Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
060957
Nº Convencional: JSTJ00004292
Relator: TORRES PAULO
Descritores: DESPEJO
CAIXA DE PREVIDÊNCIA
UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: SJ196611110609572
Data do Acordão: 11/11/1966
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: DG Nº 201, I-S 1966/12/17, PÁG. 971 - BMJ N º 161, ANO1966 PÁG. 240 - RLJ, ANO 100, PÁG. 133
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PARA O PLENO.
Decisão: TIRADO ASSENTO.
Indicações Eventuais: ASSENTO DO STJ.
Área Temática: DIR CIV - DIR CONTRAT.
Legislação Nacional: D 28321 DE 1937/12/27 ARTIGO 11 C.
D 45266 DE 1963/09/23 ARTIGO 166 N1 A.
L 1884 DE 1935/03/16 ARTIGO 1 N2 PAR2 ARTIGO 16 B.
L 2115 DE 1962/06/18 BIII N3 BXXXII N2 BXXXIII.
D 46548 DE 1965/09/23 ARTIGO 119 A.
CPC61 ARTIGO 763 ARTIGO 764 N2.
D 5411 DE 1919/04/17 ARTIGO 108 ARTIGO 117.
L 1663 DE 1924/08/30 ARTIGO 5 ARTIGO 13.
D 14630 DE 1927/11/28.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO STJ PROC60957 DE 1965/05/25.
ACÓRDÃO STJ DE 1950/01/27 IN BMJ N17 PAG286.
ACÓRDÃO STJ PROC60957 DE 1965/10/29.
Sumário :
As Caixas de Previdencia, instaladas em edificio proprio, gozam do direito de despedir os seus inquilinos quando necessitem da parte por estes ocupada mesmo que tenham adquirido o predio depois do arrendamento.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em Pleno, os juizes do Supremo Tribunal de Justiça:

A "A", com sede em Lisboa, nos termos do artigo 763 do Codigo de Processo Civil, recorre para o Tribunal Pleno do acordão deste Tribunal, de 25 de Maio de 1965, fotocopiado a folhas 11 a 14, que julgou procedente a acção que lhe moveu a B e que correu na 4 Vara da comarca de Lisboa, com fundamento em que ele, relativamente a mesma questão fundamental de direito, assenta sobre solução oposta a proferida no acordão deste mesmo Tribunal, de 27 de Janeiro de 1950, transitado em julgado, no Boletim do Ministerio da Justiça, n. 17, pagina 286.
O acordão recorrido a sombra da alinea c) do artigo 11 do Decreto n. 28 321, de 27 de Dezembro de 1937 e alinea a) do artigo 166 do Decreto n. 45266, de 23 de Setembro de 1963, que regulamentaram respectivamente as Leis ns. 1884, de 16 de Março de 1935, e 2115, de 18 de Junho de 1962, concedeu o despejo dos segundo e terceiro andares ocupados pela "A", a titulo de arrendataria desde 19 de Outubro de 1937, do predio sito em Lisboa e Largo de São Domingos, ns. 14 e 15-B, e nas Escadinhas da Barroca, ns. 2 a 4, requerido pela proprietaria, B, que o comprou por escritura publica de 26 de Janeiro de 1960 e do primeiro andar fora arrendataria desde 10 de Julho de 1963 a Ordem dos Advogados.
O acordão oferecido em oposição de 27 de Janeiro de 1950, certificado a folhas 8 a 10, ao abrigo da alinea b) do artigo 16 da Lei n. 1884, não decretou o despejo requerido pela Caixa Sindical de Previdencia dos Tipografos, Litografos e Oficios Correlativos, proprietaria do predio, onde so depois instalou a sede dos seus serviços sociais, no primeiro andar, contra os subarrendatarios dos terceiro e quarto andares, que lhes foram sublocados pelo arrendatario, em virtude da regalia conferida naquele preceito legal não e de conceder aos arrendamentos anteriores a compra do predio pelas instituições de previdencia.
O acordão da Secção de 29 de Outubro de 1965, a folhas 23 a 25, decidiu que os acordãos foram proferidos no dominio da mesma legislação, no conceito do n. 2 do artigo 763 do Codigo de Processo Civil, e que existe oposição sobre a mesma questão fundamental de direito.
