Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
148/14.4TVPRT.P1.S1
Nº Convencional: 6.ª SECÇÃO
Relator: JÚLIO GOMES
Descritores: CONTRATO-PROMESSA DE COMPRA E VENDA
ALIENAÇÃO
INCUMPRIMENTO DEFINITIVO
RESOLUÇÃO DO NEGÓCIO
ILICITUDE
CONCORRÊNCIA DE CULPAS
RESTITUIÇÃO DO SINAL
Data do Acordão: 09/12/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL – DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / OBRIGAÇÕES EM GERAL / MODALIDADE DAS OBRIGAÇÕES / OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAÇÃO / CUMPRIMENTO E NÃO CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES / REALIZAÇÃO COACTIVA DA PRESTAÇÃO / ACÇÃO DE CUMPRIMENTO E EXECUÇÃO.
Doutrina:
-ADRIANO VAZ SERRA, em anotação ao Acórdão do STJ de 14 de Maio de 1976, artigo 570.º do Código Civil, 186;
-JOÃO CALVÃO DA SILVA, Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória, Separata do Vol. XXX do Suplemento ao Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 2.ª ed., Coimbra, 1995, 130, 134, 292-293;
-JOSÉ CARLOS BRANDÃO PROENÇA, Do Incumprimento do Contrato-Promessa Bilateral, A Dualidade Execução Específica – Resolução, 2.ª ed., Separata do número especial do Boletim da faculdade de Direito de Coimbra, Estudos em Homenagem ao professor Doutor António de Arruda Ferrer Correia, Coimbra, 1996, 102 e 103.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 570.º E 830.º, N.º 3.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

- DE 14/05/1976, PUBLICADO NA RLJ N.º 3597, 180 E SS.;
- DE 18/12/1998, PROCESSO N.º 4/98, ACÓRDÃO DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA;
- DE 08/05/2013;
Sumário :
I - O promitente-vendedor que aliena a fracção prometida vender a um terceiro incumpre o contrato-promessa de compra e venda.
II - Na responsabilidade contratual a culpa do promitente-vendedor no incumprimento presume-se.
III - O promitente-comprador que resolveu ilicitamente, antes daquela alienação, o contrato-promessa, colocou-se culposamente numa situação de recusa injustificada da celebração do contrato prometido.
IV - O incumprimento do contrato pelo promitente-vendedor referido em I deveu-se, por isso, à conduta culposa de ambas as partes.
V - Neste contexto, deve proceder o pedido de resolução do contrato formulado pelo autor, promitente-comprador, e ser-lhe restituído o valor do sinal prestado, em singelo.
Decisão Texto Integral:

Processo n.º 148/14.4TVPRT.P1.S1

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça (6.ª Secção)

Relatório

AA, SA, com sede em ..., ..., ..., intentou na Comarca do ...– ...– Instância Central – 1.ª Secção Cível a presente acção declarativa sob a forma de processo comum contra BB, Ld.ª, com sede na Rua …, n.º 0 no …, pedindo que fosse declarado resolvido o contrato promessa de compra e venda celebrado entre autora e ré, devido a impossibilidade definitiva e culposa de cumprimento por parte desta; fosse condenada a ré a devolver o sinal prestado, no montante de €116.850,00, em dobro; e a pagar juros de mora desde a citação até efectivo e integral pagamento. Alegou em síntese que entre a Autora (como promitente-compradora) e a Ré (como promitente-vendedora) foi celebrado o contrato promessa de compra e venda a que se referem os autos, estando a ré definitivamente impossibilitada de cumprir a obrigação prometida por, entretanto, ter vendido a(s) fracção (fracções) a terceiros.

