Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
201/13.1TBMIR-A.C1.S1
Nº Convencional: 7ª SECÇÃO
Relator: LOPES DO REGO
Descritores: PRAZO PRESCRICIONAL
PRESCRIÇÃO DE 5 ANOS
QUOTAS DE AMORTIZAÇÃO DO CAPITAL PAGÁVEIS COM OS JUROS
Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 09/29/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDO PROVIMENTO À REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL - RELAÇÕES JURÍDICAS / TEMPO E SUA REPERCUSSÃO NAS RELAÇÕES JURÍDICAS / PRESCRIÇÃO.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGO 310.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-DE 27/3/14, PROCESSO N.º 189/12.6TBHRT-A.L1.S1, EM WWW.DGSI.PT .
Sumário :
I. Prescrevem no prazo de 5 anos, nos termos da al. e) do art. 310º do CC, as obrigações consubstanciadas nas sucessivas quotas de amortização do capital mutuado ao devedor, originando prestações mensais e sucessivas, de valor predeterminado, englobando os juros devidos.

II. Na verdade, neste caso – apesar de obrigação de pagamento das quotas de capital se traduzir numa obrigação unitária, de montante predeterminado, cujo pagamento foi parcelado ou fraccionado em prestações, - a circunstância de a amortização fraccionada do capital em dívida ser realizada conjuntamente com o pagamento dos juros vencidos, originando uma prestação unitária e global, determinou, por expressa determinação legislativa, a aplicabilidade a toda essa prestação do prazo quinquenal de prescrição.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:



1. Na execução para pagamento de quantia certa, com processo comum, instaurada por AA – INSTITUIÇÃO FINANCEIRA, S.A contra a executada BB, veio esta deduzir oposição por embargos, alegando que o crédito dado à execução se encontrava prescrito, tal como prescritos estariam os juros anteriores a 3.09.2008; que os juros reclamados são usurários por ultrapassarem os limites do art.º 1146 do C. Civil; e que o contrato de crédito que serve de título executivo é nulo, não porque a embargante o assinou sem consciência de estar a emitir uma declaração negocial, mas ainda porque o respectivo clausulado nunca lhe foi devidamente explicado.

A exequente contestou, pugnando pela improcedência das excepções e, consequentemente, dos embargos.

Em saneador-sentença, foi a execução julgada extinta, por se considerar verificada a excepção de prescrição deduzida.

Inconformada, apelou a Exequente, tendo a Relação, na procedência da apelação, revogado a decisão recorrida, julgando improcedente a invocada excepção de prescrição da dívida objecto de execução; em função do que determinou o prosseguimento dos autos com vista à apreciação das demais questões suscitadas.


2. No acórdão recorrido, começa por se enunciar a matéria de facto relevante para apreciação do litígio:

1. No requerimento executivo deduzido foi peticionada a quantia de € 12.311,06, acrescida de € 22.123,99 de juros, calculados desde 15.3.2004 até à data da entrada do requerimento executivo – cfr. requerimento executivo;

2. A execução foi intentada em 28.7.2013.

3. A exequente celebrou, em 18.9.2002, com os executados uma operação de crédito por forçada qual concedeu aos executados um empréstimo de € 12.108.62, com uma taxa de juro contratual de 19,185% ao ano, pagável em 60 prestações mensais e sucessivas (cfr. requerimento executivo e doc. de fls. 4 da execução).

4. Os executados não pagaram a 18ª prestação, vencida em 15.3.2004.


Passando a apreciar a questão jurídica que integrava o objecto do recurso, considerou a Relação no acórdão ora recorrido:

Escreveu-se no saneador-sentença recorrido:

“No caso em apreço, a obrigação assumida pelos executados, compartimentada num mútuo e respectivos juros, converteu-se numa prestação mensal de fraccionada quantia global que, assim, iria sendo amortizada na medida em que se processasse o seu cumprimento, pelo que o prazo de prescrição que lhe é aplicável é de cinco anos, ao abrigo do disposto no art. 310º, al. e) do CC (e não alínea g), tal como defendeu a embargante).

Desta feita e atentando na data de incumprimento – 15.3.2004 – tendo a execução sido instaurada em 28.7.2013 e inexistindo qualquer causa interruptiva ou suspensiva, o prazo prescricional de 5 anos foi atingido em 15.3.2009, pelo que é forçoso concluir que a obrigação exequenda se mostra prescrita.”

