Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
08B864
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: OLIVEIRA ROCHA
Descritores: ANULAÇÃO DE DELIBERAÇÃO SOCIAL
Nº do Documento: SJ2008041708642
Data do Acordão: 04/17/2008
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Sumário :
1. Os direitos dos sócios, como tal, podem ser gerais e especiais. Os primeiros competem por igual a todos os sócios; os segundos conferem aos seus titulares uma vantagem especial, um privilégio, uma posição de supremacia frente aos demais associados.
2. A disciplina fundamental dos direitos especiais é objecto do art. 24º do CSC, de que se destaca o direito especial à gerência, que pode ser atribuído a todos os sócios da mesma sociedade, como, por outro lado, a simples designação de gerente no contrato de sociedade não significa a atribuição de um direito especial à gerência.
3. O problema da interpretação das cláusulas dos pactos sociais resume-se à descoberta do sentido objectivo da declaração negocial e, assim, não podem ter-se em conta a vontade real das partes, nem elementos estranhos ao contrato social, porque estão em jogo interesses de terceiros - daqueles que hajam contratado com a sociedade.
4. Porém, quanto às sociedades por quotas, se a interpretação objectiva é de exigir no tocante às cláusulas que visam a protecção dos credores sociais, já essa exigência se não impõe nas sociedades por quotas de índole personalista quanto às cláusulas sobre relações corporativas internas e às de natureza jurídica individual, vigorando, então, nesta matéria, os princípios gerais de interpretação dos negócios jurídicos formais (art. 238º do C.Civil), com admissibilidade, portanto, do recurso a quaisquer elementos interpretativos contemporâneos do negócio, ou anteriores ou posteriores à sua conclusão.
5. A interpretação das declarações ou cláusulas contratuais constitui matéria de facto, da exclusiva competência das instâncias.
6. Constitui, contudo, matéria de direito, sindicável pelo Supremo, determinar se na interpretação das declarações foram observados os critérios legais impostos pelos citados arts. 236º e 238º, para efeito da definição do sentido que há-de vincular as partes, face aos factos concretamente averiguados pelas instâncias.
7. O retorno do processo ao tribunal recorrido para ampliação da decisão de facto, nos termos do nº 3 do art. 729º do CPC, só deve ter lugar quando o Supremo se encontre impossibilitado de julgar de direito por insuficiência de elementos de facto.
Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça


1.
AA e BB intentaram a presente acção, sob a forma de processo ordinário, contra SOCIEDADE CC & FILHOS, LDA, pedindo que sejam anuladas as deliberações sociais da Assembleia Geral da ré de 26 de Novembro de 2005.
Como fundamento, alegaram que a acta indica que tal Assembleia Geral ocorreu a 26 de Outubro de 2005, quando, na verdade, ocorreu a 26 de Novembro de 2005, não tendo tal erro sido corrigido. A acta foi escrita em papel sem configuração legal. A sócia MF interveio na qualidade de cabeça-de-casal da herança aberta por morte de seus pais, quando, à data, era já representante comum das duas quotas. Na indicação da votação não se diz quem votou a favor, contra ou se absteve. A diferença entre o capital social actual e o mínimo legal é de 1.508,41 €, corrigindo-se na acta tal valor incorrectamente. Finalmente, alegaram que têm direito especial à gerência, pelo que a sua destituição da gerência obriga ao recurso à via judicial.

A ré contestou, alegando que a qualidade de representante comum das quotas resulta da própria lei, defendendo que os erros de escrita cometidos se devem a meros lapsos, motivo pelo qual se devem ter por rectificados, sendo certo que os factos alegados nos artigos 7° a 13° da petição inicial, para além de não serem exactos, não têm qualquer interesse para a apreciação da validade da deliberação de destituição dos autores. A acta foi escrita no livro de actas da sociedade ré, onde foram já escritas outras, não exigindo a lei que a acta seja documentada em qualquer livro com um formato, número de linhas ou quaisquer outras características especiais, sendo certo que um eventual incumprimento nunca seria sancionado com a invalidade da deliberação tomada. A lei apenas impõe que se exare na acta o resultado das votações e não o sentido de voto individual dos sócios, a menos que algum sócio o requeira. Finalmente, resulta do contrato de sociedade que não foi atribuído aos autores qualquer direito especial à gerência, podendo, assim, ser livremente deliberada a destituição dos gerentes, sem necessidade de instaurar qualquer acção judicial.

Os autores apresentaram réplica, ampliando, ainda, o pedido formulado na petição inicial, no sentido de ser ordenado o cancelamento de qualquer inscrição na Conservatória do Registo Comercial efectuada com base na deliberação tomada na Assembleia Geral da ré de 26 de Novembro de 2005.
A ré apresentou tréplica, pronunciando-se quando aos documentos juntos com a réplica e quanto ao requerimento de ampliação do pedido.

Dispensada a audiência preliminar - uma vez que, a ter lugar, se destinaria apenas a facultar a discussão do mérito da causa - foi proferido o saneador, no qual, por entender que o processo continha os elementos necessários, o Sr. Juiz conheceu do mérito, tendo julgado a acção improcedente.

Discordando desta decisão, dela recorreram os autores, sem êxito, para o Tribunal da Relação do Porto.

