvida pelo tribunal, nos termos previstos na al. c) do art. 4º e no art. 5º, salvo se a defesa do seu superior interesse o desaconselhar”, audição que deve ser feita com os cuidados enunciados no art. 5º.

                      Ora, dos mencionados normativos não emerge qualquer regra absoluta que abarque menores de 12 anos de idade, devendo a necessidade da sua audição ser casuisticamente apreciada em face dos elementos atinentes à sua idade e maturidade e com ponderação ainda de circunstâncias conexas com o superior interesse da criança.

                      No caso concreto, diversas circunstâncias revelam que essa diligência não era obrigatória nem se mostra necessária. Asserções que, podendo ser feita pelas instâncias, estão igualmente ao alcance deste Supremo Tribunal de Justiça onde a questão foi suscitada, na medida em que qualquer decisão deve partir da análise dos factos que se encontram traduzidos nos autos.

                      Ora, a este respeito, verifica-se que estamos no âmbito de um processo judicial iniciado em 2014, quando os menores contavam 6, 5, 2 e menos de 1 ano de idade.

                      Com acordo dos progenitores foi adotada em 15-5-14 uma medida de promoção de proteção junto dos mesmos (fls. 34), a qual, no entanto, em face dos maus resultados que se alcançaram, rapidamente evoluiu para a medida de acolhimento institucional decretada em 18-6-15 (fls. 74 a 76).

                      Neste novo quadro veio a ser proferida, em 23-5-16, a primeira sentença que, com base nos elementos provados, determinou a confiança dos menores com vista a futura adoção. Tal medida foi posteriormente revertida pela Relação que, por acórdão de 15-9-16, considerou ajustada, no ínterim, uma solução menos gravosa que apostasse no reforço das responsabilidades parentais, a qual não logrou os objetivos pretendidos, motivo pelo qual voltou a ser decretada pela 1ª instância a medida de confiança dos menores com vista a futura adoção que agora está em apreciação.

                      Os progenitores ora recorrentes praticamente limitaram-se a invocar, de forma genérica e, como se disse, apenas nesta sede do recurso de revista, a necessidade daquela diligência de audição dos menores, sem apontarem quaisquer razões ponderosas que especificamente a exigissem ou aconselhassem, sendo que os autos também não refletem (como já não refletiriam aquando do primeiro acórdão da Relação) qualquer dúvida quanto à legitimidade e ajustamento de uma medida de confiança com vista à sua adoção.

                      Aquando da realização do debate que precedeu esta segunda sentença, os menores contavam respetivamente 9, 8, 5 e 3 anos de idade, constatando-se que a definição do futuro dos menores está em suspenso, dependente da decisão final de um processo judicial que já está pendente há mais de 4 anos.

                      Está notoriamente afastada a aplicabilidade da audiência prévia aos dois menores mais novos, sendo muito ténue a relação com os progenitores, pois, na realidade, apenas conhecem a instituição onde foram acolhidos e que tem zelado pelo seu desenvolvimento. Mas mesmo relativamente às duas menores mais velhas, ponderando tanto a sua idade e maturidade como ainda o quadro em que se desenvolveu a decisão das instâncias de confiança com vista a futura adoção, essa audição não se revela nem obrigatória, nem necessária, nem sequer conveniente,

                      Do lado dos menores, especificamente das duas irmãs mais velhas, não se demonstra a existência de uma especial maturidade que lhes permita que, de modo totalmente franco e livre, sejam confrontados com as alternativas que se mostram imediatamente realizáveis: prosseguimento da medida de acolhimento institucional ou confiança a terceira pessoa com vista à eventual adoção. Tão pouco se nota qualquer especial sensibilidade de cada um que devesse ser auscultada antes da decisão judicial.

                      A menor AA, tinha 6 anos de idade quando se iniciou o processo judicial, frequentou em 2017/2018 o 4º ano de escolaridade e vem sendo acompanhada em terapia da fala. Já a BB, frequentou o 2º ano de escolaridade e apresenta dificuldades em aceitar limites educativos, em receber ordens ou em encontrar soluções para situações que lhe surgem, dirigindo a agressividade à distância às figuras parentais e evidenciando ainda rivalidade fraterna e com os pares.

                      Acresce ainda que nenhuma das normas por que se regem os processos de promoção e de proteção de menores em situação de risco pode ser interpretada de modo a converter-se em obstáculo à realização dos superiores interesses das crianças que é o objetivo final desses processos, não estando afastada, mesmo nestes casos, a ponderação das vantagens e dos inconvenientes que estariam associados a mais um recuo do processo (depois do que foi determinado pelo primeiro acórdão da Relação), com dilação ainda mais longa de uma solução que definitivamente possa pôr fim aos “sinais de sofrimento” que evidenciam e à situação de carência afetiva individualizada. O art. 35º, nº 3, do Regime Geral do Processo Tutelar Cível que regula a matéria obriga os tribunais a ponderarem precisamente tais interesses mesmo relativamente à diligência de audição dos menores.

                      A este respeito verificamos que todos os menores se encontram internados numa instituição há mais de 3 anos, sendo pouco frequentes os contactos com os progenitores. Analisadas anteriores tentativas de aproximação, concluiu-se que deveriam cessar as saídas ou as dormidas em casa dos progenitores, mantendo-se apenas as visitas semanais que vêm ocorrendo ao Domingo.

                      Os progenitores apresentam como única alternativa a de os menores continuarem submetidos à medida de acolhimento institucional, enquanto estes estão a “evidenciar sinais de sofrimento, com manifestações físicas e emocionais decorrentes do impacto da institucionalização prolongada”, mostrando-se “extremamente carentes de atenção individualizada, sendo bastante recetivos, correspondendo à troca de afetos com outras figuras de referência na CA”.

                      Todas estas circunstâncias – e especialmente esta última - tornam desnecessária mais uma diligência que, a ser decretada, obrigaria a que o processo retomasse a tramitação na 1ª instância, com arrastamento, ainda mais longo e grave, da situação em que os menores se encontram, sendo premente, isso sim, que se encontre uma solução que defina o seu futuro e evite o prolongamento da situação de acolhimento institucional que, independentemente da qualidade dos serviços, não constitui para nenhuma criança uma solução que deva eternizar-se.

                      Se nestes últimos quatro anos em que está pendente o processo judicial o futuro das crianças tem estado em suspenso, a verdade é que o relógio biológico está em constante movimento, urgindo que se encontre uma solução estável enquanto a idade dos menores ainda o permitir, a qual passará pela passagem a uma outra importante fase, qual seja, a da confiança dos menores com vista à sua futura (e eventual) adoção.


                      IV – Face ao exposto, acorda-se em julgar improcedentes cada uma das revistas confirmando-se o acórdão recorrido.

                      Custas de cada uma das revistas a cargo de cada um dos recorrentes.

                      Notifique.


                      Lisboa, 18-10-18


                      Abrantes Geraldes (Relator)

                      Tomé Gomes

                      Maria da Graça Trigo (vencida, conforme declaração junta)

                      ___________

                      Voto vencido

                      Votei vencida por entender que, encontrando-se a apreciação deste Supremo Tribunal de Justiça restringida a juízos de legalidade, não pode deixar de se reconhecer ter ocorrido desrespeito do direito à audição das crianças ou, em alternativa, da obrigação de o juiz fundamentar a dispensa de tal audição. Votei, assim, pela anulação do acórdão, determinando-se a baixa dos autos para dar cumprimento a tal exigência ou à justificação dos motivos da sua dispensa.