Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1786/10.0PBGMR-A.G1-A.S1
Nº Convencional: 5ª SECÇÃO
Relator: HELENA MONIZ
Descritores: ACÓRDÃO PARA FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
PENA DE PRISÃO
SUBSTITUIÇÃO DA PENA DE PRISÃO
PENA DE MULTA
PRESTAÇÃO DE TRABALHO A FAVOR DA COMUNIDADE
TRÂNSITO EM JULGADO
Data do Acordão: 02/18/2016
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: DR, I SÉRIE, 56, 21.03.2016, P. 896 - 908
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO EXTRAORDINÁRIO DE FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Decisão: FIXADA JURISPRUDÊNCIA
Área Temática:
DIREITO PENAL - CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DO FACTO / PENAS / SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA DE PRISÃO / ESCOLHA E MEDIDA DA PENA.
DIREITO PROCESSUAL PENAL - EXECUÇÃO DAS PENAS / EXECUÇÃO DA PENA DE MULTA.
Doutrina:
- Actas das sessões da Comissão Revisora do Código Penal, Lisboa: Ministério da Justiça, 1966, II vol., 36, 40, 41, 52.
- Actas e projecto da Comissão de Revisão, Ministério da Justiça, Lisboa: Rei dos Livros, 1993, p. 21, 24/25, 28, 466.
- Anabela Miranda Rodrigues, «A determinação da medida concreta da pena privativa da liberdade e a escolha da pena», R.P.C.C. (Revista Portuguesa de Ciência Criminal), 1991, 243 e ss.; «Critério de escolha das penas de substituição no Código Penal português», Estudos em homenagem ao Prof. Doutor Eduardo Correia, I, Coimbra, 1984, 21 e ss..
- Eduardo Correia, Direito Criminal, vol. II, Coimbra: Almedina, 1993 (reimpressão), 394-5.
- Figueiredo Dias, «A pena de multa de substituição», R.L.J., ano 125.º, n.º 3820, 205/206;
- Germano Marques da Silva, Direito Penal Português, vol. III, Lisboa: Verbo, 2008, 235-6.
- Hélio Rodrigues, «Cumprimento da pena de multa de substituição», R.M.P., ano 33, n.º 131 (jul.-set.2012), 191 e ss., em particular, 194, 205, 211.
- Luís Osório, Comentário ao Código de Processo Penal Português, Coimbra: Coimbra Editora, 1934, 6.º vol., 277.
- Maria João Antunes, Consequências jurídicas do crime, Coimbra: Coimbra Editora, 2015, 107.
- Odete Maria de Oliveira, «Penas de substituição», Jornadas de Direito Criminal. Revisão do Código Penal (alterações ao sistema sancionatório e parte especial), Vol. II, Lisboa: C.E.J., 1998, 55 e ss, em especial 73 e ss..
- Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código Penal, Lisboa: UCP, 2015, art. 43.º/ nota 7 (284) e art. 48.º/nota 2 (300).
- Procuradoria Geral da República, Parecer n.º 99/52, de 13.11.1952, no BMJ, n.º 37 (julho, 1953), 86 e ss. (em particular 86 e 90).
- Simas Santos e Leal-Henriques, “Código Penal” Anotado, Lisboa: Rei dos Livros, 2014, 655.
- Sónia Fidalgo, «Pena de multa de substituição», R.P.C.C., 2010, 16, 158.
Direito Penal Português — As consequências jurídicas do crime, Lisboa: Æquitas/Ed. Notícias, 1993, § 168 (p. 139), § 557 e ss. (363 e ss.), § 491 (327-8), §§ 496 e ss. (330 e ss), § 505 (335), § 550 (359), § 554 (361), § 555 (362), § 568 e ss. (369 e ss.).
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL (CPP): - ARTIGOS 489.º, 490.º, 491.º.
CÓDIGO PENAL (CP): - ARTIGOS 40.º, 43.º, N.º1, 47.º, N.ºS 3 E 4, 48.º, 49.º, 55.º, 56.º, N.º1, AL. A), 70.º.
Jurisprudência Nacional:
JURISPRUDÊNCIA DAS RELAÇÕES:

-ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA, DE 17-04-2013, PROC. N.º 418/09.3PASXL.L1-3, ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA, DE 11-03-2015, PROC. N.º 291/06.3PTAMD.L1-3, ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE PORTO, DE 19-06-2013, PROC. N.º 28/09.5GDVFR-A.P1, ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE PORTO, DE 11-06-2014, PROC. N.º 659/12.6PIVNG-A.P1.— TODOS EM WWW.DGSI.PT .
-ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA, DE 25-08-2004 (CJ, ANO XXIX, TOMO IV, P. 256 E SS), E ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA, DE 09-10-2013, PROC. N.º 1006/01.8GISNT.L1-3, ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE PORTO, DE 22-06-2011, PROC. N.º 1144/10.6GBAMT-A.P1, ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA, DE 24-04-2013, PROC. N.º 1142/10.0PTAVR.C1, ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE PORTO, DE 25-11-2015, PROC. N.º 70/14.4PGGMD.P1, ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA, DE 26-03-2014, PROC. N.º 472/12.0GBPMS-A.C1, ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA, DE 16-10-2007, PROC. N.º 1357/07-1, ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA, DE 03-03-2015, PROC. N.º 263/13.1GBSLV-A.E1, ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES, DE 04-02-2013, PROC. N.º 607/07.2GAEPS-A.G1, ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES, DE 30-06-2014, PROC. N.º 226/12.4GAEPS-A.G1, TODOS EM WWW.DGSI.PT .

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SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-ACÓRDÃO DE 21.03.1991, PUBLICADO NA R.P.C.C., 1991, 243-248.

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-ACÓRDÃO DE FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA N.º 8/2013 (DR, 1.ª SÉRIE-A, 19.04.2013).
-ACÓRDÃO DE FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA N.º 12/2013 (DR, 1.ª SÉRIE-A, 16.10.2013)
-ACÓRDÃO DE FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA N.º 13/2013 (DR — 1.ª SÉRIE-A, 17.10.2013)
Sumário :
«Em caso de condenação em pena de multa de substituição, nos termos do art. 43.º, n.º 1, do CP, pode o condenado, após o trânsito em julgado daquela decisão, requerer, ao abrigo do disposto no art. 48.º, do CP, o seu cumprimento em dias de trabalho, cumpridos os requisitos dos arts. 489.º e 490.º, do CPP».
Decisão Texto Integral:

Acordam no Pleno das Secções Criminais do Supremo Tribunal de Justiça:


I

           1. No âmbito do processo n.º 1786/10.0pbgmr-A.G1, AA, arguido neste processo e identificado nos autos, veio, ao abrigo do disposto no art. 437.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, interpor, para o pleno das secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça, recurso extraordinário para fixação de jurisprudência (mediante requerimento apresentado a 23.05.2014) com fundamento em oposição de acórdãos da Relação — o acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 23.04.2014, proferido no processo referido, e o acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 24.05.2011, proferido no processo n.º 2239/09.4PAPTM.E1.

            Em síntese, alega que os acórdãos estão em oposição sobre a mesma questão de direito relativa à possibilidade (ou não) de pagamento da pena de multa, enquanto pena de substituição, em dias de trabalho (ambos os acórdãos foram proferidos ao abrigo do disposto nos arts. 43.º, 48.º, 49.º e 58.º, todos do Código Penal (doravante, CP), e nos arts. 489.º e 490.º, do Código de Processo Penal (doravante, CPP).

            2. Em conferência, por acórdão de 08.01.2015, foi decidido que o recurso devia prosseguir por se verificar oposição de julgados sobre a mesma questão fundamental de direito, em situações factuais idênticas, e no domínio da mesma legislação.

3. Após o cumprimento do disposto no art. 442.º, n.º 1, do CPP, o recorrente e o Ministério Público apresentaram as alegações. 

3.1. O recorrente, AA, em síntese, concluiu que o conflito de jurisprudência «deve ser resolvido no sentido de admitir que o condenado em pena de multa de substituição possa requerer, ao abrigo do artigo 48.º do C.P e 490.º do C.P.P. — no prazo de pagamento de 15 dias após o trânsito em julgado, de acordo com o artigo 489.º do C.P.P. — o seu cumprimento através da prestação de dias de trabalho».

3.2. O Ministério Público, em síntese, aderiu à posição do acórdão fundamento.

Começou por fazer uma exposição sobre as penas de substituição no âmbito do CP e distinguiu o regime da pena de multa principal da pena de multa de substituição. Se numa e noutra a determinação da pena de multa deve obedecer às exigências de prevenção geral e especial que se impõem no caso, tendo como limite a culpa do agente (assim demonstrando que também na pena de multa há uma determinação autónoma desta e, portanto, “não há (...) lugar a qualquer tipo de correspondência entre a duração da pena de prisão e a duração da pena pecuniária que a substitui”), outra coisa acontece quando a pena de multa não é cumprida: num caso terá que cumprir prisão subsidiária com redução de 1/3, o mesmo não acontecendo no caso da pena de multa de substituição cujo regime de incumprimento leva ao cumprimento da pena principal em que o agente tenha sido condenado (ou seja, a pena de prisão estipulada na sentença, sem que haja lugar a qualquer redução).

