Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
284/11.9TTTVD.L1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: GONÇALVES ROCHA
Descritores: MÁ FÉ
RECURSO
SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO
ADMINISTRADOR
SOCIEDADE ANÓNIMA
CADUCIDADE DO CONTRATO DE TRABALHO
SUBSÍDIO
ISENÇÃO DE HORÁRIO DE TRABALHO
IRREDUTIBILIDADE DA RETRIBUIÇÃO
DEVER DE OCUPAÇÃO EFECTIVA
Data do Acordão: 11/25/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA EM PARTE
Área Temática:
DIREITO CIVIL - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / FONTES DAS OBRIGAÇÕES / CONTRATOS.
DIREITO DAS SOCIEDADES COMERCIAIS - SOCIEDADES ANÓNIMAS / ADMINISTRAÇÃO DA SOCIEDADE.
DIREITO DO TRABALHO - CONTRATO DE TRABALHO / DIRETOS, DEVERES E GARANTIAS DAS PARTES - VICISSITUDES CONTRATUAIS / SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO POR FACTO RESPEITANTE AO EMPREGADOR - CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO / CADUCIDADE DO CONTRATO DE TRABALHO.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO / MULTAS E INDEMNIZAÇÃO.
Doutrina:
- Coutinho de Abreu, Administradores e Trabalhadores de Sociedades, p.16, nota.
- Galvão Teles, “Impossibilidade Superveniente, Absoluta e Definitiva da Entidade Patronal Receber a Prestação de Trabalho”, publicado em Estudos de Homenagem ao Professor Doutor Inocêncio Galvão Teles, vol. IV, p. 1079 e ss..
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGO 406.º.
CÓDIGO DAS SOCIEDADES COMERCIAIS (CSC): - ARTIGO 398.º, N.º2.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 542.º, N.ºS 2 E 3.
CÓDIGO DO TRABALHO (CT): - ARTIGOS 129º, Nº 1, ALÍNEA D), 298.º, 343.º, AL. B), 346.º, 347.º
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGO 53.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 9/4/2008, PROCESSO N.º 1695/07, ACESSÍVEL EM WWW.DGSI.PT ;
-DE 23/9/2009, PROCESSO N.º 3843/08, EM WWW.DGSI.PT ;
-DE 27/2/2013, PROCESSO Nº 4/09.7TTVRL.P1.S1;
-DE 10/7/2013, PROCESSO N.º 101/12.2TTABT.S1;
-DE 23/10/2013, PROCESSO N.º 70/11.6TTLSB.L1.S1.
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ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:
-N.º 1081/96, DE 9/10/96, DR, II SÉRIE DE 13/12/96; E, N.º 259/2001, DE 30/5/2001, DR, II SÉRIE DE 2/11/2001.
Sumário :
I- A Decisão de condenação como litigante de má-fé apenas comporta um grau de recurso, conforme resulta do nº 3 do artigo 542º do CPC actual, pelo que tendo a Relação apreciado essa questão, confirmando a decisão da 1ªinstância, não é a mesma passível de recurso de revista.

II- Existindo uma absoluta incompatibilidade entre os vínculos laboral e de administração, o exercício das funções de um Administrador societário não pode assentar, nunca, num contrato de trabalho.


III- O trabalhador nomeado administrador, por deliberação da entidade empregadora, fica com o seu contrato de trabalho suspenso, nos termos do nº 2 do artigo 398º do CSC, ainda que tenha mantido as funções que anteriormente desempenhava, suspensão que também ocorre em relação aos contratos de trabalho com duração inferior a um ano.

IV- A impossibilidade do empregador receber o trabalhador deve ser entendida nos termos gerais de direito, isto é, em moldes similares ao regime comum da impossibilidade de cumprimento não imputável ao devedor e que consta do artigo 790º e seguintes do CC, à luz do qual essa impossibilidade é caracterizada como superveniente, absoluta e definitiva.

V- Apesar das naturais dificuldades decorrentes da sua nacionalização, viola o dever de ocupação efectiva do trabalhador o empregador que está três anos sem lhe atribuir qualquer actividade, apesar da insistência do trabalhador em ver resolvida essa situação..

VI- Quando a isenção de horário de trabalho é estabelecida no contrato de trabalho, a sua retirada apenas pode ter lugar com o acordo das partes, se a sua atribuição foi determinante da vontade de contratar do trabalhador, sob pena de violação do regime constante do artigo 406º do Código Civil.

Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

1---

AA intentou uma acção com processo comum, emergente de contrato de trabalho contra

Banco BB, SA, pedindo a condenação da ré:

a) A atribuir ao Autor funções compatíveis com a sua categoria profissional de Director, nível 16;

b) Com reposição da sua carreira directiva e consequente cessação da situação de inactividade forçada a que o mesmo foi votado, atenta a violação do seu dever de ocupação efectiva;

c) No pagamento da quantia mensal de 7.076 euros anteriormente paga pela BBB Rent e posteriormente MM – Multiauto devida e não paga desde Setembro de 2009 e que perfaz, nesta data, 183.976,00 euros e vincendas;

d) Também no pagamento da gratificação anual de 17.500,00 euros a qual, constituindo retribuição, nunca foi paga pelo Réu, desde 1999, quantia a apurar em liquidação de sentença.

e) A atribuir ao Autor novo veículo automóvel, de acordo com o contrato de trabalho em vigor entre as partes e por força da execução do mesmo;

f) No pagamento da compensação pelos danos patrimoniais resultantes da não disponibilização tempestiva da nova viatura ao Autor, no montante mensal de 500 euros, o que perfaz 21.000 euros, à data da entrada em juízo da presente PI;

g) E bem assim, o pagamento dessa quantia mensal até à efectiva substituição da viatura;

h) Pelo protelar do exercício do direito do Autor à alienação da viatura BMW, matrícula -ZC, a qual por inexistência de outra continua a utilizar para fins profissionais e pessoais no pagamento ao Autor de indemnização, a título de lucros cessantes, no valor de 10.000 euros;

i) Caso não cumpra pontual e integralmente as decisões que o Tribunal venha a determinar, relativamente ao pedido da alínea f), g), h), deverá o Réu ser condenado a pagar, por cada mês de incumprimento ou de cumprimento defeituoso, na data devida e da não atribuição de veículo automóvel novo, uma quantia em dinheiro não inferior a 950 euros, a título de sanção pecuniária compulsória.

j) A manter o pagamento da retribuição correspondente à Isenção de Horário de Trabalho, a qual não poderá ser retirada pois faz parte das condições retributivas acordadas e contratadas entre Autor e Réu na data da celebração do contrato de trabalho;

k) A reparar os danos não patrimoniais que causou ao Autor, pagando para tal uma indemnização compensatória no valor de 7.500 euros,

l) No pagamento de juros de mora, calculados à taxa legal de 4%, vencidos e vincendos, desde a entrada em Juízo da presente petição sobre as quantias referidas nas alíneas c), f), h) supra;

m) Ser, finalmente, condenado no pagamento das custas do processo, de procuradoria condigna e dos demais encargos legais.”

Alegou para tanto que, em 1998, foi convidado para integrar os quadros da ré, com vista a assumir o desempenho de cargo de presidente do conselho de administração de empresa ligada ao respectivo grupo económico.

Foi então acordado entre o autor e o presidente do conselho de administração da ré que aquele integraria os quadros da ré com a categoria de director de nível 16 e que a sua retribuição seria composta por várias parcelas que acresciam à remuneração base do ACT incluindo isenção de horário de trabalho, quantitativo para despesas, complemento mensal, viatura e gratificação anual, valores que em 2008 atingiam um quantitativo mensal de 10.732,47 euros, pagos catorze vezes por ano.

Mantendo sempre o seu vínculo com a ré o autor, por interesse desta e de acordo com as suas instruções, foi exercendo funções de administração em diversas empresas do respectivo grupo económico, até que com a sua nacionalização foram nomeados novos órgãos de administração.

Na sequência desta intervenção, o autor comunicou aos recursos humanos da ré a sua total disponibilidade para iniciar as funções que lhe fossem determinadas, solicitando indicação sobre onde e quando se deveria apresentar. Não obstante, não lhe foram atribuídas quaisquer funções e foi-lhe retirada parte da sua remuneração que vinha sendo paga por uma das empresas do grupo, posteriormente liquidada com referência aos meses em falta e novamente não mais liquidada.

Não obstante todas as diligências efectuadas pelo autor no sentido de lhe serem atribuídas funções e reposta a sua estrutura salarial, não logrou este qualquer resposta da ré até que, decorrido um ano sobre a nacionalização desta, lhe foi determinado que se apresentasse no seu departamento de recursos humanos.

Porém, quando o autor esperava que lhe fossem atribuídas funções, foi-lhe determinado que ocupasse um espaço aberto junto ao referido departamento onde, conjuntamente com outros trabalhadores que não tinham funções atribuídas, permanecia sem qualquer actividade, situação que se mantém à data da instauração desta acção, não obstante todos os esforços e diligências efectuadas pelo autor com vista à resolução da situação.

A gratificação anual acordada entre o autor e a ré nunca foi liquidada por o autor não ter aceitado a proposta inicial do então presidente do conselho de administração no sentido da mesma ser liquidada “fora do recibo de vencimento”. Acresce que desde 2009 deixou de ser liquidada uma prestação mensal da retribuição do autor acordada com a ré, que era então de 7 076 euros, que sempre foi paga com regularidade e catorze vezes por ano, parcela essa que foi determinante na celebração do contrato de trabalho pelo autor.

Acresce que foi acordado no contrato de trabalho celebrado que o autor tinha direito à atribuição de viatura automóvel, para uso pessoal e profissional, com substituição da mesma decorridos três anos e com direito a aquisição da mesma pelo valor residual de 6% sobre o valor da compra. Não obstante ter anteriormente procedido à substituição das viaturas atribuídas ao autor com atribuição de novas viaturas, a ré não procedeu à atribuição de nova viatura após o autor ter adquirido, no início de 2008, aquela que então lhe estava atribuída.

Para além do incumprimento consubstanciado na não atribuição de viatura, a situação criada pela ré obrigou o autor a manter a utilização da que havia adquirido, impossibilitando-o de proceder à sua alienação, fazendo seu o respectivo valor, tal como o obrigou a suportar os encargos de manutenções e utilização da mesma.

Em Maio de 2011, a ré determinou a retirada de isenção de horário de trabalho ao autor, deixando de processar o quantitativo correspondente no seu vencimento mensal, e incumprindo as condições retributivas acordadas entre as partes. Esta decisão da ré surgiu dias depois de o autor ter recusado uma proposta de acordo de cessação de contrato de trabalho e passagem à situação de reforma, uma vez que o mesmo configurava uma rescisão unilateral.

Para além dos danos de natureza patrimonial decorrentes da privação de parcelas da retribuição mensal, do não pagamento da gratificação anual ao longo de toda a execução do contrato e da não atribuição de viatura, a conduta da ré causou danos na imagem do autor junto dos seus colegas de trabalho, abalou de forma severa a sua auto- ‑estima, atentou contra a sua dignidade, com reflexos na sua vida pessoal, familiar e social, logrando a ré com a sua conduta causar danos profundos e irreparáveis na imagem do autor enquanto funcionário bancário e enquanto pessoa.

Frustrada a conciliação efectuada na audiência de partes, veio a ré contestar concluindo pela improcedência da acção e alegando que o autor confunde o contrato de trabalho que celebrou com o compromisso do anterior presidente do conselho de administração da ré de o nomear para o exercício de cargos de administração noutras empresas, sendo que o exercício do cargo de administrador nada tem a ver com o contrato de trabalho que o autor celebrou com a ré e no qual era admitido com a categoria de director, tanto mais que não existe qualquer contrato de trabalho para administrador.

Daí que os valores que o autor auferia enquanto administrador de outras empresas nada tenham a ver com o valor devido em função do contrato de trabalho, sendo valores que as empresas das quais o autor era administrador suportavam, não sendo devidos pela ré a qual é, em relação aos pedidos que respeitam a tais valores, parte ilegítima.

A ré deixou de processar o valor correspondente à isenção de horário de trabalho por tal ter sido estabelecido em função do exercício do cargo de administrador que o autor exercia e não se justificar tal pagamento uma vez que já não é administrador.

Mais refere que, com o processo de nacionalização e de separação dos grupos de sociedades, a ré deixou de ter trabalho para o autor, apenas não tendo cessado o contrato com este, que na realidade trabalhava para outra sociedade, devido à grande confusão e ao período conturbado que então atravessou.

A ré sempre procurou encontrar uma colocação do agrado do autor tendo mantido este afecto à direcção de recursos humanos apenas enquanto procurava ocupação para ele, factos que eram por si conhecidos e aos quais deu a sua anuência.

Conclui pela improcedência da acção com a consequente absolvição da ré de todos os pedidos formulados.

Respondeu o autor refutando a procedência da arguida excepção de ilegitimidade invocada pela ré e concluindo pela legitimidade desta. E alega que a ré litiga com má-fé quando refere que sempre procurou arranjar-lhe colocação, ou quando refere que tentou negociar a passagem deste à reforma ou quando invoca a sua situação após a nacionalização como fundamento para o seu comportamento, pois nunca aceitou ficar sem funções atribuídas.

