Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 4.ª SECÇÃO | ||
Relator: | FRANCISCO MARCOLINO | ||
Descritores: | CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO BANCÁRIO INTERPRETAÇÃO | ||
Data do Acordão: | 11/29/2022 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA A REVISTA. | ||
Indicações Eventuais: | TRANSITADO EM JULGADO. | ||
Sumário : |
I – A letra da cláusula da convenção colectiva é o ponto de partida da sua interpretação, mas também o seu limite. II – Se a interpretação proposta não tiver o mínimo de correspondência na letra da cláusula, não pode vingar tal proposta, tornando-se desnecessário recorrer a outros elementos de interpretação. | ||
Decisão Texto Integral: | Processo 629/21.3T8CSC.L1.S1
* Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça
I – Relatório 1. AA instaurou contra Banco Santander Totta, S.A., acção de processo comum de declaração, pedindo, para além da condenação da Ré a pagar-lhe determinadas quantias em dinheiro, a condenação da mesma a reconhecer ao A. o direito a receber a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzida do valor correspondente à percentagem de 46,66 %, correspondente a 7 anos de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário. Em síntese, e para o que interessa à economia do presente recurso, alega que a Ré, que adianta a pensão de reforma, de acordo com os cálculos do Acordo Colectivo de Trabalho para o Sector Bancário, recebendo, depois, a totalidade do valor pago pela Segurança Social, com autorização do autor, deduz e tem feito sua a quantia mensal de € 329,41 correspondente a 80,53%, do valor da pensão paga pelo Centro Nacional de Pensões ao autor, quando na realidade só teria direito a 46,66 % da pensão que lhe foi atribuída pelo CNP, o que corresponde a € 190,85, tendo por base o disposto na Cláusula 94ª, nº 1, e 92º, nº 3, ambas do ACT para o Sector Bancário cuja versão integral se encontra publicada no BTE 1ª Série, nº 29, de 8/08/2016.
2. A ré contestou, defendendo que o cálculo que faz do desconto a efectuar à pensão paga pelo CNP se mostra correcto.
3. Com o acordo das partes foi lavrado despacho saneador-sentença que, na procedência da acção, assim decidiu: “a) Condeno a ré Banco Santander Totta, S.A, a reconhecer ao autor AA o direito a receber a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzida do valor correspondente à percentagem de 46,666%, correspondente aos 7 anos de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário; b) Condeno a ré a pagar ao autor a quantia de € 3.147,21 (três mil cento e quarenta e sete euros e vinte e um cêntimos), correspondente ao valor excessivamente descontado entre Maio de 2019 e Março de 2021, valor onde se encontram englobados os respectivos subsídios de férias e de Natal, acrescido de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento; c) Condeno a ré a aplicar uma regra pro-rata temporis ou regra de três simples pura no apuramento da parte da pensão do Centro Nacional de Pensões a entregar ao Banco/ré, respeitante aos descontos efectuados pelo autor para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário; d) Condeno a ré a pagar ao autor todas as quantias que tenha retido da pensão do Centro Nacional de Pensões, desde Março de 2021, pela não aplicação da regra descrita em c), e venha a reter até trânsito em julgado da mesma, acrescidas de juros de mora vincendos, a liquidar em incidente de liquidação”.
4. O Réu interpôs recurso considerando que a sentença é nula por omissão de pronúncia e alegou que a sentença recorrida fez errada interpretação da Cláusula 94ª do ACT para o Sector Bancário.
5. Contra alegou o Autor em defesa da sentença recorrida.
6. Por acórdão da Relação de Lisboa de 9 de Março de 2022, sem voto de vencido e com fundamentação coincidente, no essencial, com a decisão, negou “provimento ao recurso, mantendo a sentença da 1ª Instância”.
7. Ainda irresignado, o R interpôs recurso de revista excepcional, assim concluindo a sua alegação:
8. Contra-alegou o Recorrido concluindo que “a sentença recorrida não merece qualquer censura (…)”.
9. Remetidos os autos à Formação decidiu esta admitir a revista excepcional.
10. O MP pronunciou-se no sentido de ser negado provimento ao recurso.
11. Nos presente autos apenas se questiona a forma como deve ser calculada a pensão a que se refere a cláusula 136.ª do Acordo Coletivo de Trabalho do sector bancário (BTE n.º 3 de 22/01/2011), cláusula que veio a ser substituída, com redação similar, pela cláusula 94.ª do Acordo Coletivo de Trabalho do sector bancário (BTE n.º 29 de 08/08/2016).
