Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
10336/16.3T8VNG.P1.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: ABRANTES GERALDES
Descritores: IMPUGNAÇÃO PAULIANA
ANTERIORIDADE DO CRÉDITO
LIVRANÇA EM BRANCO
PACTO DE PREENCHIMENTO
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA
Data do Acordão: 07/11/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL – DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / GARANTIA GERAL DAS OBRIGAÇÕES / CONSERVAÇÃO DA GARANTIA PATRIMONIAL / IMPUGNAÇÃO PAULIANA.
DIREITO COMERCIAL – LETRAS / EMISSÃO E FORMA DA LETRA / AVAL / RESPONSABILIDADE DO AVALISTA.
Doutrina:
- Pereira Delgado, Lei Uniforme sobre Letras e Livranças, 7.ª ed, p. 83;
- Pinto Furtado, Títulos de Crédito, p. 145.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 610.º, ALÍNEA A), 612.º, N.º 1 E 614.º.
LEI UNIFORME RELATIVA A LETRAS E LIVRANÇAS (LULL): - ARTIGO 32.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- ACÓRDÃO DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA N.º 4/13, IN DR, I SÉRIE, DE 21-01-2013;
- DE 29-11-2011, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 02-05-2012, IN WWW.DGSI.PT.
- DE 15-05-2013, PROCESSO N.º 3057/11, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 04-06-2019, PROCESSOS N.º 65/15, IN WWW.DGSI.PT.
Sumário :
I. O crédito cambiário sobre o avalista em livrança incompleta constitui-se na ocasião em que é aposto o aval, ainda que a data de vencimento e o montante fiquem dependentes de posterior preenchimento, de acordo com o respetivo pacto.

II. Não constitui obstáculo à procedência da ação pauliana relativamente a uma doação o facto de o preenchimento da livrança, de acordo com o respetivo pacto, ter ocorrido depois de ter sido celebrado o contrato de doação.

III. Atenta a responsabilidade solidária dos diversos devedores cambiários (subscritora da livrança e seu avalista), a verificação dos pressupostos da ação pauliana deve ser aferida mediante o confronto entre o crédito cambiário e o património do avalista, sem consideração da eventual garantia patrimonial respeitante à subscritora da livrança.

Decisão Texto Integral:
I - BANCO AA, S.A. - SOC. ABERTA, intentou ação declarativa, na forma comum, contra BB, CC e DD.

Pede que:

a) Seja reconhecido o direito de crédito do A. sobre o 1º R., no valor global de € 178.584,93, acrescido de juros e respetivo imposto de selo às taxas legais em vigor, até efetivo e integral pagamento;

b) Seja reconhecido o direito de crédito do A. sobre a 2ª R., no valor global de € 144.586,83, acrescido de juros e respetivo imposto de selo às taxas legais em vigor, até efetivo e integral pagamento;

c) Seja condenada a 3ª R. a restituir, de acordo com o art. 616º, nº 1, do CC, ao património do 1º R. e da 2ª R. os dois imóveis que descrevem, em garantia do cumprimento dos direitos de crédito reconhecidos ao A.:

- Prédio urbano, composto de casa de cave, rés-do-chão, andar e logradouro, sito na R. …, freguesia de …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 1303 e inscrito na matriz predial urbana sob o art. 2661º;

- Prédio urbano, correspondente a terreno para construção urbana com a área de duzentos e sessenta e seis metros quadrados, sito no Vale …, lote …, freguesia de …, descrito na CRP de … sob o nº 3163 e inscrito na matriz predial urbana sob o art. 5453º.

No caso de não ser julgada procedente a impugnação pauliana, pediu subsidiariamente que seja declarada a nulidade, por simulação absoluta, da doação destes imóveis, reconhecendo-se que pertencem àqueles RR.

Alega, essencialmente, ter concedido à sociedade EE - Vendas e Construções, Lda, um financiamento, que foi sendo reestruturado, tendo aquela sociedade subscrito, para o efeito, livranças, avalizadas pelos 1º e 2º RR.; entretanto, aquela sociedade entrou em incumprimento, acabando por ser declarada insolvente por sentença de 2-2-16; preenchidas as livranças, não foram pagas pelos 1º e 2º RR.; sucede que, por escritura de 4-6-12, doaram dois imóveis à 3ª R., sua filha, deste modo impedindo a satisfação do seu crédito; acresce que aquela doação foi simulada.   

Na contestação os RR. alegaram não se encontrarem preenchidos os pressupostos da impugnação pauliana, designadamente, a existência de qualquer crédito à data da doação, bem como o nexo de causalidade entre o ato impugnado e a situação patrimonial do devedor, traduzida na impossibilidade ou agravamento para a satisfação do crédito; sendo que a doação ocorreu na sequência de desentendimentos entre o casal, como forma de “minimizar os focos de litígio entre ambos”, não se verificando a alegada simulação.

