Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1405/07.1TCSNT.L1.S1
Nº Convencional: 7ª SECÇÃO
Relator: LOPES DO REGO
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL
TUTELA DA PERSONALIDADE
DIREITO A HONRA
DIREITO AO BOM NOME
RESERVA DA VIDA PRIVADA
LIBERDADE DE IMPRENSA
LIBERDADE DE INFORMAÇÃO
INTERESSE PÚBLICO
COLISÃO DE DIREITOS
CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM
TRIBUNAL EUROPEU DOS DIREITOS DO HOMEM
Data do Acordão: 07/13/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDAS AS REVISTAS PRINCIPAIS. NEGADA A REVISTA SUBORDINADA
Área Temática:
DIREITO CIVIL - RELAÇÕES JURÍDICAS / PESSOAS SINGULARES / DIREITOS DE PERSONALIDADE.
DIREITO CONSTITUCIONAL - DIREITOS E DEVERES FUNDAMENTAIS / DIREITOS, LIBERDADES E GARANTIAS PESSOAIS.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PARTES / PATROCÍNIO JUDICIÁRIO - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS.
DIREITO EUROPEU - DIREITOS FUNDAMENTAIS.
Doutrina:
- Jorge Miranda e Rui Medeiros, “Constituição da República Portuguesa” Anotada, 2017, 133.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 48.º, 49.º, 671.º, N.º2.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGO 37.º.
REGULAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS (RCP): - ARTIGO 27.º, N.º 5.
Referências Internacionais:
CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM (CEDH): - ARTIGO 10.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:

-N.º 292/08.

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ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-DE 30/6/2011, PROCESSO N.º 1272/04.7TBBCL.G1.S1.
-DE 6/9/2016, PROCESSO N.º 60/09.9TCFUN.L1.S1.
Jurisprudência Internacional:
JURISPRUDÊNCIA DO TEDH:

-ACÓRDÃO DE 30/8/2016, PROFERIDO NA REQUÊTE N.º 55442/12.
Sumário :
I. Ocorrendo conflito entre os direitos fundamentais individuais – à honra, ao bom nome e reputação - e a liberdade de imprensa, não deve conferir-se aprioristicamente e em abstracto precedência a qualquer deles, impondo-se a formulação de um juízo de concordância prática que valore adequadamente as circunstâncias do caso e pondere a interpretação feita, de modo qualificado, acerca da norma do art.. 10º da CEDH pelo TEDH - órgão que, nos termos da CEDH, está especificamente vocacionado para uma interpretação qualificada e controlo da aplicação dos preceitos de Direito Internacional convencional que a integram e que vigoram na ordem interna e vinculam o Estado Português - e tendo ainda necessariamente em conta a dimensão objectiva e institucional subjacente à liberdade de imprensa, em que o bem ou valor jurídico que, aqui, é constitucionalmente protegido se reporta, em última análise, à formação de uma opinião pública robusta, sem a qual se não concebe o correcto funcionamento da democracia.

II. Não podem considerar-se ilícitos os artigos de opinião que – embora redigidos de forma mordaz, contundente e desprimorosa, se situam- no cerne do debate e crítica à acção política e governativa, traduzindo essencialmente juízos valorativos profundamente negativos sobre a capacidade e idoneidade política do visado - podendo este escrutínio público envolver a formulação de juízos valorativos claramente críticos e negativos e, consequentemente, implicar prejuízo à imagem do político visado como homem de Estado junto dos eleitores, sem que tal configure ilícita violação de direitos de personalidade.

III. As peças jornalísticas, situadas no âmbito da chamada imprensa cor de rosa, que referenciam e comentam aspectos da vida pessoal e relacionamentos do visado, situadas fora do perímetro da sua actividade política, não envolvem violação do direito à reserva da vida privada quando – como decorre da matéria de facto – o A. sempre tornou públicos aspectos da sua vida privada e familiar, participando abertamente em eventos sociais , concedendo entrevistas, participando em iniciativas  e autorizando a publicação de imagens em revistas ditas cor de rosa .

IV. Não geram ilicitude, traduzida em violação ilegítima dos direitos de personalidade, geradora de responsabilidade civil, as notícias, enquadradas em crónica social, em que se referem aspectos factuais que se apurou serem inverídicos ou inexactos– e envolvendo, nessa medida, violação de regras deontológicas do jornalismo - num caso em que ,pela natureza dos factos em questão, tal divulgação não é objectivamente susceptível  de afrontar o direito à honra e consideração pessoal do visado.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:



1. O Dr. AA, intentou acção declarativa, sob a forma ordinária, contra BB - Serviços Editoriais e Gáficos, S.A., CC, Director da Revista DD de Julho a Setembro de 2004, EE, Director da Revista DD, de Setembro a Novembro de 2004, FF, Directora da Revista GG, HH, Directora da Revista GG, II, Directora da Revista JJ, em Agosto de 2005 e Novembro de 2006, e KK, Director Geral de Publicações do Grupo LL, pedindo que os Réus sejam condenados solidariamente no pagamento das quantias de € 300.000,00 a título de compensação pelos danos não patrimoniais e € 700.000,00 a título de indemnização pelos danos patrimoniais sofridos pelo autor. Para tanto alegou, em síntese, que:

-      A actuação da Ré e dos Réus é absolutamente reprovável e inaceitável perante o direito fazendo-os incorrer na obrigação de indemnizar.

-      Como sempre se tem entendido, o direito de livre expressão não é um direito absoluto ou ilimitado, que não tenha que respeitar outros direitos, mais nobres, como o são o direito ao bom nome e a reputação de outrem.

-      Ao actuar como actuou a Ré, bem como os restantes Réus, lesaram, com culpa grave, o direito ao bom nome e reputação do Autor, o que acarretou para o mesmo nefastas consequências quer no plano pessoal, quer no profissional, para além do já referido plano familiar, o que justifica, inteiramente, a obrigação de indemnizar.

-    Os Réus redigiram e publicaram os artigos sub judice, produzindo através dos mesmos afirmações, voluntária e conscientemente, sabendo que denegriam publicamente a credibilidade do Autor, ofendendo o seu bom nome, dignidade e prestigio.

-      Os Réus sabiam que o A, pelo cargo que ocupava à data da publicação dos artigos era (como é) uma figura pública e que as afirmações descritas tinham consequências no plano profissional, político, familiar e pessoal, as quais ainda hoje se mantêm.

-     Longe do exercício do direito de expressão, previsto no art. 22.° da Lei de Imprensa, os Réus violaram "direitos ao bom nome, à reserva da intimidade da vida privada, à imagem e à palavra dos cidadãos e a defender o interesse público".

-       Os Réus conheciam e sabiam que estavam a violar os direitos do Autor sendo inequívoca a anti-juricidade da conduta dos Réus, na justa medida em que, em revistas de grande dimensão e impacto junto da opinião pública, divulgaram factos manifestam falsos, que sabiam contender com o bom nome, honra, intimidade da vida privada do Autor.

-       A ofensa ao crédito e bom nome do Autor, com a publicação dos artigos sub Judice, foi injustificada porque não foram cumpridas as exigências de verdade, tendo faltado interesse público em informar e foi usado o meio mais danoso.

-       Faltando à verdade, os Réus induziram os leitores em erro.

-      De facto, foram relatados factos inverídicos, ofensivos do crédito e do bom nome do Autor, sem respeito pelos deveres de isenção e de objectividade e sem recurso a fontes credíveis.

-      Os Réus agiram com falta de rigor e de objectividade, não havendo, assim, qualquer justificação do seu comportamento, capaz de afastar a ilicitude.

-       Os Réus sabiam da natureza melindrosa e difamatória dos seus escritos, tendo, por isso, o dever de ter impedido a sua divulgação.

-       Ao não o fazer, apesar de terem previsto a produção do facto ilícito como efeito possível ou eventual dessa conduta, conformaram-se com ele, aceitando-o.

-      Com efeito, os Réus, ao agirem como agiram, pretenderam intencionalmente visar o A., prevendo a ofensa ao bom nome do mesmo, nada fazendo para o evitar, antes tendo extravasado os limites de informação.

-       E indubitável que os ora Réus agiram culposamente, com dolo, ou seja, com intenção de ofender o direito à honra tutelado do Autor.

-      Refira-se, ainda, que não custa aceitar a existência de dolo, na modalidade de dolo necessário - reconhecendo para tanto que os Réus não podiam deixar de ter previsto o facto ilícito como consequência necessária da sua conduta, de tal modo que o resultado se apresentava intrínseca e indissoluvelmente ligado à conduta prosseguida.

-       Actuam, pois, culposamente, com dolo directo, os jornalistas que voluntariamente narram certo facto ou fazem alguma afirmação ou insinuação, sabendo que, dessa forma, atingem a honra e bom nome de outrem, sendo esse o preciso efeito que pretendem atingir.

-     A actuação dos Réus conduziu a uma situação vexatória e pública que gerou (na altura e por muito tempo), em toda a sociedade, um sentimento de consciência de reprovação social e humilhação geral, que acabou por resultar numa inevitável lesão da reputação, do bom nome e da honra do Autor.

-      Sendo os artigos sub Judice publicados em revistas de grande tiragem e de venda por todo o território nacional, considerando que o lesado, a partir da data de publicação de tais artigos, passou a ser alvo de observações jocosas de colegas e de clientes que o conheciam devido à vida pública que desempenhava, às circunstâncias do caso concreto, justifica-se como criteriosa e de acordo com a equidade a atribuição dos montantes já peticionados.

-     O Autor sofreu danos na sua honra, na sua consideração social e na sua vida profissional, sendo que o montante de reparação há-de ser proporcionado à gravidade do dano, devendo ter-se em conta, na sua fixação, as regras de boa prudência e de criteriosa ponderação das realidades da vida.

-       No caso sub Judice, importa ponderar que a divulgação dos artigos escritos e publicados pelos Réus tiveram lugar através da imprensa, que tem como destinatário um universo mais ou menos indeterminado de pessoas, tratando-se de um meio de difusão com uma particular aptidão potenciadora do dano, seja pelo elevado número de pessoas que tiveram acesso à notícia, seja pela activação da engrenagem social que, em consequência da noticia, se reproduz (retransmitindo-a, ampliando-a, deformando-a), seja pelo grau de credibilidade que o acontecimento impresso tem no público.

-      As ofensas proferidas pelos Réus ao bom nome, credibilidade e dignidade do Autor são, de qualquer modo, objectivamente graves e aptas para a produção dos prejuízos, que o Autor não teria sofrido, não fosse a redacção e publicação daqueles artigos, pelo que existe a obrigação solidária de indemnizar.


Os Réus contestaram, alegando, em síntese, que:

-      O Réu CC nunca exerceu o cargo de director editorial de qualquer das Revistas mencionadas na p.i.

-        O Réu CC exerceu o cargo de director executivo da Revista DD, com funções restritas à reorganização da redacção da Revista - distribuição de funções, reestruturação quanto à execução dos serviços, maquete gráfica da sua edição e criação de novas secções.

-       Nunca dirigiu editorialmente o conteúdo dos trabalhos dos jornalistas, nem conheceu ou autorizou a publicação dos artigos, reportagens ou fotos dos autos, antes da sua publicação.

-       Não incumbiu quem quer que seja da elaboração dos artigos e reportagens em causa e para serem tiradas as fotos.

-        Nunca foi inscrito na Entidade Reguladora da Comunicação Social (antes Instituto da Comunicação Social) como director da Revista DD ou outra das revistas indicadas na pi.

-       Exerceu aquelas funções de director executivo ao serviço da Ré LL no período entre 10.3.2004 e 24.10.2004.

-       A Ré LL não dirige o conteúdo editorial das Revistas indicadas na pi, competindo ao seu director essa direcção efectiva.

-       A Ré dispõe de uma direcção geral editorial que, juntamente com os directores, analisa temas e assuntos gerais a incluir nas Revistas que edita.

-      Tratando esses temas e assuntos, cabe depois em concreto e, caso a caso, à redacção e director da Revista a elaboração e aprovação para publicação do texto, paginação, títulos e fotos.

-       A Ré HH iniciou a prestação de serviços ao serviço da Ré LL em 17.4.2006, nas funções de jornalista (Directora da Revista GG).

-    A mesma Ré não escreveu, não colaborou na sua apresentação gráfica, não conheceu antes da publicação e nem autorizou que esta tivesse lugar, em relação a qualquer um dos artigos, reportagens ou noticias (textos e fotos) que foram referidos na pi.

-      A mesma Ré, por não exercer funções na redacção ou na qualidade de directora à data da publicação dessas reportagens, artigos e noticias, não tinha qualquer poder de direcção ou chefia sobre os autores ou colaboradores de todos esses conteúdos editoriais.

-     A data da publicação de todo esse material editorial, a R exercia funções na qualidade de assessora no Gabinete do Primeiro Ministro, e era o Autor quem estava em funções neste último cargo enquanto durou esse exercício pela Ré.

-     Sendo que um dos elementos da responsabilidade civil é a imputação do facto ao agente, resulta que para os Réus José, LL e HH não há susceptibilidade dessa imputação, pelo que o desfecho da lide lhe é desinteressante.

-       O Autor criou a imagem de um político que ama os prazeres da vida, a mundanidade e o jet-set social.

-      As férias do Autor de quatro dias nas Ilhas … ao fim de pouco mais de um mês no Governo (no exercício das funções de Primeiro Ministro de Portugal), com transporte em avião a jacto alimentaram a imagem de um político que ama os prazeres da vida, a mundanidade e o jet-set social.

-      A publicação de matéria editorial e em especial tratando-se da expressão de opiniões, não é decisiva nos meios de hoje para a formação da opinião pública.

-      E grande a concorrência no mercado das publicações periódicas e a informação chega ao público também por meios mais económicos e de actualização constante -internet, televisões e rádios.

-       Também as televisões, com canais temáticos de informação, disponibilizam horas em cada dia, para as mesas redondas de comentadores políticos e de outras áreas.

-     A opinião pública forma-se a partir da recepção de informações de todos estes meios; longe estamos da época da prevalência da imprensa nas preferências da recolha informativa do público, o que foi próprio de uma época ainda atrasada no desenvolvimento tecnológico e na comunicação global.

-      Os títulos da LL não formam em exclusivo a opinião pública e constituem um factor relativo nesse processo de formação do entendimento sobre os factos conhecidos publicamente.

-      Quanto à alegada campanha concertada, pura desinformação, manipulação, difamação e intoxicação de factos, referem factos conhecidos e veiculados pelos diversos órgãos da comunicação social, sendo que são descritos, alguns deles, em linguagem figurada de ilação, ou seja inferindo probabilidades de procedimento face a factos conhecidos.

-       Entendendo-se que hoje o "muro" da vida privada das figuras públicas é mais baixo, resulta daí que é justificável a notícia sobre comportamentos e atitudes em geral, susceptíveis, tão só, de dar a conhecer uma personalidade e a sua inserção (ou a falta dela) nos valores e padrões de comportamento da comunidade.

-     Seja, enquanto político e assim participante directo nos destinos dos interesses da comunidade, seja como autor ou intérprete de qualquer forma de expressão artística, cultural ou de recreio.

-       A proximidade trazida pelos meios da comunicação social com a inexistência de barreira física à notícia e à sua simultaneidade com o facto, torna os seus agentes mais próximos do público, suscitando-se movimentos de identificação deste com essas figuras.

-       A sua exposição vem inclusive a multiplicar-se nos seus efeitos, com o comparecimento, mesmo que episódico, em eventos sociais aberto à comunicação social; a notícia surge então abordada em perspectivas diferentes, desde a palavra à foto.

-     Os factos que integram os artigos dos autos não são difamatórios, no sentido de que deles não decorre menosprezo ou desconsideração quanto ao Autor, uma vez que toda a Comunicação Social e comentadores faziam as mesmas críticas ao Autor, não sendo lícito, então, concluir que houve uma "estratégia conjunta" encadeada e que envolveu todos os OCS e todos os jornalistas do Pais.

-      Alguns deles relatam procedimentos individuais, sob a forma de hábitos pessoais do conhecimento geral e susceptíveis de, compaginados com outros, constituírem reflexo de uma personalidade e do exercício desta.

-       Nega-se que se tenha coordenado a actividade dos Réus para difamar o Autor, ainda que sob a forma de «estratégia conjunta, encadeada e faseada»; também não se concertaram os Réus para macular créditos e bom nome do Autor.

-      E falso que nos textos dos autos se faça a persuasão da opinião pública, se atinja a imagem do Autor, e se coloque em causa bom nome, dignidade e carácter.

-     Relatam-se alguns hábitos sociais do Autor, sem conexioná-los com qualquer actividade socialmente desvalorada ou delituosa do Autor, ou das pessoas que escolhe para o seu convívio.

- Tais relatos decorrem de factos públicos e não se servem de intimidades de terceiros que por sua vez tivessem convivido com o Autor.


O Autor veio deduzir réplica, reiterando a sua posição.


A Ré LL Serviços Editoriais SA deduziu tréplica

Foi proferido despacho saneador, em sede de audiência preliminar.


Em audiência de discussão e julgamento, conforme acta constante dos autos a fls. 924 a 931, foi aditado um quesito à base instrutória.


Foi interposto recurso de despacho proferido no decurso da audiência de discussão e julgamento, que indeferiu requerimento do Autor, além do mais por que o tribunal já proferira despacho em acta acerca das questões invocadas, condenando-o, por ter dado causa a incidente, na multa de 4 UC.


Foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, julga-se a acção parcialmente procedente e condena-se solidariamente os Réus BB Serviços Editoriais e Gráficos SA, CC, EE, FF, II, e KK, no pagamento das quantias de € 30.000,00 (Trinta mil euros) a título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos pelo autor e € 700.000,00 (Setecentos mil euros) a título de compensação pelos danos patrimoniais sofridos pelo autor.

Absolve-se a Ré HH dos pedidos».


2. Inconformados, recorreram os RR. e –subordinadamente- o A., impugnando, desde logo, a decisão proferida em sede de matéria de facto tendo a Relação fixado o seguinte quadro factual subjacente ao litígio:

1)       O Réu CC foi Director da Revista DD, de Julho a Setembro de 2004 (Al. A).

2)     O Réu EE é jornalista e foi Director da Revista DD, de Setembro a Novembro de 2004 (Al. B).

3)     A Ré FF era Directora da Revista GG em Agosto de 2004 (Al. C).

4)      A Ré II era Directora da Revista JJ, em Agosto de 2005 e Novembro de 2006 (Al. D).

5)      O Réu KK é jornalista e Director Geral de Publicações da Ré LL Editores, S.A. (Al. E).

6)       As Revistas DD, GG e JJ, são publicações pertencentes à Ré LL EDITORES, S.A. (Al. F).

7)     Essas revistas têm anos de publicação ininterrupta e são editadas semanalmente (Al. G).

8)       Publicando, sobretudo a Revista DD, artigos, quer de opinião, quer de informação (Al. H).

9)       A revista GG insere-se no segmento de revistas de sociedade, com ampla projecção de mercado, cabendo-lhe, nesse mesmo segmento, uma quota correspondente a 21,7 % (Al. I).

10)     A revista JJ tem uma tiragem média semanal de 50 mil exemplares, com forte implantação no mercado português (Al. J).

11)        O Autor é militante do … desde 19…, tendo exercido, com a preocupação de serviço público, as seguintes funções:

a)       Adjunto do Ministro-Adjunto do Primeiro-Ministro (MM), no … Governo Constitucional, entre Outubro de 19… e Junho de 19… (data em que cessou funções por lhe ter sido concedida uma Bolsa de Estudo, na área da …, na, então, …);

b)      Assessor Jurídico do Primeiro-Ministro (NN) no … Governo Constitucional, entre Abril e Dezembro de 198…;

c)     Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, no … Governo Constitucional (sendo Primeiro-Ministro OO), entre Outubro de 198… e Junho de 198…;

d)      Secretário de Estado da Cultura, nos … e … Governos Constitucionais (sendo Primeiro-Ministro OO), entre Janeiro de 199… e Dezembro de 199…;

e)      Deputado eleito à Assembleia da República, nas …, …, …, …, … e … Legislaturas;

f)      Deputado eleito ao Parlamento Europeu, em Julho de 198… onde desempenhou funções até final do respectivo mandato, em Julho de 198…;

g)      Presidente da Câmara Municipal da …, eleito em Dezembro de 198…, tendo desempenhado essas mesmas funções, até ao fim do respectivo mandato, em Janeiro de 20…;

h)      Presidente da Câmara Municipal de …, eleito em Dezembro de 20.., tendo desempenhado essas mesmas funções até Setembro de 20... com um intervalo determinado pelo exercício das funções de Primeiro-Ministro;

i)       Primeiro-Ministro, entre … de … e … de 20…. (Al. L).

12)       Enquanto Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, empenhou-se na reforma do processo legislativo e do funcionamento da Presidência do Conselho de Ministros (Al. M).

13)      Enquanto Secretário de Estado da Cultura, promoveu:

-          a construção do Centro ….;

-         a recuperação de dezenas de Cine-Teatros;

-          a construção de Bibliotecas Municipais e Arquivos Distritais por todo o País;

-         a celebração do Acordo Ortográfico (antes contestado mas agora já ratificado);

-          a aquisição, recuperação e a institucionalização do Teatro Nacional … do … (Al. N).

14)    Enquanto Presidente da Câmara Municipal …, promoveu obras que o tornaram merecedor do apoio da população da …, designadamente:

-          a construção do Centro de Artes e Espectáculos;

-          a recuperação e construção de escolas;

-          a implantação de rede de saneamento em todo o Concelho;

-          a recuperação de património, como o …;

-       a construção de várias piscinas municipais espalhadas por todo o Concelho (Al. O).

15)      Enquanto Presidente da Câmara Municipal de …, promoveu as seguintes obras:

-         as obras de recuperação e dinamização de …;

-         a recuperação de variados jardins da cidade de …;

-       a construção dos Jardins do …, no cumprimento de uma promessa eleitoral;

-         a reabilitação da …., na área do L…;

-         a recuperação de cerca de mil prédios espalhados por toda a cidade;

-          a recuperação dos prédios da Rua de …;

-           o encerramento e a recuperação total da Rua da …;

-           a recuperação da Zona …;

-         a construção de 6 novas piscinas municipais (cujo processo, então, já se iniciara);

- a construção dos túneis do …, da Av. … (vulgo "…") e do … (Al. P).

16) Em 14 de Julho de 20.., foi publicado na revista DD o artigo intitulado "O cheque sem cobertura", da autoria do Réu KK, e cuja cópia consta de fls. 72, aqui se dando por integralmente reproduzido todo o seu teor, do mesmo constando designadamente que:

«Tentando remediar o irresponsável abandono de PP das suas funções de primeiro-ministro e de líder partidário, o Conselho Nacional do … entregou, de bandeja, o partido nas mãos ávidas de AA (...).

Só três conselheiros resistiram à chantagem. Todos os outros entregaram o ouro de que se julgavam guardiões a AA que, rapidamente e como é costume, o delapidará transformando-o em pechisbeque. Uns fizeram essa entrega por conveniência - são os da sua clientela. Outros engoliram o sapo que, mais tarde ou mais cedo, lhes devorará as entranhas.

Por convicção, a bem dizer, ninguém elegeu AA como líder. Mas, no entanto, ele já o é - e a responsabilidade perante a História, dos que, com o seu voto o fizeram ser, é, disso não tenham eles dúvidas, grave e pesada. AA já mostrou quem é e do que é capaz.

Só quem não quiser ver é que não vê: de embuste em embuste, até ao embuste final. Ao embuste da …, pouco visível por pequeno e distante, juntou-se o embuste de …, este já notório por imenso e presente aos olhos de todos. A uma campanha de promessas irresponsáveis (o símbolo dela é o "… a funcionar em oito meses") seguiu-se uma gestão caótica e catastrófica, de que o Túnel … embargado é o símbolo eloquente e acusador no coração da cidade. Nesta gestão só os cartazes proliferam, multiplicados como se uns gerassem os outros: dinheiro público, assim gasto, para quê e em benefício de quem? (...). As suas palavras melífluas são sempre destinadas não a revelar mas a ocultar, a disfarçar, fingindo que mostra uma coisa para esconder outra. Ouvi com propositada atenção a conferência de imprensa que deu após ter sido eleito presidente do ….

Aquela tentativa de fazer pose de Estado só enganou quem quis ser enganado. Quando AA falava de serenidade, via-se no seu olhar a inquietação, quando dizia que respeitava a decisão do Presidente da República, mostrava os dentes ameaçadores. Aliás, o que os … e as … disseram nestes dias em que o Presidente da República ponderava a sua decisão atingiu as raias do pornográfico e constitui só por si o retrato do grupo. O que seria um país governado por esta gente, encabeçada pela dupla AA/QQ, é de pôr qualquer pessoa decente com vontade de ir habitar para outras paragens enquanto o pesadelo durar. (...). Do muito que se tem escrito sobre a situação política criada por QQ, há uma tónica que tem sido repetida: AA é perigoso, porque é imprevisível. Segundo estes, o Conselho Nacional do …, ao escolhê-lo desta maneira precipitada e pressionada, ter-lhe-ia passado um cheque em branco. Puro engano, como viu bem OO, o que o Conselho Nacional do … fez, ao eleger AA, não foi passar-lhe um cheque em branco. Foi, isso sim, passar ao país um cheque sem cobertura. Infelizmente, o Presidente da República avalizou tal cheque! Espero que o País lhe perdoe este erro e esta fraqueza...» (Al. Q).

17) No dia … de Julho de 20…, foi publicado na revista DD o artigo intitulado "…",da autoria do Réu KK, cuja cópia consta de fls. …, aqui se dando por integralmente reproduzido o seu teor, e do qual, a propósito das propostas que o A. apresentou, na altura já como Primeiro-Ministro, depois de empossado no cargo, consta designadamente que:

«Aqueles que, usando o SMS dos telemóveis, convocaram, algumas semanas atrás, as manifestações que, frente ao …, exigiam eleições e se opunham à nomeação de AA como primeiro-ministro, rematavam convocatória dizendo: "Contra um governo da treta". Eu recebi muitas convocatórias e só agora me dou conta de quão proféticos eram esses dizeres. De facto, que se pode dizer deste Governo a não ser que é um governo da dita?! Vejamos sucintamente porquê. Desde logo, porque o primeiro-ministro, dando asas à sua natureza mais profunda, se pôs logo a dar entrevistas sucessivas na televisão, fazendo as promessas mais disparatadas e inconsequentes. Aquela da origem geográfica plural dos membros do governo, representativos de várias regiões, percebeu-se logo, mal se conheceu o elenco ministerial, que não tinha sido cumprida. Este é mesmo um dos governos que tem menos diversidade regional na sua composição. A outra "grande" promessa, a da disseminação dos ministérios pelo País (note-se dos serviços e não apenas dos gabinetes ministeriais), é de tal forma absurda que o único comentário que merece é o de um sorriso triste ou de um encolher desdenhoso de ombros. Já toda a gente sensata e rigorosa explicou que a descentralização não se faz com estes golpes de propaganda.

O mais grave é que a gente já não sabe se o juízo mais severo deve ser feito quando AA não cumpre as promessas ... ou quando as cumpre. A maior parte delas é tão inconsistente que mais vale louvá-lo e aplaudi-lo quando ele pura e simplesmente as não cumpre. E, sem sombra de dúvida, muitíssimo melhor para o País. Depois, o Governo tem um elenco absolutamente sintomático. Faz lembrar o elenco de uma telenovela realizada sem talento e sem meios, em que dois ou três actores mais velhos (e, sejamos justos, na maior parte das vezes já fora do prazo de validade) tentam disfarçar a fraca qualidade, a pobreza e a irrelevância do resto do elenco, em que abundam, aliás, os canastrões. (...) O Ambiente, um ministério que o QQ queria extinguir, serviu, afinal, para pôr um amigo do dr. QQ. Este, desde que é também (e para surpresa própria) ministro dos Assuntos do Mar, até está mais feliz e bronzeado. (...) E a ida do antigo chefe do SIS para a Administração Interna ou dos "grandes amigos" de AA para os Assuntos Parlamentares e para Adjunto diz tudo sobre esta mistura de trapalhada, clientelismo, amiguismo e absurdo. (...)».(A1. R).

18) No dia … de Agosto de 20…, foi publicado na revista DD, o artigo intitulado "…?!", da autoria de KK, cuja cópia consta de fls. …, aqui se dando por reproduzido o seu teor, no qual designadamente consta que:

«Quem assistiu pela televisão às cerimónias de posse do Governo de AA/QQ (uma cerimónia de posse dos ministros, outra de posse dos secretários de Estado) não pode deixar de ter aberto a boca de um espanto tal que ainda hoje não a conseguiu fechar completamente. Parecia que tínhamos voltado aos tempos mais irresponsáveis, tumultuosos e confusos do PREC e do … Governo de RR. As trapalhadas, as trocas e baldrocas, as reviravoltas, os atrasos foram tais que foi a própria imagem do Estado e o prestígio (mínimo que seja) das instituições que foram postos vergonhosamente em causa. Lembremos mais de perto o que se passou. Vale a pena, pois é ilustrativo de um estilo e de uma "ética" de serviço público. Logo na cerimónia em que tomou posse, o novo primeiro ministro fez um discurso que envergonharia qualquer presidente da junta de freguesia ou do clube de futebol da terceira divisão que o tivesse feito em análogas circunstâncias. O conteúdo do discurso era lamentável: uma sucessão de lugares-comuns, vazios e primitivos, que mostram bem a dimensão e o perfil de quem os leu. A forma foi igualmente desastrosa: o discurso não tinha nexo, os temas não se concluíam, atropelavam-se uns aos outros e tudo isto se agravava com os saltos de folhas a que o orador procedia, perdido na sua própria confusão, como se nunca tivesse lido antes o texto ou não o compreendesse bem. Em suma e como já foi dito, este foi o pior discurso de posse de um alto cargo do Estado a que alguma vez assistimos: banalidades desgarradas e recados de baixo nível, impróprios de uma cerimónia daquele alto nível. Se o estilo é o homem, como se dizia antigamente, este discurso e o seu estilo constituem bem o retrato em corpo inteiro do homem que teve a desfaçatez de ler este texto lamentável e sintomático. Outro episódio digno do PREC de 19… foi a trapalhada dos secretários de Estado, que culminou com a troca de SS, à última hora e provocando um atraso de 55 minutos na cerimónia, com o Presidente da República à espera com uma cara que chegava à fronteira com Espanha. De secretária de Estado adjunta do ministro da Defesa e dos Antigos Combatentes, a antiga secretária de Estado da Segurança Social passou para uma Secretaria de Estado criada à pressão no Ministério da Cultura e chamada das Artes e Espectáculos, o que não vai mal com o percurso recente da titular. (...). E o mais grave é que tudo isto foi apimentado por uma declaração de AA, dizendo que tinha valido a pena pôr as pessoas a secar uma hora para ele ter o governo que queria. Ouvimos e nem sabemos se nos devemos espantar mais com a lata, com a irresponsabilidade ou com a inconsciência. AA e QQ são isto: uma dupla feita de truques, lábia, golpes e trapalhadas. Por detrás de tudo isto, é o vazio e a inconsistência total. Quantos meses é que o País aguenta entregue a esta gente?!» Al. S).

19) Nas páginas … e …, da edição de … de Agosto de 20…, da Revista JJ, foi publicado um artigo intitulado

"…", cuja cópia consta de fls. …-…, aqui se dando por reproduzido o seu teor, ilustrado com uma fotografia aérea da casa onde o primeiro-ministro passava férias, ali se referindo designadamente, com o subtítulo "…", que:

«Rodeada por moradias deslumbrantes, todas ligadas por jardins e passeios inacreditavelmente bem cuidados, a casa de férias que AA escolheu é uma verdadeira mansão, no coração da …. Tem uma enorme piscina, jardim, vários terraços, ar condicionado, salas enormes e espaçosas e uma calma ainda maior. Para a limpeza diária são precisas quatro empregadas! Para maior sossego, as obras da casa em frente foram suspensas, algo sem precedentes na zona. O montante de aluguer da mensão não é divulgado, mas os preços de tabela para meia semana de um simples apartamento na luxuosa … rondam os 400 contos. Logo, uma mansão destas, por uma semana, pode chegar aos mil contos. De qualquer modo, nas imediações pouca gente acredita que AA não tenha tido um preço de amigo ... Até porque o primeiro ordenado como primeiro-ministro (1.400 contos) ainda não deve ter entrado. A título de curiosidade, refira-se que a popularidade da casa já é tanta que há quem vá lá só para tirar fotografias da "atracção turística (...) Como curiosidade, refira-se ainda que nas suas mini-férias algarvias, AA teve direito a várias regalias como receber em casa os principais jornais e revistas e, se quisesse ir à praia, tinha à sua disposição um lugar reservado (com correntes) no parque de estacionamento da Praia do …. A chuva é que não ajudou. São Pedro no céu não foi amigo de AA na Terra.» (Al. T).

20)    Mais se referindo, no mesmo artigo, e com o subtítulo "…", que: «Ao que parece, o nosso primeiro-ministro dá-se bem com os pauzinhos. Durante a sua estadia por terras do …, das poucas vezes que saiu para jantar deliciou-se com a comida do Sol Nascente duas vezes.


Primeiro, no dia …, quando jantou com o filho mais velho, TT, no restaurante …, situado no último andar do Hotel … (de cinco estrelas), em …, onde, dias antes, UU tinha jantado. O preço de cada refeição ronda os 500 euros (dez contos em moeda antiga)! No dia seguinte almoçou no famoso …, na praia do … e dia 8, ao jantar, voltou às ementas japonesas, desta vez no restaurante do …, a conhecida discoteca do …. O preço também não é para qualquer um.» (Al. U).

21)     E ainda, com o subtítulo "SEGURANÇA aparente", que:

«Já se sabia que AA REFORÇOU BASTANTE o número de seguranças privados e nem nas férias o zelo afrouxou. A casa tinha vigilância 24 horas por dia por uma brigada da GNR e o seu carro era sempre escoltado. No dia 10, "sugeridos" pelos seguranças, os agentes da autoridade tentaram correr com os jornalistas da JJ das imediações da casa de férias. O "único" problema é que se tratava de uma via pública e nem sequer havia mandato judicial a delimitar um perímetro de segurança! Tanto zelo e se alguém quisesse, podia fazer um piquenique à porta de casa de férias do chefe do Governo ...» (Al. V).

22)     E com o subtítulo "…", e duas fotografias com a chamada de atenção "Fotos exclusivas", que:

«Era uma das dúvidas sobre as férias de AA.

Com a fama de …, mas agora sendo …, iria ele resistir à tentação de "sair à noite"? Pelos vistos, não. No dia … (Sexta-feira), depois de ter jantado com o filho mais velho, tentou entrar no … (a discoteca … do verdadeiro jet set), mas virou costas depois de ter sido alertado por voz amiga da presença de jornalistas por perto. No dia …, a estratégia foi outra. Entrou na discoteca cedo, jantou calmamente, tomou um copo e saiu já tarde. Antes, tinha tido a garantia de que nenhum jornalista ia entrar. Como companhia, levava alguns amigos, o irmão e uma amiga próxima.» (Al. X).

23)      O Autor tem vindo, desde há muitos anos a esta parte, a passar férias naquela zona do País, nessa ou noutra casa com idênticas características à que utilizou nessas "mini férias" (Al. Z).

24)      O Estado não desembolsou qualquer quantia pela supra referida utilização da casa onde o A. passou as férias, nem este beneficiou de "um preço de amigo" (Al. AA).

25)        O Autor nunca, em toda a sua vida, jantou no restaurante … do Hotel …. de … (Al. BB).

26)        Enquanto desempenhou as funções de Primeiro-Ministro de Portugal, o Autor nunca jantou, nem sequer entrou, tentou entrar ou se acercou da porta do … da …, no … (Al. CC).

27)       As fotografias que ilustram o artigo, na parte sub-intitulada "…" são do ano 2003 (Al. DD).

28)       O Autor não exigiu o reforço da sua segurança, enquanto Primeiro-Ministro (Al. EE).

29)       A revista JJ do dia … de Agosto de 20… tinha na capa, cuja cópia consta de fls. …, aqui se dando por reproduzido o seu teor, uma fotografia do Autor, em primeiro plano, acompanhada dos seguintes dizeres: «ELE TEM FAMA DE … MAS DIZEM: "É APENAS UM ROMÂNTICO"... AA E OS SEUS AMORES» E AINDA «Conheça AS PAIXÕES OFICIAIS E AS OUTRAS!» (Al. FF).

30)        Nas páginas interiores da revista, cuja cópia consta de fls. …-…, foi publicado o conteúdo do artigo, aqui se dando por reproduzido o seu teor, aí se referindo designadamente que:

«Um sedutor nato. Esta é uma das características mais apontadas por quem priva com o Primeiro-Ministro. Uma faceta que lhe é conhecida desde os tempos do liceu e da faculdade. Contudo, a fama de … viria a nascer mais tarde, aos … anos, durante um cruzeiro da discoteca …. Não que antes AA não tivesse já uma vasta reputação de conquistador, gozando de grande popularidade entre o sexo feminino. Porém, aos olhos do Mundo, o cruzeiro transformou-o num bom vivant que nunca se importou de desfilar ao lado de mulheres bonitas e ter orgulho nisso. Por essa altura, em Setembro de 19…, o político contava já dois casamentos, duas uniões (que não resultaram) e cinco filhos. Ainda quente estava o famoso romance com UU, cujo primeiro capítulo tinha terminado exactamente uma semana antes. Por isso, quando embarcou a bordo do luxuoso paquete … para um cruzeiro de sete dias com destino a …, AA era um homem livre. Isso mesmo o próprio fez questão de dizer à Imprensa que acompanhou a viagem: estava oficializada a separação com UU e as feridas do coração tinham de ser saradas. O que, pelo menos aparentemente não era complicado, dado o "assédio feminino" de que AA foi alvo desde o primeiro instante da viagem. VV, uma das convidadas do cruzeiro e amiga do actual primeiro-ministro recorda bem esses dias: "no cruzeiro, ele, como pessoa educada que é, esteve sempre muito bem. Só que as mulheres metiam conversa com ele! Eu própria assisti a isso. Depois, ele era um homem livre e dotado de um grande charme." Depois de uma loura ... UMA MORENA! Contudo, foi uma bela morena do Porto, … e de seu nome … que viria a centralizar todas as atenções daquele político em plena ascensão. Conta quem lá esteve que desde o primeiro dia até ao momento em que o Funchal atracou de novo em Lisboa, os dois estiveram sempre juntos. Tornaram-se o casal mais badalado do cruzeiro e as suas fotos - na piscina da proa e nas festas à noite - fizeram as delícias dos portugueses. AA não se importou de tal mediatismo: "Se eu não tivesse acabado com a pessoa que toda a gente sabe (UU), há uma semana atrás, não estava com outra senhora. Todos nós temos as nossas escapadelas, mas tal seria demais!", declarou, então, AA, ao semanário XX - à época dirigido por QQ. Para a história da viagem ficaram também as fotos do ex-secretário de estado da Cultura e ex-presidente do … sempre bem disposto e rodeado de belas mulheres. Aos olhos do Mundo tinha nascido um …. "É verdade que foi a partir do cruzeiro da … que passaram a considerar o AA um …. Mas eu nunca o vi conquistar ninguém. As mulheres é que não o largavam", recorda VV.» (Al. GG).

31)       Ainda no mesmo artigo, e com o subtítulo "…", refere-se: «Embora a fama de … do primeiro-ministro já tenha colorido muitas revistas cor-de-rosa (e não só!), os amigos mais próximos contestam este epíteto. Todos defendem que AA não é um Dom Juan, mas sim dono de um charme natural que é muito apreciado pelo sexo feminino: "o AA é um sedutor nato mas não um …. E um homem de paixões, romântico e que, quando gosta não o esconde de ninguém. E antes de tudo, pelos seus filhos", declara à JJ um dos seus amigos de longa data, ZZ, autarca do …. Por isso, recorda que sempre foi um dos primeiros a saber quando AA estava apaixonado.

"Quando iniciava alguma relação séria, telefonava-me a mim e aos outros amigos pois queria que nós soubéssemos antes de se tornar público", conta ZZ que, no entanto, avança que agora AA está mais calmo no campo sentimental. Mas não o suficiente para se livrar da fama de bom-vivant. Há anos, terá dito que no dia em que concretizasse o sonho de ser primeiro-ministro iria festejar para a discoteca …. O desejo foi realizado, mas a festa foi feita em família (...)» (Al. HH).

32)       Foi publicado na revista DD, em … de Agosto de 20…, o artigo intitulado:

«"…", cuja cópia consta de fls. …, aqui se dando por reproduzido o seu teor, e no qual se refere que: «O primeiro-ministro esteve de férias na …, mas foi obrigado a regressar a … por causa do famoso "…". O Dr. AA ficou alojado na … e não descurou a segurança, mandando fechar a rua de acesso à habitação. Sabe-se que o primeiro-ministro almoçou no restaurante … e deu uma volta pela praia do …. Resolvida a questão da sucessão de AAA na Polícia …, AA ainda rumou ao Sul, na sexta-feira, ao fim do dia, para passar o Sábado com os filhos. Desta vez foi ainda mais discreto. Sabe-se que passou pelo … e jantou no Restaurante …, mas na praia ninguém o viu.» (Al. II).

33)      Nessa ocasião, o Autor não mandou fechar a rua de acesso à habitação onde passava férias (Al. JJ).

34)       Foi publicado no dia … de Agosto de 20…, na revista GG, o artigo intitulado "AA E BBB", cuja cópia consta de fls. …-…, aqui se dando por reproduzido o seu teor, no qual designadamente se refere que: «AA foi, desde sempre, "um homem de mulheres". Dono de uma personalidade sedutora e bem vincada, sempre se revelou um conquistador nato e bem sucedido junto do universo feminino.