Termina pedindo a sua condenação como litigante de má-fé.

Veio, entretanto, o autor apresentar articulado, nos termos do art. 28º do Código de Processo do Trabalho, referindo que após a instauração da acção a ré consumou a ameaça de retirada de isenção de horário de trabalho, deixando de processar a quantia respectiva. Alega ainda que, já na pendência dos presentes autos e após ter sido citada, a ré comunicou-lhe a caducidade do seu contrato de trabalho, o que fez de forma unilateral e sem que estejam verificados o respectivos pressupostos legais, facto que teve como resposta uma carta do autor na qual manifestou a sua discordância em relação a tal decisão de caducidade não a aceitando.

E termina pedindo que seja:

“a) Condenado a R a manter o pagamento da retribuição correspondente à Isenção de Horário de Trabalho, a qual não poderá ser retirada, pois faz parte das condições retributivas acordadas e contratadas entre Autor e R na data da celebração do contrato de trabalho;

b) Condenada a que seja considerada nula e de nenhum efeito a caducidade do contrato de trabalho por si operada, de forma unilateral, com as legais consequências;

c) E, consequentemente, condenada a reintegrar o Autor ao seu serviço com todos os direitos inerentes, designadamente de natureza retributiva e funcional;

d) Sendo condenada a pagar ao Autor as retribuições que se vencerem a partir de 17 de Outubro de 2011 e que perfazem, até à data, a quantia de 10.732,47 euros, bem como juros à taxa legal sobre as mesmas;

e) Finalmente, ser condenada a R no pagamento das custas do processo, de procuradoria condigna e dos demais encargos legais.”

Respondeu a ré reiterando o que havia alegado em sede de contestação relativamente à isenção de horário de trabalho. Mais refere que o autor nunca foi funcionário bancário, pelo que, não possuindo para tal habilitações, não é a ré obrigada a criar um posto de trabalho apenas para o ocupar. Daí que não existindo quaisquer funções que lhe possam ser atribuídas verifica-se uma situação de impossibilidade superveniente e absoluta de o autor prestar a sua actividade à ré, donde a sua decisão de declarar a caducidade do contrato cujos requisitos entende estarem verificados.

Conclui pela improcedência da acção.

Procedeu-se à realização de audiência de preliminar na qual foram estabelecidos os factos assentes, fixada a base instrutória e determinadas as provas a realizar.

Realizada a audiência de julgamento, o tribunal decidiu a matéria de facto e proferiu sentença com a seguinte decisão:

“Termos em que, com a fundamentação de facto e de direito acima enunciada, se decide julgar a presente acção procedente por provada e assim:

I. Declarar a nulidade da declaração de caducidade do contrato de trabalho operada pela ré Banco BB, SA, em 12-10-2011, com a consequente subsistência do contrato de trabalho celebrado entre o autor AA e a ré em 30-6-1998 e reintegração daquele nos quadros desta e liquidação das respectivas remunerações desde então vencidas;

II. Condenar a ré a cessar a violação do dever de ocupação efectiva do autor atribuindo-lhe funções compatíveis com a sua categoria profissional (director de nível 16);

III. Condenar a ré a pagar ao autor a parcela da sua remuneração mensal no montante de 7 076,00 euros (sete mil e setenta e seis euros), liquidada catorze vezes por ano, vencidas e vincendas desde Setembro de 2009;

IV. Condenar a ré a pagar ao autor a gratificação anual de 17 500 euros (dezassete mil e quinhentos euros) vencidas e vincendas desde 1999;

V. Condenar a ré a pagar ao autor a quantia mensal de 1 128,13 euros (mil cento e vinte e oito euros e treze cêntimos) correspondente a isenção de horário de trabalho contratualmente fixada vencidas e vincendas desde 1-9-2011;

VI. Condenar a ré a proceder à atribuição ao autor de novo veículo automóvel nos termos e com as características estabelecidas no contrato de trabalho;

VII. Condenar a ré a pagar ao autor a quantia que se apurar em execução de sentença relativamente ao valor mensal da utilização pessoal de viatura automóvel, com as características da devida em execução do contrato de trabalho, desde Fevereiro de 2008 e até efectiva atribuição de viatura como determinado supra em VI;

VIII. Condenar a ré a pagar ao autor a quantia que se apurar em execução de sentença relativamente ao valor, a título de indemnização por lucros cessantes, pelos danos decorrentes do protelamento da substituição da viatura;

IX. Condenar a ré a pagar, por cada dia de incumprimento após no trânsito da presente decisão da obrigação de atribuição de viatura automóvel uma sanção pecuniária compulsória no valor diário de 300 euros (trezentos euros);

X. Condenar a ré a pagar ao autor a quantia de 7 500 euros (sete mil e quinhentos euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais;

XI. Condenar a ré no pagamento de juros de mora à taxa anual de 4% sobre os quantitativos referidos em IV, VII e VIII desde 28-7-2011 e até efectivo e integral pagamento;

XII. Condenar a ré no pagamento de juros de mora à taxa anual de 4% sobre os quantitativos mensais devidos ao autor a título de retribuição mensal e decorrentes da declaração de nulidades mencionada em I desde a data de vencimento de cada um deles e até efectivo e integral pagamento;

XIII. Condenar a ré como litigante de má-fé na multa de 100 (cem) UC;

XIV. Condenar a ré no pagamento das custas do processo.”

Inconformada apelou a R, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa acordado em julgar parcialmente procedente o recurso, alterando a sentença quanto ao montante da condenação como litigante de má fé, cujo valor se fixou em 20 (vinte) UCs, e confirmando em tudo o mais a decisão recorrida.

Novamente inconformada traz-nos a R a presente revista, rematando a sua alegação com as seguintes conclusões:

1.            Quer o Tribunal de 1ª Instância, quer o Acórdão recorrido, definiram o contrato do recorrido com o recorrente como um contrato de trabalho.

2.            Não concorda o Recorrente com a qualificação das obrigações assumidas na "side letter" que o acompanhou.

3.            Em nosso entender inexiste qualquer contrato de trabalho para funções de administrador de uma sociedade anónima. Tal constitui uma impossibilidade.

4.            A caracterização da relação que se estabelece entre a sociedade administrada e os seus administradores, na esteira de BRITO CORREIA é um contrato de administração.

5.            Esta relação de administração não pode ser qualificada como contrato de trabalho.

6.            De facto, os administradores são eles próprios os representantes da sociedade, não podendo, logicamente, incorporar simultaneamente as posições jurídicas de empregador e empregado.

7.            Inexiste qualquer contrato de trabalho para funções de administração.

8.            O Recorrido não tem, nem nunca poderia ter um contrato de trabalho para Presidente do Conselho de Administração de uma sociedade anónima.

9.            As regalias que seriam devidas ao Recorrido por força deste contrato, explanadas na "side letter" descrita no ponto 2 dos factos dados como provados, deixaram assim de ser devidas no momento em que aquele deixou de integrar os órgãos sociais de qualquer empresa do grupo.

10.          A remuneração acordada na “side letter" só poderá assim ser entendida em função do mandato social que foi prometido e não em função do contrato de trabalho efectivamente celebrado e descrito no ponto 1 dos factos dados como provados.

11.          Considerando que este contrato não poderá ser entendido como contrato de trabalho celebrado com o Recorrente, teremos forçosamente que concluir que o mesmo cessou com a cessação do mandato dos órgãos sociais de que o Recorrido fazia parte.

12.          Assim, todas as prestações patrimoniais que implicam a existência ou a subsistência deste contrato deixaram de ser devidas desde esse preciso momento.

13.          Efectivamente o Recorrido foi contratado para exercer funções de administração em empresas do grupo. Foi para estas funções específicas que foi contratado não tendo, até à nacionalização e à separação das empresas integrantes do grupo MM, exercido qualquer função no banco réu.

14.          A nacionalização, e os problemas que a ela conduziram, eram absolutamente imprevisíveis no momento da contratação.

15.          Acontece que a realidade se alterou e o universo das empresas para a administração das quais o recorrido foi à partida contratado deixou de existir. O grupo MM foi desmembrado pela nacionalização e tornou-se de facto e objectivamente impossível a prestação pelo recorrido das funções para as quais tinha sido contratado.

16.          Esta realidade insere-se assim na previsão do artigo 343º, alínea b) por se ter tornado, de forma superveniente, impossível ao recorrente receber a prestação de trabalho do recorrido.

17.          Assim sendo, a recorrente conclui pela legalidade da caducidade do contrato de trabalho invocada.

18.          Constitui facto notório que a Recorrente, à data dos factos, se encontrava numa situação absolutamente excepcional e delicada.

19.          Situação esta que levou à sua nacionalização, facto raro e absolutamente excepcional e que, como tal, implicará que se olhe para a situação em concreto como absolutamente anómala e sem termo de comparação pelo menos nos passado mais próximo.

20.          A desocupação objectiva sofrida pelo Recorrido tem assim que ser enquadrada por este conjunto de circunstâncias.

21.          Ora, não se verificou no caso presente a existência de qualquer actuação de má-fé por parte do empregador.

22.          Toda a actividade do banco se viu afectada de forma substancial pelas circunstâncias que rodearam a intervenção estatal no BBB.

23.          Não houve assim má-fé na conduta para com o Recorrido mas apenas um desfavorável acumular de circunstâncias que na prática impediram que o problema da colocação deste quadro fosse resolvido com maior celeridade.

24.          Existem assim circunstâncias objectivas e, não subjectivas, para que o Recorrido tenha estado sem funções atribuídas, justificado pelo condicionalismo específico descrito.

25.          A situação de desocupação do Recorrido deve assim ser analisada dentro de todo o circunstancialismo descrito e como tal não deverá ser considerado como verificada a violação do dever de ocupação efectiva o que acarretaria a inexistência, pela falta de ilicitude na actuação do banco Recorrido, do direito ao ressarcimento dos danos não patrimoniais.

26.          Ainda que se entendesse que a actuação do Recorrente em relação ao Recorrido foi ilícita sempre se dirá que o quantitativo da condenação relativo aos danos não patrimoniais é manifestamente exagerado.

27.          Relativamente à viatura remete-se aqui para o estipulado no regulamento da atribuição de viaturas e que era do conhecimento do Recorrido como foi dado como provado.

28.          A atribuição de viaturas não era automática ficando dependente de uma deliberação do conselho de administração,

29.          O simples facto da viatura constar da carta que acompanha o contrato de trabalho não é por si só suficiente para considerar que a esta viatura não se aplicaria o regulamento de atribuição de viaturas.

30.          O facto do contrato de trabalho especificar um instrumento de trabalho com a relevância que reveste uma viatura automóvel não transforma esta em nada mais do que isso, um instrumento de trabalho.

31.          Conclui-se assim que a viatura em causa não constituía retribuição e como tal poderia ser livremente retirada pela Recorrente.

32.          Resulta evidente das circunstâncias que rodearam, quer a contratação, quer a sucessão de cargos exercidos pelo Recorrido, a existência duma extrema confiança da administração que o foi nomeando para os diversos mandatos em empresas do grupo MM.

33.          Esta especial ligação percebe-se até pelo facto de, em 2001 e depois de verificado todo um conjunto de irregularidades descritas no relatório da auditoria interna realizado pela testemunha CC, a administração do grupo MM liderada pelo Dr. DD ter mantido a "confiança" no Recorrido, nomeando-o para a administração de outra empresa do grupo.

34.          Ora esta situação e manutenção do recorrido em cargos de alta responsabilidade no grupo, mesmo depois de detectadas as irregularidades, só poderá significar que este gozava de grande dose de confiança e aposta por parte da administração de então.

35.          Ora, é natural que um administrador que exerceu durante dez anos cargos com a confiança da referida gestão e que beneficiou até da sua benevolência quando apanhado em falso, não viesse a merecer a confiança da administração nomeada pelo Estado no momento da nacionalização.

36.          As condições contratuais acordadas com o Recorrido no momento da sua contratação, e que se poderão considerar aceitáveis e normais para quem iria exercer cargos de tamanha responsabilidade, tornam-se excessivamente "generosas", nas palavras também explanadas no voto de vencido, quando apreciadas à luz da actual situação do banco Recorrido, e tendo em conta que as consequências do cumprimento de tais condições onerarão de forma ainda mais gravosa os contribuintes.

37.          O cumprimento destas condições traduzir-se-ia no recompensar de quem, com a sua actuação em cargos de responsabilidade e com total confiança da administração liderada pelo Dr. DD, contribuiu e forma activa para a situação que obrigou à nacionalização do banco Recorrente com as consequências e custos de todos sobejamente conhecidos.

38.          Este exercício do direito por parte do Recorrido ultrapassa claramente os limites impostos pela boa-fé e pelo fim económico e social do direito e como tal configura uma actuação em manifesto abuso de direito como o mesmo é configurado pelo artigo 334º do Código Civil.

39.          As regalias previstas na "side letter" assinado pelo então Presidente do Conselho de Administração do banco Recorrente não seriam assim devidas.

40.          O facto alegado pelo Recorrente em que o Tribunal alicerça a sua condenação como litigante de má-fé consubstancia-se na expressão "Tendo anuído na situação transitória .. ".

