Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
39/16.4YFLSB
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: JOÃO TRINDADE
Descritores: RECURSO DE REVISÃO
PRAZO DE INTERPOSIÇÃO DE RECURSO
PRAZO DE CADUCIDADE
APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
TRÂNSITO EM JULGADO
DIREITOS DE PERSONALIDADE
ACÇÃO DE REIVINDICAÇÃO
AÇÃO DE REIVINDICAÇÃO
INCONSTITUCIONALIDADE
Data do Acordão: 01/19/2017
Nº Único do Processo:
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL - RELAÇÕES JURÍDICAS TEMPO E SUA REPERCUSSÃO NAS RELAÇÕES JURÍDICAS / PRAZOS / EXERCÍCIO E TUTELA DE DIREITOS / PROVAS.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS / RENÚNCIA AO RECURSO / RECURSO DE REVISÃO / FUNDAMENTOS DA REVISÃO.
Doutrina:
- ALBERTO DOS REIS, “Código de Processo Civil” anotado, volume VI, Coimbra Editora, Coimbra, 1953, 335 a 337, 355.
- ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2ª edição, Almedina, Coimbra, 2014, 424, 428, 429, 433 e 435.
- ANTUNES VARELA, Manual de Processo Civil, 2.ª edição, 506 e 507.
- CÂNDIDA DA SILVA ANTUNES PIRES, “O recurso de revisão em processo civil” in B.M.J., 134, Março, 1964, 21 e ss., 206 a 211.
- FERNANDO AMÂNCIO FERREIRA, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9.ª edição, Almedina, Coimbra, 2009, 324 e 325.
- JOÃO ESPÍRITO SANTO, O documento superveniente para efeito de recurso ordinário e extraordinário, Almedina, Coimbra, 71-73.
- JOSÉ LEBRE DE FREITAS, “Código de Processo Civil” Anotado, volume 3.º, tomo I, 2.ª edição, Coimbra, 2008, 223.
- LUÍS CORREIA MENDONÇA e HENRIQUE ANTUNES, Dos Recursos (Regime do Decreto-Lei n.º 303/2007), Quid Juris, Lisboa, 2009, 353.
- LUÍS FILIPE BRITES LAMEIRAS, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2.ª edição aumentada e reformulada, Almedina, Coimbra, Outubro de 2009, 294, 295, 300 e 301.
- MANUEL DE ANDRADE, Noções Elementares de Processo Civil, nova edição revista e actualizada pelo Dr. Herculano Esteves, Coimbra, 1976, 305 e 306.
- PINTO FURTADO, Recursos em Processo Civil (de acordo com o CPC de 2013), Quid Juris, Lisboa, 155.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 297.º, N.º 2, 341.º, 363.º, N.º 2, 374.º, 376.º.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC), NA REDACÇÃO DO DECRETO-LEI N.º 329-A/95, DE 12-12: - ARTIGO 771.º, 772.º, N.º 2.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (NCPC), APROVADO PELA LEI N.º 41/2013, DE 26-06: - ARTIGOS 632.º, 696.º, 697.º, N.º 2.
Jurisprudência Nacional:

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:

-N.º 209/2004, DE 24-03-2004, DISPONÍVEL EM WWW.TRIBUNALCONSTITUCIONAL. PT/TC/ACORDAOS

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ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-DE 18-09-2012, PROC. N.º 158-A/2000.L1.S1, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT (E NO ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL N.º 310/2005, DE 08-06-2005, DISPONÍVEL EM WWW.TRIBUNALCONSTITUCIONAL.PT/TC/ACORDAOS, QUE NAQUELE É CITADO)
-DE 24-05-2012, PROC. N.º 2565/10.0TBSTB.S1, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT
-DE 13-12-2000 (PROC. N.º 3279/00, DISPONÍVEL EM HTTP://WWW.STJ.PT/FICHEIROS/JURISP-SUMARIOS/CIVEL/SUMARIOS-CIVEL-2000.PDF
-DE 07-10-2003 (PROC. N.º 2794/03, DISPONÍVEL EM HTTP://WWW.STJ.PT/FICHEIROS/JURISP-SUMARIOS/CIVEL/SUMARIOS-CIVEL-2003.PDF
-DE 04-07-2013, PROC. N.º 56-C/2000.S1, DISPONÍVEL EM HTTP://WWW.STJ.PT/FICHEIROS/JURISP-SUMARIOS/CIVEL/SUMARIOS-CIVEL-2013.PDF
-DE 29-10-2013, PROC. N.º 625/12.1YRLSB.S1, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT
TEXTO INTEGRAL:
HTTP://WWW.DGSI.PT/JSTJ.NSF/954F0CE6AD9DD8B980256B5F003FA814/DF371A8AD16A3C9B80257C130055EDA7?OPENDOCUMENT
-DE 13-11-2014, PROC. N.º 1544/04.0TVLSB-B.L2.S1, DISPONÍVEL EM HTTP://WWW.STJ.PT/FICHEIROS/JURISP-SUMARIOS/CIVEL/SUMARIOS-CIVEL-2014.PDF
-DE 18-09-2012, PROC. N.º 158-A/2000.L1.S1, DISPONÍVEL EM HTTP://WWW.STJ.PT/FICHEIROS/JURISP-SUMARIOS/CIVEL/SUMARIOS-CIVEL-2012.PDF
TEXTO INTEGRAL:
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-DE 29-10-2013, PROC. N.º 625/12.1YRLSB.S1, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT
TEXTO INTEGRAL:
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-DE 13-11-2014, PROC. N.º 1544/04.0TVLSB-B.L2.S1, DISPONÍVEL EM HTTP://WWW.STJ.PT/FICHEIROS/JURISP-SUMARIOS/CIVEL/SUMARIOS-CIVEL-2014.PDF
-DE 19-09-2013, PROC. N.º 663/09.1TVLSB.S1, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT
TEXTO INTEGRAL:
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-DE 30-10-2001, PROC. N.º 1719/01, DISPONÍVEL EM HTTP://WWW.STJ.PT/FICHEIROS/JURISP-SUMARIOS/CIVEL/SUMARIOS-CIVEL-2001.PDF
-DE 11-09-2007, PROC. N.º 1332/07, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT
TEXTO INTEGRAL:
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-DE 11-10-2007, PROC. N.º 3128/07, DISPONÍVEL EM HTTP://WWW.STJ.PT/FICHEIROS/JURISP-SUMARIOS/CIVEL/SUMARIOS-CIVEL-2007.PDF
-DE 13-07-2010, PROC. N.º 480/03.2TBVLC-E.P1.S1, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT
-DE 18-12-2003, PROC. N.º 2493/0102, DISPONÍVEL EM HTTP://WWW.STJ.PT/FICHEIROS/JURISP-SUMARIOS/CIVEL/SUMARIOS-CIVEL-2003.PDF
-DE 23-05-2006, PROC. N.º 4275/05, DISPONÍVEL EM HTTP://WWW.STJ.PT/FICHEIROS/JURISP-SUMARIOS/CIVEL/SUMARIOS-CIVEL-2006.PDF
-DE 25-06-2009, PROC. N.º 453/09, DISPONÍVEL EM HTTP://WWW.STJ.PT/FICHEIROS/JURISP-SUMARIOS/CIVEL/SUMARIOS-CIVEL-2009.PDF
-DE 19-09-2013, PROC. N.º 663/09.1TVLSB.S1, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT
TEXTO INTEGRAL:
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-DE 13-11-2014, PROC. N.º 1544/04.0TVLSB-B.L2.S1, DISPONÍVEL EM HTTP://WWW.STJ.PT/FICHEIROS/JURISP-SUMARIOS/CIVEL/SUMARIOS-CIVEL-2014.PDF
-DE 15-05-2001, PROC. N.º436/01, DISPONÍVEL EM HTTP://WWW.STJ.PT/FICHEIROS/JURISP-SUMARIOS/CIVEL/SUMARIOS-CIVEL-2001.PDF
-DE 25-02-2003, PROC. N.º 1978/02, DISPONÍVEL EM HTTP://WWW.STJ.PT/FICHEIROS/JURISP-SUMARIOS/CIVEL/SUMARIOS-CIVEL-2003.PDF
-DE 22-02-2005, PROC. N.º 4761/04, DISPONÍVEL EM HTTP://WWW.STJ.PT/FICHEIROS/JURISP-SUMARIOS/CIVEL/SUMARIOS-CIVEL-2005.PDF
-DE 23-05-2006, PROC. N.º 4275/05, DISPONÍVEL EM HTTP://WWW.STJ.PT/FICHEIROS/JURISP-SUMARIOS/CIVEL/SUMARIOS-CIVEL-2006.PDF
-DE 13-07-2010, PROC. N.º 480/03.2TBVLC-E.P1.S1, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT
-DE 07-04-2011, PROC. N.º 1242-L/1998.P1.S1, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT
TEXTO INTEGRAL:
HTTP://WWW.DGSI.PT/JSTJ.NSF/954F0CE6AD9DD8B980256B5F003FA814/DC38EF7CF5ED27C98025786B00390332?OPENDOCUMENT
-DE 04-07-2013, PROC. N.º 56-C/2000.S1, DISPONÍVEL EM HTTP://WWW.STJ.PT/FICHEIROS/JURISP-SUMARIOS/CIVEL/SUMARIOS-CIVEL-2013.PDF
-DE 19-09-2013, PROC. N.º 663/09.1TVLSB.S1, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT
TEXTO INTEGRAL:
HTTP://WWW.DGSI.PT/JSTJ.NSF/954F0CE6AD9DD8B980256B5F003FA814/F1C65A959503A51780257BEC00542A4C?OPENDOCUMENT
-DE 07-05-2014, PROC. N.º 5629/04.5TVLSB.L1.S1, DISPONÍVEL EM HTTP://WWW.STJ.PT/FICHEIROS/JURISP-SUMARIOS/CIVEL/SUMARIOS-CIVEL-2014.PDF
-DE 16-10-2014, PROC. N.º 1225/05.3TBBCL-A.S1, DISPONÍVEL EM HTTP://WWW.STJ.PT/FICHEIROS/JURISP-SUMARIOS/CIVEL/SUMARIOS-CIVEL-2014.PDF
-DE 13-11-2014, PROC. N.º 1544/04.0TVLSB-B.L2.S1, DISPONÍVEL EM HTTP://WWW.STJ.PT/FICHEIROS/JURISP-SUMARIOS/CIVEL/SUMARIOS-CIVEL-2014.PDF
-DE 02-06-2016, PROC. N.º 13262/14.7T8LSB-A.L1.S1, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT
TEXTO INTEGRAL:
HTTP://WWW.DGSI.PT/JSTJ.NSF/954F0CE6AD9DD8B980256B5F003FA814/DBB52F22D081C6CC80257FC7002FDFA5?OPENDOCUMENT
-DE 09-12-2008, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT
Sumário :
I - O prazo de cinco anos para interposição do recurso de revisão previsto no art. 772.º, n.º 2, do anterior CPC, era um prazo peremptório - de caducidade – que não admitia qualquer excepção.