De dois casamentos falhados, com CCC e DDD, e de um romance com EEE teve cinco filhos com idades que medeiam, actualmente, entre os … e os … anos.

No entanto, foram duas ligações mediáticas que mais chamaram a atenção para a vida romântica do actual primeiro-ministro: a primeira, com UU, e a segunda com BBB. (...) Esta semana, porém, assistiu-se a inesperado reencontro de BBB e AA, num restaurante …, sito no complexo comercial …, em …. Rodeados por alguma segurança como seria de esperar por parte do primeiro-ministro de qualquer país - Jantaram acompanhados por um outro casal, tendo-se deliciado com alguns dos melhores e mais requintados acepipes da gastronomia do … - regados, no entanto, com um bom vinho de casta portuguesa. Contactada pela GG por forma a levantar um pouco o véu sobre esta possível reaproximação, BBB afirmou ter-se tratado de um simples jantar, sem qualquer razão específica, até porque, disse: "Sou muito amiga do AA. Sempre fui amiga dele!" Inquirida sobre a possibilidade de o primeiro-ministro AA poder estar interessado em oferecer-lhe algum dos diversos cargos ainda disponíveis na sua recente equipa de trabalho, a empresária limitou-se a sorrir e a dizer que não se tratava de "nada disso", rematando a conversa acrescentando, apenas, que ambos são grandes fãs da culinária …. No ar ficam, assim, algumas hipóteses: a de permanecerem apenas amigos; a de virem a reatar o romance; ou a de poderem vir a trabalhar juntos. Como tal, resta-nos assistir às cenas dos próximos capítulos." (Al. LL).

35)      O Autor, na escolha dos elementos das equipas que dirigiu, fossem elas de executivos autárquicos, de gabinetes de membro do Governo ou do próprio Governo, sempre privilegiou, acima de qualquer outra coisa, a competência e adequação do perfil de cada um ao cargo a exercer (Al. MM).

36)      Em … de Setembro de 20…, na revista DD foi publicado o artigo intitulado "M… para AA", cuja cópia consta de fls. …, aí se referindo que: «AA gozou uns dias de alto mar em …, ao largo da costa mediterrânica espanhola. A bordo do luxuoso iate de um político castelhano, o primeiro-ministro, andou sempre aprumado, de traje marítimo. Na "suite" que lhe estava destinada, o chefe do Governo português acertava o cabelo com gel da moda, "quiçá", perguntando: "espelho meu, espelho meu, há mais algum primeiro-ministro de férias, tirando eu?" Apesar disso, a DD está em condições de dizer que AA não usou a fita vermelha, no cabelo, que o celebrizou no cruzeiro de uma conhecida revista social.» (Al. NN).

37)      No artigo de … de Setembro de 20…, foi publicado na revista DD o artigo intitulado "…", cuja cópia consta de fls. …/…, aqui se dando por reproduzido o seu teor, no qual se refere que: «Na senda da governação aos solavancos, o gabinete do primeiro-ministro, AA, divulgou na comunicação social que o Governo tinha decidido, na sequência dos acidentes e do inquérito aos mesmos na refinaria da …, encerrar a dita instalação industrial. Sábia medida! De um só golpe, o Governo de AA acaba com um perigo para a população de …, permite a construção de mais um rico empreendimento imobiliário no concelho de … ... e acaba com a gasolina em Portugal. Leu bem: acaba com a gasolina em Portugal! Só na refinaria de … é que existe uma unidade industrial que acrescenta os aditivos necessários ao precioso combustível. O preço da transferência de tal unidade para Sines custaria muitos milhares de milhões de euros» (Al. 00).

38)      Nos dias … de Setembro e … de Outubro de 20…, foram publicados na revista DD os artigos intitulados "….", cujas cópias constam, respectivamente, de fls. …/.. e fls. …/…, aqui se dando por reproduzido o seu teor, referindo-se: - no primeiro, designadamente que: «AA é que não foi na conversa. Pudera, o Governo só será percebido quando o primeiro-ministro não desmentir na segundo o que disse no domingo»; - e no segundo, além do mais, que «Ninguém percebe o que o primeiro-ministro quer. As segundas, garante que é preciso trabalhar; às terças, concede "pontes" desastrosas para a economia nacional. Vai ser preciso atar um cordel a AA: sempre que o pé lhe descaia para o eleitoralismo, o governador do Banco … puxa a corda» (Al. PP).

39)      No dia … de Outubro de 20…, a Revista DD publicou o artigo denominado "A … DE AA", cuja cópia consta de fls. …-…, aqui se dando por reproduzido o seu teor, aí se afirmando designadamente que: «(...) nunca o Palacete …, residência oficial do primeiro-ministro de Portugal, tinha conhecido tamanha animação. O inquilino de hoje, AA, não levou para o velho casarão do século XIX apenas a família: com ele e com as malas chegaram o seu estilo e o seu ritmo, num compromisso habilmente administrado entre agenda protocolar, pequenos-almoços domésticos, reuniões oficiais, visitas de amigos, trabalho de gabinete e ceias fora de horas. A frenética mescla começou por arrepiar polícias e funcionários, habituados a outros costumes - mas, escassos dois meses e meio depois da sua chegada ao palacete, o chefe do Governo já viu impostas e vulgarizadas as novas regras, transformando a sua imprevisibilidade congénita numa rotina sem grande sobressalto. A última semana foi ilustrativa da azáfama em que hoje vive o chalet da …: entre visitas políticas e oficiais, deslocações a Belém e deveres fixos de agenda, AA transformou a residência de … num "quartel-general" onde "brigadeiros" do … se acotovelavam, de mistura com membros do Governo e "amigos de sempre" que, estando "em casa do AA", não podiam deixar de sentir-se em sua própria casa.

A preparação do discurso de segunda-feira passada (que, aos olhos do respeitável público, teria sido feita num ambiente sisudo de assessores e peritos deslizando de sala em sala sobre alcatifas de prudência) fez AA regressar, afinal, aos tempos "heróicos" da "política …": bandejas com sandwiches atravessavam os corredores, grupos de trabalho arrancavam frases do fundo de imaginações desenfreadas, enquanto, agarradas aos telemóveis, as secretárias se espremiam para encontrar quem "o chefe" queria mesmo ouvir. "Chame fulano", "peça a sicrano que venha já". Pela noite de … dentro recebiam-se ainda visitas, burilavam-se parágrafos, sopesavam-se vantagens e desvantagens - as salas de trabalho destilando um frenesim capaz de, de novo, remeter à tumba o primeiro ocupante oficial da mansão, o prof. FFF, ali mesmo falecido, num quartinho soturno do primeiro piso, em Julho de 19…. (...) Não foi precisa uma grande camioneta de mercadorias para levar a São Bento o mais essencial e mais urgente da bagagem do primeiro-ministro: um guarda-roupa funcional (onde avulta uma boa colecção de gravatas) e um lote modesto de livros, objectos e papéis pessoais bastaram a AA para se fazer ao novo lar. (...) Nesse refúgio trabalha e convive até altas horas, depois de ter terminado as funções oficiais no rés-do-chão e antes de ir aconchegar os filhos nos quartos do antigo sótão. Aí recebe amigos e amigas, liberto dos formalismos que o uso dos salões nobres lhe imporia. Chega a estar dias inteiros no seu novo "reduto" (sobretudo aos fins-de-semana) - enquanto cá em baixo, na portaria da Rua …, os polícias de serviço se esfalfam a inscrever nomes sonantes da vida social e política na interminável lista de visitantes. Este é, aliás, um dos aspectos em que a vida no Palacete … mudou como do dia para a noite. Até há pouco, o casarão servia de simples gabinete de trabalho, albergando primeiro-ministro, governantes do círculo político mais próximo, serviços de secretariado e repartições da Presidência do Conselho. Os visitantes eram esperados: constavam de listas oficiais e encaixavam como uma luva na agenda oficial. Pouco depois da tomada de posse de AA, começaram a frequentar … inúmeros amigos e amigas do novo primeiro-ministro, que chegavam sem aviso ou formalidade. Vinham "estar com o AA".

Muitos são dirigentes e figuras de proa do próprio …. Outros seguem há muito a vida de AA, como apoiantes, confidentes, compagnons de route. Entre eles não faltam figuras públicas, celebrizadas em revistas cor-de-rosa. (...) As normas e as rotinas foram alteradas - e hoje os guardas não se surpreendem por encontrar o primeiro-ministro em passeios bucólicos pelo jardim, a horas inesperadas, ou por ouvirem bater ao portão depois daquilo que nas casernas policiais é a conveniente "hora de recolher". Aliás, não se pode precisamente afirmar que haja uma "hora de recolher" em casa de AA.

Depende, antes de mais, dos afazeres oficiais. Uma regra o chefe do Governo impôs já à sua entourage íntima: a partir da uma e meia da manhã, salvo caso de excepção ou gravidade, AA despe "a farda" de primeiro-ministro e passa a ser um cidadão comum. Recebe quem lhe apetece, como lhe apetece. Depois que "assentou" no cargo, voltou mesmo a sair à noite, a matar saudades dos seus locais de culto e estimação: a … e a … de novo recebem, a horas pequenas, a visita do seu mais famoso cliente. (...) Não pode desafiar UU para acompanhá-lo nas discretas saídas nocturnas: a ex-namorada do primeiro-ministro está a representar um papel na …, da …. (...) Mas companhia nunca faltou a AA - embora os amigos mais chegados lhe detectem, nesta curva dos … anos de idade, a par do cabelo grisalho, um estranho desejo de "acalmia". E não falta quem lhe adivinhe, na organização quadricular do Palacete de …, um quarto vazio, reservado, cativo. Talvez destinado a quem trocou um lugar na Rua … por uma Quinta onde só a Imprensa vê estrelas. (...) "Começa o dia, o chefe do Governo desce a saber da agenda, a ler os primeiros dossiers. Não há olheiras, rugas ou ressacas. Há anos e anos que o AA não sabe o que é uma boca a saber a papéis de música. (...). A hora das refeições, os velhos cozinheiros sonolentos que outrora serviam bifes duros a governantes sem apetite deram lugar a uma pequena mas ágil brigada de senhoras que cozinham com o esmero das antigas "criadas de fora" da Av…. Comida caseira, que cheira e sabe a verdade, chega agora à grande mesa de refeições do 1.° piso. Comensais nunca faltam à volta do primeiro-ministro - amiúde os filhos, que, vindo esfomeados, das aulas, fazem as honras da casa com sofreguidão. Fugindo por vezes ao roteiro Lisboeta, AA aproveita as suas visitas de trabalho para espairecer.» (Al. QQ).

40)       Nunca no mandato do Autor funcionaram naquela parte do gabinete do Primeiro-Ministro (o Palacete) grupos de trabalho aos quais fossem servidas bandejas de sandwiches (Al. RR).

41)      O Autor levou a sua colecção de livros para a residência oficial do primeiro-ministro (Al. SS).

42)      Não houve na residência oficial do primeiro-ministro, enquanto o Autor aí viveu, convívios "até altas horas", nem uma lista, elaborada por polícias, de visitantes de figuras conhecidas da vida social e política (Al. TT).

43)     O Autor apenas recebeu na residência oficial as pessoas que com ele trabalhavam e as pessoas suas amigas. (Al. UU).

44)      No dia … de Outubro de 20…, na revista DD, foi publicado o artigo intitulado "…" da autoria do Réu EE, cuja cópia consta de fls. …, aqui se dando por reproduzido o seu teor, aí se referindo designadamente que: «Enquanto o país político discute o "caso GGG" e o país real discute a …, a DD leva-o esta semana a conhecer outra "…", a residência oficial do primeiro-ministro AA, em …. O austero Palacete … (...) vive dias de grande animação, um autêntico "pé de vento criativo". Tal como os anteriores inquilinos, de FFF a OO, AA levou para … o seu estilo. E o velho casarão vive agora a um ritmo frenético, repartido entre a zona familiar, no segundo andar, onde ficam os quartos do primeiro-ministro e dos seus cinco filhos; a área de "Estado", no rés-do-chão; e o espaço privado contíguo ao gabinete no primeiro andar, o verdadeiro refúgio onde AA descansa e recebe os amigos e amigas que continuam a visitá-lo. E nesse reduto que o chefe do Governo toma as decisões que influenciam a nossa vida. Se cumprir as promessas que fez esta semana - aumentar os funcionários públicos e as pensões de reforma e baixar o IRS, sem rebentar com o défice para não ter de nos apertar o cinto na próxima oportunidade -, então, é melhor para todos que ele se sinta bem na casa que lhe emprestamos. (...)» (Al. VV).

45)     Em … de Setembro de 20…, foi publicado na revista DD o artigo "E….", cuja cópia consta de fls. …, aqui se dando por reproduzido o seu teor, do qual designadamente consta que: "A escolha de HHH para presidir ao Instituto da Droga e da Toxicodependência (IDT) e de III para chefiar a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDRN) - dois homens do aparelho do … - escandalizou a oposição e causou incómodo a alguns sociais-democratas pela falta de perfil técnico, tanto de um como do outro, para ocuparem aqueles cargos. GGG não escondeu a indignação no seu comentário dominical no Jornal Nacional da …. GGG, ele próprio antigo líder …, falou de "clientelismo" e referiu-se a III como um "…" do …, que não tem obviamente currículo para o cargo". (...) A estes dois casos junta-se o de JJJ, autarca … há … anos, que deixou a presidência da Câmara de … para tomar posse como administrador das Aguas … (...)." (Al. XX).

46)     Mais consta, com a chamada de atenção "NÚMEROS REDONDOS", o seguinte:

«… e … não poupam nas nomeações das pessoas "amigas" Em dois meses, o Governo de AA já fez correr muita tinta pelo perfil das pessoas escolhidas para assessorar o Governo. (...) O recorde cabe a KKK: o ministro das … fez … contratações para o seu gabinete e … para os seus dois secretários de Estado, num total de 60 pessoas. Segue-se QQ: fez … nomeações, incluindo … motoristas! O primeiro-ministro vem logo a seguir: levou … caras novas, … são secretárias! E não há Governo que se gabe de não ter sido criticado pelo número de boys. Cinco mil ficam para a história do Executivo de QQ, em pouco mais de dois anos. Já LLL, nos … anos em que esteve à frente dos destinos do País, totalizou mais de … mil nomeações. Foi, aliás, durante o seu mandato que surgiu a expressão "jobs for the boys" - em vernáculo, "tachos para os rapazes.» (Al. ZZ).

47)     As funcionárias nomeadas pelo Autor eram aquelas que, devendo ser nomeadas pelo Primeiro-Ministro (porque integrantes do seu "staff), se destinavam a trabalhar com o Chefe do Gabinete, com os assessores e com os adjuntos do mesmo, em número igual ou inferior ao das nomeações feitas por qualquer dos seus antecessores (Al. AAA).

48)      Em … de Outubro de 20…, foi publicado na revista DD o artigo intitulado "C…", cuja cópia consta de fls. …-…, cujo teor se dá por integralmente reproduzido (Al. BBB).

49)      Em … de Novembro de 20…, foi publicado na revista DD, o artigo cuja cópia consta de fls. …-…/…-…, aqui se dando por reproduzido o seu teor, intitulado "P… …., !" (Al. CCC).

50)     Em … de Dezembro de 20…, foi publicado na revista DD, o artigo intitulado "O …", cuja cópia consta de fls. …, aqui se dando por reproduzido o seu teor, da autoria do Réu EE (Al. DDD).

51)      Em …. de Dezembro de 20…, foi publicado na revista DD o artigo intitulado "M…. .", cuja cópia consta de fls. …-…/…-…, aqui se dando por reproduzido o seu teor (Al. EEE).

52)       Em … de Dezembro de 20…, foi publicado na revista DD o artigo intitulado "M…", cujo conteúdo literal se encontra reproduzido a fls. …, aqui se dando o mesmo por reproduzido (Al. FFF).

53)      Em … de Dezembro de 20…, foi publicado na revista DD o artigo intitulado "…... ", cuja cópia consta de fls. …/…, aqui se dando por reproduzido o seu teor, no qual se refere que:

«As eleições têm sempre um desfecho imprevisível, mas, ganhe quem ganhar, uma coisa é certa: em 20… Portugal terá Governo. AA herdou o posto do "emigrante" QQ, mas o fantasma da sua falta de legitimidade política nunca se desvaneceu. Os ataques surgiram de todo o lado, a desorganização imperou durante os meses de AA em … e obras feitas, só mesmo na residência oficial do primeiro-ministro.

Em caso de reeleição, AA já assegurou uma nova maioria absoluta - a coligação com o …-… está acertada - e terá novo ânimo e legitimidade para governar. Do outro lado da barricada, MMM já superou o complexo … e não se cansa de pedir uma maioria absoluta livre de encargos, entenda-se, sem coligações. Isto se o resultado das eleições não deixar a situação quase na mesma, sem maiorias possíveis...».(Al. GGG).

54)      Em … de Novembro de 20… foi publicado na Revista JJ o artigo intitulado "… ", cuja cópia consta de fls. …-…, aqui se dando por reproduzido o seu teor (Al. HHH).

55)      Durante o mandato do Autor como primeiro-ministro não foram feitas obras na sua residência oficial, nem alterada a decoração (Al. III).

56)      Em … de Dezembro de 20… foi publicada na revista DD o artigo intitulado "…", cujo conteúdo literal se encontra reproduzido a fls. …-…, aqui se dando o mesmo por reproduzido (Al. JJJ).

57)       O artigo intitulado "Primeiro-ministro de Portugal no … A BOA VIDA do nosso "primeiro" em férias" pretendeu demonstrar que este, no exercício das suas funções, aproveitava para ter regalias únicas (Art. 2.°).

58)       O artigo ELE TEM FAMA DE … MAS DIZEM: "É APENAS UM ROMÂNTICO"... .AA E OS SEUS AMORES foi elaborado com o objectivo de demonstrar que este era incapaz de assumir responsabilidades de Estado, pretendendo caricaturá-lo, como uma pessoa frívola, instável, libertina, um … (Art. 3.°)'.

59)      O artigo "…" foi elaborado com o objectivo de atingir a imagem do Autor (Art. 4.°).

60)      Com o artigo "AA e BBB" quis-se dar a entender que o Autor andava a distribuir cargos públicos pelos seus amigos (Art. 5.°).

61)      Os artigos intitulados "M…" de …-09-20… e …-10-20…, foram elaborados com o propósito de atingir a imagem do Autor (Art. 8.°). ' Matéria alterada conforme ponto 5.3. da Fundamentação de Direito.

62)     Os artigos "C…" e "E…" foram elaborados com o objectivo de fazer passar a imagem do Autor como a de um … (Art. 10.°).

63)     Os RÉUS escreveram e/ou participaram na elaboração/publicação, dos factos relatados nos artigos acima referidos alguns dos quais, conforme referido nas alíneas Z), AA), BB), CC), EE), JJ), MM), RR), TT), UU), AAA) e III) da matéria assente, não correspondiam à verdade (Art. 12. °)2.

64)     Os artigos acima referidos foram publicados em revistas de grande tiragem e de venda por todo o território nacional (Art. 13.°).

65)      A partir da data da publicação de tais artigos, o Autor passou a ser alvo de piadas entre amigos (Art. 14.°).

66)       Também com o teor desses artigos o Autor sentiu-se ofendido na sua credibilidade, prestígio, reputação e imagem, tanto pessoal, como social e institucional (Art. 15.°).

67)       O Autor sempre foi um político respeitado e considerado no meio político e social em que se insere (Art. 16.°).

68)      O Autor viu o seu prestígio abalado e deixou de ser convidado, durante o período imediatamente posterior à cessação de funções como Primeiro Ministro, pelos diferentes meios de comunicação social para participar em debates televisivos ou escrever na imprensa, em termos remunerados, como anteriormente sucedia (Art. 17.°).

69)       Durante o período imediatamente posterior à cessação de funções como Primeiro Ministro, o Autor não veio a ser solicitado para o preenchimento dos mais altos cargos na sociedade portuguesa (Art. 18.°)

70)      Durante o período imediatamente posterior à cessação de funções como Primeiro-Ministro, o Autor não veio a ser procurado para prestar os seus serviços jurídicos de advogado (Art. 19.°).

71)       Foi necessário um período de tempo não inferior a três anos, desde que o Autor deixou de exercer o cargo de Primeiro-Ministro, para repor o seu prestígio na sociedade e na área política onde se move profissionalmente (Art. 20.°).

72)      Durante esse período de 3 anos, o Autor teria auferido o total de 90.000é] à razão de 2.500,00€ por mês, pela participação na imprensa escrita, através de artigos de sua autoria?

73)      E ainda 180.000€, à razão de 5.000€ por mês pela participação em programas de ….

74)      Bem como «125.000,00, à razão de 50.000€/ano - correspondente a dois anos e meio - pela prestação de serviços jurídicos e de consultadoria a terceiros, tomando como base de comparação a receitas cobradas e as que, em média, atinge um advogado, em Portugal5.

75)       Provado apenas o que consta no ponto 1. da fundamentação de facto.

76)        A Ré LL dispõe de uma direcção geral editorial que analisa os temas e assuntos gerais a incluir nas publicações que dita (Art. 25.°).

77)       Cabe em concreto e caso a caso à redacção e ao director de cada revista a elaboração e aprovação para publicação do texto, paginação, títulos e fotos (Art. 26.°).

78)       A Ré HH apenas em …-04-20… começou a exercer as funções de jornalista, como Directora da Revista GG, ao serviço da Ré LL (Art. 27.°).

79)       Ao fim de pouco mais de 1 mês no exercício das funções de primeiro-ministro, o Autor passou 4 dias de férias nas …, com transporte em avião a jacto (Art. 28.°).

80)       O Autor concedeu entrevistas e autorizou a publicação de imagens suas em revistas ditas «cor-de-rosa» (Art. 29°).

81)       Tendo participado em iniciativas dessas revistas, designadamente no … da …/…, onde foi captada a fotografia de lenço na cabeça cuja cópia consta de fls. … (Art. 30.°).

82)       O Autor viajou para … com ... dos seus filhos, com despesas de viagens e alojamento pagas pela Ré LL, tendo-se deixado fotografar e aos seus filhos como contrapartida pelo pagamento daquelas despesas (Art. 31.°).

83)       Nessa viagem deslocou-se um jornalista e um repórter fotográfico, com despesas de deslocação e alojamento pagas pela Ré LL, os quais realizaram a reportagem publicada nas páginas da revista GG edição n.° …, de …-…-19… a …-…-19…, cuja cópia consta de fls. …-… (Art. 32.°).

84)       Nessa ocasião foram tiradas pelo repórter fotográfico fotos que foram publicadas e outras que ficaram no arquivo da Ré LL (Art. 33.°).

85)        No dia da sua eleição para Presidente da Câmara Municipal de …, o Autor apareceu na varanda dos … a acenar ao povo com a sua namorada da altura e conhecida figura do jet set, BBB (Art. 34.°).

86)      O Autor participou em programas televisivos, designadamente no reality show "…" e foi comentador desportivo (Art. 35.°).

87)       O Autor tornou públicos, alguns factos da sua vida pessoal e familiar não se coibindo de falar dos mesmos (Art. 36.°).

88)        Passado algum tempo após a cessação de funções como Primeiro Ministro e actualmente, o Autor mantém actividade partidária, sendo com frequência ouvido pela comunicação social acerca de acontecimentos relevantes da vida do partido no qual é filiado (Art. 37.°).

89)      Os seus comentários políticos e pessoais são transcritos na imprensa a propósitos de factos sociais e políticos (Art. 38.°).

90)      O Autor nos diferentes planos de actividade em que actua obtém notoriedade e popularidade (Art. 39.°).

91)      Para além dos artigos dos autos e referidos no artigo 380." da petição inicial foram publicados por terceiros artigos de comentários e noticiosos no período até …/…/20…, nomeadamente os de fls. …, … e seg., … e segs., … e segs., …, .., …, …, … e segs., …, … … (… e segs. ), … (… e segs.), … (… e segs.), …, …, … (…e seg), … e segs., … (… e seg.), … (… e seg), … e segs (… e segs.), … a … (Art. 40.°)7.

92)     O artigo "…" foi elaborado com o objectivo de imputar ao A. a tomada duma decisão sem fundamento (art. 7°) .

93)      O artigo, "…." foi elaborado com o objectivo de prejudicar a imagem do A. de homem de Estado junto dos eleitores (art. 9o) .

94)       Os Réus, com os artigos em causa, denegriram a imagem do A., lançaram a suspeita sobre a sua idoneidade pessoal e diminuíram a confiança na sua capacidade em exercer cargos públicos, condicionando a continuação do exercício do cargo de primeiro-ministro (art. 1 Io).10


3. Seguidamente, apreciou a Relação as questões procedimentais que eram objecto de agravo, tendo concluído pela procedência do agravo interposto contra a decisão de condenação do A. como litigante de má-fé.

4. Passando à apreciação das apelações, aborda logo o acórdão recorrido a questão prévia - da inadmissibilidade dos recursos de FF, BB, EE, II, KK e CC, afirmando:

Alega o A. que os recursos mencionados na epígrafe não são admissíveis já que, foi o Dr. NNN, mandatário dos RR. HH e CC, que procedeu à entrega, por via electrónica, de um requerimento da autoria do Dr. OOO, mandatário dos demais Réus, conforme assinatura nele aposta.

Adianta o A. que se pretendiam aquelas compartes proceder à entrega conjunta de requerimento, deveriam fazê-lo mediante subscrição múltipla no caso de entrega via Citius, o que não foi efectuado, existindo cominações legais, ter-se-á a peça por não apresentada (art.1273 da Portaria 114/2008).

1.1. A Portaria 1538/2008 de 30/12, regula aspectos da tramitação electrónica dos processos judiciais, entre eles, a apresentação de peças processuais por via electrónica, que, além do mais, devem ser assinadas digitalmente através de certificado de assinatura electrónica.

O art. 12°, n° 3 da citada Portaria refere-se à apresentação da peça assinada por mais de um mandatário, cabendo, ao mandatário que a não tenha enviado, proceder a uma declaração electrónica de adesão à peça - art. 12°, n° 1, al.b) da Portaria mencionada. Todavia, a apresentação da peça por mais de um mandatário pelo Citius depende do registo prévio de todos os mandatários que a apresentam (art. 12°, n°2, da Portaria).

No caso em apreço, o Dr. NNN, em nome de todos os RR, requereu a interposição dos recursos.

Cabe notar que o art. 5o, n° 3, prevê-se o efeito da falta de adesão do mandatário que tenha apresentado a peça, mas condicionada essa apresentação ao facto da prévia inscrição no Citius. Mas, no caso, o advogado signatário não está inscrito no Citius, pelo que não poderia aderir pelo Citius ao requerimento de interposição de recurso.

Considerando esta irregularidade, pretende o A. que, seja aplicada a sanção prevista no art. 5o n° 3 da citada Portaria, como se o signatário do requerimento pudesse ter aderido à peça, como qualquer mandatário inscrito no citius, como se se tratasse de pura inércia do signatário ao "abster-se" de aderir pelo Citius à peça remetida.

O que subjaz a esta sanção é a atitude de desinteresse ou negação pelo advogado signatário em não ter subscrito a peça pelo citius, quando podia tê-lo feito.

1.2.    Mas, não é esse o caso dos autos, já que o signatário estava impedido de aderir ao requerimento, por esse sistema por nele não estar inscrito.

Por isso, ainda que a situação seja singular e que o signatário tivesse ao seu dispor outros meios para interpor o recurso, não se afigura que a consequência seja a de impedir os RR. de apresentar as sua alegações de recurso.

Não pode, no caso, retirar-se da falta de adesão o efeito cominatório de não apresentação da peça - requerimento de interposição de recurso, inviabilizando a posterior apresentação de alegações de recurso.

Ademais, na Portaria regulam-se os actos pelo meio citius - e por isso no domínio das relações de quem a ele aderiu -, e não já os actos fora do sistema citius, sendo que qualquer sanção ou efeito no uso do sistema apenas vincula quem nele está inscrito e por ele pode praticar actos processuais.

1.3.     Os restantes casos serão regulados de acordo com as normas gerais do Código Processual Civil, maxime as que regulam o patrocínio judiciário, verificando-se, da sua leitura, que só em última instância se estabelece medida tão drástica quanto a preconizada pelo A. (vide art. 41° do CPC).

Este preceito legal prevê, na falta de constitui de mandatário em casos de patrocínio obrigatório, a realização oficiosa de diligências, prévias à aplicação da cominação de: absolvição da instância, de não ter seguimento o recurso ou de ficar sem efeito a defesa, consonte os casos.

Se assim é, não faz sentido, que, no caso dos autos, em que não se prefigura uma situação de falta de um pressuposto processual e portanto de uma irregularidade tão grave como a falta de patrocínio - os RR. são há muito representados pelo Dr. OOO, com procuração nos autos - se viabilizasse o entendimento preconizado pelo A., além do mais, por violação do princípio da proporcionalidade, previsto no art. 18° da Constituição.

Aliás - e ainda que tal não constitua impedimento à arguição da irregularidade para actos posteriores - já anteriormente, o Dr. NNN, seja em representação pelo cliente que na altura representava, seja pelos demais RR, mesmo em gestão de negócios, procedeu à interposição de recursos, sem que o A. tivesse invocado esta irregularidade (cfr. requerimento entregue pelo citius em 15.6.2012 que foi remetido pelo Dr. NNN e subscrito pelo advogado signatário e pelo primeiro).

Tal requerimento deu entrada atempada em juízo e o A. dele tomou conhecimento atempado, pelo que nenhum embaraço processual ou prejuízo foi causado.

Quando muito pode equiparar-se a uma situação de gestão de negócios (art. 41° do CPC) ou mera irregularidade de mandato que, a seu tempo, foi devidamente sanada, como resulta dos autos, com a ratificação do processado.

Consequentemente, foram correctamente admitidos os recursos de apelação em causa.


   Seguidamente, aborda o acórdão recorrido as questões das nulidades de sentença, tendo-as por improcedentes., ao considerar inverificadas as nulidades de omissão de pronúncia e de falta de fundamentação.

   5. Finalmente, passando à apreciação do mérito da causa, o acórdão recorrido alterou parcialmente a sentença, ao conceder parcial provimento aos recursos, julgando nos seguintes termos:

- Parcialmente procedentes os recursos dos RR. e do A. e, alterando, parcialmente, a sentença e, consequentemente, condenam-se os Réus, a pagar ao Autor a quantia total de 395.000,00 (315.000,00 + 80.000,00), solidariamente, nas seguintes proporções:

a)     os Réus BB Serviços Editoriais e Gráficos SA e KK, são responsáveis pela totalidade dos danos causados, isto é, no pagamento das quantias de € 80.000,00 (oitenta mil euros) a título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos pelo Autor e € 315.000,00 (trezentos e quinze mil euros) a título de compensação pelos danos patrimoniais sofridos pelo Autor, no total de € 395.000,00 (trezentos e noventa e cinco mil euros).

b)     os RR. EE e CC, são solidariamente responsáveis, respectivamente, em 60% e 40% dos danos causados pela Revista DD, no valor de 237.000,00 (60% x 395.000,00), isto é, EE - até €142.200,00 (237.000,00 x 60%) do montante global. CC - até €94.800,00 (237.000,00 x 40%) do montante global.

c)      a Ré FF é solidariamente responsável, em 15% dos danos causados pela Revista GG (15% x 395.000,00), ou seja, responde até €59.250,00 da totalidade dos danos causados.

d)      a Ré II, é solidariamente responsável, em 25% dos danos causados pela Revista JJ (25% x 395.000,00), ou seja, €98.750,00.


   Tal decisão assentou na seguinte fundamentação essencial:

7. Dos pressupostos da responsabilidade civil

Na presente acção, o A. fundamenta a sua pretensão indemnizatória na responsabilidade civil dos RR. por acto ilícito, com violação do seu direito ao bom nome, prestígio e reputação.

Os direitos de personalidade têm protecção no Direito Internacional, designadamente nos artigos 6º, 12° e 15° da DUDH e artigo 8o da CEDH e, a nível interno, no artigo 26° da Constituição e nos artigos 70° e seguintes do Código Civil.

A responsabilidade por ofensas à personalidade física ou moral são aplicáveis, em termos gerais, os artigos 483° e seguintes do CCivil, dispondo o artigo 484° deste diploma que responde, pelos danos causados quem afirmar ou difundir um facto capaz de prejudicar o crédito ou o bom nome de qualquer pessoa, singular ou colectiva. Desta forma, a lei protege, as pessoas contra qualquer ofensa ilícita à sua personalidade moral, pelo que a obrigação de indemnizar resultante daquela modalidade de responsabilidade supõe a prática de um facto ilícito (e culposo) que tenha causado prejuízo a alguém, no domínio dos bens inerentes à sua personalidade.

Segundo o artigo 483°, n.° 1, são pressupostos da responsabilidade civil o facto voluntário, a ilicitude a culpa, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano. Da sentença recorrida consta já uma análise dos pressupostos da responsabilidade civil, pelo que se mostram despiciendos maiores desenvolvimentos quanto a esta temática.

Em resumo dir-se-á, apenas, que a tutela civil da honra não se limita às áreas específicas da honra cuja ofensa é mais gritante, como acontece no direito penal, antes abrange a globalidade desse bem, sublinhando-se, deste modo, a desnecessidade da presença de animus injuriandi na conduta do ofensor, sendo de assinalar que, no direito civil não há uma taxatividade de modos típicos de violação do bem da honra, relevando todas as ofensas à honra não só em público, mas também em privado, quer verbais, quer por escrito, gestos, imagens ou outro meio de expressão, tanto as que envolvam a formulação de difamações ou outros juízos ofensivos como as que levantem meras suspeitas ou interrogações de per si lesivas e mesmo quaisquer outras manifestações de desprezo sobre a honra alheia.

Tudo isto, porém, sem prejuízo de uma graduação da ofensa em função da particular importância da área violada do bem da honra, do grau de intensidade do dolo ou da negligência e da especial expressividade do modo da violação.

Apreciado e interpretado o normativo em causa, podemos ter ainda como certo que, na "previsão do art. 484° cabem todas aquelas expressões que, baseadas em factos (verdadeiros ou falsos), são passíveis de gerar um movimento negativo em relação ao visado, diminuindo a estima de que goza junto dos demais"  .

Mas, se o direito ao bom nome e reputação está consagrado, quer no direito internacional e, a nível interno, na Constituição e na lei ordinária, também o direito de expressão e de informação recebeu igualmente consagração no Direito Internacional (artigo 19º DUDH e artigo 10º da CEDH) e, a nível interno, na Constituição e na Lei de Imprensa 2/99. de 13 de Janeiro, alterada pela Lei 18/2003, de 11 de Junho.

Assim, nos termos do artigo 37°, n.° 1 da CRP, "todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informado, sem impedimento nem discriminações".

Por outro lado, o artigo 38°, n.os 1 e 2 CRP garante a liberdade de imprensa, a qual implica a liberdade de expressão dos jornalistas, ou seja, engloba o direito de informação, sem impedimentos, discriminações ou limitações por qualquer tipo de censura.


A liberdade de informar e o direito a ser informado, a liberdade de expressão, situam-se, assim, no campo dos direitos fundamentais, havendo que procurar saber como compatibilizá-las com outros direitos também constitucionalmente garantidos, como o direito à protecção da honra e da imagem dos cidadãos, para verificação da ilicitude de determinada conduta jornalística.

Como é sabido, a ilicitude não tem lugar quando "se exercitam poderes derivados da prevalência, ou ordenada pela lei na regulação dos interesses da vida real, de certo interesse, através da atribuição de um direito subjectivo, com denegação de relevo jurídico ao interesse conflituante. Pelo que o titular de um direito não tem de responder civilmente pelos prejuízos na esfera da personalidade de outrem que, embora causados pelo exercício desse direito, representem, de um ou de outro modo, a frustração dos interesses que a lei postergou ao conceder aquele direito. É este o entendimento corrente do princípio "qui iure suo utitur nemini facit iniuriam". Só que, aqui, não se estará propriamente perante uma causa justificativa da ilicitude, na medida em que não há como que uma prévia ilicitude que seja sequencialmente justificada, nem há, por conseguinte, um autêntico acto lesivo. Estamos, sim, perante a determinação do próprio âmbito normativo do direito que, directamente, torna lícita a prevalência de certos interesses sobre outros e lícitos os actos em que essa prevalência se exprime" .

Segundo o critério da ponderação de bens, estando em causa a colisão do exercício de dois direitos constitucionais, a solução de tal litígio deve resultar de um juízo de ponderação em que se procure, em face da situação concreta, encontrar e justificar a solução mais conforme ao conjunto dos valores constitucionais só existindo, porém, verdadeiro conflito de direitos, quando os mesmos são exercidos dentro dos seus limites .

E que não há direitos absolutos ou ilimitadamente elásticos, comportando, pois, limitações que não devem ir além do necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos, sempre com respeito pelos princípios da proporcionalidade.

Assim, como limites imediatos à liberdade de imprensa, podem assinalar-se a integridade moral e física das pessoas - art. 25°, n° 1, CRP -, os direitos ao desenvolvimento da personalidade, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem e à reserva da intimidade da vida privada e familiar - art. art. 26°, n° 1, CRP.

Segundo o critério do âmbito material da norma, dir-se-á que os limites de cada direito se determinam em função do seu próprio fim e pela existência de outros direitos (assim, se o agente, no exercício concreto do direito, ultrapassa o seu fim, extravasa o limite do direito).

Segundo, por fim, o critério do princípio da proporcionalidade, há que assentar na seguinte ordem de raciocínio: ao direito fundamental de informação cumpre o exercício de uma função pública onde se insere toda a actividade relativa à formação democrática e pluralista da opinião pública em matéria política, social, económica e cultural numa sociedade aberta, pelo que se pode aferir em função da relevância social da notícia.

Daqui decorre que, quando a imprensa actua no domínio do entretenimento, da notícia de pura sensação ou da vida privada dos cidadãos, extravasa o âmbito da garantia jurídico-constitucional do direito à informação, importando assinalar que, quando relata factos no exercício do direito de informação que eventualmente ponham em causa o bom nome e honra das pessoas, o jornalista deve expor os factos do modo mais comedido possível, com moderação e urbanidade.

Como refere Figueiredo Dias "é indispensável à concreta justificação pelo exercício do direito de informação que a ofensa à honra cometida se revele como meio adequado e razoável de cumprimento da função pública da imprensa; ou mais exactamente: de cumprimento do fim que a imprensa, no exercício da sua função pública, pretende atingir no caso concreto. Por isso mesmo o meio utilizado não só não pode ser excessivo, como deve ser o menos pesado possível para a honra do atingido. Qualquer "excesso" pode ser suficiente para empurrar a conduta para o âmbito do ilícito" .

De sublinhar ainda, que o critério do princípio da proporcionalidade e da ponderação de bens tem consagração no Código Civil, no art. 335° (colisão de direitos), referindo o n° 1 que, havendo "colisão de direitos iguais ou da mesma espécie, devem os titulares ceder na medida do necessário para que todos produzam igualmente o seu efeito, sem maior detrimento para qualquer das partes", adiantando o n° 2 do citado preceito, que se "os direitos forem desiguais ou de espécie diferente, prevalece o que deva considerar-se superior" .

O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem vem afirmando que a liberdade de expressão vale também para as ideias que ferem, chocam ou inquietam qualquer uma restrição essa liberdade só é admissível se for proporcionada ao objectivo legítimo protegido. «La liberté d'expression constitue l'un des fondements essentiels d'une société démocratique, l'une des conditions primordiales de son progrès et de l'épanouissement de chacun. Sous réserve du paragraphe 2 de l'article 10, elle vaut non seulement pour les «informations» ou «idées» accueillies avec faveur ou considérées comme inoffensives ou indifférentes, mais aussi pour celles qui heurtent, choquent ou inquiètent: ainsi le veulent le pluralisme, la tolérance et l'espritd'ouverture sans lesquels il n'est pas de «société démocratique» .

Assim sendo, é através da apreciação da factualidade apurada que terá que ser resolvida a questão do conflito, de forma a medir-se se o conteúdo da informação extravasou o indispensável para o exercício do direito jornalístico de informar.

7.2. Quanto ao direito à imagem.

Nos nossos dias assume especial relevância, o uso de imagem humana em publicidade, para efeitos de divulgação de entidades, de produtos ou de serviços postos à disposição do público consumidor. Assume enorme importância, a capacidade lucrativa da mesma, cujo aproveitamento cabe ao respectivo titular.

Ao ter por objecto um elemento inerente ao respectivo ser humano, o direito à imagem, tal como os restantes direitos de personalidade, é irrenunciável e inalienável, conforme decorre do disposto no artigo 81° do Código Civil, que, no entanto, admite a limitação voluntária, não estando proibidas limitações lícitas ao exercício do direito à imagem que, não afectando esse direito, apenas incidem sobre expressões do mesmo. É admissível uma disponibilidade parcial, concreta, que não exclua a titularidade desse direito no futuro.


Em suma, e como se escreve no Acórdão do Supremo Tribunal da Justiça de 25 de Outubro de 2005, "o direito à imagem, em si, enquanto direito de personalidade, é inalienável, mas a exploração comercial da imagem de alguém não o é, podendo ser feita pelo próprio titular desse direito directamente ou por intermédio de outrem, ou por outrem com o seu consentimento. Pelo que um contrato de cedência do próprio direito à imagem seria efectivamente nulo por contrário à ordem pública, nos termos dos art.°s 81°, n.° 1, e 280°, n.° 2, do Cód. Civil, mas o mesmo não se passa em relação à cedência daquela exploração comercial, que a lei expressamente permite. O que não pode ser cedido é, pois, o direito à própria imagem (se o fosse, o titular nem poderia mostrar a ninguém uma fotografia de si próprio, nomeadamente incluí-la no seu bilhete de identidade, onde acabaria por ser exibido a outrem), não o direito à sua exploração comercial."34

O direito à imagem tem como objecto o retrato físico da pessoa, e expressa-se no poder que todos têm de impedir que o seu retrato seja exposto publicamente. E um direito pessoalíssimo, que não pode ser alienado, nem exercido por outrem.