II – Fundamentação As Instâncias considerarem provada a seguinte factualidade: 1. A 1ª Instância julgou a acção procedente com o seguinte argumentário: “A questão controvertida e a decidir nestes autos reside na interpretação da Cláusula 94º, nº1 e 2, do Acordo coletivo entre várias instituições de crédito e a Federação do Sector Financeiro - FEBASE - Revisão global, (doravante ACT do Sector Bancário), publicado no Boletim do Trabalho e do Emprego (doravante BTE), 1ª Série, nº 29, de 8/08/2016 (em vigor à data da passagem do autor à reforma), que sucede ao anteriormente publicado no BTE , 1ª Série, nº3, de 22/01/2011 (com as alterações publicadas no BTE , 1ª Série, nº8, de 29/02/2012), cuja Cláusula 136º tinha idêntico teor. Vejamos o que dispõe tal cláusula, inserida na Secção II, sob a epigrafe Benefício: Cláusula 94.ª Garantia de benefícios e articulação de regimes 1- As instituições de crédito garantem os benefícios constantes da presente secção aos trabalhadores referidos no número 3 da cláusula 92.ª, bem como aos demais titulares das pensões e subsídios nela previstos. Porém, nos casos em que benefícios da mesma natureza sejam atribuídos por instituições ou serviços de Segurança Social a trabalhadores que sejam beneficiários dessas instituições ou seus familiares, apenas é garantida pelas instituições de crédito a diferença entre o valor desses benefícios e o dos previstos nesta secção. 2- Para efeitos da segunda parte do número anterior, apenas são considerados os benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou serviços de Segurança Social com fundamento na prestação de serviço que seja contado na antiguidade do trabalhador nos termos da cláusula 103.ª. (…)” O mencionado nº 3 da Cláusula 92ª do aludido ACT prevê que “3- Aos trabalhadores que à data da entrada em vigor do presente acordo estejam abrangidos pelo capítulo XI, secção I do acordo colectivo de trabalho do sector bancário ora revogado, é garantido o regime de protecção social em regime de benefício definido nos termos da secção II - Benefício definido do presente capítulo”. Tais cláusulas sucederam à Cláusula 136.ª do ACT do sector bancário (versão publicada no BTE n.º 3, de 22/01/2011), que tinha o seguinte teor sob a epígrafe “Benefícios sociais” SECÇÃO I Segurança social Cláusula 136.ª Âmbito 1 — As instituições de crédito, por si ou por serviços sociais privativos já existentes, continuarão a garantir os benefícios constantes desta secção aos respectivos trabalhadores, bem como aos demais titulares das pensões e subsídios nela previstos. Porém, nos casos em que benefícios da mesma natureza sejam atribuídos por instituições ou serviços de segurança social a trabalhadores que sejam beneficiários dessas instituições ou seus familiares, apenas será garantida, pelas instituições de crédito, a diferença entre o valor desses benefícios e o dos previstos neste acordo. 2 — Para efeitos da 2.ª parte do número anterior, apenas serão considerados os benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou serviços de segurança social com fundamento na prestação de serviço que seja contado na antiguidade do trabalhador nos termos das cláusulas 17.ª e 143.ª 3 — As instituições adiantarão aos trabalhadores abrangidos pelo regime geral da segurança social as mensalidades a que por este acordo tiverem direito, entregando estes à instituição a totalidade das quantias que receberem dos serviços de segurança social a título de benefícios da mesma natureza”. No caso concreto as partes estão de acordo e tal resulta dos factos dados como provados que o autor trabalhou para a ré entre Setembro de 1983 e a data da sua reforma em 31 de Dezembro de 2017 e que teve a seguinte carreira contributiva: - De 06-1973 a 03-1975 e de 07-1978 a 09-1982 o autor efectuou descontos para a Segurança Social decorrentes da prestação de actividade dependente remunerada a entidade não bancária; - De 09-1983 a 12-2010 o autor, enquanto trabalhador bancário, efectuou descontos para a Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários (CAFEB); - Com a extinção da CAFEB por integração no Instituto da Segurança Social, I.P., o autor passou a descontar, enquanto trabalhador bancário, para a Segurança Social, até passar à situação de reforma desde 01-01-2011 a 31-12-2017. E estão também de acordo e tal resulta do teor do documento emitido pelo Centro Nacional de Pensões que deferida a pensão por Velhice com início em 9/05/2019, o valor de tal pensão, e após novo cálculo, foi de € 399,02, considerando-se, para tal cálculo, como pensão proporcional ou prorratizada (totalização com períodos contributivos noutros regimes de protecção social) 15 anos de número de anos de Segurança Social, e número de anos civis 40 e como fator de prorratização 15/40. Ora, dos 15 anos de contribuições considerados pela Segurança Social, 7 foram ao serviço da ré entre 1/01/2011 e 31/12/2017. Tal pensão, como aceite pelas partes, é desde Maio de 2020, no valor de € 409,02. Igualmente está aceite e resulta dos documentos e avisos de crédito emitidos pela ré que a ré da pensão de reforma do Centro Nacional de Pensões apenas entrega ao autor, desde Maio de 2020, no valor de € 409,02 a quantia de € 79,61, sendo antes de tal data a quantia de € 77,66 quando a pensão era de € 399,02, com a designação de “pensão extra-banco”, correspondente pois a 19,46% do valor total de tal pensão. Finalmente aceite que a ré paga ao autor o valor das mensalidades de reforma previstas no ACT do Setor Bancário e, enquanto entidade centralizadora do pagamento da pensão de velhice da segurança social, retém parte do valor correspondente à antiguidade gerada ao seu serviço, e entregue ao autor o remanescente do valor (“Pensão extra Banco). A questão em análise nos presentes autos coloca-se única e exclusivamente no que respeita ao cálculo do remanescente, tendo autor e réu interpretações distintas das regras legais e convencionais em vigor sobre