41.          Esta concordância, ou anuência que terá um sentido mais próximo da tolerância do que da concordância, seria mais no sentido até de se conformar num primeiro momento com a situação.

42.          Quando se fala em anuência fala-se no sentido de, num primeiro momento, o Recorrido ter procurado aguardar na expectativa de que o problema da falta de funções viesse a ser solucionado.

43.     Não parece assim à recorrente que tenha litigado com má-fé ao alegar o que alegou na sua contestação.

            Pede-se assim a revogação do acórdão com a consequente absolvição do recorrente.

O A contra-alegou, pugnando pela manutenção do acórdão impugnado.

Subidos os autos a este Supremo Tribunal, emitiu a Ex.mª Procuradora-Geral Adjunta judicioso parecer no sentido da revogação do acórdão recorrido na parte em que entendeu que vigorou entre as partes um contrato de trabalho para o exercício de funções de administrador, devendo assim revogar-se no que respeita à condenação da R no pagamento de todas as quantias que se enquadram no âmbito da remuneração advinda desse cargo.

E quanto às questões da caducidade do contrato de trabalho e da litigância de má-fé, propugna pela manutenção da decisão recorrida.       

 Preparado o projecto de acórdão e distribuído este pelos colegas Adjuntos, cumpre decidir.

2----

            Para tanto, as instâncias apuraram a seguinte matéria de facto:

1. Em 30-6-1998, autor, como segundo outorgante, e ré, como primeira outorgante, através de documento por ambos subscrito, acordaram que o primeiro era admitido pela segunda para prestar os seus serviços profissionais, sob a direcção e autoridade da ré “com a categoria de DIRECTOR enquadrado no Grupo I Nível 16, do ACTV para o Sector Bancário” (cláusula terceira), mediante o pagamento de uma retribuição mensal “igual à que em cada momento, estiver fixada no ACTV do Sector Bancário para os empregados do nível correspondente” (cláusula quarta), com “direito aos subsídios referidos no ACTV para o Sector Bancário que não revistam a natureza de remuneração e às diuturnidades estabelecidas no referido acordo” (cláusula quinta), estabelecendo que o contrato se iniciaria “no dia 30 de Julho de 1998 e durará por tempo indeterminado” (cláusula décima segunda) e que “A antiguidade e o tempo de serviço do SEGUNDO(A) OUTORGANTE contam-se, para todos os efeitos, designadamente de diuturnidades e segurança social, desde 10 de Junho de 1988 data em que iniciou a sua actividade no Sector Bancário” (cláusula oitava) – alínea A1 dos factos assentes.

2. Em 22-6-1998, a ré, em missiva subscrita pelo seu então presidente do conselho de administração, comunicou ao autor que “No quadro das conversações que temos mantido, tendo em vista estabelecermos um vínculo de trabalho com o grupo BBB, venho, pela presente, confirmar-lhe as condições acordadas ou seja:

1. Admissão nos quadros do BBB com a categoria de Director nível 16, duas horas de isenção de horário de trabalho e reconhecimento de 10 anos de retroactivos na banca, conforme contrato em anexo;

2. Ser-lhe-á concedido crédito para a aquisição de habitação própria, no montante de 30 mil contos.

3. Será nomeado Presidente do Conselho de Administração da EE, com remuneração mensal de 800.000$00 (oitocentos mil escudos) mais despesas justificadas no montante de 250.000$00 mensais;

4. Gratificação anual de três mil e quinhentos contos a disponibilizar da forma que se vier a revelar mais adequada para ambas as partes.

5. Ser-lhe-á atribuída uma viatura até ao valor de cerca de 10 mil contos com direito a ficar com ela ao fim de 3 anos pelo valor residual.” – alínea A2 dos factos assentes.

3. Antes de iniciar funções ao serviço da ré o autor, no período entre 1989-1991, exerceu funções de Director Comercial no Grupo FF, SA, com a categoria profissional de Director – alínea A3 dos factos assentes.

4. No período entre 1991-1995, exerceu funções de Director Geral e Administrador nas instituições GG R…/L…/F… com a categoria profissional de Director – alínea A4 dos factos assentes.

5. E, no período entre 1995-1998, exerceu funções de Administrador no Grupo HH com a categoria profissional Administrador – alínea A5 dos factos assentes.

6. Em meados de 1998, o Autor mantinha uma relação de trabalho subordinado com a empresa II, SA, que fazia parte do Grupo HH, exercendo, ainda, complementarmente, o cargo de Administrador numa outra empresa daquele grupo, concretamente na empresa JJ, SA – alínea A6 dos factos assentes.

7. Sendo então convidado pelo então Presidente Grupo BBB, Dr. DD, no sentido de integrar os quadros do ora Réu, no sentido de assumir a Presidência do Conselho de Administração da BBB EE …, SA – alínea A7 dos factos assentes.

8. A competência do autor aliada à sua experiência profissional e ao seu reconhecimento no meio motivaram o convite do então presidente do Conselho de Administração da ré – alínea A8 dos factos assentes.

9. Em escritura pública outorgada em 28-11-2003, procedeu-se à fusão por incorporação de BBB L… – …, SA, KK – ..., SA e LL – … SA na BB-EE …, SA, mediante a transferência global do património das três primeiras para esta última – alínea A9 dos factos assentes.

10. Tendo a incorporante alterado a firma social para BB – …, SA – alínea A10 dos factos assentes.

11. A BB– EE … SA tinha como objecto social o comércio de aluguer de veículos automóveis, assim como qualquer outro tipo de bens – alínea A11 dos factos assentes.

12. BB – …, SA tem por objecto social a prática das operações permitidas aos bancos, com excepção da recepção de depósitos – alínea A12 dos factos assentes.

13. O autor foi nomeado Presidente do Conselho de Administração do BB EE … – … em 10 de Julho de 1998, tendo em 31 desse mês assumido o referido cargo e sendo, na mesma data, tal facto difundido por todas as empresas do grupo BB – alínea A13 dos factos assentes.

14. Nomeação que voltou a ser repetida para o triénio 1999/2001 – alínea A14 dos factos assentes.

15. Em 2002, o Dr. DD, na sua qualidade de Presidente do Grupo BB e, também do Conselho de Administração da ré, entendeu designar o autor para os cargos de vogal do Conselho de Administração de MM SGPS actualmente MM-Multiauto SGPS e Presidente do Conselho Administração NN SA., OO SA, e PP, SA e de Vogal do Conselho de Administração de diversas empresas do “Grupo MM/BB”, todas elas ligadas ao ramo automóvel, assim como gerente e Administrador de algumas empresas imobiliárias – alínea A15 dos factos assentes.

16. Pouco tempo depois da contratação do autor o presidente do conselho de administração da ré aumentou o seu grupo de empresas, criando uma outra vertente empresarial, que se passou a denominar Grupo MM – …, constituindo-se um grupo de empresas mais alargado, o denominado Grupo MM/BB, com duas vertentes, de um lado, a MM e diversas empresas a ela associadas e, do outro, o BB – Banco BB, SA e diversas empresas a ele associadas, grupo esse que tinha, basicamente, como denominador comum e como figura de topo, a pessoa do Dr. DD – alínea A16 dos factos assentes.

17. Em Junho de 2008, o Dr. QQ assumiu a presidência do grupo MM, entidade que detinha a maioria accionista da ré, tendo sido nomeados novos órgãos sociais, com tomada de posse em 25/06/2008, órgãos nos quais não permaneceu nenhum administrador da anterior equipa de gestão – alínea A17 dos factos assentes.

18. Em 11-11-2008, assumiu funções uma nova administração da ré para a qual apenas transitou um elemento da anterior administração e integrou um director da ré, sendo os demais oriundos da administração da Caixa RR – alínea A18 dos factos assentes.

19. O autor enviou, em 12 de Novembro de 2008, uma carta à Direcção de Recursos Humanos da ré, com conhecimento ao Conselho de Administração deste, referindo “na minha qualidade de quadro do BB – Banco BB, SA, e em virtude das importantes recentes alterações verificadas no Banco e que culminaram com a promulgação, no dia de ontem por sua Excelência o Senhor Presidente da República, do diploma que procedeu à nacionalização do Banco. No quadro da anterior relação de Grupo (MM/BB) e apesar de, como referi, ser quadro do Banco e de ter sido admitido com a finalidade de assumir o cargo de Presidente do Conselho de Administração da sociedade BB EE – … S.A. (actualmente LL – …. S.A) a verdade é que, por incumbência do Grupo MM/BB, estava adstrito à administração de diversas empresas do universo do Grupo MM/BB, todas elas na vertente da MM. Ora tanto quanto é do conhecimento público, essas empresas não foram objecto de nacionalização e, independentemente da existência de situações anómalas na administração daquelas empresas, o certo é que, na generalidade dos casos, o meu mandato apenas termina no próximo ano. Impõe-se, assim, aliás, como é minha intenção, renunciar a todos os cargos que ocupo naquelas empresas e regressar ao Banco e às funções para as quais fui contratado. Nesta conformidade, venho manifestar a minha disposição de retomar, de imediato, funções no Banco BB/LL. Contudo e atendendo à actual situação do Banco e às questões burocráticas envolvidas, solicito, antes de mais, se digne obter Instruções superiores e, consequentemente, informar-me, com a máxima urgência, a data em que me devo apresentar” – alínea A19 dos factos assentes.

20. Em 12-2-2009, o Autor enviou uma nova carta, à Directora de Recursos Humanos do Réu, com conhecimento ao Conselho de Administração, reiterando o teor da sua carta referida em A19, acusando a falta de resposta à mesma, referindo “o meu mandato como Administrador da MM …, SGPS, SA não foi renovado, tendo terminado no passado dia 31 de Dezembro de 2008, facto que me foi acabado de ser formalmente comunicado. Nessa conformidade e sem qualquer aviso prévio, a MM já não liquidou, relativamente ao mês de Janeiro de 2009, a parte da minha remuneração (do montante mensal bruto de 7 076 euros – sete mil e setenta e seis euros), enquanto quadro do BB, que era suportada por aquela Empresa, no âmbito do acordo que conduziu à minha colocação na administração de diversas empresas do universo do Grupo MM/BB, todas elas na vertente da MM.” e reclamando da ré o pagamento de tal valor – alínea A20 dos factos assentes.

21. Em 14 de Maio de 2009, dirigiu nova carta à Directora de Recursos Humanos da ré, também com conhecimento ao Conselho de Administração do Réu, reiterando o teor das anteriores, voltando a reclamar o pagamento da supra mencionada parcela da sua remuneração mensal, que continuava em falta respeitante ao mês de Janeiro de 2009, reclamando também o valor respeitante aos meses de Fevereiro, de Março e de Abril de 2009, tudo no montante bruto global de 28 304 euros (vinte e oito mil trezentos e quatro euros) – alínea A21 dos factos assentes.

22. Através de carta registada, com aviso de recepção, de 26 de Junho de 2009, dirigida ao Presidente do Conselho de Administração da ré e com a epígrafe “Situação Profissional e Remuneração do Signatário”, o autor invocou perante este que “não recebi, até à data, qualquer resposta às minhas cartas de 12 de Novembro de 2008 e de 12 de Fevereiro e 14 de Maio de 2009, endereçadas, a propósito do assunto em epígrafe, ao Departamento de Recursos Humanos do BB, com cópia ao Conselho de Administração a que V. Exa. preside. Compreendendo, naturalmente, a extensão e complexidade dos problemas com que o BB e V. Exa. se debatem, não me é possível, no entanto e por outro lado, continuar a aguardar, sem mais, uma tomada de posição a propósito da minha situação profissional, até porque, como creio que deverá ser do conhecimento de V. EXª., apenas me tem sido paga uma parte diminuta do meu salário, parte essa que não é suficiente para fazer face aos meus encargos correntes e aos da minha família. Nessa conformidade e uma vez que a única outra alternativa que me restará será o recurso imediato à via judicial, via que, por todas as razões, pretendo evitar, venho fazer uma derradeira tentativa para ultrapassar a actual situação, para o efeito solicitando a V. Exa. o obséquio de me receber, com a máxima brevidade possível, afim, de poder expor o assunto, de viva voz.” – alínea A22 dos factos assentes.

23. O Autor foi convocado para uma reunião, que se realizou no dia 16 de Julho de 2009, tendo o seu interlocutor sido o Dr. SS, elemento da Caixa RR, SA afecto à Direcção de Recursos Humanos do Grupo BB, como seu Coordenador – alínea A23 dos factos assentes.

24. Em 23 de Julho de 2009, o autor dirigiu uma nova carta à Directora de Recursos Humanos da ré na qual reiterou a questão do pagamento, da quantia de 7 076 euros a qual não estava a ser paga, nessa altura desde Janeiro de 2009, reivindicando também o pagamento da gratificação anual de 17.457,93 euros (3.500.000$00) e reclamando ainda o pagamento do complemento da remuneração no montante liquido de 1 246,99 euros – alínea A24 dos factos assentes.

25. Foi ordenado ao Autor, através de contacto telefónico efectuado em 10 de Novembro de 2009, pela Dra. TT, Directora de Recursos Humanos que se apresentasse, no dia seguinte, 11 de Novembro de 2009 – alínea A25 dos factos assentes.

