Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1094/10.6TTPRT.P2.S2
Nº Convencional: 4.ª SECÇÃO
Relator: PAULA SÁ FERNANDES
Descritores: REVISTA EXCECIONAL
ADMISSIBILIDADE
Data do Acordão: 03/17/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA EXCEPCIONAL
Decisão: NÃO ADMITIDA A REVISTA.
Sumário :

I- A questão que a recorrente pretende ver apreciada com a revista excecional é sobre ilegalidade, à luz dos princípios cooperativos e de algumas normas constitucionais, na atribuição de subvenções mensais vitalícias a si próprios, pelos membros de gestão de uma Cooperativa de Ensino Superior, sujeita a um regime legal especial, a quem foi reconhecido o interesse público.

II- A Recorrente não alegou qualquer polémica na jurisprudência ou na doutrina sobre a referida questão, aliás, alega que sobre ela inexiste qualquer jurisprudência e/ou doutrina, nem alegou que o quadro legal suscite dúvidas quer na doutrina quer jurisprudência.

III- Não basta à Recorrente alegar que não está de acordo com a decisão proferidas nas instâncias, invocando, designadamente, normas constitucionais e a atribuição de interesse público à instituição/recorrente, para que essa essa divergência configure uma questão complexa de difícil resolução que implique uma decisão deste Tribunal para uma melhor aplicação do direito, ao abrigo da invocada aliena a) do n.º 1 do artigo 672.º do CPC.

IV- Cabe ao Recorrente ónus de justificar o recurso à revista excecional, atento ao disposto no n.º 2 do artigo 672.º do CPC.  

Decisão Texto Integral:


Processo n.º 1094/10.6TTPRT.P2. S1

Recurso de revista excecional

Acordam na Formação prevista no artigo 672.º, n.º 3 do CPC.

Secção Social

A Recorrente, Universidade Portucalense Infante D. Henrique, inconformada com o acórdão da Relação do Porto, proferido em 14.07.2020, interpôs recurso de revista nos termos gerais e, subsidiariamente, recurso de revista excecional com fundamento no disposto no artigo 672º, n.º 1, alínea a) do Código de Processo Civil.  

No Tribunal da Relação, por despacho do Exmo. Desembargador Relator, proferido em 22.12.2022, o recuso de revista apresentado pela Ré/Recorrente não foi admitido por se verificar dupla conforme, com exceção feita ao segmento do acórdão que decidiu, em 1º instância, sobre os efeitos da ilicitude do despedimento.

A Recorrente reclamou junto do STJ, ao abrigo do artigo 643.º do CPC. (apenso junto aos autos). A referida reclamação foi indeferida por acórdão Supremo Tribunal de Justiça proferido em 14.07.2021, transitado em julgado.

Importa agora a apreciar a admissibilidade do recurso de revista excecional presente à Formação a que se refere o artigo 672.º, n.º3 do CPC.  

A Recorrente/Ré, para o efeito, nas conclusões do recurso interposto, formulou a seguinte Conclusão: 

CXXX:  Pelo exposto estamos perante uma questão trazida à liça que se integra num instituto onde inexiste qualquer jurisprudência e/ou doutrina, mais concretamente, sobre a atribuição de subvenções mensais vitalícias pelos membros de gestão de uma Cooperativa de Ensino Superior, sujeita a um regime legal especial, a quem foi reconhecido o Interesse Público, si próprios, questão que, nos termos do disposto 672.º, nº 1 aliena a), do CPC, legitima o recurso excecional de revista.

Vejamos

A revista excecional constitui um alargamento do âmbito do recurso de revista para as situações em que ocorra uma situação de dupla conforme, nos termos do artigo 671.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, não configurando uma forma autónoma de recurso, mas um verdadeiro recurso de revista.

Assim, constatada a ocorrência de uma relação de dupla conformidade entre a decisão da segunda instância, de que se pretende recorrer de revista, e a decisão da primeira instância que da mesma era objeto, o recurso de revista será ainda possível nas situações em que se mostrem preenchidos os pressupostos referidos nas várias alíneas do n.º 1 do artigo 672.º do Código de Processo Civil, ou seja, os pressupostos específicos da revista excecional, cabendo  à Formação, a que alude o art. 672.º, n.º 3, do mesmo Código, a sua  apreciação preliminar sumária.