Ainda irresignados, pedem revista, concluindo a alegação do recurso pela seguinte forma:
Discutindo-se na presente acção se três sócios podem destituir da gerência dois seus irmãos que com eles foram nomeados gerentes no pacto social, por vontade de seu pai, é necessário indagar da vontade e intenção das pessoas envolvidas quanto à atribuição ou não dum direito especial à gerência, matéria que é controvertida;
No despacho saneador-sentença o Tribunal de 1ª instância ignorou completamente a matéria de facto alegada donde poderia emergir o conhecimento dessa concreta vontade e intenção, como foi desconsiderado o facto insólito, ou, pelo menos raro, do pacto da sociedade recorrida permitir que todos os sócios nomeados gerentes pudessem delegar por procuração, total ou parcialmente tais poderes em seus cônjuges, bem como o de ser proibida a cessão de quotas a pessoas estranhas, e de, sendo sete os sócios iniciais, a sociedade ficar obrigada com a assinatura de quaisquer dois desses sete sócios, com excepção do sócio JL;
E isto porque tais factos não se enquadravam no entendimento que o Tribunal da 1a instância tinha acerca da atribuição de direito especial à gerência, que se pode resumir assim:
a) A destituição de gerentes por maioria simples é livre, a menos que sejam titulares de direito especial à gerência (o recorrente, então apelante, declarou nas alegações de apelação que também concordava, até por ser doutrina que decorre de Assento do STJ de 9/11/1977);
b) O direito especial à gerência tem que ser individualizado no pacto social (no que o recorrente, então apelante, declarou na mesma sede que discordava, porque constituía um desenvolvimento não contemplado na lei);
c) Logo, como no caso em julgamento o pacto social da então sociedade apelada apenas se limitava a atribuir a todos os sócios a gerência, não há qualquer direito especial à gerência;
O acórdão da Relação, pelo contrário, entendeu que não seria de subscrever a sentença do Tribunal da lª instância de que "a circunstância de terem sido nomeados gerentes todos os sócios da sociedade ré e não apenas os autores, afasta, desde logo, a concessão de um direito especial à gerência a todos ou alguns deles";
E sublinhou que "é actualmente pacífico o entendimento em sentido contrário";
Ou seja, o Tribunal da Relação sufragou o entendimento do então apelante, ora recorrente, segundo o qual o direito especial à gerência pode ser atribuído a todos os sócios, desde que seja especialmente ampla a configuração desses poderes;
Da mesma forma, o recorrente só pode concordar com o entendimento exposto no acórdão recorrido acerca da orientação dualista que deve ser seguida em matéria de interpretação do pacto social da sociedade recorrida;
Com efeito, a dupla medida interpretativa (objectivista, quanto às cláusulas de organização e de funcionamento social, relevantes também para futuros sócios e terceiros, e subjectivista, quanto às cláusulas estatutárias que regulam as relações de um ou mais sócios entre si ou com a sociedade) é não só rigorosa do ponto de vista analítico, corno se harmoniza com a natureza das questões e os interesses que se discutem nos presentes autos, em que estão apenas em causa as vontades, representações e interesses dos diversos sócios, que têm relações familiares muito próximas, já que a sociedade foi inicialmente constituída por um casal e seus cinco filhos e prossegue com esses cinco filhos.
Considerando-se, no entanto, que no acórdão recorrido apenas se errou na aplicação dessas orientações ao caso sub judice;
Porquanto tais posições doutrinais impunham que o processo baixasse à lª instância para averiguar da vontade e intenção das pessoas envolvidas, em particular da vontade e intenção do impulsionador da sociedade, pai dos cinco actuais sócios;
Recorde-se que é o próprio acórdão recorrido, ao contrário do que aconteceu no saneador-sentença, em que tal matéria de facto foi totalmente ignorada, que ordena a matéria pertinente alegada:
a) Esse direito (especial à gerência) foi "ab initio" conferido na escritura de constituição de sociedade e que foi essa a vontade expressa do principal impulsionador da sociedade, o pai dos autores, que a todos os sócios-gerentes e cônjuges atribuiu pelouros e responsabilidades (art. 25°);
b) São as próprias circunstâncias em que surgiu a ré, os laços de parentesco que existem entre todos os sócios e o especial desígnio do sócio JL, que quis congregar à sua volta toda a sua família nuclear - ele, a mulher, os filhos e os seus cônjuges, que claramente o indicam - art. 105º;
c) A gerência da sociedade e a sua representação em juízo, activa e passivamente, pertence a todos os sócios, que desde já ficam nomeados gerentes, e que poderão delegar por procuração, total ou parcialmente, estes poderes a seus cônjuges;
d) Alegaram que a cessão de quotas é proibida a pessoas estranhas (art. 8 do pacto) e que o pacto permite que dois sócios obriguem a sociedade (art. 5º, § 2º);
e) E, mais adiante, refere-se no acórdão recorrido que "Exterior ao contrato, importa relembrar a já indicada alegação dos autores de que:
- foi essa (a atribuição de um direito especial à gerência) a vontade expressa do principal impulsionador da sociedade, o pai dos autores, que a todos os sócios-gerentes e cônjuges atribuiu pelouros e responsabilidades;
- são as próprias circunstâncias em que surgiu a ré, os laços de parentesco que existem entre todos os sócios e o especial designio do sócio JL, que quis congregar à sua volta toda a sua família nuclear - ele, a mulher, os filhos e os seus cônjuges, que claramente o indicam".
Ora, em especial este último registo da matéria de facto alegada, foi completamente ignorada pela sentença da primeira instância;
E não podia nem devia sê-lo, porquanto, nos termos do próprio acórdão recorrido, era necessário não só analisar a letra do pacto social, mas também o espírito e o contexto em que foi constituída a sociedade para se poder decidir em consciência se os autores tinham ou não um direito especial à gerência;
Esperar-se-ia, portanto, que o tribunal de apelação ordenasse o prosseguimento do processo em ordem à indagação da veracidade de tais alegações;
No entanto, o acórdão recorrido, inesperadamente, conclui que tais alegações apenas reforçam o carácter personalista da sociedade e nada esclarecem sobre o âmbito da gerência atribuída no contrato;
Ora, como bem observado no aresto sub censura, a lei (art. 236° a 238° e, especificamente, o disposto no nº 2 do art. 236° e nº 2 do art. 238° do Código Civil) dá relevância à vontade real e à intenção dos intervenientes no pacto social, no caso, à especial intenção de que era possuído o principal impulsionador da sociedade - JL;
Sendo assim, como é, de acordo com a própria doutrina expendida no acórdão recorrido, é evidente que a ser indagado se foi essa (a atribuição de um direito especial à gerência) a vontade expressa do principal impulsionador da sociedade, o pai dos autores, que a todos os sócios-gerentes e cônjuges atribuiu pelouros e responsabilidades e se esse sócio teve o especial desígnio de congregar à sua volta toda a sua família nuclear - ele, a mulher, os filhos e o seus cônjuges - e a provar-se tal alegação isso teria de conduzir forçosamente à procedência da acção;
Assim não entendendo, o acórdão recorrido violou o disposto nos arts. 236° a 238° do CC, art. 510º, nº1, al. b) do CPC e 24°, nº 5 e 257°, nº 3, 1ª parte, do CSC).

Nas contra-alegações, a ré pronunciou-se pela manutenção do acórdão impugnado.

2.
Estão provados os seguintes factos:
Por escritura pública outorgada a 21 de Maio de 1973, na Secretaria Notarial da Feira, JL, RF, BB, casado com AL, AA, casado com AS, LD, casada com CD, MF , casada BS, e MF, casado com MCL, declararam constituir uma sociedade comercial por quotas de responsabilidade limitada, com a denominação "Sociedade CC & Filhos, Limitada", com sede e estabelecimento no lugar de Vendas Novas, freguesia de ..., tendo por objecto a compra e venda de prédios, a construção civil e a urbanização de terrenos, podendo dedicar-se a qualquer outra actividade, mediante deliberação da assembleia geral, sendo o capital social de setecentos mil escudos, representado por sete quotas de cem mil escudos, sendo uma de cada sócio, realizado integralmente em dinheiro, ficando a gerência da sociedade e a sua representação em juízo, activa e passivamente, a pertencer a todos os sócios, nomeados gerentes, podendo delegar por procuração, total ou parcialmente, tais poderes em seus cônjuges.

Nos termos do artigo quinto, parágrafo primeiro, "A gerência, originária ou delegada, é dispensada de caução, e será remunerada ou não, conforme for deliberado em assembleia geral".

Nos termos do mesmo artigo, parágrafo segundo, "Para os actos de mero expediente bastará a assinatura de um gerente; para os demais actos que impliquem responsabilidade para a sociedade ou a obriguem é necessária a assinatura de dois gerentes ou, por excepção, a do gerente JL, que, só por si, obriga e responsabiliza a sociedade".

