Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
21116/18.1T8LSB.L1.S1
Nº Convencional: 4.ª SECÇÃO
Relator: RAMALHO PINTO
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO
SUBORDINAÇÃO JURÍDICA
PRESUNÇÃO DE LABORALIDADE
MÉTODO INDICIÁRIO
ÓNUS DA PROVA
Data do Acordão: 06/01/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA.
Sumário :

I- Tendo a relação entre as partes tido início em Outubro de 2001 é inaplicável a presunção de laboralidade contida no artigo 12º do Código do Trabalho, pelo que há que recorrer ao método indiciário ou tipológico a fim de se aferir se entre as partes vigorou um contrato de trabalho ou um contrato de prestação de serviço;

II- Nestes casos incumbe ao trabalhador, nos termos do artº 342º, n.º 1, do Código Civil, provar os factos que permitam concluir que a sua prestação foi executada em regime de subordinação jurídica;

III. Existindo indícios, como sejam o pagamento em função do resultado da actividade efectuada, e se o mesmo existisse, a não necessidade de justificar as ausências da Autora, a não demonstração de sujeição a horário de trabalho e ao poder disciplinar da Ré, que não permitem estabelecer, com a necessária segurança e certeza, que a Autora exerceu a sua actividade sob a autoridade, direcção e fiscalização da Ré, deve-se se considerar que a primeira não logrou provar que estava ligada à segunda por contrato de trabalho.

Decisão Texto Integral:

Processo 21116/18.1T8LSB.L1.S1

Revista

12/22

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:


AA veio propor a presente ação declarativa de condenação com processo comum contra MEDIAMONITOR - SOFTWARE E INFORMAÇÃO PARA COMUNICAÇÃO SOCIAL, LDª, pedindo o seguinte:
“Nestes termos e nos demais de direito, deve a presente ação ser julgada procedente por provada e, em consequência:
1) Ser reconhecido como contrato individual de trabalho de duração indeterminada o contrato celebrado entre a Autora e a Ré, cuja execução decorreu durante 15 anos e 11 meses, entre o início de Outubro de 2001 e o final de Setembro de 2017;
2) Serem repostos os direitos da Autora inerentes a tal reconhecimento, designadamente como beneficiária da Segurança Social e na qualidade de trabalhadora subordinada, com a consequente reposição da sua situação contributiva desde o mês de Outubro de 2001 até ao mês de Setembro de 2017, a cargo da Ré;
3)  Ser a Ré condenada no pagamento das retribuições pelas férias gozadas no período de tempo compreendido entre os anos de 2002 e 2012, no montante total de € 9.900;
4) Ser a Ré condenada no pagamento de 1/2 das retribuições relativas às férias gozadas nos anos de 2013 e 2017, no valor total de € 2.250,00;
5) Ser a Ré condenada no pagamento dos subsídios de férias referentes aos 16 períodos de férias gozadas nos anos de 2002 a 2017, o que totaliza € 14.400;
6) Ser a Ré condenada no pagamento dos 15 subsídios de Natal, referentes aos Natais dos anos de 2002 a 2016, o que ascende a € 13.500;
7) Ser a Ré condenada no pagamento dos proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal relativos ao ano de 2017, no montante de € 2.025;
8) Ser declarado ilícito o despedimento movido pela Ré, sendo esta consequentemente condenada no pagamento da indemnização em substituição da reintegração em montante a fixar entre € 7.162,50 e € 21.487,50;
9) Ser a Ré condenada, a título de compensação pelo despedimento ilícito, no pagamento das retribuições que a Autora deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial; e

Quantias estas acrescidas de juros de mora vencidos e vincendos, até efetivo e integral pagamento.

Alegou, em síntese e tal como consta do acórdão recorrido:
No mês de Outubro de 2001 estabeleceu com a Ré uma relação de trabalho subordinado e sempre trabalhou sob as ordens, direcção e fiscalização da mesma.
Nunca recebeu qualquer pagamento por parte da Ré relativo a retribuições de férias gozadas, e subsídios de férias e subsídios de Natal.
Desde o ano de 2013 em diante passou a ser prática da Ré entregar anualmente à Autora, aquando do respectivo gozo de férias, uma quantia monetária correspondente à retribuição por 15 dias de trabalho.
No dia 29/09/2017, a Ré comunicou verbalmente à Autora que a mesma estava despedida e que deixaria de trabalhar para si a partir dessa data.
Gozou anualmente férias, ao longo de 16 anos, mas não recebeu qualquer retribuição.

Foi despedida sem justa causa, pelo que tem direito a indemnização por antiguidade e às retribuições vencidas e vincendas até ao transito em julgado da decisão

A Ré apresentou contestação,alegando que celebrou com a Autora um contrato de prestação de serviços, nunca existindo qualquer vínculo contratual de natureza laboral, não tendo existindo qualquer despedimento ilícito e não tendo a Autora direito aos créditos reclamados.

Pede a improcedência da ação, com a sua absolvição do pedido.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença, decidindo do seguinte modo:
“Face ao exposto, decide-se:
A) Julgar verificada a exceção dilatória da incompetência do Tribunal para conhecer do pedido consistente em «serem repostos os direitos da Autora inerentes a tal reconhecimento, designadamente como beneficiária da Segurança Social e na qualidade de trabalhadora subordinada, com a consequente reposição da sua situação contributiva desde o mês de Outubro de 2001 até ao mês de Setembro de 2017, a cargo da Ré», e declarar este Juízo de Trabalho de Lisboa do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa absolutamente incompetente, em razão da matéria, para conhecer deste pedido;
B) Julgar-se parcialmente procedente a presente ação interposta pela Autora AA contra a Ré MEDIAMONITOR - SOFTWARE E INFORMAÇÃO PARA COMUNICAÇÃO SOCIAL, LDA e, consequentemente, mais se decide:
1) Reconhecer e qualificar como contrato de trabalho a relação jurídica que existiu entre a Autora e a Ré desde Outubro de 2001 [3j;
2) Declarar a ilicitude do despedimento da Autora promovido pela Ré em 30/09/2017;
3) Condenar a Ré a pagar à Autora uma indemnização em substituição da reintegração, correspondente a 35 (trinta e cinco dias) de retribuição de base, equivalente ao montante total de € 932,05 (novecentos e trinta e dois euros e cinco cêntimos), por cada ano de antiguidade ou fração, contada desde 31/10/2001 até à data do trânsito em julgado da presente sentença, ou do acórdão que eventualmente e em definitivo confirmar a ilicitude do despedimento, a qual na presente data (06/03/2019) atinge o valor de € 16.160,83 (dezasseis mil cento e sessenta euros e oitenta e três cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos desde a data da presente sentença até ao integral e efetivo pagamento, calculados à taxa legal de 4% ou a outra que vier a ser legalmente fixada;
4) Condenar a Ré a pagar à Autora as retribuições [incluindo o montante do ordenado base (€ 799,04), e também os respetivos subsídios de férias e de natal] vencidas desde 25/08/2018 até à data do trânsito em julgado da presente sentença ou, sendo a mesma objeto de recurso, do acórdão.”

A Ré interpôs recurso de apelação, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa proferido decisão singular no sentido de julgar “procedente o recurso de Apelação da Ré, com a consequente revogação da sentença da 1ª instância.”

A Autora reclamou para a conferencia, que proferiu acórdão cuja parte dispositiva transcrevemos:
Por todo o exposto, nos termos dos artigos 87.°, número 1, do Código do Processo do Trabalho e 656.° e 663.° do Novo Código de Processo Civil, acorda-se, em conferência, neste Tribunal da Relação de Lisboa, em confirmar a Decisão Sumária proferida pelo relator da presente Apelação, pelos fundamentos expostos, revogando-se, nessa medida, a sentença recorrida e absolvendo-se a Ré MEDIAMONITOR - SOFTWARE E INFORMAÇÃO PARA COMUNICAÇÃO SOCIAL, LDA de todos os pedidos contra ela formulados pela Autora AA.

Custas a cargo da Reclamante - artigo 527.°, número 1, do NCPC”.

Inconformada, a Autora interpôs o presente recurso de revista, apresentando as seguintes conclusões:

1. A Recorrente interpõe o presente Recurso do douto Acórdão de fls…. proferido pela Veneranda Relação de Lisboa, que julgou a Apelação procedente, e, em consequência, revogou a douta Sentença da 1.ª Instância e absolveu a ora Recorrida, ali Apelante, do pedido, porquanto entende a Recorrente que, contrariamente ao decidido pelo Tribunal a quo, aquela douta Sentença procedeu à correcta aplicação da lei substantiva e à adequada subsunção dos factos ao direito.

2. No caso dos autos, está em causa a qualificação de uma relação jurídica estabelecida entre as partes, desde Outubro de 2001 a 30 de Setembro de 2017, aplicando-se in casu o Regime Jurídico do Contrato de Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49.408, de 24 de Novembro de 1969 (LCT), anterior, portanto, à consagração da presunção de laboralidade.

3. Em conformidade, na esteira do entendimento perfilhado pelo Supremo Tribunal de Justiça, dever-se-á recorrer, no caso vertente, ao método tipológico, recolhendo, conferindo e interpretando os indícios susceptíveis de permitir, casuisticamente, uma indagação de comportamentos reconduzíveis a um contrato de trabalho (Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26-10-2017, processo n.º 1175/14.7TTLSB.L1.S1, acessível em www.dgsi.pt).

4. Assim, analisando os elementos caracterizadores da relação jurídica em apreço, conclui-se que os mesmos são subsumíveis a um contrato de trabalho.

5. Desde logo, o local em que a actividade da Recorrente de visionadora era realizada e que os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pela Recorrente nessa actividade pertenciam à Recorrida (factos provados n.ºs 11, 12 e 15).

6. A actividade da Recorrente, ao longo dos 16 anos de vigência da relação contratual em análise, sempre consistiu no visionamento de pacotes de anúncios de publicidade de emissões de estações de rádio, no Departamento de Rádio da Recorrida (factos provados n.ºs 3, 4 e 5).

7. Actividade que a Recorrente prestou de forma permanente à Recorrida e que se afigurou essencial ao funcionamento da Recorrida.

8. Nos presentes autos, resultou ainda provado que, inicialmente, a Recorrente tinha de observar um horário de trabalho, distribuído de Segunda a Sexta-feira, com hora de início e termo, sendo que, a partir de 2006/2007, a Recorrida definiu um horário de trabalho de cinco horas diárias para a realização da actividade de visionamento e registo de pacotes e, a partir daqui, a Recorrente, podia realizar esta actividade consoante a sua disponibilidade, mas mantendo a obrigação de que teria de ter terminado a actividade até determinada hora/período (factos provados n.ºs 9, 39, 40, 41 e 42).

9. Ademais, resultou provado nos autos que as ausências da Recorrente ficavam registadas num sistema de controlo de entradas e saídas das instalações da Recorrida, com recurso a impressão digital, não recebendo a Recorrente a retribuição correspondente ao período da sua ausência (factos provados n.ºs 16 e 17).

10. Por outro lado, ficou demonstrado que a Recorrente recebia uma quantia fixa por dia de trabalho, independentemente do número e da natureza das tarefas que lhe fossem atribuídas diariamente.

11. Com efeito, o visionamento de um pacote correspondia, normalmente, a um dia de trabalho e, portanto, a uma determinada quantia pecuniária fixa, previamente determinada (factos provados n.ºs 6 e 7), pelo que, desde que fosse trabalhar, a Recorrente recebia sempre o mesmo valor diário.

12. De notar ainda que, embora a retribuição paga à Recorrente fosse determinada por dia de trabalho, certo é que a mesma era, sempre, paga no final de cada mês, inicialmente no último dia de cada mês e, a partir de 2007, entre os dias 25 e 29 de cada mês.

13. Por fim, da análise dos recibos emitidos pela Recorrente à Recorrida no decurso da relação jurídica sub judice, concluiu-se que a Recorrente foi, ao longo de todos esses anos, economicamente dependente da Recorrida.

14. A par dos sobreditos indícios de subordinação jurídica, aluda-se ainda ao facto de a Recorrente receber diariamente instruções e ordens directas sobre a forma de execução e disciplina do trabalho, que lhe era transmitidas por pessoas que ocupavam posições de chefia, na estrutura organizativa da Recorrida, e que a Recorrente sempre acatou, por considerar que às mesmas devia obediência (factos provados n.ºs 18, 19, 20, 21, 22, 23, 32 e 33).

15. Acresce frisar que o trabalho prestado pela Recorrente não era, na verdade, o resultado final que a Recorrida apresentava aos seus clientes, porquanto o mesmo era fiscalizado, revisto e, por vezes, corrigido pelo Coordenador do Departamento de Rádio antes de ser entregue aos clientes da Recorrida.