Depois, desenvolveu o seu raciocínio a partir da ideia de que a pena de multa de substituição tem um modo de determinação autónomo, e um certo regime de execução. As especificidades desse regime resultam da “impossibilidade de conversão da multa [de substituição] em prisão subsidiária”, e da “impossibilidade de o condenado — após o trânsito em julgado do despacho que julgue verificado o incumprimento da pena de substituição — poder eximir-se ao cumprimento da pena de prisão, pagando a multa” (itálico nosso). Acrescentando que “da leitura conjugada das normas dos artigos 48.º e 49.º do CP e 489.º e 490.º do CPP decorre que a prestação de dias de trabalho é considerada pela lei como uma forma, equivalente ao pagamento voluntário da pena pecuniária, inserida no processo de execução desta” (itálico nosso). E acrescenta: “uma vez que, no decurso do prazo previsto para o pagamento voluntário, o condenado pode requerer a substituição por dias de trabalho, é evidente que o processo de cumprimento/execução da pena de multa está ainda longe de se mostrar ultimado, pois acaba de iniciar‑se a sua primeira etapa, não podendo por isso julgar‑se, de modo algum, verificada uma situação de incumprimento ― esse sim, se declarado pelo Tribunal, a implicar, nos termos da norma do n.º 2 do artigo 43.º, a execução da pena de prisão substituída.”

A solidificar este entendimento demonstrou que na versão inicial do CP (1982) estava expressamente consagrada a possibilidade de pagamento da pena de multa em dias de trabalho. E esta mesma possibilidade estava prevista quer na proposta de lei n.º 105/III, quer no anteprojeto de revisão do CP de julho de 1987. E assim também no anteprojeto de revisão do CP que deu lugar à reforma de 1995, onde a partir dos trabalhos preparatórios se demonstra “claramente que nunca foi sequer questionada a aplicação da substituição por dias de trabalho da multa imposta ao abrigo da norma do artigo 43.º, n.º 1 do Código Penal”.

E assim concluiu, considerando que a jurisprudência a fixar deveria ser «no sentido da aplicabilidade da norma do artigo 48.º do CP à pena de multa de substituição imposta ao abrigo da norma do artigo 43.º, n.º 1 do CP, podendo o condenado requerer, após o trânsito em julgado da decisão que impôs a pena de multa de substituição, e de acordo com as normas do artigo 490.º, n.º 1 do CPP, a substituição da multa por dias de trabalho».


II


1. A decisão, tomada na secção criminal por acórdão de 08.01.2015, sobre a oposição de julgados, não vincula o pleno das secções criminais. Por isso devemos reapreciar a questão.

2.1. O acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães foi prolatado a 23.04.2014 e transitou em julgado a 12.05.2014. O recurso foi, tempestivamente, interposto a 23.05.2014, de acordo com o disposto no art. 438.º, n.º 1 do CPP.

O acórdão fundamento do Tribunal da Relação de Évora foi proferido a 24.05.2011 e transitou em julgado a 20.06.2011.

Ambos os acórdãos proferem decisões ao abrigo do disposto nos arts. 43.º, 48.º, 49.º e 58.º, todos do CP, e arts. 489.º e 490.º, do CPP — qualquer um dos dispositivos tem a mesma redação e não foi objeto de modificação legislativa entre a data da prolação do acórdão fundamento e a data de prolação do acórdão recorrido, pelo que se considera estar verificado o pressuposto do art. 437.º, n.º 3, do CPP.

2.2. No âmbito deste processo, o recorrente foi condenado na pena de sete meses de prisão substituída por 210 dias de multa, à taxa diária de € 6,00, num total de € 1260,00. No acórdão fundamento o arguido foi condenado numa pena de prisão de quatro meses, substituída por 120 dias de multa, à taxa diária de 5€, num total de € 600.

Nos presentes autos, o recorrente, após interposição de recurso da decisão do Tribunal Judicial da Comarca de Guimarães, de 18.09.2012, foi condenado por acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 08.04.2013, notificado por carta registada de 09.04.2014. E a 09.05.2014, o agora recorrente deu entrada de um requerimento segundo o qual solicitava, ao abrigo do disposto no art. 490.º, n.º 1, do CPP, a “substituição” da multa por dias de trabalho, dado que estava desempregado, não auferia qualquer rendimento, vivia com os pais, e não tinha maneira sequer de obter rendimento para o pagamento da multa em prestações.

O requerimento foi indeferido, e deste indeferimento recorreu para o Tribunal da Relação de Guimarães, que proferiu o acórdão agora recorrido. Considerou este tribunal que a pena de multa de substituição não pode ser substituída por dias de trabalho, entendendo que o Recorrente confunde pena de multa principal com pena de multa de substituição, pelo que não seria pertinente convocar, nomeadamente, o disposto no art. 490.º, do CPP. E para tanto invocando jurisprudência que entende que em caso de incumprimento da pena de multa de substituição o arguido terá que cumprir a pena de prisão principal em que foi condenado.

2.3. O acórdão fundamento entende que se deve fazer uma distinção entre a pena (de substituição) de prestação de trabalho a favor da comunidade e a prestação de dias de trabalho (prevista no art. 48.º, do CP e art. 490.º, do CPP) enquanto modalidade de execução da pena de multa em que foi condenado, e desde que o condenado realize o pedido correspondente, considerando que este pedido pode também ser realizado quando se trata de condenação em pena de multa de substituição.

2.4. Entende-se, pois, que quer os requisitos formais, quer os requisitos substanciais de admissibilidade do recurso extraordinário de fixação de jurisprudência estão preenchidos, nomeadamente, a necessária oposição de julgados dado que têm soluções contrárias para a mesma questão de direito: pode o condenado em pena de multa de substituição, requerer, ao abrigo do art. 48.º, do CP, e do art. 490.º, do CPP — no prazo (de pagamento) de 15 dias, após o trânsito em julgado, de acordo com o disposto no art. 489.º, do CPP —, o seu cumprimento, a sua execução, através da prestação de dias de trabalho?

3. A partir de uma análise da jurisprudência conclui-se, na verdade, que as soluções ora oscilam no sentido de não admitir a execução da pena de multa de substituição em dias de trabalho, ora no sentido de admitir esta forma de execução.

Por um lado, existe jurisprudência[1] defendendo (tal como no acórdão fundamento) a possibilidade de execução da pena de multa em dias de trabalho, alegando que o art. 43.º, n.º 1, do CP, não afasta a possibilidade de, em fase de pagamento voluntário, a pena de multa poder vir a ser “substituída” por trabalho, sendo, no entanto, o regime diferente se o condenado entrar em incumprimento, caso em que terá de cumprir a pena de prisão aplicada, nos termos do art. 43.º, n.º 2, do CP; apenas haverá lugar à aplicação do disposto no art. 49.º, n.º 3, do CP, quando o condenado, tendo entrado em incumprimento, este não lhe é imputável, assim se permitindo a suspensão da execução da pena de prisão principal. E com isto surge um outro argumento: se o regime é idêntico no caso de incumprimento não imputável ao condenado, quer estejamos perante uma pena de multa principal, quer perante uma pena de multa de substituição, também numa situação análoga (a situação em que o condenado, estando impossibilitado de pagar, requer o pagamento em dias de trabalho) o regime deve ser idêntico, considerando que seria incompreensível que o regime seja idêntico em caso de incumprimento não imputável ao condenado e, todavia, diferente (por admissível num caso, e inadmissível em outro) quando o condenado pede para pagar a multa em dias de trabalho. E assim concluindo que o constrangimento económico e financeiro subjacente à aplicação da pena de multa de substituição também é alcançado com o seu pagamento em dias de trabalho, e do mesmo modo se alcançando as finalidades da punição.

Por outro lado, existe jurisprudência[2] que segue o defendido pelo acórdão recorrido, considerando que não pode haver “substituição da substituição” partindo, pois, de um equívoco — o do entendimento de que o pagamento da multa em dias de trabalho constitui uma pena de substituição, e não uma forma diferente de execução da pena de multa. E por isto concluem que, ou a pena de multa de substituição é paga em numerário imediatamente, ou a prazo, ou em prestações, ou não ocorrendo o pagamento em nenhuma destas modalidades o condenado entra em incumprimento, e apenas haverá lugar à suspensão da execução da pena de prisão principal, se o incumprimento não for imputável àquele.

O que tem como consequência que o condenado sem meios económicos e financeiros (e, portanto, impossibilitado de pagar a pena de multa) se tiver sido condenado numa pena de multa principal ainda poderá requerer o seu pagamento em dias de trabalho, mas se tiver sido condenado em multa de substituição não poderá cumprir (ainda que assim seja a sua vontade) a pena que lhe foi aplicada, e terá que aguardar pela decisão do juiz que lhe suspenda a execução da pena de prisão principal.

À luz desta diferença, cumpre esclarecer se aquele que é condenado em multa de substituição deverá ser remetido para uma situação de incumprimento, ainda que pretenda pagar em dias de trabalho a multa em que foi condenado, aderindo voluntariamente, deste modo, às finalidades da punição.

4. Analisemos o problema que se coloca tendo em conta os seguintes aspetos:

a)  as penas de substituição e o caso da pena de multa de substituição;

b) a execução da pena de multa: cumprimento voluntário, o pagamento coercivo; o não pagamento da pena de multa;

c) os antecedentes da pena de multa de substituição no anterior CP português (1852/1886) e o regime criado pelo CP de 1982; a revisão de 1995;

d) resposta à questão colocada no âmbito desta fixação de jurisprudência.