A Ré veio contestar por excepção, invocando caso julgado anterior, impugnando a versão dos factos tal como apresentada pela Autora e fornecendo a sua própria versão dos mesmos, que deveria conduzir à absolvição dos pedidos formulados. Deduziu, também, reconvenção, pedindo que fosse declarado o incumprimento definitivo e culposo, por parte da Autora, do contrato, e o consequente direito a fazer suas as quantias pagas a título de sinal, no valor de €116.850,00 ou, se assim não se entendesse, fosse a Autora condenada a pagar á Ré as despesas em que esta incorreu - e venha a incorrer, até ao cumprimento ou resolução do contrato - com a mora da Autora, no valor, até à data, de €38.224,01, e dos restantes danos, a apurar em execução de sentença, acrescidos dos juros de mora, à taxa legal, desde os respectivos vencimentos e até efectivo e integral pagamento.

A Autora respondeu à contestação.

Foi subsequentemente proferido despacho saneador/sentença, com o seguinte teor: “Em conclusão, tudo ponderado e ao abrigo das disposições legais supra referidas, nesta acção em que é autora/reconvinda AA, SA, e em que é ré/reconvinte BB, Ld.ª, ambas com os demais sinais dos autos, julgo improcedentes tanto a acção como a reconvenção e, em consequência, decido: A- julgar improcedente a excepção dilatória de caso julgado invocada pela ré, dela absolvendo a autora; B- Absolver a ré de todos os pedidos contra ela formulados pela autora em sede de acção, bem como absolver a autora de todos os pedidos contra si formulados pela ré em sede de reconvenção”.

Inconformada a Autora recorreu.

O Tribunal da Relação proferiu Acórdão revogando a decisão recorrida, declarando resolvido o contrato promessa de compra e venda celebrado entre as partes, por incumprimento definitivo e culposo por parte da promitente-vendedora, ora Ré/Apelada e condenando a Ré/Apelada a devolver à Autora/Apelante o sinal prestado, no montante de €116.850,00, em dobro e ainda no pagamento de juros moratórios desde a citação e até efectivo e integral pagamento.

Inconformada a Ré veio interpor recurso de revista em que pediu a revogação do Acórdão recorrido e a confirmação da sentença de 1.ª Instância.

A Autora contra-alegou, pedindo que o recurso não fosse recebido porque extemporâneo e por deficiente redacção das conclusões e defendendo a improcedência do recurso.

Fundamentação

De Facto
1. Entre a autora AA SA, na qualidade de promitente-compradora, e a ré BB Lda., na qualidade de promitente-vendedora, foi celebrado, em 07 de Dezembro de 2004, um contrato-promessa de compra e venda de uma fracção autónoma composta por uma habitação tipo T4, três lugares de garagem e um arrumo, inseridos num empreendimento denominado por “CC”, imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial do …, sob o n.º 0053 e inscrito na respectiva matriz urbana sob o artigo 0033 da freguesia de …, nesta cidade e concelho do … (doc. de fls.131 a 134, que se dá por reproduzido);
2. Com a realização da escritura de propriedade horizontal, o artigo da matriz passou a ser o 0010, a fracção autónoma, constituída pela habitação, dois lugares de garagem e arrumo passou a ser identificada pelas letras XR e o outro lugar de garagem pelas letras XU;
3. Em consequência do mesmo contrato-promessa, a título de sinal e princípio de pagamento, a autora realizou quatro prestações, no total de 116.850,00 euros;
4. A autora intentou acção de fixação de prazo para realização da escritura de compra e venda, a qual decorreu termos no 4.º Juízo, 2.ª Secção, desta comarca, sob o n.º 1963/09.0TJPRT, acabando as partes por subscrever um acordo através do qual fixaram um prazo de 90 dias para a realização da mesma;
5. Ainda entre as partes neste processo correu a acção n.º 13/09.7TVPRT, que acabou por se definitivamente julgada por acórdão do STJ datado de 8 de Maio de 2013, declarando que subsistia “repristinado” o contrato-promessa entre as partes (doc. de fls. 18 a 60, que se dá por reproduzido);
6. Tal acórdão foi objecto de reclamação, decidida pelo STJ em 21 de Janeiro de 2014 (doc. de fls. 150 a 158, que se dá por reproduzido);
7. As fracções acima prometidas vender mostram-se registadas em nome de terceira pessoa, nomeadamente a fracção designada com as letras XR, encontra-se registada na Conservatória do Registo Predial, a favor de terceira pessoa desde 2012.07.05 (docs. de fls. 13 e 16, que se dão por reproduzidos);
8. A fracção correspondente às letras XU, composta por um lugar de aparcamento automóvel, deixou de ter qualquer interesse para a promitente-compradora, pois que este só existia, caso pudesse habitar na fracção prometida vender.