Foi proferida sentença na qual se decidiu julgar a ação improcedente.

O A. apelou e a Relação julgou procedente a apelação e:

a) Reconheceu o direito de crédito do A. sobre o R. BB, no valor global de € 178.584,93, acrescido de juros de mora, imposto de selo e taxas legais;

b) Condenou a 3ª R. a restituir ao património do 1º R., para garantia do cumprimento do direito de crédito referido os seguintes imóveis:

- Prédio urbano composto de casa de cave, rés-do-chão, andar e logradouro, sito na R. …, freguesia de …, descrito na CRP de … sob o nº 1303 e inscrito na matriz predial urbana sob o art. 2661º;

- Prédio urbano, correspondente a terreno para construção urbana com a área de duzentos e sessenta e seis metros quadrados, sito no Vale …, lote …, freguesia de …, descrito na CRP de … sob o nº 3163 e inscrito na matriz predial urbana sob o art. 5453º, com o que se revoga, nesta parte, a sentença recorrida.

Os RR. interpuseram recurso de revista em que suscitam as seguintes questões:

a) Não anterioridade do crédito relativamente à doação, devendo atender-se à data em que foram preenchidas as livranças avalizadas – 29-7-16 - e não àquela em que foi celebrado o contrato de financiamento com a subscritora, na modalidade de conta corrente – em 1998 - ou o contrato de empréstimo e em que foram entregues as livranças avalizadas em branco – em 2012;

b) A eficácia do aval prestado em livranças em branco está sujeita ao seu preenchimento, com indicação do vencimento e da quantia em dívida, não existindo até então qualquer crédito do A. sobre os 1º e 2º RR.;

c) Ainda que o crédito se tenha por constituído em data anterior, apenas remanescia do mesmo a quantia de € 33.048,90;

d) Falta de prova da insuficiência do património dos 1º e 2º RR., uma vez que a sociedade subscritora das livranças possui património suficiente para cobrir as dívidas, gerando a falta de causalidade entre o ato impugnado e a impossibilidade ou agravamento da possibilidade de satisfação do crédito do A.

Houve contra-alegações.

Cumpre decidir.


II – Factos provados:

1) O R. BB é, há vários anos, empresário, detendo participações sociais de diversas sociedades comerciais, onde também assume as funções de gerente.

2) Entre essas sociedades, encontra-se a EE - Vendas e Construções, Lda, que foi constituída a 16-4-96 pelo R. BB, assumindo, desde então, as funções de gerente.

3) O R. BB é titular de uma quota de € 126.500,00, correspondente a 50 % do capital social da “EE”.

4) O R. BB é casado, no regime de comunhão de adquiridos, com CC, aqui 2ª R.

5) O Banco A. tem como objeto social o exercício de atividade bancária, onde se integra a concessão de financiamento a sociedades comerciais.

6) A 20-5-98, o Banco A. concedeu à sociedade “EE” um financiamento, sob a forma de conta corrente, no valor máximo de PTE 50.000.000$00/€ 249.398,95, capital que vencia juros à taxa anual efetiva de 7,6298% (embora devesse ser revista todos os anos nos termos previstos na cláusula sexta do contrato).

7) A quantia mutuada através daquele contrato foi efetivamente entregue por crédito na conta de depósitos à ordem a ele associada, mais propriamente na conta nº 22…28, conta esta titulada pela sociedade “EE” junto do A.

8) O A. estabeleceu como condição essencial para a celebração do contrato de conta corrente caucionada a subscrição de uma livrança por parte da sociedade “EE”, que seria também avalizada por FF e pelo R. BB, “ficando o Banco expressamente autorizado (…) a preenchê-la (…) caso se verifique o incumprimento por parte da empresa de qualquer das obrigações que lhe competem”.

9) Assim, a 20-5-98, o R. BB assinou o contrato como avalista e assinou também como avalista a livrança que o cauciona.

10) A 22-11-06, foram alteradas diversas cláusulas do contrato de conta corrente caucionada, embora se tenha mantido o montante máximo de crédito a conceder pelo Banco, isto é, € 249.398,95 e a caução concedida pela livrança avalizada pelo réu BB e por FF.

11) Já o prazo do empréstimo daquela quantia foi alvo de alteração, devendo a sociedade “EE”, enquanto mutuária, devolver a quantia mutuada a 14-1-07.

12) Contudo, foi também acordado entre o Banco A. e a sociedade “EE” que o contrato era prorrogável por “períodos sucessivos de 90 dias, salvo indicação em contrário, a qual se tornará eficaz mediante comunicação escrita do Banco”.

13) No dia 14-1-07, o A. verificou que o saldo da conta nº 22…28 era suficiente para liquidar a quantia mutuada e permitiu a renovação do contrato por 90 dias.