16. Sendo certo que, perante a ocorrência de erros, o Coordenador advertia a Recorrente para que os mesmos não fossem repetidos.

17. Do exposto resulta, assim, que a Recorrente estava, completamente, integrada na estrutura organizativa e de funcionamento da Recorrida.

18. Tudo visto, e analisados globalmente todos os indícios acima explanados, dúvidas não podem restar de que estamos perante um contrato de trabalho, uma vez que encontram-se preenchidos in casu os aspectos essenciais caracterizadores daquele tipo contratual, na esteira da definição contida no artigo 1.º da L.C.T.

19. Por conseguinte, atenta a factualidade considerada assente, decidiu bem o Tribunal de 1.ª Instância ao reconhecer e qualificar como contrato de trabalho a relação jurídica que existiu entre a Recorrida e a Recorrente entre Outubro de 2001 e 30 de Setembro de 2017, a qual, por isso, não merecia qualquer censura ou reparo.

20. Em conformidade, andou mal o Tribunal a quo no Acórdão recorrido, porquanto, atento o exposto, deveria ter confirmado a douta Sentença da 1.ª Instância, que julgou a presente acção procedente e, em consequência, condenou a Recorrida no pedido, e não, como fez, revogar tal decisão.

21. Consequentemente, deverá, salvo melhor opinião, revogar-se o douto Acórdão recorrido, que deverá ser substituído por douto Acórdão que julgue a presente acção procedente, reconhecendo e qualificando como contrato de trabalho a relação jurídica que existiu entre a Recorrida e a Recorrente, entre Outubro de 2001 e 30 de Setembro de 2017, com as demais consequências legais, na esteira do decidido pelo Tribunal de 1.ª Instância.

O douto Acórdão sob censura violou, entre outros, o seguinte preceito legal:  Artigo 58.º da C.R.P.

Não foram apresentadas contra-alegações.

A Exmª Procuradora Geral Ajunta emitiu parecer, que concluiu da seguinte forma:

“Afigura-se-nos no entanto, que não sendo completamente nítida a caracterização de um ou outro tipo de contrato, nem por isso é impeditiva a conclusão em casos como o presente, da caracterização de contrato de trabalho subordinado, quando não se tem a seu favor a presunção.

O contrato de trabalho nos termos do art.º 1152.º do C.Civil é “aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob a autoridade e direcção desta, noção esta acolhida no art.º 1.º do Regime do Contrato de Trabalho aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49408 de 24/11 de 1969 e mantida nos seus aspectos essenciais no art.º 10.º do CT de 2003 e art.º 11.º do CT de 2009.

Centrando-se a distinção de ambos os contratos no objecto do contrato e no relacionamento entre as partes cremos que no caso em apreço atento designadamente o local onde eram prestada as funções da Autora, os instrumentos utilizados, as orientações recebidas para execução do trabalho, o controle das presenças etc, tudo elementos que revelam estar a Autora integrada na estrutura organizativa da Ré, a duração do vínculo – 16 anos – a permanência quase diária da Autora na Ré, o facto desta  ter proposto à Autora para exercer a mesma actividade mediante a celebração de um contrato de trabalho, são reveladores salvo o devido respeito por opinião contrária de que a Autora não prestava o trabalho com total autonomia.

E mais se nos afigura que tais elementos na ponderação global que se impõe fazer, sobrelevam os elementos caracterizadores de uma relação de trabalho autónoma, para efeitos de definição do contrato em causa.

Por conseguinte é parecer do Ministério Público junto do Supremo Tribunal de Justiça que o recurso de revista deve ser procedente”.

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Definindo-se o âmbito do recurso pelas suas conclusões, temos, como única questão em discussão, a de saber se deve reconhecida e qualificada como contrato de trabalho a relação jurídica que existiu entre as partes no período de Outubro de 2001 a 30 de Setembro de 2017.