Tanto a notoriedade como o enquadramento público não justificam, sem mais, a liberdade de divulgação do retrato - há que, caso a caso, ponderar se se verificam as razões de valor informativo que estão na base dessa liberdade.

Pode verificar-se a violação do direito à imagem, ainda que não tenha sido maculada a honra do fotografado. Assim será, por exemplo, com a utilização de uma fotografia para determinando fim, com autorização do fotografado, sendo que, posteriormente, em situação distinta, a mesma fotografia foi novamente utilizada, só que desta feita sem a devida autorização do fotografado.

Ou seja, configura, acto ilícito, não só o uso sem o consentimento, mas também o uso que extrapole os limites contratuais, com finalidade diversa ou não expressamente ajustada.

7.3. As figuras públicas e os direitos de personalidade

7.3.1. Prescreve o art. 80° n° 2 do Código Civil que a extensão da reserva é definida conforme a natureza do caso e a condição das pessoas. São estes os dois elementos, um objectivo e outro subjectivo, em função dos quais se delimita a protecção do titular do direito.

Para além de se vir entendendo que as apelidadas "figuras públicas", em regra, beneficiam de uma menor tutela da honra e da privacidade, são as próprias que, muitas das vezes, procuram a notoriedade e gozam dos benefícios da mesma, pelo que têm de suportar uma diminuição da sua privacidade.

As chamadas "figuras mediáticas" vêem os seus direitos de personalidade tuteláveis de forma diferenciada em relação a outras pessoas, de modo que sejam mais restritos em razão da publicidade a que estão expostas e de que retiram, normalmente, proveito económico, a carecer de menor protecção. A justificação para tal redução encontra-se, portanto, no facto de, muitas vezes, usarem a sua vida privada para fins publicitários e comerciais, vivendo numa quase permanente exposição mediática de onde retiram vantagens diversas.

Seja como for, concordando-se ou não com esse mercado das chamadas revistas cor-de-rosa e com as necessidades fúteis que também satisfazem, certo é que a informação particularizada e específica que presta, não pode ser, liminar e radicalmente excluída ou erradicada, por não se traduzir na divulgação de factos de interesse e relevância públicas, pois o direito à liberdade de expressão, informação e imprensa (artigos 37.° e 38.° da Constituição da República Portuguesa) engloba e enquadra também aquele tipo de publicações e o respectivo conteúdo, sendo certo que o referido conceito de interesse e relevância pública é relativo, mutável e bastante abrangente, podendo abarcar também o universo em análise.

O "nosso mundo é rico em vedetas que a moda propõe aos olhares e fervores de uma sociedade transformada em público. Numerosas são as pessoas que a predominância do espectacular característico das sociedades modernas erige emobjectos de identificação colectiva" .

Esta menor tutela da honra e da privacidade das apelidadas figuras mediáticas, sairá, ainda, reforçada se fundada no carácter voluntário da sua exposição pública, segundo o velho brocardo "volentis non fit injuria" e pode excluir ou atenuar a eventual ilicitude de um comportamento, "consentindo" uma certa "agressão" do direito à honra ou à privacidade.

A vida privada de pessoas famosas é assunto que atrai o público. Porém, há sempre um preço a pagar, porque o papel dos meios de comunicação não consiste em gabar passivamente um produto e os lunáticos que os acham simples agências de publicidade acabam por sofrer as consequências.

Terá sido, esta, a forma de estar do aqui A., durante algum tempo, concedendo entrevistas ou aproveitando ofertas de férias a troco de entrevistas e cedência de imagem.

7.3.2. Contudo, aquando da publicação dos artigos já o A. era Primeiro-Ministro e não se trata aqui da cedência do direito de imagem ou concessão de entrevistas.

De facto, aproveitando imagens antigas do A., amigos e família, foram escritos e publicados diversos artigos, a bel-prazer dos seus autores, carreando para a vida pública e política do A., agora PM, assuntos e imagens, descontextualizadas, aproveitando, assim, para caricaturar e descredibilizar a figura de Estado de PM .

E certo que, quanto aos políticos, em nome da transparência da vida pública, os cidadãos têm o direito a conhecer da sua rectitude pessoal, da sua probidade ou da sua coerência pessoal, o que implica o conhecimento público de alguns aspectos da sua vida privada. Nestes casos, é fundamental que aos cidadãos em geral seja dada larga margem de fiscalização e censura de suas actividades e, em particular, à imprensa, ante a relevante utilidade pública da mesma.

Mas, essa interferência nos direitos de personalidade do agente público tem os seus limites, e a matéria jornalística não deve extrapolar os próprios limites de bem informar.

Além disso, a notícia deve tratar de assunto de interesse público, sem o intuito de injuriar, de caluniar ou difamar.


Ora é precisamente o que aqui está em causa.

E mesmo quando o interesse público exija a agressão do direito à honra ou à privacidade, o princípio do mínimo dano impõe que o meio utilizado não seja excessivo e deve ser o menos pesado possível para a honra e a privacidade do atingido. Quando haja excesso, a ofensa à honra continuará a ser ilícita, ainda que exista interesse público.

7.4. Da ponderação de interesses: colisão de direitos

Os Recorrentes colocam, desde logo, em crise a ocorrência de acto ilícito e, assim, considerando que se verifica um conflito entre o direito/dever de informar do próprio jornal e dos jornalistas e o direito ao bom-nome do noticiado.

A ponderação da "proporcionalidade" entre os valores em causa imporia, no caso concreto, a sobrelevância da "liberdade de expressão e do direito de informar", retirando ilicitude a eventual violação do direito do A.

Nesta sede, distingue Rabindranath Capelo de Sousa entre a redenção de acção ou omissão violadora de dever jurídico, como seja o de respeito de direito da personalidade, por alguma das causas justificativas do facto, que afastam a ilicitude do mesmo, e os casos de colisão de dois ou mais direitos, em que nos situaremos no mero plano da licitude, e em que a contradição se resolve com apelo ao art.° 335°, do Código Civil.

No entanto, não está aqui em causa o exercício legítimo de um direito, que supõe a exercitação de poderes derivados da prevalência, ordenada pela lei na regulação dos interesses da vida real, de certo interesse, através da atribuição de um direito subjectivo, com denegação de relevo jurídico ao interesse conflituante. A verdade é que grande parte das imputações feitas para realizar, o alegado interesse legítimo, qual seja o da informação do leitor sobre uma figura pública, do espectro político, são falsas, não correspondem à verdade.

O que se constata é que o agente não cumpriu devidamente o dever de informação, que as circunstâncias do caso impunham, sobre a verdade da imputação" (vide art. 180°, n° 4 do CPenal).

Nas palavras de Luís Brito Correia, "equivale a exigir um esforço sério na busca de informação, a utilização de fontes fidedignas, preferivelmente mais do que uma e, sendo possível, a audiência do visado.".

Quanto ao dever de informação importará igualmente chamar à colação o disposto no art. 14° do Estatuto do Jornalista: "Independentemente do disposto no respectivo código deontológico, constituem deveres fundamentais dos jornalistas: a) Exercer a actividade com respeito pela ética profissional, informando com rigor e isenção; (...)".

Por outro lado, a Lei da Alta Autoridade Para a Comunicação Social (Lei n.° 43/98, de 06 de Agosto), atribuiu a esta, no seu art.° 3o, al. b), a incumbência de "Providenciar pela isenção e rigor da informação". E segundo o Código Deontológico do Jornalista, aprovado em 4 de Maio de 1993, "1. O jornalista deve relatar os factos com rigor e exactidão e interpretá-los com honestidade. Os factos devem ser comprovados, ouvindo as partes com interesses atendíveis no caso.".

Luís Brito Correia refere a este respeito que rigor «significa exactidão ou precisão na aplicação prática de uma norma. No caso de informações, o rigor significa que a descrição corresponde à realidade: não é falseada, nem distorcida nem vaga. Exactidão significa correcção, apreciação justa ou rigorosa, cumprimento rigoroso e diligente dos deveres. Objectividade é a qualidade de quem descreve as coisas como elas realmente são, sem se deixar influenciar por preferências pessoais (...) Isenção é a qualidade de quem descreve as coisas com imparcialidade, com independência». E a «isenção é fundamental na descrição de factos políticos, mas também de comportamentos alheios eventualmente censuráveis, por poder afectar a presunção de inocência das pessoas ou dar origem a discriminações» .

Ora, como é patente, não usaram os RR. da diligência que lhe era exigível, nas circunstâncias concretas do caso.

No que respeita à aludida "ponderação de interesses" e sendo que estariam em causa os bens da liberdade de expressão e da informação, por um lado e a ilicitude da ofensa à honra, ponto é que nunca uma notícia desconforme à verdade enquanto se revela injuriosa, poderá convergir no efectivo exercício da liberdade de expressão e da informação.

Segundo Luís Brito Correia, «mais do que um limite à liberdade de expressão e de comunicação social, pode dizer-se que a verdade é um dos fins (porventura, o mais importante) que tais liberdades visam alcançar, correspondendo ao anseio de todo o homem na busca da verdade e ao desejo de comunicar aos outros as parcelas de verdade que vai encontrando»

O princípio fundamental a observar quanto à colisão de direitos, está formulado no já citado art.° 335°, n.° 1, do Código Civil:

"1. Havendo colisão de direitos iguais ou da mesma espécie, devem os titulares ceder na medida do necessário para que todos produzam igualmente o seu efeito, sem maior detrimento para qualquer das partes.".

"2. Se os direitos forem desiguais ou de espécie diferente, prevalece o que deva considerar-se superior".

Trata-se de um conflito entre a liberdade de expressão - consagrada no art.° 37° da Constituição da República Portuguesa - por um lado, e o direito à integridade moral - art.° 25°, n.° 1 da mesma Lei fundamental - ao bom nome e reputação -art.° 26°, n.° 1 - por outro, de colisão de dois direitos de personalidade tendo por objecto diferentes espécies de bens de personalidade.

A diversidade dos bens jurídicos da personalidade tutelados, os particulares graus, áreas ou intensidades desses bens em cada um dos direitos de personalidade conflituantes e as demais, geralmente diversificadas, circunstâncias factuais juridicamente relevantes, referentes à génese e ao exercício de cada um desses direitos, revestirão, em cada um desses conjuntos, importâncias desiguais face à personalidade humana total juscivilisticamente tutelada e a outros valores sócio-jurídicos com ela ligados, imprimindo, em regra, um diferente peso jurídico a tais direitos.

E certo que o art.° 10° da Declaração Europeia dos Direitos do Homem, dispõe que qualquer pessoa tem direito à liberdade de expressão. Porém, como anotam Jorge Miranda e Rui Medeiros, a proibição de impedimento ou limitação da liberdade de expressão e de informação, por qualquer tipo de censura, não significa, porém, que não estejam sujeitas: «a) a concordância prática com outros direitos pessoais (artigos 25°, n.° 1, e 26°), estabelecendo a lei garantias efectivas, contra a utilização abusiva ou contrária à dignidade humana, de informações relativas às pessoas e às famílias».

Seguidamente – e após passar novamente em revista a factualidade apurada – considera o acórdão recorrido sobre o enquadramento jurídico do caso concreto:

Perante as considerações teóricas que acima constam e face ao circunstancialismo fáctico supra descrito, não podem restar dúvidas de que se encontram reunidos os pressupostos cumulativos da responsabilidade extracontratual.

Se é verdade que a liberdade política identifica-se com a liberdade de imprensa, em caso de conflito, atenta a igual dignidade constitucional dos valores em causa, bem como a sua vocação de integridade, a solução terá que ser procurada no quadro da unidade da Constituição, com apelo ao princípio do direito constitucional, da concordância prática, pautado pelo critério de proporcionalidade (art. 18.°, n° 2 da C.R.P.).

Assim, a liberdade de imprensa justificará a lesão do interesse de terceiros enquanto estiver ao serviço de todos. Já não quando, permanecendo embora na esfera do juridicamente lícito, actue em domínios como os do simples entretenimento, da satisfação da mera curiosidade do leitor, da notícia de pura sensação, da publicidade, ou trate da vida privada e familiar de pessoas "particulares" ou "anónimas", em que a protecção que lhe será concedida lhe advirá tão somente dos princípios gerais de direito, e não já da garantia jurídico-constitucional do direito de informação

Mas mesmo nos casos em que se tem por assente que a imprensa exerce o seu fundamental direito de informação, e nessa medida uma função pública, tal não basta para se poder concluir que a ofensa à honra das pessoas está sem mais justificada.

«Em primeiro lugar, é indispensável à concreta justificação pelo exercício do direito de informação que a ofensa à honra cometida se revele como meio adequado e razoável de cumprimento da função pública da imprensa; ou mais exactamente: de cumprimento do fim que a imprensa, no exercício da sua função pública, pretende atingir no caso concreto. Por isso mesmo, o meio utilizado não só não pode ser excessivo, como deve ser o menos pesado possível para a honra do atingido. Em segundo lugar, parece ser de exigir que, no exercício da sua actividade, a imprensa tenha actuado com o animus ou a intenção de cumprir a sua função pública e, assim, de exercer o seu direito-dever de informação ou que ao menos não esteja em concreto excluído ter sido um tal cumprimento o motivo da sua actuação. Por último, (...) importa, em definitivo, é que a imprensa, no exercício da sua função pública, não publique imputações que atinjam a honra das pessoas e que saiba inexactas, cuja exactidão não tenha podido comprovar ou sobre a qual não tenha podido informar-se convenientemente», sendo que tal «comprovação não pode revestir-se das exigências da comprovação científica ou mesmo da judiciária», bastando que o agente só as tenha tomado como verdadeiras depois de cumprido o dever de esclarecimento prévio dos factos. Por fim, e quanto ao dever de informação que o agente do crime de difamação deverá ter cumprido, quando jornalista, para, com fundamento sério e de boa fé, reputar a imputação feita à vítima como verdadeira, importa recordar o que a propósito refere o próprio Código Deontológico dos Jornalistas, aprovado no dia 4 de Maio de 1993. Segundo o seu ponto primeiro, «o jornalista deve relatar os factos com rigor e exactidão e interpretá-los com honestidade. Os factos devem ser comprovados, ouvindo as partes com interesses atendíveis no caso e a distinção entre notícia e opinião deve ficar bem clara aos olhos do público» .

9.1. Da matéria de facto apurada resulta que a conduta dos Réus foi ilícita.

Na verdade, os Réus, enquanto autores dos escritos, atentaram contra o bom nome e reputação do Autor, caindo dentro do que lhes era vedado pela Lei de Imprensa, pelo Estatuto do Jornalista e pelo art. 484.°, do Código Civil.

E certo que o Autor, anteriormente, concedeu entrevistas e autorizou a publicação de imagens suas em revistas «cor-de-rosa», tendo participado eminiciativas dessas revistas, designadamente no cruzeiro da …/…, onde foi captada a fotografia de lenço na cabeça conforme fls. …. Também se sabe que o Autor viajou para … com … dos seus filhos, com despesas de viagens e alojamento pagas pela Ré LL, tendo-se deixado fotografar e aos seus filhos como contrapartida pelo pagamento daquelas despesas sendo que nessa viagem deslocou-se um jornalista e um repórter fotográfico, os quais realizaram a reportagem publicada nas páginas da revista GG edição n.° …, de …-…-19… a …-…-19…, cuja cópia consta de fls. …-…. Nessa ocasião foram tiradas pelo repórter fotográfico fotos que foram publicadas e outras que ficaram no arquivo da Ré LL.

Ou seja, o Autor tornou públicos alguns factos da sua vida pessoal e familiar não se coibindo de falar dos mesmos.

Também participou em programas televisivos, designadamente, no final da década de 90, no reality show "…" e foi comentador desportivo.

Mas tal não justifica que tudo seja permitido.

De facto, e ao contrário do que defendem, os Réus não se limitaram a fazer uma crítica objectiva à actividade política, pública do país e relacionamentos sociais do Autor, de tal modo que, como refere a sentença recorrida, nem sequer há que tentar uma qualquer harmonização entre o direito ao bom nome e reputação, por um lado, e o direito de informar, por outro.

Assentaram, ainda, os escritos em factos falsos e deturpados, o que demonstra a pouca preocupação em veicular a verdade, caricaturando e ridicularizando o A., transmitindo a imagem de um homem frívolo, pouco responsável com as questões de Estado e sem credibilidade para desempenhar as funções de Primeiro-Ministro.

Como refere Coutinho Ribeiro, «cumpre ao ordenamento jurídico afirmar a ilicitude, em via de princípio de afirmações falsas e injuriosas proferidas dolosamente (...) ou de forma negligente» Mas mais, a fronteira do permitido é ultrapassada quando a valoração deixa de se dirigir contra a específica apreensão do mérito e passa a atingir e a denegar aquele respeito de que toda a pessoa é credora por força da sua dignidade humana.

E certo que a opinião é uma posição parcial mas deve corresponder a uma convicção fundada, exigindo motivação de juízos, excluindo o espírito de maledicência, ajuste de contas ou até cegueira ideológica.

Aliás, a ainda sobre o conceito de ilicitude pouco importa que o facto afirmado ou divulgado corresponda ou não à verdade, contanto que seja susceptível, dadas as circunstâncias do caso, «de diminuir a confiança na capacidade e na vontade da pessoa para cumprir as suas obrigações (prejuízo de crédito) ou de abalar o prestígio de que a pessoa goza ou o bom conceito em que seja tida (prejuízo do bom nome)» .

9.2. Também se verifica o requisito da culpa, ao menos na modalidade de dolo necessário, quando não em dolo directo.

Aliás, a doutrina não hesita em equiparar, quanto ao seu tratamento jurídico, o dolo necessário ao dolo directo, já que, ambos suscitam igual juízo de reprovação no plano do direito: se o lesante embora não querendo directamente o facto, o previu como uma consequência necessária da sua conduta, o facto visado e o efeito ou resultado querido estavam indissoluvelmente ligados, pelo que, conhecendo ele esse nexo de causalidade e, não obstante, não tendo deixado de agir, a sua conduta é igualmente censurável.

Na verdade, os autores dos diversos escritos sabiam que, afirmando o que afirmaram, atingiam a honra, o bom nome, o prestígio do Autor e quiseram mesmo esse objectivo, caricaturando o desempenho das funções como Primeiro-Ministro, condicionando inclusivamente a continuação do exercício de funções.

10. Do nexo de causalidade

Os factos apurados apontam, manifestamente, para um prejuízo de crédito e do bom nome do A., porquanto, o afirmado nos textos foi/é susceptível, dadas as circunstâncias do caso, de, por um lado, diminuir a confiança na capacidade e na vontade da pessoa visada para cumprir as suas obrigações, e, por outro lado, de abalar o prestígio de que essa pessoa goza ou o bom conceito em que é tida.

Existe indubitavelmente um nexo de causalidade entre os factos - notícias - e o dano - humilhação, desgosto, descrédito e redução de rendimentos - nos termos consagrados no art. 563.° do Código Civil, de acordo com a teoria da causalidade adequada.

Na formulação negativa da teoria da causalidade adequada - que, por mais criteriosa, deve reputar-se adoptada31 - o facto que actuou como condição do dano só deixa de ser considerado como causa adequada, quando para a sua produção tiverem contribuído decisivamente circunstâncias anormais, excepcionais, extraordinárias ou anómalas, que

Assim sendo, na situação ajuizada, o resultado produziu-se, fundamentalmente, em consequência dos escritos e imagens descredibilizadores, tornando o A. alvo de chacota e prejudicando de forma indelével a sua capacidade de ganho.

Ainda assim, afigura-se que não terão sido, apenas os escritos em causa que terão contribuído para o descrédito da imagem do A.,

Com efeito, ficou provado que, ainda que sem a relevância e consequências que os artigos aqui em causa tiveram, também outros órgãos de informação terão enveredado pela crítica menos séria. Ademais, também os órgãos de informação audiovisuais contribuíram para essa deterioração, ao menos, com a divulgação dos escritos em causa e outros.

Seja como for não pode olvidar-se que as revistas da Ré tinham larga tiragem e abrangiam, globalmente, um leque heterogéneo e diversificado da sociedade portuguesa, além de que o comportamento danoso foi reiterado no tempo (cerca de seis meses).

Tudo para dizer que se admite que, no caso, estamos na presença de causas que foram concorrentes/convergentes na direcção do dano, isto é, que estamos perante um concurso real de causas.

A existência de uma pluralidade de factores causais tão somente potenciais na consolidação de um prejuízo não pode ser analisada como decorrente da conduta de um agente individualizado pelo sistema tradicional da responsabilidade civil, qual seja, a teoria da causalidade adequada ou do dano direto e imediato. Esta teoria é amplamente aceita pela doutrina e jurisprudência como regra geral na responsabilidade civil. Assim, o art. 563.° do Código Civil português destaca que o nexo de causalidade se dá "em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão".

Embora não se deduza da literalidade dos dispositivos, a teoria da causa adequada tem relativa aceitação na interpretação da lei, o que exigiria que, entre todas as condições presentes na marcha causal e com potência de terem produzido o resultado, deve-se fazer uma análise hipotética para se verificar qual a conditio sine qua non para se determinar qual a causa do prejuízo, e se ele é imputável ao réu no processo ou a qualquer outro elemento estranho.

A teoria da causalidade adequada pondera as condições sob o prisma de um conceito subjetivo do curso natural das coisas, que revelará se a condição éapropriada para produzir o dano, sem ser necessário que o gere direta e exclusivamente, mas que, independentemente de ser mais próxima ou mais remota, seja essencialmente decisiva na produção do dano a partir de uma perspectiva social e de uma valoração geral de todas as circunstâncias e do encadeamento de fatos .

Na análise do nexo causal, o facto constitutivo da responsabilidade não precisa ser a única causa do dano.

A adequação deve, naturalmente, referir-se a todo o processo causal e não só ao resultado, sob pena de um alargamento excessivo da imputação. E neste contexto que se situam os problemas da intervenção de terceiros ou da interrupção do nexo de causalidade, que têm em vista aqueles casos em que o resultado se verifica em consequência de uma co-actuação do lesado ou de terceiro.

O critério da causalidade resolve o problema por recurso ao concurso real de causas adequadas, simultâneas ou subsequentes, considerando qualquer dos lesantes responsável pela reparação de todo o dano.

Em face das dificuldades do critério da adequação não são de estranhar as propostas da sua correcção, por recurso aos conceitos de risco permitido e do fim de protecção da norma. De harmonia com a teoria do risco permitido, a imputação do resultado à conduta do agente só ocorre quando o comportamento tenha criado, ou aumentado ou incrementado um risco proibido, desde que esse risco se tenha materializado no resultado danoso. Sempre que o agente tenha criado um risco não permitido ou aumentado o risco já existente e esse risco conduza à produção doresultado concreto, este deve ser-lhe objectivamente imputado.

A obrigação de indemnização tem por escopo fundamental a remoção do dano imputado e, portanto, a medida da indemnização é, por regra, simplesmente a do dano efectivamente imputado ao lesante (art° 562 do Código Civil).

Questões como o nexo de causalidade transcendem, por isso, a problemática da determinação da indemnização.

E o Código Civil dá relevo ao grau de culpa na actuação, por forma a ponderar o quantum indemnizatório, permitindo ao juiz, nos casos em que a imputação delitual opere por ilícito negligente, fixar a indemnização, equitativamente, em montante inferior ao dano, desde que o justifiquem não só o grau de culpa do lesante, como também a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso (art° 494 do Código Civil).

Será o que eventualmente se verifica em caso de concurso de culpas (cfr. art. 570° do Código Civil), seja por banda do próprio lesado seja por banda de terceiros, como aqui será o caso. Ou seja, a contribuição causal de terceiro para a verificação do dano é certamente, uma das demais circunstâncias do caso a ponderar pelo tribunal.

Verdadeiramente, não há aqui uma limitação da indemnização, mas, apenas, uma delimitação dos danos que ao lesante devem ser imputados, pelo que a redução prescinde da comprovação, relativamente a esse terceiro, dos pressupostos da imputação delitual.

No caso dos autos, para além dos escritos dos autos, outros factos noticiosos contribuíram, ainda que em menor medida, para fazer operar o resultado, ainda que se admita que em menor medida.

Enfim, o dano, tal como concretamente teve lugar, verificou-se em consequência da eficácia causal dos factos e comportamentos, que, como "esferas de risco, com potencial de alicerçar a responsabilidade, convergem para um mesmo resultado'", o que significa que também se encontra preenchido o nexo causal.

Assim, a actuação dos Réus era/foi, face à experiência comum e às circunstâncias por eles conhecidas, adequada a prejudicar o bom nome do Recorrido, como efectivamente prejudicou, causando-lhe, não só prejuízos não patrimoniais como, ainda, patrimoniais, deixando de fazer parte do núcleo de políticos e comentadores com credibilidade junto da opinião pública, provocando a diminuiçãodrástica da capacidade de ganho do A. e certamente com reflexos no termo do mandato como Primeiro-Ministro, como também se provou.

A imprensa, ao fazer a imputação, terá que actuar dentro da sua função pública de formação da opinião publica e visando o seu cumprimento, utilizando o meio, concretamente, menos danoso para a honra do atingido, com respeito pela verdade das imputações, em que, fundadamente, acreditou, depois de ter cumprido o seu dever de esclarecimento e comprovação, o dever de verificação da verdade da imputação. Impõe-se que a imprensa, no exercício da sua função pública, não publique imputações que atinjam a honra das pessoas e que saiba serem inexactas, cuja exactidão não tenha podido comprovar ou sobre a qual não tenha podido informar-se, suficientemente.

Certo é que a fronteira do permitido foi ultrapassada na medida em que a valoração negativa atingiu, directamente, a substância pessoal, denegando aquele respeito de que toda a pessoa é credora, por força da sua dignidade humana.

Não pode, pois, aceitar-se que, a pretexto de uma crítica institucional, se ataque a pessoa do visado, para além do juízo, eventualmente, negativo que se faça da sua obra, ou que não se respeitem os limites de valoração objectiva e de consciência crítica, inflectindo-se o discurso para considerações desnecessárias à personalidade do ofendido, como foi o caso, susceptíveis de o degradar como pessoa.

Estão, pois, preenchidos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual, quais sejam, o facto, a ilicitude, a imputação do facto ao lesante, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano.

11. Responsabilidade da proprietária das revistas

Não são apenas os autores dos escritos os responsáveis pelos danos causados. Como refere a sentença recorrida, em sede de responsabilidade civil, «as sociedades respondem pelos actos e omissões dos seus representantes e agentes, nos mesmos termos em que os comitentes respondem pelos actos ou omissões dos seus comissários (cfr. os arts. 157.° e 165.°, do Código Civil). Assim, a pessoa colectiva é havida como comitente e os seus representantes e agentes como comissários, para efeito de aplicação do disposto no art. 500.°, do Código Civil, nos termos do qual, a responsabilidade imposta àquela é objectiva, na medida em que não depende de culpa sua, mas depende, em princípio, da culpa de quem actuou em nome dela. Respondendo o representante ou agente, autor do facto ilícito, solidariamente com a pessoa colectiva, pelos danos causados a terceiro (cfr. o art. 507.°, n.° 1, do Código Civil). Por conseguinte, ainda que por via da lei especial (art. 29.°, n.° 2, da Lei de Imprensa) a empresa proprietária da Revista DD, GG e JJ não fosse solidariamente responsável com os jornalistas pelos danos derivados da publicação dos artigos em causa, por esta não ter ocorrido com conhecimento e sem oposição do director das Revistas, sempre ela estaria sujeita, pela lei geral, à obrigação de indemnização (cfr., em caso semelhante, o Acórdão do STJ, de 8/3/07, disponível in www.dgsi.pt)».

Em suma, atento o disposto no art. 29°, n° 2 da Lei de Imprensa decorre que a empresa jornalística, proprietária da publicação, no caso as revistas, é solidariamente responsável pelos danos causados, responsabilidade que, aliás, sempre decorreria do disposto no n° 1 do art. 500° C.Civil.

Não restam dúvidas de que a sociedade Ré, proprietária das Rervistas é solidariamente responsável pelos danos patrimoniais e não patrimoniais causados ao Autor.

E também os directores...

12. Da responsabilidade do director

Ao director compete a orientação, superintendência e determinação, do conteúdo do periódico, a presidência do conselho de redacção e a designação do chefe de redacção.

Segundo a Lei de Imprensa, aprovada pela Lei n.° 2/99, de 13 de Janeiro, as publicações periódicas devem ter um director, a quem compete, além do mais, orientar, superintender e determinar o conteúdo da publicação (arts. 19.° n.° 1 e 20.° n.° 1 al. a) Lei 2/99).

De facto ao director impõe-se o dever de conhecimento antecipado, das matérias a publicar na referida revista, pelo que a imputação ao director da publicação do escrito que resulta da própria titularidade e exercício da função e dos inerentes deveres de conhecimento, integra, na construção conceptual, uma presunção legal, que dispensa o interessado da prova do facto (o conhecimento, a aceitação e a imputação da publicação) a que a presunção conduz (art. 350.°, n.° 1, do CCivil)56.

Independentemente do director da revista ter assumido ou não que aprovou a página, o certo é que, de acordo com o art. 29° da Lei de Imprensa, ao director compete, a orientação, superintendência e determinação do conteúdo do periódico, a presidência do conselho de redacção e a designação do chefe de redacção.

Tais competências impõem ao director, como se afirma no acórdão do STJ de Lisboa, 14 de Maio de 2002 "um dever de conhecimento antecipado das matérias a publicar e que hão-de constituir o conteúdo do periódico, em ordem a poder impedir a divulgação daquelas susceptíveis de gerar responsabilidade, civil ou criminal. (...) Portanto, um dever especial de obstar à publicação de escritos ou imagens que possam integrar um tipo legal de crime ou constituir um facto ilícito gerador de responsabilidade civil"51.

6 Neste sentido o Ac. STJ, de 14/02/2012, citado, Hélder Roque www.dgsi.pt/jsti. 57 Ac. STJ de 14 de Maio de 2002 (Ferreira Ramos) www.dgsi.pt jstj.

Em suma, "a imputação ao director da publicação do escrito que resulta da própria titularidade e exercício da função e dos inerentes deveres de conhecimento, integra, na construção conceptual, uma presunção legal, que dispensa o interessado da prova do facto (o conhecimento, a aceitação e a imputação da publicação) a que a presunção conduz (art. 350.°, n.° 1, do CC), admitindo, porém, que o onerado ilida a presunção mediante prova em contrário (art. 350.°, n.° 2, do CC). Deste modo, demandado civilmente o director, e vista a amplitude da formulação dos termos da responsabilidade e da consequente presunção, basta invocar os factos que integrem o ilícito (no caso, a publicação do «escrito») e a qualidade de director do demandado, cabendo a este ilidir a presunção, alegando e provando que o escrito foi publicadosem o seu conhecimento ou com oposição sua ou do seu substituto legal."

Admite-se, pois, que o onerado ilida a presunção mediante prova em contrário (art. 350.°, n.° 2, do CCivil). Mas, no caso, tal presunção não foi afastada.

Nesta medida os Réus directores das Revistas são solidariamente responsáveis perante o lesado nos termos do art. 29° da Lei de Imprensa.

13. Dos danos patrimoniais

Resultou da factualidade provada que, durante o período imediatamente posterior à cessação de funções como Primeiro-Ministro, e em consequência da descredibilização da sua imagem e prestígio em virtude dos escritos e imagens supra referidos, o Autor não veio a ser solicitado para o preenchimento de cargos na sociedade portuguesa, deixou de ser convidado para participar em programas televisivos, designadamente como comentador, bem como na imprensa escrita, deixando de auferir a correspondente remuneração; também não foi procurado para prestar os seus serviços jurídicos.

De facto, ficou provado que para o desprestígio do Recorrido e para a sua própria demissão foram decisivos os artigos de opinião caricuturados e criticas politicas à sua actuação, eivadas de falta de rigor, e os artigos publicados nas revistas "cor-de-rosa" da Ré QQQ.

Foi necessário um período de tempo não inferior a três anos para repor o seu prestígio na sociedade e na área política onde se move profissionalmente.

Como decorre dos factos provados, durante esse período de três anos, o A. teria auferido o total de 90.000€, à razão de 2.500,00€ por mês, pela participação na imprensa escrita, através de artigos de sua autoria e ainda 180.000€, à razão de 5.000€ por mês pela participação em programas de televisão bem como 150.000, à razão de 50.000€ pela prestação de serviços jurídicos e de consultadoria a terceiros, tomandocomo base de comparação a receitas cobradas e as que, em média, atinge um advogado, com alguns anos de experiência, em Portugal.

Somando os valores que o Autor teria direito a receber, tendo em conta o período de 3 anos. provado no facto n.° 71, e não o período de 5 anos pedido pelo Autor, o montante global da indemnização é de €420.000,00 (€: 90.000.00 + €180.000,00 + 150.000,00).

Contudo e como decorre do referido a propósito do conceito de nexo de causalidade, a que o ponto 10 da Fundamentação de Direito, faz referência, os RR. não fôramos únicos a concorrer na produção dos danoscausados, já que outros escritos concorreram para a produção dos danos computados.

Sopesando as circunstâncias supra referidas e ponderando o comportamento censurável e reiterado no tempo dos RR, afigura-se razoável reduzir em 25% o montante da indemnização a título de danos patrimoniais.

Assim sendo, fixa-se em 315.000,00 (420.000,00 x 75%) o valor global da responsabuilidade dos RR., pelos danos patrimoniais causados ao Autor.

14. Dos danos não patrimoniais

O A. vem por em causa o valor arbitrado a título de danos não patrimoniais, pugnando para que os mesmos sejam fixados em valor não inferior a 300.000,00.

14.1. Ao lado dos danos patrimoniais, há outros prejuízos (como as dores físicas, os desgostos morais, os vexames, a perda de prestígio ou de reputação, os complexos de ordem estética) que, sendo insusceptíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens como a saúde, o bem estar, a liberdade, a beleza, a perfeição física, a honra ou o bom nome), os chamados danos não patrimoniais, contemplados no art.° 496°, do Código Civil.

Danos não patrimoniais indemnizáveis são aqueles que, pela sua gravidade, merecem a tutela do direito (art. 496° n° 1 do CCivil), sendo certo que no seu ressarcimento não se pode falar de uma genuína indemnização. Destina-se, sim, a permitir que, com essa quantia monetária, o lesado encontre compensação para a dor, o que impõe que o seu montante deva ser proporcional à gravidade do dano, ponderando-se, para tal, nas regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e do criterioso sopesar das realidades da vida, em conformidade com o preceituado no n° 3 daquele art. 496° do CCivil.

Por outro lado, o art. 496°, n° 1, do CCivil restringe a ressarcibilidade dessa sorte de danos, àqueles "que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito", devendo tal gravidade medir-se por um padrão objectivo e não à luz de factores subjectivos. E a gravidade apreciar-se-á em função da tutela do direito: o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado.

Nos danos não patrimoniais, "a grandeza do dano só é susceptível de determinação indiciária fundada em critérios de normalidade. E insusceptível de medida exacta, por o padrão ser constituído por algo qualitativo diverso como é o dinheiro, meio da sua compensação"

«No domínio dos danos não patrimoniais, atendendo a que a reconstituição natural não é possível, como o não é a tradução em números do volume de dores, angústias e desilusões, o legislador manda logo julgar de acordo com a equidade (cfr. art.0 496°, n° 3 do C.C. que remete para o art° 494° do mesmo diploma), devendo o juiz procurar um justo grau de "compensação"» .

Na fixação desta indemnização deve também ter-se em conta uma componente punitiva, de reprovação ou castigo, no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado, da conduta do agente, como vem também sendo salientado pela doutrina e pela jurisprudência.


Em suma, o montante indemnizatório correspondente aos danos não patrimoniais deve ser calculado segundo critérios de equidade, atendendo ao grau de culpabilidade do agente, à sua situação económica e à do lesado e às demais circunstâncias do caso.

14.2. No caso dos autos

Como resulta da matéria de facto apurada e atento o que atrás já se referiu, estamos perante danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, merecem a tutela do direito.

De salientar que as ofensas à honra e bom-nome cometidas através da comunicação social são particularmente gravosas, dado o efeito amplificador que este meio lhes transmite e o impacto que têm na sociedade, sendo que, os desmentidos ou respostas posteriormente publicados acabam por ser pouco eficazes e, em geral, merecedores de muito menor destaque, com a agravante de normalmente se aproveitar para repetir a noticia ofensiva.

E de facto, no caso, os escritos em questão lançam a confusão sobre actuação do Autor e conduziram a uma situação que gerou na sociedade, um sentimento de consciência de reprovação a qual acabou por resultar numa inevitável lesão da reputação, do bom nome e da honra do Autor.

E os RR não só configuraram como possível, como quiseram o resultado obtido: atentar contra o bom nome, honra e consideração do Recorrente, nomeadamente a empresa jornalística que, conhecendo o conteúdo dos artigos, viabilizou a sua publicação, partilhando do fim último gizado. Ou seja, no que tange à culpabilidade dos RR. verifica-se a existência de um elevado grau de censura, tendo agido com dolo.

Os escritos em geral transmitem uma imagem negativa na credibilidade da A. que induziam o público a acreditar que o A. estava apenas preocupado com luxos e boa vida, que dá festas na residência de …, que chama os amigos à noite, que bebe uns copos, enfim, que não pode estar à frente da governação do País.

Quanto á intenção subjacente aos escritos, é claro que os autores daqueles artigos pretenderem, pelo menos, demonstrar que o Recorrido, no exercício das suas funções, aproveitava para ter regalias únicas, bem como que este era incapaz de assumir responsabilidades de Estado, pretendendo caricaturá-lo.

E os textos dos escritos, com títulos e subtítulos sugestivos, só por si são reveladores, ainda ilustrados com fotografias que apelam a essa intenção.

Por outro lado, e no que respeita à situação económica dos réus, não resulta da matéria provada qualquer referência que permita que a mesma seja chamada à colação, enquanto critério para apurar o montante indemnizatório. Porém, é certo que os escritos em causa e imagens utilizadas geraram certamente uma fonte de receita considerável, lucros para a empresa Ré e seus funcionários/prestadores de serviços, à custa e prejudicando o bom nome do A.

Importa ter presente que o que resulta da matéria de facto provada, designadamente, que está em causa não um ou dois artigos, mas mais de 20 artigos jornalísticos, publicados em 3 diferentes revistas da l.a Ré, todas elas com objectivos de informação diferenciados, com enfoque em públicos distintos - tendo a DD cariz informativo; a JJ de entretenimento e social; e GG de cariz social (a apelidada de imprensa "cor de rosa").

Ademais pode dizer-se que o A. foi bombardeado com todos estes artigos desde Julho até Dezembro de 20…, durante 6 meses, várias vezes por mês, em diversas publicações, imputando-lhe o gozo de privilégios e regalias únicas, férias de luxo; casos amorosos, desinteresse pelo fim público e dignidade do cargo exercido, com a utilização de imagens apelativas e descontextualizadas: imputações de factos "altamente atentórios da integridade, coerência e rectidão de carácter do autor, isto é, do seu bom nome e reputação" .

Quanto ao sofrimento e angústia do A., importa ter presente, além do mais que, como ficou provado, os RR. escreveram e/ou participaram na elaboração/publicação dos factos relatados nos artigos acima referidos sabendo quemuitos não correspondiam à verdade. Tais artigos foram publicados em revistas de grande tiragem e de venda por todo o território nacional.

Como também ficou provado, a partir da data da publicação de tais artigos, o Autor passou a ser alvo de piadas entre amigos e obviamente, sentiu-se ofendido na sua credibilidade, prestígio, reputação e imagem, tanto pessoal, como social e institucional, com o teor desses artigos.

Não pode olvidar-se que, à data dos factos, o A. era Primeiro-Ministro, gozando de uma imagem de prestígio na sociedade portuguesa, uma figura de relevo nacional e que foi alvo de imputações falsas e objecto de juízos atentatórios da integridade e rectidão de carácter do autor, isto é, do seu bom nome e reputação.

Está, pois, demonstrado que os escritos em questão foram causa de grande sofrimento e deram origem a danos de irreparáveis, quer na vida pessoal, quer profissional, quer na vida pública, designadamente na vertente política.

14.3. Na fixação da indemnização está em conta a compensação, sendo em termos de equidade que esta deve ser ponderada, atendendo-se aos elementos referidos no art.496.° n.° 3 do Código Civil.

E, hoje, ponto assente, na jurisprudência, que na fixação da indemnização por danos não patrimoniais os Tribunais não se devem guiar por critérios miserabilistas.

No caso. haverá que atender, por um lado, à gravidade das expressões utilizadas. à sua falsidade, e à divulgação que lhes foi dada, em revistas de grande dimensão e impacto junto da opinião pública, e, por outro, à personalidade e funções então desempenhas pelo visado no país.

Há ainda que ter em consideração a prática jurisprudencial em casos casos de semelhantes de ofensa à honra e bom nome.

Assim, no processo que PPP intentou contra a QQQ, S.A., e outros, foi fixada a quantia de €. 40.000,00 , em virtude de dois artigos publicados no jornal …, a … e … de Julho de 20… (Ac. STJ n.° 159/09.1 YFLSB, de 18/06/2009). Já na acção que RRR, moveu contra a SSS, Lda., e outros, foi fixada a quantia de €. 65.000,00, em consequência do artigopublicado na revista DD, a … de Outubro de 20… (Ac. STJ n.° 414/07.5TVLSB, de 19/01/2012).