De Direito

O presente recurso é interposto pela Ré BB, Ldaª do Acórdão do Tribunal da Relação que, revogando a sentença de 1.ª Instância, declarou resolvido o contrato promessa de compra e venda celebrado entre as partes, por incumprimento definitivo e culposo por parte da Ré/Apelada, condenando esta última à devolução do sinal em dobro e ao pagamento de juros moratórios desde a data da citação até ao efectivo e integral pagamento.

Nas suas contra-alegações o Autor/Recorrido defende que o recurso é extemporâneo e não pode, por conseguinte, ser admitido. E isto porque a notificação às partes do Acórdão recorrido foi feita a 12 de Janeiro de 2017 e o recurso apenas foi interposto a 22 de Fevereiro de 2017.

Não lhe assiste, contudo, razão.

É que consultando a 1.ª notificação enviada por carta registada que foi devolvida (f.397) verifica-se que na mesma a morada indicada era “Centro …., rua …, 000, X-00, 0000-000 …”. Não era essa, no entanto, a morada que constava de várias peças juntas ao processo: assim, por exemplo o requerimento a ff. 258 e ss. aonde se indica “Rua … 000, X-0” ou a f.321 onde se refere “Rua … 000, Edif. X-0”. Assim a primeira notificação enfermava de lapso do Tribunal, lapso esse que não pode prejudicar o ora Recorrente.

E também não há razão para rejeitar o recurso só porque o Recorrente formula 60 Conclusões que são em parte a reprodução do alegado. A técnica de formulação das conclusões poderia levar este Tribunal a pedir que as mesmas fossem mais concisas ou formuladas de modo tecnicamente mais adequado, mas tal não foi reputado necessário.

Do recurso resultam as seguintes questões:
1) A venda pelo promitente-vendedor da fracção prometida a um terceiro representa ou não um incumprimento do contrato-promessa?
2) Em caso afirmativo a quem é que esse incumprimento é imputável na situação dos autos? E pode falar-se de culpa do promitente-vendedor?
3) Atendendo à resposta à questão anterior pode o promitente-comprador resolver o referido contrato-promessa? E terá direito, como pretende, à devolução do sinal em dobro com juros desde a data da citação?

Relativamente à primeira questão, a venda a um terceiro pelo promitente-vendedor da fracção que este prometeu vender ao promitente-comprador representa por parte daquele um incumprimento do contrato-promessa, ao contrário do que afirmou o Acórdão recorrido que o configurou como uma mera recusa ilegítima de incumprimento. O nosso ordenamento admite a figura da promessa de venda de coisa alheia, mas essa é uma figura distinta, sendo que o promitente-vendedor ao alienar a fracção que prometeu vender a outrem se colocou em uma situação em que já não pode legitimamente dispor da coisa que anteriormente prometeu vender. O AUJ n.º 4/98 de 18 de Dezembro afirma expressamente que “o promitente-vendedor [que] em lugar de cumprir a obrigação assumida no contrato-promessa, aliena a terceiro a coisa objecto do contrato prometido (…) cai na situação de impossibilidade de cumprimento”.

Esta impossibilidade de cumprimento será, em regra, culposa, sendo que, de resto, a culpa do devedor se presume na responsabilidade contratual. Mas terá o promitente-vendedor no caso dos autos ilidido a presunção?