II - Ainda que actual CPC (art. 697.º, n.º 2) tenha excepcionado agora do aludido prazo as situações em que o pedido de revisão respeita a direitos de personalidade – caso em que o recurso deixou de estar dependente de qualquer prazo – decorre da regra ínsita no art. 297.º, n.º 2, do CC que a lei nova, que fixa um prazo mais longo, apenas vale se o prazo antigo ainda estiver em curso à data da sua entrada em vigor e já não quando o mesmo se mostra integralmente decorrido.

III - Em consequência, tendo o prazo de cinco anos da decisão revidenda – acórdão do STJ transitado em julgado em 27-03-2003 – decorrido integralmente ao abrigo do antigo CPC, caducou o direito de interpor o recurso extraordinário de revisão, sem que se coloque qualquer questão de inconstitucionalidade uma vez que a acção na qual se formou o caso julgado trata-se de uma típica acção de reivindicação, na qual não foram invocados quaisquer direitos de personalidade.

IV - O artigo 632.º do CPC – que prevê a renúncia antecipada ao recurso – não é aplicável ao recurso de revisão por colidir com os interesses de ordem pública que lhe estão subjacentes.

V - O fundamento de revisão enunciado no art. 696.º, al. c), do CPC exige a verificação dos seguintes requisitos: (i) a apresentação de um documento; (ii) que tenha sido impossível à parte apresentar no processo em que foi proferida a decisão a rever; e (iii) que, por si só, seja apto a modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida.

VI - Não se destinando o recurso de revisão à alegação de matéria nova, resulta igualmente da conjugação dos citados requisitos que o documento que releva – caracterizado pela novidade e pela especial força probatória – é apenas o que vise demonstrar factos que tenham sido alegados e discutidos na acção na qual foi proferida a decisão transitada em julgado.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça :



1 - Município de ... intentou, em 24-05-2016, o presente recurso de revisão, pedindo que seja proferida nova decisão determinando a condenação no pagamento de quantia certa aos recorridos AA e outros, em substituição da condenação na execução da prestação de facto subjacente à decisão recorrida.

A decisão revidenda é, in casu, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09/01/2003, proferido na acção declarativa de condenação, com processo comum, sob a forma ordinária, que correu termos, sob o n.º 3654/02, no 2.º Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Cascais, na qual eram autores AA e outros e réus Município de .... e BB – Associação de Municípios de ..., ... e ... para o Tratamento de Resíduos Sólidos, pedindo aqueles a condenação destes a desobstruir o caminho que identificaram, viabilizando o trânsito de pessoas e veículos agrícolas pelo mesmo, e a mantê-lo com a sua actual configuração.


2 - Para tanto e em síntese alegou ser proprietário de um prédio rústico, confinante com outros, igualmente seus, nos quais o réu Município de ... viabilizou que a ré BB instalasse um aterro sanitário, sendo que as terras e lixos que resvalaram do mesmo obstruíram o caminho, de natureza pública, que era utilizado, por si e pela generalidade das pessoas, como passagem e meio de acesso ao dito prédio.


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3 - Os réus defenderam-se por excepção (invocando ser o tribunal comum incompetente em razão da matéria para conhecer da acção) e por impugnação, tendo o Tribunal de Conflitos julgado improcedente a mencionada excepção e, a final, sido proferida sentença que julgou a acção improcedente com a consequente absolvição dos réus do pedido, decisão que foi confirmada pelo STJ.


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4 - A recorrente alicerça o presente recurso de revisão no facto de ter tomado conhecimento – através de ofício da CCDTRLVT que foi junto, em 08-04-2016, aos autos de execução para prestação de facto, que se encontram a correr termos – de que a prestação de facto em que foi condenada, por decisão judicial transitada em julgado, acarreta, necessariamente ou com elevado grau de probabilidade, a produção de danos ambientais que determinam a ilegalidade da obra (desmantelamento de um aterro sanitário selado há 20 anos) pugnada pelos recorridos.

Sustenta, para tanto, que, sendo a CCDTRLVT a entidade competente para emitir parecer sobre as consequências ambientais das obras a realizar em aterro sanitário, o referido “parecer” constitui fundamento bastante para modificar a decisão que condenou os demandados na execução das ditas obras, já que, perante a colisão entre o direito de propriedade dos recorridos e o direito ao ambiente (que se encontra constitucionalmente consagrado), deve ser dada prevalência a este último, ressarcindo-se, em contrapartida, os lesados pelos danos que lhes sejam causados pela impossibilidade da reconstituição natural.

Conclui dizendo que, mostrando-se cumprido o prazo de sessenta dias contado desde a data em que obteve o aludido documento – parecer da CCDTRLVT – e encontrando-se preenchidos os requisitos da alínea c) do artigo 771.º do Código de Processo Civil, deve ser revista a condenação.


O recurso foi liminarmente admitido, os recorridos, em sede de resposta, pugnado pela sua rejeição ou, caso assim não se entenda, pela sua improcedência, invocando, para tanto, a extemporaneidade do pedido de revisão com base no facto de ser aplicável ao caso o anterior Código de Processo Civil na redacção do Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24-08 e de o processo ter um cariz puramente patrimonial. Mais alegaram que, em qualquer caso, o documento apresentado, não tendo força probatória plena, não se enquadra na noção de documento concretizada pela invocada alínea c) e que também não é determinante para modificar a decisão atento o seu teor meramente opinativo, ao que acresce a circunstância de traduzir uma realidade pré-existente que podia ter sido invocada em momento anterior (e não foi), sendo que a introdução de factos novos (e pré-existentes) não constitui fundamento do recurso de revisão.

Referiram, por fim, que a postura assumida pelo recorrente no processo executivo revela que o mesmo renunciou ao presente recurso, consubstanciando agora a sua interposição abuso de direito, não havendo, para além disso, qualquer colisão de direitos que cumpra acautelar.


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5 - As questões a resolver são as seguintes:

A. Tempestividade do recurso de revisão

B. Da renúncia ao recurso de revisão

C. Do pressuposto de que depende a revisão



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A - Tempestividade do recurso de revisão

Dispunha o artigo 772.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (na redacção do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, então vigente) que o recurso não pode ser interposto se tiverem decorrido mais de cinco anos sobre o trânsito em julgado da decisão e o prazo para a interposição é de 60 dias, contados: (…) b) (…) desde que a parte obteve o documento ou teve conhecimento do facto que serve de base à revisão.

Posteriormente, o Decreto-Lei n.º 38/2003, de 08-03 (que entrou em vigor em 15-09-2003) e o Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24/08 (que entrou em vigor em 01-01-2008) introduziram pequenas alterações ao citado preceito, que, no caso, não relevam, tendo apenas a alínea b) passado a constituir a alínea c).

Vê-se do citado normativo que a lei prevê dois prazos a partir dos quais já não é possível interpor o recurso extraordinário de revisão – e, na verdade, compreende-se que assim seja já que se tratam de prazos impostos em nome do valor da segurança jurídica.

Conforme sublinha, a este propósito, Luís Filipe Brites Lameiras (Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª edição aumentada e reformulada, Almedina, Coimbra, Outubro de 2009, p. 300 e 301) é, de facto, justo e razoável que se coloquem limites temporais ao exercício do direito à revisão, sob pena de o caso julgado estar indefinidamente na iminência de ser destruído, esvanecendo-se a segurança e a certeza do direito determinado pelos tribunais, isto é, desprestigiando-se o Estado face à fluidez da sua autoridade judicial.

A esta necessidade de limitação temporal também já Alberto dos Reis aludia (Código de Processo Civil anotado, volume VI, Coimbra Editora, Coimbra, 1953, p. 335 a 337), afirmando que Convém que a situação criada pela sentença transitada em julgado se consolide e torne definitivamente estável dentro de prazo relativamente curto.

E foi, de facto, essa a posição que vingou e que se manteve no Código de Processo Civil de 1939, tal como no Código de 1961, mesmo após as suas sucessivas revisões.

Com efeito, embora o legislador reconheça que existem situações excepcionais que justificam que seja posta em causa a intangibilidade do caso julgado, não deixou este último sem protecção atentas as vertentes da segurança e da paz social que lhe são inerentes, antes tendo harmonizado os valores e interesses em conflito através do estabelecimento de um limite temporal à possibilidade de desencadear este meio de impugnação extraordinário. É, pois, esse o sentido do prazo de cinco anos previsto no n.º 2 do artigo 772.º do Código de Processo Civil (tal como se diz no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18-09-2012, proc. n.º 158-A/2000.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt e no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 310/2005, de 08-06-2005, disponível em www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos, que naquele é citado).

Trata-se de um prazo peremptório para o exercício de um direito de acção e, por conseguinte, de um prazo de caducidade que, face ao dito regime, não admitia qualquer excepção.

      É verdade que no novo Código de Processo Civil (aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26-06) o legislador veio introduzir uma alteração à enunciada regra, ao prever no actual artigo 697.º, n.º 2, que o recurso não pode ser interposto se tiverem decorrido mais de cinco anos sobre o trânsito em julgado da decisão, salvo se respeitar a direitos de personalidade (…) – sublinhado nosso.

       Ou seja, respeitando a direitos de personalidade, a lei deixou agora de estabelecer qualquer prazo para a apresentação do recurso (neste sentido: António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2ª edição, Almedina, Coimbra, 2014, p. 428 e 429).