esta matéria e sendo, a final, a questão que este Tribunal é chamado a decidir. O autor entende que deverá ser utilizado exclusivamente um critério de proporcionalidade (ou uma regra de três simples), considerando que a ré apenas tem direito a reter o valor correspondente a 7 anos (correspondentes aos descontos efectuados quando ao serviço da ré e após a integração do CAAFEB no ISS-IP), dos 15 anos de descontos para a Segurança Social, ou seja, tendo em conta a pensão actual de € 409,02 (correspondente aos 15 anos de contribuições considerados), e considerando que destes 15 anos de contribuições 7 foram ao serviço da ré, considera o autor que esta só poderia reter € 190,876 (€409,02 x 7 : 15), equivalente a uma percentagem de 46,666% (7 x 100 : 15), tendo pois que lhe pagar mensalmente (como “pensão extra Banco) o valor de € 218,144 (€409,02 - €190,876) e não o valor de € 79,61 que a ré actualmente lhe paga e que corresponde à percentagem de 19,46% do valor total de tal pensão (€79,61 x 100 : € 409,02). Por seu turno a ré considera que o valor que paga mensalmente como “pensão extra Banco” num total, actualmente, de €79,61, correspondente à percentagem de 19,46% do valor da referida pensão nos termos supra referidos é o valor correcto pelos seguintes motivos: tendo em consideração que o autor apenas apresentava 15 anos de registo de remunerações para a Segurança Social (7 dos quais ao serviço da ré) a Pensão de Reforma foi prorratizada numa proporção de 15/40 (como aliás resulta dos factos provados) e que aplicando as regras previstas no artigo 28º do D.L. 187/2007, tendo o autor 43 anos de contribuições mas considerando o limite de 40 anos de contribuições (como igualmente considerado pelo Centro Nacional de Pensões no cálculo da pensão devida ao autor), se deve fazer para apuramento da remuneração de referência, a soma das 40 remunerações anuais, revalorizadas, mais elevadas e que no caso do autor, como o mesmo apresenta uma carreira mista (períodos ao abrigo da Segurança Social e período ao abrigo do sistema previdencial dos bancários sem descontos para a Segurança, sendo que esse tempo foi contado para efeitos de taxa de formação da pensão) houve necessidade de apurar quais seriam as 40 remunerações anuais mais elevadas considerando nessa contabilização as remunerações auferidas no período sem contribuições para a Segurança Social e que, nesses termos as remunerações pagas pela ré contribuíram com 80,53% para o apuramento da remuneração de referência relevante para o cálculo da pensão estatutária de velhice do autor, daí que só entregue ao autor o remanescente de € 19,46%. De outro ponto considera também mesmo considerando a situação dos beneficiários – como é o caso do autor – inscritos na Segurança Social até 31.12.2001 e aplicando o artigo 33º n.º 1 do D.L. 187/2007 considerando que nos últimos 15 anos da sua carreira contributiva o autor prestou a sua atividade no setor bancário ao serviço da ré também segundo critério de cálculo, a totalidade da remuneração de referência relevante para o cálculo da pensão estatutária de velhice foi auferida pelo autor ao serviço da ré e que assim a retribuição auferida pelo autor em atividade fora da réu não contribuiu em mais de 19,47% para o apuramento da sua remuneração de referência e daí o valor que entrega a título de “pensão extra Banco”. Quid Iuris? Sobre a questão têm sido proferidas inúmeras decisões quer pelos Tribunais de Primeira Instância, como resulta das várias sentenças juntas como “documentos” quer pelos Tribunais Superiores. Considerando tão só a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, como abaixo melhor se concretizará, e designadamente a do ano de 2021, em que aquele Tribunal foi chamado a pronunciar-se bastas vezes sobre o tema, há que concluir que o Supremo Tribunal de Justiça já conheceu e analisou todos os argumentos aduzidos pelas partes e concluiu, no sentido da posição por que o autor pugna. Ora tendo o Supremo Tribunal de Justiça formado, o que se crê, uma posição jurisprudencial, recente e absolutamente unânime, sobre a questão, não se vê motivo para questionar tal jurisprudência, nem tão pouco se encontram argumentos que fundamentem uma tomada de posição diferente por este Tribunal. Assim, por exemplo decidiu o Supremo Tribunal de Justiça em Acórdão de 23/06/2021, processo nº 2115/20.0T8VFR.S1 publicado em www.dgsi.pt que : “I- O número 3.º da cláusula n.º 136.ª do Acordo Coletivo de Trabalho para o sector bancário (cláusula 98ª do ACT do Banco Montepio) ao referir no seu segundo segmento “entregando estes (os trabalhadores que passem à reforma) à Instituição (de Crédito) a totalidade das quantias que receberem dos Serviços de Segurança Social a título de benefícios da mesma natureza” pretende significar que os trabalhadores, na situação de reforma, só têm a obrigação de entregar as quantias que receberem dos Serviços de Segurança Social referentes ao período de tempo em que exerceram a sua atividade bancária e que efetuaram descontos para a Segurança Social, na sequência da extinção da Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários. II- As expressões utilizadas na referida cláusula “a diferença entre o valor desses benefícios” na parte final do n.º 1, “benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou Serviços de Segurança Social” no segundo segmento do n.º 2 e “benefícios da mesma natureza” na parte final do n.