Nos termos do artigo décimo primeiro "Anualmente e com referência ao dia trinta e um de Dezembro do ano anterior será elaborado o balanço do exercício. Os lucros líquidos apurados neste balanço serão distribuídos pela forma seguinte: cinco por cento para a constituição ou reintegração do fundo de reserva legal; uma percentagem a fixar pela assembleia geral para quaisquer outros fundos que a sociedade resolva criar; o remanescente será rateado pelos sócios, como dividendo anual, na proporção das suas quotas".
A sociedade ré encontra-se matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Santa Maria da Feira com o número 00892/730719, com sede no Lugar de Vendas Novas, freguesia de ..., tendo como objecto a compra e venda de prédios, construção civil e urbanização de terrenos, com o capital de 700.000$00, como sócios JL e mulher, RF, AA, BB, LD, MF e MF, estando a gerência afecta a todos os sócios, obrigando-se pela intervenção de dois gerentes ou somente com a assinatura do gerente JL.

Através da cota 1, ap. 11/051128 - Av. 2, encontra-se registada a cessação de funções dos gerentes AA e BB, por destituição.

Encontra-se matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Santa Maria da Feira, com o número 01700/820225, a sociedade "JL & Filhos, Limitada", com sede no Lugar de Vendas Novas, freguesia de ..., tendo como objecto a indústria de rolhas e artefactos de cortiça e o comércio de importação e exportação de produtos da mesma natureza, com o capital de 350.000,00 euros, como sócios JL, RF, BB, AA, LD, MF e MF, cada um com uma quota de 50.000,00 euros, incumbindo a gerência a todos os sócios e obrigando-se a sociedade pela assinatura de dois gerentes ou, excepcionalmente, pela assinatura do gerente JL.

Através das ap. 10, 11 e 12 de 16 de Março de 1998, encontra-se registada, respectivamente, a cessação de funções de gerente dos sócios MF , MF e LD, os dois últimos por renúncia.

Através da ap. 36/020313, encontra-se registada a transmissão de quota a favor de AA por doação de JL.

Através da ap. 09/020826 (seguinte à ap. 36/020313) encontra- se registada a transmissão de quota a favor de AA por doação de RF.

JL e RF faleceram, respectivamente, a 28 de Abril de 2003 e a 10 de Maio de 2004, não tendo as respectivas heranças sido ainda partilhadas, exercendo as funções de cabeça­-de-casal a sócia da requerida MF .

LD e CD casaram catolicamente, sem convenção antenupcia1, a 24 de Outubro de 1971.

JC é filho de BL e de MF .

CL é filho de MF e MCN.

O autor JL, a 9 de Outubro de 2001, convocou os sócios da ré para reunirem em Assembleia Geral ordinária a 29 de Outubro de 2001, com a seguinte ordem de trabalhos:
1. Apreciação e votação das contas referentes ao exercício de 2000.
2. Apreciação e votação da proposta de aplicação de resultados do exercício de 2000.
3. Aumento do capital social a realizar por incorporação de reservas de 700.000$00 (setecentos mil escudos) para 1.002.410$00 (um milhão dois mil quatrocentos e dez escudos).
4. Redenominação do capital social para o equivalente em euros, mediante a utilização do método da alteração unitária.
5. Dar nova redacção ao art. 3° do Contrato de Sociedade no sentido de conformar o seu teor com o aumento de capital e/ ou a redenominação do capital social.

MF , LD e MF enviaram à sociedade ré, à atenção de AA, a carta cuja cópia se encontra junta a fls. 267, datada de 19 de Outubro de 2001, com o "Assunto: Rectificação das Contas da Sociedade", referência "Assembleia Geral de 29 de Outubro de 2001", com o seguinte teor: Na análise dos documentos de prestação de contas do exercício de 2000, feita na sede da nossa sociedade em 18 de Outubro de 2001, com vista à nossa preparação e informação para a próxima Assembleia Geral Anual, marcada para o dia 29 do corrente mês, foi possível extrair as conclusões que se anexam.

Uma vez que estão em causa perdas superiores a 6.000 (seis mil) contos de IRC liquidado e pago a mais, solicita-se que sejam tomadas providências para rectificar e corrigir os erros primários detectados neste exame às contas "à vol d'oiseau".
Caso V. Exas não disponham de TOC's com competência e/ou capacidade para remediar os danos causados à nossa sociedade, em termos:
Rectificação dos Documentos de Prestação de Contas Rectificação das autoliquidações de IRC de 1999 e 2000;
De contabilização correcta das amortizações do exercício de 1999/2000;
De enquadramento contabilístico dos prédios arrendados; etc
teremos todo o gosto, aliás no interesse da nossa Sociedade e dos Sócios, em arranjar os profissionais competentes, que rectificarão as contas até à realização da Assembleia Geral.

O autor AA, por carta datada de 26 de Outubro de 2001, dirigida a MF , LD e MF, comunicou-lhes que a assembleia geral referida na alínea anterior irá efectuar-se em dia a determinar, pelo que a todos os sócios será enviada competente e atempada convocatória, justificando tal adiamento pelo facto de ter havido sensibilidade a uma sugestão expendida por V.Exas, o que implica adequado exame pela maioria dos sócios e diferimento da data da Assembleia.

MF, MF e LD enviaram à sociedade requerida uma carta, cuja cópia se encontra junta a fls. 319, datada de 13 de Fevereiro de 2002, com o seguinte teor: Em referência à vossa carta de 26 de Outubro de 2001, em que fomos informados de que a Assembleia Geral Ordinária que iria realizar-se no dia 29 de Outubro de 2001, pelas 17 horas, na sua sede social, efectuar-se-ia em dia a determinar e que seria enviada competente e atempada convocatória.
Até ao presente momento ainda não recebemos nada, o que nos surpreende.
Aguardamos uma resposta a este assunto.

LD, MF enviaram a cada um dos autores, na qualidade de sócios da sociedade ré, uma carta registada com aviso de recepção, cujas cópias se encontram juntas a fls. 169 e 172, datada de 26 de Abril de 2005, com o seguinte teor: Ainda que formalmente sejamos sócios-gerentes da Sociedade CC & Filhos, Limitada, a verdade é que a gerência de facto tem vindo a ser apenas exercida pelos sócios gerentes AA e BB que vêm, desde há mais de dez anos, administrando, de facto, a sociedade sem dar satisfação aos restantes associados quer sobre os proveitos, quer sobre os custos, quer sobre o modo como as receitas têm vindo a ser aplicadas.
Desde também há anos que temos insistido para ter acesso a toda a documentação relativa às operações sociais, o que, ilicitamente, nos tem sido negado pelos referidos sócios AA e BB que, para o efeito, se têm vindo a servir do facto dos documentos se encontrarem nas instalações da sociedade JL & Filhos, Limitada, de que os mesmos são os únicos gerentes.