A Recorrente, como pressuposto da admissibilidade Revista Excecional, invoca o disposto da al. a) do n.º 1 do artigo 672.º do CPC, que dispõe:  

1 - Excecionalmente, cabe recurso de revista do acórdão da Relação referido no n.º 3 do artigo anterior quando: a) Esteja em causa uma questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito;

Sobre o conceito de relevância jurídica, vide acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de Junho de 2010, no processo n.º158/08.0TBRMZ.E1.S1, disponível em www.dgsi.pt), :“(…) só há relevância jurídica necessária para uma melhor aplicação do direito quando se trate de questão manifestamente complexa, de difícil resolução, cuja subsunção jurídica imponha um importante, e detalhado, exercício de exegese, um largo debate pela doutrina e jurisprudência com o objetivo de se obter um consenso em termos de servir de orientação, quer para as pessoas que possam ter interesse jurídico ou profissional na resolução de tal questão a fim de tomarem conhecimento da provável interpretação, com que poderão contar, das normas aplicáveis, quer para as instâncias, por forma a obter-se uma melhor aplicação do direito. (…) o conceito genérico da citada al. a) implica que a questão sub judice surja comoespecialmentecomplexaedifícil sejaemrazão do quadro legal, do uso de conceitos indeterminados, de remissões condicionadas à adaptabilidade a outra matéria das soluções da norma que funciona como supletiva e, em geral, quando o quadro legal suscite dúvidas profundas na doutrina e jurisprudência.

A questão que a Recorrente pretende ver apreciada com a revista excecional é sobre a eventual ilegalidade, à luz dos princípios cooperativos e de algumas normas constitucionais, na atribuição de subvenções mensais vitalícias a si próprios, pelos membros de gestão de uma Cooperativa de Ensino Superior, sujeita a um regime legal especial, a quem foi reconhecido o interesse público.

A referida questão foi decidida de forma idêntica pelas duas instâncias, razão pela qual foi entendido por este Tribunal existir uma situação de dupla conforme, tendo resultado a seguinte decisão: Condenação da Ré a pagar ao Autor, a título subvenção mensal vitalícia pelo desempenho das funções de Diretor de Departamento, a quantia total de € 75 669,3 vencidas e as vincendas no valor mensal de € 1801,65, até à morte do mesmo.

A Recorrente não alegou qualquer polémica na jurisprudência ou na doutrina sobre a referida questão, aliás, alega que sobre ela inexiste qualquer jurisprudência e/ou doutrina, nem alegou que o quadro legal suscite dúvidas quer na doutrina quer jurisprudência.

Na verdade, não basta à Recorrente alegar que não está de acordo com a decisão proferida nas instâncias, invocando, designadamente, normas constitucionais e a atribuição de interesse público à instituição/recorrente, para que essa essa divergência configure uma questão complexa de difícil resolução que implique uma decisão deste Tribunal para uma melhor aplicação do direito, ao abrigo da invocada aliena a) do n.º 1 do artigo 672.º do CPC. Cabe ao Recorrente ónus de justificar o recurso à revista excecional, atento ao disposto no n.º 2 do artigo 672.º do CPC,  o que no caso,  manifestamente,  não sucedeu.

Concluímos assim que não foram apresentados à presente Formação, prevista no n.º 3 do artigo 672.º do CPC, quaisquer elementos que permitam uma ponderação das questões suscitadas no plano dos valores e dos princípios subjacentes à al. a) do n.º 1 do referido artigo 672.º do Código de Processo Civil.

Decisão

Face ao exposto, acorda-se em rejeitar liminarmente o recurso de revista excecional interposto pela Recorrente do acórdão do Tribunal da Relação.

Custas pela Recorrente.

           

STJ, 17 de março de 2022.

Maria Paula Sá Fernandes (Relatora)

Júlio Vieira Gomes

Chambel Mourisco