º 3, referem-se tão só às pensões, não se podendo afirmar que dos respetivos textos resulte um mínimo de correspondência verbal que possa suportar a interpretação no sentido da introdução de um fator de ponderação que tenha a ver com o valor das contribuições efetuadas.” E na respectiva fundamentação pode ler-se, o que aqui se transcreve e fundamentação à qual se adere: (…) Como resulta da jurisprudência citada a referida cláusula visa impedir que o trabalhador bancário na situação de reforma receba duas pensões pela mesma prestação de trabalho: aquela que lhe foi adiantada por força do Acordo Coletivo de Trabalho e aquela que recebe do Centro Nacional de Pensões em cujo cálculo foi considerado, para além do mais, o período de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário. Assim, as Instituições de Crédito, por força da referida cláusula, irão garantir aos trabalhadores que passem à situação de reforma, abrangidos pelo Regime Geral da Segurança Social, as mensalidades a que tiverem direito, nos termos do Acordo Coletivo de Trabalho para o sector bancário, entregando estes à Instituição a totalidade das quantias que receberem dos Serviços de Segurança Social, a título de benefícios da mesma natureza. A referida cláusula, no seu número 3.º, ao referir “entregando estes à Instituição a totalidade das quantias que receberem dos Serviços de Segurança Social a título de benefícios da mesma natureza” pretende significar que os trabalhadores, na situação de reforma, só têm a obrigação de entregar as quantias que receberem dos Serviços de Segurança Social referentes ao período de tempo em que exerceram a sua atividade bancária e que efetuaram descontos para a Segurança Social, na sequência da extinção da Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários. A questão que agora se coloca consiste em saber como se deve calcular o montante devido à Instituição de Crédito, tendo presente na pensão que o autor recebe do Centro Nacional de Pensões foram tidas em conta fases contributivas distintas, em que os valores das remunerações e respetivas contribuições foram diferentes. Há, pois, que determinar se para além do fator tempo também se deverá atender à relevância das remunerações sobre as quais incidiram as contribuições efetuadas naquele período. Da análise do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de maio, verificamos que de acordo com o art.º 26.º, a pensão estatutária é a que resulta da aplicação das regras de cálculo da pensão (n.º 1), sendo o montante mensal da pensão estatutária igual ao produto da remuneração de referência pela taxa global de formação da pensão e pelo fator de sustentabilidade (n.º 2). A remuneração de referência é calculada nos termos do artigo 28.º deste diploma, tendo como base as remunerações anuais de toda a carreira contributiva revalorizadas nos termos do artigo 27.º, e o número de anos civis com registo de remunerações, com as correções e ajustamentos que aquele dispositivo consagra. A pensão estatutária dos beneficiários inscritos até 31 de dezembro de 2001 e que iniciem pensão até 31 de dezembro de 2016 (como é o caso do autor) é a que resulta da fórmula de cálculo prevista no art.º 33.º, do mesmo diploma. O Supremo Tribunal de Justiça, no citado Acórdão de 06-12-2016, proferido no Processo n.º 4044/15.0T8VNG.P1. S1, já se pronunciou acerca do cálculo do valor das pensões, tendo-se aí referido que o cálculo de valor da pensão é uma operação em que intervém uma pluralidade de fatores, não existindo uma proporcionalidade direta entre o valor final da pensão atribuída e o valor das remunerações registadas para o cálculo da remuneração de referência. Como também se afirmou no mesmo aresto, mantém total atualidade a orientação assumida no acórdão desta Secção de 27 de outubro de 2010, proferido no processo n.º 1889/06.5TTLSB.L1. S1, tendo por base a cláusula 136.ª do Acordo Coletivo de Trabalho para Setor Bancário, ao tempo em vigor, em que se referiu: «Ora, este n.º 3 da cl. ª 136.ª determina que a ré adiante (avance/antecipe) ao autor a quantia correspondente à pensão que resulta do ACTV (que decorre dos oito anos de trabalho no B CC) - devendo o autor devolver-lhe a totalidade das quantias que da Segurança Social receber a esse mesmo título, ou seja, relativos aos oito anos de trabalho no B CC. Assim, utilizando as expressões da Lei e do ACTV, “as prestações emergentes do mesmo facto” atribuídas pela Segurança Social ou “a título de benefícios da mesma natureza” são aquelas que deram origem à pensão do recorrente pela sua prestação de trabalho no B CC, durante oito anos. Deste modo, sem prejuízo da salvaguarda consagrada no n.º 2 da cl. ª 137.ª, a ré apenas pode descontar do montante da pensão prevista no ACTV a parte proporcional da pensão da Segurança Social que corresponda ao período em que o trabalhador exerceu funções no setor bancário pois, como se viu, não pode receber duas pensões pela mesma prestação de trabalho de oito anos no B CC.» Neste último aresto sumariou-se: (…). De facto, nem a Lei, nem o Acordo Coletivo de Trabalho em causa, exigem que se pondere no desconto a realizar não só o fator tempo como também o fator das contribuições efetuadas. As expressões utilizadas na cláusula 136.ª a diferença entre o valor desses benefícios, na parte final do n.º 1, benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou Serviços de Segurança Social, no segundo segmento do n.º 2 e benefícios da mesma natureza, na parte final do n.º 3, referem-se tão só às pensões, não se podendo afirmar que dos respetivos textos resulte um mínimo de correspondência verbal que possa suportar a interpretação no sentido da introdução de um fator de ponderação que tenha a ver com o valor das contribuições efetuadas. Na verdade, todos os fatores em causa já foram considerados no cálculo de valor da pensão por parte do Centro Nacional de Pensões, pelo que, independentemente do peso que as contribuições efetuadas pelo exercício da atividade bancária relativas ao período de 01/01/2011 até 2016 possam ter tido no cálculo do valor da pensão de reforma atribuída ao autor, afigura-se-nos que a ré só tem direito a compensar na pensão de reforma que lhe é paga nos termos do ACT a parte proporcional da pensão da segurança social que corresponde ao período em que o trabalhador exerceu funções no sector bancário com descontos para a Segurança Social, pois só aí existe uma sobreposição das prestações por serem da mesma natureza”.