14) Renovações que foram ocorrendo a cada 90 dias, porque o A., do acompanhamento que ia fazendo dos montantes depositados na conta nº 22…28, apercebia-se da capacidade de devolução da quantia mutuada, por parte da sociedade “EE”.

15) A 14-4-12, data de vencimento da quantia mutuada através do contrato, a sociedade “EE” não tinha fundos suficientes para devolver o capital de € 249.398,95.

16) Neste seguimento, o A. e a sociedade “EE” estabeleceram contactos tendentes à “regularização de responsabilidades”, que não passaria pela extinção do contrato de conta corrente caucionada, já que a sociedade mutuária dependia, em grande medida, da conta corrente caucionada e também não tinha capacidade para devolver a totalidade do capital em dívida de uma só vez.

17) A 31-5-12, o A. e a sociedade “EE” acordaram que o montante de capital mutuado através do contrato de conta corrente caucionada seria reduzido para € 75.000,00 e que seria devolvido, integralmente, num prazo mais alargado, mais propriamente de 224 dias, vencendo-se a 10-1-13, prazo que seria renovado automaticamente por períodos sucessivos de 90 dias.

18) Tal como já tinha acontecido, neste aditamento realizado a 31-5-12, o R. BB manteve-se como avalista da livrança que cauciona o contrato de conta corrente caucionada.

19) A diferença entre o novo valor máximo do contrato de conta corrente caucionada e o valor global em dívida (€ 249.398,95), ou seja, € 174.398,00 seria, nos termos do acordo global estabelecido entre o A. e a sociedade “EE” (representada pelo R. BB), liquidada de acordo com um contrato que seria celebrado mais tarde e que estabeleceria condições de pagamento mais favoráveis, especialmente quanto ao prazo de pagamento.

20) A 26-2-14, o contrato de conta corrente caucionada foi, novamente, alterado, tendo sido reduzido o valor máximo mutuado para € 27.574,17, já que o A. tinha a intenção de reduzir a sua exposição a dívidas da sociedade “EE”.

21) No âmbito do acordo global de regularização da dívida, a 4-7-12, o Banco A. concedeu à sociedade “EE” “uma facilidade de crédito, sob a forma de um empréstimo” que se destinava a liquidar o montante em dívida por força do contrato de conta corrente caucionada e que ascendia a € 174.398,00, pelo prazo de 914 dias, desde 4-7-12 até 4-1-15.

22) A dívida do contrato de conta corrente caucionado era também da responsabilidade do R. BB, porque avalizou a livrança que cauciona aquela dívida.

23) Por isso, o contrato de 4-7-12 resultou de várias semanas de negociações entre o Banco A. e a sociedade “EE”, representada pelo seu sócio-gerente BB, com o objetivo de regularização de responsabilidades.

24) A quantia mutuada através daquele contrato foi efetivamente entregue por crédito na conta de depósitos à ordem a ele associada, mais propriamente na conta nº 21…07, titulada pela sociedade “EE” junto do A.

25) O A. estabeleceu como condição essencial para a celebração do contrato de mútuo a subscrição de uma livrança por parte da sociedade “EE”, que seria também avalizada pelos RR. BB e CC, “ficando o Banco expressamente autorizado (…) a preenchê-la (…) caso se verifique o incumprimento por parte de V. Exª(s) de qualquer das obrigações que lhe competem”.

26) Assim, 4-7-12, os RR. BB e CC assinaram o contrato como avalistas e assinaram também como avalistas a livrança que o cauciona.

27) A sociedade “EE” obrigou-se a devolver o capital mutuado e os juros contados à taxa anual efetiva de 11,336384 % (embora sujeita às alterações previstas na cláusula quarta), em 30 prestações mensais sucessivas de € 6.596,34, ao qual acrescia o imposto de selo à taxa em vigor, vencendo-se a primeira prestação a 4-8-12 e a última prestação a 4-1-15.

28) A 3-5-14 e a solicitação da sociedade “EE”, representada pelo seu sócio-gerente BB, o Banco A. aceitou aumentar o prazo de reembolso do capital então em dívida - € 126.478,55 - e o número de prestações, vencendo-se a 1ª prestação a 4-5-14 e as seguintes em igual dia dos meses subsequentes, estando previsto o vencimento da última prestação para 4-4-15.

29) Apesar disso, a sociedade “EE” não mais voltou a liquidar as prestações do contrato.

30) Neste sentido, no início do ano de 2015, o R. BB, na qualidade de sócio-gerente e avalista da sociedade “EE”, solicitou ao A. uma nova alteração do plano de pagamentos do contrato.

31) A 5-2-15, a sociedade “EE” reconheceu ser devedora ao Banco A. da quantia global de € 100.652,26, discriminada da seguinte forma:

a) € 94.092,27, referentes às prestações vencidas e não pagas relativas ao contrato; 

b) € 6.318,42, referentes a juros e demais encargos relativos ao contrato;

c) € 241,57, referentes a despesas, comissões, impostos e outros encargos com a implementação deste contrato.