Afigura-se, no entanto, que, no caso, a situação é mais e, por isso, passível de censura mais acentuada.

De facto, o A. desempenhava, então, as funções de Primeiro-Ministro de Portugal, e que durante cerca de seis meses foi reiteradamente, visado/caricaturado em artigos que lhe atribuem condutas falsas e reprováveis aos olhos de homem médio em prejuízo do seu bom nome, dignidade e reputação, bem como tecidas considerações pejorativas sobre a sua pessoa.

Destarte, tudo ponderado, trazendo à colação a prática jurisprudencial bem como as concretas circunstâncias dos presentes autos, afigura-se que o valor arbitrado na sentença recorrida (30.000,006) se mostra irrisório, considerando-se adequado, em juízo de equidade e de acordo com as regras da boa prudência, de bom senso prático e de criteriosa análise das realidades da vida, fixar a indemnização por danos não patrimoniais na quantia de € 80.000,00 (oitenta mil euros).

15. Da solidariedade e quota-parte no ressarcimento dos danos

Havendo pluralidade de sujeitos, a regra, no domínio das relações civis, é a conjunção, só se admitindo a solidariedade quando ela resulte da lei ou da vontade das partes -art. 513° C.Civil.

Um dos casos em que a lei estabelece o regime da solidariedade é, precisamente, em matéria de responsabilidade civil por factos ilícitos, determinando-se expressamente no n° 1 do art. 497° C.Civil ser solidária a obrigação dos vários responsáveis, isto é, qualquer dos autores da lesão responde pelo cumprimento integral da indemnização atribuída ao lesado.

Para além do regime da solidariedade legalmente estabelecido para a situação presente, também ficou demonstrado que foi o teor das notícias publicadas, que provocou ao autor as consequências danosas já referidas.

Pelo ressarcimento desses danos responderão solidariamente, os Réus nos termos e com os fundamentos supra expostos.

Importa, contudo, determinar a parcela de responsabilidade de cada uma dosRéus.

Desde logo, a proprietária das três publicações - a Ré LL Editores S.A. (Descobrirpress) responde pela totalidade dos danos causados ao Autor.

Também o Réu KK foi autor de diversos artigos na revista DD, e Director Geral de Publicações da Ré LL Editores, S.A. (BB).

Ou seja, como director geral da proprietária de todas as revistas que aqui estão em causa (além de autor de diversos artigos publicados na Revista DD), cabe-lhe responder, solidariamente pela totalidade dos danos causados ao Autor.

15.1. Por outro lado, estando em causa três publicações, nem todas têm a mesma quota de responsabilidade na produção dos danos.

Trata-se de revistas de grande projecção no mercado, com edições semanais.

Porém, não pode olvidar-se que a Revista DD - publicando, sobretudo artigos, quer de opinião, quer de informação - tem grande crédito junto dos leitores tendo aí sido publicados diversos e extensos artigos, ao longo de vários meses, como acima se dá nota.

Já as Revistas JJ ou GG, revistas de sociedade (chamada imprensa cor-de-rosa) - a GG, com ampla projecção de mercado, cabendo-lhe, nesse mesmo segmento, uma quota correspondente a 21,7 % e a JJ tem uma tiragem média semanal de 50 mil exemplares - terão contribuído de modo menos relevante para a quebra de prestígio do A., até porque o os artigos publicados são em menor número que na DD.

Nesta medida afigura-se ser de atribuir uma percentagem de 60% como quota parte da responsabilidade da revista DD, enquanto que as revistas JJ e GG terão contribuído, considerando o número de artigos publicados em cada uma, com uma percentagem de 25% e 15%, respectivamente.

15.2. No que tange, agora, a cada uma das revistas e seus jornalistas e directores.

O Réu CC, director da Revista DD, entre Julho a Setembro de 20…, responderá nessa medida pelo tempo em que desempenhou funções, sendo que os escritos em causa foram, no essencial, publicados entre Julho e Dezembro de 20…. Considerando o tempo em que exerceu funções e com apelo ao princípio da equidade, entende-se que o mesmo será responsável solidariamente e enquanto director da DD, em 40% dos danos provocados pela publicação que dirigia;

Quanto Réu EE que, além de autor dos escritos "C…" publicado na DD em … de Outubro de 20… e "E…", de … de Dezembro de 20…, foi Director da Revista, de Setembro a Novembro de 20…, responderá nessa medida pelo tempo em que desempenhou funções, e também como autor dos escritos lesivos dos direitos de personalidade do Autor.

Assim sendo, ponderando as suas responsabilidades e, ainda a participação activa enquanto autor de escritos, entende-se que o mesmo é responsável solidariamente em 60% dos danos provocados pela publicação que dirigia.

A Ré FF Directora da Revista GG em Agosto de 20…, responde solidariamente e pela totalidade dos danos causados pelos escritos publicados na revista GG.

A Ré II, Directora da Revista JJ, responde solidariamente e pela totalidade dos danos causados pelos escritos publicados na Revista JJ, estando em causa três artigos ou conjuntos de notícias publicados na referida revista, nomeadamente com utilização de fotografias ditas exclusivas" e que se reportavam a um tempo anterior. Assim, na edição de … de Agosto de 20…, da Revista JJ, foi publicado um artigo intitulado "… e com o subtítulo "…", e duas fotografias com a chamada de atenção "Fotos exclusivas", sendo certo que as fotografias que ilustram o artigo, na parte sub-intitulada "…" são do ano 20….

Contas feitas, e sem esquecer que o valor global da indemnização fixada a título de danos patrimoniais foi fixada em 315.000,00 - reduzindo-se em 25%, o valor total desses danos patrimoniais (420.000,00) - a que acresce o valor de 80.000,00 por danos não patrimoniais, cada um dos Réus é solidariamente responsável na medida da respectiva quota parte, nos seguintes termos:

-    Ré LL Editores, S.A. - 395.000,006 (315.000,00 + 80.000,00)

-     Réu KK - 395.000,006 (315.000,00 + 80.000,00)

-       Réu CC - (395.000,006 x 60%) x 40%

-       Réu EE - (395.000,00 x 60%) x 60%

-       Ré FF - 395.000,00 x 25%

-     Ré II - 395.000,00 x 15%


Considerando o montante global da indemnização fixada é de 395.000,00 (315.000,00 + 80.000,00), e a quota-parte de responsabilidade de cada um dos Réus, as respectivas condenações terão que refletir essas mesmas proporções.

Logo, os Réus BB Serviços Editoriais e Gráficos SA e KK, são responsáveis pela totalidade dos danos causados, isto é, no pagamento das quantias de 6 80.000,00 (oitenta mil euros) a título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos pelo Autor e 6 315.000,00 (trezentos e quinze mil euros) a título de compensação pelos danos patrimoniais sofridos pelo Autor, no total de 6 395.000,00 (trezentos e noventa e cinco mil euros).

Já os RR. EE e CC, são solidariamente responsáveis, respectivamente, até 60% e 40% dos danos causados pela Revista DD, no valor de 6237.000,00 (60% x 395.000,00), do que resulta que são solidariamente responsáveis até 6142.200,00 e 694.800,00, respectivamente.

A Ré FF é solidariamente responsável, em 15% dos danos causados pela Revista GG (15% x 395.000,00), ou seja, responde até 659.250,00 da totalidade dos danos causados.

Por último, a Ré II, responde solidariamente até 25% dos danos causados pela Revista JJ (25% x 395.000,00), ou seja, até 698.750,00.

6. Ao acórdão recorrido mostra-se apendiculado voto de vencido, em que se entende proceder o vício de falta de fundamentação das respostas a determinados pontos da matéria de facto e se discorda de determinadas respostas alcançadas pelo Tribunal sobre pontos de facto impugnados pelo recorrente – dissentindo ainda da solução jurídica alcançada, nos seguintes termos:


Apurados os factor praticados pelos RR impõe-se, em primeira linha, aferir da sua ilicitude.

Na posição que fez vencimento conclui-se pela ilicitude generalizada de quem escreveu/divulgou as peças jornalísticas em causa. E questão incontroversa que o direito à liberdade de expressão é um pilar de qualquer estado de direito que se preze como democrático, tendo no nosso ordenamento consagração constitucional, sendo proibida toda e qualquer forma de censura-art.° 37 da CRP "Liberdade de expressão e informação":

1.    Todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimentos nemdiscriminações.

2.   O exercício destes direitos não pode ser impedido ou limitado por qualquertipo ou forma de censura.

Mas também os direitos pessoais merecem protecção constitucional. Assim: "A todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à protecção legal contra quaisquer formas de discriminação", sendo inviolável a integridade moral e física das pessoas -arts.ü25.° e 26.° CRP.

Donde, a censura judicial ao uso do direito de liberdade de imprensa, deve ser escrupulosamente ponderada, no confronto entre estes direitos. Acresce que é questão consensual que os direitos das pessoas públicas sofrerão tanta maior compressão quanto maior for a sua exposição social.

E – fundando-se no Ac. do STJ de 2011/6/30 proferido no processo 1272/04.7TBBCL—considera-se que:

Tendo por orientação estes considerandos e analisados os artigos publicados e que estão em causa nestes autos, tenho para mim que, parte dos constituem "artigos de opinião", com críticas agressivas à figura do então PM, agora aqui autor.

Não é o autor, enquanto pessoa individual que é o visado, mas sim o autor enquanto pessoa pública, a quem foi confiado o encargo de conduzir o país.


Daí que me pareçam aceitáveis as opiniões expressas e os juízos de valor emitidos sobre determinados comportamentos não extravasando o direito à Liberdade de imprensa, ainda quando assumem carácter altamente mordaz, muito contundente e até de alguma violência psicológica.

Mesmo entendimento quanto à imputação (ou à interpretação feita, muito discutível diga-se, de que esses artigos continham imputações) ao autor de determinados factos que inseridos nas publicações afinal se vieram a provar não ser verdeiros, sendo eles:

24)    O Estado não desembolsou qualquer quantia pela supra referida utilização da casa onde o A. passou as férias, nem este beneficiou de "um preço de amigo" (Al. AA).

25)     O Autor nunca, em toda a sua vida, jantou no restaurante … do Hotel …. de … (Al. BB).

26)      Enquanto desempenhou as funções de Primeiro-Ministro de Portugal, o Autor nunca jantou, nem sequer entrou, tentou entrar ou se acercou da porta do … da …, no Algarve (Al. CC).

27)    As fotografias que ilustram o artigo, na parte sub-intitulada "…" são do ano 20… (Al. DD).

28)      O Autor não exigiu o reforço da sua segurança, enquanto Primeiro-Ministro (Al. EE).

33) Nessa ocasião, o Autor não mandou fechar a rua de acesso à habitação onde passava férias (Al. JJ).

35) O Autor, na escolha dos elementos das equipas que dirigiu, fossem elas de executivos autárquicos, de gabinetes de membro do Governo ou do próprio Governo, sempre privilegiou, acima de qualquer outra coisa, a competência e adequação do perfil de cada um ao cargo a exercer (Al. MM).

40) Nunca no mandato do Autor funcionaram naquela-parte do gabinete do Primeiro-Ministro (o Palacete) grupos de trabalho aos quais fossem servidas bandejas de sandwiches (Al. RR).

42)   Não houve na residência oficial do primeiro-ministro, enquanto o Autor aí viveu, convívios "até altas horas", nem uma lista, elaborada por polícias, de visitantes de figuras conhecidas da vida social e política (Al. TT).

43)       O Autor apenas recebeu na residência oficial as pessoas que com ele trabalhavam e as pessoas suas amigas. (Al. UU).

55) Durante o mandato do Autor como primeiro-ministro não foram feitas obras na sua residência oficial, nem alterada a decoração (Al. III).

Analisada esta factualidade que foi integrada nas publicações e que se veio a provar ser inverídica, considero que a mesma não é objectivamente, por si, apta a afectar a honra e/ou consideração, a imagem e o bom nome de uma pessoa necessariamente exposta ao escrutínio público, por força das funções que então desempenhava e que, mesmo a título particular, nunca se incomodou de participar em eventos sócias expondo a sua vida privada e familiar ao publico em geral. Vejam-se os seguintes factos:

79)       Ao fim de pouco mais de 1 mês no exercício das funções de primeiro-ministro, o Autor passou 4 dias de férias nas …, com transporte em avião a jacto (Art. 28.°).

80)     O Autor concedeu entrevistas e autorizou a publicação de imagens suas em revistas ditas «cor-de-rosa» (Art. 29°).

81)   Tendo participado em iniciativas dessas revistas, designadamente no cruzeiro da …/…, onde foi captada a fotografia de lenço na cabeça cuja cópia consta de fls. 77 (Art. ' 30.°).

82)        O Autor viajou para … com ... dos seus filhos, com despesas de viagens e alojamento pagas pela Ré LL, tendo-se deixado fotografar e aos seus filhos como contrapartida pelo pagamento daquelas despesas (Art. 31.°).

83)        Nessa viagem deslocou-se um jornalista e um repórter fotográfico, com despesas de deslocação e alojamento pagas pela Ré LL, os quais realizaram a reportagem publicada nas páginas da revista GG edição n.° …, de …-06-19… a …-07-19…, cuja cópia consta de fls. …-… (Art. 32.°).

84)        Nessa ocasião foram tiradas pelo repórter fotográfico fotos que foram publicadas e outras que ficaram no arquivo da Ré LL (Art. 33.°).

85)       No dia da sua eleição para Presidente da Câmara Municipal de …, o Autor apareceu na varanda dos … a acenar ao povo com a sua namorada da altura e conhecida figura do jet set, BBB (Art. 34.°).

86)       O Autor participou em programas televisivos, designadamente no reality show "…" e foi comentador desportivo (Art. 35.°).

87)      O Autor tornou públicos, alguns factos da sua vida pessoal e familiar não se coibindo de falar dos mesmos (Art. 36.°).

Decorre daqui que o autor é uma pessoa que não faz reserva da sua vida pessoal e familiar, o que o onera com uma maior' exposição à comunicação social, em especial à denominada "imprensa cor-de-rosa" que vive dos pormenores do dia a dia da vida dos "famosos".

Tudo ponderado, defendo que os artigos publicados podem ainda estar contidos dentro do exercício do direito à liberdade de impressa, não configurando assim uma qualquer actuação ilícita por parte dos seus autores/publicadores.

Porque sem ilicitude não há responsabilidade civil extra-contratual julgaria a acção totalmente improcedente.


     7. Inconformados, recorreram os RR., encerrando as respectivas alegações com as seguintes conclusões:

1.      Na relação jurídica entre o Recorrente e a R. LL aplica-se a esta a responsabilidade pelo risco da actividade, nos termos do disposto no art. 500.° do CC, questão de direito que o tribunal a quo podia e devia ter conhecido;

2.         A comissão pressupõe uma relação de dependência (droit de direction, de surveillance et de contrôle, na expressão da jurisprudência francesa) ou instruções a este, pois só essa possibilidade de direcção é capaz de justificar a responsabilidade do primeiro pelos actos do segundo e é o Recorrente, na qualidade de director da revista DD que, legalmente (art. 20.°/1/a) da Lei de Imprensa), detém se esse poder de direcção, pois as empresas jornalísticas não têm poder para, através da sua gerência, definir o conteúdo publicado nos títulos de que são proprietárias;

3.     É sabido que os gerentes ou administradores não são parte legítima numa relação de responsabilidade proveniente do risco da actividade, sendo as pessoas legítimas a empresa, na qualidade de comitente e os autores dos factos danosos e ilícitos, na qualidade de comissários;

4.      Assim, regra geral, os gerentes/administradores, detentores do poder de direcção que vincula a empresa e permite a esta ser solidariamente responsável pelos danos causados pelos seus comissários, não respondem solidária e pessoalmente pelos factos ocorridos durante a actividade da empresa;

5.       No domínio da apreciação da responsabilidade civil por actos praticados através da comunicação social importa ter em conta que o trabalho dos jornalistas é prestado num regime de relação juridicamente subordinada, sob orientação e supervisão dos órgãos próprios da hierarquia das empresas operadoras, sendo importante realçar que a decisão de publicar ou não determinados conteúdos pertence exclusivamente à empresa jornalística, através do órgão por si designado o director - implicando esta circunstância, em primeira linha, a eventual ou potencial responsabilização da empresa jornalística pela divulgação de factos violadores de direitos de terceiros;

6.       No que respeita à responsabilidade pelo risco, o director de uma publicação exerce, de facto e de júris, as responsabilidades de gerente/administrador de uma empresa, pois é este quem detém o poder/dever de controlo sobre os conteúdos a serem publicados. É o director que legalmente detém o droit de direction, de surveillance et de controle;

7.       Por isso se explica que o n.° 2 do art. 29.° da Lei de Imprensa defina como devedores solidários por conteúdos publicados i) o autor dos textos ou imagens ilícitas (responsável cível, nos termos do disposto no art. 483.° do CC) e ii) a empresa jornalística (responsável pelo risco da actividade, nos termos do disposto no art. 500.° do CC). E APENAS ESTES!!:

8.       A Lei de Imprensa não prevê a responsabilização cível do director da publicação mas apenas a sua responsabilização criminal, na medida em que o art. 29.°/2 da Lei de Imprensa exclui de qualquer responsabilidade cível o director da publicação e coloca como condição da responsabilização pelo risco da empresa jornalística, a prova do conhecimento e da não oposição, por parte do director, do conteúdo editorial ilícito;

9.       Nestes termos, o Recorrente não pode ser civilmente responsabilizado pelos conteúdos publicados durante o período em que foi director (ou pelos períodos em que não foi director), na medida em que, nos termos do disposto no art. 29º/2 da Lei de Imprensa, quem assume a responsabilidade civil pela autorização de publicação por parte do director é a empresa jornalística;

10.      Consequentemente, o Recorrente, nos termos do disposto no art. 29º/2 e 31º/1 da Lei de Imprensa, só poderia ser responsabilizado pelos artigos de que foi autor. E só estes;

11.     Concluindo-se, dir-se-á que o Recorrente não é civilmente responsável pelos textos que foram publicados quando era director da revista DD (com excepção dos que foi autor) porque quem assume a responsabilidade civil em textos publicados com conhecimento e autorização do director é, nos termos do art. 29º/2 da Lei de Imprensa, a empresa jornalística e não o director da publicação.

12.     Pelo supra exposto, relativamente a todos os textos em que Recorrente foi director, os responsáveis civeis são, nos termos do n.° 2 do art. 29.° da Lei de Imprensa os respectivos autores e solidariamente a empresa jornalística (ou seja, a Ré Impala).

13. O Venerando Tribunal da Relação de Lisboa defende a punibilidade do director com base na obrigação prevista no art. 31º/3 da Lei de Imprensa, justificando a sua responsabilização pelo facto do seu nome constar na ficha técnica da revista DD. Porém, o não analisou a questão que lhe foi apresentada de saber se este, nos termos do n.° 2 do art. 29.° da Lei de Imprensa, é passível de ser responsabilizado civilmente, por um lado, não conheceu uma questão que deveria de conhecer, o que se alega nos termos do disposto no art. 615º/1/c) do CPC;

14.     Por outro lado, o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa errou na aplicação o regime da responsabilidade civil, pois aplicou-o a alguém que, de jure constituto, não era responsabilizável civilmente;

15.     Mesmo que se entenda que estamos perante um responsável cível, sempre se dirá que, não tendo o tribunal a quo definido as responsabilidades de cada um dos RR, é a Ré LL, na qualidade pessoa colectiva, a única responsável pelos danos causados pelas suas publicações, nos termos do disposto no art. 165.° e 500.° do CC, o que implica a absolvição do Recorrente. Ao não entender desta forma, o Tribunal a quo errou na aplicação da lei substantiva ao caso concreto;

16.      Ao não aplicar o regime destas normas jurídicas o tribunal a quo errou ao aplicar o direito aos factos provados. Assim é na medida em que o Recorrente não é civilmente responsável pelos textos que foram publicados quando era director da revista DD (com excepção dos que foi autor) porque quem assume a responsabilidade civil em textos publicados com conhecimento e autorização do director é, nos termos do art. 29.°/2 da Lei de Imprensa, a empresa jornalística e não o director da publicação;

17.      Pelo supra exposto, relativamente a todos os textos em que Recorrente foi director, os responsáveis cíveis são, nos termos do n.° 2 do art. 29.° da Lei de Imprensa e do art. 500.° do CC, os respectivos autores e solidariamente a empresa jornalística (ou seja, a Ré LL);

18.      Mesmo que se entenda, por qualquer razão, que o Recorrente, na qualidade de director da revista DD, era responsável com os restantes RR., sempre se dirá que não existe qualquer responsabilidade objectiva por parte do director de uma publicação, atento o facto de a mesma não estar expressamente prevista na lei e ter carácter excepcional (art. 483º/3 do CC);

19.        Significa isto que não existe qualquer presunção de culpa sobre o director, sob pena de qualquer interpretação nesse sentido violar grosseiramente o princípio nulla poena sine culpa;

20.      Para demonstrar a responsabilidade civil do director, era necessário alegar e provar factos concretos que demonstrassem a sua culpa em concreto, o que, objectivamente, não foi logrado pelo Autor, desde logo nos factos que descreveu na sua petição inicial;

21.      Inexistindo qualquer presunção legal da culpa do Recorrente, era ao Autor que competia demonstrar a culpa deste, conforme o disposto no art. 487º/1 do CC;

22. O Autor tinha o ónus de demonstrar que o Recorrente efectivamente conheceu os textos e, podendo, não impediu a sua publicação. E não o fez. Não se demonstrando um dos elementos constitutivos da obrigação de indemnização - a culpa - é de concluir que, face à ausência de prova destas realidades, o Recorrente deverá ter sido absolvido do pedido, com excepção dos dois textos da sua autoria;

23. O Venerando Tribunal da Relação de Lisboa veio consubstanciar a responsabilidade civil do Recorrente no facto de o seu nome constar na ficha técnica da revista DD e atenta a obrigação se supervisão prevista na Lei de Imprensa;

24. Porém, mesmo que se entendesse, por qualquer razão, que o Recorrente seria responsável cível pelas notícias publicadas enquanto director da revista DD, não foi alegado o seu conhecimento e não oposição à publicação dos conteúdos editoriais publicados enquanto era director da revista DD e, consequentemente, não ficou provada a sua culpa na publicação dos mesmos, baseada no conhecimento dos textos, na sua dúvida quanto à sua veracidade e/ou carácter difamatório e da sua inacção para impedir a publicação. E essa prova competia ao Autor e não pode resultar apenas do que consta na ficha técnica da revista;

25.      Não há factos concretos e individualizados que digam respeito a este Recorrente e que delimitem e justifiquem a sua responsabilidade, com excepção dos textos da sua autoria. E o seu nome na ficha técnica não prova o conhecimento e não oposição do Recorrente;

26.       Assim sendo, a decisão de uma condenação pelos danos causados, deveria ser ponderada e tomada por recurso ao disposto nos art. 165.° e 500º/2 do CC. Consequentemente, havendo responsabilidade solidária entre a pessoa colectiva e o órgão, agente ou mandatário, responderá apenas a sociedade se não for possível determinar em concreto o agente culpado do acto;

27.       Também por esta razão, o Recorrente não deveria ter sido condenado solidariamente com a empresa jornalística para quem trabalhava na altura dos factos e os restantes RR. no processo, devendo, de jure constituto, ser absolvido do pedido, com excepção do que respeita aos textos da sua autoria;

28.       Para a responsabilização cível da Ré LL era necessário demonstrar o preenchimento dos requisitos substanciais para a responsabilização solidária das empresas jornalísticas, previstos no art. 29º/2 da Lei da Imprensa, cujo ónus pertencia ao Autor, na medida de se tratar de um facto constitutivo do seu direito;

29.       Porém, tais factos não foram alegados em sede de P.I. nem foi feita qualquer prova nesse sentido, razão pela qual o tribunal a quo não se referiu à mesma. Ficou por provar o conhecimento e não oposição dos directores das publicações, elemento constitutivo da obrigação de indemnizar da empresa jornalística, conforme dispõe o art. 29.°/2 da Lei de Imprensa;

30.       A ausência dessa prova implica, necessariamente, que a empresa jornalística seja absolvida do pedido, por não se demonstrar o preenchimento de dois elementos factuais constitutivos do direito do Autor sobre a Ré LL;

31.      Esta questão, por ser uma questão sobre um dos elementos constitutivos da responsabilidade civil, como comitente, da empresa jornalística, era uma questão que o tribunal não podia deixar de analisar. Ao não o fazer, o tribunal a quo ignorou uma questão fundamental da aplicação do direito aos factos concretos, o que se alega nos termos e para os efeitos previstos no art. 615º/1/d) do CPC;

32.     Atento o disposto no art. 29º/2 da Lei de Imprensa, nos presentes autos o Recorrente apenas pode ser responsabilizado como autor do texto "…", publicado a … de Outubro de 20… e do texto "…", publicado a … de Dezembro de 20…;

33.       Assim é na medida em que o Recorrente não é responsabilizável, civilmente, pelos conteúdos publicados na revista enquanto era director da revista DD, de jure constituto, quem assume tal responsabilidade é a empresa jornalística, conforme o disposto no art. 29º/2 da Lei de Imprensa e, relativamente aos dois artigos da sua autoria, o Recorrente é responsável cível pelo seu conteúdo, nos termos do disposto no art. 483º/1 do CC e 31º/1 e 29º/2 da Lei de Imprensa, na qualidade de autor dos textos, sendo a empresa jornalística solidariamente responsável com o Recorrente, nos termos do disposto no art. 29.°/2 da Lei de Imprensa e art. 500.° do CC. Ao não ponderar o direito desta forma, o tribunal a quo errou na aplicação do direito aos factos;

34.      Atento o facto de estes textos serem a expressão material do exercício do direito de expressão da opinião do Recorrente, sobre a pessoa do Primeiro-Ministro e atenta a vasta jurisprudência do TEDH relativamente ao exercício do direito a crítica de pessoas públicas e que exercem cargos públicos, é de entender que os mesmos não são, objectivamente, ilícitos, razão pela qual o Recorrente não deverá ser condenado pela prática de qualquer facto ilícito;

35.      Relativamente a estes dois artigos, o tribunal a quo não traçou qualquer nexo de causalidade adequada entre os danos dados como provados e os mesmos e, tendo em conta que, nos termos do disposto no art. 483.° do CC, tal nexo é um elemento constitutivo do direito de indemnizar, a ausência da definição deste nexo de causalidade constitui um vício de ausência de pronúncia, que se alega nos termos do disposto no art. 668º/1/d) do CPC;

36.      Além disso, não se traçando tal nexo de causalidade entre estes dois artigos e os danos sofridos pelo Autor, não pode o Recorrente ser responsabilizado pelos mesmos, devendo, por isso, ser absolvido do pedido, pois falta um dos elementos constitutivos da responsabilidade civil;

37.      A ausência de ilicitude implica o não preenchimento de um dos requisitos legais para a existência de responsabilidade civil por parte do Recorrente e, consequentemente, a sua absolvição nos presentes autos;

38.     Quanto ao texto "…", o mesmo consubstancia um artigo de opinião, que visa apresentar um trabalho publicado na revista DD. No entanto, atenta a doutrina mais recente e a jurisprudência do TEDH que se aplica a artigos de opinião que visam figuras com responsabilidades governativas, é de entender que o seu conteúdo não é ilícito:

39.       Assim é na medida em que, lido de forma objectiva, tal artigo não excede as normas de decoro ou educação, não ultrapassando os limites do que é admissível e desejável numa sociedade de Direito democrático, que se quer justa, plural e livre no pleno funcionamento daquilo que muitos designam por "mercado de ideias";

40.       Relativamente ao texto "…", nada foi provado para além da sua publicação, na medida em que o tribunal só dá provado tal facto. Não foi provada, assim, a sua ilicitude;

41.      No que respeita aos elementos constitutivos do direito à indemnização cível, previstos no art. 483.° do CC, sempre diremos, tal como foi defendido pelo voto de vencido aposto no Acórdão recorrido, que inexiste, desde logo, a ilicitude, na medida em que, apesar do tom forte dos escritos, o mesmo não extravasaram o âmbito da crítica legítima, tal como é interpretada pelo TEDH;

42.      A ausência de ilicitude implica a absolvição dos RR, por inexistência de um dos elementos legalmente previstos no art. 483.° do CC;

43.      Ao pugnar pela ilicitude das condutas, o Tribunal a quo não aplicou correctamente o n.° 2 do art. 10.° da CEDH, de acordo com a jurisprudência interpretativa que tem sido produzida pelo TEDH, razão pela qual a decisão condenatória deve ser revogada em conformidade;

44. O Tribunal a quo também errou na apreciação dos danos patrimoniais alegadamente sofridos pelo Autor na modalidade de lucros cessantes;

45.      Errou, desde logo, quando ignorou, tout court, a declaração de rendimentos do Autor, emitida pelo Tribunal Constitucional e que atribui ao Autor um rendimento de €: 120.970,94 no ano de 2006 (ano seguinte após ter cessado as funções de Primeiro-Ministro). Este rendimento deveria ter sido abatido aos alegados lucros cessantes do Autor pois foi rendimento de trabalho Independente;

46.      Esta questão foi colocada em sede de recurso, não tendo o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa tomado conhecimento da mesma, o que implica uma omissão de pronúncia, nos termos do disposto no art. 615./1 do CPC;

47.      E assim é na medida em que, inexplicavelmente e sem qualquer fundamentação, o tribunal a quo ignorou um documento oficial, subscrito pelo Autor, quando tal documento deveria ter sido uma prova da efectiva existência de rendimentos (avultados) do Autor após ter deixado o cargo de Primeiro-Ministro, pelo que errou, de forma injustificada, na apreciação da prova existente nos autos;

48.       Por outro lado o Tribunal a quo voltou a errar quando alega que a questão da incompatibilidade para o exercício da advocacia, após o Autor ter saído do cargo de Primeiro-Ministro e ocupado o cargo de Presidente da Câmara de … até Setembro de 20… era uma questão nova, não alegada anteriormente pelas partes e, como tal, não podia ser conhecida pela Relação;

49.       Estamos perante uma questão de direito, da exclusiva responsabilidade dos tribunais, razão pela qual o Tribunal da Relação não tem razão ao recusar aplicar uma norma legal ao caso concreto, alegando que a mesma não tinha sido anteriormente alegada pelas partes;

50.      Salvo melhor e mais esclarecido entendimento, a determinação e interpretação das normas aplicáveis é uma competência exclusiva dos tribunais, não estando na disponibilidade das partes. E, como tal, não pode o tribunal demitir-se de decidir aplicar uma norma legal;

51.      No caso concreto, o cargo de Presidente da Câmara é incompatível com o exercício da advocacia (nos termos do disposto no art. 77.° do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pela Lei n.° 15/2005, de 26 de Janeiro) razão pela qual, o valor médio mensal dos rendimentos como advogado, durante este período de incompatibilidade, deveriam ter sido reduzidos ao valor da indemnização a arbitrar ao Autor;

52.      Nos termos do disposto no art. 483º/1 do CC, só são ressarcíveis os danos causados pelo acto ilícito. Isso significa, desde logo, que não são ressarcíveis os danos que, nos termos das normas legais vigentes, não se podem ter;

53.       Se o Autor, no período em que passou a exercer as funções de Presidente da Câmara de …, estava legalmente impedido de exercer a advocacia, não pode ser titular de um direito a uma compensação por um dano de lucros cessantes relativamente ao não exercício de uma actividade profissional que estava impedido de exercer;

54.       Ao atribuir ao Autor uma indemnização por lucros cessantes, relativa a um período em que este, legalmente, não poderia ter tais proventos, o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa violou o disposto no art. 483º/1 do CC;

55.      Em conformidade, esta decisão deve ser revogada e alterada pelo ad quem alterá-la, subtraindo ao valor dos lucros cessantes atribuído a importância de €: 25.000,02 (6 x 4.166,67 = €: 25.000,02) relativo ao período total em que o Autor não pode auferir rendimentos como advogado, pois estava legalmente impedido de exercer tal profissão;

56.   No que respeita aos elementos constitutivos da responsabilidade civil extra-contratual, sempre diremos que, no que respeita à ilicitude, atenta a vasta jurisprudência fixada pelo TEDH, à qual o Estado português deve obediência, nos termos do disposto no art. 46.°/1 da CEDH e do art. 8.° e 16º/1 da CRP e atento o facto de estarmos perante críticas e notícias sobre um Primeiro-Ministro no exercício de funções, prevalece o direito à liberdade de expressão e de imprensa, pelo que tais notícias não foram ilícitas atento o disposto no n.° 2 do art. 10.° da CEDH, na interpretação que tem vindo a ser dada pelo TEDH;

57.     No que diz respeito aos danos não patrimoniais, sempre diremos que ser objecto de piada entre amigos ou ficar ofendido na sua imagem, não são danos que mereçam a tutela do Direito, atento o facto de que tais são consequência necessária e directa da exposição mediática própria do exercício da política;

58.      Este cariz punitivo que o Venerando Tribunal da Relação deu à indemnização que arbitrou a título de danos não patrimoniais, não pode deixar de chocar com o valor atribuído pelos nossos Tribunais Superior a indemnizações por graves danos não patrimoniais, sofridos pelos cidadãos comuns em acidentes de viação, por exemplo;

59.      Por outro lado, ao atribuir ao Autor uma indemnização por danos não patrimoniais, no valor de €: 80.000,00, como compensação pelo facto de pessoas virarem a cara a Autor nos restaurantes ou que este passou a ser alvo de piadas entre amigos, o tribunal a quo violou o princípio de equidade previsto no art. 496º/3 do CC. E assim é, na medida em que, por um lado, inexistem quaisquer danos que justifiquem a atribuição, nos presentes autos, da maior condenação alguma vez decretada por um tribunal, por danos não patrimoniais e, por outro lado, porque esta decisão não toma em conta os valores que comummente são atribuídos pelos nossos Tribunais Superiores danos morais imensos, resultantes de factos ilícitos graves;

60. O tribunal a quo fundamenta a sua decisão em valores atribuídos em apenas 2 processos (ambos de valores significativamente inferiores) mas esquece que tais decisões já tinham uma natureza excepcional, atendendo aos valores comummente atribuídos por danos gravíssimos;

61.     Não podemos ter um país em que o dano de sofrer com piadas de amigos ou incertezas na auto-estima sejam desproporcional e abusivamente superior ao dano de perda de um familiar próximo ou dores causadas por múltiplas operações, paralesias, recuperações longas e incertas ou cicatrizes permanentes e graves;

62.     Por outro lado, ao atribuir tal valor, o Venerando Tribunal da Relação de … fez prevalecer o carácter punitivo da indemnização cível, em detrimento do seu carácter reparador de danos. Tal possibilita a especulação económica do lesado, o que coloca em causa a justeza desta decisão, face aos valores comummente atribuídos pelos Tribunais Superiores em danos de idêntica ou superior gravidade;

63.    A indemnização punitiva não deve ser liminarmente afastada mas deve ficar reservada para os casos de gravidade extrema. Ora, da fundamentação do valor atribuído, não há nenhum argumento que nos leve a concluir que estamos perante um caso de gravidade extrema, pelo que deverá imperar a vertente reparadora sobre a punitiva, não se entendendo, por isso, o valor arbitrado;

64.    Mais: ao atribuir esta indemnização única no nosso ordenamento jurisprudencial, o Tribunal a quo ignorou o carácter repressivo, de autocensura e intimidatório que tal decisão tem para a generalidade dos órgãos de comunicação social, susceptível de gerar uma adequação comportamental fortemente limitadora da liberdade de expressão e de informação. E se é certo que estamos perante um processo de partes, também não é menos certo que os Tribunais Superiores têm o dever de equacionar os efeitos externos que as suas decisões têm na comunidade em que se inserem, o que, objectivamente, não foi feito;

65.     Ao agir desta forma, o Tribunal a quo não agiu com a equidade a que obriga o n.° 3 do art. 496.° do CC, pelo que tal decisão deve ser revogada pelo Tribunal ad quem;

66.     Além disso, não foi traçado qualquer nexo de causalidade adequada entre os danos alegados pelo Autor e os conteúdos editoriais objecto dos presentes autos;

67.    É um facto público e notório que o Autor não seguiu profissionalmente a carreira da advocacia, tendo abraçado o serviço público. Este é um facto decisivo para o Autor não ter uma carteira de clientes, não havendo qualquer nexo causal entre o desempenho de cargos públicos e a competência profissional no exercício da advocacia;

68.       Por outro lado, também é um facto público e notório que a generalidade dos políticos, após uma derrota eleitoral significativa, precisam de um tempo de ausência, vulgarmente denominado por travessia de deserto;

69.   Nestas circunstâncias, é normal que um ex-Primeiro-Ministro que sofre uma derrota eleitoral fortíssima, deixe de trabalhar por uns tempos nos órgãos de comunicação social, pelo que o tribunal a quo tinha obrigação de afastar estes efeitos normais de uma derrota política e imputá-los concretamente às publicações objecto dos presentes autos;

70.     Porém, esta normalidade própria da carreira política, apesar de ter sido alegada, não foi tomada em conta pelo tribunal a quo;

71.     Consequentemente, inexistindo prova do nexo de causalidade adequada, inexiste obrigação de indemnizar, nos termos do disposto no art. 483º/1 a contrario sensu do CC;

72.       Perante o supra exposto, o Supremo Tribunal de Justiça tem uma oportunidade única de fazer história no nosso ordenamento jurisprudência;

73.       Por um lado, pode aderir à jurisprudência emanada pelo TEDH, dando um sinal que o país bafiento do "respeitinho é muito bonito" é coisa do passado e que este país aderiu, definitivamente, à modernidade e aos valores europeus, onde não existe o medo do debate e da exteriorização de ideias e informações, sendo as mesmas tuteladas como conditio sine qua non da existência de um Estado de Direito democrático. Porque, ao defender a liberdade de expressão dos outros, estamos a defender a nossa liberdade de expressão e de pensamento. Para tal, terá que concluir que o Acórdão objecto do presente recurso, viola o n.° 2 do art. 10.° da CEDH e, em conformidade, os RR devem ser absolvidos dos pedidos;

74.     Alternativamente, o Supremo Tribunal de Justiça poderá optar por uma posição mais conservadora, que, inevitavelmente, será tempestivamente analisada pelo TEDH, à luz da CEDH. Nesse caso, para a história ficará a decisão deste tribunal europeu.


Termos em que,

revogando-se a sentença recorrida, na parte objecto do presente recurso, se fará inteira e sã

JUSTIÇA!!!


I.     Vem o presente recurso interposto do acórdão que condenou, entre outros, os Réus KK e II, ora Recorrentes, a pagar € 395.000,00 (trezentos e noventa e cinco mil euros) e € 98.750,00 (noventa e oito mil setecentos e cinquenta euros), respectivamente, ao Autor, AA, a título de compensação por danos patrimoniais e não patrimoniais, alegadamente causados pela publicação de três artigos de opinião política e três textos de noticiário social.

II.     O acórdão sob recurso constitui uma ingerência manifestamente ilegal no direito de liberdade de expressão dos aqui Recorrentes que se limitaram a exprimir a sua opinião política sobre um político (no caso do Recorrente KK) e a noticiar, na chamada imprensa cor-de-rosa, acontecimentos da vida do Autor, à data, primeiro-ministro (no caso da Recorrente II).

III.    Constitui um dos fundamentos do presente recurso de revista para este Supremo Tribunal de Justiça a nulidade prevista no artigo 615º nº 1 alínea b) do CPC e que consiste na falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.

IV.     Tal como sucedia com a sentença de 1ª instância, da leitura do acórdão do Tribunal “a quo” não é possível extrair o processo lógico ou racional que subjaz à formação da convicção do julgador, não sendo especificados os fundamentos de facto e de direito que conduzem à decisão final.

V.       Em nenhum momento do acórdão, o Tribunal “a quo” se debruça sobre os artigos elaborados pelo Recorrente KK e identifica em que medida as opiniões nele contidas são ilegítimas ou geradores de responsabilidade civil.

VI.       E no que concerne aos textos publicados na revista de que a Recorrente II era directora o Tribunal recorrido, para além de constatar a existência de alguns erros de facto irrelevantes, prevalece-se infundadamente da sua posição processual de última palavra sobre a matéria de facto, para afirmar certezas absolutas sobre as intenções dos autores dos textos.

VII.     Da leitura do acórdão recorrido não é pois possível extrair de que forma e em que medida ou que afirmações concretas constantes dos artigos de opinião e notícias sociais escritos pelos Recorrentes são ilícitas.

VIII.     Deveria o Tribunal da Relação, confrontado com o recurso que deu origem ao presente acórdão, em que todos os Recorrentes indicaram os concretos pontos de facto que consideraram incorrectamente provados e referiram os concretos meios probatórios, constantes do processo, que – na sua perspectiva – impunham uma decisão de facto diversa da recorrida, ter efectuado uma séria avaliação da convicção formada pelo Tribunal de 1ª instância, o que, como decorre da mera leitura do acórdão recorrido, não sucedeu.

IX.      A par de “juízos conclusivos”, as testemunhas do Autor constituíram a prova de todos os factos relvantes para a condenação dos Recorrentes neste processo.

X.     A falta de fundamentação e sucessiva remissão para juízos conclusivos e injustificados verifica-se, de forma flagrante e especialmente censurável, no que concerne o ponto 67 da matéria de facto (“O A. sempre foi um político respeitado e considerado no meio político em que se insere); no que respeita à justificação do valor dos prejuízos alegadamente sofridos pelo Autor em virtude da publicação dos textos em causa no processo; no que concerne aos supostos rendimentos do Autor como advogado; no que respeita ao artigo “....”; ao artigo “...” e ao artigo 94 da matéria de facto (este aditado à matéria de facto dada como provada).