4.1. O nosso sistema de reações criminais tem como ponto nuclear uma preferência pelas penas não privativas da liberdade relativamente às penas privativas da liberdade. Nos termos do art. 70.º, do CP, sempre que as penas não privativas da liberdade permitam assegurar as finalidades da punição (cf. art. 40.º, do CP) devem ser estas as escolhidas. Esta escolha pode ocorrer em um de dois momentos: ou numa fase inicial da determinação da medida da pena quando o tipo legal de crime preenchido pela conduta do agente prevê a possibilidade de aplicação de uma pena de prisão ou de uma pena de multa, em alternativa[3], ou numa fase ulterior, depois da determinação da medida concreta da pena e atenta a sua duração há ainda possibilidade de aplicação de uma pena de substituição[4]. Em ambos os casos o juiz deve dar preferência à pena não privativa da liberdade “sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades de punição” (art. 70.º, do CP), isto é, sempre que a aplicação daquela permita concluir que a “protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade” (art. 40.º, n.º 1, do CP) estão asseguradas[5]. Naquele dispositivo reside o “reflexo de uma orientação político-criminal bem definida”[6] — a luta contra as penas curtas de prisão.

Ora, quando, uma vez determinada a medida concreta da pena principal, o juiz escolhe aplicar uma pena de substituição, terá ao seu dispor um leque variado de penas de substituição: umas privativas da liberdade, como por exemplo a prisão por dias livres ou o regime de semidetenção, e outras não privativas da liberdade (também designadas como penas de substituição em sentido próprio) como a suspensão da execução da pena de prisão, ou a pena de multa.

As penas de substituição caracterizam-se como sendo aplicadas em vez da pena principal, constituindo pena principal a pena que está expressamente prevista no tipo legal de crime, o que no nosso ordenamento jurídico se reduz à pena de prisão e à pena de multa, no que respeita às penas aplicáveis às pessoas singulares[7].

Mas a pena de multa, para além de constituir uma pena principal, é também uma pena de substituição aplicada em vez da pena principal de prisão quando esta não tenha duração superior a 1 ano (cf. 43.º, do CP). A pena de multa de substituição integra-se na classificação dogmática das penas de substituição em sentido próprio, pois permite o cumprimento da sanção em liberdade (assim cumprindo a exigência de uma preferência por penas não detentivas ou não privativas da liberdade), correspondendo “deste modo, pelo melhor, aos propósitos político-criminais de movimento de luta contra a pena de prisão”[8], e como pena de substituição que é pressupõe uma determinação prévia de uma pena curta de prisão, isto é, uma pena de prisão com duração inferior a 1 ano. Na verdade, a “luta decidida contra a frequência da aplicação da pena de prisão marcou, desde a primeira hora — desde a apresentação, por Eduardo Correia, do seu Projeto da Parte Geral do Código Penal, em 1963 — o movimento de reforma do direito penal português que veio a culminar com a publicação do Código Penal de 1982”[9], uma “decisiva luta movida contra a execução da pena de prisão de curta e média duração e, consequentemente, a sua substituição por outros meios de reacção de natureza penal”[10]. Na verdade, desde os finais do séc. XIX que se iniciou um movimento no sentido de reduzir a aplicação da pena de prisão e, em particular, reduzir a aplicação de penas curtas de prisão, dado que “à pena curta de prisão não podia caber a satisfação de qualquer das finalidades que a pena deveria cumprir: nem de prevenção especial (...), nem de prevenção geral”[11].

 Ora, a pena de multa de substituição constitui a “medida substitutiva por excelência da prisão” (preâmbulo ao CP, ponto II.10) e tem como objetivo primordial a luta contra o efeito criminógeno das penas curtas de prisão — “é sabido que penas curtas de prisão não permitem realizar (ou sequer tentar realizar) a finalidade da reinserção social, sendo, em contrapartida, apontadas como especialmente criminógenas”[12] e “potenciador[as] da reincidência”[13]. Ou, nas palavras de Figueiredo Dias, “as penas curtas de prisão (...) nem possibilitam uma actuação eficaz sobre a pessoa do delinquente no sentido da sua socialização; nem exercem uma função de segurança relevante face à comunidade”[14].

Por isto “a multa de substituição é pensada como meio de obstar, até ao limite, à aplicação das penas curtas de prisão e constitui, assim, um específico instrumento de domínio da pequena criminalidade”[15].

Na verdade, apesar de a solução ideal ser a de retirar do catálogo das penas aplicáveis as penas de prisão de curta duração, o legislador não optou por esta solução, mas uma outra: a de determinar, em regra, a substituição da pena de prisão inferior a 1 ano por uma pena de multa, a não ser que “a execução da prisão [seja] exigida pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes” (cf. art. 43.º, n.º 1, do CP) — assim se consagrando o chamado sistema de substituição-regra[16].

Assim sendo, as penas de substituição em geral, e a pena de multa de substituição em particular, constituem um meio que, possibilitando ainda o cumprimento das finalidades da punição, permite lutar contra os efeitos nocivos que o cumprimento de uma pena curta de prisão implica —  as penas curtas de prisão “transportam consigo o risco sério de dessocializar fortemente o condenado, ao pô‑lo em contacto, durante um período curto, com o ambiente deletério da prisão; curto, mas, em todo o caso, suficientemente longo para prejudicar seriamente a integração social do condenado, máxime, ao nível familiar e profissional. Por sobre tudo isto, a pena curta de prisão representa para as autoridades encarregadas da execução um enormíssimo peso, que nem ao menos possui a virtualidade de ser compensado por oportunidades razoáveis de socialização”[17].

4.2. As penas de substituição, como vimos, sendo aplicadas em vez da pena principal, têm como finalidade primordial evitar a execução de uma pena efetiva de prisão sempre que as exigências de prevenção o imponham. Dadas as diferenças entre uma pena de substituição e uma pena principal justifica-se a manutenção da diferença sempre que estejamos perante uma situação de incumprimento.

Na verdade, em caso de incumprimento de uma pena de substituição, deve o condenado cumprir a pena que foi substituída, a pena de prisão em que foi condenado; o incumprimento da pena de substituição demonstra que as exigências impostas pela prevenção, em particular as exigências decorrentes da prevenção especial de socialização que haviam mostrado ser mais conveniente, sob o ponto de vista daquela socialização, não aplicar aquela pena de prisão, falharam. Além de que a aplicação daquela pena de substituição teve também em conta as exigências de prevenção geral, tendo-se considerado que o “sentimento de reprovação social do crime” (Beleza dos Santos) ou o “sentimento jurídico da comunidade” (acórdão do STJ, de 21.03.1991, relator: Cons. Manso Preto[18]) ainda permitia a sua aplicação. Ora, com o não cumprimento da pena de substituição aplicada, este sentimento jurídico da comunidade impõe que o condenado, que não soube aproveitar a alternativa que a sociedade lhe concedeu, cumpra a pena de prisão efetiva aplicada na sentença.

Isto para dizer que há dois momentos relevantes em sede de execução da pena de substituição: o momento do cumprimento e o momento do não cumprimento ou incumprimento. O que é acentuado pelo Código Penal quando se pretende que o cumprimento siga moldes idênticos quando se trata de uma pena de multa principal ou de uma pena de multa substituição; e que o regime do incumprimento seja distinto, pois em caso de pena de substituição deve o condenado cumprir a pena de prisão aplicada, ainda que esta seja a solução de ultima ratio (isto mesmo é demonstrado pelo regime proposto pelo disposto no art. 55.º, do CP, relativo ao incumprimento dos deveres impostos aquando da aplicação da pena de substituição da suspensão da execução da pena de prisão, em que o juiz antes da revogação desta pena de substituição poderá optar por outra solução; até porque a revogação apenas ocorre quando os deveres foram “grosseira ou repetidamente” — art. 56.º, n.º 1, al. a), do CP — violados).

Vejamos então qual o regime de cumprimento da pena de multa.

A pena de multa pode ser paga de forma voluntária ou coerciva.

Nos termos do art. 489.º, do CPP, pode ser paga voluntariamente após o trânsito em julgado da decisão (n.º 1) e no prazo de 15 dias “a contar da notificação para o efeito” (n.º 2). Porém, e por força do disposto no art. 47.º, n.º 3, do CP, sempre que o tribunal autorizou o pagamento no prazo de 1 ano (ou mais — cf. n.º 4 do mesmo dispositivo), ou em prestações, este prazo não se aplica (art. 489.º, n.º 3, do CPP).

Mas, nos termos do art. 490.º, do CPP, pode ainda o condenado pedir para cumprir a pena em “dias de trabalho”, o que poderá ser concedido se se entender que as finalidades de punição estão asseguradas com a execução da pena de multa através de dias de trabalho (cf. art. 48.º, do CP). Ou seja, o ordenamento jurídico pretendeu “muito justamente afastar, até ao limite possível, a aplicação de uma pena de prisão”[19].

Caso nenhuma destas formas de cumprimento voluntário seja possível, segue‑se o pagamento coercivo através da execução patrimonial (cf. art. 491.º, do CPP). Mas, repare-se, já estamos numa situação em que “findo o prazo de pagamento da multa ou de algumas das suas prestações” (artigo citado) o condenado não pagou a multa.