32) Simultaneamente, o Banco A. e a sociedade “EE”, representada pelo aqui 1º R., acordaram numa moratória no pagamento daquela quantia pelo prazo de 6 meses, o que implicava que a quantia de € 100.652,26, acrescida de juros e imposto de selo, seria devolvida numa prestação única que se vencia apenas a 5-8-15.

33) Já as prestações do contrato, alterado pelo aditamento, ainda não vencidas à data de 5-2-15, no valor global de € 32.386,28, não foram objeto do contrato de moratória, cabendo à sociedade “EE” devolver esta quantia ao A. nas datas de vencimento acordadas.

34) De modo a não haver uma diminuição das garantias de cumprimento da quantia em dívida, à semelhança do que aconteceu com o contrato, o Banco A. exigiu que os RR. BB e CC avalizassem uma livrança que caucionaria o contrato de moratória.

35) No entanto, as várias oportunidades de cumprimento concedidas à sociedade “EE” revelaram-se totalmente infrutíferas, uma vez que não só não foram pagas as prestações do contrato de 4-7-12, como também não foi paga a prestação única relativa ao contrato de moratória de 5-2-15.

36) A 6-8-15, o R. BB, em representação da sociedade “EE”, deu início a um processo especial de revitalização, descrevendo da seguinte forma a situação económica da sociedade:

“4. Sucede que nos últimos anos, e em resultado da crise económica, que não deixou incólume nenhum sector de atividade, e em especial a construção civil, onde a aqui apresentante insere a sua atividade principal, sofreu a ora Apresentante uma elevada desalavancagem financeira;

5. Pois que, não bastasse já a quebra e recessão do sector imobiliário, acresce, ainda inúmeros entraves “burocráticos” que obstaram ao concreto desenvolvimento da sua atividade,

6. Como também, uma série de agravantes relacionados com custos financeiros, por força de negócios inconclusos, logo desvantajosos.

7. Gerando-se, pois, o denominado efeito de “bola de neve”, na medida em que, face ao não desenvolvimento da sua atividade e ao não recebimento dos respetivos montantes provenientes do desenvolvimento da mesma, deixou a aqui apresentante de ter capacidade para responder prontamente aos seus débitos,

8. Que, inevitavelmente, se iam somando e avolumando.

9. Com efeito, no decurso da sua atividade comercial, a situação financeira da apresentante foi-se agravando, facto esse devido a vários fatores, entre os quais, como se disse, a crise generalizada no nosso país,

10. E ainda investimento efetuado no estrangeiro que se revelou de todo quase ruinoso.

11. Mas, também, de facto e essencialmente (não podemos deixar de sublinhar), justificada pelos “contratempos” que foram obstaculizando ao normal desenvolvimento daquela sua atividade.

27. Como se evidencia pelas contas dos três últimos exercícios (2012 a 2014) da sociedade aqui apresentante, tem apresentado prejuízos para efeitos fiscais mas, certo é que, do grande esforço e compreensão dos credores e, ainda, pelo recurso a crédito de terceiros (particulares) e/ou a venda dos imóveis já com contratos promessa realizados, a apresentante reúne as condições favoráveis para nas contas futuras apresentar já lucro tributável (cf. docs. nºs 2 a 7)”.

37) De acordo com o que consta no próprio requerimento inicial do “PER”, o passivo acumulado era de € 6.891.409,22.

38) Na lista dos maiores credores foi colocado, logo em 1º lugar, com um crédito de € 5.391.646,00, o Banco A., crédito no qual se incluíam as dívidas referidas nas anteriores secções “A” e “B” deste capítulo II.

39) O processo especial de revitalização foi distribuído à … Secção de Comércio J… – … – da Instância Central do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, recebendo o nº 7181/15.7T8VNG e no âmbito do qual foi nomeado como Administrador Judicial Provisório GG.

40) O processo especial de revitalização terminou sem a aprovação de um plano de revitalização, porque o Banco A. apercebeu-se de uma das muitas estratégias inventadas pelo 1º R., enquanto sócio-gerente da “EE”, para frustrar os seus créditos.

“(…)

4 - O maior credor do devedor é o HH com um crédito reclamado no valor de 6.237 milhares de euros, único financiador do empreendimento e que recusou entrar em qualquer acordo por se sentir traído na confiança comercial que tinha com o devedor. A causa desta desconfiança prende-se com o facto de o devedor ter efetuado 16 contratos-promessa pela venda de 17 frações no valor de 2.664 milhares de euros, entre 2013 e 2014, sem que o credor tivesse qualquer conhecimento

5 - Os contratos-promessa em causa pressupunham adiantamentos com prazos estipulados e um valor final no ato da escritura. O valor dos adiantamentos que está evidenciado na contabilidade (com entradas em dinheiro por caixa e cheques) cifra-se na quantia de 1.348 milhares de euros e representa 50% do valor de venda nos contratos promessa

6 - Salientamos ainda que pela falta de concretização da escritura por não existir licença de habitação e com o facto de o devedor ver-se confrontado com a devolução em dobro do sinal já entregue, optou por efetuar novos contratos-promessa com eficácia real em Março de 2015, dando por pagos todos os valores em falta, acabando por perder os 1,348 milhares de euros dos restantes 50% que seriam recebidos com a escritura (…)”.