Uma vez que temos suspeitas da prática de graves irregularidades que pretendemos confirmar e uma vez que a sociedade não tem vindo sequer a cumprir algumas das suas obrigações legais, vimos solicitar o acesso a toda a documentação e que a mesma seja depositada no local onde deverá estar que é na loja, propriedade da sociedade, sita na Avenida ..., nºs 2850, 2640, lugar de Vendas Novas, freguesia de ..., Santa Maria da Feira.

A documentação dever-nos-á ser entregue contra a assinatura de um protocolo de recebimento onde se discrimine o que recebemos. Aguardaremos dez dias pelo cumprimento do solicitado. Para a hipótese de não ser cumprido o que solicitamos desde já informamos que iremos, também de imediato, tomar as medidas indispensáveis à salvaguarda dos direitos que nos assistem.

Tais cartas foram recebidas pelos autores, os quais não lhes deram qualquer resposta.

MF e LD convocaram, a 26 de Abril de 2005, os sócios da ré para se reunirem em assembleia geral, na sede social, sita na Avenida ... nºs 2850 - 2640, no dia 31 de Maio de 2005, com a seguinte ordem do dia:
1. Deliberar sobre a designação formal da cabeça-de-casal da herança MF , como representante comum das quotas, no valor nominal de 100.000$00 cada uma, que pertenceram aos falecidos associados JL e RF.
2. Deliberar que a sede da sociedade esteja definitivamente instalada onde é o seu local, ou seja, na Avenida ... nºs 2850 - 2640, Vendas Novas, ..., em imóvel que pertence à sociedade.
3. Deliberar instaurar acção contra os sócios gerentes AA e BB destinada a obrigar que os mesmos procedam à entrega de toda a documentação relativa à sociedade na sede social referida em 2.

No dia 31 de Maio de 2005, reuniram os sócios da ré, constando da respectiva acta que ali se encontravam presentes os sócios MF, na qualidade de cabeça-de-casal da herança aberta por óbito de JL e RF, MF , representada pelo seu filho JC, MF, LD, representada pelo seu marido CD, AA, representado pelo seu filho CP, e BB, representado pelo seu filho JCC.

Votaram a favor do primeiro ponto da ordem do dia os sócios MF , na qualidade de cabeça-de­-casal da herança aberta por óbito de JL e RF, MF , representada pelo seu filho JC, MF, LD, representada pelo seu marido CD, e votaram contra os sócios AA, representado pelo seu filho CP, e BB, representado pelo seu filho JCC.

Votaram a favor do segundo ponto da ordem do dia os sócios MF, na qualidade de cabeça-de-casal da herança aberta por óbito de JL e RF, MF , representada pelo seu filho JC, MF, LD, representada pelo seu marido CD, e votaram contra os sócios AA, representado pelo seu filho CP, e BB, representado pelo seu filho JCC.

O sócio BB, representado pelo seu filho JCC, ditou a seguinte declaração de voto: O voto contra não se prende com qualquer oposição em princípio em que a sede fique no local ora pretendido, mas com o facto de o pacto social ter previsto local diverso (Vendas Novas, ...), o qual foi pela prática associado à sede da FC. Desta forma e até por economia de custos necessária - numa sociedade que para já tem pouca actividade - entende-se que deveria manter-se a situação actual sem prejuízo de fim da sociedade o funcionar de forma diferente de se ponderar a mudança de sede. Por outro lado, a deliberação que se pretende tomar constitui alteração do contrato de sociedade pelo que deveria como tal estar contemplada na convocatória, não existindo quorum deliberativo para a tomar, à qual aderiu o sócio AA, representado pelo seu filho CP.

Votaram a favor do terceiro ponto da ordem do dia os sócios MF , na qualidade de cabeça-de­-casal da herança aberta por óbito de JL e RF, MF , representada pelo seu filho JC, MF, LD, representada pelo seu marido CD, e votaram contra os sócios AA, representado pelo seu filho CP, e BB, representado pelo seu filho JCC.

O sócio BB, representado pelo seu filho JCC, ditou a seguinte declaração de voto: As razões já aduzidas na declaração de voto do ponto anterior dão-se aqui por integralmente reproduzidas. Assim e enquanto não se alterar o pacto social no sentido da consagração da nova sede social deve o espólio contabilístico e documentação associada permanecer depositada no local habitual, devendo outrossim criar-se uma sala específica no edifício onde tal espólio se encontra actualmente para exclusivamente a gerência da sociedade praticar em relação a tais documentos os actos que reputar necessários, à qual aderiu o sócio AA, representado pelo seu filho CP.

Os autores intentaram procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais contra a ora requerida, a qual correu termos pelo 1º Juízo Cível deste Tribunal, com o número 4941/05.0, pretendendo obter a suspensão das deliberações sociais tomadas na assembleia geral referida, a qual, por decisão proferida a 13 de Julho de 2005, transitada em julgado, foi declarada extinta por inutilidade superveniente da lide, por se ter considerado caducado o direito dos requerentes de impugnarem a sua validade.

A 1ª Conservatória do Registo Predial e Comercial de Santa Maria da Feira enviou à sociedade ré um oficio datado de 7 de Julho de 2005, com o "assunto: aumento de capital social para o valor mínimo legal", concedendo o prazo de três meses para "apresentação do registo de "aumento do capital social para o valor mínimo legal e a consequente alteração do contrato de sociedade no que respeita ao artigo do capital, sócios e quotas" ou para "apresentação de declaração pela sociedade subscrita pelos sócios, no sentido de que não procederão ao aumento de capital legalmente obrigatório", informando que "no caso de decorrerem os 3 meses acima referidos sem que seja apresentado o registo a que se faz referência na mencionada alínea a) ou no caso de ser apresentada a declaração referida na alínea b), procederemos à participação ao Ministério Público junto do Tribunal Judicial de Santa Maria da Feira para efeitos do disposto no nº1 do Decreto-Lei 235/2001, de 31 de Agosto - Dissolução da Sociedade".

Os autores "considerando o teor da notificação da 1ª Conservatória do Registo Predial e Comercial de Santa Maria da Feira, que intima a Sociedade CC & Filhos, Limitada a aumentar o capital social para o valor mínimo legal", convocaram, por convocatória datada de 15 de Setembro de 2005, os sócios daquela para a "Assembleia Geral Extraordinária, a realizar no próximo dia 1 de Outubro de 2005, com início às 10:00 horas, e com a seguinte ordem de trabalhos:
Aumento do capital social para o valor mínimo legal e a consequente alteração do contrato de sociedade no que respeita aos artigos relativos ao capital, sócios e quotas:
Convoca-se, a título excepcional, a realização da referida Assembleia Geral para o Edificio sito na Avenida ....l, nº 300, da freguesia de ... (Edificio da FC - JL & Filhos, Lda), em virtude de existirem dúvidas quanto à concreta localização da sede social, que alguns sócios entendem localizar-se nos nºs 2850-2640, da Avenida , da freguesia de ... (cfr. Deliberação plasmada na Acta da Assembleia Geral Extraordinária de 31 de Maio de 2005, a qual foi, entretanto, objecto de impugnação judicial, não existindo ainda decisão com trânsito em julgado), e em virtude de tal localização não dispor de condições satisfatórias para a realização dos trabalhos.