O Ministerio Publico no seu parecer de folhas 39 e
40 pronuncia-se no sentido de que se deve tirar assento nos termos seguintes:
"Mantem-se a regalia mencionada no artigo 166, n. 1, alinea a), do Decreto n. 45266, de 23 de Setembro de 1963, ainda que o arrendamento seja anterior a aquisição do predio pelas Caixas sindicais de previdencia".
Cumpre decidir:
Existe, com efeito, oposição entre os dois julgados sobre a mesma questão fundamental de direito, compra do predio pela Instituição de Previdencia quando nele se ache instalada no tocante ao exercicio da actuação da regalia conferida nos preceitos legais atras citados.
Assim o acordão recorrido decretou o despejo do arrendatario anterior a aquisição do predio, mas o acordão oferecido em oposição não decretou o despejo com o fundamento de que a mesma regalia, conferida nos citados preceitos, não e de conceder aos arrendamentos anteriores a compra do predio.
Os acordãos embora proferidos não na vigencia do mesmo diploma legal foram, contudo, no dominio da mesma legislação, em harmonia com o conceito insito no n. 2 do artigo 764 do Codigo de Processo Civil.
Pois que o principio legislativo que vigorava, aquando do acordão opositor, consignado na alinea c) do artigo 11 do Decreto n. 28321, concedendo as Caixas de Previdencia a regalia de "despedir no fim do arrendamento, quando instalados em edificio proprio, qualquer dos seus inquilinos, se carecerem da parte por eles ocupada para as suas instalações", era o mesmo que o proclamado no Regulamento Geral das Caixas Sindicais da Previdencia aprovado pelo Decreto n. 45266, de 23 de Setembro de 1963, na alinea a) do artigo 166, em cumprimento ao disposto na Base XXXIII da Lei n. 2115, onde mais explicitamente se concretizou e alargou o ambito da regalia "para as suas instalações e serviços".
A Lei n. 1884 reconheceu instituições de previdencia, entre outras, as Caixas de reforma ou de previdencia, de 2 categoria (n. 2 do artigo 1 e seu paragrafo 2) a quem concedeu a regalia contida na alinea b) do artigo 16 seguinte:
"Despedir no fim do arrendamento, quando instaladas em edificio proprio, qualquer dos seus inquilinos, se carecerem da parte por eles ocupada para as suas instalações".
Na alinea c) do artigo 11 do Decreto n. 28321, que regulamentou a Lei n. 1884, repetiu-se ipsis verbis a regalia inserida na Lei n. 1884 de que disfrutam as Caixas de reforma ou de previdencia.
A Lei n. 1884 foi revogada pela Lei n. 2115, que manteve a classificação de 2 categoria das Caixas de reforma ou de previdencia (n. 3 da Base III) e as que estavam então constituidas continuaram a reger-se pela legislação complementar da Lei n. 1884 em tudo o que não contrarie as disposições deste novo diploma (n. 2 da Base XXXII).
No Decreto n. 45266, que regulamentou a Lei n. 2115, dando cumprimento ao disposto na Base XXXIII, destinado a regulamentar a estrutura, funcionamento e esquemas de beneficios das caixas sindicais de previdencia nas tres especies fundamentais que segundo aquela Lei podem revestir; caixas de previdencia e abono de familia, caixas de pensões e caixas de seguros, a alinea a) do n. I do artigo 166 atribui as caixas sindicais de previdencia a regalia de "despedir no fim do arrendamento, quando instalados em edificio proprio, qualquer dos seus inquilinos, se necessitarem da parte por eles ocupada para as suas instalações ou serviços".
Posteriormente as instituições previstas no n. 3 da Base III da Lei n. 2115, caixas reforma ou previdencia, destinadas a proteger os beneficiarios e os seus familiares na invalidez, na velhice e por morte, foram directamente regulamentadas no Decreto n. 46548, de 23 de Setembro de 1965, que expressamente revogou o Decreto n. 28321, que regulamentou a Lei n. 1884, que passou a nele englobar as que foram constituidas pela Lei n. 1884 e que por esta Lei continuaram a reger-se pela Legislação complementar em tudo o que não contrarie as disposições da Lei n. 2115.
E neste Decreto n. 46548 se volta a inserir na alinea a) do seu artigo 119 a mesma regalia:
"despedir no fim do arrendamento, quando instalados em edificio proprio, qualquer dos seus inquilinos, se necessitarem da parte por eles ocupada para as suas instalações ou serviços".