       Sucede, porém, que, in casu, o prazo de cinco anos contado do trânsito em julgado da decisão revidenda decorreu integralmente ao abrigo da lei antiga, estando, por conseguinte, há muito exaurido.

Com efeito, a decisão a rever é, como se disse, o Acórdão do Supremo de Tribunal de Justiça de 09-01-2003 – proferido no âmbito de uma acção declarativa de condenação, com processo comum, sob a forma ordinária, instaurada em 11-02-1998 – acórdão esse que transitou em julgado em 27-03-2003 (cf. se vê da certidão de trânsito a fls. 360 dos autos apensos).

       Assim sendo, é evidente que o prazo de cinco anos de que o recorrente dispunha para, querendo, interpor recurso de revisão se completou em Março de 2008, altura em que estava em vigor o anterior Código de Processo Civil (com as alterações do Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24/08), no qual não se estabelecia qualquer excepção ao referido prazo de caducidade.

       Pelo que, ainda que a lei nova tenha agora excepcionado do aludido prazo as situações em que o pedido de revisão respeita a direitos de personalidade – caso em que o recurso deixou de estar dependente de qualquer prazo –, a verdade é que à data em que essa lei entrou em vigor (01-09-2013) o prazo de cinco anos há muito que tinha decorrido integralmente.

        Ora, é pacífico que a regra ínsita no artigo 297.º, n.º 2, do Código Civil – no sentido de ser aplicável a lei que vier, para qualquer efeito, fixar um prazo mais longo – apenas vale se o prazo antigo estiver ainda em curso à data da entrada em vigor da lei nova, não tendo aplicação nos casos, como o dos autos, em que, a essa data, o prazo se mostra transcorrido (vide, neste sentido, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24-05-2012, proc. n.º 2565/10.0TBSTB.S1, disponível em www.dgsi.pt).

       Refira-se, por último, que, correndo os dois prazos (o de 5 anos e o de 60 dias) em paralelo (embora com início em momentos diversos), mas sendo independentes (funcionando o primeiro como obstáculo intransponível à interposição do recurso), dúvidas não podem restar de que o decurso de qualquer deles, por inacção do interessado, provoca a extinção, por caducidade, do direito de peticionar a revisão. Ou seja, verificando-se esta consequência logo que um deles tenha decorrido, é totalmente irrelevante para o caso que o prazo de 60 dias – único a que o recorrente alude na sua petição de recurso – não se mostrasse ainda exaurido à data em que foi pedida a revisão, já que o de 5 anos há muito que decorreu.

É, pois, neste sentido que o Supremo Tribunal de Justiça se tem pronunciado, entendendo, face ao anterior Código de Processo Civil, que o prazo de cinco anos se aplicava, sem qualquer excepção, a todos os casos previstos no artigo 771.º, podendo citar-se, neste particular, os seguintes acórdãos:

- Acórdão de 13-12-2000 (proc. 3279/00, Relator Dionísio Correia, Adjuntos Quirino Soares e Neves Ribeiro, disponível em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2000.pdf):

I - Quando uma acção tenha corrido à revelia por falta absoluta de intervenção do réu, este não pode interpor o recurso de revisão se houverem decorrido mais de cinco anos sobre o trânsito em julgado da sentença, mesmo que só então tenha tido conhecimento da falta ou nulidade da sua citação.

II - Esta regra de caducidade do recurso de revisão aplica-se a todos os casos previstos no art.º 771, do CPC.


- Acórdão de 07-10-2003 (proc. 2794/03, Relator Lopes Pinto, Adjuntos Pinto Monteiro e Reis Figueira, disponível em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2003.pdf):


I - O art.º 772, n.º 2, do CPC fixa 2 prazos que correm em paralelo, tendo, contudo, início diverso. Articulam-se entre si e a exaustão de qualquer deles, de per se, por inacção do interessado provoca a extinção, por caducidade, do direito de peticionar a revisão da decisão transitada (essa consequência ocorre logo que um deles tenha decorrido). A lei não lhes abriu qualquer excepção nem estabeleceu causa impeditiva da caducidade (art.ºs 298, n.º 2, 328 e 331, n.º 1, do CC).

II - O primeiro limite temporal tem início no trânsito em julgado da decisão - o recurso só pode ser interposto se não tiverem decorrido mais de 5 anos sobre o trânsito em julgado da decisão a rever (corpo daquele n.º 2 e art.º 671, n.º 1, do CPC).

III - O segundo toma em atenção os fundamentos do recurso, os elementos que servem de causa à mesma (als. a) e b) daquele n.º 2) e não pode ultrapassar o limite do primeiro.


- Acórdão de 04-07-2013 (proc. 56-C/2000.S1, Relator Gregório Silva Jesus, Adjuntos Martins de Sousa e Gabriel Catarino, disponível em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2013.pdf):


I - O art. 772.º, n.º 2, al. d), do CPC, estabelece um prazo de caducidade, pois que liga o decurso do prazo nele previsto ao exercício de um direito (art. 298.º do CC), competindo ao recorrido a prova de que o prazo foi ultrapassado (art. 342.º, n.º 2, do CC). 

(…)


- Acórdão de 29-10-2013 (proc. 625/12.1YRLSB.S1, Relator Moreira Alves, Adjuntos Alves Velho e Paulo Sá, disponível em www.dgsi.pt):


I - A nulidade processual por falta de citação pode ser arguida em qualquer estado do processo, enquanto não estiver sanada (art. 204.º, n.º 2, do CPC), mas tal não significa que possa ser invocada no processo após o trânsito da decisão.

II - Transitada a decisão, o vício só pode ser invocado, em sede de recurso extraordinário de revisão, dentro dos prazos previstos no art. 772.º do CPC.

III - O prazo de 5 anos, previsto no n.º 2 do art. 772.º, não se soma ao prazo de 60 dias (desde o conhecimento do fundamento invocado) para a interposição do recurso, antes de tratando de prazos independentes e funcionando o primeiro como um obstáculo intransponível à interposição do recurso de revisão.

IV - Esse prazo de 5 anos conta-se, por determinação expressa da lei, a partir do trânsito em julgado da decisão a rever e não de qualquer outro facto, designadamente do conhecimento do fundamento invocado.

V - Esgotado o prazo de 5 anos, ainda que, durante o seu decurso, não tenha ocorrido conhecimento do vício, fica logo precludido o direito ao recurso, sendo irrelevante o conhecimento posterior do aludido vício.


      Texto integral:

http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/df371a8ad16a3c9b80257c130055eda7?OpenDocument


- Acórdão de 13-11-2014 (proc. 1544/04.0TVLSB-B.L2.S1, Relatora Maria Clara Sottomayor, Adjuntos Sebastião Póvoas e Moreira Alves, disponível em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2014.pdf):


I - O recurso extraordinário de revisão interpõe-se de decisões transitadas em julgado, se não tiverem decorrido mais de cinco anos sobre o respectivo trânsito em julgado e tem por função reparar anomalias processuais de especial gravidade, taxativamente enunciadas no art. 696.º do NCPC (2013).

(…)


Destarte, sendo aplicável ao presente recurso de revisão, no que tange ao seu prazo de interposição, o anterior Código de Processo Civil, afigura-se que o direito de acção que, por esta via, o recorrente pretende fazer valer há muito que se mostra, caducado.


*


Cumpre referir, por último, que só assim não seria se viesse a ser adoptado o entendimento de que o prazo de cinco anos previsto na lei para a interposição do recurso de revisão, quando interpretado no sentido de ser absolutamente peremptório, é inconstitucional, tal como já foi decidido, numa particular situação, pelo Tribunal Constitucional (questão esta que o recorrente nem sequer invocou).

Porém, julga-se que a conclusão a que acima se chegou em nada sai beliscada pela circunstância de o Tribunal Constitucional ter, no passado, decidido julgar inconstitucional a norma contida no n.º 2 do artigo 772.º do Código de Processo Civil, na parte em que prevê um prazo absolutamente peremptório de cinco anos para a interposição do recurso de revisão, contados desde o trânsito em julgado da decisão a rever, já que a situação que aí foi analisada nenhuma similitude apresenta com o caso sub judice (cf. Acórdão n.º 209/2004, de 24-03-2004, disponível em www.tribunalconstitucional. pt/tc/acordaos).

      Nessa decisão, o juízo de inconstitucionalidade formulado prendeu-se com o facto de a decisão cuja revisão foi pedida ter sido proferida no âmbito de uma acção oficiosa de investigação de paternidade que correu à revelia e em que foi alegado, para fundamentar o pedido de revisão, a nulidade da citação edital, tendo-se considerado que a citada norma quando interpretada no sentido de ser aplicável a um caso desses violava o princípio do contraditório, na vertente da proibição da indefesa, ínsito nos artigos 2.º e 20.º da Constituição.

       No fundo, o que se ponderou nesse aresto foram os valores que, em concreto, aí estavam em jogo, concluindo-se que, face à natureza estritamente pessoal dos direitos em causa (expressos na relação de paternidade ou de filiação), teria de ser o caso julgado a ceder, por a prevalência, sem mais, da solução normativa consagrada na norma em análise levar a que uma pessoa pudesse ser definitiva e irremediavelmente afectada num seu direito fundamental daquela natureza por decisão judicial proferida numa acção para a qual não tinha sido sequer citada.

       De resto, o Tribunal Constitucional deixou esse entendimento expresso, de forma clara, em acórdão posterior em que adoptou solução contrária (formulando, então, um juízo de não inconstitucionalidade) precisamente por ter considerado que a questão do prazo de caducidade da revisão nunca pode prescindir de encarar a situação concreta que originou o caso julgado e por, no caso, a acção se referir a interesses exclusivamente patrimoniais. Ou seja, decidiu aí que, atendendo aos interesses em jogo, o prazo de cinco anos após o trânsito em julgado não deixava de expressar uma solução de equilíbrio entre os interesses contraditórios, todos eles relevantes de um ponto de vista constitucional (cf. Acórdão n.º 310/2005 já citado).