No dia 1 de Outubro de 2005, reuniram os sócios da ré, constando da respectiva acta que ali se encontravam presentes os sócios MF , na qualidade de cabeça-de­-casal da herança aberta por óbito de JL e RF, MF F, representada pelo seu filho JC, MF, LD, representada pelo seu marido CD, AA e BB.

Pelos sócios MF, na qualidade de cabeça-de-casal e representada pelo seu filho, MF e LD, representada pelo seu marido, foi dito:
a) que a assembleia tinha sido irregularmente convocada, já que a sociedade tem a sua sede noutro local, ou seja, na Avenida ..., nºs 2850 a 2640, Vendas Novas, ..., e não nas instalações da sociedade JL & Filhos, Lda, para onde tinha sido convocada;
b) que, para além disso, na convocatória não se indicava a modalidade do aumento do capital, nem no aviso convocatório se deu cumprimento ao disposto no nº 8 do artigo 377º do Código das Sociedades Comerciais (…);
c) que, por último, é no mínimo estranho que os sócios gerentes AA e BB tenham recebido uma notificação da Conservatória do Registo Comercial e tenham aguardado quase pelo termo fixado por aquela repartição para dar conhecimento aos restantes sócios gerentes da comunicação que foi feita;
d) que, em face da irregularidade da convocatória, a assembleia não está em condições de poder deliberar validamente.

Pelos mesmos sócios foi ainda dito que:
a) votam contra qualquer deliberação de aumento de capital, enquanto não for reposta a situação de legalidade no interior da sociedade;
b) tal reposição da legalidade passa pelo reconhecimento de que a sede da sociedade fica localizada na Avenida ..., nº 2850 a 2640, e ainda pela permissão do acesso à escrita e demais documentos relativos às operações sociais, acesso que tem vindo a ser negado pelos sócios gerentes AA e BB;
c) o acesso à escrita é absolutamente fundamental para que os demais sócios e gerentes possam comprovar a existência das graves suspeitas sobre as irregularidades praticadas pelos sócios gerentes AA e BB já denunciadas na carta datada de 26 de Abril de 2005 e a que não foi dada qualquer resposta;
d) já após aquela carta de 26 de Abril de 2005, descobriu-se que existem provas documentais de desvios de avultadas quantias de dinheiro pelos sócios gerentes AA e BB para a sociedade JL & Filhos, Limitada, existindo suspeitas fundadas que todas as receitas da sociedade foram e estão a ser afectadas a fins e custos estranhos à sociedade;
e) a sociedade não exerce qualquer actividade, a não ser o mero recebimento de rendas, desde há muitos anos, devido ao modo como tem sido gerida pelos sócios AA e BB;
f) em face de toda a situação descrita, a dissolução da sociedade será um mal menor, já que a liquidação judicial permitirá apurar todas as apontadas ilegalidade e responsabilizar os seus autores.

Submetida a proposta apresentada a votação, a mesma não foi aprovada, tendo o aumento de capital sido rejeitado com os votos contra dos sócios MF, LD e MF , esta também na qualidade de cabeça-­de-casal da herança aberta por óbito de JL e RF, e os votos a favor dos sócios AA e BB.

O sócio BB fez a seguinte declaração de voto: Quanto ao local da realização da Assembleia, remeta-se para as razões expostas na Convocatória. Quanto à oportunidade de realização da Assembleia, foi respeitado o prazo legal da convocação, sendo que tal encargo caberia a qualquer dos gerentes aqui presentes. Quanto à não referência na Convocatória da modalidade de aumento de capital, pretendeu-se dar aos sócios a maior amplitude na sua definição, entendendo o aqui declarante que deverá ser feito por entradas em numerário, cada uma no valor de 221,20 euros, ficando cada sócio com uma quota de 720,00 euros, e perfazendo o capital social 5.040,00 euros.

O sócio AA fez a seguinte declaração de voto:
1) Subscrevo integralmente a declaração de voto para esta acta do sócio BB.
2) Sobre o local da localização das assembleias, remeto para o parágrafo último da convocatória da presente assembleia, fazendo delas a minha ideia.

Os demais sócios presentes votaram contra tais declarações de voto.

Por carta registada com aviso de recepção, datada de 9 de Novembro de 2005, MF e MF convocaram os sócios da ré para reunirem em assembleia geral, na sede social, sita na Avenida ...., nº 2850 - 2640, no dia 26 de Novembro de 2005, pelas 10 horas, com a seguinte ordem do dia:
1. Deliberar destituir, com justa causa, de gerentes da sociedade os sócios AA e BB que, de facto, têm sido quem tem gerido sociedade, sem darem qualquer satisfação aos restantes gerentes, em face de se ter descoberto que as receitas sociais têm vindo a ser afectadas a fins e à satisfação de custos estranhos à sociedade e em virtude destes não procederem ao depósito/ entrega de toda a documentação e demais elementos relativos à escrituração social na sede social nos termos deliberados na assembleia geral da sociedade realizada no dia 30 de Maio de 2005;
2. Discussão das medidas tendentes a regularizar a situação do capital social através da divisão, em partes iguais, por todos os herdeiros, das quotas que pertenciam aos falecidos sócios JL e RF, divisão a ser efectuada em simultâneo com o aumento do capital social para €5.000 euros, por subscrição em dinheiro de todos os sócios da quantia global de €1.508,41, a realizar até 30 de Novembro de 2005, de modo a que o capital passe a ser de €5.000 (cinco mil euros) dividido em cinco quotas no valor nominal de € 1.000 euros cada uma.
3. Deliberar dar a seguinte nova redacção ao artigo relativo à composição do contrato de sociedade: o capital social é de 5.000 euros repartido por cinco quotas iguais, no valor de 1.000 euros cada uma, de que são titulares os sócios MF , MF, LD, AA e BB.

Da carta referida anteriormente consta, na parte final, a seguinte "Nota: o texto da ordem do dia foi feito propositadamente de forma discursiva, a fim de o mesmo conter o próprio teor das propostas que irão ser feitas em assembleia geral e assim ser dado cumprimento ao disposto no nº 8 do art. 377° do Código das Sociedades Comerciais, aplicável por força do estabelecido no art. 248°, nº1, do mesmo diploma.

Por documento escrito, datado de 26 de Novembro de 2005, intitulado "Carta de Representação", LD declarou conceder poderes ao meu filho CL para me representar na assembleia geral da sociedade que se realizará no próximo 26 de Novembro de 2005, incluindo os de votar, conforme entenda, os diversos pontos da ordem do dia da assembleia geral.

Por documento escrito, datado de 26 de Novembro de 2005, intitulado "Carta de Representação", MF declarou conceder poderes ao meu filho CL para me representar na assembleia geral da sociedade que se realizará no próximo 26 de Novembro de 2005, incluindo os de votar, conforme entenda, os diversos pontos da ordem do dia da assembleia geral.