41) A 2-2-16 foi declarada a situação de insolvência da “EE”, no âmbito do proc. nº 741/16.0T8VNG, que corre termos no … Secção de Comércio J… – … – do Tribunal Judicial da Comarca do Porto.

42) A 26-4-16, tendo em conta o facto de os RR. se terem constituído avalistas em livranças que caucionavam dívidas da “EE”, o Banco A. comunicou-lhes o vencimento da totalidade do capital mutuado através dos contratos referidos, concedendo-lhes um prazo até ao dia 5-5-16, para liquidarem as dívidas, conforme se discrimina:

a) € 27.574,17, capital relativo ao contrato de 20-5-98.

b) € 32.386,28, capital relativo ao contrato de 4-7-12.

c) € 100.652,26, capital relativo ao contrato de 5-2-15.

43) No prazo concedido, os RR. não liquidaram o capital em dívida, obrigando o Banco A. a preencher as livranças - que caucionavam os contratos em incumprimento – e a englobar também os juros de mora já vencidos, perfazendo o valor global em dívida de € 173.598,98, conforme se discrimina:

a) A livrança (emitida a 20-5-98) que cauciona o contrato de 20-5-98, foi preenchida com o valor em dívida de € 33.048,90, tendo a data de vencimento de 29-7-16.

b) A livrança que cauciona o contrato de 4-7-12 foi preenchida com o valor em dívida de € 34.837,99, tendo a data de vencimento de 29-7-16.

c) A livrança que cauciona o contrato de 5-2-15 foi preenchida com o valor em dívida de € 105.712,09, tendo a data de vencimento de 29-7-16.

44) A 13-7-16, ambos os RR. foram interpelados, através de cartas registadas com aviso de receção, para procederem ao pagamento das quantias em dívida referidas no artigo antecedente, até à data de vencimento das livranças fixada em 29-7-16.

45) Porém, as livranças em questão não foram pagas então, nem posteriormente, até hoje, por nenhum dos intervenientes, nomeadamente pelos ora RR.

46) O montante em dívida referente a estas responsabilidades (avales prestados em livranças por ambos os RR.) ascende, assim, nesta data (20-12-16), à quantia global de € 178.584,93, que compreende:

a) € 173.598,98 (€ 33.048,90 + € 34.837,99 + € 105.712,09), referente ao capital titulado pelas livranças;

b) € 4.794,19 (€ 912,69 + € 962,10 + € 2.919,39), relativo a juros de mora, à taxa comercial, contados desde a data de vencimento das livranças até à presente data;

c) € 191,77 (€ 36,51 + € 38,48 + € 116,78), referente ao imposto de selo.

47) Ambos os RR. são responsáveis (sic) pelo pagamento das livranças juntas como documentos nºs 7 e 10, estando em dívida, atualmente, a quantia de € 144.586,83.

48) Já o R. BB, é devedor da quantia global de € 178.584,93, referente à dívida emergente das livranças juntas como docs. nºs 4, 7 e 10.

49) A livrança junta como documento nº 4 já foi, inclusivamente, objeto de ação executiva, que recebeu o nº 20492/16.5T8PRT e corre termos na … Secção de Execução J… da Instância Central – … – do Trib. Jud. da Comarca do Porto, enquanto as livranças juntas como docs. nºs 7 e 10 são objeto da ação executiva que recebeu o nº 20493/16.3T8PRT, que corre termos na … Secção de Execução J… do mesmo Tribunal.

50) A 20-5-98, data da celebração do contrato de conta corrente caucionada, os RR. já eram proprietários do imóvel registado nos seus nomes sob a Ap. 35 de 1997/03/06.

- Prédio urbano, composto de casa de cave, rés-do-chão, andar e logradouro, sito na R. …, freguesia de …, descrito na CRP de … sob o nº 1303 e inscrito na matriz predial urbana sob o art. 2661º.

51) Em 2006, os RR. adquiriram o imóvel que ficou registado nos seus nomes sob a Ap. 20 de 2006/10/04:

- Prédio urbano, correspondente a terreno para construção urbana com a área de duzentos e sessenta e seis metros quadrados, sito no Vale …, lote …, freguesia de …, descrito na CRP de … sob o nº 3163 e inscrito na matriz predial urbana sob o art. 5453º.