26. O autor apresentou-se nesse dia (11-11-2009) ao serviço, na Direcção de Recursos Humanos – alínea A26 dos factos assentes.

27. O Autor, no dia 11-11-2009, enviou um mail à Dra. TT a chamar a atenção para a não atribuição de quaisquer funções e para as condições físicas do espaço onde se encontrava dispondo apenas de uma secretária e uma cadeira – alínea A27 dos factos assentes.

28. O Autor enviou em 23 de Março de 2011 uma carta à ré, dirigida à pessoa do seu presidente do Conselho de Administração, onde referia “encontro-me desde o início do ano de 2009, numa situação de completa inactividade profissional pois que, desde tal data, não mais me foram atribuídas quaisquer funções. Tal situação, à qual sou completamente alheio e que me é imposta pela minha entidade empregadora (BB), tem-me penalizado severamente, a todos os títulos, desde o profissional ao familiar, com reflexos a nível emocional, como resultado da prolongada situação de inactividade a que venho sendo sujeito, sem qualquer justificação, em clara violação dos direitos que me assistem nos termos do Código do Trabalho e do ACT para o Sector Bancário, bem como ao arrepio do consagrado no contrato assinado entre as partes. Para além disso tenho sido altamente penalizado em termos financeiros, pois desde Setembro de 2009 deixou de me ser paga parte da retribuição que sempre auferi desde que integrei o BB, em 30 de Junho de 1998, bem como de outras parcelas retributivas, que adiante indicarei, sendo que essa redução salarial tem reflexos sérios no cumprimento das minhas responsabilidades para, com o BB, as quais procuro satisfazer pontualmente, mau grado as dificuldades em que me encontro. (…) Nessa conformidade, perante o actual circunstancialismo que, infelizmente, se mantém inalterado, com evidentes prejuízos profissionais, familiares, emocionais económicos para mim e considerando que não vislumbro da parte do BB qualquer iniciativa ou sequer vontade em resolver a minha situação estou seriamente empenhado em solicitar a minha passagem à situação de reforma, por velhice, através da Segurança Social pois já atingi 55 anos de idade, completando também 34 anos de contribuições para o referido regime, ao longo da minha carreira profissional e fruto dos meus já muitos anos de trabalho. Paralelamente e tendo em conta também o disposto no Decreto-Lei 1-A/2011 de 3 de Janeiro desejo passar à situação de reforma, por invalidez, nos termos do ACT para o Sector Bancário, tendo em consideração o tempo de serviço prestado ao BB, de 13 anos (1998/2011) e também o facto dessa instituição, à data da tinha contratação, ter reconhecido a minha antiguidade reportada a 1988”, referindo ainda o não pagamento da quantia mensal de 7 076,00 euros desde Setembro de 2009, acusava o não pagamento da quantia anual de 17 500,00 euros e a mensal de 1.250,00 euros de despesas justificadas bem como a não substituição da viatura automóvel e terminando a missiva “considerando a minha situação profissional de inactividade forçada, a que sou totalmente alheio; considerando também as escassas, para não dizer, nulas possibilidades de inversão da actual situação, pese embora o meu desejo e disponibilidade total para que tal sucedesse; considerando ainda a indisponibilidade manifestada pelo BB, ao longo dos últimos dois anos, em reverter o actual cenário; considerando finalmente que me encontro em condições de requerer à Segurança Social a minha passagem à situação de reforma por velhice (55 anos e 34 anos de contribuições para esse regime); solicito a V.Exa que, com urgência, me seja concedida a reforma por invalidez (nos termos do ACT do Sector Bancário), tendo em conta também as quantias que me são devidas, conforme acima exposto” – alínea A28 dos factos assentes.

29. Em 18 de Maio de 2011, o Réu enviou ao Autor carta na qual lhe comunicou a retirada da isenção de horário de trabalho alegando, relativamente ao “Que, à presente data, o Conselho de Administração, considerou que as funções que actualmente exerce não justificam continuar a estar abrangido pelo regime de Isenção de Horário de Trabalho“, mais acrescentando que a referida retribuição ser-lhe-á retirada com efeitos a partir de 1 de Setembro de 2011 o que veio a acontecer – alínea A29 dos factos assentes.

30. O Autor respondeu por intermédio da carta que remeteu ao Réu, em 30 Maio de 2011 reclamando da ilegal decisão de retirada da isenção de horário – alínea A30 dos factos assentes.

31. O Banco Réu, através da respectiva Direcção de Recursos Humanos, respondeu em 7 de Junho de 2011, referindo “Em resposta à carta que remeteu ao Exmo Presidente do Conselho de Administração do BB, Dr. UU, em 30/05/11, vimos confirmar o teor da nossa carta de 18/05/2011” – alínea A31 dos factos assentes.

32. A 11 de Maio de 2011, o autor foi confrontado com uma nota interna do Réu, emitida pela DRH, “conforme transmitiu à DRH a intenção da passagem à situação de reforma, e, havendo a necessidade de regularizar o período de 10 anos anteriores à sua admissão no BB junto da VV, tendo tal ficado acordado no seu contrato de trabalho, a DRH apresentou proposta ao C.A. do BB. Neste sentido veio o C.A. a deferir tal proposta na condição de cumulativamente com a regularização junto VV do respectivo período, fosse acordado por escrito com o Sr. AA a sua passagem à situação de reforma. Não obstante a passagem à reforma ser um direito que assiste a todos os trabalhadores, nesta situação estaria em causa a regularização do período de 10 anos assumidos pelo BB. Ultrapassada esta situação em concreto, vimos através da presente enviar ao seu cuidado duas cópias do “Acordo”, Desta forma vimos solicitar que proceda à assinatura das duas cópias do “Acordo” que seguem em anexo, agradecendo que os mesmos nos sejam enviados até ao dia 16 de Maio do corrente ano.” – alínea A32 dos factos assentes.

33. Respondeu o Autor, por carta de 16 de Maio de 2011, dizendo que “não transmiti à DRH do BB qualquer intenção de passagem à situação de reforma. Transmiti sim ser detentor de uma certidão emitida peta VV, comprovativa da não existência de quaisquer descontos efectuados pelo BB, para aquela entidade, relativamente ao período de 1988 a 1998, período que, nos termos da cláusula 8.ª do meu contrato de trabalho celebrado em 1998, foi contado pelo BB para efeitos da minha antiguidade bancária. Acresce que, ao ser convocado pelos representantes da DRH para uma reunião inferi que a mesma se deveria à carta que, em 28 de Março de 2011, enviei ao Conselho de Administração do BB, na qual, entre outros assuntos solicitei a minha passagem à situação de reforma por invalidez nos termos do ACT para o Sector Bancário. (….) assim, ao analisar o conteúdo da minuta do “ acordo “, constatei, para minha surpresa, que o mesmo não contempla o que havia solicitado na supra referida carta mas antes uma verdadeira rescisão contratual, a qual não solicitei, nem aceito, com a agravante de que V.Exas dizem ter deferido tal proposta (que não apresentei nestes termos) fazendo dependê-la de uma obrigação do BB de pagar contribuições à VV respeitantes ao período de 1988 a 1998. – alínea A33 dos factos assentes.

34. À carta de 16 de Maio de 2011, respondeu a ré, por carta de 17 de Maio de 2011, dizendo que a minuta de contrato que fora enviada ao autor tinha dado cumprimento ao determinado pelo Conselho de Administração do Réu e que o mesmo assunto iria ser alvo de reapreciação por parte daquele órgão – alínea A34 dos factos assentes.

35. Por carta datada de 12 de Outubro de 2011, a ré comunicou ao Autor “que nos termos do disposto no art. 343/2, alínea b) do Código de Trabalho vigente, o seu contrato de trabalho cessou por impossibilidade superveniente absoluta e definitiva, do BB – Banco BB, S.A. receber a sua prestação de trabalho. A referida impossibilidade, é absoluta ou seja total e definitiva, pois não mais será viável a prestação ou o recebimento do seu trabalho no Banco BB, S.A. face à inexistência de quaisquer funções e cargos disponíveis no Banco compatíveis com a sua categoria profissional, situação que resultou agravada da nacionalização operada na instituição, não sendo previsível que possa vir a desempenhar no futuro funções no BB, S.A. Mais informamos V. Exa. que esta comunicação de caducidade terá efeitos imediatos, sendo considerado o valor de dois meses de retribuição por falta de aviso prévio juntamente com a compensação que será posta à sua disposição nos termos previstos na lei, bem como os demais suplementos que por Direito lhe couberem, designadamente, o subsídio de férias e parte proporcional ao subsídio de Natal.” – alínea A35 dos factos assentes.

36. O Autor enviou em 19 de Outubro de 2011, uma carta à ré, concretamente à Direcção de Recursos Humanos, referindo “Na sequência da Carta de 12 de Outubro de 2011, dessa Direcção em que me foi comunicada a caducidade do contrato de trabalho perante a qual reitero o meu veemente repúdio e relativamente à qual irei, oportunamente, actuar judicialmente, venho, por este meio solicitar a V.Exa, o favor de mandarem debitar a minha conta DO nº … desse Banco, no montante de 38.506,86 euros (Trinta e oito mil quinhentos e seis Euros e oitenta e cinco Euros), quantia que, presumo, tenha sido creditada por V.Exas a título de compensação pela referida caducidade, que, como referi, não aceito” enviando cópia da mesma ao Presidente do Conselho de Administração da CRR chamando a atenção para” todo o circunstancialismo que rodearam o BB desde a sua nacionalização através do dec.lei nº 62-A/2008 de 11 de Novembro, no qual expressamente se garantia a defesa dos postos de trabalho dos seus colaboradores, a verdade e que a actual Administração do BB e seus membros (alguns são ainda administradores da Caixa RR) – CRR, entidade que nos termos da referida legislação é responsável pela gestão do Banco Nacionalizado. Reforça ainda o signatário que a actuação em termos de política de Recursos Humanos é gravemente lesiva dos interesses do Estado, o que poderá implicar responsabilidades pessoais dos mesmos enquanto gestores públicos. Mais informo que, ainda na presente data, enviei carta de idêntico teor a cada dos membros do referido Conselho de Administração” – alínea A36 dos factos assentes.

37. O que veio a ser rejeitado pelo Réu em carta de 26 de Outubro de 2011 enviada ao autor – alínea A37 dos factos assentes.

38. À data da instauração da presente acção o autor auferia a quantia mensal de 2.268,15 euros de vencimento base como director do nível 16 que lhe era liquidada pela ré – alínea A38 dos factos assentes.

39. E a quantia de 1.128,13 euros de isenção de horário de trabalho igualmente liquidada pela ré – alínea A39 dos factos assentes.

40. Quantias às quais acresciam, também liquidadas pela ré, 161,60 euros de diuturnidades, 24,82 euros de subsídio infantil e 192,68 euros de subsídio de alimentação – alínea A40 dos factos assentes.

41. Em Janeiro de 2009, o autor deixou de receber a quantia mensal de 7 076,00 euros, recebendo em Agosto de 2009 o quantitativo referente aos meses de Janeiro a Agosto (2009) – alínea A41 dos factos assentes.

42. A partir de 1 de Setembro de 2011, a ré deixou de pagar ao autor uma parcela da sua retribuição correspondente ao valor da Isenção de Horário de Trabalho – alínea A42 dos factos assentes.

43. Ao autor foi atribuído, em 1998, um veículo automóvel, marca B…, com a matrícula -LO o qual manteve até 2001, data em que o autor optou pela sua compra – alínea A43 dos factos assentes.

44. Nesse mesmo ano de 2001, foi atribuída uma nova viatura ao autor também da marca B…, no caso com a matrícula - -QM, a qual veio substituir a anterior – alínea A44 dos factos assentes.

45. Mais tarde, em 2005, o autor optou pela compra do referido veículo pelo valor residual, tendo-lhe sido disponibilizada outra viatura, também da marca B…, com a matrícula -ZC – alínea A45 dos factos assentes.

46. A remuneração base do autor acordada com a ré compreendia a quantia mensal correspondente à fixada no ACTV do Sector Bancário para os empregados do nível correspondente à categoria de Director, acrescida de subsídio mensal de isenção de horário de trabalho, correspondente a duas horas diárias – alínea A46 dos factos assentes.

47. Em 14-9-2009, o autor integrava uma unidade orgânica com o nome de Área de Transitários, no âmbito de um denominado BB SERVIÇOS – …, A.C.E., situação que se a manteve até 14-10-2011 – alínea A47 dos factos assentes.

48. Na execução do contrato de trabalho o autor sempre cumpriu as suas funções com zelo, diligência e competência, sob as ordens, fiscalização e direcção da ré – ponto 1 da base instrutória.

49. A actividade da empresa II, SA consistia, especificamente, no financiamento à aquisição de automóveis (em regime de ALD) – ponto 2 da base instrutória.

50. Actividade que era similar à desenvolvida na BB EE, SA – ponto 3 da base instrutória

51. Mais acordando que como contrapartida da prestação do seu trabalho para o Grupo BB, a remuneração a auferir pelo autor seria a resultante de um conjunto de parcelas que, para além das referidas na missiva mencionada em 2, compreendia a quantia mensal líquida de Esc. 800.000$00 (oitocentos mil escudos) / 3 990,38 euros (três mil novecentos e noventa euros e trinta e oito cêntimos) – ponto 4 da base instrutória.