Por documento escrito, datado de 26 de Novembro de 2005, intitulado "Carta de Representação", MF declarou conceder poderes ao meu filho CL para me representar na assembleia geral da sociedade que se realizará no próximo 26 de Novembro de 2005, incluindo os de votar, conforme entenda, os diversos pontos da ordem do dia da assembleia geral.

No dia 26 de Novembro de 2005 reuniram os sócios da ré, constando da respectiva acta que ali se encontravam presentes os sócios MF, na qualidade de cabeça-de­-casal da herança aberta por óbito de JL e RF, MF , representada pelo seu filho JC, "nos termos da carta mandadeira anexa à presente acta e cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido, MF, representado pelo seu filho CL, "nos termos da carta mandadeira anexa à presente acta e cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido", LD, representada pelo seu marido CD, "nos termos da carta mandadeira anexa à presente acta e cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido".

Presidiu aos trabalhos a sócia MF, a qual declarou que a) a assembleia tinha sido regularmente convocada por cartas registadas, com aviso de recepção, expedidas a 9 de Novembro de 2005; b) que se encontrava representado cinco sétimos do capital social, correspondente à quota dos sócios; c) que a assembleia se encontrava em condições de reunir e deliberar validamente sobre todos os pontos da Ordem do Dia ... , e que nos termos do disposto no artigo 251°, nº1, al. j), do Código das Sociedades Comerciais, os sócios gerentes AA e BB, ainda que estivessem presentes, estavam impedidos de votar a deliberação.

Da respectiva acta consta que tomou a palavra o representante da sócia LD, CD, apresentou a seguinte proposta:
1. Considerando que os sócios gerentes AA e BB têm sido, desde sempre, os únicos gerentes de facto da sociedade, apesar de esta possuir formalmente outros gerentes a quem são sonegados todos os elementos de informação sobre a vida da sociedade;
2. Considerando que os referidos AA e BB sempre recusaram o acesso a toda a documentação relativa à escrita da sociedade apesar de tal ter sido solicitado por carta de 26 de Abril de 2005 e objecto de deliberação na assembleia geral de 31 de Maio de 2005;
3. Considerando que os referidos gerentes se recusam a entregar a documentação;
4. Considerando que o acesso à escrita é absolutamente fundamental para que os demais sócios e gerentes possam comprovar a existência de graves suspeitas sobre as irregularidades praticadas pelos sócios gerentes AA e BB já denunciadas na carta datada de 26 de Abril de 2005 e a que não foi dada qualquer resposta;
5. Considerando que os referidos gerentes são os únicos que movimentam os cheques da sociedade e que se veio a verificar recentemente que foram transferidas, antes do início de 2005, em data concreta, que se ignora por não se ter acesso à escrita, para a sociedade FC - JL & Filhos, Limitada a quantia de € 200.000 (duzentos mil euros), sociedade de que os sócios gerentes AA e BB são gerentes;
6. Considerando que a sociedade tem, pelo menos, cerca de 100.000 euros de rendas por ano e que a sociedade tem despesas insignificantes, pelo que não há qualquer razão para a sociedade não possuir qualquer quantia significativa em bancos, nem em caixa;
7. Considerando que, em 28 de Fevereiro de 2005, foram transferidas, por ordens dos sócios gerentes AA e BB, para a sociedade JL & Filhos, Limitada, a quantia de € 75.000 (setenta e cinco mil euros) e em 4 de Agosto de 2001 mais a quantia de € 40.000 (quarenta mil euros);
8. Considerando que, desde 1989, a sociedade nunca distribuiu dividendos, sendo certo que a mesma se tem dedicado à mera administração de bens e que as rendas recebidas totalizaram cerca de € 950.000 (novecentos e cinquenta mil euros);
9. Considerando que existem suspeitas fundadas - que só a análise da documentação e da escrita da sociedade poderá permitir confirmar - que houve outras receitas e proveitos da sociedade que não foram utilizados para custear actividades desta
Propõe-se
A destituição, com justa causa, de gerentes da sociedade dos sócios AA e BB.

Foi submetida tal proposta a votação, sendo aprovada a destituição dos gerentes AA e BB, passando-se ao segundo ponto da ordem do dia, tendo tomado a palavra o representante da sócia LD, CD, que disse que a dissolução judicial da sociedade poderia vir a ter custos fiscais significativos e que, uma vez que, com a destituição com justa causa dos gerentes AA e BB será possível repor a legalidade, propunha que: Que o capital da sociedade seja aumentado de 700.000$00 (setecentos mil escudos), ou seja, € 3.491,58, para 5.000 euros por subscrição em dinheiro a realizar do seguinte modo: a) no que respeita às quotas de que eram titulares os falecidos sócios JL e RF no valor de 100.000$00 cada uma, ou seja, € 498,79 que as mesmas fossem aumentadas em dinheiro para 500 euros cada uma, através da subscrição, em dinheiro, de € 1,21 a ser suportado por todos os herdeiros, sendo as duas quotas no valor de 20 euros cada uma, ficando cada um dos herdeiros MF, LD, MF, AA e BB a serem titulares, cada um, de duas quotas no valor de 20 euros cada uma, resultante da divisão por cinco das duas quotas de 100 euros pertencentes aos falecidos JL e RF; b) que, quanto às quotas no valor de 100.000$00 (cem mil escudos), de que são titulares os sócios MF, LD, MF, AA e BB, as mesmas sejam aumentadas de 100.000$00, ou seja, € 498,79, para € 800 (oitocentos euros) cada uma através da subscrição e realização em dinheiro por cada um dos sócios da quantia de € 301,21; c) que a subscrição e realização do aumento sejam efectuados até 6 de Dezembro de 2005 em dinheiro a ser entregue até àquela data ao gerente MF; d) que, caso alguns dos sócios não subscrevam e realizem o aumento de capital até à data limite referida em c), se proceda a rateio pelos restantes sócios do capital não subscrito; e) que se corrija o erro de escrita no valor indicado no ponto 2 da ordem do dia, pois onde se refere € 1.508,41 deverá referir-se € 1.508,46; f) que o gerente MF fique com poderes para proceder aos arrendamentos que se mostrem necessários desde que o resultado final seja o de o valor das participações detidas por todos os sócios ... ser exactamente igual; g) que o gerente MF fique com poderes para outorgar as escrituras de divisão de quotas e aumento de capital.

Da acta consta que “Em face da não comparência dos sócios AA e BB, foi deliberado que a proposta apresentada prejudicava e não poderia ser votada, já que a divisão das quotas dos falecidos JL e RF pressuporia o acordo de todos os sócios. Uma vez que, em face da destituição com justa causa dos sócios gerentes AA e BB, será, após se ter acesso à escrita da sociedade, possível apurar a totalidade das irregularidades por estes praticadas. Será possível, então, estimar o valor das necessidades de tesouraria para suprir as quantias que foram desviadas, pelo que, então será possível determinar qual o montante do aumento a efectuar em dinheiro para colmatar a falta de fundos e fixar o capital social no valor mínimo estabelecido na lei. Será, então, convocada uma nova assembleia geral para deliberar o aumento de capital”.