       Ora, no caso de que cuidamos, a acção na qual se formou o caso julgado é uma típica acção de reivindicação na qual não foram invocados quaisquer direitos de personalidade que pudessem vir a ser afectados pela decisão judicial proferida. Na verdade, apenas agora, em sede de pedido de revisão – e volvidos que estão mais de 13 anos desde o trânsito em julgado da decisão a rever – é que o recorrente veio alegar que a execução da decisão poderá causar danos ambientais e daí que se afigure que as questões dessa natureza, apenas agora suscitadas, nenhum relevo assumem na apreciação do prazo de caducidade consignado na lei.

       Refira-se, de resto, que o Supremo Tribunal de Justiça já se pronunciou no sentido acima exposto, isto é, de que nunca se pode prescindir de encarar a situação concreta que originou o caso julgado, tendo concluído que, nos casos analisados, face aos interesses em causa, a fixação de um prazo de caducidade absolutamente peremptório de cinco anos não era desconforme com a Constituição:


- Acórdão de 18-09-2012 (proc. 158-A/2000.L1.S1, Relator Martins de Sousa, Adjuntos Gabriel Catarino e António Joaquim Piçarra, disponível em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2012.pdf


I - O recurso extraordinário de revisão interpõe-se de decisões transitadas em julgado, se não tiverem decorrido mais de cinco anos sobre o respectivo trânsito e tem por função reparar anomalias processuais de especial gravidade, taxativamente, enunciadas no art. 771.º do CPC.

II - Trata-se de prazo peremptório para o exercício de um direito de acção e, portanto, de um prazo de caducidade.

III - Para se avaliar se a limitação é adequada, necessária e proporcional ao conteúdo dos interesses ou valores em confronto, não pode prescindir-se de encarar a situação concreta que originou o caso julgado.

IV - Quando conexo com decisão adoptada numa acção de divórcio, não faz sentido e seria de todo perverso pretender eliminar o prazo de caducidade pois, dessa forma, estaria encontrado o meio de o cônjuge, porventura, negligente, faltoso ou ausente, inviabilizar o direito ao divórcio do outro e impedi-lo, porventura para sempre, de readquirir a sua capacidade matrimonial, assim dando azo à violação do direito constitucional de contrair casamento (art. 36.º, n.º 1, da CRP).

V - Faz, pois, todo o sentido o estabelecimento do limite temporal aposto ao recurso de revisão de sentença transitada em julgado, proferida em acção de divórcio que correu à revelia do recorrente por falta ou nulidade da respectiva citação.

VI - Não se pode dizer que seja exíguo o prazo de cinco anos, fixado no n.º 2 do art. 772.º do CPC, para o competente exercício de tal direito recursório, pois natural é que a dissolução operada pelo divórcio, quer pela sua consequências pessoais, patrimoniais ou familiares, quer pela repercussão social ou no seio das famílias afins, não passe despercebida, por tempo tão alargado, àqueles que são seus actores principais.

VII - Não se vislumbra fundamento para considerar intolerável a restrição do direito de defesa da recorrente (art. 20.º da CRP) e, em consequência, sustentar a inconstitucionalidade do prazo previsto no art. 772.º, n.º 2, do CPC.

     

Texto integral:

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- Acórdão de 29-10-2013 (proc. 625/12.1YRLSB.S1, Relator Moreira Alves, Adjuntos Alves Velho e Paulo Sá, disponível em www.dgsi.pt):


I - A nulidade processual por falta de citação pode ser arguida em qualquer estado do processo, enquanto não estiver sanada (art. 204.º, n.º 2, do CPC), mas tal não significa que possa ser invocada no processo após o trânsito da decisão.

II - Transitada a decisão, o vício só pode ser invocado, em sede de recurso extraordinário de revisão, dentro dos prazos previstos no art. 772.º do CPC.

III - O prazo de 5 anos, previsto no n.º 2 do art. 772.º, não se soma ao prazo de 60 dias (desde o conhecimento do fundamento invocado) para a interposição do recurso, antes de tratando de prazos independentes e funcionando o primeiro como um obstáculo intransponível à interposição do recurso de revisão.

IV - Esse prazo de 5 anos conta-se, por determinação expressa da lei, a partir do trânsito em julgado da decisão a rever e não de qualquer outro facto, designadamente do conhecimento do fundamento invocado.

V - Esgotado o prazo de 5 anos, ainda que, durante o seu decurso, não tenha ocorrido conhecimento do vício, fica logo precludido o direito ao recurso, sendo irrelevante o conhecimento posterior do aludido vício.


      Texto integral:

http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/df371a8ad16a3c9b80257c130055eda7?OpenDocument


*


     Destarte, afigura-se que, in casu, a extemporaneidade do recurso é incontornável, pelo que, obstando a mesma ao conhecimento do mérito, fica, naturalmente prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas, sendo certo que o facto de o recurso ter sido liminarmente admitido não preclude a apreciação da aludida questão neste momento.

     Com efeito e conforme refere, neste particular, Abrantes Geraldes (ob. cit., p. 433 e 435), Apresentado o requerimento inicial, o mesmo é submetido à apreciação liminar do juiz (ou do relator), seguindo-se, na parte em que for aplicável, o que dispõe o art. 641º.

     O recurso será rejeitado, além do mais, se faltar a legitimidade activa, se a decisão ainda não tiver transitado em julgado ou se tiver sido excedido algum dos prazos de caducidade previstos no art. 697º, nº 2. (…)

     Por fim, o requerimento também deverá ser rejeitado quando se constate que os factos alegados não preenchem os pressupostos da revisão, designadamente quando não conduzam ao resultado pretendido ou quando inexista uma relação de causalidade entre o facto e a decisão revidenda. (…)

      A tramitação processual subsequente à notificação do recorrido e à apresentação eventual de resposta é variável consoante o fundamento da revisão.

      A lei não o refere expressamente, mas é claro que se houver razões de ordem formal que obstem ao conhecimento do mérito e que tenham escapado ao controlo liminar ou que apenas se tornem perceptíveis em momento ulterior, cumpre ao juiz proceder ao saneamento do processo e decretar, sendo esse o caso, a extinção da instância. Só assim se explica a concessão ao requerido do direito para deduzir resposta, nos termos do art. 699º, nº 2. (…).


*


     Mas, ainda que assim não fosse – isto é, caso se concluísse que o recurso está em tempo – nem por isso o mesmo teria um desfecho favorável já que, face aos normativos que regem esta matéria e à doutrina e à jurisprudência que têm sobre ela versado, se julga que a pretensão do recorrente está irremediavelmente votada ao fracasso.

      Em todo o caso e para a hipótese de se concluir pela tempestividade do recurso, passarão a apreciar-se igualmente as demais questões decidendas.


B - Da  renúncia ao recurso de revisão

Vejamos, se o recorrente renunciou ao recurso.

Na decisão a rever - Acórdão do Supremo de Tribunal de Justiça de 09-01-2003 – os aí réus foram condenados a desobstruir o caminho identificado nos autos, viabilizando o trânsito de pessoas e veículos agrícolas pelo mesmo, e a mantê-lo com a sua actual configuração.

Com base em tal decisão condenatória, os aqui recorridos instauraram, em 16-03-2004, acção executiva para prestação de facto, que se encontra a correr termos na 2ª Secção de Execução (Juiz 1) de Oeiras do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, sob o n.º 909/14.4T8OER (cf. documentos de fls. 75 a 94).

Sustentam, neste particular e em suma, os recorridos que, no âmbito dessa acção executiva e em sede de tentativa de conciliação, realizada em 02-12-2015, as partes acordaram (incluindo o recorrente) em fixar em oito meses o prazo para a prestação em causa. Pelo que, ao ter aceitado, dessa forma, o sentenciado pelo Supremo Tribunal de Justiça, se tem de entender que o recorrente renunciou ao recurso de revisão, sendo agora a sua postura contraditória e coincidente com o abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium, tudo nos termos dos artigos 632.º do Código de Processo Civil e 334.º do Código Civil.

Sucede, porém, que, nesta parte, se afigura não lhes assistir razão.

Com efeito, embora o recurso de revisão esteja inserido no capítulo do Código de Processo Civil dedicado aos “Recursos”, o mesmo obedece a regras substancialmente diversas das que regem os recursos ordinários, não dependendo, naturalmente, nem dos pressupostos do valor do processo, nem da sucumbência.

Para além disso, também não lhe é aplicável o artigo 632.º do Código de Processo Civil – que prevê a renúncia antecipada ao recurso – por tal regra colidir com os interesses de ordem pública subjacentes ao recurso de revisão.

Em consequência, não estando em causa um direito que admita renúncia antecipada, é mais do que evidente que os argumentos avançados pelos recorridos não merecem, neste particular, acolhimento, nem mesmo pela aventada via do abuso do direito, já que uma tal solução levaria, em termos práticos, a tornar disponível uma faculdade que, por força dos referidos interesses de ordem pública, está, in casu, excluída da disponibilidade das partes.

Neste sentido, pode, aliás, ver-se:

- ABRANTES GERALDES, ob. cit., p. 424, que afirma que Conquanto o recurso de revisão se insira no capítulo dos “Recursos”, obedece a pressupostos e regras substancialmente diversas das que regem os recursos ordinários. (…) naturalmente que a revisão não depende nem do valor do processo, nem da sucumbência. Também não é aplicável o art. 632.º que prevê a renúncia antecipada ao recurso, já que colide com os interesses de ordem pública subjacentes ao recurso de revisão. (…); e

- JOSÉ LEBRE DE FREITAS, Código de Processo Civil Anotado, volume 3.º, tomo I, 2ª edição, Coimbra, 2008, p. 223, que refere que O regime geral dos recursos ordinários não é, em regra, aplicável aos recursos extraordinários, atendendo à radical diferença entre ambas as figuras. (…) Por isso, se se descontar a ideia de que a parte pode livremente desistir do recurso ordinário, tal como do extraordinário, já interposto, grande parte das regras gerais dos recursos ordinários são inaplicáveis aos recursos extraordinários. Basta referir a inaplicabilidade das regras de recorribilidade em função do valor da causa, confrontando este com o da alçada do tribunal recorrido, ou da sucumbência, da licitude da renúncia aos recursos, sobretudo a antecipada, dos prazos de interposição, (…) etc.

     Tudo para concluir que, não sendo lícita a renúncia antecipada ao recurso de revisão, a conduta assumida pelo recorrente no processo de execução que se encontra a correr termos irreleva para este efeito.