52. Bem como da quantia mensal líquida, referente a despesas justificadas, de 250.000$00 (duzentos e cinquenta mil escudos) / 1 246,99 euros (mil duzentos e quarenta e seis euros e noventa e nove cêntimos) – ponto 5 da base instrutória.

 

53. A quantia de 800.000$00 era paga 14 vezes por ano – ponto 6 da base instrutória.

54. Juntamente com a retribuição base e isenção de horário – ponto 8 da base instrutória.

55. Quantias cujo pagamento foi determinante na sua decisão de contratar com a ré – ponto 9 da base instrutória.

56. A estas referidas quantias mensais acrescia uma verba anual de Esc. 3.500.000$00 (três milhões e quinhentos mil escudos) /17457,93 euros (dezassete mil, quatrocentos e cinquenta e sete euros e noventa e três cêntimos) – ponto 10 da base instrutória.

57. E ainda o direito de adquirir, ao fim de cada três anos, pelo seu valor residual, uma viatura cujo valor comercial fosse até cerca de Esc. 10.000.000$00 (dez milhões de escudos) / 49 879,79 euros (quarenta e nove mil, oitocentos e setenta e nove euros e setenta e nove cêntimos) – ponto 11 da base instrutória.

58. A quantia referida em 51 foi actualizada por iniciativa e determinação da ré – ponto 12 da base instrutória.

59. À data da instauração da acção era de 7 076 euros – ponto 13 da base instrutória.

60. Nos primeiros anos tal quantia era paga pelo BB Rent – ponto 14 da base instrutória.

61. Posteriormente, em 2002, era paga pela MM Car – ponto 15 da base instrutória.

62. E à data da instauração da acção era paga pela MM – … – ponto 16 da

base instrutória.

63. Pagamentos assim efectuados por interesse exclusivo e iniciativa da ré – ponto 17 da base instrutória.

64. A qual constava do recibo de vencimento de tal quantia como entidade empregadora – ponto 18 da base instrutória.

65. Nos mesmos termos em que constavam as quantias de vencimento base e isenção de horário que suportava de forma directa – ponto 19 da base instrutória.

66. Tal quantia, referida em 59, havia sido acordada com a ré aquando da celebração do contrato de trabalho, foi determinante para a aquiescência do autor em fazer parte dos quadros directivos da ré – ponto 22 da base instrutória.

67. Com excepção do período entre Janeiro de 2009 e Agosto de 2009 sempre foi paga com regularidade mensal – ponto 23 da base instrutória.

68. O convite do autor para o exercício das funções referidas em 7 teve lugar no contexto da criação do denominado Grupo MM/BPN – ponto 31 da base instrutória.

69. Não obstante as funções que o autor foi convidado para desempenhar, referidas em 13 a 15, continuou a desempenhar a sua actividade sob a direcção, autoridade e fiscalização da ré – ponto 32 da base instrutória.

70. Em Junho de 2008 e ao nível dos órgãos sociais da BB Crédito (ex BB EE Rent) não se verificou qualquer alteração – ponto 33 da base instrutória.

71. As cartas referidas em 19, 20 e 21 não obtiveram qualquer resposta, nem por parte do Conselho de Administração da ré, nem por parte da sua Directora de Recursos Humanos – ponto 34 da base instrutória.

72. Na reunião referida em 23, nada de concreto foi adiantado ao autor quanto ao (não) exercício efectivo das suas funções – ponto 36 da base instrutória.

73. A viatura atribuída ao autor era para utilização quer na sua vida profissional, quer na sua vida pessoal – ponto 37 da base instrutória.

74. O que o autor fez em relação às viaturas referidas em 43 a 45 – ponto 38 da base instrutória.

75. Com conhecimento da ré – ponto 39 da base instrutória.

76. Foi estipulado em 6% do valor residual, sobre o valor de compra, o valor a liquidar pelo autor para exercício do direito a ficar com ela ao fim de três anos – ponto 40 da base instrutória.

77. Em 2005, o valor para aquisição de viatura automóvel havia sido actualizado para

60 000 euros – ponto 41 da base instrutória.

78. O autor, no início de 2008, adquiriu a viatura referida em A45 tal como havia sido acordado – ponto 42 da base instrutória.

79. Após essa aquisição a ré não atribuiu qualquer outra viatura ao autor para substituição da referida em A45 – ponto 43 da base instrutória.

80. Ao contrário do que sucedeu com outros colaboradores da ré – ponto 44 da base instrutória.

81. E não obstante o autor ter interpelado a ré para esse efeito – ponto 45 da base instrutória.

82. Que confiava na atribuição por parte da ré de uma nova viatura – ponto 46 da base instrutória.

83. O autor teve de utilizar a viatura de sua propriedade, referida em A45, para fins profissionais e pessoais, como sempre fez com as viaturas automóveis que a ré lhe disponibilizou desde 1998 – ponto 47 da base instrutória.

84. O autor não vendeu a viatura que detinha – ponto 48 da base instrutória.

85. O autor suportou despesas de manutenção, combustível e de seguros com aquela que é, neste momento, a sua viatura, a qual utiliza em serviço desde Fevereiro de 2008 – ponto 51 da base instrutória.

86. Com a drástica redução do rendimento mensal por si efectivamente recebido, o autor viu-se em sérias dificuldades, as quais não lhe permitiram cobrir os elevados encargos mensais fixos do seu agregado familiar, nomeadamente o próprio crédito à habitação que o Autor contraiu, nos termos do ACT para o Sector Bancário, com a ré, crédito esse que se encontra em mora – ponto 52 da base instrutória.

87. O Autor, sempre contribuiu com o seu trabalho e esforço para o Réu e empresas do grupo a que o mesmo pertence – ponto 53 da base instrutória.

88. Fruto da grande dedicação, profissionalismo e competência com que exerce essas funções e cargos – ponto 54 da base instrutória.

89. Foi um trabalhador que sempre se empenhou e deu o seu melhor para cumprir as funções e tarefas de que foi sendo incumbido, sempre no rigoroso cumprimento dos normativos legais e internos, na defesa dos superiores interesses tal como definidos e divulgados pela ré – ponto 55 da base instrutória.

90. Com mérito reconhecido por esta – ponto 56 da base instrutória.

91. Bem como pela generalidade dos colaboradores com que o autor trabalhou, quer como Director, quer enquanto Administrador – ponto 57 da base instrutória.

92. O trajecto profissional do autor no contexto da ré, ao seu serviço em empresas suas associadas, havia sido marcado por uma actividade altamente dinâmica, com um desempenho muito intenso e interventivo – ponto 58 da base instrutória.

93. Teve relevo e impacto na evolução dos resultados averbados ao longo dos anos, designadamente na BB-EE – Rent SA e MM-M…SGPS – ponto 59 da base instrutória.

94. Por virtude desse desempenho, tanto a nível interno, como no mercado, o autor granjeou uma notoriedade e prestígio assinaláveis – ponto 60 da base instrutória.

95. Com reflexos na boa evolução da actividade das empresas – ponto 61 da base instrutória.

96. O autor estava no auge da sua vida profissional, concretizado pelas realizações que alcançou para a sua entidade patronal – ponto 62 da base instrutória.

97. Quando o autor se apresentou como referido em 26, a ré procedeu à sua colocação num open space, conjuntamente com outros directores da ré, os quais haviam sido colocados no mesmo local – ponto 63 da base instrutória.

98. Colegas seus esses que, tal como o autor, não exercem quaisquer funções – ponto 64 da base instrutória.

99. Todos eles confinados a uma sala, sem rigorosamente nada para fazer – ponto 65 da base instrutória.

100. Todos eles integrando uma listagem de elementos afectos à denominada área de transitários – ponto 66 da base instrutória.

101. Da qual, entretanto, deixaram de constar alguns colegas do autor – ponto 67 da base instrutória.

102. Os antigos colegas e subordinados do autor encontravam-se a trabalhar normalmente e com funções atribuídas – ponto 68 da base instrutória.

103. Os mesmos constatavam a situação de ausência de funções do autor – ponto 69 da base instrutória.

104. O que causava incómodo ao autor – ponto 70 da base instrutória.

105. Que se sentia diminuído enquanto profissional e homem – ponto 71 da base instrutória.

106. Humilhado e vexado – ponto 72 da base instrutória.

107. Afectado no seu bom-nome e dignidade – ponto 73 da base instrutória.

108. Originando um contínuo estado de desmoralização – ponto 74 da base instrutória.

109. Causando um persistente sofrimento psíquico e físico, com perturbações do sono e do humor – ponto 75 da base instrutória.

110. Abalando o seu ânimo e a sua natural alegria de viver, desmoralizando-o de forma notória – ponto 76 da base instrutória.

111. Afectando também, seriamente, o seu ambiente familiar – ponto 77 da base instrutória.

112. E também o seu relacionamento com amigos e pessoas das suas relações – ponto 78 da base instrutória.

113. Provocando o seu isolamento, condicionando a sua vida pessoal, levando-o a afastar-se dos amigos, da família e da própria sociedade que o rodeia – ponto 79 da base instrutória.

114. O mesmo se passando no local de trabalho com séria afectação do ambiente profissional – ponto 80 da base instrutória.

115. A intensa vida profissional do autor resultava numa estreita ligação com a sua vida pessoal, por força da natureza das suas funções de Administrador e dos contactos estabelecidos na decorrência das mesmas – ponto 81 da base instrutória.

116. Face à ausência de funções o autor, perante colegas de trabalho e superiores hierárquicos e clientes, sentia-se vexado e humilhado – ponto 82 da base instrutória.

117. O que lhe causava enorme angústia, humilhação e ansiedade – ponto 83 da base instrutória.

118. E provocava sentimentos de desvalorização, baixa auto estima, tristeza, indiferença e apatia – ponto 84 da base instrutória.

119. Devido ao referido em 97 a 100, o autor viu a sua imagem perante colegas de trabalho, mormente os inferiores hierárquicos e seus subordinados e demais colegas seriamente prejudicada – ponto 85 da base instrutória.

120. Interrogando-se e comentando se o autor teria tido actuação ilícita que justificasse a atitude da ré – ponto 86 da base instrutória.

121. Causando a completa anulação do autor enquanto profissional bancário – ponto 87 da base instrutória.

122. Os efeitos devastadores do escândalo financeiro protagonizado pelo Banco afectam todos os seus trabalhadores, especialmente aqueles que tiveram cargos de responsabilidade no período antecedente à nacionalização – ponto 88 da base instrutória.

123. Independentemente de nada terem a ver com os factos que foram tornados públicos – ponto 89 da base instrutória.

124. A ressonância mediática do caso BB gerou uma imagem muito negativa para todos aqueles que estiveram ou estão associados a essa instituição – ponto 90 da base instrutória.

125. A não atribuição de funções ao autor por parte da ré, no mercado, em geral, e quanto aos colaboradores da ré, em particular, originou um clima de suspeição sobre o autor – ponto 91 da base instrutória.

126. Sendo consequentemente aventado que o seu afastamento se deveria a condutas ilegais ou menos próprias, na sequência da “limpeza” feita na ré – ponto 92 da base instrutória.

127. Sendo o autor confrontado com perguntas sobre a sua situação e se tinha algum envolvimento com o que era noticiado sobre o Banco – ponto 93 da base instrutória.

128. Não era considerado normal que estivesse sem funções atribuídas pela ré, durante um período tão longo, sem que tivesse cometido qualquer infracção ou ilícito – ponto 94 da base instrutória.

129. Tendo o autor muita dificuldade em conceber a sua regeneração profissional na Banca – ponto 95 da base instrutória.

130. O referido em 97 a 100 constituiu e constitui um golpe profundo na vida pessoal e profissional do autor – ponto 96 da base instrutória.

131. A admissão do autor previa o desempenho de função de administrador em outra empresa do grupo – ponto 97 da base instrutória.

132. O pagamento de uma quantia mensal tinha lugar através das empresas em que o autor era colocado pela ré – ponto 98 da base instrutória.

133. O autor possuía particulares competências no ramo financiamento de automóvel – ponto 100 da base instrutória.

134. O grupo MM, era constituído por várias empresas de várias actividades em algumas das quais o autor poderia desempenhar as funções inerentes a essas competências – ponto 101 da base instrutória.

135. O autor tinha conhecimento que era contratado pelos seus conhecimentos específicos e experiência profissional no ramo de financiamento de automóveis (em regime de ALD) – ponto 102 da base instrutória.

136. Uma das parcelas da retribuição do autor era paga por outras empresas do grupo da ré – ponto 105 da base instrutória.

137. Em finais de 2008, o quadro de pessoal da ré era superior às necessidades do volume de negócios que possuía – ponto 107 da base instrutória.

138. Situação agravada pela perda de volume de negócios então verificada – ponto 108 da base instrutória.

139. A Ré teve de levar a cabo vários ajustamentos, sendo forçada a racionalizar os recursos humanos, desde logo porque se viu confrontada com trabalhadores ex-‑administradores da ré, que vendo cessado o seu mandato social pretendiam regressar às suas anteriores funções – ponto 109 da base instrutória.