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Estão fixados os seguintes factos:
-FACTOS PROVADOS:
1) A Ré MEDIAMONITOR - SOFTWARE E INFORMAÇÃO PARA COMUNICAÇÃO SOCIAL, LDA tem por objeto a recolha, tratamento e comercialização de informação, software e serviços para a comunicação social.
2) No mês de Outubro de 2001, a Autora AA e a Ré ajustaram verbalmente.
3) Que aquela se obrigava a efetuar para esta o visionamento de pacotes de anúncios de publicidade de emissões de estações de rádio.
4) Competindo-lhe verificar a correta difusão desses anúncios, procedendo para o efeito à respetiva auscultação.
5) E devendo realizar um registo do pacote visionado, elaborado em computador e num programa específico, do qual deviam constar, relativamente a cada anúncio, as horas de início e termo, se tinha passado de forma integral ou estava “cortado”, se tinha problemas de som e respetiva marca, e do qual deviam constar toda a “linha de programação”, nome do animador, informação de trânsito e meteorologia.
6) Como contrapartida desta atividade realizada pela Autora, a Ré pagava-lhe uma quantia de por cada pacote, cujo valor inicial era de cerca de € 15,00 e que foi aumentando até, por volta do ano de 2006/2007, passar a ser de € 32,80.
7) Por força do ajuste referido em 2), a Autora devia visionar um pacote por cada dia.
8) E, aquando desse ajuste, foi comunicado pela Ré à Autora que se não entregasse o registo do pacote/dia não recebia qualquer valor.
9) Inicialmente, a Autora realizava a atividade entre as 20 horas e as 2 horas do dia seguinte, de segunda a sexta-feira, devendo o registo estar pronto até às referidas 2 horas de manhã.
10) A Autora também realizava a atividade ao fim de semana, quando era preciso substituir alguém e tinha disponibilidade para isso.
11) A Autora exerceu sempre as suas funções relativas à referida atividade nas instalações da Ré, situadas na Rua Padre Luís Aparício, n.° 10-A, em Lisboa.
12) A Autora prestou sempre a atividade no departamento de rádio da Ré.
13) Sendo designada como “visionadora” de rádio.
14) A Autora nunca recebeu qualquer pagamento por parte da Ré a título de subsídios férias e de Natal.
15) Todos os equipamentos, materiais e utensílios usados pela Autora no desempenho das suas funções relativas à referida atividade pertenciam à Ré e eram-lhe disponibilizados para esse efeito, nomeadamente equipamento e mobiliário de escritório, e equipamento informático.
16) A partir de finais de 2011, por determinação da Ré, para entrar e sair das instalações referidas em 11), a Autora tinha que apor a sua impressão digital em equipamento específico (sistema “...’).
17) Tal como tinha que fazer qualquer trabalhador do quadro da Ré.
18) No departamento de rádio da Ré existia equipa de “visionadores” para os dias de semana (2.a a 6.a), cerca de 5, da qual fazia parte a Autora, e uma equipa de “visionadores” para o fim-de-semana, cerca de 3/4, não sendo nenhum do “quadro” da Ré.
19) Existia um coordenador e um adjunto do coordenador, que nos últimos anos eram BB e CC respetivamente, os quais pertenciam ao quadro da Ré,
20) E existia um diretor do departamento, que nos últimos anos era DD, que também pertencia ao quadro da Ré.
21) O referido coordenador distribuía os pacotes pelos “visionadores”, verificava a correção dos registos elaborados pelos mesmos, corrigia os erros que esses registos continham, e informava-os sobre esses erros, para que os mesmos não se repetissem,
22) E também alertava-os para novos aspetos e para alterações que os “visionadores” tinham que ter atenção na realização da atividade.
23) A Autora aceitava as informações referidas em 21) e os alertas referidos em 22).
24) Desde o ano de 2013 em diante, a Ré pagava anualmente à Autora, no mês de Julho, e para além da contrapartida referida em 6), uma quantia monetária correspondente a um total 10 dias vezes o valor de € 32,80.
25) Durante o mês de Setembro de 2017, a Ré propôs à Autora a celebração de um contrato de trabalho.
26) Proposta que teria que ser aceite ao final do referido mês de Setembro.
27) A Autora não aceitou tal proposta.
28) Nesta sequência, no dia 29 de Setembro de 2017, a Ré comunicou verbalmente à Autora que não podia continuar a prestar-lhe a sua atividade sem a celebração de um contrato de trabalho.
29) Pelo que, a partir de 30 de Setembro de 2017, inclusive, a Autora deixou de prestar a sua atividade para a Ré.
30) Para receber a contrapartida referida em 6), a Autora emitiu, normalmente mensalmente, em nome da Ré “recibo verdes”,
31) Não fazendo a Ré quaisquer contribuições para a Segurança Social relativamente aos valores que pagava à Autora.
32) A elaboração em computador e em programa específico e as menções referidas em 5) foram determinadas pela Ré.
33) Sendo que, quanto à forma de realização da auscultação e à ordem do registo, a Autora podia atuar de forma que entendesse.
34) Sem infraestrutura tecnológica existente nas instalações referidas em 11), composta por estações de captação, servidores informáticos, sistemas avançados dê captação de som e imagem, rede de computação e redundância de comunicações, não era possível à Autora exercer a sua atividade noutro local.
35) E não era possível à Autora, económica e tecnicamente, ter essas infraestruturas que existiam naquelas instalações.
36) Até finais de 2011, a Autora não estava sujeita a qualquer sistema de registo das horas em que prestava a atividade.
37) O sistema referido em 16) é o sistema utilizado pela Ré para registar as horas de trabalho dos trabalhadores do seu quadro.
38) A atividade de visionamento e registo dos pacotes era diária, ocorrendo todos os dias de semana.
39) A hora a que o registo tinha que estar pronto referida em 9) foi determinada pela Ré.
40)  A partir de ano de 2006/2007, a Ré definiu um período de 5 horas para a realização da atividade de visionamento e registo de pacotes e a partir daqui a Autora podia realizar esta atividade consoante a sua disponibilidade e às horas que entendesse, entrando e saindo das instalações da Ré a quantidade de vezes que quisesse.
41) Pelo menos desde esta data, a Ré não indicava à Autora qualquer período concreto para realizar a atividade.
42) Mas a mesma tinha de estar terminada antes do período da manhã do dia seguinte.
43) A Ré não marcava faltas à Autora.
44) A Autora comunicava à Ré as ausências para que esta pudesse arranjar pessoa para a substituir.
45) A Autora não tinha que apresentar qualquer justificação à Ré pelas suas ausências.
46) A proposta referida em 25) consistia na celebração de um contrato de trabalho com um horário de segunda-feira a sexta-feira, com o cumprimento de um horário de 7 horas e 45 minutos, a retribuição mensal de € 700,00, acrescidos de subsídio de transporte, subsídio de refeição, férias, subsídio de férias e subsídio de natal.
47) Apesar do referido em 7), no caso de, no mesmo dia, a Autora fizesse a visionamento de um pacote atribuído a outro colega “visionado” que tivesse faltado, receberia também o valor da contrapartida por este pacote.
48) Ou receberia metade do valor do mesmo, no caso de o visionamento ser realizado a “meias” com outro colega “visionador”.
49) Relativamente à atividade que prestou para a Ré, a Autora emitiu em nome daquela, pelo menos, os “recibos verdes” que a seguir se discriminam, contendo as seguintes datas de emissão e os seguintes valores brutos (sem retenções na fonte e/ou IVA), a título de honorários de “prestação de serviços”:
Em data indeterminada do ano de 2002, na importância de € 687,50; Em 31/08/2002, na importância de € 1.018,00; Em “31/09/2002’, na importância de € 473,00; Em “31/09/2002’, na importância de € 860,00; Em “31/09/2002’, na importância de € 475,00; Em 31/10/2002, na importância de € 582,50; Em 31/10/2002, na importância de € 989,00; Em 30/11/2002, na importância de € 473,00; Em 30/11/2002, na importância de € 645,00; Em 30/12/2002, na importância de € 430,00; Em 30/12/2002, na importância de € 863,00; E em 30/ 12/2002, na importância de € 43,00;
Em 30/01/2003, na importância de € 909,00; Em data indeterminada mas ocorrida entre 30/01/2003 e 20/02/2003, na importância de € 64,50; Em 20/02/2003, na importância de € 129,00; Em 20/02/2003, na importância de € 493,00; Em 27/03/2003, na importância de € 600,00; Em 27/03/2003, na importância de € 172,00; Em 24/04/2003, na importância de € 670,00; Em 28/04/2003, na importância de € 561,50; Em 28/04/2003, na importância de € 172,00; Em 23/05/2003, na importância de € 670,00; Em 27/05/2003, na importância de € 724,50; Em 28/06/2003, na importância de € 784,50; Em 30/07/2003, na importância de € 653,75; Em 30/09/2003, na importância de € 524,50; Em 30/09/2003, na importância de € 494,50; Em 31/10/2003, na importância de € 750,75; Em 30/11/2003, na importância de € 703,00; Em 25/12/2003, na importância de € 1.000,00; E em 31/12/2003, na importância de € 613,00;
Em 30/01/2004, na     importância     de € 630,00;    Em 28/02/2004, na importância de € 765,00; Em 29/03/2004, na importância de € 600,00; Em 28/04/2004, na importância de € 600,00; Em 28/05/2004, na importância de € 630,00; Em 29/06/2004, na importância de € 720,00; Em 28/07/2004, na importância de € 555,00; Em 31/08/2004, na importância de € 793,00; Em 30/09/2004, na importância de € 600,00; Em 31/10/2004, na importância de € 600,00; Em 30/11/2004, na importância de € 540,00; E em 30/12/2004, na importância de € 630,00;
Em 30/01/2005, na importância de € 660,00; Em 28/02/2005, na importância de € 660,00; Em 31/03/2004, na importância de € 600,00; Em 29/04/2005, na importância de € 651,00; Em data indeterminada mas ocorrida entre 29/04/2005 e 29/07/2005, um na          importância de € 682,00 e outro na importância de € 762,00; Em 29/07/2005,      na importância de € 651,00; Em data indeterminada mas ocorrida entre 29/07/2005 e 30/09/2005, na importância de € 1.023,00; Em 30/09/2005 no valor de € 496,00; Em 31/10/2005, na importância de € 527,00; Em 30/11/2005, na importância de € 651,00; E em 31/12/2005, na importância de € 589,00;
Em 31/01/2006, na importância de € 713,00; Em 28/02/2006, na importância de € 743,00; Em 31/03/2006, na importância de € 620,00; Em 30/04/2006, na importância de € 651,00; Em 30/06/2006, na importância de € 620,00; Em 28/07/2006, na importância de € 992,00; Em 31/08/2006, na importância de € 735,00; Em 29/09/2006, na importância de € 453,500; Em 31/10/2006, na importância de € 682,00; Em 30/11/2006, na importância de € 682,00; E em 22/12/2006, na importância de € 558,00;
Em 26/01/2007, na importância de   € 740,50; Em 28/02/2007, na importância de € 619,00; Em 27/03/2007, na importância de € 574,00; Em 24/04/2007, na importância de € 681,00; Em 31/05/2007, na importância de € 756,00; Em 30/06/2007, na importância de € 641,50; Em 31/07/2004, na importância de € 1.127,75; Em 27/08/2007, na importância de € 706,25; Em 28/09/2007, na importância de € 582,50; Em 29/10/2007, na importância de € 610,50; Em 30/11/2007, na importância de € 683,75; E em 29/12/2007, na importância de € 686,50;
Em 28/01/2008, na importância de € 868,76; Em 27/02/2008, na importância de € 788,94; Em 31/03/2008, na importância de € 777,17; Em 28/04/2008, na importância de € 904,27; Em 26/05/2008, na importância de € 720,99; Em 26/06/2008, na importância de € 917,44; Em 31/07/2008, na importância de € 1.227,80; Em 28/08/2008, na importância de € 424,16; Em 29/09/2008, na importância de € 798,02; Em 28/10/2008, na importância de € 650,36; Em 26/11/2008, na importância de € 867,48; E em 31/12/2008, na importância de € 837,40;
Em 30/01/2009, na importância de € 805,88; Em 27/02/2009, na importância de € 930,08; Em 27/03/2008, na importância de € 825,45; E em 30/04/2008, na importância de € 921,87;
Em 26/01/2011, na importância de € 938,87; Em 28/02/2011, na importância de € 969,69; Em 28/03/2011, na importância de € 869,16; Em 28/04/2011, na importância de € 704,84; Em 27/05/2011, na importância de € 897,95; Em 28/06/2011, na importância de € 894,12; Em 27/07/2011, na importância de € 1.100,81; Em 24/08/2011, na importância de € 1.122,33; Em 23/09/2011, na importância de € 1.040,10; Em 26/10/2011, na importância de € 894,12; Em 26/11/2011, na importância de € 701,16; E em 20/12/2012, na importância de € 721,60;
Em 26/01/2012, na importância de € 787,20; Em 27/02/2012, na importância de € 820,00; Em 27/03/2012, na importância de € 721,60; Em 23/04/2012, na importância de € 828,20; Em 24/05/2012, na importância de € 732,53; Em 27/06/2012, na importância de € 707,00; Em 26/07/2012, na importância de € 1.178,20; Em 24/08/2012, na importância de € 668,00; Em 26/09/2012, na importância de € 1.062,80; Em 26/10/2012, na importância de € 795,40; Em 28/11/2012, na importância de € 820,00; E em 14/12/2012, na importância de € 754,40;
Em 26/01/2013, na importância de € 864,60; Em 27/02/2013, na importância de € 919,60; Em 26/03/2013, na importância de € 786,60; Em 24/04/2013, na importância de € 893,80; Em 27/05/2013, na importância de € 956,60; Em 26/06/2013, na importância de € 1.086,40; Em 24/07/2013, na importância de € 1.359,80; Em 26/08/2013, na importância de € 680,20; Em 29/10/2013, na importância de € 937,80; Em 29/10/2013, na importância de € 1.088,00; Em 25/11/2013, na importância de € 888,60; E em 18/12/2012, na importância de € 1.008,20;
Em 27/01/2014, na importância de € 1.095,00; Em 23/02/2014, na importância de € 1.020,80; Em 27/03/2014, na importância de € 922,40; Em 24/04/2014, na importância de € 931,60; Em 27/05/2014, na importância de € 856,80; Em 25/06/2014, na importância de € 856,80; Em 23/07/2014, na importância de € 1.359,00; Em 26/08/2014, na importância de € 630,00; Em 25/09/2014, na importância de € 756,80; Em 28/10/2014, na importância de € 1.041,00; Em 26/11/2014, na importância de € 898,80; E em 17/12/2014, na importância de € 856,80;
Em 27/01/2015, na importância de € 997,20; Em 23/02/2015, na importância de € 922,40; Em 24/03/2015, na importância de € 1.015,60; Em 24/04/2015, na importância de € 1.338,40; Em 25/05/2015, na importância de € 1.123,20; Em 24/06/2015, na importância de € 1.023,20; Em 27/07/2015, na importância de € 1.725,40; Em 25/08/2015, na importância de € 1.312,21; Em 28/09/2014, na importância de € 1.105,00; Em 27/10/2015, na importância de € 1.263,80; Em 25/11/2015, na importância de € 1.213,40; E em 16/12/2015, na importância de € 1.131,40;
Em 26/01/2016, na importância de € 1.156,00; Em 25/02/2016, na importância de € 964,40; Em 23/03/2016, na importância de € 796,40; Em 27/04/2016, na importância de € 820,00; Em 27/05/2016, na importância de € 721,60; Em 27/06/2016, na importância de € 885,60; Em 26/07/2016, na importância de € 1.066,00; Em 23/08/2016, na importância de € 943,00; Em 27/09/2016, na importância de € 738,00; Em 24/11/2016, na importância de € 787,20; Em 24/11/2016, na importância de € 787,20; E em 21/12/2014, na importância de € 1.148,00;
E em 26/01/2017, na importância de € 729,80; Em 23/02/2017, na importância de € 754,40; Em 23/03/2017, na importância de €656,00; Em 24/04/2017, na importância de € 828,20; Em 25/05/2017, na importância de € 836,40; Em 23/06/2017, na importância de € 738,00; Em 26/07/2017, na importância de € 1.115,20; Em 16/08/2017, na importância de € 582,20; Em 25/09/2014, na importância de € 746,20; E em 25/10/2017, na importância de € 205,00.
50) Para além dos referidos em 49), relativamente à atividade que prestou para a Ré, a Autora auferiu daquela: no ano de 2009, ainda mais o valor de € 6.870,43; e no ano de 2010, o valor de € 10.854,75.
51) Na data de 02/02/2004, a Autora celebrou um contrato de trabalho por termo indeterminado com a CINEMATECA PORTUGUESA - MUSEU DO CINEMA, para exercer funções de colaboração e apoio à ..., auferindo a retribuição mensal ilíquida de € 651,69 e sendo o período normal de trabalho de 25 horas semanais, distribuídas de segunda a sexta-feira, com início às 9 horas e finalização às 17 horas e 20 minutos, com intervalo para refeição de 90 minutos.
52) Contrato esse que manteve, pelo menos, até Agosto de 2018.
53) A Autora declarou, para efeitos de IRS, ter recebido da Cinemateca
(POR MANUALMENTE) valor de € 6.232,65; no ano de 2016, no valor de € 9.617,49; e no ano de 2017, no valor de € 10.522,54.
54) Nos anos de 2013, 2014 e 2015, a Autora não auferiu da referida Cinemateca Portuguesa quaisquer rendimentos da categoria A.
55) A Autora prestou a referida atividade à Ré pelo menos:
No ano de 2011, em 14 dias do mês de Novembro e em 25 dias do mês de Dezembro;
No ano de 2012, em 23 dias do mês de Janeiro, em 22 dias do mês de Fevereiro, em 28 dias do mês de Março, em 25 dias do mês de Abril, em 26 dias do mês de Maio, em 21 dias do mês de Junho, em 25 dias do mês de Julho, em 14 dias do mês de Agosto, em 25 dias do mês de Setembro, em 27 dias do mês de Outubro, em 27 dias do mês de Novembro e em 22 dias do mês de Dezembro;
No ano de 2013, em 27 dias do mês de Janeiro, em 22 dias do mês de Fevereiro, em 26 dias do mês de Março, em 23 dias do mês de Abril, em 25 dias do mês de Maio, em 24 dias do mês de Junho, em 18 dias do mês de Julho, em 24 dias do mês de Agosto, em 22 dias do mês de Setembro, em 29 dias do mês de Outubro, em 16 dias do mês de Novembro e em 27 dias do mês de Dezembro;
No ano de 2014, em 27 dias do mês de Janeiro, em 22 dias do mês de Fevereiro, em 24 dias do mês de Março, em 26 dias do mês de Abril, em 25 dias do mês de Maio, em 24 dias do mês de Junho, em 27 dias do mês de Julho, em 15 dias do mês de Agosto, em 20 dias do mês de Setembro, em 29 dias do mês de Outubro, em 26 dias do mês de Novembro e em 25 dias do mês de Dezembro;
No ano de 2015, em 27 dias do mês de Janeiro, em 24 dias do mês de Fevereiro, em 28 dias do mês de Março, em 28 dias do mês de Abril, em 29 dias do mês de Maio, em 30 dias do mês de Junho, em 30 dias do mês de Julho, em 16 dias do mês de Agosto, em 28 dias do mês de Setembro, em 30 dias do mês de Outubro, em 29 dias do mês de Novembro e em 30 dias do mês de Dezembro;
No ano de 2016, em 30 dias do mês de Janeiro, em 29 dias do mês de Fevereiro, em 28 dias do mês de Março, em 28 dias do mês de Abril, em 30 dias do mês de Maio, em 29 dias do mês de Junho, em 24 dias do mês de Julho, em 26 dias do mês de Agosto, em 19 dias do mês de Setembro, em 30 dias do mês de Outubro, em 27 dias do mês de Novembro e em 29 dias do mês de Dezembro;
E no ano de 2017, em 29 dias do mês de Janeiro, em 25 dias do mês de Fevereiro, em 27 dias do mês de Março, em 24 dias do mês de Abril, em 28 dias do
de Maio, em 27 dias do mês de Junho, em 21 dias do mês de Julho, em 14 dias
do mês de Agosto, e em 18 dias do mês de Setembro.
*
FACTOS NÃO PROVADOS

“Nos presentes autos, dos que foram alegados (e que não constituem conclusões e/ou conceitos de direito, e que têm interesse e relevância para a decisão da causa, consideram-se não provados os seguintes factos”:

a) A Ré exigiu que o ajuste referido em 2) se denominasse de prestação de serviços.

b) O valor da contrapartida referida em 6) ultimamente era no montante de € 40,00.

c) As horas das entradas e saídas diárias da Autora do seu local de trabalho, bem como as suas faltas, foram sempre fiscalizadas pela Ré.

d) Caso se atrasasse, competia a Autora contactar os responsáveis da Ré, dando conta da ocorrência.

e) Para além do referido em 21) e 22), o coordenador e/ ou o diretor de departamento davam indicações diárias e constantes à Autora.

f) A Autora indicava à Ré, na pessoa do coordenador, as datas em que pretendia gozar férias, ficando tal marcação sujeita a aprovação por parte da Ré.

g) Até ao ano de 2006/2007, a Ré não tinha qualquer interferência na definição do período de atividade da Autora, sendo esta que organizava e geria livremente o tempo que pretendia despender para a executar a mesma.

h) Em caso de ausência, a Autora devia coordenar com um colega "visionador" para que assegurasse a realização da sua atividade.

i) Nos meses de Outubro de 2001 a Julho de 2002, a Autora recebeu da Ré o valor mensal de € 900,00.

j) A Ré fiscalizava asfaltas da Autora.

k) A recusa referida em 27) deveu-se à duração de cada turno diário a realizar passar a ser superior a que ate então vinha vigorando e porque a Autora passaria a auferir um valor mensal liquido inferior ao ate então recebido,

l) E também porque ficaria desconsiderada a antiguidade da Autora como trabalhadora da Ré desde 2001.

m) Aquando do referido em 28), a Ré comunicou a Autora que estava despedida.

n) A recusa referida em 27) deveu-se a Autora não pretender celebrar um contrato de trabalho com a Ré, invocando que tinha um emprego e que isto seria sempre um part-time e também porque se iria casar e que deixava de ter a necessidade de acumular duas ocupações para fazer face as suas despesas.

x

Cumpre apreciar e decidir:

Tendo em conta as considerações acertada e incisivamente expendidas no Ac. da Rel. de Lisboa de 16/01/2008, in www.dgsi.pt, temos que  a questão da qualificação contratual é uma das que mais se discute nos nossos tribunais de trabalho, porque, efectivamente, na prática, é muitas vezes extremamente difícil estabelecer a fronteira entre as duas espécies contratuais que se caracterizam pela prestação de trabalho intelectual ou manual de uma pessoa em benefício de outra (contrato de trabalho / contrato de prestação de serviços).