     Decorrentemente, não podendo afirmar-se que o recorrente tenha renunciado antecipadamente ao recurso e admitindo-se que o mesmo é tempestivo, restará analisar se se mostra preenchido o fundamento em que se alicerça o pedido de revisão.


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C - Do pressuposto de que depende a revisão

Sustenta o recorrente, a este propósito, que tomou conhecimento de um ofício da CCDTRLVT – entidade que diz ser a competente para emitir parecer sobre as consequências ambientais das obras a realizar em aterro sanitário – do qual decorre, no seu entender, que a prestação de facto a que está obrigado por decisão transitada em julgado acarretaria, necessariamente ou com elevado grau de probabilidade, a produção de danos ambientais.

É, pois, esse “ofício” que o recorrente defende – qualificando-o como “parecer” – constituir fundamento bastante e suficiente para modificar a aludida decisão condenatória ao abrigo da alínea c) do art. 771.º do Código de Processo Civil, correspondente ao actual artigo 696.º do novo Código.

Crê-se, porém, que, à luz da doutrina e da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça – que, de resto, nesta matéria e no essencial, tem sido pacífica – não lhe assiste qualquer razão.

Conforme resulta do corpo do artigo 696.º do Código de Processo Civil (que corresponde, sem alterações no que ora releva, ao artigo 771.º do anterior Código), o recurso de revisão interpõe-se de decisões transitadas em julgado, mas apenas nos casos aí taxativamente enunciados.

E compreende-se que assim já que, tal como acima se aflorou, resultando o recurso de recurso de revisão da ponderação que o legislador fez entre os valores da certeza e da segurança inerentes ao caso julgado e as exigências de justiça, apenas em casos de especial gravidade se justifica que o primeiro ceda perante as segundas.

A doutrina tem, aliás, dado conta da ponderação que deve ser feita entre os ditos valores conflituantes e da necessidade da sua harmonização em casos excepcionais.

Conforme se colhe do ensinamento de ALBERTO DOS REIS (ob. cit., p. 335 a 337) O recurso de revisão apresenta, à primeira vista, o aspecto de uma aberração judicial: o aspecto de atentado contra a autoridade do caso julgado. (…).

Bem consideradas as coisas estamos perante uma das revelações do conflito entre as exigências da justiça e a necessidade da segurança ou da certeza. Em princípio, a segurança jurídica exige que, formado o caso julgado, se feche a porta a qualquer pretensão tendente a inutilizar o benefício que a decisão atribuiu à parte vencedora.

Mas pode haver circunstâncias que induzam a quebrar a rigidez do princípio. A sentença pode ter sido consequência de vícios de tal modo corrosivos, que se imponha a revisão como recurso extraordinário para um mal que demanda consideração e remédio. Quer dizer, pode a sentença ter sido obtida em condições tão estranhas e anómalas, que seja de aconselhar fazer prevalecer o princípio da justiça sobre o princípio da segurança. Por outras palavras, pode dar-se o caso de os inconvenientes e as perturbações resultantes da quebra do caso julgado serem muito inferiores aos que derivariam da intangibilidade da sentença. (…).

De igual modo e seguindo a mesma linha de raciocínio, também FERNANDO AMÂNCIO FERREIRA (Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª edição, Almedina, Coimbra, 2009, p. 324 e 325) refere que o princípio da autoridade do caso julgado não é absoluto posto que a lei lhe abre excepções, qualificando o recurso de revisão como o último remédio contra os erros que atingem uma decisão judicial, já insusceptível de impugnação por força dos recursos ordinários. O prestígio do Estado, na vertente da função jurisdicional, seria fortemente afectado se uma decisão judicial, só por ter transitado em julgado, não pudesse jamais ser reformada, apesar de ser patente que ele se obteve de modo fraudulento, flagrantemente contrário ao Direito. (…).

É ainda particularmente elucidativa a este propósito a dissertação de CÂNDIDA DA SILVA ANTUNES PIRES, intitulada “O recurso de revisão em processo civil” (in BMJ, 134, Março, 1964, p. 21 e ss.), na qual se refere que, nos casos em análise, se está em presença da luta pela vitória, do duelo entre as noções rivais de Justiça e Segurança Jurídica, cuja conciliação se apresenta particularmente difícil, e que pode mesmo dizer-se impossível sem que os lutadores se façam mútuas concessões.

Assim configuradas as coisas, vemos que a questão que se levanta consiste na determinação da medida em que deve sacrificar-se cada um desses valores em holocausto ao outro, num esforço de doseamento equilibrado e prudente de ambos.

Dando-se conta da urgência da resolução do problema, em certos sectores o legislador resolve intervir, ditando normas a tal destinadas. (…)

Assim sucede em matéria de revisão de sentenças. A lei processual, consagrando e regulamentando o recurso de revisão, pretende obstar à consolidação de situações de grande injustiça para uma das partes, embora com certo perigo para a segurança jurídica, por tal medida constituir, ao menos sob determinado aspecto, um atentado contra a força do caso julgado, que essa mesma lei tão categoricamente afirma.

Optou-se, neste campo, por um predomínio da Justiça sobre a certeza na vida jurídica, sem no fundo atingir esta grandemente. (…)

Pode, assim, afirmar-se, em suma e citando PINTO FURTADO (Recursos em Processo Civil (de acordo com o CPC de 2013), Quid Juris, Lisboa, p. 155), que se a ideia de justiça e a de certeza andam geralmente associadas, em certas circunstâncias excepcionais entram as duas em conflito, impondo-se então que a certeza abra as suas portas para deixar entrar a justiça. E a chave para o efeito é o recurso extraordinário.

Ciente, porém, da necessidade de encontrar um equilíbrio entre a certeza e a justiça, o legislador elencou, de forma taxativa, na lei os casos excepcionais em que se mostra justificado o direito de desencadear o referido remédio.

Entre esses casos excepcionais conta-se precisamente aquele em que o recorrente ancorou o presente recurso, dispondo, neste particular o citado artigo artigo 696.º, al. c), do Código de Processo Civil, que A decisão transitada em julgado só pode ser objecto de revisão quando: (…) c) Se apresente documento de que a parte não tivesse tido conhecimento, ou de que não tivesse podido fazer uso, no processo em que foi proferida a decisão a rever e que, por si só, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida.

Decorre, assim, desde logo, deste normativo que são, essencialmente, três os requisitos exigíveis para se verifique este fundamento da revisão, a saber: (i) a apresentação de um documento; (ii) que tenha sido impossível à parte apresentar no processo em que foi proferida a decisão a rever; e (iii) que, por si só, seja apto a modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida.

A estes requisitos há, porém, que acrescentar um outro que resulta da conjugação dos anteriores, que é o de que o documento, que se caracteriza pela sua novidade e pela sua especial força probatória, vise demonstrar factos que tenham sido alegados e discutidos na acção na qual foi proferida a decisão transitada em julgado.

Analisando, com maior detalhe e de per se, os enunciados requisitos, dúvidas não restam de que se pretende abranger aqui o documento superveniente. Todavia, maiores dúvidas se suscitam quanto à questão se saber se o documento de aqui se cuida tem de ser anterior ao trânsito em julgado da decisão a rever, isto é, se tem de ser um documento já existente nessa altura, mas que a parte não pôde juntar ao processo anterior por desconhecer a sua existência ou por não ter podido dele dispor para esse fim (subjectivamente superveniente) ou antes se pode ser um documento que se formou em data posterior (objectivamente superveniente).

A esmagadora maioria da doutrina e da jurisprudência – apoiando-se, sobretudo, na circunstância de a lei não exigir, expressamente, que o documento seja de formação contemporânea ao decurso do processo em que foi proferida a decisão revidenda – tem entendido que o normativo em análise tanto abrange o documento anterior, como o posterior ao trânsito em julgado, isto é, tanto os casos de impossibilidade objectiva como subjectiva, podendo ver-se, na doutrina, neste sentido:

- ALBERTO DOS REIS, ob. cit., p. 355;

- CÂNDIDA PIRES, dissertação citada, p. 206 a 211;

- JOÃO ESPÍRITO SANTO, O documento superveniente para efeito de recurso ordinário e extraordinário, Almedina, Coimbra, p. 71 e 72; e

- LUÍS CORREIA MENDONÇA e HENRIQUE ANTUNES, Dos Recursos (Regime do Decreto-Lei n.º 303/2007), Quid Juris, Lisboa, 2009, p. 353.


E na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça:

- Acórdão de 13-11-2014 (proc. 1544/04.0TVLSB-B.L2.S1, Relatora Maria Clara Sottomayor, Adjuntos Sebastião Póvoas e Moreira Alves, disponível em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2014.pdf):

 (…)

IV - Considera-se superveniente tanto o documento que se formou ulteriormente ao trânsito da decisão a rever, como o que já existia na pendência do processo em que essa decisão foi proferida sem que o recorrente conhecesse a sua existência ou, conhecendo-a, sem que lhe tivesse sido possível fazer uso dele nesse processo. 

V - A lei não exige a superveniência objectiva do documento, mas apenas a superveniência subjectiva, bastando que se prove que o recorrente não teve conhecimento do documento em tempo útil de com ele conseguir obter uma alteração dos factos provados na acção principal. 

VI - O documento é novo (i) requisito da novidade, no sentido em que não foi apresentado no processo onde se emitiu a decisão a rever, porque ainda não existia, ou porque, existindo a parte não pôde socorrer-se dele, por não ter tido conhecimento e porque quando teve este conhecimento já a fase dos articulados da acção principal onde se discutia a questão. 


A verdade, porém, é que as expressões contidas na lei - documento de que a parte não tivesse tido conhecimento, ou de que não tivesse podido fazer uso inculcam precisamente o contrário, isto é, que se trata de documento já existente ao tempo em que correu o processo no qual foi formado o caso julgado, mas de que a parte não pôde socorrer-se porque o desconhecia ou porque não o teve à sua disposição já que, como é evidente, é destituído de sentido afirmar-se que se desconhece ou que não pôde usar-se o que ainda não existia.