140. Como era o caso do autor – ponto 110 da base instrutória.

141. A ré afectou o autor à Direcção de Recursos Humanos enquanto procurava uma colocação para o mesmo – ponto 114 da base instrutória.

142. O autor tinha conhecimento da situação referida em 139 a 141 – ponto da base instrutória.

143. A ré propôs ao autor uma cessação do contrato de trabalho e passagem à reforma – ponto 120 da base instrutória.

144. Não existia ou existe trabalho para ocupar todos quantos fazem parte da pesada estrutura da ré – ponto 121 da base instrutória.

145. Face à falta de trabalho e a perda de volume de negócio que se verifica no seio do ré – ponto 122 da base instrutória.

146. Situação da qual o autor tem conhecimento – ponto 123 da base instrutória.

147. A ré possui um regulamento de atribuição de viaturas – ponto 124 da base instrutória.

3---

            Questão prévia:

Inadmissibilidade da revista quanto à má-fé:

            A 1ª instância condenou a R em 100 UCs de multa por litigância de má-fé.

            Na apelação sustentou que não litigou de má-fé pois o recorrido anuiu à sua situação de inactividade.

Tendo a Relação concluído que o A. não concordou com a sua situação de inactividade, e que a R. não se coibiu de alegar na sua defesa que o mesmo anuiu na suspensão do exercício de funções e que esta teve a sua compreensão, acabou por se considerar que esta alegação não pode deixar de ser considerada como litigância de má- ‑fé, nos termos do art. 456º, nº 2, al. b) do CPC, pois só com negligência grave podia afirmar que esta situação de inactividade teve a não oposição do autor.

Por isso, manteve a Relação a sua condenação como litigante de má fé.

No entanto, e por considerar excessivo o montante fixado, reduziu-se a multa para 20 (vinte) UCs.

Na revista continua a R a pugnar pela inexistência de má-fé.

            Mas esta questão não pode ser objecto de pronúncia pelo Supremo Tribunal de Justiça, pois conforme resulta do nº 3 do artigo 542º do CPC actual, a condenação por litigância de má-fé apenas comporta um grau de recurso[1].

Assim sendo, não sendo admissível a revista quanto a este segmento decisório, não se conhece desta questão.

4----

Pretende a recorrente que o A nunca poderia ter celebrado um contrato de trabalho para desempenho de funções de Administração de uma sociedade anónima, pelo que as regalias acordadas têm que ser entendidas em função do mandato social em que foi investido e não como contrapartida dum contrato de trabalho. E nesta linha sustenta que há regalias constantes do ponto 2 dos factos dados como provados que deixaram de ser devidas a partir do momento em que aquele deixou de integrar os órgãos sociais das empresas do grupo.

           

Consta efectivamente da matéria de facto que, em meados de 1998, o A foi convidado pelo então Presidente Grupo BB, Dr. DD, para integrar os quadros da ora Ré e assumir a Presidência do Conselho de Administração da BB EE Rent Comércio e …, SA.

E em 22-6-1998, em missiva subscrita pelo seu presidente do conselho de administração, a R comunicava-lhe que, no quadro das conversações que tinham mantido com vista ao estabelecimento dum vínculo de trabalho com o grupo BB, lhe vinha confirmar as condições acordadas e que eram as seguintes:

 

“1. Admissão nos quadros do BB com a categoria de Director nível 16, duas horas de isenção de horário de trabalho e reconhecimento de 10 anos de retroactivos na banca, conforme contrato em anexo;

2. Ser-lhe-á concedido crédito para a aquisição de habitação própria, no montante de 30 mil contos.

3. Será nomeado Presidente do Conselho de Administração da EE, com remuneração mensal de 800.000$00 (oitocentos mil escudos) mais despesas justificadas no montante de 250.000$00 mensais;

4. Gratificação anual de três mil e quinhentos contos a disponibilizar da forma que se vier a revelar mais adequada para ambas as partes.

5. Ser-lhe-á atribuída uma viatura até ao valor de cerca de 10 mil contos com direito a ficar com ela ao fim de 3 anos pelo valor residual.”

Por outro lado, colhe-se do nº 1 da matéria de facto que em 30-6-1998, autor e ré, através de documento por ambos subscrito, acordaram que o primeiro era admitido pela segunda para prestar os seus serviços profissionais, sob a direcção e autoridade da ré, com a categoria de DIRECTOR enquadrado no Grupo I Nível 16, do ACTV para o Sector Bancário, mediante o pagamento de uma retribuição mensal igual à que, em cada momento, estiver fixada no ACTV do Sector Bancário para os empregados do nível correspondente e com direito aos subsídios referidos naquele ACTV que não revistam a natureza de remuneração e às diuturnidades estabelecidas no referido Acordo, contrato que se iniciaria no dia 30 de Julho de 1998.

             Em 10 de Julho de 1998, o autor foi nomeado Presidente do Conselho de Administração do BB EE …, tendo em 31 desse mês assumido esse cargo, nomeação que voltou a ser repetida para o triénio 1999/2001.

Em 2002, o Dr. DD, na sua qualidade de Presidente do Grupo BB e, também do Conselho de Administração da ré, entendeu designar o autor para os cargos de vogal do Conselho de Administração de MM SGPS, actualmente MM-M… SGPS e Presidente do Conselho Administração NN SA., OO SA, e PP, SA e de Vogal do Conselho de Administração de diversas empresas do “Grupo MM/BB”, todas elas ligadas ao ramo automóvel, assim como gerente e Administrador de algumas empresas imobiliárias.

           

Em 11 de Novembro de 2008, e na sequência da publicação da Lei nº 62-‑A/2008, procedeu-se à dissolução dos órgãos sociais das empresas do universo do grupo MM/BB, tendo o A, por carta de 12 de Novembro, dirigida à Direcção de Recursos Humanos da ré, com conhecimento ao seu Conselho de Administração, referido que:

“[…]na minha qualidade de quadro do BB – Banco BB, SA, e em virtude das importantes recentes alterações verificadas no Banco e que culminaram com a promulgação, no dia de ontem por sua Excelência o Senhor Presidente da República, do diploma que procedeu à nacionalização do Banco. No quadro da anterior relação de Grupo (MM/BB) e apesar de, como referi, ser quadro do Banco e de ter sido admitido com a finalidade de assumir o cargo de Presidente do Conselho de Administração da sociedade BB EE – Rent S.A. (actualmente BB Crédito – IFIC. S.A) a verdade é que, por incumbência do Grupo MM/BB, estava adstrito à administração de diversas empresas do universo do Grupo MM/BB, todas elas na vertente da MM. Ora tanto quanto é do conhecimento público, essas empresas não foram objecto de nacionalização e, independentemente da existência de situações anómalas na administração daquelas empresas, o certo é que, na generalidade dos casos, o meu mandato apenas termina no próximo ano. Impõe-se, assim, aliás, como é minha intenção, renunciar a todos os cargos que ocupo naquelas empresas e regressar ao Banco e às funções para as quais fui contratado. Nesta conformidade, venho manifestar a minha disposição de retomar, de imediato, funções no Banco BB/LL. Contudo e atendendo à actual situação do Banco e às questões burocráticas envolvidas, solicito, antes de mais, se digne obter instruções superiores e, consequentemente, informar-‑me, com a máxima urgência, a data em que me devo apresentar”.

E em 12-2-2009, o Autor enviou uma nova carta à Directora de Recursos Humanos do Réu, com conhecimento ao Conselho de Administração, reiterando o teor da sua carta anterior e acusando a falta de resposta à mesma. E referia ainda que “o meu mandato como Administrador da MM M…, SGPS, SA não foi renovado, tendo terminado no passado dia 31 de Dezembro de 2008, facto que me foi acabado de ser formalmente comunicado. Nessa conformidade e sem qualquer aviso prévio, a MM já não liquidou, relativamente ao mês de Janeiro de 2009, a parte da minha remuneração do montante mensal bruto de 7 076 euros, enquanto quadro do BB, que era suportada por aquela Empresa, no âmbito do acordo que conduziu à minha colocação na administração de diversas empresas do universo do Grupo MM/BB, todas elas na vertente da MM.”

Colhe-se assim de todo o circunstancialismo apurado que até 31 de Agosto de 2009, o A ainda recebeu a parte da remuneração, do montante mensal bruto de 7 076 euros, e que recebia no âmbito do acordo que conduziu à sua colocação na Administração das diversas empresas do universo do Grupo MM/BB, passando a partir desta data, a receber apenas o vencimento de 2.268,15 euros como director do nível 16 que lhe era liquidado pela ré, a que acresciam as quantias de 1.128,13 euros de isenção de horário de trabalho (e que a R deixou de pagar a partir de Setembro de 2011), de 161,60 euros de diuturnidades, 24,82 euros de subsídio infantil e 192,68 euros de subsídio de alimentação.

Coloca-se assim, a questão de saber se depois de cessar as funções de Administrador que exerceu nas diversas empresas do Grupo MM/BB, o A terá direito às restantes contrapartidas que foram acordadas, ou seja:

a quantia mensal de 7 076,00 euros a partir de Setembro de 2009;

o pagamento da “gratificação anual” de 17 500,00 euros;

a quantia mensal de 1.250,00 euros de despesas justificadas;

substituição da viatura automóvel.

As instâncias entenderam que, tratando-se de valores derivados do contrato de trabalho, ao deixar de os satisfazer, a R violou princípio da irredutibilidade da retribuição, acabando por reconhecer ao A esses direitos, advindos da comunicação de 22/6/1998.

 

Ora, a solução depende da resposta à seguinte questão:

O desempenho de funções de presidente do Conselho de Administração duma empresa poderá alicerçar-se num contrato de trabalho? (o próprio A reconhece, conforme se conclui da carta de 12 de Novembro de 2008, que era quadro do Banco tendo sido admitido com a finalidade de assumir o cargo de Presidente do Conselho de Administração da EE).

Esta Secção já se pronunciou sobre uma questão de idêntica natureza, a propósito do desempenho de funções de administrador a coberto da figura da comissão de serviço, e que foi apreciada no acórdão de 9 de Abril de 2008, proferido no processo n.º 1695/07[2], tendo-se então decidido que “a natureza laboral da comissão de serviço torna insustentável a sua utilização como modo de preencher cargos da Administração societária em sociedades anónimas.”

Para tanto argumentou-se que:

 “Conforme têm constituído doutrina e jurisprudência pacíficas, a lei é frontalmente desfavorável ao cúmulo, num mesmo sujeito, das qualidades de Administrador de uma sociedade anónima e de trabalhador, subordinado ou autónomo, dessa mesma sociedade, seja a constituição do vínculo laboral anterior, simultânea ou posterior à da relação de administração.

E revela, além disso, uma particular hostilidade relativamente às situações de trabalho conexas com a relação de Administração.

É o que resulta com clareza do disposto no art. 398.º do Código das Sociedades Comerciais (inscrito no título relativo às sociedades anónimas), que prescreve nos seguintes termos:

1 - Durante o período para o qual foram designados, os administradores não podem exercer, na sociedade ou em sociedades que com esta estejam em relação de domínio ou de grupo, quaisquer funções temporárias ou permanentes ao abrigo de contrato de trabalho, subordinado ou autónomo, nem podem celebrar quaisquer desses contratos que visem uma prestação de serviços quando cessarem as funções de administrador.

2 - Quando for designado administrador uma pessoa que, na sociedade ou em sociedades referidas no número anterior, exerça qualquer das funções mencionadas no mesmo número, os contratos relativos a tais funções extinguem-se, se tiverem sido celebrados há menos de um ano antes da designação, ou suspendem-se, caso tenham durado mais do que esse ano.(…)”.

Assim, o n.º 1 impede a coexistência do vínculo laboral e de Administrador de uma mesma sociedade ao proibir aos administradores de sociedades anónimas, durante o período para o qual foram designados, o exercício, “na sociedade ou em sociedades que com esta estejam em relação de domínio ou de grupo” de “quaisquer funções temporárias ou permanentes ao abrigo de contrato de trabalho, subordinado ou autónomo”, bem como a celebração de “quaisquer desses contratos que visem uma prestação de serviços quando cessarem as funções de administrador”.

Por seu turno, o n.º 2 resolve essa incompatibilidade entre os vínculos laboral e de administração pela suspensão do primeiro com a assunção do cargo de Administrador, se tiver sido celebrado há mais de um ano, e pela extinção do mesmo, se tiver sido celebrado há menos de um ano.

Daqui resulta que o exercício das funções de um Administrador societário não pode assentar, nunca, num contrato de trabalho.

Várias razões justificam esta opção legislativa.

Em primeiro lugar, a tutela da independência, autonomia e idoneidade do Administrador. Neste sentido, a norma insere-se num conjunto mais abrangente, que visa evitar conflitos de interesses e garantir que o Administrador social vá agir em conformidade com o art. 64.º do CSC, isto é, prosseguir o interesse social tendo em conta os interesses dos sócios e dos trabalhadores. Como se refere no Ac. do STJ de 2007.10.17 (Recurso n.º 1615/07, da 4.ª Secção), “competindo ao conselho de administração de uma sociedade, nos termos do artº 405º do indicado Código, gerir as actividades da sociedade – nestas se incluindo, inter alia, a abertura ou encerramento de estabelecimentos, extensões ou reduções assinaláveis da sua actividade, introdução de modificações importantes na sua organização e projectos de fusão, cisão ou transformação [cfr. alíneas g), h), i) e m) do artº 406º] –, torna-se patente a repercussão que aquela gestão possa, eventualmente, vir a ter no universo dos trabalhadores da sociedade, com a consequente possibilidade de surgimento de conflitos de interesses entre aqueles e esta”.