52) Sem que o A. tivesse conhecimento, a 4-6-12, os RR. doaram à R. DD os dois imóveis atrás referidos, isto é:

a) Prédio urbano, composto de casa de cave, rés-do-chão, andar e logradouro, sito na R. …, freguesia de …, descrito na CRP de … sob o nº 1303 e inscrito na matriz predial urbana sob o art. 2661º.

b) Prédio urbano, correspondente a terreno para construção urbana com a área de 266 m2, sito no Vale …, lote …, freguesia de …, descrito na CRP de … sob o nº 3163 e inscrito na matriz predial urbana sob o art. 5453.º.

Os imóveis descritos estão, atualmente, registados a favor da R. DD sob a Ap. 430 de 2012/06/04.

53) A donatária DD é filha dos RR.

54) Os imóveis objeto de doação têm, de acordo com as avaliações efetuadas para efeitos do imposto municipal sobre imóveis, um valor mínimo global de € 248.388,71:

a) € 225.718,47, relativamente ao prédio urbano, composto de casa de cave, rés-do-chão, andar e logradouro, sito na R. …, freguesia de …, descrito na CRP de … sob o nº 1303 e inscrito na matriz predial urbana sob o art. 2661º;

b) € 22.670,24, relativamente ao prédio urbano, correspondente a terreno para construção urbana com a área de duzentos e sessenta e seis metros quadrados, sito no Vale …, lote …, freguesia de …, descrito na CRP de … sob o nº 3163 e inscrito na matriz predial urbana sob o art. 5453º.

55) A doação destes dois imóveis à sua filha deixou os RR. BB e CC apenas com o direito de compropriedade correspondente a metade do seguinte imóvel:

- Fração autónoma designada pela letra “B”, parte integrante do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, sito na freguesia de …, descrito na CRP de … sob o nº 552 e inscrito na matriz predial urbana sob o art. 7398.º.

56) Porém, este imóvel está onerado com uma penhora no valor global de € 462.028,83, registada sob a Ap. 28 de 2002/08/06, que ultrapassa, em muito, o seu valor real, que não será muito diferente do valor patrimonial tributário fixado em € 51.060,00.

57) Além desta penhora, o imóvel referido está onerado com 4 hipotecas.

58) Os RR. BB e CC não possuem bens móveis dignos de registo (ex. veículos automóveis).

59) A sociedade tinha património suficiente para liquidar os montantes aqui reclamados, atendendo a que possui (à data) 42 imóveis registados e apreendidos à ordem daqueles autos de insolvência.

60) A obrigação de cumprimento prestacional foi sendo cumprida até Maio de 2013.

61) A conta caucionada nº 22…28 foi reduzida em Agosto de 2012 à quantia de € 74.602,00.

62) Certo é que, por conta dos pagamentos verificados em Outubro de 2013 (€ 17.284,84) e Fevereiro de 2014 (€ 29.742,99), o valor remanescente em divida é de € 27.574,17.

63) Depois de 2012 continuaram os 1º e 2º RR. a responder a todas as solicitações do aqui A., tendo anuído nas alterações contratuais que o mesmo apresentava, de motu proprio, de forma a melhor gerir a relação dos contratos mantidos com a sociedade “EE”.

64) Nos anos de 2014 e 2015, formam renegociadas condições de pagamento.

65) Renegociações essas que nunca foram travadas pelo facto dos aqui 1º e 2º RR. não deterem património (imobiliário) pessoal, em seu nome.

66) Nunca foi condição para o aqui A., tendo por referência os contratos de crédito aqui em causa (nºs 22…28 e 21…07), a existência de um qualquer património pessoal dos mesmos.

67) A doação em causa realizada pelos 1º e 2º RR. a favor da sua única filha, resulta de um desiderato pessoal de ambos e não de qualquer objetivo relacionado com o aqui A. Com efeito, e antes de mais, precisamente no ano de 2012, o casal constituído pelo 1º e 2ª RR. atravessou um período conturbado em termos de convivência conjugal. Perante o que a 2ª R. exigiu que, ainda que não avançassem com a dissolução do vínculo conjugal – nomeadamente, por questões religiosas – pusessem fim ao vínculo patrimonial que mantinham. Razão pela qual, tomaram, então, a decisão que ou um ou outro haveria de ficar com os imóveis, liquidando as competentes tornas.

68) Sucedeu que, a aqui 2ª R., conquanto não tinha como liquidar a parte ao seu marido e para que não ficasse sem casa, colocou ao 1º R. como solução acautelar os interesses futuros dos seus filhos, através da doação em causa, assegurando, a mãe da 2ª R. e avó da 3ª R. todos os dispêndios que fossem referentes aos imóveis em causa. Tendo sido, pois, com a ajuda daquela – II – que a doação dos imóveis em questão à filha de ambos – por ser aquela que mais próxima da maioridade se encontrava – acabou por ser realizada. Pondo fim, nessa data, à relação patrimonial entre ambos, de forma a acautelar que nem um nem outro esvaziariam tal património no futuro, nem tão pouco que haveriam de litigar por conta de uma tal questão.