No que concerne ao terceiro ponto da ordem do dia "foi considerado o mesmo prejudicado porque não foi objecto de qualquer deliberação".

Consta ainda que “Após a assinatura da acta foi detectado o erro de escrita na data da realização da assembleia na folha 5, linha 26. Em tempo: a fls. 5, linha 26, onde se lê "26 de Outubro de 2005" deve ler-se "26 de Novembro de 2005", seguindo-se a assinatura dos presentes na Assembleia Geral em causa.

LD subscreveu o documento cuja cópia se encontra junta a fls. 206, datado de 13 de Janeiro de 2006, dirigido a MF, na qualidade de Presidente da Assembleia Geral de 26 de Novembro de 2005, com o "Assunto: Carta de Representação", com o seguinte teor: A aqui signatária vem, na qualidade de sócia da Sociedade CC & Filhos, Lda, esclarecer que, na Assembleia Geral de 26 de Novembro de 2005, fez-se representar pelo seu marido CD, tendo por erro de escrita sido indicado na respectiva carta de representação o nome de "CL", filho do sócio MF, a quem representou. Ora, tal facto, deve-se apenas a um erro informático, em virtude de as respectivas cartas de representação terem sido elaboradas em simultâneo, não tendo, reitera-se, apenas, por lapso sido alterado o nome do representante. Assim sendo, desde já se rectifica o lapso ocorrido e se esclarece que onde se lê “CL” deverá ler-se “CL”.

MF subscreveu o documento cuja cópia se encontra junta a fls. 207, datado de 13 de Janeiro de 2006, com o "Assunto: Carta de Representação", com o seguinte teor: A aqui signatária vem na qualidade de sócia da Sociedade CC & Filhos, Lda, esclarecer que na Assembleia Geral de 26 de Novembro de 2005, fez-se representar pelo seu filho JC, tendo por erro de escrita sido indicado na respectiva carta de representação, o nome de "CL", filho do sócio MF, a quem representou. Ora, tal facto, deve-se apenas a um erro informático, em virtude de as respectivas cartas de representação terem sido elaboradas em simultâneo, não tendo, reitera-se, apenas, por lapso sido alterado o nome do representante. Assim sendo, desde já se rectifica o lapso ocorrido e se esclarece que onde se lê "CL” deverá ler-se “JC”.

3. O Direito.
Os recorrentes, concordando embora com a orientação dualista que deve ser seguida em matéria de interpretação do pacto social e que foi consagrada no acórdão impugnado, discordam, porém, da aplicação dessa orientação ao caso ajuizado pelo mesmo acórdão, porquanto as posições doutrinais seguidas impunham que o processo baixasse à lª instância para averiguar da vontade e intenção das pessoas envolvidas, em particular da vontade e intenção (a atribuição de um direito especial à gerência) do impulsionador da sociedade, pai dos cinco actuais sócios.

É esta a única questão suscitada, avançando-se, desde já que, apreciado o tratamento que lhe foi dado pela Relação, bem se poderia, sem mais, face aos fundamentos utilizados, porque com eles se concorda, tal como com a solução encontrada, para ele remeter nos termos e ao abrigo do disposto no art. 713º-5 CPC.
Sobretudo no intuito de oferecer mais um contributo no sentido da afirmação da posição jurisprudencial que se adopta, em reforço de posições que já se crêem maioritárias, dir-se-á o que segue sobre o objecto do recurso.

Pedem os autores que sejam anuladas as deliberações sociais da Assembleia Geral da ré, de 26 de Novembro de 2005, alegando, para o que aqui releva, que têm direito especial à gerência, que lhes foi conferido na escritura de constituição da sociedade, tendo sido essa, de resto, a expressa vontade do principal impulsionador da sociedade, o pai dos autores, que a todos os sócios gerentes e cônjuges atribuiu pelouros e responsabilidades. Deste modo, a sua destituição de gerentes obrigava ao recurso à via judicial (arts. 24º, nº 5 e 257º, nº 3, do CSC).

Como é sabido, os direitos dos sócios, como tal, podem ser gerais e especiais. Os primeiros competem por igual a todos os sócios; os segundos conferem aos seus titulares uma vantagem especial, um privilégio, uma posição de supremacia frente aos demais associados (cfr. Ferrer Correia, Estudos Jurídicos, II, pag. 96 e Pinto Furtado, Deliberações dos Sócios, pag. 261).
Quanto a esta última espécie (direitos especiais), refere aquele primeiro Autor (ob. e loc. citados) que se trata de direitos de uma feição singular, pois não se mostram ao serviço de valores sociais ou de interesse comum a todos os sócios, mas de interesses próprios e exclusivos de um ou alguns deles. São, por certo, direitos estatutários, mas a sua função é tutelar o interesse do sócio a quem competem já em relação ao dos outros sócios, já em face do próprio interesse da sociedade.

A disciplina fundamental dos direitos especiais é objecto do art. 24º do CSC, de que se destaca o direito especial à gerência.

Mas, para se saber se estamos ou não em face de um direito especial haverá que atender apenas aos termos objectivos do respectivo pacto ou estatuto social ou poder-se-á recorrer, para o efeito e como meio interpretativo, a elementos estranhos a esses instrumentos?

Tem a jurisprudência - ao que cremos dominante - defendido que o problema da interpretação das cláusulas dos pactos sociais se resume à descoberta do sentido objectivo da declaração negocial e, assim, não podem ter-se em conta a vontade real das partes, nem elementos estranhos ao contrato social, porque estão em jogo interesses de terceiros - daqueles que hajam contratado com a sociedade.

No contrato de sociedade não importa tanto a vontade real dos sócios originários, ao darem vida à sociedade, mas apenas a vontade objectiva e perceptível por todos quantos possam vir a ter relações com o novo ente.

Porém, a verdade é que, a respeito das sociedades por quotas, se tem doutrinado que se a interpretação objectiva é de exigir no tocante às cláusulas que visam a protecção dos credores sociais, já essa exigência se não impõe nas sociedades por quotas de índole personalista quanto às cláusulas sobre relações corporativas internas e às de natureza jurídica individual, vigorando, então, nesta matéria, os princípios gerais de interpretação dos negócios jurídicos formais (art. 238º do C.Civil), com admissibilidade, portanto, do recurso a quaisquer elementos interpretativos contemporâneos do negócio, ou anteriores ou posteriores à sua conclusão (v. Vaz Serra, RLJ, ano 112, pags. 21 e sgs. e, ainda, pag. 173, nota 2).

Cremos que é de sufragar este critério, visto que, respeitando inteiramente os direitos de terceiros, é o que melhor permite averiguar a intenção que presidiu à formulação de cláusulas pactícias que apenas respeitam aos interesses dos sócios entre si sem qualquer repercussão sobre esferas jurídicas alheias.