Além disso, o risco acrescido de fraude na constituição de relações laborais. Como escreve Ilídio Rodrigues (20), “a proibição do cúmulo (…) visa evitar que as garantias de estabilidade concedidas pelo Direito do Trabalho restrinjam o funcionamento efectivo do princípio da livre destituição do administrador, evitando-se abusos e fraudes, nomeadamente através da celebração de um contrato de trabalho fictício, anterior à designação, para garantir ao futuro administrador as regalias laborais após a cessação das suas funções”. Assim, perante a nomeação como administrador da sociedade de um seu trabalhador cujo contrato de trabalho tenha sido celebrado há menos de um ano, o n.º 2 do art. 398.º do CSC estabelece a extinção do contrato por a escassa duração do vínculo fazer avolumar o receio de fraude. Embora a situação se não reconduza à contemplada no art. 398.º, n.º 1, in fine - em que o Administrador utiliza o cargo para obter um vínculo com a sociedade quando cessar funções - existe uma grande afinidade entre elas. É lícito, razoavelmente, temer que o Administrador tenha condicionado a aceitação da designação à obtenção de um vínculo que, apesar de anterior – ao menos formalmente – ao exercício do cargo, se projecta sobretudo no futuro, uma vez cessada a Administração. A questão com que se defronta em tais casos o ordenamento reside justamente em evitar celebrações de contratos temporalmente próximos da designação e presumivelmente fraudulentos, para conseguir a manutenção, após a cessação do cargo de Administrador, de um vínculo remunerado com a sociedade.

Finalmente, o perigo de subversão da hierarquia e da organização empresarial, que situações de confusão ou de ambiguidade de papéis potenciam.”

E finaliza o acórdão:

“Haverá pois de concluir-se pela absoluta incompatibilidade dos vínculos laboral e de administração e, também, por uma hostilidade da lei relativamente às relações laborais conexas com a relação de administração….”

Também aderimos a este entendimento que considera existir uma absoluta incompatibilidade entre os vínculos laboral e de administração, posição também seguida no acórdão desta Secção Social de 23/10/2013, processo nº 70/11.6TTLSB.L1.S1, razão pela qual se decidiu que o “trabalhador nomeado administrador, por deliberação da entidade empregadora, fica com o seu contrato de trabalho suspenso, nos termos do nº 2 do artigo 398º do CSC, ainda que tenha mantido as funções que anteriormente desempenhava.”

E assim sendo, não podemos sufragar o entendimento que foi seguido nas instâncias ao considerarem que todos os valores recebidos pelo A emergiam dum contrato de trabalho.

Por outro lado, da factualidade apurada resulta que a R quis assumir dois compromissos distintos com o A.

Efectivamente da missiva de 22-6-1998, colhe-se que este seria admitido nos quadros do BB, como trabalhador subordinado, com a categoria de Director nível 16, duas horas de isenção de horário de trabalho e reconhecimento de 10 anos de retroactivos na banca.

Doutro modo, assumia também a R que o A seria nomeado Presidente do Conselho de Administração da EE, com remuneração mensal de 800.000$00 (oitocentos mil escudos) mais despesas justificadas no montante de 250.000$00 mensais, mais uma gratificação anual de três mil e quinhentos contos e mais a concessão duma viatura, até ao valor de cerca de 10 mil contos, com direito a ficar com ela ao fim de 3 anos pelo valor residual.

Trata-se de dois compromissos absolutamente diferentes, sendo esta posição também confirmada pelo teor do contrato de trabalho que foi celebrado em 30-6-1998, em que as partes acordaram na admissão do A para a categoria de DIRECTOR enquadrado no Grupo I Nível 16, do ACTV para o Sector Bancário, mediante o pagamento de uma retribuição mensal igual à que em cada momento, estiver fixada naquele ACTV e com direito aos subsídios referidos naquele ACTV que não revistam a natureza de remuneração, bem como às diuturnidades estabelecidas no referido Acordo, nada se clausulando quanto aos direitos do A quando passasse ao cargo de Presidente do Conselho de Administração da EE.

Por isso, não se inserindo neste contrato (de trabalho) as condições remuneratórias que seriam concedidas ao A após a sua passagem para as funções de presidente do conselho de administração da EE, temos de concluir que as partes se vincularem a dois contratos distintos:

Contrato de trabalho por um lado, celebrado para exercer as funções da categoria de Director nível 16, com duas horas de isenção de horário de trabalho e reconhecimento de 10 anos de retroactivos na banca;

e contrato de mandato para o exercício de funções de presidente do conselho de Administração da EE Rent e a que se seguiram outros cargos de Administração noutras empresas do grupo BB e que conferiria ao A os seguintes direitos:

uma remuneração mensal de 800.000$00, e que ultimamente era do montante de 7 076,00 euros;

o pagamento duma “gratificação anual” de 17 500,00 euros;

a quantia mensal de 1.250,00 euros de despesas justificadas;

substituição da viatura automóvel.

Por isso, e em relação ao contrato de trabalho que teve o seu início no dia 30 de Julho de 1998, temos de considerar que ficou suspenso em 31 de Julho do mesmo ano, por força do desempenho das funções de Presidente do Conselho de administração da EE, pois e como já se disse, a lei é frontalmente desfavorável ao cúmulo, num mesmo sujeito, das qualidades de Administrador de uma sociedade anónima e de trabalhador, subordinado ou autónomo, dessa mesma sociedade, seja a constituição do vínculo laboral anterior, simultânea ou posterior à da relação de administração.

Na verdade, com a declaração de inconstitucionalidade do nº 2 do artigo 398º do CSC[3], na parte em que impunha que os contratos de trabalho existentes antes da nomeação do trabalhador para os corpos sociais da empresa se extinguiam se tivessem sido celebrados há menos de um ano contado da sua designação para esses cargos, vem-‑se sustentando que estes contratos de trabalho celebrados há menos de um ano também se suspendem, tal como acontecia com os de maior antiguidade do trabalhador.[4]

E assim sendo, temos de concluir que, findo o exercício dos cargos de administração que desempenhou nas várias empresas do grupo, ressurgiu o contrato de trabalho que tinha sido celebrado em 30/6/1998, pelo que, a partir do termo do desempenho dessas funções, o A apenas pode exigir o pagamento das quantias que ficaram a constar do contrato de trabalho que foi efectivamente celebrado.

Não podemos assim manter as condenações da R constantes dos seguintes números do dispositivo:  

III. (onde se condenou a ré a pagar ao autor a parcela da sua remuneração mensal no montante de 7 076,00 euros, liquidada catorze vezes por ano, vencidas e vincendas desde Setembro de 2009);

IV. (onde se condenou a ré a pagar ao autor a gratificação anual de 17 500 euros vencidas desde 1999 e vincendas);

VI. (onde se condenou a ré a proceder à atribuição ao autor de novo veículo automóvel);

VII. (onde se condenou a ré a pagar ao autor a quantia que se apurar em execução de sentença relativamente ao valor mensal da utilização pessoal de viatura automóvel, desde Fevereiro de 2008 e até efectiva atribuição da mesma);

VIII. (onde se condenou a ré a pagar ao autor a quantia que se apurar em execução de sentença relativamente ao valor, a título de indemnização por lucros cessantes, pelos danos decorrentes do protelamento da substituição da viatura);

IX. (onde se condenou a ré a pagar, por cada dia de incumprimento após o trânsito da presente decisão da obrigação de atribuição de viatura automóvel uma sanção pecuniária compulsória no valor diário de 300 euros);

XI. (onde se condenou a ré no pagamento de juros de mora à taxa anual de 4% sobre os quantitativos referidos em IV, VII e VIII, desde 28-7-2011 e até efectivo e integral pagamento), pois dizem respeito a direitos derivados do contrato de mandato pelo exercício de funções nos órgãos sociais das empresas do grupo BB.

            Procede pois a revista nesta parte.

5----

             

Quanto à caducidade do contrato de trabalho:

Sustenta a recorrente que com a sua nacionalização, o grupo MM foi desmembrado e tornou-se de facto e objectivamente impossível a prestação das funções para as quais o recorrido havia sido contratado, realidade que se insere na previsão do artigo 343º, alínea b) do Código do Trabalho, pugnando assim pela legalidade da caducidade do contrato de trabalho por si invocada.

Sobre esta questão, argumentou a 1ª instância (a que aderiu a Relação):

            “Ora, no caso dos autos, não tendo logrado a resolução contratual consensual, tentada na sequência de uma referência do autor no sentido de estar em condições de passar à situação de reforma por invalidez mas carecendo da regularizações contributiva pela ré, veio a ré em 12-10-2011, já depois de citada para os termos da presente acção, comunicar ao autor a cessação do contrato de trabalho por caducidade nos termos do art. 343º, al. b) do Código do Trabalho.

De acordo com este preceito o contrato de trabalho caduca “Por impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva, de o trabalhador prestar o seu trabalho ou de o empregador o receber”.

A ré referiu na comunicação que enviou ao autor que estava impossibilitada de receber a prestação de trabalho do autor alegando a inexistência de quaisquer funções e cargos disponíveis compatíveis com a categoria profissional do autor.

Não foi invocada nenhuma das situações respeitantes ao empregador previstas nos arts. 346º e 347º do Código do Trabalho pelo que se impõe delimitar os contornos da noção de impossibilidade, de caducidade por impossibilidade de receber a prestação de trabalho.

Em primeiro lugar a impossibilidade terá de ser superveniente ou seja, não pode ser uma situação reportada à origem do contrato, sendo antes uma situação verificada durante o desenvolvimento da relação laboral.

Terá a impossibilidade de ser definitiva, ou seja, não será uma qualquer impossibilidade conjuntural ou temporária que determina a caducidade do contrato, mas sim uma situação cuja reversão seja improvável ou não expectável. Para as situações temporárias ou conjunturais existe o mecanismo da suspensão do contrato – cfr. art. 298º do Código do Trabalho.

A impossibilidade deverá ainda ser absoluta, ou seja inelutável por falta de um qualquer substrato da prestação laboral da empresa – a destruição do estabelecimento, o encerramento do estabelecimento, a extinção da empresa – e não o resultado de uma mera dificuldade de recebimento da prestação laboral – por todos vd. M Rosário Ramalho in loc cit a pag 786 e ss.

Considerando por um lado a protecção decorrente do princípio constitucional consagrado no art. 53º da Constituição da República Portuguesa, com a consequente limitação e imperatividade das formas de cessação do contrato de trabalho, e por outro a ponderação dos interesses potencialmente antagónicos do trabalhador e da entidade patronal afigura-se ainda que, na perspectiva de impossibilidade de receber a prestação de trabalho, se deverá ainda considerar que a impossibilidade seja imprevisível ou que quando previsível seja, de acordo com a normal diligência exigida ao sujeito médio – o bom pai de família tantas vezes usado como critério legal – inevitável, donde se possa afirmar que a impossibilidade não decorre da vontade das partes, nomeadamente da empregadora, e que é objectiva – vd., ainda que reportado a regime legal anterior ao CT (2003) mas em grande medida aplicável ao regime vigente, S Galvão Teles in Impossibilidade Superveniente, Absoluta e Definitiva da Entidade Patronal Receber a Prestação de Trabalho, publicado em Estudos de Homenagem ao Professor Doutor Inocêncio Galvão Teles, vol IV a pag 1079 e ss.

Assim considerada a caducidade do contrato de trabalho como forma de cessação da relação laboral afigura-se que a situação dos autos não pode, como defendido pela ré, ser como tal enquadrada.

É certo que, como se apurou, em finais de 2008 o quadro de pessoal da ré se mostrava sobredimensionado para as necessidades do seu volume de negócios o qual então sofreu uma quebra acentuada.

Na referida altura a ré foi objecto de nacionalização pela Lei 62-A/2008.

Tal período coincide ainda, como é do conhecimento público, com o reconhecimento de uma situação de crise económica com efeitos a nível mundial e ainda hoje persistente.

A ré, …. viu-se confrontada com a cessação do mandato social de diversos colaboradores e com dificuldade para ocupar todos eles na sua estrutura.

Porém nenhuma destas circunstâncias justifica a invocação da caducidade nos termos em que a ré o faz.

Por um lado, a situação é conjuntural e reflexo de um quadro económico.

Por outro lado, não dispondo a ré de actividade para ocupar todos os seus colaboradores tal não significa, nem a ré o demonstrou, que o autor seja um deles.

Neste particular afigura-se evidenciada a inidoneidade do meio adoptado – caducidade do contrato – e a sua utilização como forma de obviar às regras, procedimentos e garantias que outras formas, já referidas, de cessação da relação laboral demandam.

Vejamos.

Situando as dificuldades da ré em finais de 2008, ou mesmo no início de 2009, não resulta dos autos, nem a ré em concreto o alegou, qualquer acto ou diligência concreta da ré no sentido de colocação ou autor ou de atribuição de qualquer função ao mesmo até à comunicação da caducidade do contrato, ou seja, durante quase três anos.