2. A Relação de Lisboa confirmou a sentença com a seguinte fundamentação: “A segunda questão de direito a enfrentar é a questão fulcral desta acção e consiste em saber se a dedução da pensão a que se referem a cláusula 136ª do Acordo Colectivo de Trabalho do Sector Bancário (ACT), publicado no BTE, 1ª Série, nº 8, de 29 de Janeiro de 2011 e a subsequente cláusula 94ª do ACT do sector bancário, publicado no BTE, 1ª Série, nº 29, de 8 de Agosto de 2016 (as duas cláusulas sucessivas com redacção similar), deve ser feita apenas com base no critério do tempo de contribuições para a Segurança Social ou considerando também o montante das contribuições efectuadas durante aquele período. No fundo, trata-se de interpretar as aludidas cláusulas convencionais – que a nosso ver se revestem de completude, não se justificando o apelo ao regime da integração de lacunas previsto na lei civil, como alega a recorrente – a fim de aferir como se deve calcular o montante devido pela Instituição de Crédito nas situações em que, na pensão atribuída ao trabalhador bancário são tidas em conta duas fases contributivas distintas, em que os valores das remunerações e respectivas contribuições foram diferentes. Estas cláusulas convencionais surgiram porque os trabalhadores bancários beneficiam há longos anos, desde 1936, de um regime específico de segurança social estabelecido nos instrumentos de regulamentação colectiva aplicáveis mas, a partir de 1 de Janeiro de 2011, por força da extinção e integração da Caixa de Abono da Família dos Empregados Bancários (CAFEB) no Instituto de Segurança Social pelo Decreto-Lei nº 1-A/2011, de 3 de Janeiro, passaram a estar protegidos pelo regime geral da Segurança Social, na eventualidade de maternidade, paternidade e adopção e na velhice. A cláusula 136.ª do ACT para o Sector Bancário, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, 1ª Série, nº 3, de 22 de Janeiro de 2011, dispunha do seguinte modo: “1 — As instituições de crédito, por si ou por serviços sociais privativos já existentes, continuarão a garantir os benefícios constantes desta secção aos respectivos trabalhadores, bem como aos demais titulares das pensões e subsídios nela previstos. Porém, nos casos em que benefícios da mesma natureza sejam atribuídos por instituições ou serviços de segurança social a trabalhadores que sejam beneficiários dessas instituições ou seus familiares, apenas será garantida, pelas instituições de crédito, a diferença entre o valor desses benefícios e o dos previstos neste acordo. 2 — Para efeitos da 2.ª parte do número anterior, apenas serão considerados os benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou serviços de segurança social com fundamento na prestação de serviço que seja contado na antiguidade do trabalhador nos termos das cláusulas 17.ª e 143.ª. 3 — As instituições adiantarão aos trabalhadores abrangidos pelo regime geral da segurança social as mensalidades a que por este acordo tiverem direito, entregando estes à instituição a totalidade das quantias que receberem dos serviços de segurança social a título de benefícios da mesma natureza”. Por seu turno Cláusula 94.ª do ACT publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 29, de 8 de Agosto de 2016, veio estabelecer, sob a epígrafe “garantia de benefícios e articulação de regimes”, que: “1- As instituições de crédito garantem os benefícios constantes da presente secção aos trabalhadores referidos no número 3 da cláusula 92.ª, bem como aos demais titulares das pensões e subsídios nela previstos. Porém, nos casos em que benefícios da mesma natureza sejam atribuídos por instituições ou serviços de Segurança Social a trabalhadores que sejam beneficiários dessas instituições ou seus familiares, apenas é garantida pelas instituições de crédito a diferença entre o valor desses benefícios e o dos previstos nesta secção. 2- Para efeitos da segunda parte do número anterior, apenas são considerados os benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou serviços de Segurança Social com fundamento na prestação de serviço que seja contado na antiguidade do trabalhador nos termos da cláusula 103.ª 3- Os trabalhadores ou os seus familiares devem requerer o pagamento dos benefícios a que se refere o número 1 da presente cláusula junto das respectivas instituições ou serviços de Segurança Social a partir do momento em que reúnam condições para o efeito sem qualquer penalização e informar, de imediato, as instituições de crédito logo que lhes seja comunicada a sua atribuição, juntando cópia dessa comunicação. 4- O incumprimento do referido no número anterior, determina que: a) No caso em que o benefício assuma a natureza de pensão e esta seja atribuída com penalização, as instituições de crédito considerem, para o apuramento da diferença a que se refere a segunda parte do número 1, o valor da referida pensão sem aplicação do factor de sustentabilidade e com uma taxa de penalização correspondente a 75 % da taxa efectivamente aplicada pela instituição ou serviço de Segurança Social. b) No caso em que não seja requerido o pagamento dos benefícios logo que reúnam condições para o efeito, apenas é garantido pelas instituições de crédito, a partir dessa data, o pagamento da diferença entre os benefícios previstos neste acordo e o valor, por si estimado, dos benefícios a atribuir pelas instituições ou serviços de Segurança Social. c) No caso em que não seja comunicada às instituições de crédito a atribuição dos benefícios ou não lhes seja enviada cópia da comunicação recebida das instituições ou serviços de Segurança Social, aplica-se o previsto na alínea b) deste número. 