Recorde-se que esta é uma situação em que entre as mesmas partes correu a acção n.º13/09.7TVPRT que foi definitivamente julgada por Acórdão do STJ de 8 de Maio de 2013, o qual decidiu que o Autor nesse processo – que é também o Autor deste – não tinha direito à resolução do contrato nem à indemnização correspondente ao dobro do sinal, pelo que “o contrato-promessa continua a vincular ambas as partes” e considerou tal contrato repristinado. Em suma, a resolução do contrato pelo promitente-comprador foi considerada ilícita porque não foi precedida de interpelação admonitória, tendo o Tribunal aderido á tese de que a resolução ilícita é ineficaz.

No entanto, é preciso atender a que a mora do promitente-vendedor passou a ser acompanhada de uma resolução a qual, ainda que ineficaz, foi ilícita por parte do promitente-comprador e que significou que o promitente-comprador não estava disponível, pelo menos pela duração da acção anterior, para celebrar o contrato prometido.

O Tribunal sublinhou, é certo, que “não pode a inércia do promitente-comprador ser interpretada como uma conduta concludente, reveladora de uma deliberada e definitiva intenção de não cumprir a obrigação contratual de celebrara a escritura, não sendo subsumível o caso á situação do não cumprimento definitivo, não tendo, por outro lado, o promitente vendedor demonstrado que perdeu o interesse na prestação, objectivamente apreciado, nem procedido à interpelação admonitória do promitente-comprador” (Conclusão II).

Nada disto afasta, todavia, a conclusão de que embora subsistindo o contrato passou a existir uma violação do mesmo por ambas as partes e à mora do promitente-devedor passou a acrescer um comportamento culposo do promitente-comprador – uma resolução ilícita – que o colocou temporariamente em uma situação de recusa injustificada da celebração do contrato prometido, com a concomitante violação do seu dever de colaborar na realização do contrato pelo devedor[1].

E mesmo repristinado o contrato-promessa não parece que fosse exigível ao promitente-vendedor manter durante anos a fio a propriedade da fracção. Com efeito, esta terá sido alienada antes da anterior decisão do STJ (cfr. facto n.º 7: a fracção correspondente ao apartamento em causa acha-se registada na Conservatória do Registo Predial a favor de terceira pessoa desde 05 de Julho de 2012, data, portanto, anterior a 8 de Maio de 2013) em um momento em que a aparência criada pelo promitente-comprador ao resolver (ilicitamente) o contrato-promessa em vez de exigir a sua execução específica como podia (n.º 3 do artigo 830.º do Código Civil) era a de que não estava primordialmente interessado na transmissão da propriedade. Ao que acresce que seria excessivo para o promitente-vendedor o prejuízo de manter nessas condições “imobilizado” o activo.

Em suma, o incumprimento pelo promitente vendedor deve-se, no fim de contas, à conduta culposa de ambas as partes, a uma violação recíproca do contrato, resultante da mora do promitente vendedor, mas também da resolução ilícita do contrato pelo promitente-comprador que não sendo eficaz, nem por isso deixou de ser ilícita.

A jurisprudência deste mesmo Supremo Tribunal de Justiça – sirva de exemplo já o Acórdão do STJ de 14 de Maio de 1976[2] – e uma parte importante da doutrina têm-se orientado no sentido de que é possível pedir a resolução do contrato nestas situações[3] e, sobretudo, que, em tais situações, se justifica a aplicação do artigo 570.º do Código Civil[4]. Com efeito, não é por ter existido uma primeira situação de mora do devedor que a resolução ilícita do promitente-comprador deixa de relevar para este efeito.

As condutas das partes equivalem-se, atendendo não só ao grau de culpa, mas também às suas consequências. Com efeito, se o promitente-vendedor não compareceu ou se atrasou reiteradamente às escrituras de celebração do contrato definitivo, a resolução ilícita do promitente-comprador, porque não eficaz, impediu o cumprimento do contrato durante anos.

Assim sendo, a solução deverá ser a da procedência do pedido de resolução apresentado pelo Autor, promitente-comprador, com a restituição pelo promitente vendedor do sinal recebido, mas em singelo.