A única “diligência” no sentido de colocar termo à situação é, em Maio de 2011, através de um acordo de cessação de funções que ao autor foi proposto, acordo este que não visa, como é evidente, a cessação da violação do dever de ocupação efectiva que então, e desde há muito, se verificava.

Depois, ainda que as competências do autor incidissem particularmente sobre uma concreta área de concessão de crédito – financiamento automóvel – não demonstrou a ré que não tenha qualquer actuação em tal área, ou que o autor não lograsse desempenhar quaisquer outras dentro da sua categoria profissional.

Quer o carácter conjuntural da situação da ré, quer a falta de demonstração da impossibilidade de receber a prestação de trabalho do autor, acrescida da manifesta falta objectividade que transparece de toda a cronologia da situação que culminou com tal declaração da ré obstam à verificação da caducidade do contrato celebrado entre autor e ré por caducidade.

Admiti-la seria o mesmo que admitir a cessação do contrato de trabalho por vontade unilateral e arbitrária do empregadora em manifesta violação do disposto no art. 53º da Constituição da República Portuguesa que, desse modo, se via dispensada do cumprimento dos procedimentos inerentes à cessação por despedimento colectivo e/ou por extinção do posto de trabalho, com a consequente diminuição das garantais dos visados.

Impõe-se, pois e ao abrigo do disposto no art. 280º do Código Civil, concluir pela nulidade da declaração de caducidade do contrato efectuada pela ré em Outubro de 2011 e pela consequente subsistência do vínculo contratual laboral entre o autor e a ré.”

            Concordando com esta fundamentação, acrescentou a Relação:

 “…[O] facto que emerge da informação da Direcção de Recursos Humanos, junta a fls. 747-748 dos autos, que analisando as possibilidades de colocação de colaboradores sem funções, propôs relativamente ao caso do Autor, o seguinte:
a) Colocação do Sr. AA na D…, ou, em alternativa, na área comercial;
b) Desencadear os procedimentos na D… para caducidade do seu contrato de trabalho, por se verificar a impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva de o BB  receber a sua prestação de trabalho, procedendo-se à imediata comunicação ao empregado e à correspondente compensação legalmente prevista (incluindo a respeitante à eventual falta de aviso prévio).

Ora, no rosto desse documento consta na parte referente a despacho: “Aprovado em Conselho de Administração a proposta b)”, com data de 24.05.2011.

Este documento, que não foi impugnado, demonstra de forma inequívoca que a impossibilidade da Ré receber a prestação do Autor não era definitiva nem absoluta, pois existia outra opção possível, mas a escolha do Conselho de Administração recaiu na opção b).

        Não se verificam, portanto, os pressupostos da caducidade nos termos previstos no art. 343º al. b) do Código do Trabalho.”

Também sufragamos esta posição das instâncias.

Efectivamente, e conforme se diz no acórdão desta Secção Social de 10/7/2013, recurso nº 101/12.2TTABT.S1, a impossibilidade do empregador receber o trabalhador deve ser entendida nos termos gerais de direito, isto é, em moldes similares ao regime comum da impossibilidade de cumprimento não imputável ao devedor e que consta do artigo 790º e seguintes do CC, à luz do qual essa impossibilidade é caracterizada como superveniente, absoluta e definitiva.

Mas esta impossibilidade só será definitiva se, face a uma evolução normal e previsível, não será mais viável o recebimento da colaboração do trabalhador.

Ora, atenta a matéria provada, não se mostra integrada tal impossibilidade, pois se a R ponderou a colocação do A na D.., ou, em alternativa, na área comercial, é porque ainda lhe era possível receber o seu trabalho.

Por isso, o quadro apurado configurará apenas um caso de mera dificuldade de recebimento da prestação laboral de que fala a acima citada Prof. M Rosário Ramalho, e que não é suficiente para se poder concluir pela caducidade do contrato à luz da norma invocada pela recorrente.

Improcede portanto esta questão.

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Quanto à violação do dever de ocupação efectiva:

Alega a Recorrente que existiam circunstâncias objectivas, decorrentes da nacionalização do Banco, para que o recorrido tenha estado sem funções atribuídas.

A Relação não aceitou tal argumentação, aderindo antes à posição da sentença da 1ª instância que a este respeito disse o seguinte:

“Ora apurou-se que o autor desde Novembro de 2008, e particularmente desde o início de 2009 quando cessou o seu mandato numa das empresas em que integrava o conselho de administração, insistiu com a ré no sentido de, manifestando a sua disponibilidade para o exercício de funções compatíveis com a sua categoria, lhe serem por esta atribuídas funções indagando quando e onde se deveria apresentar.

Apenas em Novembro de 2009, ou seja, decorrido um ano, o autor foi chamado pela ré para se apresentar na Direcção de Recursos Humanos, sendo que então foi confinado a um espaço aberto, acompanhado de outros directores que aí haviam sido colocados, sem que lhe fossem atribuídas quaisquer funções.

A situação de absoluta inactividade manteve-se, não obstante inúmeras interpelações do autor à ré com vista ao esclarecimento da situação e à atribuição de funções, inalterada nunca lhe sendo atribuídas funções inerentes à sua categoria profissional, à categoria profissional que havia sido objecto do seu contrato de trabalho, ou seja, sem que tenha sido reconhecido o seu direito de ocupação efectiva na actividade contratada.

Esta situação configura uma objectiva violação do dever imposto à ré enquanto empregadora pelo art. 129º nº 1 al b) do Código do Trabalho.

Não se ignora que é ao empregador que cabem os poderes de organização e direcção do trabalho, da estrutura produtiva e da sua organização e a mesma pode, em determinados momentos ou circunstâncias, determinar que não seja exigível ao empregador manter o trabalhador em exercício de funções.

Contudo se um empregador se defronta com alterações na sua estrutura organizativa ou produtiva que determinam uma menor exigência quantitativa, ou mesmo qualitativa, de trabalhadores resta-lhe recorrer ao mecanismo de resolução do contrato, seja por via consensual, ou, frustrada esta, por via do despedimento por extinção do posto de trabalho – cfr. art. 340º al b) e e), 349º e 367º do Código do Trabalho – observando, naturalmente, os requisitos objectivos e subjectivos prescritos na lei.

O que, salvo melhor opinião, não pode é, como fez com o autor, afectar o trabalhador ao departamento de recursos humanos (ou outro) e aí o manter durante quase dois anos sem qualquer actividade ou atribuição de funções, período ao qual acresce o cerca de um ano em que igualmente não lhe forma atribuídas quaisquer funções e durante o qual, tal como posteriormente, o autor manifestava, sem qualquer resposta da ré, a sua disponibilidade para o exercício de funções.”

Concordando com esta fundamentação, acrescentou o acórdão que as dificuldades existentes decorrentes da nacionalização do banco não podem justificar a manutenção durante cerca de três anos de trabalhadores qualificados em situação de completa inactividade, pois isso desqualifica-os profissionalmente e descredibiliza-os socialmente.           

Também aderimos a este entendimento.

De facto, aceita-se que a nacionalização da R tenha gerado grandes dificuldades na absorção de elevado número de trabalhadores advindos das várias empresas do grupo, nomeadamente dos que nelas exerciam funções na sua Administração e que tendo os seus contratos de trabalho suspensos regressaram à empresa-mãe após o termo desse desempenho.

De qualquer forma, afigura-se-nos que o prazo decorrido (cerca de três anos) sem a R dar ao A qualquer ocupação é manifestamente excessivo.

Por isso, temos de concluir que a Ré violou o dever de ocupação efectiva do Autor.

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Quanto ao ressarcimento dos danos não patrimoniais:

Sustenta a Recorrente que mesmo que se conclua que a sua actuação de inactividade do Recorrido foi ilícita, o quantitativo da condenação relativo aos danos não patrimoniais é manifestamente exagerado.

Já perante a Relação esta tinha suscitado tal questão, vindo a manter-se a indemnização desses danos na quantia de € 7.500, montante que considerou adequado.

Para tanto argumentou o acórdão que os factos constantes dos nº 97 a 130 são bem demonstrativos da gravidade dos danos sofridos pelo Autor, em virtude da situação de inactividade a que foi votado no período de Novembro de 2008 até à data da propositura da acção em 28.07.2011, justificando plenamente a indemnização que foi arbitrada.

Também concordamos com esta posição, pois a colocação do A “num open space”, conjuntamente com outros directores da ré, sem exercerem quaisquer funções, quando os antigos colegas e seus subordinados se encontravam a trabalhar normalmente e com funções atribuídas, causou-lhe grande incómodo, por se sentir diminuído, humilhado e vexado enquanto profissional e homem e afectado no seu bom-nome e dignidade.

            Por isso, e considerando que esta situação lhe causou um contínuo estado de desmoralização, um persistente sofrimento psíquico e físico, com perturbações do sono e do humor, abalando o seu ânimo e a sua natural alegria de viver, e afectando também, seriamente, o seu ambiente familiar e o seu relacionamento com amigos e pessoas das suas relações, levando ao seu isolamento e a afastar-se dos amigos e da família, não podemos considerar excessiva a compensação que lhe foi fixada em 7 500 euros.

            Improcede por isso esta questão.  

8---

No ponto V do dispositivo condenou-se a ré a pagar ao autor a quantia mensal de 1 128,13 euros (mil cento e vinte e oito euros e treze cêntimos) correspondente a isenção de horário de trabalho contratualmente fixada, importâncias vencidas desde 1-9-‑2011 e vincendas.

A recorrente sustenta que se trata duma atribuição patrimonial com vista a remunerar o trabalhador pelo exercício da sua actividade como administrador.

Não foi isso porém, que concluímos no ponto 4 deste acórdão, onde referimos que do nº 1 do ponto 2 da matéria de facto resulta que o A foi admitido nos quadros do BB para a categoria de Director, a que correspondia o nível 16 de retribuição, com duas horas de isenção de horário de trabalho e reconhecimento de 10 anos de retroactivos na banca (o que também se colhe do ponto 46 da matéria apurada).

Por isso, e tratando-se duma atribuição patrimonial cuja fonte era o contrato de trabalho, entendemos que a R não lha podia retirar tal como concluiu a Relação.

Efectivamente, o princípio da irredutibilidade da retribuição consagrado no artigo 129º, nº 1, alínea d) do Código do Trabalho, não é impeditivo da supressão de certas atribuições patrimoniais conexas com condições específicas do modo de prestação de trabalho, e quando essas condições específicas deixem de existir.

Assim, e como se decidiu no acórdão desta Secção Social de 23/9/2009, recurso nº 3843/08, consultável em www,stj.pt, apesar do seu carácter retributivo, o subsídio de isenção de horário corresponde à contrapartida devida pelo modo específico de prestação do trabalho, pelo que apenas será devida enquanto perdurar a situação que lhe serve de fundamento.

No entanto, quando a isenção de horário de trabalho é estabelecida no contrato de trabalho, resultando assim de um acordo expresso da vontade das partes, a sua retirada apenas pode ter lugar com o acordo de ambas as partes, sob pena de violação do regime constante do artigo 406º do Código Civil.

Tal foi o caso dos autos, pois a sua consagração resultou duma obrigação expressamente assumida na altura da contratação do A, conforme se colhe do ponto 1 da carta de 22/6/1998, acordo que surgiu na sequência das conversações que então foram estabelecidas, tendo esta atribuição sido determinante da vontade de contratar do trabalhador.

Por isso, sendo ilegítima a sua retirada, bem andaram as instâncias em condenar a R no seu pagamento a partir de 1/9/2011.

Improcede portanto esta questão.

9---

            Termos em que se acorda nesta Secção Social em:


A) Não se conhecer da revista quanto à questão da má-fé da R, por a mesma não ser admissível nesta parte.
B) Conceder parcialmente a revista, pelo que e em consequência:


B1) Revogam-se os pontos III, IV, VI, VII, VIII, IX e XI do dispositivo da sentença confirmada pelo acórdão recorrido, pelo que e em relação a tais pedidos vai a R absolvida.
B2) Mantêm-se os pontos I, II, V, X e XII do dispositivo da sentença confirmada pelo acórdão recorrido, indo a R condenada nos respectivos termos.

As custas da revista e nas instâncias são da responsabilidade de cada uma das partes na proporção do respectivo decaimento.

                        Anexa-se sumário do acórdão.

                        Lisboa, 25 de Novembro de 2014

                        Gonçalves Rocha (Relator)

                        Leones Dantas

                        Melo Lima

_________________________
[1] Neste sentido, veja-se o acórdão deste Supremo Tribunal de 27/2/2013, recurso nº 4/09.7TTVRL.P1.S1 e que embora respeite a uma situação regulada pelo CPC anterior mantém plena actualidade, pois a norma do NCPC é idêntica à anterior.
[2] Acessível em www.stj.pt
[3]  Veja-se os acórdãos do TC nº 1081/96 de 9/10/96, DR, II série de 13/12/96, e nº 259/2001 de 30/5/2001, DR, II série de 2/11/2001.
[4] Neste sentido Coutinho de Abreu in “Administradores e trabalhadores de sociedades”, pgª 16, nota.