69) Ao que, anuiu o 1º R., garantindo assim o “teto” aos seus filhos e, assegurando que não haveria de suportar mais custos com os ditos imóveis, custos esses, nomeadamente referentes a luz, água, IMI e seguro da habitação de … que, como se disse, passaram a ser assegurados pela referida Dª II.

70) A qual, passou, inclusive a habitar no imóvel com a sua filha e netos.

71) Pois que, doando, por conta da quota disponível, evitavam discussões futuras relacionadas com a partilha de bens comuns.      

72) Preenchendo assim o único desiderato pessoal de ambos: acautelar a esfera patrimonial dos filhos, face à situação periclitante que, à data, vivenciavam em termos matrimoniais.

73) Em momento algum pretenderam os RR. prejudicar quem quer que fosse, muito menos, enganar o aqui A.

74) Nunca os 1º e 2º RR. pretenderam com a doação aqui em causa sonegar qualquer património da esfera de proteção do direito de crédito do aqui A.


III – Decidindo:

1. A matéria de facto provada, integrada pelas normas jurídicas que regulam a ação de impugnação pauliana, como instrumento destinado a preservar a garantia patrimonial do credor, não oferece qualquer dúvida quanto ao acerto do acórdão recorrido e, consequentemente, quanto à improcedência da revista.

O facto de o ato impugnado constituir um contrato de doação, por natureza gratuito, facilita a tarefa, na medida em que, atento o disposto no nº 1 do art. 612º do CC, em tais circunstâncias mostram-se irrelevantes os motivos que presidiram a tal ato.


2. A questão principal que é suscitada e que no acórdão recorrido encontrou uma resposta desfavorável aos RR. recorrentes consiste em avaliar se, pelo facto de o crédito que ao A. foi reconhecido sobre o 1º R. decorrer de livrança subscrita pela sociedade devedora e avalizada por esse 1º R., ficando incompleta quanto ao montante em dívida e data de vencimento, permite concluir que tal crédito é posterior ao ato de doação.

A resposta a esta questão é relevante, na medida em que, atento o disposto no art. 610º do CC, para que a ação de impugnação proceda relativamente a atos que impliquem a diminuição da garantia patrimonial (fora dos casos em que sejam orientados com o fim de impedir a satisfação do direito de crédito), é necessário que, além dos efeitos negativos do ato impugnado na satisfação integral do crédito (pela impossibilidade ou pelo agravamento da possibilidade de ser satisfeito através do património do devedor), o crédito seja anterior ao ato, ou seja que se considere constituído antes de ter sido outorgado o ato impugnado.

Por outras palavras, relativamente ao ato de doação que está em causa, a procedência do pedido de impugnação está dependente do facto de o crédito do A. sobre o 1º R., avalista na livrança em branco, se ter constituído antes dessa doação.


3. Alegam os recorrentes em defesa da sua tese que o aval foi aposto quando a livrança ainda não estava completamente preenchida e que, por isso, o crédito do A. sustentado nesse aval apenas se constituiu na ocasião em que a livrança foi preenchida nos seus elementos essenciais: quantia em dívida e vencimento.

Esta mesma questão já foi apreciada pelo ora relator, noutro contexto processual, mas que aqui mantém atualidade. Assim ocorreu no Ac. do STJ de 15-5-13, 3057/11, em www.dgsi.pt, de que se extrata o seguinte:

“… não pode ignorar-se o que este mesmo Supremo Tribunal de Justiça vem asseverando relativamente à natureza jurídica dos créditos cambiários e das correspondentes obrigações, concluindo que quando se trate de letras ou de livranças sacadas ou subscritas em branco ou em branco avalizadas, o direito de crédito de natureza cartular se constitui simultaneamente com tais atos.

Assim acontece designadamente para efeitos de determinação da anterioridade do crédito que é pressuposto da procedência da ação de impugnação pauliana, nos termos dos arts. 610º, al. a), e 614º do CC (cf. os Acs. do STJ, de 29-11-11, e de 2-5-12, www.dgsi.pt).

Em tais circunstâncias, a constituição da relação cambiária (maxime a que integra o avalista) ocorre em paralelo com a outorga do pacto de preenchimento que define os termos em que o título poderá ser preenchido no que concerne aos elementos em falta, tais como a data de vencimento ou o montante, correspondendo este à quantia que, de acordo com o relacionamento contratual subjacente, se encontre vencido e seja exigível na data em que o título for preenchido.