Não acompanhamos esta decisão.

Se não vejamos.

Já a respeito deste mesmo tema, teve esta Secção da Relação oportunidade de se pronunciar no Acórdão de 8/05/2007, subscrito por este mesmo Relator, disponível em www.dgsi.pt, aresto onde se teceram as seguintes considerações:

“A prescrição – instituto por via do qual os direitos subjectivos se extinguem quando não exercitados durante certo tempo fixado na lei – funda-se especificamente na presunção de renúncia ao direito ou na indignidade da protecção jurídica do respectivo titular em consequência da negligência que se tem por implícita na sua conduta (Manuel de Andrade, Teoria Geral, 1972, p. 446).

No que respeita às chamadas prescrições de curto prazo sem natureza presuntiva, como é o caso das prestações periódicas renováveis, o Prof. Vaz Serra, no seu Estudo sobre Prescrição Extintiva e Caducidade, in BMJ 106, p.107, explicita assim a sua motivação, citando os tratadistas Planiol, Ripert e Radouant: "A razão essencial desta prescrição, que remonta ao nosso antigo direito francês, claramente indicada nos trabalhos preparatórios, é proteger o devedor contra a acumulação da sua dívida que, de dívida de anuidades, pagas com os seus rendimentos, se transformaria em dívida de capital susceptível de o arruinar, se o pagamento pudesse ser-lhe exigido de um golpe ao cabo de um número demasiado de anos». E, precisamente sobre o problema das fracções de capital, expende o mesmo Prof. (ob. cit. p.113-114): "Com os juros parece deverem prescrever as quotas de amortização, se deverem ser pagas como adjunção aos juros (Código alemão, § 197º), pois, se assim não fosse, poderia dar-se uma acumulação de quotas ruinosa para o devedor, apesar de, com a estipulação de quotas de amortização, se ter pretendido suavizar o reembolso do capital e tratá-lo como juros".     

É à luz desta finalidade – subjacente, sem dúvida, à solução legislativa que vingou em 1966 – que deve ser interpretado o disposto no art.º 310, alínea e) do Código Civil, nos termos do qual prescrevem no prazo de cinco anos as quotas de amortização de capital pagáveis com juros. Isto é, desde que o pagamento das fracções ou quotas de capital se processe de forma adjunta com os juros, funciona a norma redutora do prazo (5 anos)”.

Também no Ac. da Rel. de Lxª de 12/07/2001, in CJ, Ano XXVI, T. 4, p.87, ainda que sobre a prescrição da dívida de rendas do locatário no contrato de locação financeira (dívida de natureza e contornos para este efeito similares à do mutuário), se ponderou o seguinte: “Esta dívida existe desde a celebração do contrato, embora o seu reembolso seja fraccionado. Trata-se de uma obrigação de prestação fraccionada, quanto ao cumprimento, mas unitária em si mesma, sem dependência da duração da relação de contratual.

O que prepondera na classificação das prestações como prestações periódicas ou prestações fraccionadas (ou repartidas) não é, só por si, a intervenção do factor tempo, nas sim a circunstância, materialmente relevante, de o objecto da prestação não estar (ou estar) previamente fixado, sem dependência da relação contratual: sendo este último o caso das prestações fraccionadas, mas não o é das prestações periódicas”.

O que, por conseguinte, está na base do instituto desta prescrição de curto prazo é o propósito de evitar uma acumulação de quotas/prestações ao longo de um lapso temporal considerável. Quotas/prestações que, pelo seu carácter renovável e não previamente unificado, não concitam a prudente ponderação pelo devedor das consequências que em dado momento o seu somatório pode atingir.

No entanto, havendo uma obrigação única, já o devedor tem previamente a noção do valor a que o seu inadimplemento pode ascender.

Decisivo é, pois, o apurar se o devedor está vinculado ao cumprimento de uma única obrigação, ainda que repartida ou fraccionada em várias prestações, ou antes a uma sucessão de prestações que se apresentam de renovação periódica e sem um valor ab initio globalmente fixado.

Ora, no caso sub judicio, afigura-se-nos claro que para a Executada/devedora se tratou da contracção de uma obrigação unitária, porquanto com o contrato celebrado logo ficou ciente de estar adstrita à restituição da quantia exactamente mutuada pela Exequente, ainda que de modo fraccionado e acrescida dos juros estipulados.