XI.     O acórdão em crise toma os textos como um todo para os considerar, a todos, sejam eles de opinião ou noticiosos (no âmbito da imprensa cor-de-rosa) ilícitos e com o efeito de ter condicionado a permanência do Autor no lugar de primeiro-ministro e tornaram o mesmo “alvo de chacota prejudicando de forma indelével a sua capacidade de ganho.”

XII.    Para qualquer pessoa medianamente informada, o desprestígio do Recorrido quando foi demitido e a sua própria demissão não resultaram das críticas politicas à sua actuação ou dos artigos publicados nas “revistas cor-de-rosa” mas sim da sua própria actuação.

XIII.    Sendo certo que numa sociedade democrática a imprensa desempenha um papel matricial na avaliação crítica dos eleitos e das figuras do poder em geral.

XIV.    O tribunal “a quo” – reproduzindo acriticamente o decidido em 1ª instância – não evidenciou minimamente como chegou à conclusão de que os artigos do recorrente KK lesam qualquer direito do recorrido e como é que são susceptíveis de causar danos indemnizáveis ou como é que os artigos de noticiário social publicados na revista de que era directora a Recorrente II, muito embora contenham erros, são causadores do denegrir da imagem do Autor ou da falta de solicitação para trabalhos ou até mesmo para a sua queda do governo pelo que o acórdão recorrido padece do vício de nulidade por falta de fundamentação nos termos do disposto nos artigos 615º nº 1 b) e 674º nº 1 c) do CPC, o que se expressamente se invoca.

XV.     O uso, pelas instâncias, em processo civil, de regras de experiência comum é um critério de julgamento, aplicável na resolução de questões de facto, não na interpretação e aplicação de normas legais, está subordinado à razão e à lógica e pode ser sindicado pelo STJ se através da necessária objectivação e motivação, se alcance que foi usado para além do que é consentido para além da experiência comum de vida, fundando uma conclusão inaceitável.

XVI.     É – parece lógico – uma conclusão inaceitável a de que os textos objecto deste processo foram a causa do descrédito do Autor e condicionaram a sua queda do Governo e a falta de solicitações profissionais que terá sofrido em consequência daqueles.

XVII.    Pelo que este Supremo Tribunal de Justiça está habilitado a reverter a situação, não se conformando com os tais juízos conclusivos que desembocam numa condenação dos Recorrentes em virtude dos supostos prejuízos causados ao Autor com os textos publicados.

XVIII.    Mas ainda que se entendesse não dever proceder o arguido vício de nulidade de falta de fundamentação, o Tribunal “ad quem” sempre poderá sindicar o correcto ou incorrecto uso dos poderes da Relação, no tocante à alteração ou modificação da matéria de facto, apreciação que expressamente se requer.

XIX.     Como já notou este Supremo Tribunal de Justiça em acórdão de 2 de Março de 2011, “se o recorrente pretende que o STJ sindique o correcto ou incorrecto uso dos poderes da Relação, no tocante à alteração ou modificação da matéria de facto, solicitando, no fundo, que se avalie se a Relação, ao efectuar a dita apreciação, se conformou, ou não, com a lei, a avaliação sobre o assunto a realizar será de direito e da competência do STJ.”

XX.      “Não é compatível com a exigência da lei, em termos de reapreciação da matéria de facto, o exercício (apenas formal) por parte da Relação de um poder que se fique por afirmações genéricas de não modificação da matéria de facto, por não se evidenciarem erros de julgamento ou se contenha numa simples adesão aos fundamentos da decisão, ou numa pura aceitação acrítica das provas, abstendo-se de tomar parte activa na avaliação dos elementos probatórios indicados pelas partes ou adquiridos oficiosamente pelo tribunal.”

XXI.     “confrontada a Relação com um recurso que envolve a impugnação da decisão sobre a matéria de facto e relativamente ao qual a parte tenha cumprido o ónus de alegação e o ónus de especificação dos pontos de facto e dos meios probatórios, recaem sobre os respectivos juízes deveres de ordem legal (e deontológica) que inviabilizam a resolução do caso mediante meras observações genéricas que, à contraluz, deixem visível a omissão daquela tarefa fundamental: reapreciar os meios de prova oralmente produzidos, maxime, os referenciados pelas partes e confrontá-los com outros meios que se mostrem acessíveis, a fim de verificar se foi cometido ou não erro de apreciação que deva ser corrigido.”

XXII.    Em face do exposto, e não procedendo a arguida nulidade por falta de fundamentação, sempre deverá o aresto recorrido ser anulado por violação do artigo 662º do CPC, não tendo sido assegurado o duplo grau de jurisdição em termos de matéria de facto que era exigível ao Tribunal da Relação, e determinada a baixa do processo à Relação para que se proceda à devida reapreciação da prova.

XXIII.  A par do já invocado vício de nulidade, constitui fundamento do presente recurso de revista, a violação de lei substantiva prevista na alínea a) do nº 1 e nº 2 do artigo 674º do CPC por força da violação dos artigos 37º e 38º da Constituição da República Portuguesa, do artigo 10º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, do artigo 29º da Lei de Imprensa, da alínea a) do nº 1 do artigo 77º do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pela Lei nº 15/2005 de 26 de Janeiro (actual artigo 82º nº 1 a) do EOA), do artigo 484º do Código Civil, dos artigos 483º e 563º do Código Civil e, ainda, do art.º 566.º do Código Civil.

XXIV.     No caso do recorrente KK, estamos, inequivocamente, no campo da expressão do pensamento já que o mesmo foi condenado pela autoria de três artigos, inequivocamente, de opinião política, “…”, “…” e “…?!” – todos se reportando a tomadas de posição ou comportamentos políticos do Autor, enquanto primeiro-ministro do nosso país.

XXV.     O Recorrente exerceu o seu direito de crítica, enquanto manifestação do direito de opinião constitucionalmente consagrado, e que se traduz numa avaliação e apreciação pessoal de actuações e comportamentos do Autor, com a correspondente emissão de juízos, in casu, depreciativos.

XXVI.     As críticas em causa em nada beliscam o bom nome e reputação do Recorrido, antes se limitando a atacá-lo nas sua maneira de ser e actuação política e pública, pelo que nem sequer seria necessário realizar qualquer ponderação entre a liberdade de expressão e de opinião do Recorrente e o direito à honra do Recorrido – mas fazendo-o, por dever de patrocínio, dir-se-á - que a liberdade de expressão constituiu um dos pilares fundamentais do Estado democrático e uma das condições primordiais do seu progresso e, bem assim, do desenvolvimento de cada pessoa, pelo que as limitações à mesma – designadamente em virtude do direito à honra – devem ser interpretadas de modo restrito.

XXVII.    A liberdade abrange expressões ou outras manifestações que criticam, chocam, ofendem, exageram ou até distorcem a realidade e, em especial, no caso de a crítica versar uma figura pública, nomeadamente um agente político, como é o caso dos autos, que quer pela sua exposição, quer pelas ideologias que professam, quer ainda pelo controle a que devem ser sujeitos, seja pela comunicação social, seja pelo cidadão comum – quanto à comunicação social, tem sido utilizada com regularidade a expressão “cão de guarda” - devem ser mais tolerantes a críticas do que os particulares, devendo ser, concomitantemente, admissível maior grau de intensidade destas.

XXVIII.   A Recorrente II na sua qualidade de directora da publicação JJ, responde nos presentes autos pela publicação de três artigos ou conjuntos de notícias publicados na referida revista, “… “primeiro” em férias”, “ ….” e  “…. “…” de dizer no seu livro”.

XXIX.       Nestes artigos fala-se sobre questões sem particular relevo mas usuais e naturais no tipo de publicação em causa sendo certo que os valores da transparência e da probidade permitem o conhecimento das actividades das figuras públicas para além do exclusivo domínio da sua profissão ou cargo, nomeadamente quando são elas mesmas que publicitam a sua vida privada daí retirando benefícios em termos de construção da sua imagem pública, havendo, pois, um interesse público no conhecimento de facetas privadas das figuras públicas, desde que respeitada a intimidade da vida privada.

XXX.       O conteúdo dos artigos em causa não é susceptível de gerar qualquer responsabilidade civil, apesar de não corresponderem à verdade alguns dos factos relatados (idas ao restaurante e à discoteca), já que os mesmos em nada ofendem os direitos de personalidade do Autor, nomeadamente em nada violam o bom nome ou crédito do recorrido, até porque o Autor é uma figura pública que utiliza as revistas sociais para promover a sua imagem, concedendo entrevistas, expondo publicamente a sua família e as suas relações amorosas e auferindo vantagens diversas, nomeadamente a nível de viagens, cruzeiros e estadias em hotéis, participando em programas de televisão, seja de comentário desportivo seja reality show. (Factos provados 80 a 87- artigos 29.º a 35.º da BI).

XXXI.     A tolerância do visado em relação a artigos e notícias como os dos autos tem de de ser manifestamente ampla: não só o Autor é uma pessoa que não faz reserva da sua privada, como o Autor ocupava o cargo de primeiro-ministro, o que, como é evidente, “o onera com uma maior exposição à comunicação social, em especial à denominada imprensa cor-de-rosa” que vive dos pormenores do dia a dia da vida dos “famosos” – neste sentido, cfr. o voto de vencido constante do acórdão recorrido.

XXXII.    A liberdade de expressão e de imprensa, consagrada constitucionalmente nos artigos 37.º e 38.º não abrange só o direito de falar de questões sérias ou de publicar jornais e revistas de informação geral, politica ou científica mas também publicações de entretenimento e ligeiras no seu conteúdo, também elas de interesse público.

XXXIII.    Quer os artigos de opinião escritos pelo Recorrente KK quer os artigos de noticiário social publicados na revista de que a Recorrente II era directora são textos lícitos, legítimos numa sociedade democrática e insusceptíveis de gerar responsabilidade civil já que constituem o legítimo uso das liberdades de expressão, de informação e de imprensa e consagradas nos artigos 37.º e 38.º da CRP e não podem ser suprimidas por uma absolutamente errónea e desfasada da realidade ponderação com o bom nome e reputação do Autor.

XXXIV.    O acórdão em crise constitui uma violação flagrante dos artigos 37º e 38º da nossa Constituição, directamente aplicáveis nos termos do art.º 18º, pelo que sempre deverá este Supremo Tribunal revogar o mesmo e absolver os Recorrentes.

XXXV.     O Tribunal “a quo” limita-se a afirmar generalidades a propósito dos diversos textos em causa no processo, concluindo que os mesmos, num todo, (não se percebendo quais e em que medida) ultrapassam “a fronteira do permitido”.

XXXVI.    O entendimento do acórdão recorrido em nada cuida, assim, da dimensão da liberdade de expressão numa sociedade democrática tal como é configurada na CEDH, que, por força dos artigos 8.º e 16.º, nº 1 da Lei Fundamental, hierarquicamente se situa em plano superior ao das leis ordinárias internas e que não tutelando directamente o direito à honra se reporta ao mesmo como possível integrante das restrições à liberdade de expressão enunciadas no artigo 10º, nº 2

XXXVII.    A observância da Convenção Europeia leva o intérprete a ter de seguir o caminho consistente, não em partir da tutela do direito à honra e considerar os casos de eventuais ressalvas, mas em partir do direito à livre expressão e averiguar se têm lugar algumas das excepções do nº 2 – sendo que só uma necessidade social imperiosa poderá justificar uma restrição, nomeadamente no domínio da informação e opinião sobre agentes políticos.

XXXVIII.   Sobre esta matéria, os Recorrentes não podem deixar de invocar os acórdãos do TEDH proferidos no caso SSS-SOCIEDADE JORNALÍSTICA, LDA c. PORTUGAL (referente a uma queixa respeitante a uma condenação de um jornalista por um artigo de opinião sobre o mesmo Autor), de Agosto deste ano; e nos casos PINTO PINHEIRO MARQUES c. PORTUGAL, 2015, AMORIM GIESTAS e JESUS COSTA BORDALO c. PORTUGAL , 2014;  WELSH e SILVA CANHA c. PORTUGAL. 2013; BARGÃO e DOMINGOS CORREIA c. PORTUGAL, 2012; GOUVEIA GOMES FERNANDES e FREITAS E COSTA c. PORTUGAL, 2011 e PÚBLICO – COMUNICAÇÃO SOCIAL, S.A. e outros c. PORTUGAL, 2011.

XXXIX.    Todos os referidos acórdãos se vêm obrigados a explicitar o que deve ser entendido como liberdade de expressão e de opinião nos termos do art.º 10.º do CEDH, porque, naqueles casos, os Tribunais portugueses não o souberam interpretar e aplicar devidamente, tal como sucedeu, de forma clamorosa, no acórdão sob recurso.

XL.      É sintomático da incorrecta interpretação e aplicação da CEDH no acórdão em crise o facto de ser atribuída especial censura ao facto de as notícias (de imprensa cor-de-rosa) e textos de opinião em causa dizerem respeito a um primeiro-ministro, tendo sido esse, em especial, o facto que fez o Tribunal da Relação considerar o valor de € 30.000,00 irrisório (?!) no que toca à compensação por danos não patrimoniais, elevando-a mesmo para € 80.000,00 (!!).

XLI.     Como é evidente e resulta de toda a jurisprudência do TEDH, é precisamente o facto de o visado ser primeiro-ministro que o torna necessariamente mais tolerante a críticas.

XLII.   É também um indicador da liberdade de expressão garantida numa sociedade aberta, democrática e pluralista a capacidade de absorver e corrigir discursivamente afirmações falsas e juízos de valor injustos, podendo e devendo as imprecisões ser corrigidas através de mais discurso, mais comunicação e mais informação, o que, ao Autor, enquanto primeiro-ministro, é largamente facilitado já que dispõe de amplas possibilidades de acesso à comunicação social.

XLIII.    Como salientado pelo juiz conselheiro Henriques Gaspar, “na jurisprudência do TEDH, a liberdade de expressão tem sido considerada como super liberdade e um dos direitos mais preciosos do homem, condição sine qua non de uma verdadeira democracia pluralista, necessária ao desenvolvimento do homem e ao progresso da sociedade; a sociedade democrática repousa precisamente sobre o pluralismo de ideias e opiniões livremente expressas.”

XLIV.      Nos artigos de opinião do Recorrente KK não é o autor, enquanto pessoa individual que é o visado, mas sim o autor enquanto pessoa política, a quem foi confiado o encargo de conduzir o país, pelo que sempre terão de ser aceites as opiniões expressas e os juízos de valor emitidos sobre determinados comportamentos de um primeiro-ministro, que não extravasam o direito à liberdade de imprensa, ainda quando assumem carácter altamente mordaz, contundente e até de alguma violência psicológica.

XLV.    Também os textos publicados na revista de que a Recorrente II era directora e que continham factualidade que se veio a provar ser inverídica, a mesma não é objectivamente, por si, apta a afectar a honra e/ou consideração, a imagem e o bom nome de uma pessoa necessariamente exposta ao escrutínio público, por força das funções que então desempenhava e que, mesmo a título particular, nunca se incomodou de participar em eventos sociais expondo a sua vida privada e familiar ao público em geral – neste sentido o voto de vencido do acórdão recorrido.

XLVI.     É patente o erro em que incorre o acórdão recorrido no que concerne a aplicação e interpretação do disposto no artigo 10º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos, aprovada para ratificação pela Lei 65/78 de 13 de Outubro e ratificada em 9 de Novembro de 1978, assim violando tal normativo legal, de forma ostensiva, pelo que deverá o acórdão sob recurso ser revogado e os Recorrentes absolvidos.

XLVII.     Dispõe o artigo 29º da Lei da Imprensa, aprovada pela Lei nº 2/99 de 13 de Janeiro, no seu nº 1, que “na determinação das formas de efectivação da responsabilidade civil emergente de factos cometidos por meio da imprensa observam-se os princípios gerais”, dispondo, por seu turno, o artigo 29º, nº 2, do mesmo diploma dispõe que “no caso de escrito ou imagem inseridos numa publicação periódica com conhecimento e sem oposição do director ou seu substituto legal, as empresas jornalísticas são solidariamente responsáveis com o autor pelos danos que tiverem causado”.

XLVIII.    O Réu e aqui Recorrente KK não era, à data dos factos objecto da presente acção, director de qualquer publicação periódica pelo que nunca poderia ser responsabilizado enquanto director-geral da Ré LL, como ocorreu no acórdão sob recurso, porquanto essa responsabilização não está legalmente prevista.

XLIX.     E, assim, incorreu num erro que se traduz numa grave violação da lei, designadamente na interpretação que faz do disposto na Lei de Imprensa nos seus artigos 20º e 29º, o que sempre determinará a revogação do acórdão sob recurso e a absolvição do Recorrente KK.

L.      Errou também, violando a lei, o Tribunal da Relação no cálculo do valor dos danos patrimoniais que entendeu terem sido sofridos pelo Autor, tendo usado por base os rendimentos que entendeu – sem prova –  que o Autor teria deixado de auferir em virtude dos “artigos de opinião caricaturados e críticas políticas à sua actuação, eivadas de falta de rigor, e os artigos publicados nas revistas “cor-de-rosa” da Ré QQQ.”

LI.        Sem prejuízo do absurdo que é referir-se “falta de rigor” no que concerne a opiniões e críticas políticas, entre esses rendimentos estariam as receitas que o Autor deixou de receber por não ter sido procurado para prestar serviços jurídicos tendo o Tribunal da Relação de Lisboa entendido no acórdão recorrido que o Autor teria deixado de auferir, durante os três anos em que se encontrava a “repor o seu prestígio”, € 50.000,00 em virtude de não ter sido procurado para prestar serviços jurídicos enquanto Advogado.

LII.      É facto público e notório que o Autor, na sequência da sua demissão como primeiro-ministro, voltou a ocupar o cargo de Presidente da Câmara de ... pelo que mesmo a admitir que se tivesse exercido advocacia naquele período o Autor teria rendimentos de cerca de € 4.000,00/mês, a verdade é que, pelo menos enquanto foi Presidente da Câmara nunca teria tido quaisquer rendimentos como advogado uma vez que o exercício da advocacia é incompatível com o exercício daquele cargo.

LIII.     Termos em que a decisão sob recurso também nesta parte violou a lei, concretamente a alínea a) do nº 1 do artigo 77º do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pela Lei nº 15/2005 de 26 de Janeiro (actual artigo 82º nº 1 a) do EOA) e, deverá ser revogada.

LIV.     Em relação ao Recorrente KK, resulta evidente uma outra flagrante violação da lei decorrente de uma incorrecta aplicação do artigo 484º do Código Civil aos artigos de opinião por si elaborados, já que que aquele normativo que prevê a ilicitude decorrente da ofensa do crédito ou do bom nome provocada pela divulgação ou afirmação de factos não se aplica a juízos de valor e opinião.

LV.    Sendo incontestável que os artigos escritos pelo ora Recorrente KK são artigos de opinião política, juízos de valor e não contêm afirmações ou declarações de factos susceptíveis de integrar a previsão do artigo 484º do Código Civil, a sua aplicação constitui uma flagrante e inadmissível violação de lei substantiva pelo que deverá o STJ revogar tal decisão e absolver o Recorrente KK.

LVI.    A responsabilidade dos Recorrentes, depende do concurso dos pressupostos mencionados no artigo 483º do Código Civil, ou seja, da ilicitude do acto, da sua voluntariedade, do nexo de imputação do facto ao agente, da produção de um dano e do nexo de causalidade entre o facto e o dano.

LVII.     Os Recorrentes já demonstraram não serem ilíctos os actos por si praticados, mas ainda que se entendesse que os actos em causa são ilícitos e/ou não têm causa de justificação – o que, sublinhe-se, não só veementemente não se entende, como não se entende como é que o acórdão de recurso o entendeu – a verdade é que continuaria a não estar verificado um dos pressupostos de que a lei faz depender a obrigação de indemnizar: o nexo de causalidade.

LVIII.     A apreciação da existência ou não nexo de adequação causal integra uma questão de direito compreendida nos poderes de sindicância do Supremo Tribunal de Justiça.

LIX.     Assente o nexo naturalístico, inserido no plano factual, pode o Supremo Tribunal de justiça, “verificar da existência de nexo de causalidade o que se prende com a interpretação e aplicação do artigo 563º do Código Civil.”, sendo que, da correcta aplicação daquele normativo resulta que o facto gerador do dano só pode deixar de ser considerado sua causa adequada se se mostrar inidóneo para o provocar ou se apenas o tiver provocado por intercessão de circunstâncias anormais, anómalas ou imprevisíveis – o que aconteceu nos autos.

LX.       Como sabe qualquer pessoa medianamente informada, a demissão do recorrido ou o desprestígio do mesmo quando foi demitido não resultou das críticas politicas à sua actuação do Recorrente nem sequer dos artigos publicados nas imprensa cor-de-rosa que estão em causa neste processo mas sim da sua própria actuação, das suas trapalhadas e da sua inconsistência.

LXI.     A actuação do Recorrido durante o seu governo foi a causa do seu desprestígio e descrédito, sendo essa a circunstância anormal, anómala ou imprevisível que poderá ter consubstanciado quaisquer danos ou consequências que ao Recorrido possam ter advindo na sequência da queda do seu governo.

LXII.      Mesmo aceitando que os artigos possam ter contribuído ou até provocado para desprestígio do Autor – o que não se aceita, mas porque integrantes do nexo naturalístico não se poderá, nesta sede alterar, – a verdade é que esse desprestígio e falta de solicitações apenas aconteceu porque o autor, em virtude das suas sempre, no mínimo, polémicas tomadas de posição, atitudes e comportamentos públicos, veio a ser demitido, colocando-se na posição de perder os alegados e, pelo tribunal “a quo” dados como provados, rendimentos.

LXIII.    “A determinação de um nexo de causalidade entre algumas notícias factualmente infundadas e os alegados danos morais e patrimoniais invocados por figuras públicas só deve proceder se ficar demonstrado, para além de qualquer dúvida razoável, que as mesmas afectaram significativamente a possibilidade de o público formular um juízo objectivo sobre a pessoa visada por essas notícias. Também por estes motivos, os tribunais, na determinação do nexo de causalidade, devem interpretar restritivamente os seus poderes de intervenção na esfera de discurso público, especialmente quando esteja em causa a informação sobre matéria de interesse público e o debate envolvendo figuras públicas no exercício de funções públicas” (Jónatas Machado)

LXIV.    Mostrando-se o facto gerador do dano inidóneo para o provocar ou se apenas o tiver provocado por intercessão de circunstâncias anormais, anómalas ou imprevisíveis então o mesmo deixa de ser considerado sua causa adequada e inexistindo nexo de causalidade, falha um dos pressupostos que gera a obrigação de indemnizar, soçobrando, também por aí, a responsabilização dos ora recorrentes.

LXV.      A decisão em contrário constante do acórdão recorrido representa pois um incorrecto enquadramento do nexo de causalidade nos princípios legais em violação do disposto no artigo 563º do Código Civil pelo que deverá a decisão sob recurso ser revogada e os Recorrentes absolvidos.

LXVI.     Os Recorrentes, muito embora entendam que, inexiste lugar a qualquer indemnização, não podem deixar de se pronunciar relativamente ao montante fixado, seja no que respeita à compensação por danos patrimoniais seja no que concerne a fixação dos danos não patrimoniais.

LXVII.    No que respeita aos danos patrimoniais, in casu, referentes aos lucros cessantes do Autor, além da forma escandalosa como foram dados por provados os rendimentos do mesmo e o que auferiria se exercesse advocacia – com base, unicamente, no depoimento dos amigos e do irmão – já se viu que o cálculo se baseia parcialmente num raciocínio que o próprio Tribunal confessa estar viciado, situação que parece suficiente para a alteração de tais valores por este Supremo Tribunal de Justiça.

LXVIII.     Mesmo que se admitisse que o Autor deixou de receber aquelas quantias, o recurso às fórmulas matemáticas ou de cálculo financeiro para a fixação dos cômputos indemnizatórios por danos futuros/lucros cessantes não poderá substituir o prudente arbítrio do julgador, ou seja a utilização de sãos critérios de equidade, de resto em obediência ao comando do n.º 3 do art.º 566 do CC., o que não ocorreu minimamente no acórdão sob recurso, assim violando o disposto no referido normativo.

LXIX.       Não é o alegado sentimento de quem se diz ofendido que deve servir de padrão aferidor da alegada ofensa pelo que foi assim violada a lei substantiva – art.º 566.º do CC e art.º 10.º CEDH, pelo que não deverá ser fixado qualquer montante e título de rendimentos perdidos pelo Autor em consequência dos artigos da responsabilidade dos Recorrentes ou, se assim não se entender – o que só por mero dever de patrocínio se admite – os mesmos, na parte que toca aos artigos em causa nos presentes autos, nunca deveriam ser superiores, na sua globalidade, a € 1.000,00.

LXX.       O TEDH tem sublinhado por diversas vezes, a imposição de indemnizações de valor elevado à comunicação social inevitavelmente produz um efeito inibitório da liberdade expressão (chilling effect) que não é permitido pelo art.º 10.º de CEDH, igualmente violado neste aspecto pela decisão sob recurso.

LXXI.       No que ao valor da compensação por danos não patrimoniais que o acórdão entendeu elevar de € 30.000,00 para € 80.000,00 em virtude de à data da publicação dos textos em causa o Autor ser primeiro-ministro – os mesmos estão absolutamente desfasados do que é admissível para uma compensação para este tipo de danos, sendo, no mínimo, absurdamente excessivo, atribuir uma compensação de € 80.000,00 ao Autor aqui Recorrido para que este se compense dos sofrimentos que terá suportado com a publicação dos textos objecto deste processo.

LXXII.      Montante indemnizatório – tanto o respeitante a danos patrimoniais como morais – que revela uma absoluta desconsideração pela liberdade de expressão na sua vertente do discurso livre sobre as figuras públicas e sobre a sua conduta, especialmente no caso de titulares de cargos políticos.

LXXIII.     Com a fixação daqueles montantes violou o acórdão recorrido a lei substantiva no que à aplicação dos artigos 563º e 566º do Código Civil e ao art.º 10.º de CEDH concerne, devendo o tribunal “ ad quem” revogar tal condenação e absolver os Recorrentes ou caso assim não se entendesse condenando os Recorrentes no pagamento de um € 1 a título de reparação dos danos morais.

LXXIV.      Em face de tudo o exposto, deve ser julgada procedente a presente revista e revogado o acórdão em crise, sendo absolvidos os aqui Recorrentes, assim se fazendo JUSTIÇA!


Termos em que deverá ser declarada a nulidade do acórdão sob recurso e ordenada a baixa do processo para a elaboração de novo acórdão nos termos legais ou, face às clamorosas violações da lei substantiva, deverá ser revogado o acórdão sob recurso e absolvidos os ora Recorrentes por ser de inteira

                                                                                                                                             JUSTIÇA !


a) são juízos de valor, conjecturas, suposições, especulações, opiniões, reflexões;

b) e não encerram a realidade naturalística para serem considerados factos, com interesse para a prova dos autos;

c) trata-se desta matéria - que deve considerar-se não escrita:

- artigos - factos provados

- 67-Acordão pág.90 (foi respeitado e considerado no meio - quando muito encerra uma conclusão),

- art. 69-pág. 92 (na medida em que os mais altos cargos de soberania são electivos e não de convite),

- art. 70-pág. 93 (na medida do seu desinteresse para os autos, ao não ser estabelecida com a prova a causalidade dos factos com este suposto dano),

- art. 71 a 74 - repor o prestigio ( na medida em que não é susceptível de demonstração essa reposição ou a falta dela, ou pelo menos constitui uma conclusão, para além de que há a inutilidade da prova dos supostos factos, porquanto não se prova a causalidade entre a falta da reposição e os danos - se tivesse reposto, haveria a prestação de serviços?),

d) constitui a prática de acto inútil dar-se como provado um facto impertinente para a aplicação da lei - arts. 607-4 e 130, CPC;

e) trata-se da matéria constante do art. 63 - matéria provada - Acórdão, pág. 89 -os rr escreveram, sendo que alguns dos factos relatados não correspondiam à verdade, o qual se deve dar como não escrito;

f) só interessaria esta matéria se houvesse a consciência da falta da veracidade no momento no qual se escreveu;

g) não sendo assim - como é o caso - não releva para a aplicação do direito, tanto mais que podem publicar-se noticias falsas, tal seja a boa fé - reputando-as verdadeiras - de quem elabora a noticia - CP, art. 180-2,b);

h) matéria de facto que deve considerar-se não escrita porque no seu teor inserem-se conclusões e não factos:

- arts. 71 a 74 - se se entender que encerram uma descrição da realidade, pelo menos são conclusões,

- 11-pág. 106 (com os artigos denegriram, lançaram a suspeita, diminuíram a confiança condicionando a continuação do exercício),

i) enquanto aos arts. 72 a 74 - matéria provada - pág. 60 - Acórdão - 19 da matéria de facto - decisão sobre a matéria de facto:

- dá como provada uma realidade fora do seu contexto, e sem atender à confissão do A quanto aos rendimentos que declarou no T Constitucional e que se sobrepõe à resposta por força da confissão consubstanciada nesses documentos;

- deve a resposta dar-se como não escrita;

j) factos a serem considerados no Acórdão e que nele não se consideraram:

- confissão do A nas declarações juntas aos autos - declarações de rendimento do A no período dos autos no T Constitucional;

- sentença - matéria de facto provada – pº no qual o A foi Autor – pº nº 3913/07.5TVLSB/ 3ª secção, 9ª vara/ Varas Cíveis de Lisboa: o A criou a imagem de politico que ama os prazeres da vida, a mundanidade, e o jet set social/ as férias de 4 dias nas Ilhas Baleares ao fim de pouco mais de um mês no Governo, como Primeiro Ministro, com transporte em avião a jacto, alimentam a imagem de politico que ama os prazeres da vida, a mundanidade e o jet set social;

I) na sentença não se estabelece o nexo causal entre os valores em cujo pagamento os RR foram condenados e a adequação à causa das publicações dos autos;

m) não se estabelece a relação entre esses rendimentos e a sua perda por causa das publicações, ou seja esta causa foi indiferente para a produção do dano - cfr. Ac. STJ, 1806/07,16.12.2010, dgsi.pt;

n) os RR contiveram-se no direito a informar com a publicação dos artigos e reportagens dos autos, e não praticaram facto ilícito-CC, art. 483,1;

o) nota-se que os políticos e outras figuras públicas pela sua visibilidade e discutibilidade das suas ideias - e no seguimento da Jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem - e pelo controle a que devem estar sujeitos, pela comunicação social ou pelo cidadão comum, devem ser mais tolerantes a criticas que os particulares e por isso o maior grau de intensidade destas - cfr. Ac TRL, 1613/10, 15.11.2011, dgsi.pt;

p) os valores fixados na sentença são elevados injustificadamente - danos materiais e quanto aos danos morais, não há fundamento para os atribuir por falta do seu relevo -art. 496,1, CC, e, se assim se não entender, devem ser reduzidos no seu valor;

q) quanto às alíneas supra - a) a f) - violou-se o CPC, art. 607-4;

r) deve dar-se provimento ao recurso, absolvendo-se integralmente os rr do pedido -todos eles.


1.    O acórdão recorrido padece de vários vícios que acarretam a sua anulação e baixa à Relação, designadamente os seguintes:

a.      Omissão de pronúncia quanto à junção de documentos pelo A. na ampliação do recurso e quanto ao desentranhamento requerido pelo R. quanto a tais documentos porquanto a Relação não se pronunciou sobre a admissão ou rejeição dos mesmos – o que acarreta a nulidade do acórdão nos termos do disposto do artigo 668.º, n.º 1, al. d), primeira parte, do CPC ex vi do artigo 722.º n.º 1, al. c) do CPC, todos na redação anterior à Lei 41/2013 de 26 de junho por violação dos termos do disposto nos artigos 524.º, 660.º, n.º 2, 693.º-B do CPC e 700.º, n.º 1, alínea e), do CPC (na redação anterior à Lei 41/2013 de 26 de junho).

b.       Omissão de pronúncia quanto às nulidades arguidas pelo R. de excesso de pronúncia quanto aos pontos 69 e 70 dos factos provados da sentença de 1.ª instância porquanto o Tribunal da Relação tinha o dever de pronunciar sobre as mesmas – o que acarreta a nulidade do acórdão nos termos do disposto do artigo 668.º, n.º 1, al. d), primeira parte, do CPC ex vi do artigo 722.º n.º 1, al. c) do CPC, todos na redação anterior à Lei 41/2013 de 26 de junho.

c.    Sem prejuízo da nulidade invocada na alínea anterior, ocorreu errada aplicação da lei de processo nos termos do disposto nos arts. 264.º, 646º, nº 4, e 664º do CPC (na redação anterior à Lei 41/2013), devendo a expressão “durante o período imediatamente posterior à cessação de funções como Primeiro-Ministro” – inserida nos pontos 68), 69) e 70) – ser dada por não escrita, por não ter sido questionada, articulada pelas partes ou objeto de prova, nem se conter na matéria do ponto em causa.

d.      Falta de fundamentação de facto quanto à remoção da expressão «sénior» no ponto 74) dos factos provados, o que impõe a anulação do acórdão, nos termos do disposto no artigo 668.º, n.º 1, a. b), ex vi do artigo 722.º n.º 1, al. c) do CPC (na redação anterior à lei 41/2013), incorrendo ainda em violação dos artigos 514.°, n.º 1, e 660.º, n.º 2,do CPC (todos na redação anterior à Lei 41/2013 de 26 de junho), incorrendo ainda em violação dos artigos 514.°, n.º 1, e 660.º, n.º 2,do CPC (todos na redação anterior à Lei 41/2013 de 26 de junho).

e.      Contradição entre a matéria de facto e a decisão pois dá-se como provado no ponto 74) dos factos provados que pela prestação de serviços jurídicos e de consultadoria a terceiros, o A. deve ser indemnizado em 125.000 €, à razão de 50.000€/ano – correspondente a dois anos e meio, mas na decisão aplica-se o valor de 150.000€ para 3 anos. Por este motivo se argui a nulidade prevista no artigo 668.º, n.º 1, al. c) do CPC (anterior à reforma de 2013) e que implica, por efeito do ponto 74), a redução do valor de danos a este título para montante não superior a 125.000 €.

f.      Omissão de pronúncia quanto ao conhecimento da questão da impossibilidade legal de cumulação do exercício da advocacia com o cargo de Presidente da Câmara exercido pelo A. de março de 2005 a setembro de 2005 e seu reflexo nos danos patrimoniais a fixar nos autos – com recurso à análise de questões de direito, a matéria instrumental de conhecimento público e notório e resultante da factualidade provada nos autos - que acarreta, nos termos do disposto nos artigos 668.º, n.º 1, al. d), primeira parte, ex vi do artigo 722.º nº 1, al. c) do CPC, a sua nulidade, por violação dos termos do disposto nos artigos 77.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, 280.º, n.º 1, do CC e 514.°, n.° 1, e artigo 712.º do CPC do CPC (redação anterior à Lei 41/2013 de 26 de junho).

Do conhecimento do fundo desta nulidade resultará uma necessária redução ao valor total de indemnização que venha a ser fixado a título dos danos patrimoniais (correspondente a 7 meses de impossibilidade legal de exercício de advocacia).

g.      Excesso de pronúncia quanto à alteração ao ponto 63) dos factos provados, por ser inserida matéria de facto ex novo que não foi aduzida pelas partes e que não é de conhecimento oficioso ou notório, mas antes se situava no domínio do princípio do dispositivo e sem contraditório ou defesa prévios quanto a tais factos – que acarreta a nulidade do acórdão em análise, nos termos do disposto no artigo 668.º, n.º 1, al. d), primeira parte, do CPC ex vi do artigo 722.º n.º 1, al. c) do CPC, todos na redação anterior à Lei 41/2013 de 26 de junho, por violação do disposto nos artigos 264.º e 712.º do CPC (todos na redação anterior à Lei 41/2013) e ainda do n.º 4 do artigo 20.º da CRP e do artigo 6.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem;

Ainda que assim não se entenda, deve a matéria constante do ponto 63) ser considerada como não escrita – quer na versão da sentença, quer na versão resultante do aditamento operado pela Relação –, por imperativo de disciplina processual e por analogia com o disposto nos arts. 646º n.º 4 e 664º do CPC e ainda por contradição com a restante matéria provada, cfr. art. 712º do CPC.

A não se concluir nos termos propugnados supra nesta alínea g. do Ponto 1, cumpre evidenciar e arguir expressamente que a interpretação da alínea a) do n.º 1, do n.º 2 e do n.º 4 do artigo 712.º, do artigo 646.º, n.º 4, e do artigo 3.º, n.º 3, do Código de Processo Civil (na redação do Decreto-Lei n.º 329.º-A/95, de 12 de Dezembro, do Decreto-Lei n.º 180/96, de 25 de Setembro, e do 303/2007, de 24 de agosto) e, bem assim, do artigo 351.º do Código Civil no sentido de que a Relação pode aditar, oficiosamente ou a requerimento das partes, matéria de facto nova sem caráter notório e que não foi sujeita a alegação, contraditório ou prova em 1.ª instância pelas partes, ainda que a decisão de facto considere deficiente, obscura ou contraditória, e, consequentemente, insira novos factos sem prévia audição das partes, é inconstitucional, por violação do direito a um processo equitativo consagrado no n.º 4 do artigo 20.º da CRP e do artigo 6.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

2.     O acórdão recorrido padece também do vício de falta de análise crítica ou explicitação dos elementos probatórios reapreciados na decisão dos pontos 1) 75), 63) e nos pontos 72), 73) e 74) dos factos provados, por violação do disposto no artigo 712.º, n.º 2, do CPC. Em consequência deve determinar-se a baixa do processo à Relação para que se proceda à devida reapreciação da prova – vide acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03.02.2012 (consultável em www.dgsi.pt, Processo 1675/06.2TBPRD.P1.S1; Relator: GARCIA CALEJO.

3.     O acórdão recorrido padece ainda de falta de análise crítica ou explicitação dos elementos probatórios reapreciados na decisão dos pontos 72), 73) e 74) dos factos provados, por violação do disposto no artigo 712.º, n.º 2, do CPC. Em consequência deve determinar-se a baixa do processo à Relação para que se proceda à devida reapreciação da prova.

4.        Ainda que assim não se entenda (o que não se concede), a Relação deveria ter anulado parcialmente o julgamento, com vista à produção de prova sobre os factos essenciais à imputação de responsabilidade aos RR, ampliando a matéria de facto, tudo nos termos do artigo 712.º, 3 e 4, do CPC.

5.     Caso se entenda pela improcedência do supra exposto neste ponto 3, cumpre, desde já arguir, que a interpretação da alínea a) do n.º 1, do n.º 2 e do n.º 4 do artigo 712.º, do artigo 646.º, n.º 4, e do artigo 3.º, n.º 3, do Código de Processo Civil (na redação do Decreto-Lei n.º 329.º-A/95, de 12 de Dezembro, do Decreto-Lei n.º 180/96, de 25 de Setembro, e do 303/2007, de 24 de agosto) e, bem assim, do artigo 351.º do Código Civil no sentido de que a Relação pode manter, aditar, alterar ou eliminar matéria de facto da decisão de 1.ª instância sem concretizar quais os elementos probatórios em que se baseou e sem proceder à análise crítica desses elementos, é inconstitucional, por violação do direito a um processo equitativo consagrado no n.º 4 do artigo 20.º da CRP e do artigo 6.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, o que se alega para todos os efeitos legais.

6.      O ponto 1) dos factos provados deve ser eliminado da matéria provada porquanto estiveram subjacentes à sua manutenção a errada aplicação e interpretação:

a.      do disposto nos artigos 650º n.º 2, f), 712.º n.º 4 e 729.º n.º 3 do CPC na redação anterior à Lei 41/2013, de 26 de junho) – referentes à suscetibilidade de alteração de matéria inserida no despacho saneador por assente;

b.     Do disposto nos artigos 706º e 712.º, n.ºs 1, alíneas b) e c), e n.º 3, do CPC (na redação anterior à Lei 41/2013), por não se admitir a junção aos autos do documentos juntos pelo R. com as suas alegações de apelação.

c.      do disposto no artº 5º da Lei de Imprensa - Lei nº 2/99 de 13 de janeiro, arts. 1º, 2º e 17º do Decreto-Regulamentar 8/99 de 9 de junho, 38º nº 3 da CRP, 342º nº 1, 364º, ambos do C. Civil, 490º nº 2, 653º nº 2, 646º, nº 4, 659º nº 2 e 3 todos do CPC – referentes às regras do ónus da prova e aos pressupostos de presunções legais retiradas da Lei da Imprensa quanto ao teor do ponto 1) dos factos provados;

d.      do disposto nos artigos 706º e 712.º, n.ºs 1, alíneas b) e c), e n.º 3, do CPC (na redação anterior à Lei 41/2013) – que determinariam a admissão aos autos dos documentos juntos pelo R. no recurso de apelação (entre os quais se encontra a certidão do registo obrigatório da ERC onde consta um co-Réu como diretor da revista DD para o período e facto erradamente imputados ao R. CC);

e.     do disposto nos arts. 151º, 490º, 653º nº 2, 264º nº 2 e 660º nº 2, todos do CPC – por a matéria inserida no ponto 1) não ter sido articulada pelas partes e, consequentemente, não ter de ser objeto de posição especificada sobre a mesma na contestação, nem objeto de ponderação do tribunal a nível de matéria factual;

7.      O ponto 75) dos factos provados na sentença deve ser reinserido na matéria provada na sua redação original porquanto estiveram subjacentes à sua alteração a errada aplicação e interpretação dos artigos 342.º, n.º 1, e 364º do CC, 706º e 712.º, n.ºs 1, alíneas b) e c), e n.º 3, do CPC (na redação anterior à Lei 41/2013), 5º da Lei de Imprensa - Lei nº 2/99 de 13 de janeiro, arts. 1º, 2º e 17º do Decreto-Regulamentar 8/99 de 9 de junho, 38º nº 3 da CRP, 490º nº 2, 653º nº 2, 646º, nº 4 e 659º nº 2 e 3 todos do CPC. Inerente a esta reinserção dever-se-á ter por não escrito o teor do facto 63) ou excluído o Réu do seu âmbito de aplicação por decorrência lógica.