A estipulação estatutária pela qual são nomeados gerentes inclui-se naquelas cuja interpretação se deve fazer recorrendo a todos os elementos interpretativos (cfr. António Caeiro, Destituição do gerente designado no pacto social, em Temas do Direito das Sociedades, pag. 396).
Mais do que aquilo que as partes declararam, importa aqui descobrir a sua intenção comum, desde que essa intenção tenha um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento, ainda que imperfeitamente expresso (art. 338º do C.Civil).

Ora, a interpretação de um contrato consiste em determinar o conteúdo das declarações de vontade e, consequentemente, os efeitos que o negócio visa produzir, em conformidade com essas declarações (Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3ª ed., pag. 444).
O sentido das declarações negociais das partes, nos termos do art. 236º, nº s 1 e 2, será aquele que possa ser deduzido por um declaratário normal colocado na posição do declaratário real, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele, sem embargo de, conhecendo o declaratário a vontade real do declarante, ser de acordo com ela que vale a declaração emitida. Consagrou-se, assim, a denominada teoria da impressão do destinatário, teoria que sofre adaptação objectiva no caso dos negócios formais, em que a declaração não pode valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do documento, ainda que imperfeitamente expresso, salvo se tal sentido corresponder à vontade real das partes e as razões determinantes da forma do negócio se não opuserem a essa validade (art. 238º, nº s 1 e 2).
No domínio da interpretação, surgem como elementos essenciais - a que deve recorrer-se para a fixação do sentido das declarações - "a letra do negócio, as circunstâncias de tempo, lugar e outras, que precederam a sua celebração ou são contemporâneas desta, bem como as negociações respectivas, a finalidade prática visada pelas partes, o próprio tipo negocial, a lei e os usos e os costumes por ela recebidos" (Luís Carvalho Fernandes, Teoria Geral do Direito Civil, vol. II, pag. 344). Ou, como exemplifica Manuel de Andrade (Teoria Geral da Relação Jurídica, II, pag 213), “os termos do negócio; os interesses que nele estão em jogo (e a consideração de qual seja o seu mais razoável tratamento); a finalidade prosseguida pelo declarante; as negociações prévias; os hábitos do declarante (de linguagem ou outros); os usos da prática, em matéria terminológica, ou de outra natureza que possa interessar, devendo prevalecer sobre os usos gerais ou especiais (próprios de outros meios ou profissões), etc.".

Porém, a interpretação das declarações ou cláusulas contratuais constitui, como é sabido, matéria de facto, da exclusiva competência das instâncias.
Ao Supremo, como tribunal de revista, só cabe exercer censura sobre o resultado interpretativo sempre que, tratando-se da situação prevista no nº1 do art. 236º do C.C., tal resultado não coincida com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, pudesse deduzir do comportamento do declarante ou, tratando-se de situação contemplada no art. 238º, nº1, do mesmo diploma, não tenha um mínimo de correspondência no texto do documento, ainda que imperfeitamente expresso.
Quer dizer, constitui matéria de direito, sindicável pelo Supremo, determinar se na interpretação das declarações foram observados os critérios legais impostos pelos citados arts. 236º e 238º, para efeito da definição do sentido que há-de vincular as partes, face aos factos concretamente averiguados pelas instâncias.

É o que faremos de seguida.
Mas antes há que ter presente que o direito especial pode ser atribuído a todos os sócios da mesma sociedade, como, por outro lado, a simples designação de gerente no contrato de sociedade não significa a atribuição de um direito especial à gerência (v. Raul Ventura, in Sociedades por Quotas, vol. III, - Comentário ao Código das Sociedades Comerciais, pags. 16 e sgs. e Pinto Furtado, in Código Comercial Anotado, vol. II – Das Sociedades em Especial, pags. 773 e sgs.).

E assim, já se vê que, não obstante a gerência da sociedade ré e a sua representação em juízo, activa e passivamente, pertencer a todos os sócios (art. 5º do pacto), não é decisivo para se concluir que os autores têm o direito especial à gerência.
Como não é decisivo o complemento do mesmo artigo de que os gerentes nomeados podem delegar por procuração, total ou parcialmente, estes poderes nos eus cônjuges.
Como bem observa a Relação, citando António Caeiro, esta cláusula vinca a índole personalista da sociedade, não traduzindo a atribuição de um privilégio especial.
Acresce que em lado algum do contrato de sociedade se faz referência a qualquer direito especial à gerência conferido a qualquer dos sócios ou a todos eles.

Sustentam, porém, os recorrentes que, para a decisão da questão que vimos apreciando, e tendo em conta as posições doutrinais sobre a interpretação das cláusulas dos pactos sociais, se impunha que o processo baixasse à lª instância para averiguar da vontade e intenção das pessoas envolvidas, em particular da vontade e intenção do impulsionador da sociedade, o pai dos autores, que a todos os sócios-gerentes e cônjuges atribuiu pelouros e responsabilidades e se esse sócio teve o especial desígnio de congregar à sua volta toda a sua família nuclear - ele, a mulher, os filhos e o seus cônjuges.

Como é sabido, são insindicáveis pelo Supremo questões de facto, salvo a ampliação do art. 729º, nº 3, do CPC ou a situação do seu art. 722º, nº 2.
A previsão desta disposição legal não se verifica e nem sequer foi invocada.
O mesmo não acontece com a outra norma referida.

O Tribunal da Relação não reputou de deficiente a decisão sobre a matéria de facto, quando refere:
“A estrutura familiar e personalista que decorre das várias cláusulas do contrato de sociedade constitui elemento atendível, mas claramente não decisivo.
Ora, cremos que a referida alegação pouco mais acrescenta que confirmar a referida estrutura da sociedade. Nada esclarece sobre o âmbito da gerência atribuída no contrato, não se referindo, aliás, especificamente à gerência. Com efeito, o sentido do que os autores afirmaram - por um lado, a expressa vontade de atribuir a todos os sócios e respectivos cônjuges pelouros e responsabilidade e, por outro, a vontade de congregar à sua volta toda a sua família nuclear - é perfeitamente compatível, num caso, com a simples atribuição de gerência e, no outro, com a qualidade de sócio.
Nada que indicie suficientemente a atribuição de um direito especial à gerência e que permita assim interpretar a cláusula 5ª dos estatutos (longe, muito longe, dos termos inequívocos que atrás reproduzimos). A este respeito a cláusula é neutra”.

Estamos de acordo com esta asserção.
O retorno do processo ao tribunal recorrido para ampliação da decisão de facto, nos termos do nº 3 do art. 729º, só deve ter lugar quando o Supremo se encontre impossibilitado de julgar de direito por insuficiência de elementos de facto, o que não é o caso.
Tendo, na interpretação das declarações, sido observados os critérios legais impostos pelos citados arts. 236º e 238º do C.Civil, para efeito da definição do sentido que há-de vincular as partes, face aos factos concretamente averiguados pelas instâncias, só resta concluir pela improcedência do recurso.

4.
Face ao exposto, decide-se negar a revista.
Custas pelos recorrentes.

Lisboa, 17 de Abril de 2008

Oliveira Rocha (relator)
Oliveira Vasconcelos
Serra Baptista