Dos conceitos vazados nos artigos 1152º e 1154º do Código Civil decorre que as diferenças entre ambos são estabelecidas através, por um lado, da obrigatoriedade da retribuição (presente no contrato de trabalho, mas não necessariamente no contrato de prestação de serviços, embora na realidade também nele exista retribuição, na maior parte dos casos); por outro, na prestação objecto do contrato - uma obrigação de meios (actividade, no contrato de trabalho) ou de resultado (no contrato de prestação de serviços) - e, por último, na existência ou não de subordinação jurídica do prestador de trabalho ao respectivo credor.

Os dois primeiros elementos distintivos são pouco relevantes porque, por um lado, como se disse, serão actualmente muito raros os casos de contratos de prestação de serviços sem retribuição, face à total desadequação da gratuitidade do trabalho, no contexto de uma sociedade com as características da contemporânea; por outro lado, porque, mesmo quando o objecto da prestação é a actividade, em última análise, pretende-se sempre retirar dessa actividade uma utilidade, um resultado, que não é indiferente e, por outro lado ainda, em muitos contratos de prestação de serviços cuja qualificação não oferece quaisquer dúvidas, como seja, por exemplo, o estabelecido entre o médico e o seu paciente ou entre o advogado e o seu cliente, o que aquele tem de prestar é apenas a sua actividade, não o resultado, que é aleatório.

Decisivo para a distinção acaba, pois, por ser o elemento "subordinação jurídica" que consiste na circunstância de o prestador do trabalho desenvolver a sua actividade sob a autoridade e direcção do empregador, o que significa a possibilidade de o credor do trabalho determinar o modo, o tempo e o lugar da respectiva prestação. A prestação de trabalho nesses casos é heterodeterminada (pelo empregador), contrapondo-se ao trabalho autodeterminado em que, em princípio, cabe apenas ao próprio trabalhador a definição do modo, tempo e lugar da prestação. No trabalho heterodeterminado o grau de dependência do prestador do trabalho da autoridade e direcção do empregador pode ser maior ou menor, sobretudo no que se refere ao modo da prestação, diminuindo, sensivelmente à medida que aumenta a especificidade técnica exigida para o desempenho da actividade. O contrato de trabalho não é incompatível com a salvaguarda da autonomia técnica do trabalhador, sendo possível o desempenho de funções de elevada craveira técnica e intelectual em regime de subordinação jurídica.

A crescente flexibilização das formas de emprego tem contribuído para um aumento exponencial dos casos nebulosos, de fronteira, em que se torna por vezes extremamente difícil ajuizar se estamos perante uma situação de trabalho subordinado ou de trabalho autónomo.

É certo que estamos no domínio da autonomia da vontade, pelo que haverá que ter em conta o acordo das partes. Sendo, em regra, escassos os elementos que permitam identificar a vontade comum das partes no momento da celebração do contrato (frequentemente reduzida a uma expressão mínima) e dando ele início a uma relação duradoura, esses elementos terão de ser colhidos através do modo como as partes desenvolveram, na prática, essa relação

No caso concreto, e da análise dos factos fixados pelas instâncias, resulta que as partes iniciaram a sua relação em Outubro de 2001, mediante um contrato verbal, relação essa que veio a cessar em 29/09/2017, por iniciativa da Ré.

A jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem entendido de forma consolidada que, para efeitos da qualificação de uma relação jurídica entre as partes, deve atender-se ao regime jurídico que vigorava à data em que se iniciou/consolidou a relação em causa.

Neste sentido, entre outros o Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 04/07/2018 proferido no processo nº 1272/16.4T8SNT.L1. S1[1] no qual se decidiu que:

I. A jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça está consolidada de forma uniforme no sentido de que estando em causa a qualificação de uma relação jurídica estabelecida entre as partes, antes da entrada em vigor das alterações legislativas que estabeleceram o regime da presunção de laboralidade, e não se extraindo da matéria de facto provada que tenha ocorrido uma mudança na configuração dessa relação, há que aplicar o regime jurídico em vigor na data em que se estabeleceu a relação jurídica entre as partes.

II. A presunção de laboralidade é um meio facilitador da prova a favor de uma das partes, pelo que a solução de aplicar a lei vigente ao tempo em que se realiza a atividade probatória pode conduzir a um desequilíbrio no plano processual provocado pela impossibilidade de se ter previsto no momento em que a relação se estabeleceu quais as precauções ou diligências que deviam ter sido tomadas para assegurar os meios de prova, o que poderia conduzir à violação do direito a um processo equitativo e causar uma instabilidade indesejável em relações desde há muito constituídas.

III. Estando em causa uma relação jurídica estabelecida entre as partes em 2 de novembro de 1995, e não se extraindo da matéria de facto provada que as partes tivessem alterado os seus termos essenciais, à qualificação dessa relação aplica-se o regime jurídico do contrato individual de trabalho, anexo ao Decreto-Lei n.º 49.408 de 24 de novembro de 1969, não tendo aplicação as presunções previstas no artigo 12.º do Código do Trabalho de 2003 e de 2009.”.

In casu, tendo a relação sido estabelecida em Outubro de 2001 e não se extraindo da restante factualidade provada uma alteração dos termos essenciais de tal relação, consideramos, seguindo a referida jurisprudência, que, e tal como fizeram as instâncias, deve aplicar-se ao caso concreto o regime jurídico do contrato individual de trabalho, anexo ao Decreto-Lei n.º 49.408 de 24 de novembro de 1969 (LCT), não sendo, consequentemente, aplicáveis as presunções previstas nos artigos 12º do Código do Trabalho de 2003 e de 2009.

Assim, face à inaplicabilidade das referida presunções, há que recorrer ao método indiciário ou tipológico a fim de se aferir se entre as partes vigorou um contrato de trabalho ou um contrato de prestação de serviço, sem esquecer que incumbia à Autora, nos termos do artº 342º, nº 1, do Código Civil, provar os factos que permitam concluir que a sua prestação foi executada em regime de subordinação jurídica, por serem constitutivos do direito que invoca- Acórdão do STJ de 08/07/2020, proferido no processo n. º 4220/15.5T8VFX.L1. S1.

Ora, e como já se adiantou, o único critério incontroversamente diferenciador entre os dois tipos de contrato reside na subordinação jurídica, típica do contrato de trabalho, a qual implica uma posição de supremacia do empregador e uma correlativa posição de subordinação do trabalhador.

A autonomia ou subordinação é que permite, em última análise, estremar a locatio operis ou contrato de prestação de serviço da locatio operarum ou contrato de trabalho.

A este respeito é assaz esclarecedor o ensinamento de Galvão Teles (B.M.J. 83º,165):

"Promete‑se (no contrato de trabalho) a actividade na sua raiz, como  processo ou instrumento posto dentro  dos  limites mais  ou  menos  largos  à disposição da  outra  parte  para  a realização  dos  seus  fins,  não se  promete  este  ou  aquele efeito  a  alcançar  mediante  o emprego  de  esforço,  como  a transformação ou transporte de uma coisa.

Mas como se pode verdadeiramente saber se se  promete  o trabalho  ou  o  resultado?  Todo o trabalho conduz  a  algum resultado  e  este  não  existe sem aquele.  O único  critério legítimo  está  em averiguar se a actividade é ou não  prestada sob  a  direcção  da pessoa a quem ela aproveita,  que  dela  é credora."

Para Menezes  Cordeiro (Manual de Direito  do  Trabalho) verificam‑se   duas   diferenças  essenciais  entre   os   dois contratos:  na  prestação de serviços trata‑se de  proporcionar certo  resultado do trabalho, enquanto no contrato de  trabalho se  refere  o prestar uma actividade; e na definição  legal  do primeiro  contrato não há qualquer referência à  autoridade e  direcção  de outrem. Assim, e ainda segundo este  autor, o   critério   último  da  distinção  reside  na   sujeição   à autoridade e direcção de outrem.

A subordinação jurídica traduz-se no poder do empregador conformar, através de ordens, directivas e instruções, a prestação a que o trabalhador se obrigou; é ao credor que cabe programar, organizar e dirigir a actividade do devedor; a ele incumbe não apenas distribuir as tarefas a realizar, mas ainda definir como, quando, onde e com que meios as deve executar cada um dos trabalhadores.

Sendo a subordinação jurídica um conceito integrado por um conjunto de características reveladoras dos poderes de autoridade e direcção atribuídos à entidade patronal, a sua determinação há-de fazer-se através de uma maior ou menor correspondência entre aquelas características e as da situação concreta.

Não esquecendo, todavia, que o valor de qualquer desses índices de subordinação não pode deixar de considerar-se relativo, quer pela insuficiência de cada um deles, isoladamente considerado, quer porque podem assumir significado muito diverso de caso para caso.

Assim, para a determinação da subordinação jurídica deve ter-se como decisivo um juízo de apreciação global sobre os elementos indiciários fornecidos pela sua situação concreta em correspondência com aquelas características do conceito-tipo.

Por sua vez, o Acórdão do STJ de 13/11/2002, disponível em www.dgsi.pt, defende que é “a natureza da prestação acordada o ponto de partida diferenciador entre o contrato de trabalho e o contrato de prestação de serviço, embora depois o contrato de trabalho subordinado exija ainda a retribuição (subordinação económica) e a sujeição à autoridade e direcção da contra-parte (subordinação jurídica). E embora se possa argumentar que a valia daquele critério diferenciador é diminuta pois toda a actividade produz, em regra, um resultado e a obtenção de qualquer resultado pressupõe o desenvolvimento de alguma actividade, o certo é que em muitas situações se torna claro qual é o interesse do credor: nuns casos é que o devedor coloque à sua disposição o desenvolvimento de determinada actividade, enquanto noutros unicamente lhe interessa o resultado final da actividade desenvolvida, sendo-lhe indiferente o modo seguido pelo devedor para obter esse resultado”.

A qualificação da situação de facto, em termos de a subsumir a um contrato ou a outro, dependerá das circunstâncias concretas de cada caso, já que estamos perante uma das actividades em que nem sempre é fácil operar a distinção. O factor decisivo será, como se disse, a existência do elemento subordinação jurídica, um juízo de apreciação global sobre os elementos fornecidos pela situação concreta.

Como se escreveu no recente acórdão deste STJ de 17/03/2022, proc. 251/18.1T8CSC.L2.S1, para resolver as dificuldades que vão surgindo em cada caso concreto a doutrina e a jurisprudência têm enumerado determinados traços distintivos com vista a facilitar a distinção entre contrato de trabalho e contrato de prestação de serviço, traços distintivos, esses, que devem ser utilizados como tópicos indiciadores de subordinação jurídica.