8.     Os pontos 72), 73) e 74) dos factos provados devem ser excluídos dos factos provados por a sua inserção (em 1.ª instância) e manutenção (no acórdão) nos factos provados violar o disposto no artigo 57.º do CIRS e do artigo 75.º LGT. Em consequência, o acórdão recorrido deverá ser revogado, eliminando-se estes pontos da matéria de facto.

9.      O acórdão recorrido devia ter julgado procedente o vício de falta de fundamentação sobre a decisão da matéria de facto da sentença de 1.ª instância arguido pelos RR. Recorrentes FF e BB por a referida sentença carecer efetivamente de fundamentação nesse segmento. Tendo julgado tal nulidade improcedente, o acórdão padece de erro de julgamento por errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 653.º, n.º 2, do CPC (redação anterior à Reforma de 2013). Assim, deverá o STJ revogar esta decisão, substituindo-a por decisão de procedência da nulidade arguida e ordenando a baixa do processo à 1.ª instância para suprimento da mesma.

10.     Como resulta do exposto, a presente ação, nos termos em que se encontra formal e literalmente configurada - isto é, como uma ação coletivamente proposta contra todos os Réus e assim decidida - carece de fundamento. Na verdade, não se provou, porque de facto não existiu, nenhuma ação concertada dos Réus tendo como visado o Apelado, muito menos uma ação dolosa com vista a denegrir a sua imagem.

11.     Da matéria de facto que o tribunal recorrido considerou provada não resulta a imputação de qualquer facto ilícito ao Réu CC. Com efeito, o Réu CC não foi o autor dos textos controvertidos, sendo que nunca foi alegado ou objeto de prova que este Réu tivesse participado na elaboração e/ou publicação dos escritos em causa nos autos, designadamente através de alguma ordem ou autorização nesse sentido.

12.     Assim, a presença na ação do Réu CC só pode explicar-se pelo facto de ele ter sido diretor executivo da revista DD (de Julho a Setembro de 2004) e de o Tribunal ter incorretamente considerado que ele teve, nesse período, o cargo de diretor stricto sensu da revista, ou seja, de diretor editorial. Efetivamente, conforme se alcança do vertido no acórdão recorrido, págs. 146 a 148 e 156, a responsabilidade do Recorrente assentaria nessa qualidade de diretor. Sucede que este pressuposto de facto não se verifica, salientando-se ainda que essa qualidade não foi objeto de prova pelo A. e foi erroneamente avaliada pelo Tribunal da Relação.

13.    Mas ainda que se considere apenas a matéria de facto constante do ponto 1), da mesma não resulta, nem pode inferir-se ou concluir-se que o ora Recorrente fosse o diretor editorial da revista DD, ou seja, o diretor a que se reporta o artigo 20º da Lei de Imprensa - e/ou tivesse exercido funções editoriais, o que, aliás, nem sequer foi alegado pelo Autor, a quem competia o ónus de alegação e de prova dessa factualidade.

14.     A que acresce o facto de não existirem quaisquer outros elementos no processo donde se retire tal asserção, salientando-se aliás que do doc. junto aos autos a fls. 1148 (correspondente ao doc. nº 1 junto pelo A. em 28.11.2011) resulta expressa e inequivocamente que o Réu CC era apenas Diretor Executivo da Revista DD, consistindo, pois, uma prova documental inequívoca dos factos constantes do art. 24º da base instrutória e que correspondiam ao ponto 75 da fundamentação de facto da sentença. Note-se ainda que resulta clara e expressamente deste documento que contém a ficha técnica da revista DD (21.07.2004) que o Diretor (Editorial) de Revista DD era o R. EE, sendo o R. CC seu Diretor Executivo.

15.      Assim sendo, não poderia ser imputada ao Recorrente qualquer responsabilidade nos presentes autos a título de diretor editorial com as competências previstas no artigo 20º da Lei de Imprensa. E também não lhe é imputável qualquer responsabilidade a título de diretor executivo, uma vez que tal figura não se encontra prevista nesta Lei e, portanto, também não está previsto e/ou regulamentado qualquer tipo de responsabilidade pelo exercício de tal cargo.

16.      Em suma, falta o primeiro e fundamental pressuposto de facto de uma alegada responsabilidade do Recorrente: dos factos considerados provados não decorre, nem que ele tenha sido o autor dos invocados atos danosos, nem que fosse o diretor editorial da Revista ao tempo em que os correspondentes textos ou imagens foram publicados.

17.     Nessa medida, o acórdão recorrido incorre numa errada aplicação do disposto nos artigos 483º e 484º do Código Civil, bem como dos artigos 20º e 29º, nº 2, da Lei de Imprensa, seja qual for a interpretação a dar a estes últimos preceitos.

18.     Mesmo que Recorrente tivesse sido o diretor (editorial) da revista, não haveria fundamento para o responsabilizar pelos atos controvertidos. Com efeito, não existe base legal para considerar o diretor de um periódico da imprensa escrita, qua tale, ou seja pela simples qualidade de diretor, responsável pelos ilícitos cometidos através de tal periódico. O acórdão recorrido violou, assim, a lei e a Constituição, interpretando e aplicando erradamente o disposto no artigo 20º e 29º, n.º 2 da Lei de Imprensa, bem como o disposto nos artigos 37º e 38º, 203º; 204º; 3.º, n.º 2 e 2.º, todos da Constituição da República Portuguesa.

19.      Ainda que se admita em geral a responsabilidade dos diretores de publicações periódicas, tal responsabilidade só existirá em concreto se se verificarem os respetivos pressupostos. Não havendo base legal para dispensar ou presumir a verificação de algum deles, incluindo a culpa.

20.      Na verdade, em termos gerais, respondem civilmente por atos ilícitos os seus autores (arts. 483ºss do CC) e, havendo entre eles e dada organização uma relação de «comissão» ou equiparada, esta é corresponsável solidária com eles (art. 500º do CC, cfr. também o art. 6º, nº 5, do CSC e o art. 165º do CC).

21.     No caso dos atos ilícitos praticados através da imprensa - máxime, por exercício ilegítimo ou abusivo da liberdade de expressão e informação - respondem pelos mesmos: (i) o autor ou autores, isto é, o criador do texto/imagem ou quem promoveu a sua publicação); (ii) a entidade detentora da publicação/periódico, desde que o diretor desta haja tido conhecimento e não se tenha oposto à publicação do texto/imagem (art. 29º, nº e, da Lei de Imprensa, que, assim, por um lado limita a aplicação do art. 500º do CC, mas, por outro lado, estende a responsabilidade pelo risco aí prevista a casos em que não existe uma relação de comissão); (iii) não havendo autor identificado, responde ainda a entidade detentora da publicação, caindo-se na regra geral do art. 500º do CC, aplicável mesmo quando não se consegue encontrar um concreto agente responsável.

22.       Não existe fundamento legal para, na falta de um autor identificado, atribuir a autoria do texto/imagem ou a promoção da sua publicação ao diretor, que tem uma função de direção e não de concreta disposição e inserção do material publicável. De facto, essa situação tanto pode ocorrer como não.

23.      E também não existe fundamento legal para uma presunção jurídica de que a publicação do texto/imagem foi promovida ou consentida pelo diretor. Quando muito, como o STJ já salientou, poderá haver um princípio de prova nesse sentido.

24.       A admitir-se a facilitação da posição dos potenciais lesados, a solução passaria por uma presunção de conhecimento do diretor, que, não sendo elidida, levará, não à sua responsabilidade, mas à responsabilidade da entidade titular da publicação, nos termos do art. 500º do CC, afastando-se a restrição constante do art. 29º, nº 2, da LI.

25.       A responsabilidade da entidade titular da publicação periódica pelos atos de autor desconhecido (autoria do texto ou promoção da publicação) ou não identificado (via de regra, está nas suas mãos tal identificação e, eventualmente, restringir a sua responsabilidade nos termos do art. 29º, nº 2, da LI), bem como de autor conhecido desde que o diretor tenha tido conhecimento do texto/imagem e não se tenha oposto à sua publicação (com ou sem presunção desse conhecimento nos termos do número anterior), coloca o problema de saber se - enquanto responsável pela determinação do conteúdo da publicação (art. 20º, nº 1, al. a), da LI) - o diretor tem para com ela o dever funcional de controlar tudo o que se publica e de impedir a publicação daquilo que possa constituir um ato ilícito envolvendo essa responsabilidade. Dever esse conjugado com uma eventual presunção de culpa, por se tratar de uma relação funcional-contratual, e cujo incumprimento acarretaria um direito de regresso da entidade empregadora contra ele, nos termos do art. 500º, nº 3, do CC.

26.       De facto, um dever com essa configuração e extensão é suscetível de levar, na prática, a uma restrição excessiva da liberdade de expressão e informação e da liberdade de imprensa (arts. 37º e 38º da CRP).

27.      Haja ou não tal dever - situado no âmbito das relação interno-organizativa que se estabelece entre o diretor da publicação e a entidade titular -, não existe nenhuma base legal para entender que o mesmo dever funcional de controlo compreende (ainda) uma vertente externa, isto é, o dever de impedir a publicação de textos/imagens portadores de atos ilícitos no interesse de terceiros, potencialmente visados ou ofendidos com o que se publica. Noutros termos, carece de fundamento uma interpretação da Lei de Imprensa, em especial do art. 20º, nº 1, al. a), no sentido de a competência do diretor envolve uma norma de proteção desses terceiros.

28.       Na verdade, a dissociação da função empresarial e da função editorial, imposta por essa Lei, que representa uma limitação da liberdade de empresa (art. 61º da CRP), visa assegurar a liberdade de expressão e informação, exercitável através da imprensa, e não a sua restrição para proteção desses terceiros. O diretor não está incumbido legalmente do controlo da licitude do que se publica; nem tem, nem a lei lhe exige qualificações para isso. Na prática, dados os contornos dos ilícitos em causa e o tempo normal de decisão, um tal dever traduzir-se-ia num mecanismo discricionário de censura.

29.      Há apenas uma exceção, que confirma essa regra. O diretor tem o dever de impedir a publicação de textos/imagens que envolvam ilícitos criminais.

30.       Mas, mesmo nesse caso, tal dever só existe dentro dos limites apertados do art. 31º da Lei de Imprensa - o que significa, em geral, a sua exclusão quando o texto/imagem tem um autor identificado.

31.       E, para haver responsabilidade penal (e civil com ela «conexa»), torna-se necessário ainda, em virtude dos princípios gerais do direito criminal e em nome da liberdade de expressão e informação, a existência clara de um crime e a correspondente consciência da ilicitude.

32.    A presente ação é uma ação indemnizatória, fundada em responsabilidade civil extracontratual. A sua procedência requer, portanto, a verificação e demonstração concreta dos respetivos pressupostos.

33.     Em primeiro lugar, torna-se necessária a prática de um ato ilícito. No caso vertente, em relação ao Recorrente, só podem estar em causa atos dessa índole veiculados por textos/imagens relativos ao período assinalado (de Julho a Setembro de 2004).

34.     A apreciação dos textos tem de fazer-se dentro do âmbito da chamada “liberdade de imprensa”, enquanto valor constitucionalmente protegido, e dos seus limites face a valores igualmente merecedores de tutela do direito.

35.    Ora, analisando objetiva e contextualizadamente o conteúdo das publicações, não resulta qualquer ofensa ao bom nome nem à reputação do Recorrido, não existindo nenhum facto ilícito violador dos seus direitos de personalidade, não é por alguém se sentir ofendido com o teor de determinadas notícias ou publicações que as mesmas atentam contra o bom nome e a reputação do suposto visado.

36.     Desses textos, os únicos verdadeiramente contundentes - que poderão estar na fronteira do ilícito - são artigos com autor identificado (aliás com importantes funções na entidade titular da publicação).

37.     Civilmente responsável é, em geral, o autor do ato e a entidade titular da publicação, nos termos conjugados do art. 500º do CC e do art. 29º, nº 2, da Lei de Imprensa (cfr. «supra»).

38.     Como se observou, o diretor da publicação, pelo simples facto de ser diretor, não se considera autor ou co-autor.

39.      Nem sobre ele impende o dever de impedir a publicação de textos/imagens portadores de ilícitos civis, no interesse e para proteção de terceiros, cuja violação (por omissão do comportamento devido) possa constituir um ilícito autónomo, gerador de responsabilidade civil a seu cargo. Tal dever só existe - e apenas em casos limitados - havendo a prática de um crime.

40.      Mesmo tratando-se de textos/imagens sem autor identificado, faltando a correspondente responsabilidade individual, quem responde perante os lesados é, portanto, a entidade titular da publicação, com eventual direito de regresso; não o diretor.

41.      Além da existência de um ato ilícito, a responsabilidade pressupõe a culpa do agente (autor do texto/imagem que o veicula ou promotor da sua publicação). Estando em causa a responsabilidade extracontratual, não há presunção de culpa.

42.     Não tendo o diretor nenhum dever legal de impedir a prática de simples ilícitos civis através da imprensa - pelo menos no plano externo, das relações com terceiros, já que nem a LI o consagra nem ele seria compatível com a CRP (arts. 37º, 38º e 28º, nº 2) - também não se coloca, quanto a ele, um problema de presunção de culpa: falta o próprio ilícito.

43.     Porém, ainda que se admitisse tal dever, nesse plano externo seria sempre um simples dever geral de proteção, relativamente ao qual falta base legal para qualquer presunção de culpa (violação culposa do dever), na publicação de textos/imagens portadoras de ilícitos.

44.      Por conseguinte, não se tendo provado que o Recorrente tenha autorizado a publicação dos concretos textos/imagens controvertidos, faltam, quanto a ele, ambos os pressupostos da responsabilidade - a ilicitude e a culpa.

45.       Mesmo que tivesse autorizado a publicação, não havendo elementos para afirmar a existência de uma situação de coautoria ou de comparticipação, apenas o autor do texto/imagem e/ou a entidade titular da publicação seriam responsáveis. Não o Recorrente.

46.     Ainda que se verificassem, quanto ao Recorrente, os pressupostos anteriores, seria necessário identificar e demonstrar a produção de danos, bem como a existência de um nexo causal entre o suposto ato ilícito e culposo do mesmo - violação do dever de impedir a publicação dos textos/imagens controvertidos, no período em que foi diretor executivo da DD - e os danos, no montante considerado.

47.      O Acórdão recorrido não demonstra a verificação de tais pressupostos, desde logo porque nem sequer individualiza a conduta do Recorrente e, portanto, também não lhe liga qualquer dano.

48.       Independentemente disso e mais em concreto, os alegados danos morais são de consistência no mínimo duvidosa, uma vez que o Recorrente era uma figura pública com uma imagem não fundamentalmente diferente da que transparece dos textos controvertidos. E nunca justificariam a atribuição de 80 000 euros de indemnização.

49.    A atribuição de uma indemnização em tal montante é suficientemente desproporcional para violar o direito de liberdade de expressão ínsito no artigo 10.º da CEDH – vide acórdão SSS-SOCIEDADE JORNALÍSTICA, LDA c. PORTUGAL de 30.08.2016, em que o TEDH condenou o Estado Português na restituição de 30.000 € por violação do direito à liberdade de expressão (processo referente ao artigo da Visão «O despertar do Presidente?», na sequência de processo cível intentado pelo aqui A. contra a SSS em que esta foi condenada no pagamento de 30.000€ àquele por danos não patrimoniais).

50.    Os danos patrimoniais, consistentes em alegados lucros cessantes por quebra da procura dos serviços de opinião e comentário e de advocacia, além de estarem mal calculados (cfr. «supra»), não podem ter-se por demonstrados, pelo menos no valor que resulta do Acórdão, inclusive depois de corrigido o erro. Com efeito, não existem no processo elementos de facto relativos ao volume de faturação dos serviços prestados no passado nem elementos capazes de permitir, a partir deles, fazer uma projeção para o período subsequente à cessação das funções de Primeiro Ministro, nem elementos relativos à faturação efetivamente conseguida, pelo que se torna impossível apurar um valor diferencial de perda de negócios.

51.       E o valor relevante também nunca poderia ser o valor da faturação (rendimento bruto), considerado no Acórdão, mas um valor líquido, diminuído de despesas/encargos e impostos.

52.    Ainda que se considerassem provados os danos - já corrigidos e líquidos -, nem há elementos para afirmar a existência de uma relação de causa-efeito entre a alegada, mas não provada, atuação concertada dos Réus e tais danos, nem muito menos entre o comportamento do Apelante e esses danos.

53.       Na verdade, os textos controvertidos, a terem de algum modo contribuído para a produção dos danos, terão dado um contributo muito relativo e, pelo menos em relação aos danos patrimoniais, apenas indireto. Por si sós, nunca seriam bastantes para produzir esse efeito.

54.       Primeiro, porque o seu conteúdo não se mostra adequado para incutir nos leitores da revista uma imagem do visado substancialmente diferente da real. A linguagem apresenta-se por vezes de gosto no mínimo discutível, mas isso reflete-se mais na imagem da própria revista que na do Recorrido.

55.        Em segundo lugar, porque a verdadeira causa plausível dos supostos danos terá a demissão forçada do Recorrido, decretada pelo Presidente da República, com base num juízo muito crítico acerca da sua capacidade para o desempenho do cargo de Primeiro Ministro.

56.        É possível que a comunicação social também tenha dado algum contributo, para esta destituição e para a perda de credibilidade política do visado, mas a revista DD tinha, no panorama dessa comunicação social, pouco significado. Mormente em termos políticos. Assim, ainda que houvesse lugar a qualquer condenação, nunca poderia a mesma seguir os critérios propugnados no acórdão recorrido por os mesmos serem desproporcionais e inadequados à casuística.

57.      Em terceiro lugar, quanto aos serviços de advocacia, porque a imagem política conta pouco para a necessária credibilidade profissional necessária para manter e conquistar a correspondente clientela.

58.       Como quer que seja, ainda que - contra o que entendemos correto - se admita esse contributo da revista, a par da existência do dever de impedir a publicação dos textos a cargo do Recorrente e a sua violação culposa, sempre faltaria o apuramento da sua efetiva e respetiva responsabilidade.

59.       Considera-se, assim, inexistir causalidade adequada entre o comportamento do Apelante e a produção dos danos, mesmo com montantes corrigidos.

60.      Ainda quanto aos ilícitos invocados, importa salientar que, a existirem, o que não se concede, eles consistiriam num excesso: num exercício da liberdade de expressão e informação para além dos limites permitidos, ofendendo, o bom nome, a imagem e a credibilidade política do visado.

61.     O ponto de equilíbrio entre a liberdade de expressão e informação e os direitos pessoais que através do seu exercício podem ser atingidos é controvertido. Mas não pode ignorar-se que ela cumpre, além de finalidades de realização pessoal, uma relevantíssima função social e política, de interesse geral, em contraste com a mera dimensão individual dos valores da imagem, credibilidade e bom nome de certa pessoa.

62.      Essa dimensão social e política encontra-se bem patente no caso «sub judice», na medida em que, estando em causa o então Primeiro Ministro, o essencial da informação e do juízo crítico, ainda que por vezes contundente e em tom de gosto duvidoso, constante dos textos controvertidos era de interesse geral. O que constitui um fator adicional de justificação dos mesmos.

63.     Ajuizar a situação de outro modo, dando prevalência aos invocados direitos do Recorrente, representaria uma restrição excessiva da liberdade de expressão e informação e, em especial, da liberdade de imprensa em que no caso se manifesta, contrária ao princípio da harmonização dos direitos e liberdades em confronto e ao princípio da proporcionalidade, violando os arts. 37º, 38º e 18º, nº 2, da Constituição.

64.    Igual excesso se verificaria na aludida hipótese de uma interpretação da Lei de Imprensa no sentido da existência de um dever geral de proteção de terceiros a cargo do diretor da revista em apreço - e, por maioria de razão, de um mero diretor executivo, como o Recorrente - mormente quando conjugado com uma presunção de culpa.

65.     Porém, no caso do Recorrente, ainda que se admitisse tal dever e tal presunção, havendo-se provado que ele era mero diretor executivo, a presunção sempre deveria considerar-se elidida. Ainda que assim não se entenda (que o Recorrente era mero diretor executivo), note-se que da matéria de facto não resulta que o Recorrente tenha tido conhecimento dos textos controvertidos e omitido culposamente um suposto dever de se opor à sua publicação, inferindo-se aliás, da mesma, que o Recorrente desconhecia os conteúdos publicados, pelo que a aludida presunção legal foi refutada no caso presente.

66.    A entender-se que a matéria de facto provada não é suficiente para considerar ilidida a presunção legal, o que não se concede e alvitra por mero dever de patrocínio, isso dever-se-á a uma falha do acórdão recorrido que deve ser colmatada.

67.      Com efeito, constate-se que o Recorrente alegou e provou os factos necessários para ilidir a referida presunção, reitera-se, a este propósito, o alegado sob os artigos 03., 03.1, 03.2, 03.3, 03.4 e 03.5 da Contestação, sendo que de tudo o alegado pelo Recorrente foi levado à base instrutória a matéria constante do art. 24º que foi considerada provada pela sentença proferida pelo tribunal a quo e correspondia ipsis verbis ao ponto 75) da matéria de facto da sentença (pág. 34), ponto este que o Tribunal da Relação veio a alterar a resposta considerando que apenas estava provado o que constava do ponto 1) da matéria de facto.

68.     Note-se ainda que face ao enquadramento jurídico desta questão à luz do defendido e explanado no acórdão recorrido impunha-se in casu que o Tribunal da Relação tivesse ordenado a aludida ampliação da matéria de facto, tendo, aliás, o ora Recorrente requerido ao Tribunal da Relação que fizesse tal ampliação, conforme se constata das Alegações de Apelação que apresentou nos autos.

69.      Essa ampliação é, de resto, um poder-dever da Relação que, tendo sido omitido, justifica e fundamenta a revogação do acórdão pelo Supremo Tribunal de Justiça, permitindo assim o cumprimento do disposto no artigo 712º, do Código de Processo Civil antigo, nomeadamente no n.º 4, e do art. 662º do atual CPC, com a posterior baixa do processo à instância competente para instrução e julgamento dessa factualidade, o que novamente e nesta sede se requer no caso de se considerar que tais elementos são necessários e indispensáveis à boa decisão da causa.

70.     Deste modo, caso se entenda que a matéria de facto não é suficiente para considerar ilidida a presunção legal do respetivo conhecimento do diretor pelos conteúdos publicados, o que alvitra por mero dever de patrocínio, deverá o Supremo Tribunal de Justiça mandar ampliar a base instrutória / temas da prova de forma a incluir a matéria que diz respeito ao Recorrente e que foi articulada nos arts. 03., 03.2, 03.3, 03.4 da contestação que apresentou nos autos e que infra se indica (devendo ser ordenada a baixa do processo à instância competente para instrução e julgamento dessa factualidade):

- Nunca exerceu o cargo de diretor editorial de qualquer das revistas;

- Nunca dirigiu editorialmente o conteúdo dos trabalhos dos jornalistas,

- Nem conheceu ou autorizou a publicação dos artigos, reportagens ou fotos antes da sua publicação;

- Não incumbiu quem quer que seja da elaboração dos artigos e reportagens em causa e para serem tiradas fotos e que

- Nunca foi inscrito na Entidade Reguladora da Comunicação Social como diretor da revista DD ou outra das revistas indicadas na pi,

71.    Em suma, faltam quanto ao Recorrente todos os pressupostos da responsabilidade civil. Ainda que assim não se entenda, no mínimo faltam alguns deles, sendo certo que bastaria a falta de um para excluir tal responsabilidade, pelo que se impõe a revogação do acórdão recorrido, declarando-se a absolvição total do Réu CC dos pedidos peticionados no processo sub judice.

72.       Atento tudo o supra vertido, o acórdão recorrido ao ter decidido pela responsabilização do Recorrente, violou, aplicou e interpretou erradamente o disposto nos artigos 490º, 497º, n.º 1 e 512º, n.º 1, e 563º, todos do Código Civil, bem como o disposto no artigo 483º, 484º do Código Civil e 29º da Lei de Imprensa, por inexistência do nexo de causalidade adequada, pressuposto fundamental à verificação da responsabilidade civil por factos ilícitos.

73.     Saliente-se ainda que vistos os artigos e os alegados danos, cremos ser notório que o direito que sai verdadeiramente lesado deste confronto será o direito à liberdade de expressão e de imprensa, pelo que o Acórdão recorrido violou, assim, o disposto nos artigos 19º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, 10º da Convenção Universal dos Direitos do Homem, 37º, n.ºs 1 e 2, 38, n.ºs 1 e 2, e 18º, nº 2, da Constituição e o artigo 335º do Código Civil e, mais uma vez, o disposto nos artigos 483º e 484º do Código Civil e 29º da Lei de Imprensa.

Sem conceder,

74.    Afigura-se, que a condenação dos Réus em 75% dos danos totais é manifestamente irrazoável e excessiva face às contribuições causais de terceiros e do próprio A. para os alegados danos, conforme resulta da matéria de facto provada, entre as quais a decisão e fundamentos do ex-Presidente da República quanto à dissolução da Assembleia da República e o inerente desprestígio para o A. e as condutas do próprio A., tal como foram reconhecidas nos pontos 79) a 87) dos factos provados, algumas das quais ocorreram em data próxima dos factos, aos demais jornais e artigos publicados. Dir-se-á que a fixação da responsabilidade total dos Réus pelos danos – a existir (o que não se concede) – nunca poderia ser superior a 10% dos danos totais.

75.    Por outro lado, refira-se que critério de repartição de responsabilidade, pelo pagamento dos danos, entre revistas/publicações, deveria ter tido como referência o conteúdo e gravidade das imputações constantes de cada artigo / publicação, não sendo adequado ou equitativo, nem legalmente admissível, atribuir a obrigação de pagamento à DD de 60% do montante global de indemnização tendo apenas por base a credibilidade da publicação em causa e o número de artigos publicados. Refira-se que os artigos da DD eram os menos suscetíveis de causar prejuízos ao A., o que se conclui pela mera confrontação do conteúdo dos artigos em causa, pelo que a percentagem de responsabilidade que foi fixada pelo tribunal não deveria ter excedido 10% do montante global de indemnização que foi determinado.

76.    Por último, entende o Recorrente que a proporção da sua (suposta) responsabilidade (que não se concede) não deveria nunca ter excedido 10% do valor total imputado à DD, no período reportado às suas funções, ao invés dos 40% determinados no acórdão recorrido.

77.     Considerando o supra exposto, é inequívoco concluir-se que o acórdão recorrido ao ter decidido nos termos aludidos, no que concerne aos montantes indemnizatórios e percentagens de repartição de responsabilidade, violou, aplicou e interpretou erradamente o disposto nos artigos 490º, 494º, 496º, 497º, n.º 1, 562º, 564º, 566º, 570º todos do Código Civil, bem como o disposto no artigo 483º, 484º do Código Civil e 29º da Lei de Imprensa.

78.    Refira-se ainda em última análise, sem conceder, que atento o critério da equidade e a jurisprudência que tem vindo a ser firmada, reputa-se que o valor de 80 mil euros, a título de danos não patrimoniais, que foi fixado no acórdão Recorrido é inequivocamente excessivo, tendo, em consequência, incorrido na violação do disposto nos arts.496º e 494º, ambos do Código Civil, impondo-se a sua redução para valor não superior a 10 mil euros.

79.     Também em última análise e no que concerne aos danos patrimoniais, considerando que o Recorrido estava legalmente impedido de exercer advocacia (profissão na qual se incluem os serviços jurídicos e consultadoria) no período de Março a Setembro de 2005 (sete meses), cfr. resulta do disposto no artigo 77.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, e do artigo 280.º, n.º 1, do CC, impõe-se a subtração ao quantum indemnizatório fixado (referente aos ‘lucros cessantes’ por proveitos não auferidos, por serviços jurídicos e consultadoria) da quantia de 29.166,67 € (constituindo a ratio indemnizatória a de atribuição de 50.000 €/ano por estes ‘lucros cessantes’, não auferidos no exercício da advocacia, importa que por cada mês de impossibilidade de exercício de advocacia se reduza a indemnização em 4.166,66 €).

80.    De tudo o exposto, resulta que o acórdão recorrido violou, interpretou e aplicou erradamente o disposto nos artigos 3º nº 3, 151º, 264º, 264º nº 2, 490º, 490º nº2, 511º, 514º nº 1, 524º, 646º n.º 4, 650º nº 2 f), 653º, 653º nº 2, 659º nº 2 e 3, 660º nº 2, 664º, 667º nº 2, 684º nºs 3 e 4, 685º-A nº 1, 668º nº 1, b), c) e d), 672º, 693º-B, 700º nº 1 e), 706º nº 1, 712º, 712º nº 1 a), b) e c), 712º nº 2, 712º nº 3, 712º nº 4, 712º nº 5, 722º nº 1 c), 729º nº 3, todos do Código do Processo Civil (CPC antigo), 425º, 608º, 635º nºs 3 e 4, 639º nº 1, 651º, 652º nº 1 e), 662º, 674º, todos do Código do Processo Civil (CPC actual), bem como os artigos arts. 1º nºs 1 e 2, 2º, 2º a), 8º, 13º, 17º, 17º nº 1, 17º nº 1 b), 18º nº 1 c), 37º nº 1 a) do Decreto-Regulamentar 8/99 de 9 de Junho, os artigos, 249º, 280º nº 1, 341º, 342º, n.º1, 335º, 350º, n.ºs 1 e 2, 351º, 364º, 483º, 484º, 487º, 490º, 493º, 1.ª parte, 494º, 496º, 497º, n.º1, 500º, 512º, n.º1, 562º, 563º, 564º, 566º, 570º todos do Código Civil (CC), art. 77º do Estatuto da Ordem dos Advogados, os artigos 2º, 3º, n.º 2, 18º, n.sº2 e 3, 20º, 37º, 38º, 38º nº 3, 61º nº 1, 203º e 204º; todos da Constituição da República Portuguesa (CRP ou Constituição), o artigo 19º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 10/12/48, os artigos 6º nº 1, 10º, n.º 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, de 4/11/50, os artigos 1º, n.º 1 e 2 e 2º, n.º 1, al. a), 5º, 5º nº 2, 5º nº 3, 19º nº 1, 20º, 22º, al. a), 29º, n.º 2, todos da Lei de Imprensa - Lei nº 2/99 de 13 de Janeiro e ainda o artigo 6º, al. a) do Estatuto do Jornalista - Lei n.º 1/99 de 13 de Janeiro, art. 57º CIRS e 75º da LGT, impondo-se, assim, a revogação da decisão proferida.


NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO APLICÁVEL,

Deverá ser dado total provimento ao presente recurso, revogando-se, em consequência, o acórdão recorrido, só assim se fazendo o que é de Lei e de

JUSTIÇA!


   Por sua vez, interpôs o A. recurso subordinado, cujas conclusões são as seguintes:

1.    O Autor procedeu à interposição 2 (dois) de recurso de agravo: um do despacho que o condenava no pagamento de 3 UC pela junção de 4 documentos e outro do despacho que o condenava em 4 UC por incidente anómalo (fls. … e …).

2.      Foi proferido despacho nos termos do qual foram ambos admitidos, tendo sido, em consequência, oferecidas as Alegações e Conclusões respetivas e liquidada as taxas de justiça correspondentes - cfr. Docs. 1 a 4 ora juntos, por facilidade.

3.     Sucede que o Tribunal recorrido não apreciou um deles, a saber o recurso da decisão que condenação do Autor em multa correspondente a 3 UC por junção de 4 (quatro) documentos, ao qual foram apontados os vícios de falta de fundamentação, violação de norma jurídica e erro na determinação da norma aplicável [arts. 668.º/1, al. b) e 690.º/1, al. c) e 2, al. a), todos do CPC na versão vigente à data dos factos], nos termos melhor descritos no articulado respetivo.

4.     Termos em que enferma o Acórdão recorrido da nulidade prevista no art. 615º/1. al. d) Cód. de Processo Civil, o que se impõe sanar, devendo ser proferida decisão que atenda aos fundamentos do recurso e revogada a decisão que condenou o ali Autor no pagamento da multa por junção de 4 (quatro) documentos.

II.  DA ADMISSÃO DO RECURSO DE APELAÇÃO - VIOLAÇÃO DAS LEIS SUBSTANTIVA E DE PROCESSO E NULIDADE

5.       Considerou o Acórdão improcedente a reclamação do ora Recorrente quanto ao deferimento do requerimento de interposição de recurso oferecido pelo mandatário do Réu CC, confirmando a decisão de admissão do recurso de apelação proferida pelo Tribunal a quo.

6.     Com tal decisão foram violadas as leis de processo e substantivas aplicáveis, para além omitida a referência às normas concretas que sustentaria tal posição.

7.        Ficou, pois, o Acórdão, na parte ora recorrida, inquinado dos vícios previstos nos art. 674.º/1, als. a) e b)e 615.º/1, al. b), aplicável ex vi art. 674.º/1, al. c) e 666.º.

Com efeito,

8.       Até à fase de recurso, o patrocínio dos RR. foi assumido conjuntamente pelos Ilustres Mandatários Dr. OOO e Dr. NNN, sendo que, no dia … de setembro de 20…, em sede de audiência de discussão e julgamento - mercê da estratégia processual que entenderam conveniente (nomeadamente a duplicidade do direito ao contraditório) - foi o Dr. NNN substabelecido, sem reserva, pelo seu co-mandatário nos poderes de representação dos RR. HH e CC - cfr. Docs. 5 a 7 ora junto e constantes a fls. (...).

9.     Permaneceu, portanto, o Senhor Dr. OOO mandatário dos demais RR., a saber: BB-SERVIÇOS EDITORAIS E GRÁFICOS S.A.; EE, FF, II e KK.

10.     Ao contrário do Dr. NNN - que, por se encontrar inscrito no sistema informático CITIUS, procedeu sempre à transmissão, por via eletrónica, das suas peças processuais -, o Senhor Dr. OOO não se encontrava registado na plataforma em causa, tendo recorrido aos restantes meios convencionais, previstos no Código de Processo Civil e gozado das consequentes dilações de prazo que a lei prescreve.

11.    A 5 de março de 2013, o Senhor Dr. NNN, Ilustre Mandatário do Réu CC, procedeu à entrega, por via eletrónica, de um requerimento (não da sua, mas) da autoria do Senhor Dr. OOO, mandatário dos demais Réus, conforme assinatura nele aposta -Doc. 8 ora junto e constante a fls. (...).

12.   Era pela Portaria 114/2008, de 6 de fevereiro, na redação dada pela Portaria 471/2010, de 08 de julho (ora em diante Portaria), que os vários aspetos da tramitação eletrónica dos processos judiciais de 1ª instância estavam regulados, nomeadamente "Apresentação de peças processuais e documentos por transmissão electrónica de dados (...) incluindo a apresentação do requerimento de interposição de recurso (...)." — cfr. art. 1º, al. a).

13.    E, nos termos desse diploma legal, a apresentação de peças processuais e documentos por transmissão eletrónica de dados tinha de realizar-se através do sistema informático CITIUS, (...) em termos devidamente especificados, devendo os advogados, para o efeito, requer o seu registo junto da entidade responsável pela gestão dos acessos ao sistema informático, após o que lhes seriam disponibilizados os elementos para acesso à área reservada daquela plataforma.

Ora,

14.   Que o documento oferecido não é da autoria do apresentante, é uma evidência incontestável, resultando do requerimento e reconhecido posteriormente pelos mandatários.

15.   A este propósito, saliente-se que a lei prevê, expressamente, que os dados de acesso ao citius são secretos, pessoais e intransmissíveis, e que caso existam dúvidas quanto à autenticidade ou genuinidade das pecas processuais existe o dever de exibição das mesmas em suporte de papel (arts. 3.º/2, al. a) e 4.º/3 da Portaria), donde resulta evidente que o legislador não pretendeu dar cobertura a situação como a dos presentes autos; cada mandatário pode apenas pode apresentar, via citius, requerimentos próprios - o que, comprovadamente, não é o caso.

16.   Os vícios identificados constituíam condição de recusa liminar do ato processual eletrónico, que é nulo (art. 15º-A/2 da Portaria) - vide Ac. da Relação de Coimbra de - nos termos prescritos na lei, sob pena de nulidade (cfr., entre outros, Acs. do STJ, de 23/03/1995 e de 30/09/1997, do STA; do TC, de 19/02/1998 (n.º 191/98); da RP, de 19/12/1994, 29/05/1995,17/01/1996, 15/04/1996, 04/06/1996, 22/01/1998, 01/03/2000 e de 14/11/2007; da RL, de 10/03/1994, 10/02/1998, 17/12/1998, e da RC, de 29/11/2006 e 01/06/2011, todos disponíveis em www.dgsi.pt.

17.     E ainda que, materialmente, tivessem os RR. pretendido dar entrada de um requerimento conjunto - conforme o próprio Dr. NNN admite no seu requerimento de 15 de março de 2013, ora junto como Doc. 9-, decorre do art. 12.º/2 daquele diploma, "A apresentação de peça processual por mais de um mandatário através do CITIUS está dependente do registo prévio de todos os mandatários que apresentam a peca, nos termos do n.º 2 do artigo 4.º ”.

18.    Assim, não estando um dos mandatários registado na plataforma em questão - e, a ser assim, não tendo sido observadas as formalidades da lei para o efeito - impunha-se "(...) considerar-se que a peça processual (oferecida pelo Dr. NNN!) não foi apresentada", conforme dispõe do art. 12.º/3 daquela Portaria.

19.   De facto, face às disposições legais citadas e ora aplicáveis, é manifesta e incontornável a desconformidade total e insanável no oferecimento do requerimento em causa.

20.      E o argumento segundo o qual a falta de registo prévio do Senhor Dr. OOO no citius, impediria que se aplicasse ao requerimento apresentado pelo Dr. NNN os efeitos cominatórios da portaria não teria nunca como proceder: o requerimento em análise foi apresentado, através da plataforma citius, por um mandatário devidamente registado, sendo os vícios invocados em relação a este (e não qualquer outro).

21.    Não obstante, o Acórdão debruça-se sobre o requerimento em si mesmo considerado, da autoria do Dr. OOO, desconsiderando em absoluto a forma surgiu nos autos e isto quando o próprio mandatário dos RR. BB - SERVIÇOS EDITORAIS E GRÁFICOS S.A., II, EE e FF reconhece não ter praticado qualquer ato processual para efeitos de interposição de recurso - não procedeu à junção de qualquer requerimento nesse sentido,

22.       Deixando de apreciar a atuação processual do Dr. NNN, desprovida de qualquer atuação conforme por parte do Dr. OOO.

23.      E, diga-se, é falso que a falta de subscrição múltipla por parte do Senhor Dr. OOO não constituísse "atitude de desinteresse ou negação pelo advogado signatário em não ter subscrito a peça pelo citius, quando podia tê-lo feito.", e que a ausência de registo na plataforma impediria a aplicação da cominação prevista no art. 5.º/3 da Portaria, visto que a adesão não lhe estava vedada; era-lhe possível, a todo o tempo, o registo no sistema Citius - tratando-se, de facto, de mero ato de vontade de cada um dos interessados.

24.      E mais se diga que (para além de tal circunstancia não inibir o direito à invocação do vício subsequente), nunca os RR. não apresentaram qualquer requerimento de interposição de recurso de agravo sem que o Autor se tenha oposto

25.    Exerceram, apenas e só, o direito à pronúncia sobre a admissibilidade de documento junto pelo Autor, através de requerimento assinado por punho próprio, também, do subscritor eletrónico, nos termos do qual os RR. patrocinados por esse mandatário concordaram com o juízo de pertinência subjacente àquela junção por parte do A. (cfr. Doc. 10 ora junto) - sequer existia, portanto, interesse processual o justificasse contraditório por parte deste.

26.     De todo o modo, da mera comparação de requerimentos fica evidente a discrepância entre si: este requerimento de 15 de junho de 2012 é documento da autoria do subscritor eletrónico, conforme resulta do papel timbrado e da assinatura aposta, por mão própria, o qual é também subscrito, no papel físico, pelo Senhor Dr. OOO.

27.    Esta atuação revela, de forma clara, a consciência daqueles mandatários quanto à necessidade da observância dos pressupostos formais da entrega eletrónica de peças processuais, as quais foram postergadas a propósito do putativo requerimento de interposição de recurso de apelação.

28.     Em suma: os RR. não manifestaram, de forma válida e eficaz, a vontade em interpor recurso da decisão final, pelo que deveria ter sido o requerimento eletrónico recusado ou, entendesse-se que estava em causa uma subscrição múltipla, aplicar-se os efeitos correspondentes à falta de apresentação (cfr. arts. 15º-A/2 e 12.º/3 da Portaria), as apontadas irregularidades sempre determinariam.

29.       Não há, pois, qualquer ato processual praticado pelo RR., pelo que se impunha concluir pelo trânsito em julgado da decisão proferida na primeira instância.

30.     E nem se diga que tal cominação seria contrária ao princípio da proporcionalidade porquanto existem norma concretas, gerais e abstratas, de aplicação transversalmente às partes, que o determinam.

31.      Dura lex, sede lex.

Sem prejuízo,

32.     Ainda que se entendesse que o Ilustre Mandatário do Réu CC praticara algum ato processual válido e eficaz - no que não concede pelas já apontadas ordens de razão - relevando-se a falta de genuinidade da peça apresentada e a ausência de subscrição múltipla, apenas o poderia ser no que se refere ao R. CC, porquanto é o único recorrente que, à data, era representado pelo Senhor Dr. NNN.