É verdade que esta questão não obtém unanimidade na doutrina, defendendo uns que a obrigação cambiária apenas se constitui posteriormente, na ocasião em que o título seja preenchido com todos os seus elementos essenciais (neste sentido cf. Pinto Furtado, Títulos de Crédito, p. 145, ou Pereira Coelho, citado no acórdão recorrido e também por Pereira Delgado, Lei Uniforme sobre Letras e Livranças, 7ª ed, p. 83).

Outra é a solução que prevalece na jurisprudência, a qual vem expressa nos Acs. do STJ, de 2-5-12 (fls. 724 e ss.) e de 29-11-11 (fls. 570 e ss.), contando com significativo apoio doutrinal, de onde se destacam Pereira Delgado (ob. e loc. cit.), e Vaz Serra, sendo argumento essencial para se afirmar a anterioridade da constituição da obrigação cambiária o facto de a letra em branco ser suscetível de endosso.

Por isso, justifica-se que se separe o momento da constituição da obrigação cambiária traduzida em letras ou em livranças sacadas ou subscritas em branco daquele em que se efetiva o direito de crédito que naturalmente depende do preenchimento do título.


3.3. Como flui do recente AUJ nº 4/13, no DR, I Série, de 21-1-13, está consolidado o entendimento quanto à autonomia da obrigação do avalista em relação ao avalizado, sendo o aval uma garantia autónoma diretamente prestada ao respetivo beneficiário, mesmo quando se trate de avales apostos em livranças subscritas em branco.

Se as especiais circunstâncias que rodeiam o aval prestado em livrança subscrita em branco impedem que com a declaração de insolvência do avalista se considere imediatamente vencida e exigível a obrigação causal, também pode afirmar-se que a constituição da obrigação cambiária do avalista não está dependente do preenchimento da livrança.

A falta de preenchimento de alguns dos elementos que definem os títulos de crédito não tem como significado a inexistência de qualquer crédito. Pelo contrário, a obrigação do avalista constituiu-se com a aposição do aval, ainda que, tratando-se de aval em branco, a quantificação da obrigação cambiária e a sua exigibilidade fiquem condicionados pela verificação de um evento futuro e incerto: o preenchimento dos elementos em falta.

…”.

Não existe qualquer elemento que permita modificar o referido entendimento, que, aliás, também foi recentemente reafirmado no Ac. deste Supremo de 4-6-19, 65/15, em www.dgsi.pt, sendo evidente a improcedência da questão suscitada, na medida em que o crédito sobre o 1º R. avalista emergente da livrança que foi subscrita e avalizada em branco deve considerar-se constituído na data em que foi aposta a assinatura do avalista, ou seja, antes do ato de doação impugnado através da presente ação.

Nem poderia ser de outro modo, sob pena de periclitar a garantia patrimonial do credor que apenas é satisfeita à custa do património do devedor, pondo-o a salvo de condutas – de que a dos autos é um claro exemplo – de que possa resultar a impossibilidade ou a grave dificuldade de obter o pagamento dos créditos mediante a execução coerciva.


4. Invocam os recorrentes ainda o argumento de que a doação que foi feita à 3ª R. não prejudica a garantia patrimonial do seu crédito, uma vez que a sociedade a quem foram concedidos os financiamentos foi declarada em estado de insolvência mas a massa insolvente integra património imobiliário suficiente para garantir o pagamento da sua dívida perante o A., sem necessidade de recorrer ao património do 1º R. avalista.

A invocação de tal argumento não supera a marca da contrariedade relativamente ao que os recorrentes anteriormente referiram acerca da autonomia do aval. Ademais não consegue ultrapassar o regime legal da responsabilidade do avalista, decorrente do art. 32º da LULL, nos termos do qual tal responsável cambiário responde solidariamente perante o credor.

Como é característico das obrigações solidárias, é legítimo ao credor exigir de cada um dos condevedores o pagamento integral do crédito sem ter que respeitar qualquer ordem preferencial.

Neste contexto, a procedência da impugnação pauliana dirigida contra algum dos credores solidários não fica condicionada pela maior ou menor capacidade patrimonial de outros condevedores, sendo o confronto estabelecido exclusivamente entre o direito de crédito e a situação patrimonial do demandado antes e depois do ato impugnado, como também se decidiu no recentíssimo Ac. deste Supremo de 4-6-19, 65/15, em www.dgsi.pt.

Ora, no caso concreto, não há dúvida de que a outorga da doação dos imóveis esvaziou o património do avalista ao ponto de inviabilizar a cobrança do crédito à custa da execução de outros bens integrados na sua esfera jurídica, o que basta para que improceda a revista e se confirme o acórdão recorrido.


IV – Face ao exposto, acorda-se em julgar improcedente a revista, confirmando-se o acórdão recorrido.

Custas da revista a cargo dos recorrentes.

Notifique.


Lisboa, 11-7-19


Abrantes Geraldes (Relator)

Tomé Gomes

Maria da Graça Trigo