Os indícios que podem conduzir à qualificação de um contrato de trabalho são os seguintes:

- A vinculação do trabalhador a um horário de trabalho;

- A execução da prestação em local determinado pelo empregador;

- A existência de controlo externo do modo da prestação;

- A obediência a ordens;

- A sujeição do trabalhador à disciplina da empresa;

- O pagamento da retribuição em função do tempo;

- O pagamento da retribuição de férias e dos subsídios de férias e de Natal;

- Pertencerem ao empregador os instrumentos de trabalho e serem por ele disponibilizados os meios complementares da prestação;

- Inscrição do trabalhador na segurança social como trabalhador por conta de outrem;

- Estar o trabalhador inscrito numa organização sindical;

- Não recair sobre o trabalhador o risco da inutilização ou perda do produto;

- Inexistência de colaboradores;

- A prestação da atividade a um único beneficiário.

Identificados estes indícios, há que confrontar a situação concreta com o modelo tipo de subordinação, através não de um juízo de mera subsunção, mas de um juízo de aproximação que terá de ser também um juízo de globalidade.

Como refere Monteiro Fernandes (Direito do Trabalho, 13.ª Edição, Almedina, pág. 148) “Cada um destes elementos, tomado de per si, reveste-se de patente relatividade. O juízo a fazer, nos termos expostos, é ainda e sempre um juízo de globalidade, conduzindo a uma representação sintética da tessitura jurídica da situação concreta e comparação dela com o tipo trabalho subordinado”.

Acrescenta ainda o citado autor que “Não existe nenhuma fórmula que pré-determine o doseamento necessário dos vários índices, desde logo porque cada um deles pode assumir um valor significante muito diverso de caso para caso”.

Face à dificuldade da distinção a doutrina de origem britânica avançou com um critério baseado na existência ou inexistência de incorporação na empresa ou organização técnico-laboral alheia (organisation test), ao qual se confere um alcance complementar no âmbito do método tipológico (cfr. Monteiro Fernandes, obra citada, nota 2 da pág. 148).

De qualquer forma, como adverte o citado autor, temos de ter sempre presente que o contrato de prestação de serviço pode harmonizar-se com a inserção funcional dos resultados da atividade no metabolismo da organização empresarial.

Passando ao caso em apreço, após exaustivo enquadramento teórico da distinção contrato de trabalho / contrato de prestação de serviço, a sentença de 1ª instância  analisou, na nossa perspectiva de forma acertada e no que foi secundado pelo acórdão recorrido, do seguinte modo a factualidade dada como provada:

Ficou provado que, tendo a Ré como objeto a recolha, tratamento e comercialização de informação, software e serviços para a comunicação social, no mês de Outubro de 2001, a Autora e a Ré ajustaram verbalmente, que aquela se obrigava a efetuar para esta o visionamento de pacotes de anúncios de publicidade de emissões de estações de rádio, competindo-lhe verificar a correta difusão desses anúncios, procedendo para o efeito à respetiva auscultação, e devendo realizar um registo do pacote visionado, elaborado em computador e num programa específico, do qual deviam constar, relativamente a cada anúncio, as horas de início e termo, se tinha passado de forma integral ou estava “cortado”, se tinha problemas de som e respetiva marca, e do qual deviam constar toda a “linha de programação”, nome do animador, informação de trânsito e meteorologia, sendo que, como contrapartida desta atividade realizada pela Autora, a Ré pagava-lhe uma quantia de por cada pacote, cujo valor inicial era de cerca. d.e € 15,00 e que foi aumentando até, por volta do ano de 2006/2007, passar a ser de € 32,80, e sendo que, por força do referido ajuste, a Autora devia visionar um pacote por cada dia, e, aquando desse ajuste, foi comunicado pela Ré à Autora que se não entregasse o registo do pacote/dia não recebia qualquer valor (cfr. factos provados n.°s 1 a 8). Este manancial factual indicia, à primeira vista, que a Ré contratou a Autora para lhe prestar um resultado da sua atividade (visionamento e registo de um pacote por dia, só havendo pagamento no caso de ser efetivamente entregue esse registo). Porém, em primeiro lugar, começa por ser logo mitigado pela circunstância das partes nada terem definido sobre a “medida” da prestação (um pacote/dia mas quantos dias por semana, mês e/ou ano? Nada foi definido nesta matéria), nem terem definido qualquer remição para um critério ou uma referência para fixar tal “medida” ou “tempo”, o que coloca em causa a determinabilidade do conteúdo/objeto do obrigação da prestação da atividade, e inclusive a sua validade (cfr. art.° 280.° do C. Civil), o que constitui um óbvio e manifesto elemento que se afasta a figura da prestação de serviços, isto é, coloca em causa que se quis apenas obter um resultado da atividade prestada pela Autora. Em segundo lugar, tal indício é contrariado pela efetiva conformação que, na prática, foi dada a este acordo verbal, já que, por um lado, também ficou provado que inicialmente, a Autora realizava a atividade entre as 20 horas e as 2 horas do dia seguinte, de segunda a sexta-feira, devendo o registo estar pronto até às referidas 2 horas de manhã, que a Autora também realizava a atividade ao fim de semana, quando era preciso substituir alguém e tinha disponibilidade para isso, que a partir de ano de 2006/2007, a Ré definiu um período de 5 horas para a realização da atividade de visionamento e registo de pacotes e a partir daqui a Autora podia realizar esta atividade consoante a sua disponibilidade e às horas que entendesse, entrando e saindo das instalações da Ré a quantidade de vezes que quisesse, que pelo menos desde esta data, a Ré não indicava à Autora qualquer período concreto para realizar a atividade, mas a mesma tinha de estar terminada antes do período da manhã do dia seguinte, e que, apesar do acordo ser um pacto/dia, no caso de, no mesmo dia, a Autora fizesse a visionamento de um pacote atribuído a outro colega “visionador" que tivesse faltado, receberia também o valor da contrapartida por este pacote, ou receberia metade do valor do mesmo, no caso do visionamento ser realizado a “meias” com outro colega “visionador” (cfr. factos provados n.°s 9, 10, 40 a 42, 47 e 48), o que comprova que, embora acordando um “pagamento à tarefa”, na realidade e na prática, a Ré tinha efetivo interesse na atividade da Autora (sendo o respetivo resultado mais uma consequência do que o primeiro objetivo) já que, de início, conformou a execução da atividade dentro de certos limites horários (entre as 20 horas e as 2 horas do dia seguinte, de segunda a sexta-feira), e depois, mesmo quando deixaram de existir tais limites horários, estimou um efetivo período de tempo para o desempenho da atividade (5 horas), independentemente da hora em que a mesma realizava tal atividade, mais acrescendo que a Autora realizava, muitas vezes, mais de que o visionamento e registo de um pacote por dia (atente-se que nos recibos emitidos no ano de 2002, quando o valor do pacote dia era de € 15,00, e concluiu-se que foram quase sempre superiores a € 450 mês, sendo que este seria o valor máximo mesmo pensando em 30 dias por mês, e atente-se nos recibos emitidos nos anos de 2007 e seguintes, quando o valor do pacote dia era de € 32,80, e conclui-se que existem vários superiores a € 984,00, sendo que este seria o valor máximo mesmo pensando em 30 dias por mês, e mesmo descontando os recibos de Julho do ano de 2013 em diante - cfr. factos provados n.°s 6, 24 e 49), mais se relembrando que este tipo de atividade (de visionamento e registo de pacotes de rádio) era realizada na Ré diariamente (cfr. facto provado n.° 38), o que significa que se trata de uma atividade permanente e essencial ao funcionamento da própria Ré. Portanto, atento o modo de execução do acordo verbal, verifica-se que a Ré contava permanente com a prestação da atividade da Autora (quer para fazer mais do que um pacote/dia, quer mesmo para substituir outros “visionadores”), o que constitui um indício de indício de subordinação jurídica, E, por outro lado, igualmente ficou provado que as horas a que os registos tinham que estar prontos eram determinadas pela Ré (quer inicialmente, quer aquando a alteração de 2006/2007), que o registo em computador e em programa específico e as menções que deviam conter eram determinadas pela Ré, e que o coordenador de departamento de rádio da Ré distribuía os pacotes pelos “visionadores”, verificava a correção dos registos elaborados pelos mesmos, corrigia os erros que esses registos continham, e informava-os sobre esses erros, para que os mesmos não se repetissem, e também alertava-os para novos aspetos e para alterações que os “visionadores” tinham que ter atenção na realização da atividade, aceitando a Autora tais informações e tais alertas (cfr. factos provados n.°s 21 a 23, 32, 39, e 42), o que comprova, inequivocamente, uma situação de prestação de trabalho pela Autora sob certa orientação da Ré e sob a obediência a certas ordens desta e uma situação de um certo controlo por parte da Ré quanto ao conteúdo prestação do trabalho pela Autora, embora tais orientações, ordens e/controlo não tenham resultado provados com a amplitude alegada pela Autora [cfr. factos não provado ejj, o que tudo constitui um indício de subordinação jurídica.
Ainda relacionado com esta vertente da orientação, obediência e controlo, verifica-se que a factualidade supra referida (as horas a que os registos tinham que estar prontos eram determinadas pela. Ré, quer inicialmente, quer aquando a alteração de 2006/2007; o registo em computador e em programa específico e as menções que deviam conter eram determinadas pela Ré; e o coordenador de departamento de rádio da Ré distribuía os pacotes pelos “visionadores”, verificava a correção dos registos elaborados pelos mesmos, corrigia os erros que esses registos continham, e informava-os sobre esses erros, para que os mesmos não se repetissem, e também alertava-os para novos aspetos e para alterações que os “visionadores” tinham que ter atenção na realização da atividade, aceitando a Autora tais informações e tais alertas) representa que o núcleo essencial da atividade prestada pela Autora era efetivamente determinado e conformado pela Ré (esta é que distribuía o “trabalho/pacote” a visionar, esta é que definia conteúdo dos registos a efetuar; qual o meio e o local onde deviam ser efetuados, e esta verifica e corrigia o “trabalho efetuado” pela Autora, dando-lhe nota dos erros para que não fossem repetidos), tudo no “quadro” de uma organização também determinada e conformada pela própria Ré, na qual existe um departamento específico para este tipo de atividade, em que existem duas “equipas” de “visionadores”, estando a Autora integrada numa delas, e em que existe um coordenador que distribui o serviço e uma diretora do departamento, o que representa uma verdadeira estrutura hierárquica (com efeito, está também provado que a Autora prestou sempre a atividade no departamento de rádio da Ré, sendo designada como “visionadora” de rádio, que no departamento de rádio da Ré existia equipa de “visionadores” não sendo nenhum do “quadro” da Ré, existia um coordenador e um adjunto do coordenador, que nos últimos anos eram BB e CC respetivamente, os quais pertenciam ao quadro da Ré, e existia um diretor do departamento, que nos últimos anos era DD, que também pertencia ao quadro da Ré, e que o referido coordenador distribuía os pacotes pelos “visionadores” - cfr. factos provados n.°s 12, 13, e 18 a 21). Tudo isto constitui um forte indício de subordinação jurídica, que em nada é afetado pelo facto de também ter ficado demonstrado que, quanto à forma de realização da auscultação e à ordem do registo, a Autora podia atuar de forma que entendesse (cfr. facto provado n.° 33), uma vez que se trata d.a autonomia, mínima e normal de qualquer trabalhador subordinado.
Noutra vertente, ficou igualmente provado que a Autora exerceu sempre as suas funções relativas à “referida atividade nas instalações da Ré, situadas na Rua Padre Luís Aparício, n.° 10-A, em Lisboa e que todos os equipamentos, materiais e utensílios usados pela Autora no desempenho das suas funções relativas à referida atividade pertenciam à Ré e eram-lhe disponibilizados para esse efeito, nomeadamente equipamento e mobiliário de escritório, e equipamento informático” (cfr. factos provados n.°s 11 e 15). Este manancial factual consubstancia inequivocamente que o local da trabalho da Autora era nas instalações da Ré e que os instrumentos de trabalho utilizados pela Autora eram exclusivamente da Ré, o que tudo igualmente constitui um indício de subordinação jurídica, salientando-se que, ao contrário do que a Ré pretendia fazer crer, a circunstância de estar demonstrado que sem infraestrutura tecnológica existente nas referidas instalações, composta por estações de captação, servidores informáticos, sistemas avançados dê captação de som e imagem, rede de computação e redundância de comunicações, não era possível à Autora exercer a sua atividade noutro local, e que não era possível à Autora, económica e tecnicamente, ter essas infraestruturas que existiam naquelas instalações (cfr. factos provados n.°s 34 e 35), reforça precisamente esse indício de subordinação jurídica já que confirma a impossibilidade da Autora, de forma autónoma e por si própria, apresentar o alegado resultado pretendido pela Ré.