5- As correcções que se mostrem devidas em relação aos valores pagos pelas instituições de crédito nos termos da presente secção serão efectuadas logo que estas disponham dos elementos necessários para o seu processamento e serão aplicadas à data em que produzam ou devessem ter produzido efeitos. 6- No momento da passagem à situação de reforma as instituições de crédito informarão o trabalhador dos diplomas legais, em vigor nessa data e que lhe são aplicáveis, que regulam a atribuição de subsídios e pensões por parte dos regimes públicos de segurança social. Desta regulação convencional decorre que a protecção dos trabalhadores bancários estabelecida no instrumento de regulamentação colectiva se articula com outros regimes de segurança social que os abranjam, nomeadamente com o Regime Geral, permitindo-se às instituições bancárias responsáveis pelo pagamento das específicas prestações consagradas a favor destes trabalhadores o desconto, nestas prestações por si pagas, dos benefícios que os trabalhadores aufiram de outros sistemas, para evitar duplicação de benefícios. A questão da interpretação destas cláusulas e, particularmente, no que respeita à questão colocada no presente recurso, tem suscitado uma intensa actividade jurisprudencial, v.g. do Supremo Tribunal de Justiça que, em vários recursos de revista, alguns deles de natureza excepcional [artigo 672.º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Civil], tem acolhido a tese sufragada na sentença sob recurso. Por versar sobre um litígio com contornos idênticos ao presente, lançamos mão da palavra do douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de Junho de 2021, Processo n.º 2276/20.8T8VCT.S1. Como ali se exarou (…) «[…] É a partir da interpretação desta cláusula [a cláusula 136.ª do ACT] e invocando os elementos literal, sistemático e teleológico que o Recorrente conclui que “a “pensão de abate” é, assim, o benefício do CNP pelo tempo de carreira ao serviço do banco (pensão teórica) que resulta das contribuições feitas no período em apreço, apurado segundo as regras do regime geral da segurança social, que são as regras aplicáveis ao cálculo do benefício a pagar pelo CNP” (Conclusão 6.ª), defendendo também que “porque a cláusula 136.ª do ACT do sector bancário (tal como a cláusula 94.ª do atual ACT do setor bancário) se refere expressamente a benefícios decorrentes de contribuições para o regime geral de segurança social e porque o benefício pago pelo regime geral de segurança social (através do CNP) é apurado considerando, além do tempo de carreira contributiva (que determina a taxa de formação da pensão), os montantes das contribuições feitas ao longo da carreira contributiva (por via da determinação da remuneração de referência), torna-se imperioso calcular as duas pensões teóricas” (Conclusão 25.ª). Este Tribunal tem reiteradamente afirmado que a interpretação da parte normativa das convenções coletivas deve seguir as regras da interpretação da lei. A este respeito o artigo 9.º do Código Civil, embora afirme no seu n.º 1 que a interpretação não deve cingir-se á letra da lei, afirma, depois, que “não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso” (n.º 2) e que “na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados” (n.º 3). A letra da lei – aqui a letra da cláusula da convenção – é não apenas o ponto de partida da interpretação, mas o limite da mesma, o que é de particular importância nesta sede já que as partes de uma convenção não devem obter pela interpretação da convenção pelo tribunal o que não lograram obter nas negociações. Ora da letra da cláusula resulta tão-só a garantia de benefícios pelas instituições de crédito, sendo que caso benefícios da mesma natureza sejam atribuídos por Instituições ou Serviços de Segurança Social, aos trabalhadores e seus familiares, as instituições de crédito apenas garantirão a diferença entre o valor desses benefícios e o valor dos benefícios previsto no ACT. Por outro lado, e para o cálculo desta diferença apenas são relevantes os benefícios decorrentes de contribuições para Instituições ou Serviços de Segurança Social respeitantes a períodos que contam para a antiguidade do trabalhador ao serviço das instituições de crédito. A cláusula refere-se única e exclusivamente ao valor dos benefícios o que, obviamente, e como este Tribunal teve já ocasião de referir, não coincide (nem se confunde) com o valor das contribuições [A sentença recorrida observa, a este respeito, certeiramente, que “o cálculo das remunerações a ter em consideração para a contabilização da pensão de reforma tem em consideração inúmeros fatores para além do valor da retribuição o que reforça a ideia de que não existe uma relação direta entre o valor da retribuição e o da pensão final atribuída”]. E quando se refere no seu n.º 2 às contribuições é para mandar atender aos benefícios decorrentes das contribuições em um determinado período e, portanto, para esclarecer qual o período de tempo relevante – o período de tempo relevante para a antiguidade do trabalhador ao serviço da instituição de crédito, mas em que houve contribuições para outras instituições ou serviços de Segurança Social. Em suma, a cláusula nunca refere o valor das contribuições. E partindo da presunção do legislador que se sabe exprimir adequadamente há que concluir que não se pretendeu atribuir qualquer relevância ao valor em concreto dessas contribuições. Acresce que não há qualquer remissão para o Decreto-Lei n.º 187/2007, nem qualquer referência ao cálculo de duas pensões como pretende o Recorrente. Uma vez que a tese do Recorrente não tem o mínimo de apoio na letra da cláusula, como, aliás, este Tribunal já teve ocasião de afirmar recentemente [Acórdão de 22/02/2018, proferido no processo n.