Se não tem havido qualquer dúvida, mesmo quando se trata de pena de multa de substituição, a que ainda após o prazo de cumprimento possa haver lugar à execução patrimonial do condenado para pagamento da multa, entendemos que esta dúvida nem sequer deve ser colocada quando o condenado ainda pretende pagar — assim demonstrando que uma das finalidades que se pretendeu assegurar com a aplicação da pena de multa foi exatamente a socialização do delinquente, de modo a que voluntariamente cumpra as regras da sociedade em que está inserido. Ora, nada mais demonstrativo disto mesmo do que o facto de o condenado vir a tribunal pedir para pagar através da força do seu trabalho.

Mas, se, em tempo, nenhuma das formas de pagamento voluntário ocorreu, ainda haverá lugar ao pagamento coercivo.

Se ainda assim se mantém o incumprimento (porque se esgotaram todas as formas de cumprimento voluntário e coercivo), cabe ainda saber qual a razão de não cumprimento: ou se deve a motivo não imputável ao condenado (por razões supervenientes à condenação ou já existentes no momento da condenação) ou a motivo imputável ao condenado.

Se estamos numa situação em que o não pagamento da multa não é imputável ao condenado, porque, por exemplo, é um desempregado de longa duração, sem património próprio, ainda assim não irá o condenado cumprir a prisão (em que foi convertida a pena de multa não paga — cf. art. 49.º, n.º 1, do CP — ou a pena de prisão em que foi condenado): nestes casos há uma suspensão da execução da prisão subsidiária ou da pena de prisão principal subordinada ao cumprimento de deveres ou regras de conduta (cf. art. 49.º, n.º 3, do CP).

           Se, pelo contrário, o não pagamento é imputável ao condenado, então o regime necessariamente terá que ser distinto consoante se esteja perante uma pena de multa principal ou uma pena de multa de substituição.

Na verdade, se a pena de multa é a pena principal em que foi condenado, a única forma de impor um cumprimento de uma privação da liberdade é converter aquela num certo período de reclusão (nos termos do art. 49.º, n.º 1, do CP — cumpre em prisão o tempo correspondente aplicado na pena de multa, determinada em dias de multa, reduzido a 2/3) em tempo de prisão; não se trata da aplicação de uma pena de prisão, pois a pena em que o arguido foi condenado foi a pena de multa, mas sim da aplicação de uma prisão subsidiária (“sanção de constrangimento”) cujo cumprimento a todo o tempo pode evitar (cf. art. 49.º, n.º 2, do CP).

Mas, o mesmo não pode ocorrer quando estamos perante uma pena de multa de substituição. Desde logo porque as razões que presidiram à sua aplicação, maxime as decorrentes das exigências de prevenção especial de socialização, falharam. Além disto, o arguido foi condenado numa pena de prisão, pelo que em caso de incumprimento da pena de substituição deve cumprir a pena em que foi condenado. Por isso, terá que cumprir a pena de prisão efetiva sem que haja possibilidade sequer de evitar a qualquer momento o seu cumprimento[20].

Ou seja, daqui se pode concluir que quer se trate de pena de multa principal, quer se trate de pena de multa de substituição, a forma de cumprimento é idêntica; as regras só diferem em caso de incumprimento, e apenas quando o não cumprimento é imputável ao condenado — desde logo porque as finalidades que presidiram à aplicação da pena de substituição falharam, sendo a pena de multa de substituição, como a designação indica, uma simples pena que substitui uma outra aplicada a título principal.

Mas, ainda é necessário explicar em que medida e qual a razão para que se admita a possibilidade de cumprimento (ainda antes de ocorrer qualquer situação de não cumprimento) da pena de multa em dias de trabalho. Vejamos os antecedentes históricos desta possibilidade de execução do cumprimento da pena de multa de substituição.

4.3. Os antecedentes históricos que permitem o cumprimento da pena de multa de substituição em dias de trabalho são relevantes.

Assim, começou por se considerar, ainda durante a vigência do Código Penal de 1852/1886, que as penas curtas de prisão deviam ser substituídas[21], pelo que foi determinado, por força do decreto n.º 13 343, de 26 de março de 1927, que na pena de prisão correcional até 6 meses “o julgador substituirá sempre essa pena pela de multa” (art. 1.º). E quando o “réu” não tivesse pago a multa ou prestado fiança (art. 4.º), ou ainda que tivesse prestado fiança não tivesse procedido ao pagamento nos 3 dias posteriores à sentença (art. 5.º), seria “recolhido à cadeia” ou “ordenada a prisão dêle”. Mas, nos termos do art. 7.º do mesmo decreto, podiam “ser colocados em regime de trabalho correcional ou em estabelecimentos apropriados ou nos serviços públicos do Estado ou dos corpos administrativos locais”, assim se admitindo a possibilidade de pagamento da multa, aplicada em substituição da pena de prisão, em dias de trabalho.

Mais tarde, por força do decreto-lei n.º 39 688, de 5 de junho de 1954, foi alterado o art. 86.º, do então CP, que passou a ter a seguinte redação[22]: “A pena de prisão aplicada em medida não superior a seis meses poderá sempre ser substituída por multa correspondente”. Ou seja, o regime da substituição facultativa passou a estar expressamente consagrado no CP. E o art. 87.º, por força do mesmo decreto, determinou:

As penas de multa, quer directamente aplicadas como tais, quer resultantes da substituição de penas de prisão, poderão ser substituídas pela prestação de trabalho em qualquer mister ou ofício, em obras públicas ou oficinas do Estado ou dos corpos administrativos.

§ 1 Cabe ao juiz autorizar a substituição prevista neste artigo, sob proposta do director da cadeia, e nas condições estabelecidas em regulamento.

§ 2 No caso de substituição de multa por prestação de trabalho, por cada dia útil de trabalho fica resgatada a parte da multa equivalente à importância descontada na remuneração do condenado.

Tratando-se de pena de multa fixada por certa duração de tempo, ou de pena de prisão substituída por multa, considerar-se-á resgatado por cada dia de trabalho útil um dia de multa.”.

Mais tarde, por força do decreto-lei nº 184/72, de 31 de maio, o “regime do cumprimento da pena de multa por prestação de trabalho” passou a constar do art. 124.º do CP cuja redação era muito semelhante:

 “As penas de multa, quer directamente aplicadas como tais, quer resultantes da substituição de penas de prisão, poderão ser cumpridas por meio de prestação de trabalho em qualquer mister ou ofício, em obras públicas, serviços ou oficinas do Estado e dos corpos administrativos, ou em obras, serviços ou oficinas de entidades particulares, nos termos e nas condições constantes da lei.

§ 1 No caso de substituição da multa por prestação de trabalho, por cada dia útil de trabalho fica resgatada a parte da multa equivalente à importância descontada na remuneração do condenado.

§ 2 Tratando-se de pena de multa fixada por certa duração de tempo, ou de pena de prisão substituída por multa, considerar-se-á resgatado um dia de multa com a entrega de metade da remuneração de cada dia de trabalho.”

Este artigo foi depois revogado pelo decreto-Lei n.º 371/77, de 5 de setembro[23], e deixou de se estabelecer expressamente que quer as penas de multa “directamente aplicáveis”, quer as “resultantes da substituição de penas de prisão” poderiam ser executadas em dias de trabalho. Foi dada nova redação ao art. 123.º, do CP, onde se determinou: § 2 — “Quando a multa não for paga nem puder ser executada ou substituída por dias de trabalho nos termos da lei de processo penal, será cumprida a pena de prisão aplicada na sentença em alternativa”. Mas, com a revogação daquele art. 124.º, não se pretendeu afastar qualquer possibilidade de pagamento da multa de substituição em dias de trabalho. Tal como refere o preâmbulo do decreto “procura-se que seja cumprida a pena de multa”, “[m]as do não cumprimento voluntário da pena de multa transita-se, antes de mais, para a tentativa da sua cobrança coerciva e, após isso, para a sua substituição por dias de trabalho, só sendo cumprida a pena de prisão quando a pena de multa não puder ser executada nem remida com trabalho”. Ou seja, ainda que o art. 123.º, § 2, do CP, tivesse deixado de fazer referência expressa aos dois casos anteriormente referidos — pena de multa diretamente aplicada ou resultante de substituição da prisão — em que se poderia colocar o problema da execução da pena de multa em dias de trabalho, são explícitos a referir que esta é uma alternativa anterior à execução de qualquer prisão; aliás no seguimento de uma das ideias que presidiu à alteração — “a multa continua a constituir uma muito importante medida substitutiva da cada vez mais condenada pena de prisão” (in preâmbulo); acrescentando: “a perspectiva de indiferença do que não possui bens penhoráveis perante a força intimidativa da pena de multa é, pelo menos, tão receável quanto a perspectiva tradicional, segundo a qual só cumpre pena de cadeia o que não tem meios para pagar a multa” — ainda hoje se tornam atuais estas  palavras.

Ou seja, até ao CP de 1982 era claro que a pena de multa, quer se tratasse ou não de pena de substituição, poderia ser paga em dias de trabalho. Visava-se com o “instituto do resgate da multa pelo trabalho (...) o estabelecimento de uma relativa equidade no cumprimento de tais penas, pois é manifesto o maior gravame que elas revestem em relação aos que não têm bens suficientes para o seu pagamento”[24].