33.    De facto, nunca os demais RR. DESCOBRIPRESS-SERVIÇOS EDITORAIS E GRÁFICOS S.A.; II; KK; FF e EE poderiam ser julgados recorrentes por direito próprio, cabendo-lhes conformar-se com o teor das Alegações e objeto do recurso daquele R., nos seus precisos termos.

Ainda assim, sobre a putativa ratificação, diga-se o seguinte:

34.        Sem prejuízo, de não alcançar da leitura do Acórdão o dispositivo legal concreto de que lançou mão para o efeito, a verdade é que o Tribunal recorrido confirmou a decisão que admitiu o recurso, admitindo como hipótese que "quando muito pode equiparar-se a uma situação de gestão de negócios (art. 41.º do CPC) ou mera irregularidade de mandato que, a seu tempo, foi devidamente sanada, como resulta dos autos, com a ratificação do processado." (negrito nosso).

35.      Ora, nenhuma destas figuras tem aplicação nos presentes autos.

36.       De facto, em reação à invocação dos vícios pelo ali Autor e ora Recorrente, foi junto, a 11/03/2013, substabelecimento com reserva datado de 15/03/2013, nos termos do qual o mandatário dos RR. DESCOBRIPRESS - SERVIÇOS EDITORAIS E GRÁFICOS S.A.; II; KK; FF e EE, substabeleceu a favor do Senhor Dr. NNN os poderes de representação conferidos pelos seus clientes, com vista à ratificação do processado para efeitos de sanação da alegada (mera) irregularidade de mandato.

37.     Sucede que não há qualquer irregularidade de mandato; esses mesmos RR. estiveram, desde sempre, regularmente representados em juízo pelo Senhor Dr. OOO.

38.    E, da mera previsão do art. 40.º do Cód. de Processo Civil resulta evidente que essa circunstância inibe a subsunção da situação dos autos na norma; as partes encontravam-se regularmente representadas em juízo, ["(...) os RR. (leia-se BB - SERVIÇOS EDITORAIS E GRÁFICOS S.A., II; KK, FF e EE) são há muito representados pelo Dr. OOO (...) - cfr. Acórdão recorrido], pelo que não existia falta de procuração e a sua insuficiência ou irregularidade.

39.       Não poderia, por isso, invocar-se tal instituto.

40.     Do mesmo modo, não se encontram preenchidos os requisitos previstos no art. 41.º desse mesmo código, pelo que não há como concluir pela existência de gestão de negócios.

41.      Não existiu (nem foi invocada) qualquer circunstância que permitisse sequer antever a situação de urgência na representação dos ora RR. BB - SERVIÇOS EDITORAIS E GRÁFICOS S.A., II; KK, FF e EE por mandatário terceiro.

42.      E sequer o próprio Senhor Dr. NNN - que estaria em condições, ele sim, para justificar os termos da sua atuação - se rogou da qualidade de gestor de negócios; nunca sustentou que atuava ou sequer atuara nessa condição!

43.     E nem o podia fazer, dado que aqueles RR. se encontravam devidamente representados em juízo e que o requerimento em causa, dado entrada via CITIUS por si, fora redigido e subscrito, por punho próprio, pelo efetivo mandatário daqueles Réus, Dr. OOO, conforme atestado em 9.E)1) do requerimento oferecido a 28.03.13 - Doc. 11 ora junto e constante a fls. (...) -, em sinal evidente de que ambos os mandatários se encontravam em plenas condições para dar entrada de requerimento de interposição de recurso (um elaborou e assinou, o outro deu entrada - em sinal evidente da disponibilidade de ambos), não o tendo feito de forma válida e eficaz tout court!

44.    Ou seja, também quanto a este instituto não se encontram reunidos (e, sequer, foram invocados) os pressupostos legais que permitiriam a mandatário terceiro atuar em regime de gestão de negócios na presente sede.

45.     Em suma: não se verificava falta, insuficiência ou irregularidade do mandato (40.º CPC), do mesmo modo que não foi exercido pelo Dr. NNN o patrocínio de RR. a título de gestão de negócios (art. 41.º CPC).

46.     E, para além da falta de reunião dos pressupostos legais de qualquer uma das figuras, é transversal o argumento segundo o qual o Dr. NNN não demonstrou nem, efetivamente, teve a intenção de atuar em nome de outrem (268.º/1 do Cód. Civil), que não o R. CC, não havendo como desconsiderar o animus da atuação do apresentante do articulado, que não era o de vincular os RR. BB - SERVIÇOS EDITORAIS E GRÁFICOS S.A.; II; KK; FF e EE, e muito menos o de se substituir a esse mandatário na prática de um ato processual!

De toda a maneira,


47.     ainda que assim não fosse, nunca a pretendida ratificação teria a virtualidade de produzir os efeitos gizados, uma vez que o substabelecente não dispunha ou dispõe de poderes para sancionar o processado.

48.    Os RR., na procuração emitida, não conferem aos mandatários os poderes para, em seu nome e representação, ratificarem os atos praticados por terceiros, e "Não tendo (o mandante) conferido esses poderes, os actos não são válidos" -vide Ac. TRP, de 07-11-2001.

49.     Assim, não havia como decidir pelos efeitos da ratificação, atenta a inexistência dos pressupostos legais para o efeito.

À cautela,

50.        e ainda que estivessem reunidos os requisitos legais da ratificação, sempre o art. 268º/2 do Cód. Civil, impediria os efeitos pretendidos (i.e., o aproveitamento do requerimento de interposição de recurso em benefício dos RR. representados pelo Dr. OOO), porquanto o prejuízo dos direitos de terceiro constitui exceção aos efeitos retroativos da ratificação - o que o aqui Recorrente expressamente invocou e ora reitera.

De facto,

51.       A "(...) ineficácia pode ser invocada por terceiro que tem interesse em ver transcorrido um prazo de caducidade, interrompido pela prática de um acto ineficaz." - cfr. Júlio de Castro Caldas in parecer da Ordem dos Advogados n.º E-28/02.

52.         Assim, como resulta evidente, a putativa ratificação (da gestão de negócios ou da irregularidade do mandato) constitui mero expediente com que pretendiam os RR. retratar-se e, desse modo, obviar aos efeitos do decurso de um prazo legal.

53.      Nesta senda parece ter embarcado - e mal - o Tribunal recorrido.

54.    As regras processuais encontram-se legalmente estabelecidas, são do conhecimento de todos os intervenientes (o que justifica, precisamente, a constituição de mandatário) e por todos têm de ser observadas, sob pena das necessárias cominações legais - cuja aplicação o ora Recorrente pugna; nada mais!

55.    Admitir-se o contrário constitui permitir o recurso a artimanhas para driblar a falta de apresentação, em tempo, de requerimento de interposição de recurso por parte de RR., desde sempre, devidamente representados por advogado, em clara fraude à lei.

56.      A figura da ratificação do processado não tem como objetivo os ali pretendidos e (sem fundamento inteligível) confirmados pela Relação, destinando-se a situações perfeitamente definidas na lei, que não encontram aqui qualquer eco.

57.      Mal andou, portanto, o Tribunal recorrido quando, nega a subsunção dos factos (apresentação de requerimento de interposição, via citius) na Portaria que, nos termos do seu art. 1.º, al. a), regulava os vários aspetos da tramitação eletrónica dos processos judiciais de 1ª instância, nomeadamente a apresentação do requerimento de interposição de recurso.

58.     Do mesmo modo, mal andou o Tribunal recorrido quando omite a referência às normas processuais legais concretas de que, em primeira linha, se sustenta para confirmar a decisão que admitiu o recurso dos RR.,

59.     Não obstante admite, ainda que a título subsidiário, a existência de situação de eventual irregularidade de mandatou ou de gestão de negócios, considerando sanada através da ratificação.

60.     E, ao equacionar a ratificação, desconsiderou, em absoluto, a previsão da lei processual (arts. 40.º e 41.º do Cód. de Processo Civil) e material (art. 268º/1 e 2 do Código Civil) e a ratio subjacente.

61.    Verifica-se, assim, violação das leis substantiva e de processo [art. 674.º/1, als. a) e b)] e a nulidade prevista no art. 615.º/1, al. b), aplicável ex vi art. 674.º/1, al. c) e 666.º.


NESTES TERMOS e nos melhores de Direito- sempre com o mui Douto Suprimento de Vossas Excelências - deve o despacho que admitiu o recurso ser revogado e substituído por outro que julgue pela inadmissibilidade legal do presente recurso, por falta de interposição,

Com o que farão Vossas Excelências a acostumada Justiça!


      8. A multiplicidade de questões suscitadas pelas partes e a extensão das peças processuais apresentadas obrigam a definir uma metodologia adequada na abordagem das questões que integram o objecto dos recursos, começando naturalmente pelas que apresentam uma precedência lógico jurídica sobre as demais – cumprindo, em aplicação deste critério, abordar primeiramente as questões adjectivas colocadas no recurso subordinado do A.

   Saliente-se, desde logo, que não é manifestamente susceptível de revista a questão atinente à respectiva condenação na multa de 3 UC pela junção de determinados documentos, desde logo por tal condenação emergir de uma decisão interlocutória, insusceptível de recurso de revista, nos termos do art. 671º, nº2, do CPC: a omissão de pronúncia invocada terá, deste modo, de ser necessariamente objecto de apreciação pela Relação, a quem cabe eventualmente o exercício do – único - grau de recurso possibilitado pelo nº5 do art. 27º do Regulamento das Custas.

  Quanto à segunda questão enunciada no recurso subordinado – referente à admissibilidade da interposição do recurso de apelação por parte do mandatário do apelante CC – subscreve-se inteiramente o decidido acerca de tal matéria no acórdão recorrido, já que o vício em causa, situado na tramitação electrónica do processo, a existir, se consubstanciaria, em última análise, numa irregularidade de patrocínio, há muito sanada no processo, mediante oportuna ratificação do processado pela parte interessada no acto praticado: saliente-se que as normas regulamentares, constantes das várias portarias que regulam a tramitação electrónica dos processos, não podem sobrepor-se aos princípios fundamentais do processo civil, constantes da lei que o regula, nomeadamente os arts. 48º e 49º do CPC, enquanto prescrevem o necessário suprimento da falta, insuficiência ou irregularidade do mandato ou admitem a figura do patrocínio a título de gestão de negócios, inviabilizando que se extraia um efeito cominatório ou preclusivo irremediável da falta de poderes de representação judiciária por quem pratica acto processual em juízo.

   Deste modo, como refere o acórdão recorrido, a circunstância de o mandatário de dois dos recorrentes não ter aderido à interposição por via electrónica do recurso de apelação -desde logo em consequência de o dito mandatário não estar à época inscrito na plataforma citius, fazendo-o antes pelos restantes meios convencionais previstos no art. 150º do anterior CPC – e sendo ulteriormente ratificado pela parte interessada todo o processado da autoria do Dr. NNN, via citius,- não poderia deixar de se ter, face às referidas normas legais, por suprida qualquer insuficiência ou irregularidade do mandato, porventura verificada a propósito da tramitação electrónica do processo, na fase da interposição dos recursos de apelação.

   Improcede, pois, a questão adjectiva suscitada, nada obstando a que a Relação se tivesse pronunciado sobre o objecto do referido recurso de apelação.


     9. Passando à abordagem das questões substantivas que integram os vários recursos interpostos pelos demandados, importa começar por realçar um aspecto específico ou particular da presente acção, que consiste em a pretensão indemnizatória deduzida se não circunscrever ao ressarcimento de danos morais decorrentes da invocada lesão do direito à honra, ao crédito e bom nome do A., envolvendo ainda o ressarcimento de danos patrimoniais – verdadeiros lucros cessantes futuros – causalmente determinados, na óptica do A., pelo teor dos artigos e peças jornalísticas em causa nos presentes autos, - o que naturalmente implica a análise da problemática do nexo causal entre os escritos atentatórios da honra e a invocada perda futura de chances profissionais – determinando ainda a delimitação do círculo de tais danos patrimoniais ressarcíveis.

   Tais questões – incluindo a abordagem das questões procedimentais suscitadas quanto à definição da matéria de facto apurada e relevante para aferir da realidade e extensão de tais danos patrimoniais futuros – apenas serão abordadas após se ter definido a solução aplicável à questão fulcral ou nuclear em que assenta a lide – e que tem naturalmente a ver com a definição e preenchimento do requisito ilicitude, cujos pressupostos se situam no plano jurídico normativo, implicando a indispensável articulação ou ponderação entre a liberdade de expressão e opinião e os direitos de personalidade do visado nas peças jornalísticas em questão – só se passando assim à abordagem da matéria relevante para aferir dos demais pressupostos da responsabilidade civil dos demandados se se tiver por verificado esse pressuposto básico da ilicitude.

   A mesmo ordem de precedência lógico jurídica ocorre, por outro lado, no respeitante à questão da eventual responsabilidade civil imputada às sociedades detentoras das publicações em causa e aos respectivos directores – tema este que naturalmente só cumprirá abordar se se tiver concluído primeiramente sobre a verificação do referido pressuposto básico da ilicitude dos escritos e peças jornalísticas dissecados na presente acção. 

    Como é evidente –e resulta claramente das conclusões das alegações dos recursos interpostos pelos demandados – a questão jurídica fulcral, a decidir prioritariamente para apurar da existência ou inexistência do pressuposto ilicitude , consiste em operar – no caso dos autos - uma compatibilização ou concordância prática entre os valores fundamentais da defesa da honra, do direito ao crédito, ao bom nome e privacidade dos cidadãos ( exercendo, no caso, destacada e relevantíssimo papel político) e o exercício das liberdades de expressão, opinião e de   imprensa, obrigando naturalmente a convocar, não apenas as normas constitucionais e legais internas, mas também as que integram a CEDH, tal como vêm sendo reiteradamente interpretadas e aplicadas pelo órgão jurisdicional especificamente criado pela Convenção para zelar pela respectiva interpretação e aplicação.

    Como é sabido, a tendência predominante na nossa jurisprudência foi, durante longos anos, a de claramente privilegiar, no caso de conflito de direitos, os direitos fundamentais individuais – à honra, ao bom nome e reputação, vistos como ligados à própria dignidade da pessoa humana- sobre o exercício do direito de liberdade de imprensa - continuando o entendimento, que já vinha de longe, de que, por regra, a ofensa à honra (e usamos esta palavra em sentido lato, abrangendo o que a lei, sem uniformidade terminológica, chama “honra”, “honra e bom nome”, “reputação”, “consideração” e “crédito”) integrava um acto ilícito a demandar, consoante os casos, sanção criminal, indemnização ou ambas.

A regra seria a afirmação daquele direito, que só cederia, em casos justificados, que, doutrina e jurisprudência, se encarregaram de ir precisando.

Outrossim, nos casos em que a cedência recíproca não resolvesse a questão, havia que dar preferência à honra porque integrante de direito de personalidade.( Ac. de30/6/2011, proferido por este STJ no P. 1272/04.7TBBCL.G1.S1)

  Simplesmente – como dá nota este mesmo aresto:


Foram, entretanto, proferidas muitas decisões do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem sobre a matéria.

A Convenção Europeia dos Direitos do Homem não tutela, no plano geral, o direito à honra.

Não o ignora no artigo 10.º, n.º2, mas a propósito das restrições à liberdade de expressão.

Esta construção levou aquele Tribunal a seguir um caminho inverso ao que vinham seguindo, habitualmente, os Tribunais Portugueses. Não partia já da tutela da honra, situando-se, depois, nas suas ressalvas, mas partia antes da liberdade de expressão, situando-se, depois, na apreciação das suas restrições, constantes daquele artigo 10.º, n.º2.

E vem proferindo múltiplas decisões cujo entendimento, mantido de forma constante, vem assentando, essencialmente, no seguinte:

A liberdade de expressão constitui um dos pilares fundamentais do Estado democrático e uma das condições primordiais do seu progresso e, bem assim, do desenvolvimento de cada pessoa;

As excepções constantes deste n.º2 devem ser interpretadas de modo restrito;

Tal liberdade abrange, com alguns limites, expressões ou outras manifestações que criticam, chocam, ofendem, exageram ou distorcem a realidade.

Os políticos e outras figuras públicas, quer pela sua exposição, quer pela discutibilidade das ideias que professam, quer ainda pelo controle a que devem ser sujeitos, seja pela comunicação social, seja pelo cidadão comum – quanto à comunicação social, o Tribunal vem reiterando mesmo a expressão “cão de guarda” - devem ser mais tolerantes a críticas do que os particulares, devendo ser, concomitantemente, admissível maior grau de intensidade destas;

Na aferição dos limites da liberdade de expressão, os Estados dispõem de alguma margem de apreciação, que pode, no entanto, ser sindicada pelo próprio TEDH.

Tal entendimento tem levado a que este Tribunal Europeu, considerando expressões insertas em peças jornalísticas ou outras ainda dentro dos limites da liberdade de expressão, venha condenando os Estados por os respectivos tribunais internos terem condenado os autores ou, em geral, os responsáveis por elas.

Muito exemplificativamente, trazemos aqui para ponderação alguns casos, cujo texto se pode ver no sítio do próprio Tribunal:

Acórdão Oberschlick contra a Áustria de 1.7.1997 a respeito da expressão, inserta numa peça jornalística, dirigida a um político proeminente – que fizera um discurso provocador - “imbecil em vez de nazi”, porque “este último epíteto favorecê-lo-ia”.

Acórdão Lopes da Silva contra Portugal, de 28.9.2000, perante as expressões dirigidas, numa peça jornalística, a um jornalista que pretendia candidatar-se a eleições municipais, de “grotesco”, “boçal” e eivado de “reaccionarismo alarve”.

Acórdão Almeida Azevedo contra Portugal, de 23.1.2007, em que, numa peça jornalística, um membro da oposição, apelidou o presidente da Câmara da localidade de “mentiroso completo e sem complexos”, de ter “falta de pudor inqualificável” e de ser “intolerante e perseguidor”.

Acórdão Mestre contra Portugal, de 26.4.2007, a propósito da expressão “patrão dos árbitros” proferida em entrevista televisiva, com referência ao presidente dum grande clube e da Liga de Futebol.

Acórdão “Público” contra Portugal, de 7.12.2010, a propósito do caso apreciado no Ac. do STJ de 8.3.2007, processo n.º 07B566, relativo a publicação, em manchete e em dois artigos naquele jornal, referente a dívidas fiscais dum clube de futebol português que não estariam a ser pagas, referindo-se que os respectivos dirigentes cometeram um crime de abuso de confiança fiscal.

Acórdão Otegi Mondragon contra a Espanha, de 15.3.2011, em que o demandante havia sido condenado pelo Tribunal Supremo Espanhol (depois de absolvição pelo Tribunal Supremo Basco), por se ter referido, em conferência de imprensa, a propósito da visita do rei a Bilbau, nos seguintes termos:

“Como é possível que eles se façam fotografar hoje em Bilbau com o rei de Espanha, quando o rei de Espanha é o chefe supremo do exército espanhol, ou seja, o responsável pelos torcionários, o protector da tortura e quem impõe o seu regime monárquico ao nosso povo por meio da tortura e da violência?”

Desta enumeração, todavia, não podemos retirar que todos os casos de ofensa veiculada na comunicação social sejam aceitáveis para aquele Tribunal Europeu. Os Acórdãos Barford contra a Dinamarca, de 22.2.1989, Prager e Oberschlick contra a Áustria de 26.4.1995, Cumpana contra a Roménia de 10.6.2003 e Pena contra a Itália, de 6.5.2003, constituem exemplos, de entre muitos, em que foi pronunciada a não violação do mencionado artigo 10.º, não se censurando as condenações levadas a cabo pelos tribunais internos. Por regra, por as pessoas visadas desempenharem cargos sem exposição pública, ou por as ofensas serem gratuitas, desproporcionadas ou sem correspondência com o interesse geral de informação e controle.

O modo de ver consistente em afirmar a liberdade de expressão como ponto de partida para situar em ressalvas a sua violação, mormente quanto à ofensa à honra, sai reforçada pelo teor da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. A vinculação dos Estados ao seu cumprimento teve lugar depois dos factos que agora apreciamos, pelo que a atenção à mesma serve só para melhor entendimento das razões deste raciocínio e da hierarquia de valores que encerra.

Ignora o direito à honra e estatui no artigo 11.º :

Liberdade de expressão e de informação

1 . Todas as pessoas têm direito à liberdade de expressão. Este direito compreende a liberdade de opinião e a liberdade de receber e transmitir informações ou ideias, sem que possa haver ingerência de quaisquer poderes públicos e sem consideração de fronteiras.

2 . São respeitados a liberdade e o pluralismo dos meios de comunicação social.


Prescindiu-se aqui até da enumeração de restrições, não se seguindo sequer o artigo n.º2 do artigo 10.º da CEDH, ao qual se chega só pela via indirecta – aliás, de modo não concludente – do n.º3 do artigo 52.º. Ou situando ainda tais restrições, tão simplesmente, na figura do abuso do direito prevista no artigo 54.º.

No fundo, com tudo isto, estará, talvez, a vir ao de cima a contraposição entre a tendência nacional – e não só - para o individualismo (que a tutela do direito à honra, habitualmente, protege) e a visão internacional mais virada para as realidades colectivas, especialmente as reportadas ao suporte da sociedade tal como se pretende que ela seja. E estar-se-á a questionar fortemente a ideia de que quem desempenha cargos de relevo – principalmente políticos – deve ser, por aí, particularmente considerado e respeitado.

Tendo como consequência, claramente, uma discrepância entre os limites à liberdade de expressão que traçam as autoridades internas dos vários países – com destaque para Portugal – e os que o Tribunal internacional vem fixando, estabelecendo um círculo de aceitação muito mais alargado.

Discrepância, aliás, no nosso caso, não total. Já no Acórdão deste Supremo Tribunal de 13.1.2005, processo n.º 04B39224, se acolheu a posição do TEDH e, por isso, se absolveu um jornal que empregara expressões muito ofensivas a respeito dum governador civil e presidente da Câmara, as quais, vista a acessibilidade do aresto – sempre em www.dgsi.pt – aqui nos dispensamos de repetir. E no de 7.2.2008, processo n.º 07B4540, referiu-se expressamente que deve ser acolhida a orientação daquele Tribunal, nesta matéria.

Perante esta dissintonia, há que atender à hierarquia normativa.

Em primeiro, a nossa Constituição.

Em duas vertentes:

Uma respeitante à tutela, quer do direito à honra, quer do direito à liberdade de expressão e informação;

Outra reportada à relação que estabelece, no que respeita ao direito internacional.

Sobre a tutela do direito à honra já nos debruçámos em VIII.

Mas, paralelamente, o artigo 37.º estatui que todos têm o direito de exprimir e divulgar o seu pensamento, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informado.

Não vemos que, do texto constitucional, resulte a prevalência dum dos direitos sobre o outro (Neste sentido, Iolanda de Brito, Liberdade de Expressão e Honra das Figuras Públicas, 54) . Mesmo a alusão, logo no artigo 1.º, à dignidade humana não inclui, dos dois, apenas a honra. A dignidade encerra também a ausência de mordaças.

O conflito entre os dois direitos não encontra, no próprio texto constitucional, solução.


Decerto que, tutelando a Constituição ambos, hão-de ser exercidos até onde não interfiram um com o outro. Se interferirem, há-de se procurar ainda a redução em ordem a cada um deles poder ser exercido de modo mais amplo. Mas se se atingir o patamar da incompatibilidade, não temos elementos para retirar a solução do texto constitucional. Nem o já falado artigo 16.º, n.º2, que impõe uma interpretação conforme à Declaração Universal dos Direitos do Homem, faz luz neste domínio porque, se nesta se tutela a honra, se tutela também em plano de igualdade, a “liberdade de opinião e de expressão”.

Na segunda vertente, e para além da interpretação acabada de referir, há que atender aos artigos 8.º e 16.º, n.º1.

Eles conduzem a CEDH a um plano superior ao das normas ordinárias de origem interna (Cfr-se Jorge Miranda e Rui Medeiros, Anotação XIII ao primeiro daqueles artigos). No que a lei constitucional deixa por regulamentar, vale, em primeira linha, o texto convencional.

Se vale o texto convencional, coloca-se a questão da sua interpretação através das sucessivas decisões do TEDH. Nos termos do artigo 46.º, n.º1, as Altas Partes Contratantes obrigam-se a respeitar as sentenças definitivas do Tribunal nos litígios em que forem partes. Nessa sequência veio a lume a alínea f) do artigo 771.º do Código de Processo Civil, abrindo caminho às revisões de sentença quando a decisão transitada em julgado “seja inconciliável com decisão definitiva de uma instância internacional de recurso vinculativa para o Estado Português”. No mesmo sentido dispondo o artigo 449.º, n.º1 g) do Código de Processo Penal; no seguimento do qual, admitiu já este Supremo Tribunal – precisamente em casos de violação do artigo 10.º da Convenção decretada pelo TEDH – a revisão das sentenças condenatórias proferidas na ordem interna – Ac.s de 23.4.2009, processo n.º5TACTB-A.S1 e de 27.5.2009, processo n.º 0TBEPS-A.S1.

Mas a jurisprudência do TEDH vai mais longe, com o entendimento de que:

“Os Estados que conservam na sua ordem jurídica normas contrárias à Convenção, tal como consta dos Acórdãos do Tribunal, mesmo que o país em causa nele não seja parte, devem conformar-se com tal jurisprudência sem que tenham de esperar para serem demandados no Tribunal Europeu” – Acórdão Modinos contra Chipre, de 22.4.1993. Como refere Ireneu Barreto, em anotação a este artigo, apesar do caso julgado se reportar às partes no processo, “convirá, no entanto, a todas as autoridades, mesmo àquelas que não pertencem ao Estado em causa e entre elas os tribunais, acolher a doutrina que deles deriva para evitar futuras condenações por violação da Convenção.”

Cremos, pois, daqui derivar a imposição também para este Tribunal de acatar o artigo 10.º da Convenção, na interpretação que lhe vem conferindo o TEDH (assim, Iolanda de Brito, ob. cit., 107 e 367). Ou seja, que atender ao que sumariamente se deixou explanado em X.


Esta complexa e controversa questão – da articulação ou formulação  de critérios operativos de concordância prática entre direitos e valores constitucionalmente tutelados – foi muito Recentemente-  abordada no Ac. de 6/9/2016, proferido pelo STJ no P. 60/09.9TCFUN.L1.S1, que, pelo seu interesse e relevância, nos permitimos citar, e em que se considera:

Não suscita dúvidas que vários instrumentos de direito internacional vinculativos na ordem jurídica portuguesa (como a Declaração Universal dos Direitos do Homem, art. 12º; ou o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, art. 17º nº 1) asseguram o direito à dignidade, à integridade moral e ao bom nome e reputação das pessoas (o bom nome e reputação não deixa de ser apenas uma especificação ou particularização do direito à dignidade e à integridade moral). 

Também a lei infraconstitucional - art.s 70º nº 1 e 484º do CCivil - repele qualquer abuso contra a personalidade moral das pessoas, crédito e bom nome (sendo estes simples emanações da personalidade moral das pessoas).

Parafraseando Capelo de Sousa (v. O Direito Geral de Personalidade, pp. 301 e seguintes), podemos dizer que entre os bens mais preciosos da personalidade moral tutelada no art. 70º figura a honra, enquanto projeção na consciência social do conjunto dos valores pessoais de cada indivíduo, desde os emergentes da sua mera pertença ao género humano até aqueloutros que cada indivíduo vai adquirindo através do seu esfoço pessoal. O crédito da honra é devido naturalmente, sendo que a honorabilidade só pode ser descartada quando os atos do indivíduo demonstrem o contrário. A honra, em sentido amplo, inclui também o bom nome e a reputação, enquanto sínteses do apreço social que o indivíduo merece. Ou, como diz Maria Paula Andrade (Da Ofensa do Crédito e do Bom Nome, Contributo para o estudo do artigo 484º do Código Civil, p. 97), “a honra é um bem da personalidade, que se traduz numa pretensão ou direito do indivíduo a não ser vilipendiado no seu valor aos olhos da sociedade e que constitui modalidade do livre desenvolvimento da dignidade humana (…)”.

Entretanto, o facto capaz de prejudicar o crédito ou o bom nome de uma pessoa (art. 484º do CCivil) deve ser entendido, como aduz Menezes Cordeiro (Tratado de Direito Civil Português, I - Direito das Obrigações, Tomo III, p. 553), como “uma afirmação ou insinuação, feita pela palavra (escrita ou oral), pela imagem ou pelo som, que impliquem ou possam implicar desprimor para o visado. Este resultará (ou poderá resultar apoucado, aviltado ou, por qualquer modo, diminuído na consideração social ou naquela que ele tenha de si mesmo. A pessoa média normal (bonus pater famílias) sentir-se-ia bem consigo próprio e com os outros se fosse vítima da afirmação ou da insinuação em causa? A resposta dir-nos-á, em regra, se há facto capaz de prejudicar o crédito ou o bom nome do visado”. Terá de haver a imputação de um facto, não bastando alusões vagas e gerais (v. Almeida e Costa, Direito das Obrigações, 9ª ed., pp. 516 e 517), bem que os juízos de valor e qualquer outra manifestação não factual ofensiva possa também ser censurada e reprimida. De acordo com Menezes Leitão (Direito das Obrigações, I, 12ª ed., p. 270), e parece de subscrever este ponto de vista, “A afirmação ou difusão de factos falsos é sempre proibida; quanto aos factos verdadeiros, a sua divulgação poderá ser admitida, mas desde que tal se efetue para assegurar um direito próprio ou um interesse público legítimo”. Neste último caso será admissível a exceptio veritatis (v. Almeida e Costa, ibidem). Na lição de Antunes Varela (Das Obrigações em Geral, Vol. I, 10ª ed., p. 549), poder-se-á dizer que o prejuízo do crédito traduz-se na diminuição da confiança na capacidade e na vontade da pessoa para cumprir as suas obrigações, e que o

prejuízo do bom nome traduz-se no abalo do prestígio de que a pessoa goze ou o bom conceito em que ela seja tida no meio social em que vive ou exerce a sua atividade.

De outro lado, também a Constituição da República Portuguesa (art.s 37º nº 1 e 38º nº 1 e 2 alínea a)) assegura, como direito fundamental, a liberdade de expressão e divulgação do pensamento (pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio), e o direito de informar, assim como assegura a liberdade de imprensa (de que a liberdade de expressão do jornalista é conatural, e vem também expressamente assegurada). 

De igual forma, a Declaração Universal dos Direitos do Homem (art. 19º) afirma que todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, podendo difundir informações e ideias por qualquer meio de expressão. 

O Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos (art. 19º) afirma, por seu turno, que toda e qualquer pessoa tem direito à liberdade de expressão (direito que compreende a liberdade de procurar, receber e expandir informações e ideias de toda a espécie, sob forma oral ou escrita, impressa ou artística, ou por qualquer outro meio). Mas logo a seguir dispõe que o exercício destas liberdades comporta deveres e responsabilidades especiais, podendo, em consequência, ser submetido a certas restrições que sejam necessárias e que devem, todavia, ser expressamente fixadas na lei, nomeadamente as inerentes ao respeito dos direitos ou da reputação de outrem.

A Convenção Europeia dos Direitos do Homem prescreve no seu art. 10º que qualquer pessoa tem direito à liberdade de expressão (direito que compreende a liberdade de opinião e a liberdade de receber ou de transmitir informações ou ideais). Mas acrescenta que o exercício destas liberdades, porquanto implica deveres e responsabilidades, pode ser submetido a certas formalidades, condições, restrições ou sanções, previstas pela lei, que constituam providências necessárias, numa sociedade democrática, para, nomeadamente, a proteção da honra ou dos direitos de outrem.

A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia estabelece (art. 11.º) que todas as pessoas têm direito à liberdade de expressão, direito que compreende a liberdade de opinião e a liberdade de receber e de transmitir informações ou ideias, e que são respeitados a liberdade e o pluralismo dos meios de comunicação social.

Também a lei ordinária, (Lei nº 2 /99, Lei da Imprensa) garante, no seu art. 1º, a liberdade de imprensa, nos termos da Constituição e da lei, abrangendo tal liberdade, e nomeadamente, o direito de informar. Constituem direitos fundamentais dos jornalistas, com o conteúdo e a extensão definidos na Constituição e no Estatuto do Jornalista, entre outros, a liberdade de expressão e de criação (art. 22º da Lei de Imprensa e art. 6º alínea a) do Estatuto do Jornalista, Lei nº 1/99). 

Mas já são deveres fundamentais dos jornalistas, entre outros, informar com rigor e isenção, rejeitando o sensacionalismo e demarcando claramente os factos da opinião, procurar a diversificação das suas fontes de informação, e ouvir as partes com interesses atendíveis nos casos de que se ocupem (art. 14º nº 1 alíneas a) e e) da Lei nº 1/99).


(…)

Embora alguma jurisprudência relativamente recente deste Supremo Tribunal pareça conferir implicitamente uma certa precedência ao bom nome e reputação no confronto da liberdade de expressão e informação (no acórdão de 9 de setembro de 2010, processo nº 77/05.2TBARL.E1.S1, disponível em www.dgsi.pt, escreve-se que “o valor da honra, enquanto dignitas humana, «é mais importante que qualquer outro (valor do direito à projeção moral, ou seja, o direito à honra em sentido amplo) e transige menos facilmente com os demais em sede de ponderação de interesses»”; no acórdão de 4 de março de 2010, processo nº 677/09.IYFLSB, disponível em www.dgsi.pt, escreve-se que “relativamente ao direito ao bom-nome e à reputação, a Constituição não estabelece qualquer restrição, o que não acontece em relação à liberdade de expressão e informação em que as infracções cometidas no seu exercício ficam submetidas ao princípio geral de direito criminal”), essa não será uma orientação a subscrever de forma irrestrita. 

Sem dúvida que, como nos dizem Jorge Miranda e Rui Medeiros (Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, p. 283), e passamos a citar “Por ser expressão direta do postulado básico do respeito pela dignidade humana, o princípio consignado no art. 26º constitui uma “pedra angular” na demarcação dos limites ao exercício dos outros direitos fundamentais. É em especial o que sucede com a liberdade de expressão e informação e com liberdade de imprensa e meios de comunicação social (mas também com a própria liberdade de criação literária e artística). Estas liberdades não poderão ser interpretadas sem ter sempre em consideração o direito geral de personalidade consignado neste artigo e, em especial, a tutela do bom nome, da reputação (…)”. Todavia, a Constituição não estabelece qualquer hierarquia entre o direito ao bom nome e reputação, e o direito à liberdade de expressão e informação, nomeadamente através da imprensa. Daqui afirmarem Gomes Canotilho e Vital Moreira (Constituição da República Portuguesa Anotada, I, 4ª ed., p. 466) que esses direitos, quando em colisão, “devem considerar-se como princípios susceptíveis de ponderação ou balanceamento nos casos concretos, afastando-se qualquer ideia de supra ou infravaloração abstracta”. Concordantemente, aduz-se no acórdão deste Supremo Tribunal de 13-10-2011 (Revista n.º 2729/08.6.TBLSB.L1.S1, relator Távora Victor, disponível em www.dgsi.pt) que, perfilando-se no seio do ordenamento jurídico esses dois direitos com igual relevo constitucional, haverá que os conciliar tanto quanto possível de harmonia com as circunstâncias do caso concreto, pela valorização de um deles em detrimento do outro, com o fito de encontrar a solução justa. 

Interessa aqui fazer uma breve referência, neste domínio do confronto entre o direito ao bom nome e reputação e o direito à liberdade de expressão e informação, à orientação adotada no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH), cujo critério deverá ser seguido. Observa, a propósito, Henriques Gaspar (A influência da CEDH no diálogo interjurisdicional, Julgar, nº 7, 2009, pp. 39 e 40) que “os juízes nacionais estão vinculados à CEDH e em diálogo e cooperação com o TEDH. Vinculados porque, sobretudo em sistema monista, como é o português (artigo 8º da Constituição), a CEDH, ratificada e publicada, constitui direito interno que deve, como tal, ser interpretada e aplicada, primando, nos termos constitucionais, sobre a lei interna. E vinculados também porque, ao interpretarem e aplicarem a CEDH como primeiros juízes convencionais, devem considerar as referências metodológicas e interpretativas e a jurisprudência do TEDH, enquanto instância própria de regulação convencional. (…) Os tribunais nacionais e, de entre estes, em último grau de intervenção mas no primeiro de responsabilidade, os Supremos Tribunais, são os órgãos de ajustamento do direito nacional à CEDH, tal como interpretada pelo TEDH; as decisões do TEDH têm, pois, e deve ser-lhes reconhecida, uma autoridade interpretativa”. Aliás, a relevância desta jurisprudência internacional está até espelhada na possibilidade de revisão de decisão transitada em julgado quando “seja inconciliável com decisão definitiva de uma instância internacional de recurso vinculativa para o Estado Português” (art. 696.º, al. f), do CPC).

Sucede que, como faz notar Jónatas Machado (Liberdade de Expressão, Interesse Público e Figuras Públicas ou Equiparadas, Boletim da Faculdade de Direito, Vol. LXXXV, 2009, p. 81) “Para o Tribunal Europeu, a centralidade da liberdade de expressão e de imprensa, como elementos constitutivos de uma sociedade democrática, obriga a que todas as restrições às mesmas devam ser objecto de uma interpretação restritiva e a sua necessidade estabelecida de forma convincente. Para o TEDH, as condutas expressivas são dignas de protecção, mesmo quando sejam ofensivas, perturbadores, chocantes e inquietas”. Mais diz o autor (p. 93) que “no âmbito da responsabilidade civil por imputações prima facie difamatórias deve ser dada latitude suficiente para o exercício do direito à liberdade de informar, especialmente quando se esteja perante notícias de interesse público inegável ou a discussão de temas de grande relevância pública, incluindo não apenas titulares de cargos políticos, mas outras figuras de relevo económico, social, cultural, religioso, etc., dotadas de grande capacidade para influenciar o espaço público.” 

O mesmo autor (v. Liberdade de Expressão - Dimensões Constitucionais da Esfera Pública no Sistema Social, 2002, p. 807) observa que “as afirmações de facto ou os juízos de valor que um cidadão faça sobre a conduta de indivíduos ou instituições publicamente relevantes devem ter unicamente como limite a consciência ou a suspeita fundada da falsidade das mesmas, ou a falta de quaisquer indícios sérios da sua verdade. Ele deve poder exprimir as suas suspeitas e especulações razoavelmente apoiadas, por via dedutiva, indutiva e abdutiva, em evidências circunstanciais de que algo vai mal no funcionamento das instituições socialmente relevantes”.

No mesmo sentido vai Henriques Gaspar (Liberdade de Expressão: o artigo 10º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Uma leitura da Jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Jorge de Figueiredo Dias, p. 698), ao apontar que “o TEDH enunciou o seguinte princípio fundador: os limites da crítica admissível são mais amplos em relação a personalidades públicas visadas nessa qualidade, do que em relação a um simples particular. Diferentemente destes, aquelas expõem-se, inevitável e conscientemente, a um controlo apertado dos seus comportamentos e opiniões, tanto pelos jornalistas como pela generalidade dos cidadãos, devendo, por isso, demonstrar muito maior tolerância. Esta perspectiva garante uma extensa margem de actuação na expressão crítica e nas intervenções publicadas.”

Concordantemente, aduz Francisco Pereira Coutinho (O Tribunal dos Direitos do Homem e a Liberdade de Imprensa: os Casos Portugueses, in Media, Direito e Democracia, pp. 319 e seguintes, Almedina, 2014) que «No entendimento do TEDH as exceções à liberdade de expressão fundadas na proteção do bom nome e reputação devem ser objeto de interpretação restritiva se a pessoa visada por um artigo crítico pretensamente difamatório “tiver entrado na arena do debate público”. Nestes casos, o tribunal atribui aplicação preferente ao direito à liberdade de expressão em relação ao direito ao bom nome e reputação, rejeitando adotar a técnica jurídica da “concordância prática”, que exigiria uma aplicação compromissória de direitos fundamentais valorativamente equivalentes, de acordo com o princípio da proporcionalidade. (…) Os limites da praxis jornalística têm sido cartografados de forma bastante generosa pelo TEDH. Desde que a peça não constitua um ataque pessoal gratuito, o tribunal maximiza a liberdade de expressão dos jornalistas. O direito de informar questões de interesse geral parece estar apenas condicionado pela obrigação de os jornalistas agirem de boa-fé, com base em factos exatos, de modo a fornecerem informações fiáveis e precisas no respeito pela ética jornalística».[1] 

Porém, como se observa no acórdão deste Supremo Tribunal de 30 de junho de 2011 (processo nº 1272/04.7TBBCL.G1.S1, relator João Bernardo, disponível em www.dgsi.pt) - e isto é uma confirmação do que se deixa extratado em nota de rodapé - não pode concluir-se que todos os casos de ofensa veiculada na comunicação social sejam aceitáveis para o TEDH. Concordantemente, o acórdão informa que “Os Acórdãos Barford contra a Dinamarca, de 22.2.1989, Prager e Oberschlick contra a Áustria de 26.4.1995, Cumpana contra a Roménia de 10.6.2003 e Pena contra a Itália, de 6.5.2003, constituem exemplos, de entre muitos, em que foi pronunciada a não violação do mencionado artigo 10.º, não se censurando as condenações levadas a cabo pelos tribunais internos. Por regra, por as pessoas visadas desempenharem cargos sem exposição pública, ou por as ofensas serem gratuitas, desproporcionadas ou sem correspondência com o interesse geral de informação e controle.”

A jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça (disponível www.dgsi.pt) tem indicado, em sede do confronto entre o direito à reputação e bom nome e o direito de expressão, alguns vetores que importa recordar. Assim:

- No citado acórdão de 30 de junho de 2011 refere-se que a CEDH não tutela, no plano geral, o direito à honra. Não o ignora no artigo 10.º, n.º 2, mas a propósito das restrições à liberdade de expressão. Esta construção levou o TEDH a seguir um caminho inverso ao que vinham seguindo, habitualmente, os Tribunais Portugueses. Não partia já da tutela da honra, situando-se, depois, nas suas ressalvas, mas partia antes da liberdade de expressão, situando-se, depois, na apreciação das suas restrições, constantes daquele artigo 10.º, n.º2. E vem proferindo múltiplas decisões cujo entendimento, mantido de forma constante, vem assentando, essencialmente, no seguinte: a liberdade de expressão constitui um dos pilares fundamentais do Estado democrático e uma das condições primordiais do seu progresso e, bem assim, do desenvolvimento de cada pessoa; as exceções constantes deste n.º 2 devem ser interpretadas de modo restrito. Tal liberdade abrange, com alguns limites, expressões ou outras manifestações que criticam, chocam, ofendem, exageram ou distorcem a realidade. Os políticos e outras figuras públicas, quer pela sua exposição, quer pela discutibilidade das ideias que professam, quer ainda pelo controle a que devem ser sujeitos, seja pela comunicação social, seja pelo cidadão comum - quanto à comunicação social, o Tribunal vem reiterando mesmo a expressão “cão de guarda” - devem ser mais tolerantes a críticas do que os particulares, devendo ser, concomitantemente, admissível maior grau de intensidade destas; na aferição dos limites da liberdade de expressão, os Estados dispõem de alguma margem de apreciação, que pode, no entanto, ser sindicada pelo próprio TEDH.

- No acórdão de 21-10-2014 – (Revista n.º 941/09.0TVLSB.L1.S1, relator Gregório da Silva Jesus) indica-se que a prevalência do direito à honra e ao bom-nome no confronto com o direito à liberdade de expressão e de informação não se compadece com as situações em que certas afirmações, embora potencialmente ofensivas, sirvam o fim legítimo do direito à informação e não ultrapassem o que se mostra necessário ao cumprimento da função pública da imprensa. O direito do público a ser informado tem como referência a utilidade social da notícia - interesse público -, devendo restringir-se aos factos e acontecimentos que sejam relevantes para a vivência social, apresentados com respeito pela verdade. A verdade noticiosa não significa, porém, verdade absoluta: o critério de verdade deve ser mitigado com a obrigação que impende sobre qualquer jornalista de um esforço de objetividade e seguindo um critério de crença fundada na verdade. Embora seja difícil estabelecer o equilíbrio ténue entre o princípio da presunção de inocência, de que todos os cidadãos devem gozar, mormente na fase de inquérito, e o direito à informação, é inderrogável o interesse em dar a conhecer aos cidadãos uma matéria que, encontrando-se porventura sujeita ao segredo de justiça, releva do cometimento de irregularidades graves passíveis de configurar a prática de crimes. Há interesse público. 

- No acórdão de 01-04-2014 (Revista n.º 218/11.0TBPDL.L1.S1, relator Martins de Sousa) aduz-se que o direito à honra no confronto com o exercício do direito de liberdade de imprensa deve estar submetido a uma interpretação restritiva quando os queixosos são políticos ou outras figuras públicas, cujo estatuto e proeminência no governo das sociedades hodiernas há de ser mais permissivo e tolerante com o tom mais elevado e intenso das críticas de que são objeto pela imprensa, desde que não se trate de ofensa gratuita, desproporcionada ou que desvirtue o interesse geral subjacente à informação.

- No acórdão de 08-05-2013 (Revista n.º 1486/03.7TVLSB.L1.S1, relator Moreira Alves) observa-se que não obstante a importância fundamental que assumem os direitos de liberdade de imprensa e de livre expressão nos modernos Estados democráticos, não se trata de direitos absolutos e ilimitados, como, da mesma forma, não são ilimitados os direitos de personalidade. O jornalista não pode publicar aquilo que entender se, ao fazê-lo, violar direitos de personalidade de outrem. Em casos especiais, pode dar-se prevalência ao direito de liberdade de imprensa em detrimento do direito de personalidade, mas, para que se imponha tal solução há que submeter o conflito concreto ao crivo de três critérios de análise: o critério da verdade, o critério do interesse público e o critério da proporcionalidade e adequação. Assim e desde logo, nunca poderá prevalecer o direito de liberdade de imprensa ou o direito de livre expressão da opinião se os factos noticiados forem falsos, equívocos, traduzirem meras suspeitas sem prova ou se fundarem em simples boatos. Por outro lado, é sempre necessário que a informação veiculada pela comunicação social corresponda à realização de um interesse público ou social de relevância, isto é, o interesse público há de, atenta a sua relevância, justificar a agressão do direito de personalidade com o qual entre em colisão. Pressuposta a verdade da imputação e o interesse público relevante, deve ser respeitado o devido grau de proporcionalidade e adequação, perante as circunstâncias concretas, em ordem a maximizar a eficácia prática dos dois direitos em conflito ou a prejudicar, o menos possível, aqueles dos direitos que deve ceder perante o outro.  

- No acórdão de 14-02-2012 (Revista n.º 5817/07.2TBOER.L1.S1, relator Helder Roque) refere-se que o direito do público a ser informado tem como parâmetro a utilidade social da notícia, ou seja, deve restringir-se aos factos e acontecimentos que sejam relevantes para a vivência social. A importância social da notícia deve ser integrada pela verdade do facto noticiado ou pela seriedade do artigo de opinião, o que pressupõe a utilização pelo jornalista de fontes de informação fidedignas, tanto quanto possível, diversificadas, por forma a testar e controlar a veracidade dos factos. As afirmações de facto ou são verdadeiras ou falsas, pressupondo a indispensabilidade da sua prova, ao contrário do que sucede com os juízos de valor, que não podendo encontrar-se, totalmente, desprovidos de base factual, já não impõem, em princípio, a averiguação da sua verdade ou falsidade, ou do seu escoramento emocional ou racional, desde que a génese subjetiva do juízo de valor seja, imediatamente, percetível junto dos destinatários. São pressupostos da justificação das ofensas à honra, cometidas através da imprensa, causa de exclusão da ilicitude da conduta, a exigência de que o agente tenha atuado dentro da sua função de formação da opinião pública e visando esse objetivo [a], utilizando o meio concretamente menos danoso para a honra do atingido [b], com respeito pela verdade das imputações [c], em que, fundadamente, acreditou [d], depois de ter cumprido o dever de verificação da verdade da imputação [e]. O dever de comprovação não corresponde ao facto histórico narrado, nem à sua comprovação científica ou sequer à sua comprovação judiciária, antes há de satisfazer-se com as exigências derivadas das legis artis dos jornalistas. Mas estas não se contentam com um convencimento meramente subjetivo, antes é necessário que exista uma base objetiva, de que possa resultar, no quadro do direito de informação, uma crença fundada na verdade.

     10. Pode, deste modo, considerar-se que a jurisprudência recente deste Supremo vem realizando uma reponderação relativamente à tradicional visão acerca do critério de resolução dos conflitos entre direitos fundamentais individuais e liberdade de imprensa, que conferia aprioristicamente precedência ao direito individual à honra e bom nome – procurando valorar adequadamente as circunstâncias do caso e ponderar a interpretação feita, de modo qualificado, pelo TEDH - órgão que, nos termos da CEDH, está especificamente vocacionado para uma interpretação qualificada e controlo da aplicação dos preceitos de Direito Internacional convencional que a integram e que vinculam o Estado Português; e tendo, por outro lado, também em conta a dimensão objectiva e institucional subjacente à liberdade de imprensa - que não pode deixar de ser considerada, sempre que se determina o âmbito de protecção da norma constitucional que consagra este tipo de liberdade: com efeito, o bem ou valor jurídico que, aqui, é constitucionalmente protegido não é outro senão o da formação de uma opinião pública robusta, sem a qual se não concebe o correcto funcionamento da democracia (cfr. declaração de voto aposta ao Ac. do TC nº292/08).

   Como refere o TC no Ac.292/08, a solução dos conflitos de direitos não pode ser resolvida através de uma preferência abstracta, com o mero recurso à ideia de uma ordem hierárquica de valores constitucionais. Desde logo porque é difícil estabelecer, em abstracto, uma ordem hierárquica dos valores constitucionalmente protegidos. Essa hierarquização só pode fazer-se, na maior parte das hipóteses, quando se consideram as circunstâncias concretas dos casos. Se a Constituição protege diversos valores ou bens não é lícito sacrificar um deles em detrimento dos outros, antes se impõe uma ponderação concreta dos bens que pode conduzir a resultados variáveis em função das circunstâncias, ou seja, há que resolver os conflitos de direitos através de um princípio de harmonização ou concordância prática.

A aplicação do princípio da concordância prática não pode implicar a afectação do conteúdo essencial de nenhum dos direitos em presença e também não impõe a realização óptima de cada um dos direitos em jogo.

Como escreve JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE:

 “O princípio da concordância prática executa-se, portanto, através de um critério de proporcionalidade na distribuição dos custos do conflito.

Por um lado, exige-se que o sacrifício de cada um dos valores constitucionais seja adequado e necessário à salvaguarda dos outros. Se o não for, não chega sequer a existir um verdadeiro conflito.

Por outro lado, e aqui estamos perante a ideia da proporcionalidade em sentido estrito, impõe-se que a escolha entre as diversas maneiras de resolver a questão no caso (a “preferência concreta”) se faça em termos de comprimir o menos possível cada um dos valores em causa segundo o seu peso na situação – segundo a intensidade e a extensão com que a sua compressão no caso afecta a protecção que lhes é constitucionalmente concedida (in Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, 3ª ed., Coimbra, 2004, p. 326).    


   Importa, pois, para tentar realizar uma concordância prática entre os direitos em colisão, valorar adequadamente todas as circunstâncias concretas e peculiares do caso, ponderando, por um lado, o referido e fundamental relevo da liberdade de imprensa, enquanto garante de um efectivo e amplo debate democrático, realizado sem constrangimentos indevidos; e, por outro, atentando na dimensão fundamental dos direitos individuais de personalidade eventualmente afectados pelo exercício excessivo da referida liberdade – sem olvidar que os direitos fundamentais eventualmente atingidos encontram assento, não apenas em normas de direito infraconstitucional, mas, desde logo, em preceitos basilares da nossa Lei Fundamental.

   E, nesta busca de realização de uma satisfatória concordância prática entre os direitos em conflito ou colisão, face `as circunstâncias do caso concreto, não pode naturalmente o intérprete e aplicador do Direito deixar de atender e conferir o devido relevo às normas de Direito Internacional convencional, vinculativas do Estado Português, tal como são qualificadamente interpretadas e aplicadas pelo órgão jurisdicional a que a própria Convenção confiou uma tarefa de realização prática dos princípios nela contidos.

   Este indispensável apelo à jurisprudência do TEDH é imposto, desde logo, no plano normativo, pelo valor reforçado que as normas da Convenção assumem no nosso sistema jurídico, caracterizado pela prevalência das normas internacionais, vinculativas do Estado Português, sobre as normas legais, sejam anteriores ou posteriores (CRP Anotada, Jorge Miranda/Rui Medeiros, 2017, pag. 133).

   Existem, por outro lado, prementes razões de ordem prática a impor esse diálogo entre os Supremos Tribunais e o TEDH a propósito da interpretação dos princípios da Convenção: desde logo, o dissídio entre tais órgãos jurisdicionais acabará por se traduzir em condenações do Estado Português pelo incumprimento das normas convencionais, implicando em última análise que sejam suportadas pelo erário público – afinal, pelo contribuinte –as indemnizações arbitradas aos lesados pelos abusos de liberdade de imprensa que não suportem o ulterior confronto com o entendimento jurisprudencial prevalecente no TEDH; depois, porque, a partir da reforma do processo civil de 2007, passou a constituir fundamento de revisão a incompatibilidade do acórdão proferido na jurisdição interna com decisão definitiva de uma instância jurisdicional internacional, vinculativa do Estado Português – implicando este regime processual que, a posteriori, tenha de se proceder a uma análise e eventual reponderação dos fundamentos da decisão do órgão nacional, transitada em julgado, à luz da jurisprudência afirmada, no caso, pelo TEDH : ora, em vez de se proceder a uma tentativa de articulação ou compatibilização das orientações jurisprudenciais, interna e internacional, realizada apenas ex post, envolvendo eventual preterição do caso julgado e do princípio da confiança que lhe subjaz, é claramente preferível tentar realizar essa operação de eventual compatibilização ou concordância prática ex ante, evitando assim, na medida do possível, a sedimentação de conflitos insanáveis acerca da interpretação dos princípios e normas da Convenção.

   É certo que não existe, no âmbito da Convenção, um mecanismo processual análogo ao do reenvio prejudicial, susceptível de permitir ao Tribunal nacional, chamado nomeadamente a resolver um conflito entre os direitos individuais de personalidade, alegadamente lesados, e o exercício da liberdade de imprensa, obter previamente do TEDH a resposta a dúvidas interpretativas razoavelmente suscitadas acerca do âmbito das normas convencionais: consideramos que a metodologia adequada para substituir esse inexistente mecanismo de reenvio consistirá em formular um juízo de prognose sobre a interpretação que certa norma convencional provavelmente irá merecer se o caso for ulteriormente colocado ao TEDH, partindo, na medida do possível, de uma análise da jurisprudência mais recente e actualizada desse órgão jurisdicional internacional, proferida a propósito de situações materialmente equiparáveis á dos autos.

   Saliente-se que esta via metodológica que se propõe não implica que o Supremo Tribunal nacional tenha de seguir automaticamente a orientação que, naquele juízo de prognose, considere que provavelmente decorre da jurisprudência reiterada do TEDH, emitida anteriormente a propósito de situações materiais idênticas ou equiparáveis; na verdade, a prevalência das normas constitucionais sobre o próprio Direito Internacional convencional poderá levar a uma recusa de aplicação, com fundamento em inconstitucionalidade, da solução normativa que, resultando, naquele juízo de prognose , da jurisprudência reiterada do TEDH, se revele, no caso, conflituante com as normas e princípios da Constituição: ou seja, a verificar-se tal situação (por ex., num caso em que se considere que a compatibilização ou concordância prática dos direitos fundamentais em conflito, tal como emerge da jurisprudência corrente do TEDH, implicaria o desproporcional esmagamento ou esvaziamento de um direito fundamental de personalidade) enunciará o Tribunal esse preciso conteúdo normativo, recusando a respectiva aplicação por o considerar inconstitucional – e abrindo-se, assim, a possível via do recurso de fiscalização concreta, previsto na al. a) do nº1 do art. 70º da Lei do TC.

   É, pois, esta via metodológica que iremos seguir no caso dos autos, escolhendo como padrão ilustrativo da jurisprudência do TEDH neste domínio o Ac. de30/8/2016, proferido muito recentemente na Requête nº 55442/12 – num litígio que teve a particularidade de ter como parte o A. nos presentes autos – e em que se afirma, nomeadamente:

30. Une ingérence est contraire à la Convention si elle ne respecte pas les exigences prévues au paragraphe 2 de l’article 10. Il y a donc lieu de déterminer si la présente ingérence était « prévue par la loi », si elle visait un ou plusieurs des buts légitimes énoncés dans ce paragraphe et si elle était « nécessaire dans une société démocratique » pour atteindre ce ou ces buts.

i. Prévue par la loi

31. En l’espèce, la Cour constate que l’ingérence était prévue par les articles 70 et 484 du code civil.

ii. But légitime

32. La Cour note que l’ingérence visait un but légitime, à savoir la protection de la réputation ou des droits d’autrui au sens de l’article 10 § 2 de la Convention, ce qui peut englober, selon la jurisprudence de la Cour, le droit des personnes concernées au respect de leur vie privée protégé par l’article 8 de la Convention (Chauvy et autres c. France, no 64915/01, § 70, CEDH 2004‑VI, Pfeifer c. Autriche, no 12556/03, § 35, 15 novembre 2007, et Almeida Leitão Bento Fernandes c. Portugal, no 25790/11, § 45, 12 mars 2015).

33. La question qui se pose est donc celle de savoir si l’ingérence était « nécessaire, dans une société démocratique ». Il s’agit plus particulièrement d’examiner si les autorités ont ménagé un juste équilibre entre le droit de la requérante à la liberté d’expression et le droit de l’homme politique visé par l’article de presse au respect de sa vie privée.

iii. Nécessaire dans une société démocratique


α) Principes généraux

34. La Cour rappelle que sur le terrain de l’article 10 de la Convention les États contractants disposent d’une certaine marge d’appréciation pour juger de la nécessité et de l’ampleur d’une ingérence dans la liberté d’expression protégée par cette disposition (Tammer c. Estonie, no 41205/98, § 60, CEDH 2001-I, et Pedersen et Baadsgaard c. Danemark [GC], no 49017/99, § 68, CEDH 2004‑XI). Toutefois, cette marge d’appréciation va de pair avec un contrôle européen portant à la fois sur la loi et sur les décisions qui en font application, même quand elles émanent d’une juridiction indépendante (voir, mutatis mutandis, Peck c. Royaume-Uni, no 44647/98, § 77, CEDH 2003‑I, et Karhuvaara et Iltalehti c. Finlande, no 53678/00, § 38, CEDH 2004-X).

35. La Cour rappelle avoir dit dans son arrêt Lindon, Otchakovsky-Laurens et July c. France ([GC], nos 21279/02 et 36448/02, § 46, CEDH 2007-IV) que l’article 10 § 2 de la Convention ne laisse guère de place pour des restrictions à la liberté d’expression dans le domaine du discours et du débat politiques – dans lequel la liberté d’expression revêt la plus haute importance (Brasilier c. France, no 71343/01, § 41, 11 avril 2006) – ou des questions d’intérêt général (voir notamment Sürek c. Turquie (no 1) [GC], no 26682/95, § 61, CEDH 1999-IV, et Brasilier, précité, idem).

36. La Cour rappelle en outre que les limites de la critique admissible sont plus larges à l’égard d’un homme politique, visé en cette qualité, que d’un simple particulier : à la différence du second, le premier s’expose inévitablement et consciemment à un contrôle attentif de ses faits et gestes tant par les journalistes que par la masse des citoyens ; il doit, par conséquent, montrer une plus grande tolérance (voir, par exemple, Lingens c. Autriche, 8 juillet 1986, § 42, série A no 103, Vides Aizsardzības Klubs c. Lettonie, no 57829/00, § 40, 27 mai 2004, et Brasilier, précité, § 41). Par ailleurs, la liberté journalistique comprend aussi le recours possible à une certaine dose d’exagération, voire même de provocation (Prager et Oberschlick c. Autriche, 26 avril 1995, § 38, série A no 313, Thoma c. Luxembourg, no 38432/97, §§ 45-46, CEDH 2001‑III, Perna c. Italie [GC], no 48898/99, § 39, CEDH 2003‑V, et Riolo c. Italie, no 42211/07, § 70, 17 juillet 2008).

37. Si la presse ne doit pas franchir certaines limites, tenant notamment à la protection de la réputation et des droits d’autrui, il lui incombe néanmoins de communiquer, dans le respect de ses devoirs et de ses responsabilités, des informations et des idées sur toutes les questions d’intérêt général. Ainsi, la mission d’information comporte nécessairement des «devoirs et des responsabilités» ainsi que des limites que les organes de presse doivent s’imposer spontanément (Mater c. Turquie, no 54997/08, § 55, 16 juillet 2013, et Couderc et Hachette Filipacchi Associés c. France [GC], no 40454/07, § 89, CEDH 2015 (extraits)). La Cour rappelle également que la protection que l’article 10 offre aux journalistes est subordonnée à la condition qu’ils agissent de bonne foi de manière à fournir des informations exactes et dignes de crédit dans le respect des principes d’un journalisme responsable.

38. Lorsqu’elle est appelée à se prononcer sur un conflit entre deux droits également protégés par la Convention, la Cour doit effectuer une mise en balance des intérêts en jeu. L’issue de la requête ne saurait en principe varier selon qu’elle a été portée devant elle, sous l’angle de l’article 8 de la Convention, par la personne faisant l’objet de la publication ou, sous l’angle de l’article 10, par son auteur. En effet, ces droits méritent a priori un égal respect (Hachette Filipacchi Associés (ICI PARIS) c. France, no 12268/03, § 41, 23 juillet 2009, Timciuc c. Roumanie (déc.), no 28999/03, § 144, 12 octobre 2010, et Mosley c. Royaume-Uni, no 48009/08, § 111, 10 mai 2011). Dès lors, la marge d’appréciation devrait en principe être la même dans les deux cas (Von Hannover c. Allemagne (no 2) [GC], nos 40660/08 et 60641/08, § 106, CEDH 2012, Axel Springer AG, précité, § 87, et Almeida Leitão Bento Fernandes, précité, § 49).

39. En outre, dans les arrêts Lingens (précité, § 46) et Oberschlick (Oberschlick c. Autriche (no 1), 23 mai 1991, § 63, série A no 204), la Cour a distingué entre déclarations de fait et jugements de valeur. La matérialité des déclarations de fait peut se prouver ; en revanche, les jugements de valeur ne se prêtant pas à une démonstration de leur exactitude, l’obligation de preuve est donc impossible à remplir et porte atteinte à la liberté d’opinion elle-même, élément fondamental du droit garanti par l’article 10 (De Haes et Gijsels, précité, § 42, et Bargão et Domingos Correia c. Portugal, nos 53579/09 et 53582/09, § 37, 15 novembre 2012). Cependant, en cas de jugement de valeur, la proportionnalité de l’ingérence dépend de l’existence d’une « base factuelle » suffisante sur laquelle reposent les propos litigieux : à défaut, ce jugement de valeur pourrait se révéler excessif (De Haes et Gijsels, précité, § 47, Oberschlick c. Autriche (no 2), 1er juillet 1997, § 33, Recueil 1997‑IV, Brasilier, précité, § 36, et Lindon, Otchakovsky-Laurens et July, précité, § 55). Pour distinguer une imputation de fait d’un jugement de valeur, il faut tenir compte des circonstances de l’espèce et de la tonalité générale des propos (Brasilier, précité, § 37), étant entendu que des assertions sur des questions d’intérêt public peuvent constituer à ce titre des jugements de valeur plutôt que des déclarations de fait (Paturel c. France, no 54968/00, § 37, 22 décembre 2005, et Morice c. France [GC], no 29369/10, § 126, 23 avril 2015).

40. Si la mise en balance par les autorités nationales s’est faite dans le respect des critères établis par la jurisprudence de la Cour, il faut des raisons sérieuses pour que celle-ci substitue son avis à celui des juridictions internes (MGN Limited c. Royaume-Uni, no 39401/04, §§ 150 et 155, 18 janvier 2011, Palomo Sánchez et autres c. Espagne [GC], nos 28955/06, 28957/06, 28959/06 et 28964/06, § 57, CEDH 2011, Jelševar et autres c. Slovénie (déc.), no 47318/07, § 32, 11 mars 2014, et Almeida Leitão Bento Fernandes, précité, § 50).

β) Application des principes précités à la présente espèce

41. En l’espèce, la Cour constate que l’article litigieux a été publié dans un magazine jouissant d’une certaine crédibilité auprès du public et qu’il portait sur un sujet d’intérêt général relevant de la vie politique et sociale du pays. La marge d’appréciation dont disposaient les autorités pour juger de la nécessité de la condamnation prononcée contre la requérante au civil était, en conséquence, étroite.

42. Cela étant, la Cour rappelle que l’article 10 de la Convention ne garantit pas une liberté d’expression sans aucune restriction même quand il s’agit de rendre compte dans la presse de questions sérieuses d’intérêt général. Le paragraphe 2 de cet article précise que l’exercice de cette liberté comporte des « devoirs et responsabilités » qui peuvent revêtir de l’importance lorsque, comme en l’espèce, l’on risque de porter atteinte à la réputation de particuliers et de mettre en péril les « droits d’autrui ». Ainsi, l’information rapportée sur des questions d’intérêt général est subordonnée à la condition que les intéressés agissent de bonne foi de manière à fournir des informations exactes et dignes de crédit (Fressoz et Roire c. France [GC], no 29183/95, § 54, CEDH 1999‑I, Brunet-Lecomte et autres c. France, no 42117/04, § 47, 5 février 2009, et Barata Monteiro da Costa Nogueira et Patrício Pereira c. Portugal, no 4035/08, § 31, 11 janvier 2011). La Cour rappelle que, s’il est vrai que les adversaires des idées et positions officielles doivent pouvoir trouver leur place dans l’arène politique, discutant au besoin des actions menées par des responsables dans le cadre de l’exercice de leurs mandats publics, ils sont également tenus de ne pas dépasser certaines limites quant au respect – notamment – de la réputation et des droits d’autrui (Fleury c. France, no 29784/06, § 45, 11 mai 2010, et Barata Monteiro da Costa Nogueira et Patrício Pereira, précité, § 37).

43. La Cour a examiné l’article incriminé sans y trouver d’expressions déclarant que le demandeur avait commis des actes illicites punis d’une amende administrative (coima), comme, en l’espèce, la consommation de drogues dures au Portugal (voir, mutatis mutandis, Gouveia Gomes Fernandes et Freitas e Costa c. Portugal, no 1529/08, § 51, 29 mars 2011). Par ailleurs, même si l’on interprète les mots pertinents comme une allusion à l’existence de rumeurs sur ce sujet, dont l’article litigieux ferait l’écho, la Cour estime qu’elle n’a été utilisée par la requérante que pour appuyer sa virulente critique de la proposition législative du gouvernement dirigé à l’époque des faits par le demandeur (voir, mutatis mutandis, Riolo, précité, § 67). Contrairement aux juridictions portugaises, la Cour interprète les déclarations incriminées dans la présente affaire comme faisant partie des assertions critiques sur des questions d’intérêt public par un journaliste et constituant à ce titre des jugements de valeur plutôt que des déclarations de fait (voir, mutatis mutandis, Jerusalem c. Autriche, no 26958/95, §§ 42 et 44, CEDH 2001‑II, et Brasilier, précité, § 37). En effet, la Cour note que les cours nationales n’ont pas pris en considération la nature ironique des assertions du journaliste dans le contexte de sa critique sur les « nouvelles règles du journalisme » proposées par le gouvernement (Lepojic c. Serbie, no 13909/05, § 77, 6 novembre 2007, et Sokolowski c. Pologne, no 75955/01, 46, 29 mars 2005). Pour la Cour, il est évident que le journaliste ne voulait pas imputer la consommation de drogues dures au Premier ministre, ni répandre une telle rumeur, mais au contraire utiliser l’ironie pour contester une proposition politique qui faisait débat dans la société portugaise. Enfin, les cours nationales n’ont pas examiné, comme elles auraient dû le faire, l’existence d’une base factuelle pour la critique des « nouvelles règles du journalisme » faite par le journaliste dans l’article incriminé.

44. Dans ces conditions, la Cour estime que, tout en contenant une certaine dose de provocation, l’article de la requérante ne saurait s’analyser en une attaque personnelle gratuite à l’encontre de l’ex-Premier ministre (voir, mutatis mutandis, Kwiecień c. Pologne, no 51744/99, § 54, 9 janvier 2007, Ormanni c. Italie, no 30278/04, § 73, 17 juillet 2007, et Chalabi c. France, no 35916/04, §§ 45-46, 18 septembre 2008).

45. Les considérations qui précèdent suffisent pour conduire la Cour à conclure que l’ingérence dans la liberté d’expression de la requérante n’a pas été conforme à la Convention. Au demeurant, elle considère également que le montant des dommages moraux et de la compensation que la requérante a été condamnée à payer (30 000 EUR au total) est de nature à altérer le juste équilibre requis en la matière (voir Riolo, précité, § 71). La Cour rappelle que la nature et la lourdeur des sanctions infligées sont des éléments à prendre en considération lorsqu’il s’agit de mesurer la proportionnalité d’une ingérence (voir, par exemple, Sürek, précité, § 64, deuxième alinéa, et Chauvy et autres, précité).


   11. Passando à apreciação do caso concreto em litígio, à luz da via metodológica atrás traçada, importa realçar liminarmente que se não pode proceder a uma análise global e amalgamada do teor dos vários artigos e peças jornalísticas que integram a matéria litigiosa, já que os mesmos apresentam conteúdos, natureza e relevância substancialmente distintos – impondo-se distinguir claramente -e tratar separadamente:

- a) os que têm como objecto uma crítica – violenta e demolidora – à acção e coordenação política do A., quer enquanto Primeiro ministro, quer nos cargos autárquicos que exerceu anteriormente, envolvendo juízos valorativos fortemente negativos e depreciativos sobre as suas capacidades de actuação no plano político ( cfr. nomeadamente os pontos16, 17, 18, 37,38, 45, 46);

- b) os que têm como objecto referências e valorações a aspectos da vida privada do A., ao estilo de vida e aos relacionamentos que foi mantendo ao longo de anos, em aspectos totalmente estranhos à dita avaliação da actuação política - típicos das chamadas revistas cor de rosa ( cfr. nomeadamente pontos 19, 29, 30, 31,34, 36);

- c) os que se reportam a notícias dispersas, de crónica social, acerca de aspectos factuais ligados à vida  pessoal do visado, noticiário social acerca do estilo de vida que manteria, nomeadamente durante as férias posteriores ao início de funções naquele cargo político , bem como ao modo como decorreriam as actividades realizadas  na residência oficial, contendo várias incorrecções factuais ( cfr. nomeadamente pontos 20,  21,22, 32, 39, 44).


   Saliente-se, desde já, que são aqueles primeiros artigos de opinião, de conteúdo e valoração profundamente negativa acerca da capacidade política do visado e da acção política desenvolvida pelo seu Governo – pondo, de modo contundente e radical, em causa a idoneidade do A. para exercitar as relevantíssimas funções políticas em que fora investido - que fundamentalmente se poderão revelar atentatórios do direito à honra, ao crédito , bom nome e reputação.

   No caso das publicações e peças jornalísticas incluídas na chamada  imprensa cor de rosa , referenciadas em b), não se vê que as referências e valorações, em muitos casos factuais, feitas pelos respectivos autores acerca do estilo de vida privada e social do A. e dos relacionamentos por ele tidos ao longo de anos contenham propriamente imputações que justificadamente se possam qualificar como injuriosas ou difamatórias, susceptíveis de atentar contra o direito à honra e consideração: como se verá, o que poderia estar aqui essencialmente em causa seria a eventual violação de um direito à reserva da vida privada, afectado pela revelação e comentários feitos acerca de aspectos da vida pessoal do A., em aspectos estranhos aos cargos políticos exercidos.

  Finalmente – e no que respeita à referência a aspectos factuais, quer da vida privada, quer do modo de funcionamento da residência oficial que se apurou não corresponderem à realidade, implicando, nessa medida, quebra de deveres deontológicos dos jornalistas, ao deturpar ou ficcionar, com dolo ou, ao menos, negligência, determinados factos e situações inverídicas, destacadamente relatadas na imprensa – tudo está em saber se tal quebra da deontologia implicou, afinal, o cometimento de um acto lesivo dos direitos de personalidade do visado, qualificável como civilmente ilícito e gerador de danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, merecem a tutela do direito.


  Ora – tomando, conforme a metodologia atrás referida, como padrão de referência a jurisprudência do TEDH ,– poderá considerar-se que a qualificação como civilmente ilícitas das valorações e apreciações fortemente negativas e desprestigiantes para o A., enquanto investido em relevante cargo político e no exercício das respectivas funções, se pode enquadrar no âmbito do § 2º do art. 10º da Convenção  determinando  se tal ingerência na liberdade de imprensa – expressa na condenação proferida nos autos - se pode ter por legalmente prevista, visando um mais fins legítimos, tal como emergem da norma, e se ela se impõe como necessária numa sociedade democrática, como via para atingir tais fins?

 Os artigos em causa situam-se no cerne do debate e crítica à acção política e governativa, traduzindo essencialmente juízos valorativos profundamente negativos sobre a capacidade e idoneidade política do visado – e não propriamente imputações factuais específicas e determinadas: ora, não estando obviamente em causa a licitude de um amplo e aprofundado debate acerca da composição do Governo, da acção e das tarefas de coordenação política, desenvolvidas pelo A. no exercício do cargo em que estava investido - podendo naturalmente este escrutínio público envolver a formulação de juízos valorativos claramente críticos e negativos e, consequentemente, implicar prejuízo à imagem do político visado como homem de Estado junto dos eleitores - a questão que aqui se suscita prende-se fundamentalmente – não tanto com o conteúdo crítico das peças em questão –mas com a forma mordaz, contundente e desprimorosa como tais valorações ou juízos negativos são apresentados.


   Afigura-se, todavia, que – atentos os precedentes jurisprudenciais do TEDH , atrás referenciados , - é possível, num juízo de prognose, admitir como muito provável que, se a questão lhe viesse a ser colocada, tal órgão jurisdicional entenderia que, nos presentes autos, a forma mordaz e contundente das críticas formuladas, com uma carga claramente desprimorosa para o A. enquanto titular de relevante cargo político, se situaria ainda dentro dos limites toleráveis do exercício da liberdade de expressão e informação.

  Na verdade, o TEDH vem entendendo que – particularmente no âmbito dos artigos que visam essencialmente a expressão da opinião e a crítica políticas - está coberta pela liberdade de expressão, não apenas a discordância respeitosa, a crítica puramente objectiva e moldada pela elevação do debate – mas também a crítica contundente, sarcástica, mordaz, com uma carga exageradamente depreciativa ou caricatural da acção e capacidades do visado no plano da acção política– justificando a necessidade de uma particular tolerância deste às opiniões adversas que criticam acerbamente, chocam, ofendem ou exageram , envolvendo  porventura o uso de expressões agressivas ou virulentas:

-la Convention ne laisse guère de place pour des restrictions à la liberté d’expression dans le domaine du discours et du débat politiques – dans lequel la liberté d’expression revêt la plus haute importance

-les limites de la critique admissible sont plus larges à l’égard d’un homme politique, visé en cette qualité, que d’un simple particulier : à la différence du second, le premier s’expose inévitablement et consciemment à un contrôle attentif de ses faits et gestes tant par les journalistes que par la masse des citoyens ; il doit, par conséquent, montrer une plus grande tolérance

  Sirva, desde logo, de padrão o atrás citado Ac. de 30/8/2016, em que – apesar de tais críticas, violentas e contundentes, a determinada medida inserida na acção política desenvolvida serem acompanhadas e agravadas pela imputação ao A. de um facto que poderia assumir contornos difamatórios, o TEDH acabou por entender que cumpria interpretar les déclarations incriminées dans la présente affaire comme faisant partie des assertions critiques sur des questions d’intérêt public par un journaliste et constituant à ce titre des jugements de valeur plutôt que des déclarations de fait – notando ainda que la Cour note que les cours nationales n’ont pas pris en considération la nature ironique des assertions du journaliste dans le contexte de sa critique sur les « nouvelles règles du journalisme » proposées par le gouvernement.


  Considera-se, por outro lado, que, na especificidade do caso dos autos, este entendimento acerca deste nível de compatibilização ou concordância prática dos direitos fundamentais em confronto não envolve violação de normas constitucionais, não implicando nomeadamente a desproporcional afectação do direito à honra e bom nome do visado: para esta convicção contribui, desde logo, a circunstância de os artigos em causa serem fundamentalmente artigos de opinião e crítica política, envolvendo essencialmente juízos e apreciações valorativas ( e não propriamente factuais), escrutinando, de forma mordaz e implacável, aspectos de essencial relevância para a vida democrática – implicando apreciação fortemente negativa quanto a temas situados no núcleo duro da actividade política ( a legitimidade do visado para assumir nas exactas circunstâncias  o cargo de Primeiro Ministro, a constituição do novo Governo, a análise crítica das medidas logo apresentadas , o momento do discurso e tomada de posse, os critérios de nomeação para lugares públicos).

   Ora, neste âmbito, as exigências de uma sociedade democrática e aberta não se coadunam com a imposição de restrições formais ao exercício da actividade de escrutínio e crítica política, de modo a tornar lícitos apenas os juízos críticos da capacidade e idoneidade política do visado quando formulados com elevação, de forma correcta e objectiva - não podendo erigir-se, neste âmbito, impedimentos ou discriminações ao modo como é exercida a liberdade de expressão e opinião que poderiam funcionar, em última análise, como formas atípicas ou subliminares de censura, vedadas pelo art. 37º da Lei Fundamental.

   Por outro lado, a eventual afectação ou prejuízo da imagem do visado enquanto homem de Estado perante os eleitores, bem como a eventual diminuição da confiança na sua capacidade para o exercício de cargos de natureza política que possa decorrer do exercício do direito de opinião e crítica política, essencial ao funcionamento da própria democracia, é estritamente consequencial ao exercício desta, não podendo arvorar-se tal afectação do prestígio do homem político perante os cidadãos eleitores em afectação de direitos individuais ou pessoais fundamentais do visado.

 Considera-se, deste modo, por estas razões, que não podem qualificar-se como civilmente ilícitos os artigos e peças jornalísticas referidos em a), por as apreciações e juízos valorativos neles contidos, fortemente negativos e expressos de forma agressiva e contundente, referentes a temas situados no núcleo duro da actividade política, não atentarem desproporcionalmente contra os direitos individuais de personalidade do homem político visado.


   Como atrás se salientou acerca das peças jornalísticas referidas em b), reportadas a aspectos da vida privada do A., situados fora do perímetro da sua acção política, o que poderia essencialmente perspectivar-se era uma possível violação do direito à reserva da vida privada – que implicaria a indagação sobre se, porventura, existiriam ainda interesses públicos que justificassem adequadamente tal intromissão.

  Sucede, porém, que – como decorre da matéria de facto – o A. sempre tornou públicos aspectos da sua vida privada e familiar, participando abertamente em eventos sociais, concedendo entrevistas, participando em iniciativas e autorizando a publicação de imagens em revistas ditas cor de rosa – o que naturalmente afasta, com a revelação e apreciação de aspectos da vida pessoal, de nenhum modo pretendidos ocultar pelo A. e conhecidos do público em geral, a existência de qualquer violação relevante da reserva da vida privada.


   Resta analisar as situações de inveracidade ou incorrecção factual das notícias, qualificáveis como de crónica social, referidas sob a al. c); como se referiu ocorreu, por força de tal inveracidade, violação de deveres deontológicos, impondo-se, porém, averiguar se – apesar de tal quebra – as referidas notícias se podem configurar como facto ilícito, violador de direitos de personalidade do visado, susceptível de fundar a procedência de uma pretensão indemnizatória civil.

  Ora, percorrendo o elenco factual em causa, não vemos que a publicitação de tais notícias factualmente incorrectas seja, pela natureza dos factos em questão, susceptível de afrontar o direito à honra e consideração pessoal do visado: algumas dessas notícias de crónica social são, nesta óptica, absolutamente inócuas e irrelevantes, não se vendo como poderia atentar contra os direitos de personalidade a circunstância de o A. ter – ou não ter – jantado em determinado restaurante ou ter ou não estado, após tomada de posse nas funções de Primeiro Ministro, no T Clube ou em quaisquer outros estabelecimentos de diversão ou animação nocturna (que naturalmente se não podem ter como vedadas, censuráveis ou desprestigiantes referentemente aos titulares de cargos públicos ou políticos, no âmbito da autonomia da sua vida pessoal e privada)…

   Relativamente a notícias contendo incorrecções ou juízos factuais que, perante a matéria de facto apurada, se verificou serem incorrectas ou inverídicas, agora de algum modo conexionadas com o exercício das funções de Primeiro Ministro (exigência de reforço da segurança, ambiente pretensamente vivido na residência oficial e pessoas aí recebidas) não se vê, do mesmo modo, que tais notícias possam envolver violação relevante dos direitos de personalidade – sendo notório que, na avaliação das condições de segurança, os serviços de protecção aos titulares de relevantes cargos públicos têm natural autonomia técnica na avaliação dos ricos e consequentes medidas preventivas a adoptar e que nada Impede obviamente que o titular de um importantíssimo cargo político possa licitamente receber na sua residência oficial quem bem entender, às horas que considere adequadas…

  Concorda-se, quanto a este ponto, inteiramente com a posição tomada no voto de vencido, apendiculado ao acórdão recorrido, ao considerar que a factualidade ali especificada não se revelava, apesar da inveracidade verificada quanto a alguns pontos, objectivamente, por si, apta a afectar a honra e/ou consideração, a imagem e o bom nome de uma pessoa necessariamente exposta ao escrutínio público, por força das funções que então desempenhava e que, mesmo a título particular, nunca se incomodou de participar em eventos sociais expondo a sua vida privada e familiar ao público em geral.


  Ou seja: pela sua natureza intrínseca, as referidas situações factuais, ainda que incorrectamente noticiadas, não são idóneas para afrontar o direito à honra e consideração pessoal do visado, o que afasta decisivamente a formulação de um juízo de ilicitude para efeitos de responsabilidade civil extracontratual.

  E, assim sendo, por não se ter por verificado, quanto às peças e artigos jornalísticos em causa nos presentes autos, o requisito básico da ilicitude, decorrente da violação ilegítima de direitos de personalidade do visado, têm de improceder as pretensões indemnizatórias deduzidas, tornando-se naturalmente inútil a abordagem das questões referentes aos demais pressupostos da responsabilidade civil dos demandados.


  12. Nestes termos e pelos fundamentos apontados nega-se provimento ao recurso subordinado do A. e concede-se provimento às revistas interpostas pelos RR., revogando-se o acórdão recorrido na parte em que julgou parcialmente procedentes as pretensões indemnizatórias deduzidas, as quais se consideram totalmente improcedentes.

  Custas da acção e dos recursos pelo A./recorrente.


Lisboa, 13 de Julho de 2017


Lopes do Rego (Relator)

Távora Victor

António Piçarra