Também noutra vertente, ficou probatoriamente demonstrado que a Autora prestou sempre a atividade no departamento de rádio da Ré, sendo designada como "visionadora” de rádio, que no departamento de rádio da Ré existia equipa de “visionadores” para os dias de semana (2.a 6.a), cerca de 5, da qual fazia parte a Autora, e uma equipa de “visionadores” para o fim-de-semana, cerca de 3/4, não sendo nenhum do “quadro” da Ré, existia um coordenador e um adjunto do coordenador, que nos últimos anos eram BB e CC respetivamente, os quais pertenciam ao quadro da Ré, existia um diretor do departamento, que nos últimos anos era DD, que também pertencia ao quadro da Ré, e que o referido coordenador distribuía os pacotes pelos “visionadores” (cfr. factos provados n.°s 12, 13, e 18 a 21). Esta factualidade confirma a integração completa da Autora na estrutura organizativa e de funcionamento da Ré, o que constitui outro forte indício de subordinação jurídica, e que foi até mais reforçado quando a partir de finais de 2011, por determinação da Ré, para entrar e sair das instalações a Autora tinha que apor a sua impressão digital em equipamento específico (sistema “...”), sistema que é o utilizado pela Ré para registar as horas de trabalho dos trabalhadores do seu quadro (cfr. factos provados n.°s 16 e 37).
Já noutra vertente, está probatoriamente demonstrado que: inicialmente, a Autora realizava a atividade entre as 20 horas e as 2 horas do dia seguinte, de segunda a sexta-feira, devendo o registo estar pronto até às referidas 2 horas de manhã; a Autora também realizava a atividade ao fim de semana, quando era preciso substituir alguém e tinha disponibilidade para isso; a partir de ano de 2006/2007, a Ré definiu um período de 5 horas para a realização da atividade de visionamento e registo de pacotes e a partir daqui a Autora podia realizar esta atividade consoante a sua disponibilidade e às horas que entendesse, entrando e saindo das instalações da Ré a quantidade de vezes que quisesse; pelo menos desde esta data, a Ré não indicava à Autora qualquer período concreto para realizar a atividade, mas a mesma tinha de estar terminada antes do período da manhã do dia seguinte; até finais de 2011, a Autora não estava sujeita a qualquer sistema de registo das horas em que prestava a atividade; a Ré não marcava faltas à Autora; a Autora comunicava à Ré as ausências para que esta pudesse arranjar pessoa para a substituir; e a Autora não tinha que apresentar qualquer justificação à Ré pelas suas ausências; e a partir definais de 2011, por determinação da Ré, para entrar e sair das instalações a Autora tinha que apor a sua impressão digital em equipamento específico (sistema “...”), sistema que é o utilizado pela Ré para registar as horas de trabalho dos trabalhadores do seu quadro (cfr. factos provados n°s. 9, 10, 16, 36, 37 e 40 a 45). E tenha-se presente que a Autora não logrou provar que «as horas das entradas e saídas diárias da Autora do seu local de trabalho, bem como as suas faltas, foram sempre fiscalizadas pela Ré», nem que «caso se atrasasse, competia à Autora contactar os responsáveis da Ré, dando conta da ocorrência», nem que «a Autora indicava à Ré, na pessoa do coordenador, as datas em que pretendia gozar férias, ficando tal marcação sujeita a aprovação por parte da Ré» e nem que «a Ré fiscalizava asfaltas da Autora» [cfr. factos não provados c), d), J) e j)], tal como a Ré não logrou provar que «até ao ano de 2006/2007, a Ré não tinha qualquer interferência na definição do período de atividade da Autora, sendo esta que organizava e geria livremente o tempo que pretendia despender para a executar a mesma», e nem que «em caso de ausência, a Autora devia coordenar com um colega “visionador” para que assegurasse a realização da sua atividade» [cfr. factos não provados g), e h)[. Esta factualidade provada e esta factualidade não provada significa, por um lado, que inicialmente a Autora estava adstrita a um regime de prestação da atividade idêntico ao de um horário de trabalho fixo, sendo que a alteração ocorrida em 2006/2007, significa mais uma alteração para um regime flexível de prestação de trabalho do que uma inexistência de horário de trabalho (embora a partir daí a Autora prestasse a sua atividade quando quisesse, certo é que a Ré estimou um período de 5 horas para cada pacote/dia e continuava a ter um prazo temporal para a realização da atividade), apontando-se para um “trabalho parcial”, o que constitui um indício de subordinação jurídica, e significa, por outro lado, que a Autora nunca esteve sujeita a um regime de faltas e de férias típico dos trabalhadores subordinados, o que constitui um indício que afasta a existência de subordinação jurídica.
Ainda numa outra vertente, mais ficou provado que: a Autora iniciou a sua atividade para a Ré em Outubro de 2001; relativamente à atividade que prestou para a Ré, a Autora emitiu em nome daquela, pelo menos, os “recibos verdes” que a seguir se discriminam, contendo as seguintes datas de emissão e os seguintes valores brutos (sem retenções na fonte e/ ou IVA), a título de honorários de “prestação de serviços (...) na data de 02/02/2004, a Autora celebrou um contrato de trabalho por termo indeterminado com a Cinemateca Portuguesa - Museu do Cinema, para exercer funções de colaboração e apoio à ..., auferindo a retribuição mensal ilíquida de € 651,69 e sendo o período normal de trabalho de 25 horas semanais, distribuídas de segunda a sexta-feira, com início às 9 horas e finalização às 17 horas e 20 minutos, com intervalo para refeição de 90 minutos, contrato esse que manteve, pelo menos, até Agosto de 2018; a Autora declarou, para efeitos de IRS, ter recebido da Cinemateca Portuguesa os seguintes rendimentos ilíquidos da categoria A: no ano de 2004, no valor de € 8.443,51; no ano de 2005, no valor de € 9.510,76; no ano de 2006, no valor de € 6.728, 77; no ano de 2007, no valor de € 9.354,92; no ano de 2008, no valor de € 9.667,68; no ano de 2009, no valor de € 9.779,35; no ano de 2010, no valor de € 10.147,00; no ano de 2011, no valor de € 10.171,51; no ano de 2012, no valor de € 6.232,65; no ano de 2016, no valor de € 9.617,49; e no ano de 2017, no valor de € 10.522,54; nos anos de 2013, 2014 e 2015, a Autora não auferir da referida Cinemateca Portuguesa quaisquer rendimentos da categoria A (cfr. factos provados n. °s 2, e 49 a 54). Esta factualidade atesta que a Ré foi a única beneficiária da atividade da Autora nos primeiros 2 anos e 4 meses do acordo verbal que ajustaram, exclusividade esta voltou a existir nos períodos 2013, 2014, e 2015, e mais atesta que, mesmo nos anos em que a Autora prestou atividade quer para a Ré quer para a Cinemateca Portuguesa, no âmbito de um contrato de trabalho, em 7 desses anos Autora auferiu da Ré um valor global superior ao que auferiu da Cinemateca (...) e restantes 3 desses anos a Autora auferiu da Ré um valor quase igual ao auferido da Cinemateca (aliás, atento que nos valores pagos por esta estão sempre incluídos 14 meses, o que não sucede com os valores pagos pela Ré, caso estes valores também fossem 14 vezes, então estes seriam também superiores aos pagos pela Cinemateca), donde resulta que, por um lado, em 5 anos e 4 meses de duração da relação contratual com a Ré, a Autora esteve em situação de total dependência económica daquela, e que, por outro lado, nos restantes anos, a Autora continuou em situação dependência económica daquela (embora não absoluta) uma vez que a os valores recebidos da Ré representavam a maioria dos seus rendimentos ou, pelo menos, cerca de metade dos mesmos, o que tudo mais constitui outro forte indício de subordinação jurídica. Aliás, reforçando esta situação de dependência é a factualidade também provada que demonstrada que (ainda que apenas estejam provados dados a partir de Novembro de 2011 - cfr. facto provado n.u 55) a Autora prestava a sua atividade para a Ré, na esmagadora maioria dos meses, muitos mais dias por mês do que os normais 21/22/23 dias que prestava de trabalho para a Cinemateca (cfr. facto provado n.° 55), o que comprava a permaneça quase diária da Autora na Ré, revelando-se esta sua atividade como a principal, o que constitui outro indício de subordinação jurídica.
Ainda relacionado com esta vertente da  remuneração /retribuição /honorários, o manancial factual provado atesta que a Ré pagava à Autora uma quantia por cada pacote, sendo que se aquela não entregasse o registo do pacote/ dia não recebia qualquer valor, que desde Agosto de 2002 a Setembro de 2017 os pagamentos eram realizados normalmente todos os meses mas os valores mensais variavam, que a Autora emitia em nome da Ré “recibo verdes", não fazendo a Ré quaisquer contribuições para a Segurança Social relativamente aos valores que pagava à Autora, e que a Autora nunca recebeu qualquer pagamento por parte da Ré a título de subsídios férias e de Natal, mas desde o ano de 2013 em diante, a Ré pagava anualmente à Autora, no mês de Julho, e para além da contrapartida, uma quantia monetária correspondente a um total 10 dias vezes o valor de € 32,80 (cfr. factos provados n.°s 6, 8, 14, 24, 30, 31, e 49). Esta factualidade demonstra afixação de uma remuneração em função do resultado (e não da atividade, embora como supra já se referiu tenha estado sempre “presente” um período temporal definido ou estimado pela Ré), periódica e regular (mensalmente e durante mais de 15 anos), embora sem um valor certo, acrescendo que foi sempre utilizado um regime de retribuição (12 vezes por ano), de fiscalidade e de parafiscálidade (segurança social) próprio de um “trabalho independente”, o que tudo constituir um indício que afasta a existência de subordinação jurídica, ainda que não num grau tão elevado como seria se não tivesse ficado demonstrada a existência de um período de referência temporal, de uma longa periodicidade e regularidade, e de uma aproximação ao regime retributivo do trabalhador subordinado (pagamento de uma quantia sem a contraprestação de atividade num mês que faz parte da normal época de férias).
Por fim, é desconhecido sobre se a Autora estava ou não sujeito à disciplina da Ré”.

Para, por sua vez, o acórdão recorrido comparar os vários índices, no sentido do descrito juízo de globalidade, da seguinte forma:
“Tendo como pano de fundo o quadro legal indicado e a interpretação que dele faz a nossa melhor doutrina, resta-nos apurar se, no caso dos autos, logrou a Autora, como lhe competia, demonstrar os elementos típicos ou indícios integradores da noção de contrato de trabalho que deixámos antes enunciada, à luz do quadro jurídico em vigor antes do CT/2003.
No sentido de que, com base no mero acordo verbal firmado entre as partes no mês de outubro de 2001 [Pontos 2) a 6)], poderemos estar face a uma relação juridicamente subordinada estão os seguintes factos:
- Integração da Autora na estrutura organizativa da Ré [departamento de rádio e correspondenteequipa], por referência a um concreto e pré-determinado quadro funcional definido contratualmente pela MEDIAMONITOR - SOFTWARE E INFORMAÇÃO PARA COMUNICAÇÃO SOCIAL, LDA. (“visionamento de pacotes de publicidade de emissões e de estações de rádio”), sendo para o efeito designada como «visionadora» da rádio [Pontos 2) a 5), 12), 13) e 18)];
- A prestação de tais serviços de visionamento, levada a cabo pela Autora, era efetuada nas instalações da Ré e que foram sempre as mesmas ao longo do vínculo profissional [Pontos 5) e 15)1;
- A partir do ano de 2011 [sendo que nos 10 anos anteriores inexistia qualquer registo dessa natureza] e por determinação da Ré, as entradas e as saídas da Autora das instalações da empresa passaram a ser efetuadas através da aposição da impressão digital no equipamento específico para tal efeito instalado e que era geral para os trabalhadores da Ré e para os prestadores de serviços da mesma [Pontos 16), 17), 36) e 37)];
- Utilização do mobiliário, equipamentos e instrumentos de trabalho fornecidos pela Ré, assim como «software» específico [Pontos 5) e 15)];

- Os pacotes publicitários a serem visionados pela Autora e colegas eram-lhes individualmente distribuídos pelo coordenador do departamento de rádio da Ré [que, tal como o adjunto do coordenador e o diretor do departamento pertenciam ao quadro da empresa;
- Esse mesmo coordenador verificava depois a exatidão dos registos efetuados pela Autora e dos colegas, corrigia os erros encontrados, alertava-os para os mesmos, assim como lhes dava indicações quanto a novos aspetos e para alterações da referida atividade de visionamento que iam ocorrendo ao longo dos tempos [Pontos 19) a 23)];
- Os registos desses pacotes tinham de ser elaborados em computador, num programa próprio e com menções obrigatórias, assim como deveriam ser entregues pela Autora até às 2 horas da manhã do dia seguinte, conforme determinado pela Ré [Pontos 5), 9), 32), 39) e 42)];
- Estabelecimento de uma quantia pecuniária igual por pacote visionado e entregue, a título de pagamento de prestação de serviços, sendo os montantes mensais correspondentes e de valor variável, liquidados mensalmente [Pontos 6), 24), 30) e 49)];