E a mesma ideia manteve-se no projeto de Eduardo Correia.

Assim, no art. 58.º determinava-se a substituição das penas de prisão não superiores a 6 meses por pena de multa: “A pena de prisão — quando não tenha lugar a condenação condicional ou o regime de prova — aplicada em medida não superior a seis meses será substituída pelo número de dias de multa correspondentes, salvo quando a execução da prisão seja exigida pela necessidade de prevenir a prática de futuros crimes[25]. E o art. 59.º previa expressamente a possibilidade de pagamento da pena de multa em dias de trabalho — “Se o pagamento da multa não puder ter lugar imediatamente, ou não puder ter lugar imediatamente sem que isso envolva uma injusta sobrecarga para o condenado, poderá o tribunal fixar um prazo, que não deverá exceder oito meses, para o seu pagamento integral ou autorizar que ele se faça em prestações, de forma, porém, a que, no máximo, a multa esteja integralmente paga dentro de dois anos a partir da decisão. (...) § 3 — Se um réu condenado a uma pena de multa não puder solvê-la senão com o produto do seu trabalho e não encontrar ocupação poderá requerer ao tribunal que a substitua total ou parcialmente por correspondentes dias de trabalho em obras públicas, oficinas do Estado ou dos corpos administrativos, nas condições estabelecidas em regulamentos.”[26]. Este dispositivo tinha como objetivo, segundo Eduardo Correia,  procurar “tornar os cidadãos iguais perante a lei e impedir que a multa possa ter para o réu efeitos muito mais vastos do que aqueles que, em princípio, se deseja que ela tenha”[27], completando: “pode (...) acontecer que o delinquente não tenha bens, mas possa prestar trabalho e então deve admitir-se a substituição da multa pela prestação de trabalho (...) — só com a diferença de que aqui se admite que seja o delinquente a pôr o juiz perante o condicionalismo de facto que ocorre e as dificuldades que se lhe antolham no cumprimento da pena”[28]. Esta disposição (que permitia o pagamento da multa em dias de trabalho) era expressamente aplicada aos casos de pena de multa de substituição, dado que, nos termos do art. 58.º, n.º 2, se estabelecia: “Neste caso aplicar-se-ão as regras do artigo 59.º e do n.º 1 do artigo 60.º [conversão da multa não paga em prisão], mas não as dos números seguintes deste artigo [conversão parcial e cumprimento da pena de multa após conversão], nem as do artigo 61.º [redução da conversão em prisão, suspensão da execução da prisão]”[29]. Tal como explica Eduardo Correia o “pensamento da luta contra as curtas penas de prisão revela-se ainda na possibilidade do resgate da multa pela prestação de trabalho, quer da multa aplicada como tal, quer resultante da conversão da pena de prisão (...). E dizemos que se trata de uma reacção contra as penas de prisão pois a multa, quando não paga, é convertida em prisão. O resgate da multa pelo trabalho é, pois, indirectamente, uma reacção contra tais penas curtas”[30].

E, em 1982, a mesma ideia mantinha-se. No artigo 43.º (substituição da prisão por multa) estabeleceu-se:

1 - A pena de prisão não superior a 6 meses será substituída pelo número de dias de multa correspondente, excepto se a execução da prisão for exigida pela necessidade de prevenir a prática de futuros crimes.

2 - Se o crime for punido com pena de prisão não superior a 6 meses e multa, será aplicada uma só multa, equivalente à soma da multa directamente imposta e da que resultar da substituição da prisão.

3 - É aplicável à multa que substituir a prisão o regime dos artigos 46.º e 47.º”.

Isto é, era também aplicável à pena de multa de substituição não só o regime de pagamento a prazo ou a prestações, estabelecido no art. 46.º, n.º 3, mas ainda tudo o estipulado no art. 47.º, nomeadamente o seu n.º 2 — “Se, porém, a multa não for paga voluntária ou coercivamente, mas o condenado estiver em condições de trabalhar, será total ou parcialmente substituída pelo número correspondente de dias de trabalho em obras ou oficinas do Estado ou de outras pessoas colectivas de direito público.”. O que se manteve até à reforma de 1995.

Com a reforma de 1995[31] o anterior art. 43.º, n.º 3 passou para o agora art. 43.º, n.ºs 1 e 2: no n.º 1, refere-se que é correspondentemente aplicável à pena de multa de substituição o disposto no art. 47.º (o art. 46.º antes da reforma de 1995) que se refere ao modo de determinação (autónoma[32]) da pena de multa de substituição; no n.º 2, determina-se que não sendo a pena de multa de substituição paga é cumprida a pena principal de prisão, sendo certo, todavia, que se o não pagamento da pena de multa não for imputável ao condenado é aplicável o regime do art. 49.º, n.º 3 (que corresponde, grosso modo, ao art. 47.º, n.º 4 anterior). Ou seja, o velho art. 47.º, n.º 2, que permitia o pagamento da multa em dias de trabalho, não só deixou de estar integrado no âmbito do atual art. 49.º como passou a ser autonomizado no art. 48.º (o que não sucedia anteriormente).

Vejamos, então, as razões que presidiram à remissão apenas para o dispositivo referente à determinação da pena de multa de substituição (atual art. 47.º) e para o referente ao não pagamento da multa por motivo não imputável ao condenado (atual art. 49.º, n.º 3), sem que se tivesse procedido à remissão para o atual art. 48.º que permite o pagamento em dias de trabalho ao arrepio de toda a tradição legal portuguesa.

Compulsadas as atas da comissão revisora a partir da qual veio a culminar a redação de 1995 ao Código Penal, verificamos que também numa fase inicial se procedia à remissão para a norma que permitia o pagamento da multa de substituição em dias de trabalho. Na verdade, na redação inicial do art. 43.º do projeto (cuja epígrafe era “substituição da pena curta de prisão não superior a...”) estabelecia-se  no n.º 2: “A determinação da multa que substituir  prisão e ao seu regime aplica-se o disposto nos artigos 46.º e 47.º[33], isto é, havia também lugar a uma determinação autónoma da pena de multa de substituição (era esta a remissão para o art. 46.º[34]) e a possibilidade de pagamento da multa em dias de trabalho (prevista no art. 47.º [35]).

Porém, este art. 47.º passou a ter a redação introduzida pelo art. 47.º-A (e que corresponde ao atual art. 49.º) onde se determinava, no seu n.º 1, que a pena de multa (principal) não paga, nem voluntária, nem coercivamente, seria substituída por prisão subsidiária à razão de 2/3 dos dias de multa em que o arguido havia sido condenado; no n.º 2, estabelecia a possibilidade de pagamento a todo o tempo da pena de multa, e no n.º 3 previa a suspensão da execução da prisão subsidiária se o incumprimento não fosse imputável ao condenado. Ou seja, aquela remissão inicial no regime da pena de multa de substituição para o “velho” art. 47.º, onde se permitia a execução da pena de multa em dias de trabalho, sem fazer qualquer distinção entre a pena de multa de substituição e a pena de multa principal, desapareceu, dado que o “novo” art. 47.º (o art. 47.º-A) já não estabelecia qualquer possibilidade de pagamento em dias de trabalho, e estabelecia sim algo a que Figueiredo Dias sempre se tinha oposto — a possibilidade de cumprimento da pena de prisão correspondente a 2/3 dos dias de multa, quer se tratasse de uma condenação em pena de multa principal, quer se tratasse de uma condenação em pena de multa de substituição. Por isso havia que alterar aquela remissão.

Assim, em momento posterior (outubro de 1990, quando as anteriores discussões e deliberações ocorreram nas sessões de janeiro e fevereiro de 1989), Figueiredo Dias veio considerar, no respeitante àquele n.º 2, do art. 43.º,  “como errada a solução aprovada”[36], por entender que “se a pena de substituição não é cumprida, deve aplicar-se a pena de prisão fixada na sentença. Só conferindo efectividade à ameaça da prisão é que verdadeiramente se está a potenciar a aplicação da pena de substituição”[37], tendo proposto a redação que acabou por ficar consagrada na norma correspondente ao atual art. 43.º, n.º 2, do CP; e foi acrescentada uma remissão expressa no art. 44.º, n.º 1 (atual art. 43.º, n.º 1) para o então art. 47.º, n.ºs 3 e 4 (atual art. 47.º, n.ºs 3 e 5) assim permitindo o pagamento da pena de multa num certo prazo ou em prestações. E com isto caiu a remissão para o, inicialmente, art. 47.º (atual art. 48.º), ou seja, parecendo com isto ter-se querido eliminar aquilo que já era tradição no nosso ordenamento jurídico — o pagamento da multa, ainda que de substituição, em dias de trabalho. Mas, em parte alguma se refere isto; em parte alguma se refere que a razão de ser desta alteração era a de impedir o cumprimento da pena de multa em dias de trabalho. O que se pretendia era impedir a conversão da multa de substituição não paga em prisão, tal como sucedia no caso de não pagamento da pena de multa principal; dado que se tratava de uma pena de multa de substituição em caso de incumprimento, devia haver lugar à execução da pena substituída, isto é, à execução da pena de prisão principal em que o arguido havia sido condenado. O objetivo era afirmar de modo explícito que, não sendo cumprida a pena de substituição, o condenado teria que cumprir a pena de prisão principal em que foi punido.