É, portanto, no mínimo, duvidoso que o documento em questão possa ser um documento ainda não existente quando correu termos a acção na qual foi proferida a decisão revidenda, acompanhando-se, portanto, neste ponto, as reflexões e a posição que, embora, minoritária, foi sufragada pelo Supremo Tribunal de Justiça no:

- Acórdão de 19-09-2013 (proc. 663/09.1TVLSB.S1, Relator Fernando Bento, Adjuntos João Trindade e Tavares de Paiva, disponível em www.dgsi.pt):

 (…)

IV - O documento novo de que a parte não tivesse conhecimento ou de que não tivesse podido fazer uso deve ser um documento existente na pendência do processo onde foi proferida a decisão a rever porque, por um lado, a parte só podia ter conhecimento do que existe (sendo um absurdo lógico, ignorar a existência do que não existe…) e, por outro, o não ter podido fazer uso desse documento na acção anterior deve ser entendido no sentido de que, noutras circunstâncias, teria podido fazer uso dele (e ninguém pode fazer uso do que não existe…). 

V - Assim, é, no mínimo, duvidoso que o documento a que alude a al. c) do art. 771.º do CPC, possa ser um documento que ainda não existia na pendência da acção onde foi proferida a decisão a rever e só foi criado posteriormente ao respectivo trânsito. 

(…)

         Texto integral:

http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/f1c65a959503a51780257bec00542a4c?OpenDocument


Seja como for e independentemente das dúvidas e da controvérsia que a redacção do preceito suscita neste particular, o que importa reter (por ser pacífico) é que a impossibilidade de apresentação do documento no processo anterior – isto é, a tempo de interferir no resultado declarado na decisão revidenda – não pode ser imputável à parte.

Ficam, assim, excluídos da previsão normativa em análise os casos em que a parte tinha conhecimento do documento e não o apresentou porque não quis, bem como os casos em que não teve conhecimento do documento por incúria sua, sendo-lhe imputável o seu não uso.

Dito de outro modo, o que se impõe para que possa haver lugar a revisão é que se demonstre que, apesar de a parte ter empregue todos os esforços que estavam ao seu alcance para obter o documento, não lhe foi, ainda assim, possível obtê-lo; não lhe sendo, portanto, imputável a sua não apresentação na acção na qual foi proferida a decisão a rever, podendo ver-se, neste sentido, as seguintes decisões:


- Acórdão de 30-10-2001 (proc. 1719/01, Relator Moura Cruz, Adjuntos Barata Figueira e Abílio Vasconcelos, disponível em http://www.stj.pt /ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2001.pdf):

A al. c) do art.º 771 do CPC, é de interpretar no sentido de que não seja imputável à parte vencida a não produção do documento no processo anterior. 

- Acórdão de 11-09-2007 (proc. 1332/07, Relator Fonseca Ramos, Adjuntos Azevedo Ramos e Silva Salazar, disponível em www.dgsi.pt):

I - O documento superveniente apenas fundamentará a revisão extraordinária da decisão transitada quando, por si só, seja capaz de modificar tal decisão em sentido mais favorável ao recorrente. 

II - Se os documentos em que se fundamenta o pedido de revisão puderem ser obtidos através de certidões, sobre o requerente incumbia o ónus de instruir o processo de harmonia com tais provas, por tal obtenção estar ao seu alcance, incumbindo-lhe proceder a consultas e buscas; a situação não é assimilável aqueloutra em que o documento é desconhecido, por se encontrar em poder da parte adversa, ou de terceiro, ou não poder ser obtido a tempo de ter sido utilizado na acção revidenda. 

III - Deve ser de imputada à parte a não obtenção de documentos a que poderia aceder através de certidão emitida por entidade ou repartição pública, não sendo relevante a mera alegação de superveniência do conhecimento de documentos autênticos.

IV - Não preenche o fundamento do recurso de revisão do art. 771.º, al. c), do CPC, a apresentação de documentos com relevância para a causa mas que, apenas em conjugação com outros elementos de prova produzidos, ou a produzir em juízo, poderiam modificar a decisão transitada em julgado.

         Texto integral:

http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/fd77cb13d3c6df5e80257353003d0140?OpenDocument

- Acórdão de 11-10-2007 (proc. 3128/07, Relator Ferreira de Sousa, Adjuntos Armindo Luís e Pires da Rosa, disponível em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2007.pdf):

I - Para que a decisão transitada em julgado seja susceptível de revogação com base em documento superveniente é necessário: que a parte vencida apresente um documento; que não tivesse conhecimento desse documento ou dele não pudesse fazer uso no processo em que foi proferida a decisão revidenda; que o documento apresentado seja, em si, suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável ao recorrente. 

II - Sendo o documento concretamente apresentado pelo recorrente anterior, na formação dos factos respectivos, à sentença a rever, respeitando o mesmo a elementos existentes desde 05-08-1993 (tendo a acção sido intentada em 31-10-1994) numa determinada Repartição de Finanças (onde tal documento estava acessível ao recorrente, como a qualquer interessado) e não estando demonstrado que o recorrente não teve conhecimento ou não lhe foi possível fazer uso do documento no processo em que foi proferida a decisão revidenda, deve concluir-se que in casu não se está perante um documento superveniente, pelo que o mesmo não pode ser atendido como fundamento do recurso de revisão. 

- Acórdão de 13-07-2010 (proc. 480/03.2TBVLC-E.P1.S1, Relator Moreira Alves, Adjuntos Alves Velho e Moreira Camilo, disponível em www.dgsi.pt):

I - Perante a letra e a razão de ser do preceito contido na al. c) do art. 771.º do CPC, parece evidente que, quem queira utilizar o recurso de revisão, com base na referida alínea, terá de alegar e provar que não tinha conhecimento da existência do documento, ou tendo dele conhecimento não pôde usá-lo no processo em tempo processualmente útil. Trata-se de um pressuposto da própria viabilidade do recurso a apreciar numa primeira fase e que pode levar ao indeferimento liminar, se aquele pressuposto não estiver presente – cf. art. 774.º, n.º 2, do CPC. 

II - É essencial que não seja imputável à parte vencida a não produção do documento no processo anterior. Exige-se, portanto, ao pretendente à revisão que tenha desenvolvido todas as diligências que estavam ao seu alcance para utilizar o documento de que tinha conhecimento e, não obstante, o não tenha conseguido, por motivo que não lhe seja imputável. 


Para além disso, é igualmente pacífico na jurisprudência que o documento novo superveniente de que aqui se fala se deve destinar a demonstrar factos alegados e discutidos na acção onde foi proferida a decisão revidenda que, só por falta desse documento, foi julgada desfavoravelmente ao recorrente.

E compreende-se que assim seja já que, não sendo admissível, invocar, em sede de recurso de revisão, matéria fáctica nova, torna-se, naturalmente, necessário que, no processo anterior, já tenham sido alegados os factos que, com o documento novo ou superveniente, se pretendem provar (neste sentido: JOÃO ESPÍRITO SANTO, ob. cit., p. 73).

O documento é, pois, um meio de prova que visa demonstrar a realidade de factos (artigo 341.º do Código Civil), sendo que, conforme se deixou dito no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19-09-2013 (já citado), embora o documento, na sua acepção mais ampla, seja qualquer objecto elaborado pelo homem com o fim de reproduzir ou representar uma pessoa, coisa ou facto, já na sua acepção mais restrita é um escrito, normalmente em papel, que representa factos, factos esses que, como se disse, devem ter sido oportunamente alegados no processo onde foi proferida a decisão a rever.

Assim sendo, tem-se entendido que a única interpretação que o preceito em análise consente é a de que o documento que releva para este efeito é apenas o documento em sentido restrito (isto é, o escrito em papel), que corporize uma declaração de verdade ou de ciência; ou, dito de outro modo, o documento narrativo, isto é, aquele que narra um facto, por via de regra, exterior ao documento ou que descreve uma coisa ou situação (cf. ANTUNES VARELA, Manual de Processo Civil, 2ª edição, p. 506 e 507).

É neste sentido que se tem pronunciado o Supremo Tribunal de Justiça:

- Acórdão de 18-12-2003 (proc. 2493/0102, Relator Joaquim de Matos, Adjuntos Moitinho de Almeida e Ferreira de Almeida, disponível em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2003.pdf):

Para, com base no disposto no art.º 771, al. c), do CPC, proceder o recurso de revisão, é necessário que, além do mais, na acção onde se proferiu a decisão revidenda hajam já sido alegados os factos que o documento novo pretende provar, por neste recurso não ser admissível invocar nova matéria de facto. 

- Acórdão de 23-05-2006 (proc. 4275/05, Relator Moreira Camilo, Adjuntos Urbano Dias e Paulo Sá, disponível em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2006.pdf):

I - O documento a que alude a al. c) do art. 771.º do CPC tem de corporizar uma declaração de verdade ou ciência, isto é, uma declaração destinada a corporizar um estado de coisa, pelo que deve ser um documento em sentido estrito. 

(…)

- Acórdão de 25-06-2009 (proc. 453/09, Relator Serra Baptista, Adjuntos Santos Bernardino e Álvaro Rodrigues, disponível em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2009.pdf):

I - É fundamento de recurso extraordinário de revisão a apresentação de documento que a parte não tivesse tido conhecimento, ou de que não tivesse podido fazer uso, no processo em que foi proferida a decisão a rever e que, por si só, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida (art. 771.º, al. c), do CPC). 

II - O documento a que se refere a al. c) do art. 771.º tem de corporizar uma declaração de verdade ou ciência, destinada a corporizar um estado de coisas, pelo que deve ser um documento em sentido estrito. 

III - Uma sentença proferida no âmbito de um processo não pode ser configurada como um documento superveniente essencial. 

- Acórdão de 19-09-2013 (proc. 663/09.1TVLSB.S1, Relator Fernando Bento, Adjuntos João Trindade e Tavares de Paiva, disponível em www.dgsi.pt):

         (…)

III - O fundamento da revisão previsto na al. c) do art. 771.º do CPC é a apresentação de um documento novo superveniente, comprovativo de facto alegado e discutido na acção onde foi proferida a decisão a rever e que, só por falta de tal documento, foi julgada desfavoravelmente ao recorrente. 

         (…)

V - Assim, é, no mínimo, duvidoso que o documento a que alude a al. c) do art. 771.º do CPC, possa ser um documento que ainda não existia na pendência da acção onde foi proferida a decisão a rever e só foi criado posteriormente ao respectivo trânsito. 