º 9637/16.5T8LSB.L1.S1 (CHAMBEL MOURISCO): “As expressões utilizadas na referida cláusula “a diferença entre o valor desses benefícios” na parte final do n.º 1, “benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou Serviços de Segurança Social” no segundo segmento do n.º 2 e “benefícios da mesma natureza” na parte final do n.º 3, referem-se tão só às pensões, não se podendo afirmar que dos respetivos textos resulte um mínimo de correspondência verbal que possa suportar a interpretação no sentido da introdução de um fator de ponderação que tenha a ver com o valor das contribuições efetuadas”. No mesmo sentido cfr. o Acórdão de 12/07/2018, processo n.º 3312/16.8T8PRT-P1.S1 (RIBEIRO CARDOSO): “nesta cláusula não se estabelece que a percentagem da pensão a devolver ao R. pelo A. deva ser calculada não só com base no tempo de contribuições para a Segurança Social, enquanto trabalhador do setor bancário, mas também levando em conta o valor das retribuições sobre que incidiram essas contribuições”], torna-se desnecessário apreciar os outros argumentos aduzidos, já que os mesmos não poderiam fazer vingar uma interpretação sem esse arrimo mínimo. Acrescente-se, apenas, que não se vislumbra qualquer inconstitucionalidade nesta cláusula a qual se limita a cumprir o desiderato constitucional do aproveitamento integral de todo o tempo de trabalho [Em rigor, para GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, 4.ª ed. Revista, Coimbra Editora, 2007, vol. I, p. 829, trata-se da contagem de tempos de serviço juridicamente relevantes.] para o cálculo da pensão (artigo 63.º n.º 4 da Constituição). […]» Estas doutas considerações têm inteira aplicação ao presente caso, dando resposta à argumentação aduzida pela recorrente quanto à questão em análise, não se vendo razões para deixar de aderir à posição que reflectem e para decidir de modo diverso situações materiais equivalentes e verificadas no contexto da uma mesma actividade: a abrangida pelos indicados instrumentos de regulamentação colectiva para o sector bancário. Destarte, e tendo ainda em consideração o disposto no artigo 8.º, n.º 3, do Código Civil – segundo o qual “[n]as decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito” –, entendemos nada dever acrescentar a esta posição consistente do Supremo Tribunal de Justiça no sentido de que as expressões utilizadas na cláusula 136.ª do ACT do sector bancário de 2011, e bem assim da cláusula 94ª do ACT para o sector bancário de 2016, com expressões similares – “a diferença entre o valor desses benefícios”, “benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou Serviços de Segurança Social” e “benefícios da mesma natureza” –, se referem tão só às pensões na parte proporcional ao tempo de contribuições para a Segurança Social, não resultando dos respectivos textos a introdução de um qualquer outro factor de ponderação que tenha a ver com o valor das contribuições nesse tempo efectuadas. E, sendo assim, não se anui ao que foi vertido nas alegações de recurso da recorrente, no sentido de, por via da aplicação do Regime Geral da Segurança Social, atender para estes efeitos igualmente ao valor das contribuições efectuadas ao longo dos anos, devendo, ao invés, sufragar-se o veredicto da 1.ª instância”.
3. Discorda o Recorrente do decidido porque, em muito resumida síntese, entende, “no que respeita aos critérios relevantes para a formação da pensão estatutária do Recorrido que: Cumpre decidir, sabendo-se que a questão em análise foi objecto de tratamento uniforme por esta Secção Social do STJ, em diversos acórdãos, alguns muito recentes: - Acórdãos de 22-06-2022, proferidos nos processos n.ºs 14406/20.5T8SNT.L1.S1 e 5815/20.0T8ALM.S1 (Júlio Manuel Vieira Gomes); - Acórdão de 01-06-2022, proferido no processo n.º 638/20.0T8PRT.P1.S1 (Pedro Branquinho Dias); - Acórdãos de 01-06-2022, proferidos nos processos n.º 598/20.7T8MTS.P1.S1 e 3817/19.9T8MTS.P1.S1 (Mário Belo Morgado). O MP, no seu parecer, enumerou ainda mais estes: - Ac do STJ de 1 de Junho de 2022, processo 831/20.5T8VLG.P1.S1; - Ac do STJ de 13.01.2022, processo 300/20.3T8MTS.P1.S1; - Ac do STJ de 29.09.2021, processo 17792/19.6T8PRT.P1.S1; - Ac do STJ de 29.09.2021, processo 23235/19.8T8LSB.L1.S1; - Ac do STJ de 14.07.2022, processo 2084/20.8T8VLG.S1; - Ac do STJ de 14.07.2021, processo 2457/10.4T8OAZ.P1.S1. Todos os arestos decidiriam de forma concordante a questão ora submetida à apreciação deste Tribunal
5. Porque se tem seguido nesta Secção Social a posição assumida no acórdão de 8/06/2021, tirado no processo 2276/20.8T8VCT.S1, com a qual, de resto, se concorda, a qual está em consonância com anteriores arestos, nele citados, passamos, com a devida vénia, a transcrever o que aí se referiu: “No seu recurso per saltum o Recorrente afirma que «ao decidir como decidiu, a douta Sentença violou o disposto cláusula 136.º do Acordo Coletivo de Trabalho do setor bancário (BTE n.º 3 de 22/01/2011 – data de distribuição: 24/01/2011) cláusula que veio a ser substituída, com redação similar, pela cláusula 94.ª do atual Acordo Coletivo de Trabalho do setor bancário (BTE n.º 29 de 08/08/2016), os artigos 26.º e 28.º do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de Maio e, bem assim, violou também o disposto no artigo 63.º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa». A mencionada cláusula 136.ª do ACT do setor bancário tinha o seguinte teor: Cláusula 136.