E isto mesmo nos confirmam os escritos de Figueiredo Dias. Na verdade, Figueiredo Dias, perante a redação dada antes da reforma de 1995, insurgia-se contra a remissão expressa para o disposto nos arts. 46.º e 47.º (que abarcavam ambas as situações agora previstas nos arts. 48.º e 49.º).

Na verdade, o art. 43.º (referente à pena de multa de substituição) ao remeter para os arts. 46.º e 47.º (todos do CP, na versão de 1982) determinava que, quando fosse calculada a pena de multa (ainda que de substituição), também se fixasse na sentença a pena de prisão em alternativa[38], e o n.º 3 do art. 47.º estabelecia que, não havendo cumprimento, nem voluntário nem coercivo, da pena de multa (sem fazer qualquer distinção entre a pena principal e a pena de substituição), nem tendo havido pagamento em dias de trabalho, seria cumprida a pena de prisão aplicada em alternativa na sentença (aquela pena cuja duração correspondia aos dias de multa reduzidos a 2/3). Ou seja, quer se tratasse de pena de multa principal, ou pena de multa de substituição, a final era sempre cumprida prisão pelo tempo dos dias de multa reduzidos a 2/3, independentemente de, em caso de multa de substituição, o tempo de prisão determinado na pena principal ser diferente.

Ora, Figueiredo Dias entendia que este regime conduzia  “inevitavelmente à conclusão de que, caso o condenado não pague a multa, tudo se passa como se ele houvesse sido originariamente condenado em pena de multa”[39]. Isto porque em caso de incumprimento, e depois de ter falhado a execução de bens e a possibilidade de cumprimento em dias de trabalho, havia possibilidade de “cumprimento da prisão sucedânea”, assim se contrariando uma ideia “dogmática e político-criminalmente” fundada — “a de que, sempre que uma pena de substituição não seja cumprida, o regime mais adequado à própria ideia «de substituição» é a de que o agente deve — tanto quanto possível automática e imediatamente — cumprir a pena de prisão fixada e que foi substituída.”[40] Mas acrescentando ainda de forma muito clara: “Ainda aqui, porém, o propósito político-criminal de tornar em extrema ratio o cumprimento da prisão pode justificadamente conduzir a atenuações de pura lógica: assim como, por exemplo, o incumprimento de condições de suspensão da execução da prisão não deve conduzir, sem mais, à execução daquela, também aqui se podem invocar razões para que entre o incumprimento da multa e a execução da prisão se interponham vias de «diversão» análogas às cominadas para o incumprimento da pena (principal) de multa”[41]. O que o indignava era não a possibilidade de pagamento da pena de multa de substituição em dias de trabalho, mas sim o facto de “se o condenado não pagar a multa e não houver lugar a execução, nem a substituição por dias e trabalho, ele vai então cumprir prisão igual a 2/3 dos dias de multa em que foi condenado (art. 46.º-3)! Quer dizer: o tribunal fixou a pena de prisão, v.g., em 4 meses, substituiu-a por 120 dias de multa e, como «prémio» do incumprimento culposo da pena de substituição, o condenado acaba por cumprir apenas 3 meses de prisão! Uma tal solução já nada tem  a ver com a consideração da prisão como extrema ratio, mas constitui um erro legislativo que acaba por pôr em causa a efectividade político-criminal da própria pena de substituição.”[42]. E admitindo logo de seguida que uma solução de iure condendo  pudesse ser “que a multa de substituição possa ser paga em prestações ou com outras facilidades, ou que uma vez não paga sem culpa, se apliquem medidas de diversão da prisão”[43], já não aceitando, todavia, que assim possa ser se o não cumprimento for culposamente imputável ao condenado. Na verdade, o que pretendia era afastar o regime que permitia que não tendo sido paga a pena de multa de substituição, nem mesmo em dias de trabalho, o condenado cumpriria a pena de prisão aplicada em alternativa na sentença, cujo período correspondia aos dias de multa reduzido a 2/3. Mas, mais não pretendia afastar. E volta a reafirmá-lo mais tarde: a ideia político-criminal de tornar a pena de prisão a ultima ratio e a de evitar a aplicação de penas curtas de prisão permite que, em caso de incumprimento da pena de substituição, também se possam “invocar razões para que entre o incumprimento da multa de substituição e a execução da prisão se interponham vias de «diversão» análogas às cominadas para o incumprimento da pena pecuniária principal”[44].

4.4. Perante tudo isto voltemos ao regime atual.

Nos termos do art.  43.º, n.º 1, do CP, há lugar a substituição da pena de prisão não superior a 1 ano por uma pena de multa ou outra pena não detentiva, sempre que a isso se não oponham as exigências de prevenção, nomeadamente, a necessidade de prevenir a prática de futuros crimes. Isto é, mantém-se o propósito já antigo de luta contra as penas curtas de prisão pelo seu efeito criminógeno e prejudicial à socialização do condenado. Se, por um lado, esta é uma exigência a manter — a de não aplicar penas curtas de prisão — acresce ainda uma outra subjacente a todo o regime sancionatório português: a de que a prisão só deve ser aplicada em ultima ratio, e por isso a preferência pela aplicação das penas não privativas da liberdade em detrimento das penas privativas da liberdade (tal como expressamente se estipula no art. 70.º, do CP). E por isto se faz uma remissão expressa (no art. 43.º, n.º 1, do CP) para o art. 47.º do CP — assim permitindo que também no caso de uma pena de multa de substituição se possa proceder ao seu pagamento dentro de um certo prazo ou em prestações “sempre que a situação económica e financeira do condenado o justificar” (art. 47.º, n.º 3, do CP).

Coisa diferente são aqueles casos em que ocorre um incumprimento da pena de multa de substituição. Como a própria designação nos indica, esta pena é aplicada em vez de uma pena principal que terá sido de prisão em medida não superior a 1 ano. Pelo que, tal como em todas as penas de substituição, quando não haja o seu cumprimento (por motivo imputável ao condenado) deve proceder-se à execução da pena principal.

Mas ainda aqui a execução da pena de prisão deve constituir a ultima ratio.

Assim como na pena de substituição de suspensão da execução da pena de prisão a execução da pena principal de prisão só deve ocorrer no limite (cf. arts. 55.º e 56.º, do CP), também no caso de pena de multa de substituição deve ainda dar-se possibilidade ao condenado de, antes de entrar em incumprimento[45], poder proceder ao pagamento da multa em dias de trabalho. Na verdade, o condenado que não consegue, por motivo que lhe não é imputável, pagar num certo prazo ou a prestações, mas ainda assim pretende pagar em dias de trabalho vem de forma expressa demonstrar que uma das finalidades básicas que presidiu à substituição da pena de prisão — a de permitir a socialização do delinquente de modo a que este prossiga a sua vida de acordo com as regras estabelecidas na sociedade — está a atingir o seu objetivo: o condenado, ao requerer o pagamento em dias de trabalho quando não pode realizar o pagamento de outra forma, e pretendendo evitar entrar numa situação de incumprimento (que demonstraria expressamente não estar ainda a atuar de acordo com as regras da sociedade), demonstra que quer cumprir, ainda que através da força do seu trabalho, a pena em que foi condenado, assim ressarcindo a sociedade pelo crime cometido.

Além disto, em caso de incumprimento, apenas podemos dizer que o não pagamento não lhe é imputável, quando possamos concluir que não só não tinha possibilidades económicas e financeiras para pagar, como não tinha possibilidades de pagar através do seu trabalho.  Não estamos, pois, a admitir aquilo que por vezes incorretamente se afirma quando se diz que o condenado em pena de multa pode substituí-la por prestação de trabalho. Não se trata aqui de uma substituição, ou da aplicação de uma outra pena em vez de uma pena principal; a pena de substituição que lhe foi aplicada foi a pena de multa, apenas estando agora a pagá-la, diríamos, em espécie e não em numerário. Assim contribuindo para assegurar a finalidade que presidiu à aplicação daquela pena de substituição: evitar as penas curtas de prisão e aplicar uma pena detentiva apenas em ultima ratio.

Aliás, tem já sido esta a posição da maioria da doutrina que tem considerado que se pode proceder ao pagamento voluntário da pena de multa de substituição (de forma imediata, a prazo ou em prestações) por prestação de dias de trabalho[46], pois não estamos perante uma “substituição” de uma pena de substituição, mas sim perante uma outra modalidade de execução da pena de multa de substituição.

Acresce que já foi este — o de o pagamento da pena de multa de substituição constituir uma forma de execução da pena de multa — o entendimento do Supremo Tribunal de Justiça aquando do acórdão de fixação de jurisprudência n.º 12/2013 (DR, 1.ª série, 16.10.2013), onde se afirmou expressamente:

Condenado o arguido em pena de multa de substituição, nos termos do art.º 43.º, do CP, a multa deve ser paga no prazo de 15 dias a contar do trânsito em julgado, após notificação que lhe deve ser feita , nos termos do art.º 489.º,  n.ºs 1 e 2, do CPP, assistindo ao arguido o direito de requerer o pagamento em prestações ou dentro do prazo de um ano, nos termos do art.º 47.º, n.º 3, do CP, a substituição por dias de trabalho (art.º 490.º, do CPP), porém findo o prazo para pagamento da multa ou de alguma das suas prestações sem que o pagamento por inteiro esteja efectuado, procede-se, nos termos do art.º 491.º n.º 1 , do CPP, à execução patrimonial.