VI - Independentemente disto, a revisão não pode ter lugar se os factos comprovados por tal documento não tiverem sido alegados na acção anterior. 

VII - E, por maioria de razão, se tais factos se reconduzem a actuações da própria parte que os invoca e em seu próprio benefício. 

         Texto integral:

http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/f1c65a959503a51780257bec00542a4c?OpenDocument


- Acórdão de 13-11-2014 (proc. 1544/04.0TVLSB-B.L2.S1, Relatora Maria Clara Sottomayor, Adjuntos Sebastião Póvoas e Moreira Alves, disponível em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2014.pdf):

 (…)

II - A apresentação de um documento novo superveniente (art. 696.º, al. c), do NCPC) constitui um fundamento de revisão, relativo à formação do material instrutório, que visa a comprovação de facto alegado e discutido na acção onde foi proferida a decisão a rever, e que, só por falta de tal documento, foi julgada desfavoravelmente ao recorrente. 

(…)

VII - O (ii) requisito da pré-alegação impõe que a factualidade que o documento visa provar tenha sido suporte da acção ou defesa naquele processo em que os factos foram alegados e discutidos.


Por último, o documento que se junte, para alicerçar a revisão, deve ser apto, por si só, a modificar a decisão transitada em julgado; o mesmo é dizer que dele deve emergir uma força probatória qualificada, auto-suficiente e impassível de destruição, defendendo alguns inclusive que se está aqui no domínio da prova legal e vinculada – da prova plena – à qual é, em absoluto, alheio qualquer tipo de julgamento de facto produzido pelo julgador, à luz da sua liberdade de apreciação (…), ainda que o julgamento – quanto ao pertinente documento – se bem que com reflexo no facto, seja de direito (neste sentido: LUÍS FILIPE BRITES LAMEIRAS, ob. cit., p. 294 e 295).

Excluem-se, com esta limitação, da supra transcrita previsão normativa os casos em que o documento apenas quando conjugado com outros meios de prova, produzidos ou a produzir, seja susceptível de modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida, bem como aqueles em que o documento pode, eventualmente, alterar um dos fundamentos em que se baseou a decisão, mas mantém intacto um outro que também lhe serviu de fundamento, sendo abundante a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça neste sentido:

- Acórdão de 15-05-2001 (proc. 436/01, Relator Silva Paixão, Adjuntos Silva Graça e Armando Lourenço, disponível em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2001.pdf):

O documento mencionado na al. c) do art.º 771 do CPC há-de ser um documento decisivo, ou seja, dotado, em si mesmo, de tal força que possa conduzir o juiz à persuasão de que só através dele a causa poderá ter solução diversa daquela que teve.

- Acórdão de 25-02-2003 (proc. 1978/02, Relator Pinto Monteiro, Adjuntos Reis Figueira e Barros Caldeira, disponível em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2003.pdf):

I - Com o recurso de revisão visa-se a modificação de uma decisão transitada em julgado, como meio de reparar eventuais injustiças ou erros. 

II - O documento mencionado na alínea c), do art.º 771, do CPC, tem que ser um documento decisivo, dotado, em si mesmo, de tal força que possa conduzir o juiz ao convencimento de que só através dele a causa poderá ter solução diversa daquela que teve.


- Acórdão de 22-02-2005 (proc. 4761/04, Relator Alves Velho, Adjuntos Moreira Camilo e Lopes Pinto, disponível em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2005.pdf):

Carece de suficiência modificativa como fundamento de recurso nos termos da al. c) do art.º 771, do CPC, o documento particular que contém declarações emitidas por terceiro, uma vez que, não é mais que um depoimento escrito, produzido fora do processo, de livre apreciação e, como tal, inidóneo para, por si só, determinar qualquer modificação da matéria de facto – art.ºs 366, 376, e 396, do CC (cfr., ainda, como caso paralelo, o art.º 712-1-c), do CPC). 

- Acórdão de 23-05-2006 (proc. 4275/05, Relator Moreira Camilo, Adjuntos Urbano Dias e Paulo Sá, disponível em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2006.pdf):

 (…)

II - Terá ainda de ser um documento decisivo, dotado, em si mesmo, de uma força tal que possa conduzir o juiz à persuasão de que, só através dele, a causa poderá ter solução diversa da que teve. 

III - Uma sentença não pode ser qualificada como documento para efeitos do disposto na al. c) do art. 771.º do CPC.

- Acórdão de 13-07-2010 (proc. 480/03.2TBVLC-E.P1.S1, Relator Moreira Alves, Adjuntos Alves Velho e Moreira Camilo, disponível em www.dgsi.pt):


(…)

III - O documento que pode fundar o recurso extraordinário de revisão, além do mais, deve ser tal que, só por si, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida, o que significa que não pode ser considerado e apreciado em conjugação com outros meios de prova para alterar a situação de facto emergente da sentença a rever. Há-de, ele próprio, com a sua exclusiva força probatória ter tal virtualidade. 

- Acórdão de 07-04-2011 (proc. 1242-L/1998.P1.S1, Relator Bettencourt de Faria, Adjuntos Pereira da Silva e João Bernardo, disponível em www.dgsi.pt):

I - A revisão não pode ter como base, apenas, indícios da razão daquele que a pretende, mas sim uma consistente demonstração de que essa razão é provável, ou seja, o art. 771.º do CPC exige que o documento por si só indicie tal probabilidade. 

II - Interpretação mais ampla deste preceito constituiria uma infracção ao princípio do processo equitativo do art. 20.º, n.º 4, da CRP, bem como ao princípio da confiança ali previsto. 

Texto integral:

http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/dc38ef7cf5ed27c98025786b00390332?OpenDocument

- Acórdão de 04-07-2013 (proc. 56-C/2000.S1, Relator Gregório Silva Jesus, Adjuntos Martins de Sousa e Gabriel Catarino, disponível em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2013.pdf):


(…)

II - O documento superveniente previsto no art. 771.º, al. c), do CPC, tem de ter a virtualidade bastante para só através dele, e sem recurso a novos elementos de prova, impor à causa uma solução diversa daquela que teve. 

III - É necessário que o documento prove factos incompatíveis ou inconciliáveis com os provados na decisão a rever, evidenciando um julgamento errado de factos relevantes na decisão da causa. 

IV - A autoridade, a segurança e o prestígio do caso julgado seus verdadeiros atributos, embora não sejam absolutos e intangíveis, não podem estar à mercê de qualquer documento superveniente. 

V - Se os recorrentes vêm suscitar o valor probatório de um documento, certo que de forma infundada, mas aparentemente convictos de que lhes assiste razão substancial, ainda que não a tenham, a falta de razão, só por si, não é sinónimo de má fé, antes causa da improcedência da pretensão, não constituindo motivo revelador, só por si, de dolo ou negligência grosseira, de molde a integrar algum dos tipos de litigância de má fé, previstos no art. 456.º, n.º 2, do CPC.

- Acórdão de 19-09-2013 (proc. 663/09.1TVLSB.S1, Relator Fernando Bento, Adjuntos João Trindade e Tavares de Paiva, disponível em www.dgsi.pt):

         (…)

III - O fundamento da revisão previsto na al. c) do art. 771.º do CPC é a apresentação de um documento novo superveniente, comprovativo de facto alegado e discutido na acção onde foi proferida a decisão a rever e que, só por falta de tal documento, foi julgada desfavoravelmente ao recorrente.  

         (…) 

VI - Independentemente disto, a revisão não pode ter lugar se os factos comprovados por tal documento não tiverem sido alegados na acção anterior. 

VII - E, por maioria de razão, se tais factos se reconduzem a actuações da própria parte que os invoca e em seu próprio benefício. 

         Texto integral:

http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/f1c65a959503a51780257bec00542a4c?OpenDocument

- Acórdão de 07-05-2014 (proc. 5629/04.5TVLSB.L1.S1, Relatora Maria dos Prazeres Beleza, Adjuntos Lopes do Rego e Orlando Afonso, disponível em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2014.pdf):

 (…)

II - Na lista de fundamentos do recurso de revisão figura a hipótese de se apresentar documento de que a parte não tivesse conhecimento ou de que não tivesse podido fazer uso, no processo em que foi proferida a decisão a rever e que, só por si, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida. 

III - Não têm tal virtualidade os documentos apresentados pela recorrente e que consubstanciam cópias de artigos de jornais e comentários obtidos da internet. 


- Acórdão de 16-10-2014 (proc. 1225/05.3TBBCL-A.S1, Relator Bettencourt de Faria, Adjuntos João Bernardo e Oliveira Vasconcelos, disponível em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2014.pdf):

I - A revisão de decisão transitada em julgado, com fundamento no art. 696.º, al. c), do NCPC (2013) tem como requisitos a impossibilidade de a parte apresentar atempadamente o documento e a susceptibilidade de o mesmo, por si só, modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida. 

II - Carece de força probatória relevante um documento que consubstancia um acto unilateral da parte, tanto mais que, em julgamento, não foi considerado um acto da contraparte que lhe poderia ser tido como favorável à apresentante. 

(…)

- Acórdão de 13-11-2014 (proc. 1544/04.0TVLSB-B.L2.S1, Relatora Maria Clara Sottomayor, Adjuntos Sebastião Póvoas e Moreira Alves, disponível em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2014.pdf):

 (…)

VIII - O (iii) requisito da suficiência exige que o documento implique, por si só, uma modificação da sentença, em sentido mais favorável à parte vencida.

- Acórdão de 02-06-2016 (proc. 13262/14.7T8LSB-A.L1.S1, Relator Oliveira Vasconcelos, Adjuntos Fernando Bento e João Trindade, disponível em www.dgsi.pt):


(…)

III - O recurso extraordinário de revisão faculta a quem tenha definitivamente ficado vencido na causa a possibilidade de a reabrir mediante a invocação de fundamentos taxativamente previstos no art. 696.º do NCPC (2013), as quais se referem à atividade material do juiz, à situação das partes, à formação do material probatório e à preterição do caso julgado.