Com efeito, consta do acervo fáctico que a Exequente concedeu aos executados um empréstimo de € 12.108.62, com uma taxa de juro contratual de 19,185% ao ano, pagável em 60 prestações mensais e sucessivas.


Ou seja: atentos os contornos da obrigação assim assumida, às prestações em dívida pela Executada/Embargante não é aplicável o prazo prescricional do art.º 310 do C. Civil, mas antes o prazo ordinário do art.º 309 do m. diploma.

Donde que, no êxito do recurso, a decisão recorrida não possa manter-se.


3. Inconformada, interpôs a executada a presente revista, que encerra com as seguintes conclusões:

A) Nos termos da alínea c) do n.° 1 do artigo 674.° e alínea c) do n.° 1 do artigo 615.° do CPC, é nula a decisão do Tribunal da Relação de Coimbra, em virtude de sustentar a decisão numa argumentação e fundamentação duma decisão anteriormente proferida pelo mesmo Tribunal, sobre situação idêntica, com decisão contrária, o que causa uma obscuridade e ininteligibilidade que se invoca, que mina a certeza e segurança da justiça.

B) Recorrente e Recorrido celebraram em 18-09-2002 contrato de mútuo cujo valor financiado por de cerca de €12.311,06, valor este que foi colocado à disposição do consumidor, pagável em 60 prestações mensais e sucessivas, compostas por capital e juros.

C) Cada uma das prestações era composta por duas frações - uma de capital e outra de juros - pagas simultaneamente.

D) Em 15-03-2004, os Executados não pagaram a 18.° prestação, entrando em incumprimento.

E) A execução foi intentada em 28-07-2013, tendo como título executivo aquele contrato de mútuo (crédito).

F) Nos termos da alínea e) do artigo 310.º do Código Civil, prescrevem no prazo de 5 anos as quotas de amortização do capitai pagáveis com os juros.

G) Esta situação prevista na alínea e) do artigo 310.° do Código Civil, reporta-se também a casos de uma única obrigação cujo cumprimento é efetivado em prestações fracionadas no tempo, como é o caso das prestações mensais sucessivas.

H) Mesmo que assim não se entenda, sempre se deverá entender que as obrigações unitárias encontram o seu regime prescricional na alínea g)-dp artigo 310.° do Código Civil, pois que não existem razões de qualquer índole -jurídica e prática - que operem uma restrição e interpretação diversa.

I) As razões justificativas das prescrições de curto prazo do artigo 310.° do Código Civil, são a da proteção e certeza do tráfico, a conveniência de se evitarem os riscos, a nível probatório, de uma apreciação judicial a longa distância e obstar que o credor deixe acumular excessivamente os seus créditos, para proteger o devedor da onerosídade excessiva que representaria, muito mais tarde, a exigência do pagamento, procurando-se, assim, obstar a situações de ruína económica.

J) Estes fitos permitem e até exigem que se entenda que o prazo de 5 anos previsto em tal preceito, leia-se o artigo 310.° do Código Civil, se aplique não só às prestações periodicamente renováveis, mas também às situações de uma única obrigação cujo cumprimento é efetivado em prestações fracionadas.

K) As quotas de capital e os juros prescrevem no prazo de 5 anos, nos termos do artigo 310.° do Código Civil.

L) Estas conclusões resultam e são sustentadas na jurisprudência unânime nos Tribunais Superiores, inclusive no Supremo Tribunal de Justiça conforme supra se referiu, por ser a melhor interpretação e a que origina uma maior segurança, certeza e justiça ao caso sub judice.

M) Assim, pela ordem de razões já expostas, deverá ser dado total provimento ao presente recurso, revogando-se o Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, por violação substantiva consistente em erro de interpretação e aplicação dos artigos 309.° e 310.° do Código Civil, no seguimento da jurisprudência quiçá unânime, mas sempre dominante, mantendo-se a decisão do Tribunal de 1.ª Instância, considerando-se prescrita o crédito exequendo nos termos do artigo 310.° do Código Civil e consequentemente absolvendo-se a Executada, aqui Recorrente, do pedido

TERMOS EM QUE, EM FACE DAS CONSIDERAÇÕES EXPOSTAS NA FUNDAMENTAÇÃO DO PRESENTE RECURSO, DEVEM AS PRESENTES CONCLUSÕES PROCEDER E POR VIA DELAS E COM O DOUTO SUPRIMENTO DE V.S.a EXAS., DEVE SER DADO TOTAL PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, REVOGANDO-SE A DECISÃO RECORRIDA COM AS LEGAIS CONSEQUÊNCIAS.