Exaurida esta plúrima regra procedimental, não assiste outra alternativa ao tribunal, desde que ante este se não haja comprovado previamente a impossibilidade não culposa de satisfazer a multa, que não seja a de fazer cumprir a pena de prisão substituída.

Podemos ainda referir que o entendimento do disposto no art. 48.º, do CP, como uma “forma de cumprimento da multa” (assim se distinguindo claramente das penas de substituição) é reafirmado pelo acórdão de fixação de jurisprudência n.º 13/2013, onde se admitiu o cumprimento da pena de multa em dias de trabalho como sendo uma “possibilidade de cumprimento da pena”, uma forma de execução da pena de multa (principal), uma  “possibilidade de cumprimento da pena de multa através da prestação de trabalho, não estando portanto ainda a multa dada como incumprida[47].

Sendo, pois, o pagamento da pena de multa em dias de trabalho, previsto no art. 48.º, do CP, uma forma de execução da pena de multa, e não uma pena de substituição, e sendo uma forma de execução antes de o condenado entrar em situação de incumprimento, é aplicável quer se trate de uma pena de multa principal, quer de uma pena de multa de substituição. E assim se reafirmando que não há qualquer distinção entre a pena de multa principal e a pena de multa de substituição quando estamos perante um caso de cumprimento da pena. Na verdade, só o regime do incumprimento (por motivo imputável ao condenado) deve ser diferente consoante estejamos perante uma pena de multa principal ou uma pena de multa de substituição atenta a natureza desta última.

4.5. Admitindo, pois, o pagamento da multa de substituição em dias de trabalho, esta modalidade de pagamento apenas pode ocorrer quando haja requerimento do condenado (cf. art. 48.º, do CP). Deve, então, o condenado requerer, no prazo de 15 dias após a notificação para o pagamento, aquela específica modalidade de execução antes de entrar em incumprimento (cf. art. 490.º, do CPP e art. 489.º, n.ºs 2, do CPP[48]; caso tenha sido autorizado anteriormente o pagamento em prestações poderá requerer o pagamento em dias de trabalho antes de expirar o prazo para o pagamento da prestação, ou enquanto não ocorrer uma situação de mora[49]).  Ou seja, só após o trânsito em julgado da condenação em pena de prisão substituída por pena de multa, e antes de o condenado entrar em incumprimento, é que o tribunal a requerimento do condenado poderá permitir o pagamento da multa em dias de trabalho, se entender que através desta forma de cumprimento se realizam “de forma adequada e suficiente as finalidades de punição” (cf. art. 48.º, do CP). Isto é, o tribunal terá que concluir que, perante o dever de pagamento da pena de multa e uma vez demonstrada a impossibilidade (não imputável ao condenado) de o cumprir, pode o condenado pagar em dias de trabalho. Na verdade, entendemos que só perante a impossibilidade de pagamento da multa imediatamente, ou em diferido, ou em prestações, é que se pode entender que, em respeito pelas finalidades de punição, maxime a de socialização do condenado, aquela possa ser cumprida deste outro modo. Até porque só assim se pode solicitar a tolerância da sociedade para com esta outra forma de pagamento. E “com a demonstração da vontade do condenado em prestar dias de trabalho, poderemos já, na maioria dos casos, considerar que as necessidades de prevenção especial, no sentido da adesão aos valores da comunidade e à reparação simbólica da lesão do bem jurídico violado se encontram já assimiladas pelo condenado”[50].

Conclui-se, pois, que a pena de multa de substituição pode ser cumprida através de dias de trabalho, tal como o acórdão fundamento defendeu.


III

Com base no exposto, o Pleno das Secções Criminais do Supremo Tribunal de Justiça decide:
1. Fixar a seguinte jurisprudência:
Em caso de condenação em pena de multa de substituição, nos termos do art. 43.º, n.º 1, do CP, pode o condenado, após o trânsito em julgado daquela decisão, requerer, ao abrigo do disposto no art. 48.º, do CP, o seu cumprimento em dias de trabalho, observados os requisitos dos arts. 489.º e 490.º do CPP.
2. Revogar o acórdão recorrido que deverá ser substituído por outro que aplique a jurisprudência fixada.

Cumpra-se, oportunamente, o disposto no art. 444.º, n.º1, do CPP.

Não são devidas custas de harmonia com o disposto no art. 513.º, n.º1 ex vi art. 448.º, ambos do CPP.

            Supremo Tribunal de Justiça, 18 de fevereiro de 2016

Helena Moniz (relatora)
Nuno Gomes da Silva
João Silva Miguel
Francisco Caetano
Manuel Augusto de Matos
Pereira Madeira
Santos Carvalho
Armindo Monteiro
Santos Cabral (vencido)
Oliveira Mendes
Souto de Moura
Pires da Graça (vencido)
Raúl Borges (vencido)
Isabel Pais Martins
Manuel Braz
Isabel São Marcos
Henriques Gaspar (Presidente)