IV - Na primeira fase da tramitação do recurso de revisão – a fase rescindente –, verifica-se se existe ou não fundamento para a revisão, mantendo-se ou revogando-se, em consonância, a decisão recorrida. Na eventualidade do recurso ser julgado provido, segue-se a fase rescisória em que se procede à ressuscitação da instância (expurgada da falsidade que a inquinou) em que se produziu o caso julgado e se julga a mesma ação, mantendo-se intocáveis a causa de pedir, o pedido, os sujeitos e o valor da causa. 

V - O fundamento previsto na al. c) do art. 696.º do NCPC refere-se a um documento escrito dotado de força probatória plena que seja suficiente para, por si só (alheando-se assim da margem de apreciação do julgador – trata-se de um julgamento produzido pela lei, embora com reflexo na matéria de facto), destruir a prova em que se fundou a decisão. 

VI - Uma carta dirigida ao recorrido na qual o recorrente afirma que, na hipótese de aquele não se submeter a exame de ADN, reabrirá o processo de investigação da paternidade e nele pedirá que o tribunal reconheça que a falta de colaboração implica a inversão do ónus da prova é destituída da força probatória mencionada em V, já que, necessariamente, o seu teor teria de ser conjugado (o que é vedado em sede de recurso de revisão) com outros meios de prova, mormente, o resultado daquele exame, o qual, em todo o caso, não se imporia aos fundamentos da sentença revidenda.

VII - A apreciação dos efeitos de uma eventual recusa à submissão ao exame em causa apenas teria cabimento na fase rescisória do recurso de revisão, já que, na fase precedente, não poderia ocorrer a provocação da recusa por aí não poder ter lugar qualquer julgamento de facto.

VIII - As diligências a que se refere o n.º 1 do art. 700.º do NCPC reportam-se à previsão das als. b), d) e g) do art. 696.º do mesmo diploma e apenas têm lugar na fase rescindente, não se impondo, pois, a sua realização oficiosa. 

         Texto integral:

http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/dbb52f22d081c6cc80257fc7002fdfa5?OpenDocument


Retomando a análise do caso sub judice, sem perder de vista as considerações expendidas, crê-se ser evidente que o “ofício” apresentado pelo recorrente, não é, à luz da doutrina e da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, subsumível à previsão contida no artigo 696.º, alínea c), do Código de Processo Civil, desde logo, por não se enquadrar no conceito de “documento” aí inserto.

Com efeito, tal “ofício” (que se mostra junto a fls. 20) consubstancia uma resposta da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo (CCDRLVT) à solicitação que lhe terá sido dirigida pela BB – Associação dos Municípios de ..., ..., ... e ... para o Tratamento dos Resíduos Sólidos, em 02/02/2016, acerca dos procedimentos e condicionantes a adotar para reposição de caminho dentro do perímetro da antiga lixeira selada (…), sita em Trajouce.

Pretende o recorrente, com tal documento, demonstrar que a execução da decisão que o condenou a desobstruir o caminho melhor identificado na acção apensa, por acarretar o desmantelamento do aterro sanitário aí existente e selado há mais de vinte anos, se traduz numa obra ilegal por a desselagem do referido aterro acarretar danos ambientais.

Sucede, porém, que, na acção em que foi proferida a decisão a rever, não foram alegados nem pelo recorrente, nem pela aí co-ré BB, quaisquer factos atinentes aos supostos perigos e danos ambientais que resultariam da procedência da acção, não tendo aí sido feita sequer menção a essa possibilidade ou à probabilidade da sua verificação.

Limitou-se, ao invés, o recorrente a impugnar, nesse processo, a factualidade que aí foi alegada pelos autores a propósito da obstrução do caminho, sustentando, para tanto, que tal situação apenas teria ocorrido durante um período limitado de tempo por via de chuvas de caudal excepcional que teriam caído em Outubro e Novembro de 2007 e que após terem sido levados a cabo trabalhos de selagem técnica do aterro sanitário existente no local e de construção de uma banqueta suplementar, a situação se mostrava sanada.

Ou seja, não obstante ter feito alusão ao aterro sanitário existente no local e ao facto de o mesmo ter sido selado (factos que, então, já conhecia), o recorrente não só não invocou que a procedência da acção acarretaria danos ambientais como, em bom rigor, nem sequer alegou que a desobstrução do caminho implicasse, necessariamente, a desselagem do aterro.

Tais factos sendo, por isso, novos, porquanto só agora alegados, não foram discutidos no processo e, como tal, não suscitaram qualquer decisão e se não houve decisão, seguramente que também não houver qualquer erro que o documento pudesse ter evitado e que cumpra corrigir por via da revisão.

Com efeito e conforme se deixou dito no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19-09-2013 (já citado e que aqui se vem seguindo de perto), o fundamento da revisão a que alude o artigo 696º, alínea c), do Código de Processo Civil (correspondente ao artigo 771.º, alínea c), do anterior Código) é a apresentação de um documento novo e não de um facto novo; no fundo, é apenas a prova (documento) que deve ser nova e não os factos probandos.

Donde, sendo pacífico, conforme acima se deixou dito, que o recurso de revisão não se destina à alegação de matéria nova, é mais do que evidente que os factos só agora invocados – e que o recorrente pretende demonstrar com o “documento” que apresentou – não constituem fundamento de revisão, sendo que tal é quanto basta para que o recurso seja indeferido.

Mas ainda que assim não fosse, a verdade é que o “ofício” junto aos autos se trata de um documento produzido, fora do processo, por terceiro – no caso, a referida CCDRLVT – que, para além de não se encontrar revestido de força probatória qualificada, também não contém qualquer declaração de ciência, mas antes meros juízos de valor ou de opinião, de carácter eventual ou de possível verificação.

Repare-se que no “ofício” em questão a referida Comissão mais não faz do que aventar uma série de hipóteses, equacionando, para tanto, o tipo de resíduos que poderão estar depositados na antiga lixeira de Trajouce - cuja natureza assume, expressamente, desconhecer – e daí que as consequências da desselagem do aterro que aí vêm relatadas não revistam qualquer grau de certeza quanto à sua verificação, antes consubstanciando meras possibilidades – o que, de resto, está bem patente nas expressões aí vertidas: “poderá incluir (…)”, “poderá verificar-se (…)”, “poderá resultar (…)”, “poderá acarretar”.

Está em causa, portanto, um mero documento particular que, por si só, sempre estaria longe de ter a virtualidade de alterar a decisão condenatória transitada em julgado em sentido mais favorável ao recorrente, já que, mesmo que tivesse sido apresentado a tempo, não era susceptível de criar no Tribunal uma convicção nesse sentido, precisamente por não apresentar qualquer grau de certeza quanto às declarações (que, na verdade, mais não são do que hipóteses) aí contidas.

Com efeito, os documentos particulares – como aquele que está agora em causa e no qual o recorrente alicerça o pedido de revisão – sendo reconhecida a sua autoria, apenas fazem prova plena quanto às declarações neles atribuídas ao seu autor, não resultando, contudo, daí que os factos abrangidos por essas declarações se hajam de considerar provados e nem que essas declarações correspondam à realidade (artigos 363.º, n.º 2, 374.º, e 376.º do Código Civil e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09-12-2008, disponível em www.dgsi.pt).

Também não é despiciendo sublinhar que, em bom rigor, nem sequer deflui, com suficiente clareza, da factualidade dada como provada no processo em que foi proferida a decisão a rever, que a desobstrução do caminho em que o recorrente foi condenado implique necessariamente a desselagem do aterro sanitário em questão ou o seu “desmantelamento”, tal como agora é sustentado por aquele. E a verdade é que, a ser exacta tal afirmação, estava em causa matéria que podia e devia ter sido, oportunamente, alegada, sendo certo que a circunstância de não o ter sido ter-se-á, certamente devido à estratégia que o recorrente optou por seguir e que resulta bem patente do teor da contestação aí apresentada e de que, sumariamente, acima se deu conta.

Tudo para concluir que, sendo taxativos os fundamentos do recurso de revisão, não podem os mesmos ser interpretados de forma elástica ou extensiva, tal como parece pretender o recorrente, sob pena de se atentar, de forma desproporcionada e injustificada, contra o princípio da intangibilidade do caso julgado, abrindo-se as portas à incerteza e à insegurança das decisões judiciais transitadas.

Efectivamente, tal como já referia MANUEL DE ANDRADE (Noções Elementares de Processo Civil, nova edição revista e actualizada pelo Dr. Herculano Esteves, Coimbra, 1976, p. 305 e 306), Sem o caso julgado material estaríamos caídos numa situação de instabilidade jurídica (…) verdadeiramente desastrosa – fonte perene de injustiças e paralisadora de todas as iniciativas. Seria intolerável que cada um nem ao menos pudesse confiar nos direitos que uma sentença lhe reconheceu; que nem sequer a estes bens pudesse chamar seus, nesta base organizando os seus planos de vida; que tivesse constantemente que defendê-los em juízo contra reiteradas investidas da outra parte, e para mais com a possibilidade de nalgum dos novos processos eles lhe serem negados pela respectiva sentença. Não se trata propriamente de a lei ter como verdadeiro o juízo – a operação intelectual – que a sentença pressupõe. O caso julgado material não assenta numa ficção ou presunção absoluta de verdade, por força da qual, como diziam os antigos, a sentença faça do branco preto e do quadrado redondo (“facit de albo nigrum,... aequat quadrata rotundis ...”) ou transforme o falso em verdadeiro (falsum que mutat in vero). Trata-se antes de que, por uma fundamental exigência de segurança, a lei atribui força vinculante infrangível ao acto de vontade do juiz, que definiu em dados termos certa relação jurídica, e portanto os bens (materiais ou morais) nela coenvolvidos. Este caso fica para sempre julgado. Fica assente qual seja, quanto a ele, a vontade concreta da lei (Chiovenda). O bem reconhecido ou negado pela pronuntiatio judicis torna-se incontestável. (…) a finalidade do processo não é apenas a justiça – a realização do direito objectivo ou a actuação dos direitos subjectivos privados correspondentes. É também a segurança – a paz social (Schönke).


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Caixa de texto: 11 - DECISÃO:
Nesta conformidade, acorda-se em negar provimento à revista.
Custas pelo recorrente.
Notifique.


Lisboa, 2017-01-19


João Trindade (Relator)

Tavares de Paiva

Abrantes Geraldes