A revista foi admitida em consequência do provimento da reclamação deduzida contra o despacho de indeferimento do recurso, por se considerar que o tema controvertido respeitava ao mérito da causa.


4. A questão controvertida centra-se, deste modo, na definição dos pressupostos de aplicação da prescrição de 5 anos, prevista nas várias alíneas do art. 310º do CC: será a situação dos autos susceptível de preencher alguma dessas previsões normativas que encurtam substancialmente o prazo normal da prescrição de créditos?

A metodologia correcta para abordar esta questão traduz-se em, primeiramente, verificar se o caso dos autos é enquadrável nalguma primeiras alíneas de tal preceito legal – máxime na situação prevista na al. e) – só depois se passando, se necessário, à interpretação da norma residual que consta da al. g): ou seja, há, em primeiro lugar, que verificar se, na situação litigiosa, o crédito feito valer pelo exequente se consubstancia em quotas de amortização do capital pagáveis com os juros ; e só no caso de a resposta a esta questão ser negativa cumprirá verificar se o crédito feito valer pela entidade exequente se pode configurar como conjunto de prestações periodicamente renováveis, susceptível de caber na norma residual constante da citada al. g).

Sobre esta questão normativa divergiram frontalmente as instâncias: na verdade, a sentença apelada considerou que a circunstância de a prestação fraccionada do capital em dívida integrar, com os juros, uma quantia ou prestação mensal, global e  predeterminada, reportada, quer aos juros remuneratórios do capital mutuado, quer à amortização parcelada do próprio capital, desencadeava a aplicação do prazo prescricional de 5 anos, previsto na citada al. e).

Pelo contrário, a Relação, no acórdão recorrido, entendeu que a aplicabilidade de todo o art. 310º pressupunha necessariamente que estivéssemos sempre confrontados com prestações periodicamente renováveis, nunca se podendo aplicar tal normativo a situações em que, afinal, existisse uma única obrigação inicial, de valor predeterminado, apenas repartida ou fraccionada em várias prestações parcelares – como seria precisamente a emergente do débito do capital mutuado, cujo objecto estava previamente fixado, apenas sendo pago em parcelas ou fracções que se venciam ao longo dos 60 meses subsequentes ao contrato.

O STJ teve oportunidade, em recente aresto proferido na sequência de revista excepcional, de esclarecer esta questão jurídica: fê-lo no Ac. de 27/3/14, proferido por esta mesma Secção no P. 189/12.6TBHRT-A.L1.S1, em que se entendeu - em hipótese em que estava igualmente em causa a efectivação de direitos emergentes de um mútuo bancário - que :

1. O prazo ordinário da prescrição é de vinte anos (art.º 309.º do C.Civil); todavia, prescrevem no prazo de cinco anos as quotas de amortização do capital pagáveis com os juros - art.º 310.º, alínea e), do C. Civil.

2. O débito concretizado numa quota de amortização mensal de 24 prestações (iguais, mensais e sucessivas) referentemente ao capital de 7.326.147$00, enquadra -se na previsão legal do disposto no art.º 310.º, alínea e), do C. Civil.


Escreveu-se neste aresto:

Na verdade, se é certo que a disciplina legal estatuída na alínea e) do art.º 310.º do C.Civil se não estenderá aos casos em que se verifica “uma única obrigação pecuniária emergente de um contrato de financiamento, ainda que com pagamento diferido no tempo”, o certo é que a realidade circunstancial que envolve o relacionamento contratual estabelecido entre o exequente e os executados se não propaga nesta realidade jurídico-substancial.

Convenhamos que das considerações, difundidas por Ana Filipa Morais Antunes, insertas nos “Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Sérvulo Correia; volume III; página 47” se retira lição diferente daquela que o recorrente pretende divulgar.