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[1] Cfr. entre outros, acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 17-04-2013, Proc. n.º 418/09.3PASXL.L1-3, acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 11-03-2015, Proc. n.º 291/06.3PTAMD.L1-3, acórdão do Tribunal da Relação de Porto, de 19-06-2013, Proc. n.º 28/09.5GDVFR-A.P1, acórdão do Tribunal da Relação de Porto, de 11-06-2014, Proc. n.º 659/12.6PIVNG-A.P1.— todos em www.dgsi.pt.
[2] Cfr., entre outros, acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 25-08-2004 (CJ, ano XXIX, tomo IV, p. 256 e ss),  e acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 09-10-2013, Proc. n.º 1006/01.8GISNT.L1-3, acórdão do Tribunal da Relação de Porto, de 22-06-2011, Proc. n.º 1144/10.6GBAMT-A.P1, acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 24-04-2013, Proc. n.º 1142/10.0PTAVR.C1, acórdão do Tribunal da Relação de Porto, de 25-11-2015, Proc. n.º 70/14.4PGGMD.P1, acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 26-03-2014, Proc. n.º 472/12.0GBPMS-A.C1, acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 16-10-2007, Proc. n.º 1357/07-1, acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 03-03-2015, Proc. n.º 263/13.1GBSLV-A.E1, acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 04-02-2013, Proc. n.º 607/07.2GAEPS-A.G1, acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães,  de 30-06-2014, Proc. n.º 226/12.4GAEPS-A.G1, todos em www.dgsi.pt.
[3] Deve, no entanto, ser clara a distinção entre este momento inicial e o segundo momento; pois se, num primeiro momento, a escolha pela aplicação de uma pena de prisão pode mostrar-se mais adequada ao crime cometido, no segundo momento já serão apenas critérios de necessidade atentas as exigências de prevenção (prevenção geral de integração ou tutela do ordenamento jurídico e prevenção especial de socialização), impondo-se, pois, ao tribunal uma explicação da razão que torna necessária a aplicação da pena curta de prisão sem que se possa substituir por uma medida não detentiva (assim, Figueiredo Dias, Direito Penal Português — As consequências jurídicas do crime, Lisboa: Æquitas/Ed. Notícias, 1993, §§ 557 e ss (p. 363 e s).
[4] Tendo em conta a panóplia de penas de substituição previstas no Código Penal, apenas haverá possibilidade de aplicação de uma pena de substituição se a pena concreta de prisão aplicada ao condenado for não superior a 5 anos.
[5] Sobre o critério da escolha ou de substituição da pena, cfr. Figueiredo Dias, ob. cit., §§ 496 e ss (p. 330 e ss).
[6] Anabela Miranda Rodrigues, Critério de escolha das penas de substituição no Código Penal português, Estudos em homenagem ao Prof. Doutor Eduardo Correia, I, Coimbra, 1984, p. 21 e ss (p. 24).
[7] No caso das pessoas coletivas ou equiparadas constituem penas principais a pena de multa e a pena de dissolução — cf. art. 90.º- A, do CP.
[8] Figueiredo Dias, ob. cit., § 505 (p. 335) — característica evidenciada relativamente a todas as penas de substituição em sentido próprio e não somente em relação à pena de multa de substituição.
[9] Anabela Miranda Rodrigues, ob. cit. p. 22.
[10] Idem, p. 23.
[11] Figueiredo Dias, ob. cit., § 491 (p. 327-8).
[12] Anabela Rodrigues, ob. cit., p. 27.
[13] Anabela Miranda Rodrigues, A determinação da medida concreta da pena privativa da liberdade e a escolha da pena, RPCC (Revista Portuguesa de Ciência Criminal), 1991, p. 243 e ss (p. 255).
[14] Figueiredo Dias, ob. cit., § 550 (p. 359).
[15] Figueiredo Dias, ob. cit., § 554 (p. 361).
[16] Sistema que impõe a necessidade de o juiz, em caso de aplicação de uma pena de prisão inferior a 1 ano, ter de fundamentar, à luz das exigências de prevenção, a aplicação da pena de prisão e a não aplicação da pena de multa de substituição — caso em que não o fazendo é entendido como uma falta de fundamentação da sentença gerando a sua nulidade (cf. arts. 71.º, n.º 3, do CP, e arts. 374.º, n.º 2, 375.º, n.º 1 e 379.º, n.º 1, al. a), todos do CPP) — neste sentido, Anabela Miranda Rodrigues, ob. cit. nota 13, p. 249; Figueiredo Dias, ob. cit., § 555 (p. 362) e Sónia Fidalgo, Pena de multa de substituição, RPCC, 2010, p. 158.
[17] Figueiredo Dias, ob. cit., § 550 (p. 359).
[18] Publicado na RPCC, 1991, p. 243-248.
[19] Figueiredo Dias, ob. cit., § 168 (p. 139).
[20] Já assim neste sentido, acórdão de fixação de jurisprudência n.º 12/2013 (DR – 1.ª série-A, 16. 10.2013, p. 6116 e ss).
[21] Já anteriormente se havia previsto a possibilidade de substituição da pena de prisão por pena de multa (cfr. decreto de 15 de setembro de 1892, Diário do Governo, 15.09.1892, p. 1892 — art. 22.º “Os juízes, attendendo ao número, e importancia das circumstancias attenuantes, poderão sempre substituir a pena de prisão pela de desterro ou de multa” (respeitou-se a ortografia original) — assim se consagrando a “substituição facultativa” e de harmonia com o que, no art. 85.º, do CP de 1852/1886, se estabelecia: “nenhuma pena poderá ser substituída por outra, salvo nos casos em que a lei o autorizar” (art. 69.º, da redacção de 1852).
[22] Na linha do que já havia sido estabelecido no art. 33.º, do decreto 34 674, de 18 de junho de 1945: “As penas de multa, quer directamente aplicadas como tais, quer resultantes da conversão das penas de prisão, poderão ser resgatadas pela prestação de trabalho nos termos dêste regulamento” (manteve-se a ortografia original).
[23] Constitui objetivo primordial deste decreto a adaptação das regras do CP à Constituição, considerando-se que “a pura e simples conversão em prisão da pena de multa colidiria frontalmente com a prescrição do artigo 27.º da Constituição.”
[24] Parecer n.º 99/52, da PGR, de 13.11.1952, BMJ, n.º 37 (julho, 1953), p. 86 e ss (em particular, p. 86 e 90); neste expressamente se refere que quer as multas diretamente aplicadas, quer as “resultantes da concessão da pena de prisão” podiam ser resgatadas mediante a prestação de trabalho (cf. p. 88).
[25] Cf. Actas das sessões da Comissão Revisora do Código Penal, Lisboa: Ministério da Justiça, 1966, II vol., p. 36.
[26] Cf. Actas citadas na nota 25, p. 40.
[27] Idem.
[28] Ibidem, p. 41.
[29] Cf. Actas citadas na nota 25, p. 52.
[30] Direito Criminal, vol. II, Coimbra: Almedina, 1993 (reimpressão), p. 394-5.
[31] Referimo-nos à redação que surgiu com o decreto-lei n.º 48/95, de 15.03; sobre os seus antecedentes e, em particular, sobre o modo de determinação da medida da pena de multa de substituição, cf., entre outros, acórdão de fixação de jurisprudência n.º 8/2013 (DR, 1.ª série-A, 19.04.2013, p. 2304 e ss).
[32] O que constitui o entendimento fixado pelo acórdão n.º 8/2013 referido na nota anterior — "A pena de multa que resulte, nos termos dos actuais artigos 43.º, n.º 1, e 47.º do Código Penal, da substituição da pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano, deve ser fixada de acordo com os critérios estabelecidos no n.º 1 do artigo 71.º e não, necessariamente, por tempo igual ou proporcional ao estabelecido para a prisão substituída.”
[33] Cf. Actas e projecto da Comissão de Revisão, Ministério da Justiça, Lisboa: Rei dos Livros, 1993, p. 21.
[34] Cf. Actas citadas na nota 33, p. 24-5.
[35] Cf. Actas citadas na nota 33, p. 28 [artigo 47.º (substituição da multa por trabalho): 1 – A requerimento do condenado pode o tribunal ordenar que a pena de multa fixada seja total ou parcialmente substituída por dias de trabalho em estabelecimento, oficinas ou obras do Estado ou de outras pessoas colectivas de direito público, quando conclua que esta forma de cumprimento satisfaz de forma adequada e suficiente as finalidades da pena.”].
[36] Cf. Actas citadas na nota 33, p. 466.
[37] Idem (itálico nosso).
[38] A redação original do art. 46.º, n.º 3 estabelecia: “Quando o tribunal aplicar a pena de multa será sempre fixada na sentença prisão em alternativa pelo tempo correspondente reduzido a dois terços”.
[39] A pena de multa de substituição, RLJ, ano 125.º, n.º 3820, p. 205.
[40] Idem.
[41] Ibidem, p. 205-6.
[42] Ob. cit., p. 206.
[43]  Ob. e loc. cit.. Assim justificando a solução do projeto de 1991, apenas permitindo o pagamento da pena de multa num certo prazo ou em prestações, tendo querido com isto afastar aquilo que era possível à luz da versão de 1982 do CP — “quando a multa não for paga ou substituída por dias de trabalho (...) será cumprida a pena de prisão aplicada em alternativa na sentença” a qual teria sempre um período correspondente ao da multa reduzido a 2/3.
[44] Figueiredo Dias, ob. cit na nota 4, § 568 e s (p. 369 e s).
[45] Na verdade, o pagamento da pena de multa (ainda que principal) em dias de trabalho constitui ainda um modo de cumprimento, antes de o condenado entrar em incumprimento. E por isso se determina que o requerimento, para o pagamento da pena de multa em dias de trabalho, seja deduzido no período de pagamento voluntário, de acordo com o estabelecido nos arts. 490.º, n.º 1 e 489.º, n.ºs 2 e 3, ambos do CPP. 
[46] Cf. Odete Maria de Oliveira, Penas de substituição, Jornadas de Direito Criminal. Revisão do Código Penal (alterações ao sistema sancionatório e parte especial), Vol. II, Lisboa: CEJ, 1998, p. 55 e ss, em especial, p. 73 e ss; Sónia Fidalgo, ob. cit. nota 16, p. 159; Maria João Antunes, Consequências jurídicas do crime, Coimbra: Coimbra Editora, 20152, p. 107, onde é explícito que só há lugar a pagamento coercivo quando a pena de multa de substituição não é paga voluntariamente (referindo-se à execução da pena de multa de substituição afirma “se a multa, que não tenha sido substituída por trabalho, não for paga voluntariamente tem lugar o pagamento coercivo” (p. cit.), e só quando “não tenha sido substituída por trabalho, não for paga voluntária ou coercivamente, é cumprida a pena de prisão aplicada na sentença” (idem); Simas Santos/Leal-Henriques, Código Penal Anotado, Lisboa: Rei dos Livros, 20144, p. 655 — “uma vez que entendemos (...) que a substituição da multa por dias de trabalho (art. 48.º) não configura uma pena de substituição, mas um modo de cumprimento da pena de multa, somos de opinião que não existem razões que justifiquem uma diferença de regimes, pelo que a pena de multa de substituição poderá ser cumprida, igualmente, através da prestação de dias de trabalho”. Contra este entendimento Paulo Pinto de Albuquerque (Comentário do Código Penal, Lisboa: UCP, 20153, art. 43.º/ nota 7 (p. 284) e art. 48.º/nota 2 (p. 300)) que, partindo do entendimento de que o pagamento da multa em dias de trabalho constitui uma “pena substitutiva”, não admite a “substituição” da pena de multa de substituição, assim partindo de um equívoco também apontado por Hélio Rodrigues (Cumprimento da pena de multa de substituição, RMP, ano 33, n.º 131 (jul.-set.2012), p. 191 e ss, em particular, p. 194 — “as teses que defendem a inadmissibilidade do cumprimento da pena de multa de substituição através da prestação de dias de trabalho padecem, salvo o devido respeito, de um equívoco conceptual, que provoca a construção de um silogismo falacioso por errada aplicação de uma premissa essencial — a da natureza da prestação de dias de trabalho”, que o Autor entende como “um modo diversificado e cumprimento da pena de multa”), de que não pode haver substituição da substituição. Também fazendo o raciocínio partindo do equívoco de que o cumprimento da multa em dia de trabalho constitui uma pena de substituição, cfr. Germano Marques da Silva, Direito Penal Português, vol. III, Lisboa: Verbo, 20082, p. 235-6.
[47] Cf. acórdão de fixação de jurisprudência n.º 13/2013, DR — 1.ª série, 17.10.2013, p. 6136, considerando ainda que a prisão subsidiária é uma “forma residual de cumprimento da pena de multa” quando “a multa não foi paga nem cumprida através de trabalho”.
[48]  Constituem antecedentes destes dispositivos o art. 639.º § 5, do CPP de 1929, e após a reforma de 1977, o art. 641.º. Aliás, como salienta Luís Osório já em assento de 18.8.1774 se considerou não ser possível “ser retido na cadeia por condenações pecuniárias (...) excepto se tivesse dolosamente havido ocultação ou sonegação de bens” (Comentário ao Código de Processo Penal Português, Coimbra: Coimbra Editora, 1934, 6.º vol., p. 277).
[49] Também assim Hélio Rodrigues, ob. cit., p. 211.
[50] Hélio Rodrigues, ob. cit., p. 205.