Quanto ao pedido de juros feito pelo Autor este reporta-se à restituição do sinal relativamente á qual o ora Recorrente se acha efectivamente em mora pelo menos desde a data da citação (e é a essa data que se reporta o pedido).

Decisão: Concedida parcialmente a revista, revogando-se o Acórdão recorrido e decidindo-se que procede o pedido de resolução do contrato pelo promitente-comprador, ficando o promitente-vendedor obrigado à restituição do sinal em singelo, com juros desde a data da citação na presente acção.

Custas a dividir igualmente pelas Partes

Lisboa, 12 de Setembro de 2017

Júlio Gomes – Relator

José Rainho

Salreta Pereira

_______________________________________________________
[1] JOÃO CALVÃO DA SILVA, Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória, Separata do Vol. XXX do Suplemento ao Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 2.ª ed., Coimbra, 1995, depois de sublinhar que, em princípio, o interesse do devedor no cumprimento não tem a mesma protecção e a mesma importância que o interesse do credor (p. 130: “não há (…) paralelismo entre a falta de cooperação do credor, geradora da mora credendi, e o incumprimento do devedor, gerador da mora debendi”), acaba por afirmar a existência em certas situações de um verdadeiro dever de cooperação por parte do credor, apontando como exemplo o contrato-promessa: “Outro exemplo de obrigação de cooperar no cumprimento surge no contrato-promessa. De facto, o consentimento que cada um dos contraentes deve prestar para celebrar o contrato definitivo é, simultaneamente, cumprimento da própria obrigação e concurso necessário ao cumprimento da outra parte” (ob. cit., p. 134).
[2] Publicado na RLJ n.º 3597, pp. 180 e ss.
[3] JOÃO CALVÃO DA SILVA, ob. cit., pp. 292-293: “o facto de o não cumprimento ser imputável, em igual medida a ambas as partes, não deve precludir o direito de resolução de uma delas nos contratos com prestações correspectivas”.
[4] ADRIANO VAZ SERRA em anotação ao referido Acórdão do STJ de 14 de Maio de 1976 afirma que “esta [o artigo 570.º do Código Civil] é a disposição a aplicar na hipótese de contrato-promessa não cumprido por culpa de ambos os contraentes, donde deriva que a restituição do sinal em dobro pode ser totalmente concedida, reduzida ou excluída, conforme a gravidade das culpas de ambas as partes e as consequências delas resultantes” (p. 186). Também JOÃO CALVÃO DA SILVA, ob. cit., p.292, sustenta a aplicação nestes casos do artigo 570.º do Código Civil: “Quer-nos parecer que o caso de não cumprimento bilateralmente imputável do contrato deve ser resolvido, tendo por base as normas gerais, pela compensação de culpas concorrentes, verificados os referidos pressupostos (art. 570.º)”. Por seu turno, JOSÉ CARLOS BRANDÃO PROENÇA, Do Incumprimento do Contrato-Promessa Bilateral, A Dualidade Execução Específica – Resolução, 2.ª ed., Separata do número especial do Boletim da faculdade de Direito de Coimbra, Estudos em Homenagem ao professor Doutor António de Arruda Ferrer Correia, Coimbra, 1996, ainda que sublinhe que a “a culpa do promitente-autor está ligada a um ilícito contratual e é aqui sempre uma culpa em sentido próprio ou perante a contraparte, o que parece não acontecer no art. 570.º, já que o lesado não transgride qualquer dever jurídico” (p.102), acaba por concluir que “ a diversidade apontada não afasta, contudo, a aplicação da ideia contida no art. 570.º, tendo o tribunal que proceder, sobretudo, à indagação do grau de culpas concorrentes (normalmente terá que se presumir uma igualdade) e às repercussões da frustração contratual (que pode ter beneficiado uma das partes em detrimento da outra), em ordem à fixação ou não da indemnização ou à sua maior ou menor extensão (haja sinal ou não, tenha havido tradição ou não)” (p. 103; o itálico é do Autor).