- Pagamento de 10 dias/pacotes a partir do ano de 2013, sem que correspondesse a uma contrapartida efetiva de qualquer serviço de visionamento pela Autora efetuado durante tal período e que se pode presumir destinarem-se a possibilitar à Autora o gozo de férias por igual período) [Pontos 24), 49) e 55)];
- Prestação de tais serviços praticamente durante todos os dias úteis da semana e mesmo aos fins-de-semana, quando necessário - mas desde que a Autora tivesse para tal disponibilidade - dentro de períodos temporais cujos limites gerais foram, numa primeira fase [entre 2001 e 2006/2007], previamente estabelecidos pela Ré e depois deixaram de o ser, podendo a referida atividade ser desenvolvida em termos temporais de forma livre, sem prejuízo de dever ser respeitado o prazo limite de entrega dos registos dos visionamentos, com as características mínimas definidas pela Ré [Pontos 9), 10), 38), 40), 41), 42) e 55)];
- Prestação pela Autora de tais serviços com carácter regular e duradouro, ao longo de 16 anos [Pontos 49) e 55)].
No sentido de uma relação jurídica de carácter autónomo, teremos os seguintes factos:
- Muito embora o mobiliário, equipamentos e instrumentos de trabalho fossem fornecidos pela Ré, assim como «software» específico [Pontos 5) e 15)], certo era que a Autora só ali poderia desenvolver tal visionamento devido aos condicionalismos técnicos e ao valor do equipamento necessário para o efeito [Pontos 34) e 35)];
- A equipa de visionadores de rádio onde a Autora se mostrava inserida era composta exclusivamente por prestadores de serviços [não integrados no quadro da Ré] [Ponto 18)];
- A Autora esteve coletada nas Finanças como trabalhadora independente [Pontos 30) e 49)];
- A Ré não emitia recibos relativamente às quantias entregues à Autora, sendo esta que emitia mensalmente, como trabalhadora independente, recibos verdes com referência aos montantes variáveis auferidos, que incluíam o IVA mas sobre os quais não era feita pela empresa qualquer retenção na fonte [Pontos 6), 30), 49) e 50)];
- A Ré não pagou à Autora quantias pecuniárias destinadas a pagar subsídio de férias e subsídio de Natal [Ponto 14)];
- A Ré nunca fez descontos para a Segurança Social relativamente à Autora [Ponto 31)];
- A Ré não marcava faltas à Autora nem esta tinha de justificar as suas ausências, estando apenas obrigada a comunicar à empresa que não ia trabalhar com vista a ser substituída nas suas funções de visionamento por outra pessoa [Pontos 43) a 45)];
- A Autora só prestava serviço aos fins-de semana, para efeitos de substituição de um colega «visionador», caso tivesse disponibilidade pessoal para o efeito [Pontos 9), 10), 51) a 54];    
-  A Autora entre outubro de 2001 e finais de 2011 não foi sujeita a qualquer registo de entradas e saídas [o que só aconteceu nesse segundo momento] e desde 2006/2007, passou a desempenhar a sua atividade de forma temporalmente livre, ao contrário do antes acontecia [em que tinha de prestar os serviços de visionamento acordados entre as 20,00 horas de um dia e as 2,00 horas da manhã do seguinte] [Pontos 9), 10), 38), 40), 41), 42) e 55)]
- A Autora tinha autonomia técnica, dentro dos parâmetros mínimos fixados pela Ré, para prestar os serviços acordados de visionamento [Pontos 5), 9), 32) e 33)];
- Pagamento por pacote diário visionado, tendo o montante respetivo se situado inicialmente no montante de 15,00 € e evoluído quantitativamente, nos anos de 2006/2007, para 32,80 € [Pontos 6) e 7)];
- Visionamento de um pacote por dia e obrigação da entrega do correspondente registo diário de tal pacote publicitário até às 2 horas da manhã do dia seguinte, sob pena de a Autora não ser paga do serviço prestado durante tal período diário de 6 ou 5 horas [Pontos 7) a 9), 38, 39), 40) e 42)];
- Possibilidade de a Autora poder visionar, no mesmo dia, exclusivamente ou a meias com um colega da equipa de visionadores, um pacote publicitário que havia sido afetado a este último ou a um terceiro, recebendo também por tal visionamento o valor total ou metade do mesmo, no caso desse serviço ter sido feito em parceria com o aludido colega [Pontos 47) e 48)];

- O risco dos serviços prestados pela Autora corria não apenas por conta da Ré mas também por conta dela, muito embora os mesmos fossem prestados em benefício da primeira [e dos seus clientes], face à possibilidade de não ser paga caso não entregasse até à hora acordada o registo da audição do pacote publicitário que lhe havia sido concretamente adstrito [Pontos 7) a 9), 38, 39), 40) e 42)];
- Serviços não prestados em regime de exclusividade, dado a Autora ter também, a partir de 2/2/2004, começado a desenvolver atividade profissional subordinada e remunerada, mediante a celebração de um contrato de trabalho por tempo parcial (25 horas semanais) indeterminado, para a CINEMATECA PORTUGUESA, relação essa que, com ressalva dos anos de 2013, 2014 e 2015, durante os quais não recebeu quaisquer rendimentos da categoria A, se manteve até agosto de 2018 [Pontos 51) a 54)];
- Proposta de celebração de um contrato de trabalho que a Autora recusou [Pontos 25) a 29)].
Não escondemos a nossa dificuldade e perplexidade na análise e decisão do eterno e frequente dilema que se coloca aos Tribunais de Trabalho e que respeita à caracterização laboral de muitos vínculos jurídicos dúbios e ambíguos, tanto mais que nos parece que, com a rápida evolução da atividade económica e subsequente criação, transformação e diversificação das formas e tipos contratuais, alguns dos indícios que anteriormente eram reveladores da natureza laboral ou não de uma determinada relação profissional (tal como a prestação autónoma de serviços para só uma empresa, durante todos os dias da semana, por um número mais ou menos idêntico de horas semanais e com o pagamento do mesmo em função do tempo) já perderam grande parte dessa virtualidade.

Bastará olhar para a crescente "proletarização" que muitos pequenos empresários em nome individual (eletricistas, canalizadores, serralheiros, marceneiros, etc.,), bem como profissões do setor terciário que habitualmente eram exercidas em regime liberal (advogados, médicos, arquitetos, etc.) têm vindo a sofrer (e que, por exemplo, para a nossa anterior Lei dos Acidentes de Trabalho, desde que houvesse uma efetiva situação de dependência económica, implicava um tratamento jurídico para efeitos da sua aplicação equiparado ao do trabalho subordinado), com a integração exclusiva ou quase exclusiva aproximar-se  do trabalho autónomo por aqueles prestado numa estrutura mais vasta e de carácter empresarial e a sua consequente "dependência económica" relativamente a tal estrutura (cf. o que a este propósito, o que diz o Dr. GARCIA PEREIRA no texto denominado “As lições do grande Mestre Alonso Olea - A atualidade do conceito de alienidade no século XXI” publicado na obra coletiva “Estudos de Direito do Trabalho em Homenagem ao Professor Manuel Alonso Olea”, Almedina, Coimbra, Março de 2004, págs. 55 e seguintes, bem como a Dr.a MARIA DO ROSÁRIO PALMA RAMALHO na mesma obra, no seu estudo “De la servidumbre al contrato de trabajo” - deambulações em torno da obra de Manuel Alonso Olea e da singularidade dogmática do contrato de trabalho”) 127/28j.
Será possível caracterizar a relação profissional dos autos como emergente de um contrato de trabalho, em razão de ler ficado suficientemente demonstrada a existência de subordinação jurídica, traduzida em poderes de controlo, fiscalização e direção, por parte da Ré, sobre os serviços prestados pela Autora?
No caso dos autos, entrechocam-se entre si alguns sinais ou indícios contraditórios, afigurando-se-nos de difícil análise e qualificação jurídica o cenário dúbio, ambíguo, híbrido, misto, que ressalta dos factos dados como assentes nos autos e dos documentos que os complementam.
Naturalmente que não se ignora que a Autora prestou tais serviços de uma forma constante e regular durante cerca de 16 anos, em benefício da Ré e na sequência da afetação ou distribuição dos respetivos pacotes publicitários à aqui demandante por parte da mesma.

Essa prestação, por outro lado, traduzia-se numa atividade de natureza intelectual e técnica (ainda que exercida com autonomia), em local e com equipamento e instrumentos de trabalho pertencentes e fornecidos pela entidade perante a qual se obrigou a prestar os serviços de visionadora, controlada qualitativamente, em termos de resultado final (registo), contra o recebimento de um montante pecuniário fixo por pacote publicitário visionado e que eram geralmente durante quase todos dias úteis e os meses do ano, dentro de um determinado quadro temporal que, nos primeiros anos [2001 a 2006/2007] podiam  dos legalmente denominados horário e período normais de trabalho, mas que a partir daí já não era reconduzível a tais conceitos mas que ainda assim estavam sujeitos a alguns condicionalismos impostos pela Ré (fundamentalmente, limite horário para a entrega dos registos).
Refira-se, finalmente, com o destaque merecido, que a demandante só passou a poder gozar, de uma forma indireta e enviesada, férias pagas pela Ré [10 dias úteis], a partir do ano de 2013.
Impõe-se dizer aqui, até por uma questão de honestidade intelectual, que alguns dos indícios de autonomia antes referidos - emissão de recibos verdes pela Autora, inscrição como trabalhadora independente, não realização de contribuições para a Segurança Social por parte da Ré e não pagamento de subsídio de férias e de Natal - não são suficientemente [minimamente?] convincentes e decisivos quanto à qualificação jurídica de uma relação profissional como a que está em discussão nestes autos, mas reconduzem-se apenas a factores ou aspetos externos ou formais, muito utilizados pelos empregadores encapotados, para tentar dar tal aparência de independência a uma relação genuinamente de trabalho subordinado, ao mesmo tempo que reduzem os custos inerentes à relação laborai verdadeiramente existente.
Importa também realçar que a não exclusividade de funções também não é incompatível com a celebração de um contrato de trabalho, sendo por demais conhecidas em diversos setores de atividade no nosso país, situações de duplo e triplo emprego subordinado.
A questão da aquisição do equipamento técnico não se achar na disponibilidade económica e financeira da Autora também não nos parece de significado particular muitos trabalhadores assalariados conduzem camiões TIR ou autocarros de passageiros ou programam megacomputadores empresariais ou manobram tecnologia audiovisual proibitiva em termos de valor para um vulgar cidadão que tem de viver do seu trabalho e tal não impede que sejam firmados os correspondentes contratos de trabalho.
A proposta de celebração de um contrato de trabalho por parte da Ré, assim como a constituição da equipa do departamento de rádio só integrar prestadores de serviços possui alguma relevância, mas também relativa e facilmente contornável.
As dúvidas maiores acerca da natureza laboral do vínculo em questão giram em tomo dos quatro aspetos seguintes, que nos parecem decisivos em termos de qualificação da relação profissional dos autos:
-Pagamento à peça [pacote publicitário], que lhe era distribuído pessoal e diariamente e cujo serviço podia até não lhe ser pago caso o correspondente registo não fosse entregue até às 2 horas da madrugada, nada obstando a que mesma pudesse ainda cumular o seu serviço próprio com o visionamento de pacotes alheios, que podiam ser visionados «a meias», como se afirma na Factualidade dada como Provada e igualmente pagos, em acréscimo ao devido pelo trabalho próprio realizado e devidamente entregue, na sua totalidade ou na proporção do serviço prestado.
Salvo melhor opinião, esta forma de realização do serviço e seu pagamento remeto-nos não para a contrapartida de uma atividade ou de um trabalho desenvolvido ao longo de tantas horas acordadas diária e mensalmente, mas antes para a liquidação de um ou mais resultados consensualizados e que, para tal, têm de se cumprir nos termos temporalmente contratualizados, sob pena de nem sequer serem remunerados [o que distribui - mal ou bem - o risco da atividade de visionamento entre Autora e Ré].
Ora, num contrato de trabalho, tal risco é geralmente do empregador, que, nessa medida, suporta os atrasos ou as imperfeições ou incorreções do trabalho realizados pelos seus assalariados e tem até a possibilidade de responsabilizar disciplinar ou contratualmente, em termos de responsabilidade civil e em cenários limite, os trabalhadores infratores, mas já não detém o poder de não pagar a retribuição respeitante atais erros ou defeitos.
Muito embora o pagamento à peça não seja incompatível com uma relação de trabalho subordinada, quer-nos parecer que no caso dos autos e nos moldes concretamente referidos nos autos, é o resultado em si que se busca fundamentalmente e é função dele que se pagava à Autora.