Como nelas se contêm “…na situação prevista no artigo 310.º, alínea e), não estará em causa uma única obrigação pecuniária emergente de um contrato de financiamento, ainda que com pagamento diferido no tempo, a que caberia aplicar o prazo ordinário de prescrição, de vinte anos, mas sim, diversamente, uma hipótese distinta, resultante do acordo entre credor e devedor e cristalizada num plano de amortização do capital e dos juros correspondentes, que, sendo composto por diversas prestações periódicas, impõe a aplicação de um prazo especial de prescrição, de curta duração. O referido plano, reitera-se, obedece a um propósito de agilização do reembolso do crédito, facilitando a respectiva liquidação em prestações autónomas, de montante mais reduzido. Por outro lado, visa-se estimular a cobrança pontual dos montantes fraccionados pelo credor, evitando o diferimento do exercício do direito de crédito para o termo do contrato, tendo por objecto a totalidade do montante em dívida

Prosseguindo nesta análise, completa este estudo que constituirão, assim, indícios reveladores da existência de quotas de amortização do capital pagáveis com juros: em primeiro lugar, a circunstância de nos encontrarmos perante quotas integradas por duas fracções: uma de capital e outra de juros, a pagar conjuntamente; em segundo lugar, o facto de serem acordadas prestações periódicas, isto é, várias obrigações distintas, embora todas emergentes do mesmo vínculo fundamental, de que nascem sucessivamente, e que se vencerão uma após outra”.

A obrigação assumida pelos signatários do contrato, confirmamos nós, compartimentada num mútuo e respetivos juros, converteu-se numa prestação mensal de fraccionada quantia global que, desta forma, iria sendo amortizada na medida em que se processasse o seu cumprimento; e esta facticidade está abrangida pelo regime jurídico descrito no artigo 310.º, alínea e), do C. Civil.

Considera-se que é de manter a orientação jurisprudencial fixada no acórdão acabado de referir.


Note-se que efectivamente, no caso do débito do capital mutuado, estamos confrontados com uma obrigação de valor predeterminado cujo cumprimento, por acordo das partes, foi fraccionado ou parcelado num número fixado de prestações mensais; ou seja, em bom rigor, não estamos aqui perante uma pluralidade de obrigações que se vão constituindo ao longo do tempo, como é típico das prestações periodicamente renováveis, mas antes perante uma obrigação unitária, de montante predeterminado, cujo pagamento foi parcelado ou fraccionado em prestações.

Porém, o reconhecimento desta específica natureza jurídica da obrigação de restituição do capital mutuado não preclude, sem mais, a aplicabilidade do regime contido no citado art. 310º, já que – por explicita opção legislativa - esta situação foi equiparada à das típicas prestações periodicamente renováveis, ao considerar a citada al. e) que a amortização fraccionada do capital em dívida, quando realizada conjuntamente com o pagamento dos juros vencidos, originando uma prestação unitária e global, envolve a aplicabilidade a toda essa prestação do prazo quinquenal de prescrição.

Ou seja, o legislador entendeu que , neste caso peculiar, o regime prescricional do débito parcelado ou fraccionado de amortização do capital deveria ser absorvido pelo que inquestionavelmente vigora em sede da típica prestação periodicamente renovável de juros, devendo, consequentemente, valer para todas as prestações sucessivas e globais, convencionadas pelas partes, quer para amortização do capital, quer para pagamento dos juros sucessivamente vencidos, o prazo curto de prescrição decorrente do referido art. 310º.

Ora, no caso dos autos, como decorre da matéria de facto apurada, as partes estipularam efectivamente, no âmbito da operação de crédito que gerou a dívida da executada, o pagamento da mesma em 60 prestações mensais sucessivas, de montante predeterminado, que incluíam, quer a amortização fraccionada do capital mutuado, quer o pagamento dos respectivos juros remuneratórios, o que dita a aplicação do estatuído na referida al. e) do art. 310º - e, consequentemente, do prazo prescricional de 5 anos à totalidade de tais prestações globais e parceladas ( a última das quais se venceria em  15/8/07, conforme refere a exequente a fls. 50).

Tem-se, pois verificada a excepção de prescrição, como havia sido decidido em 1ª instância, o que determina a extinção da obrigação exequenda.


5. Nestes termos e pelos fundamentos apontados concede-se provimento à revista, revogando o acórdão recorrido e, julgando procedentes os embargos deduzidos pela executada, tem-se por extinta a execução.


Custas pela exequente/embargada.


Lisboa, 29 de Setembro de 2016


Lopes do Rego (Relator)

Orlando Afonso

Távora Victor