Todos estes diplomas reconhecem as caixas de previdencia, quando instalados em edificio proprio, o direito de despedir, no fim do arrendamento, qualquer dos seus inquilinos, se necessitarem da parte por eles ocupada para as suas instalações, e depois ao Decreto n. 45226 ainda tambem para os seus serviços.
Os pressupostos legais determinantes ao exercicio da regalia são: ser proprietario do predio e nele se achar instalado e necessitar da parte ocupada por qualquer dos inquilinos para as suas instalações ou para os seus serviços.
A lei curou de acautelar os interesses das caixas sindicais de previdencia no tocante as instalações e de seus serviços, sem entraves de qualquer natureza a esse desiderato, logo que ocorram os indispensaveis pressupostos legais acima referidos.
A movimentação da regalia e de livre escolha, recai em qualquer inquilino, sendo, por isso, indiferente, que ela seja anterior ou posterior a aquisição do predio, situações essas completamente irrelevantes ao exercicio e reconhecimento do direito.
E esta a interpretação que imediatamente se colhe atraves do elemento gramatical, - que parece não oferecer duvida seria -, corroborada pelo elemento logico explicito na ratio legis, no fim visado pela lei, obter instalação para a instituição e ainda para os seus serviços no predio de que seja proprietaria e ocupe.
A tese que o acordão de 1950, oferecido em oposição, adoptou, negando o exercicio da regalia de despedir o inquilino com arrendamento anterior a aquisição do predio, apoiado nos direitos do arrendatario, em sa logica, deve ser extensivo ao arrendatario posterior a aquisição.
Não se concebe que sob a egide do mesmo principio os arrendatarios anteriores não possam ser despedidos mas possam ser ja os posteriores a compra do predio, uma vez que uns e outros são arrendatarios e são igualmente tratados pela lei.
Não se apreende com facilidade, pelo que vem ponderado, a distinção exarada no citado acordão, tanto mais que perante a regra consignada na Resolução de 28 de Agosto de 1776 ubi lex non distinguit, nec nos distinguere debemus, o interprete não deve distinguir.
Prevale, desta sorte, a interpretação firmada no acordão recorrido, que se mantem provimento ao recurso com custas a cargo da recorrente, e fixam o assento seguinte:
"As Caixas de Previdencia, instaladas em edificio proprio, gozam do direito de despedir os seus inquilinos quando necessitem da parte por estes ocupada mesmo que tenham adquirido o predio depois do arrendamento".


Lisboa, 11 de Novembro de 1966

Torres Paulo (Relator) - J. Santos Carvalho Junior - Oliveira Carvalho - Eduardo Correia Guedes - Joaquim de Melo - Gonçalves Pereira.
Ludovico da Costa (Com a declaração de que votei o acordão, não apenas pelas razões deste, como ainda porque, ao contrario do afirmado no acordão oposto, o despedimento facultado pelas leis especiais em referencia de nenhum modo "posterga direitos adquiridos" por inquilinos anteriores, dado que nenhum estava subjectivado no sentido de verem, por vontade unilateral deles, forçadamente prorrogado o arrendamento.
E que o respectivo contrato continua a ser, em principio, de duração temporaria (artigos 1 a 29 do Decreto n. 5411). Simplesmente, o exercicio da faculdade de o senhorio despedir o inquilino no termo contratual esta, ainda que desde 1919, transitoriamente suspenso (artigos 108 e 117 do mesmo Decreto, e 5 e 13 da Lei n. 1 663 em ligação com o Decreto n. 14630, de 1927).

Portanto, esta situação emerge unicamente da lei e para subsistir enquanto essa mesma lei continuar em vigor. Dai que se trata de uma restrição meramente legal, que, por livremente revogavel, não subjectiva nenhum direito a ser eternizada a mesma situação.
Ora, as Leis ns. 1884 e 2115 derrogaram ou levantaram aquela suspensão no caso especial que contemplam).
Tem voto de conformidade dos excelentissimos Conselheiros: Bernardes de Miranda, Albuquerque Rocha,
Teixeira de Andrade, Francisco Soares, Vera Jardim, Lopes Cardoso e Jose Cabral, que não assinam por não estarem presentes.
Torres Paulo.