- Não obrigatoriedade de prestação de tais serviços jurídicos num horário ou período mínimo e normal de trabalho, a partir de 2006/2007, muito embora também não tenha ficado demonstrado que anteriormente a demandante tinha de ficar sempre e obrigatoriamente nas instalações da Ré a desenvolver os seus serviços ao longo das 6 horas em questão e até às 2 horas da madrugada, dado nos parecer possível que, caso o pacote publicitário distribuído à recorrida não demandasse tal presença, nada parecia impedir que o registo final relativo ao mesmo pudesse ser entregue antes, à 1,00 horas ou à 1,30 horas, por exemplo - cf. redação dos Pontos 3) a 9) e 40) a 42).
- Liberdade de movimentação profissional da Autora [até finais de 2011], nunca tendo estado obrigada a justificar oficial e formalmente as suas ausências e só prestando serviço ao fim de semana quando tinha disponibilidade pessoal para o efeito, o que, no caso do contrato de trabalho e atendendo ao regime do trabalho suplementar, não poderia acontecer].
Importa dizer que não nos impressiona particularmente o controlo de entradas e saídas a que a Apelada ficou sujeita desde finais de 2011, pois não somente nos parece que tal foi o sistema geral instituído para todas as pessoas que ali prestavam funções, em regime de contrato de trabalho ou de prestação de serviços [o que naturalmente e por arrastamento, englobou a Autora], como nada mais sabemos relativamente ao que a Ré fazia com tais registos, pois, como já antes vimos, não havia controlo de faltas da recorrida nem justificação para as mesmas, como aquela, desde 2006/2007, passou a desenvolver os seus serviços de uma forma temporalmente livre.
- A Autora, salvo melhor opinião e de acordo com a matéria que acima deixámos sintetizada, não estava sujeita a um cenário de verdadeira subordinação jurídica, não obstante a existência dos factos referidos nos Pontos 3) a 5), 7) a 10), 18) a 23), 32) e 33), 38) a 42)].
Afigura-se-nos que os parâmetros básicos definidos pela Ré para os serviços de visionamento da Autora [quer inicialmente, quer posteriormente, através do coordenador do Departamento de rádio da empresa] e o controlo posterior feito para verificar se não havia erros no registo final, para os corrigir, se eles tivessem ocorrido e para alertar a Autora para a sua verificação, a fim de não se repetirem no futuro, não é, em nosso entender, inconciliável com a existência de um contrato de prestação de serviços nem implica, só por si, uns quaisquer poderes de autoridade, direção e fiscalização como os pressupostos pela noção do contrato de trabalho dos artigos 1152.° do Código Civil, 1:° da LCT, 10.° do CT/2003 e 11.° do Código do Trabalho de 2009.
Um cliente de um advogado, de um arquiteto, de um informático ou de uma empresa de construção civil [através designadamente de uma prestação de serviços contratualizada e continuada] procura determinadas realidades que ele especifica, define, circunstancia e parametriza, buscando um dado conceito ou resultado que perceciona como sendo o que pessoal ou profissionalmente quer e que depois pode vir a controlar, acompanhando e provocando alterações na obra em curso ou simplesmente rejeitando e mandando retificar ou substituir o produto final por não obedecer às suas exigências.
Este quadro não me parece ser distinto do que ficou demonstrado nos autos e que acima, sintetizámos.
Serão estes quatro aspetos suficientes para colocar em crise a natureza jurídico-laboral da relação profissional dos autos?
Entendemos que sim, pois, por um lado, a não obrigatoriedade de cumprimento de um horário e período normais de trabalho, embora não sendo absolutamente incompatível com um contrato de trabalho (pense-se por exemplo, em alguma das modalidades de IHT), confirma e reafirma a liberdade de movimentação profissional que também ficou dada como assente e vai ao encontro da referida autonomia técnica.
Acresce que a referida liberdade de movimentação - desde que cumpridas as exigências formais, matérias e temporais de entrega do registo - não estava dependente de uma qualquer obrigação de comunicação ou justificação formal e oficial nem sujeita a qualquer sanção ou chamada de atenção, podendo, por outro lado, a Autora faltar - com o oportuno aviso de ausência de maneira a possibilitar a sua substituição atempada - sem outras consequências que a não a perda do valor da remuneração desse dia ou dias, o que até podia acontecer mesmo quando ela estava presente e a trabalhar, bastando para o efeito não entregar o registo do visionamento até às 2 horas da manhã seguinte.
Finalmente, as regras e controlo básicos e compreensíveis dadas como provadas não são de molde a fazer nascer aqui um quadro evidente ou até indiciário de exercício efetivo de poderes patronais e característicos da subordinação jurídica.

Este cenário fáctico e jurídico, na sua consideração conjunta e conjugada, obriga-nos a perspetivar assim de forma distinta e a dar um enquadramento e significado diferentes a alguns dos demais indícios antes elencados e que foram referidos como suscetíveis de sustentar a natureza subordinada do vínculo dos autos, pois que, quando articulados com aqueles aspetos, com os quais não são absolutamente incompatíveis ou irreconciliáveis (existem, por exemplo, contratos de avença onde são pagas as férias anuais do avençado) ganham um valor e relevância diversos.

Logo, tendo em atenção a matéria de facto dada como assente e a noção de contrato de trabalho contida nos artigos 1152.° do Código Civil e 1° da LCT, entendemos que a Autora não logrou demonstrar nos autos, como lhe competia, que o seu desempenho de funções como visionadora para a Ré, configura, efetiva e inequivocamente, a existência de um acordo “pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua atividade a outra pessoa, sob a autoridade e direção desta”, isto é, de um verdadeiro e genuíno contrato de trabalho subordinado celebrado entre ambas”.

Não obstante se deva reconhecer que a questão está longe de ser isenta de dúvidas, concordamos com estas considerações.

Estabelecida a inegável subordinação económica, não suficiente para se considerar a  existência de um contrato de trabalho, e não obstante ter resultado provado que a Autora /Recorrente exerceu a sua actividade, de natureza intelectual e técnica (ainda que exercida com autonomia), nas instalações da Ré/ Recorrida e com meios e equipamentos por esta fornecidos (que está longe de ser decisivo para a pretendida qualificação, pelos motivos apontados pela Relação), o certo é que, se por um lado,  indícios relevantes apontam no sentido da laboralidade da relação contratual, por outro lado estamos perante indícios não menos relevantes, antes pelo contrário, no sentido de estarmos perante um contrato de prestação de serviço.

Dentro desse primeiro conjunto de indícios, temos aquilo que se aproximava de um horário de trabalho, nos primeiros anos (2001 a 2006/2007), mas o mesmo já não acontecia a partir daí: a actividade era exercida nas instalações da Ré e com equipamento técnico desta, o que só por si nada revela, por não se ver o modo, independentemente da qualificação do contrato, como o poderia ser de forma diferente; a não exclusividade de exercício de funções para a Ré efectivamente também não é incompatível com a celebração de um contrato de trabalho.

No segundo conjunto de índices relevam:
O pagamento era o comummente chamado “à peça”, correspondendo ao pacote publicitário, ou isolada e exclusivamente ou a “meias”, com cumulação com visionamento de pacotes atribuídos a outras pessoas, pagamento esse que só era efectuado caso se produzisse esse resultado de visionamento e o correspondente registo fosse entregue até determinada hora, circunstância que está muito distante de ser típica de uma relação subordinada, embora não impossível, mas, como diz no acórdão recorrido, era o resultado em si que se buscava fundamentalmente e era em  função dele que se pagava à Autora, podendo acontecer que, na ausência de entrega do registo, nem sequer houvesse pagamento.
Se, por um lado, não existia obrigatoriedade de prestação de tal actividade, com produção de concretos resultados, num horário ou período mínimo e normal de trabalho, isto a partir de 2006/2007, também é certo que, anteriormente, não ficou provada qualquer obrigação da Autora de permanecer nas instalações da Ré durante o período temporal da respectiva prestação.
E se até finais de 2011 a Autora nunca esteve obrigada a justificar oficial e formalmente as suas ausências e só prestava serviço ao fim de semana quando tinha disponibilidade pessoal para o efeito (algo incompatível com o regime de trabalho suplementar no contrato de trabalho), também não se pode conferir especial relevância ao controlo de entradas e saídas a que a Autora ficou sujeita desde finais de 2011, pois afigura-se que tal foi o sistema geral instituído para todas as pessoas que ali prestavam funções, independentemente do tipo de contrato - trabalho ou prestação de serviço - a que estavam vinculados, e sem que se saiba o que a Ré fazia com o registo desse controle.
É certo que a Ré instituiu os parâmetros básicos serviços de visionamento e controlava posteriormente os eventuais erros no registo final, para os corrigir, se eles tivessem ocorrido e para alertar a Autora para a sua verificação, a fim de não se repetirem no futuro, mas tal não é inconciliável com a existência de um contrato de prestação de serviço nem implica, só por si, uns quaisquer poderes de autoridade, direcção e fiscalização, como acertadamente adverte o acórdão recorrido. Tudo isto aponta no sentido de que a Ré pretendia um resultado final de acordo com os parâmetros previamente definidos, provocando correcções de acordo com aqueles, como qualquer cliente de qualquer atividade almeja.
Não está demonstrado que qualquer ausência, pontual ou prolongada tivesse qualquer consequência que não a da perda da contrapartida financeira, nomeadamente reacção disciplinar, nem está minimamente provado que a Ré exercesse, sobre qualquer forma, o poder disciplinar, típico da relação subordinada, sobre a Autora.
E se a emissão de recibos verdes pela Autora, a inscrição como trabalhadora independente, a não realização de contribuições para a Segurança Social por parte da Ré e o não pagamento de subsídio de férias e de Natal são não raras vezes meios utilizados pelos empregadores para se subtraírem ao cumprimento de obrigações fiscais e contributivas, no caso em análise não podem deixar de ser contextualizados juntamente com os restantes aspectos mencionados, no sentido de fazer duvidar seriamente da existência do contrato de trabalho reclamado pela Autora.

Ou seja, tudo considerado, não estamos perante uma situação de facto que permita, com a necessária segurança, qualificar a relação dos autos como constituindo um contrato de trabalho.

Como de escreveu no citado Ac. deste STJ de 08/07/2020, verificada “a ausência de horário de trabalho ou período de trabalho diário ou semanal, a ausência de um controlo de assiduidade, e do registo de faltas e da necessidade da sua justificação, a ausência de obrigação de exclusividade, o não pagamento de subsídios de férias ou de Natal, bem como de quaisquer outros benefícios pagos aos trabalhadores, como subsídio de refeição, subsídio infantil e outros, o pagamento da remuneração contra a entrega de recibos de trabalho independente”, dever-se-á entender que a Autora não logrou demonstrar nos autos, como lhe competia, que o seu desempenho configurava a existência de um acordo pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua atividade a outra pessoa, sob a autoridade e direção desta, isto é, um contrato de trabalho.

Afigura-se-nos, assim, adequado o entendimento acolhido no acórdão recorrido, no sentido de que os indícios apurados e conjuntamente avaliados não são suficientes para se poder concluir pela existência de uma relação de subordinação jurídica, devendo concluir-se que a Autora/Recorrente não logrou demonstrar, como lhe competia, nos termos do artigo 342.º, n.º 1 do Código Civil, que a relação contratual em causa configura um contrato de trabalho.

x

Decisão:

Pelo exposto, acorda-se em negar a revista, confirmando-se o acórdão recorrido.

Custas pelo recorrente.

                                                                                   Lisboa, 01/06/2022

Ramalho Pinto (Relator)

Domingos Morais

Mário Belo Morgado

                                                                      

                                                                                  

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[1] No mesmo sentido, a título de exemplo, os Acórdãos deste Supremo Tribunal de Justiça:
-  Acórdão de 26-10-2017, proferido no processo n.º 1175/14.7TTLSB.L1. S1
- Acórdão de 21-09-2017, proferido no processo n.º 2011/13.7LSB.L2. S1
- Acórdão de 15-04-2015, proferido no processo n.º 329/08.0TTCSC.L1. S1
- Acórdão de 18-09-2013, proferido no processo n.º 2775/07.7TTLSB.L1. S1
- Acórdão de 08-01-2013, proferido no processo n.º 176/10.9TTGRD.C1. S1