ª «Âmbito 1. As Instituições de Crédito, por si ou por serviços sociais privativos já existentes, continuarão a garantir os benefícios constantes desta Secção aos respetivos trabalhadores, bem como aos demais titulares das pensões e subsídios nela previstos. Porém, nos casos em que benefícios da mesma natureza sejam atribuídos por Instituições ou Serviços de Segurança Social a trabalhadores que sejam beneficiários dessas Instituições ou seus familiares, apenas será garantida, pelas Instituições de Crédito, a diferença entre o valor desses benefícios e o dos previstos neste Acordo. 2. Para efeitos da segunda parte do número anterior, apenas serão considerados os benefícios decorrentes de contribuições para Instituições ou Serviços de Segurança Social com fundamento na prestação de serviço que seja contado na antiguidade do trabalhador nos termos das Cláusulas 17.ª e 143.ª. 3. As Instituições adiantarão aos trabalhadores abrangidos pelo Regime Geral da Segurança Social as mensalidades a que por este Acordo tiverem direito, entregando estes à Instituição a totalidade das quantias que receberem dos serviços de Segurança Social a título de benefícios da mesma natureza.” É a partir da interpretação desta cláusula e invocando os elementos literal, sistemático e teleológico que o Recorrente conclui que a «pensão de abate» é, assim, o benefício do CNP pelo tempo de carreira ao serviço do banco (pensão teórica) que resulta das contribuições feitas no período em apreço, apurado segundo as regras do regime geral da segurança social, que são as regras aplicáveis ao cálculo do benefício a pagar pelo CNP» (Conclusão 6.ª), defendendo também que «porque a cláusula 136.ª do ACT do sector bancário (tal como a cláusula 94.ª do atual ACT do setor bancário) se refere expressamente a benefícios decorrentes de contribuições para o regime geral de segurança social e porque o benefício pago pelo regime geral de segurança social (através do CNP) é apurado considerando, além do tempo de carreira contributiva (que determina a taxa de formação da pensão), os montantes das contribuições feitas ao longo da carreira contributiva (por via da determinação da remuneração de referência), torna-se imperioso calcular as duas pensões teóricas» (Conclusão 25.ª). Este Tribunal tem reiteradamente afirmado que a interpretação da parte normativa das convenções coletivas deve seguir as regras da interpretação da lei. A este respeito o artigo 9.º do Código Civil, embora afirme no seu n.º 1 que a interpretação não deve cingir-se á letra da lei, afirma, depois, que «não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso” (n.º 2) e que “na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados» (n.º 3). A letra da lei – aqui a letra da cláusula da convenção – é não apenas o ponto de partida da interpretação, mas o limite da mesma, o que é de particular importância nesta sede já que as partes de uma convenção não devem obter pela interpretação da convenção pelo tribunal o que não lograram obter nas negociações. Ora da letra da cláusula resulta tão-só a garantia de benefícios pelas instituições de crédito, sendo que caso benefícios da mesma natureza sejam atribuídos por Instituições ou Serviços de Segurança Social, aos trabalhadores e seus familiares, as instituições de crédito apenas garantirão a diferença entre o valor desses benefícios e o valor dos benefícios previsto no ACT. Por outro lado, e para o cálculo desta diferença apenas são relevantes os benefícios decorrentes de contribuições para Instituições ou Serviços de Segurança Social respeitantes a períodos que contam para a antiguidade do trabalhador ao serviço das instituições de crédito. A cláusula refere-se única e exclusivamente ao valor dos benefícios o que, obviamente, e como este Tribunal teve já ocasião de referir, não coincide (nem se confunde) com o valor das contribuições. E quando se refere no seu n.º 2 às contribuições é para mandar atender aos benefícios decorrentes das contribuições em um determinado período e, portanto, para esclarecer qual o período de tempo relevante – o período de tempo relevante para a antiguidade do trabalhador ao serviço da instituição de crédito, mas em que houve contribuições para outras instituições ou serviços de Segurança Social. Em suma, a cláusula nunca refere o valor das contribuições. E partindo da presunção do legislador que se sabe exprimir adequadamente há que concluir que não se pretendeu atribuir qualquer relevância ao valor em concreto dessas contribuições. Acresce que não há qualquer remissão para o Decreto-Lei n.º 187/2007, nem qualquer referência ao cálculo de duas pensões como pretende o Recorrente. Uma vez que a tese do Recorrente não tem o mínimo de apoio na letra da cláusula, como, aliás, este Tribunal já teve ocasião de afirmar recentemente, torna-se desnecessário apreciar os outros argumentos aduzidos, já que os mesmos não poderiam fazer vingar uma interpretação sem esse arrimo mínimo. Acrescente-se, apenas, que não se vislumbra qualquer inconstitucionalidade nesta cláusula a qual se limita a cumprir o desiderato constitucional do aproveitamento integral de todo o tempo de trabalho para o cálculo da pensão (artigo 63.º n.º 4 da Constituição)”. Não há necessidade de acrescentar seja o que for atendendo à categórica argumentação. Salienta-se, apenas que a interpretação do Recorrente não tem cabimento na letra da cláusula em análise razão pela qual não há necessidade de convocar os elementos lógicos da interpretação. Destarte, ao abrigo do disposto no art.º 656º do CPC, aplicável com as devidas adaptações à revista – art.º 679º do CPC – expressamente se aderindo à doutrina do acórdão citado, importa negar provimento á revista.
III – DECISÃO Termos em que se nega a revista. Custas pelo Recorrente
Lisboa, 29 de novembro de 2022
Francisco Marcolino de Jesus (Relator) Ramalho Pinto Mário Belo Morgado
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