Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
8992/14.6T8LSB.L1.S1
Nº Convencional: 1ª SECÇÃO
Relator: PEDRO DE LIMA GONÇALVES
Descritores: DIVORCIO SEM CONSENTIMENTO
FUNDAMENTOS
Data do Acordão: 01/09/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL – DIREITO DA FAMÍLIA / CASAMENTO / DIVÓRCIO E SEPARAÇÃO JUDICIAL DE PESSOAS E BENS / DIVÓRCIO / DIVÓRCIO LITIGIOSO.
Doutrina:
-Boele-Woelki, Principles of European Family Law Regarding Divorce and Maintenance Between Former Spouses, Commission on European Family Law, Antwerp-Oxford, Intersentia, 2004, p.55
-Guilherme de Oliveira, A Nova Lei do Divórcio, p.13 e 14;
-Pereira Coelho e Guilherme Oliveira, Curso de Direito da Família, 4.ª edição, p.619 e 620.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGO 1781.º, ALÍNEA D).
Sumário :

I - O fundamento de divórcio previsto na al. d) do art. 1781.º do CC verifica-se quando, em face dos factos provados, o vínculo conjugal está definitivamente destruído.
II - O facto de, pelo menos, desde Maio de 2014 até Novembro de 2015 (data da audiência de julgamento), o réu discutir, regularmente, com a autora, na presença dos filhos de ambos, não lhe demonstrar afeto e provocar-lhe sentimentos de mal-estar, angústia e sofrimento, demonstra que não existe qualquer proximidade afetiva entre a autora e o réu e que a situação não é passageira.
III - Deste modo, encontra-se provado o fundamento de divórcio, pelo que o recurso não merece provimento.
Decisão Texto Integral:


Acordam na 1ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça:


I. Relatório

1. AA intentou ação de divórcio sem consentimento de um dos cônjuges contra BB, pedindo que se decrete o divórcio entre si e o Réu, bem como se decida, provisoriamente, a atribuição do uso da casa de morada de família à Autora.

Alega em síntese, que: vem sendo vítima de agressões verbais e físicas perpetradas pelo Demandado; este vem usando o produto exclusivo do trabalho da Autora em proveito próprio; o Demandado manteve um «caso extraconjugal»; não existe intimidade entre ambos; é a Demandante que, com o seu salário, vem fazendo face a todas as despesas do agregado familiar; o Réu tem uma conta bancária à qual a Autora nunca teve acesso; é irremediável o desgaste da relação conjugal.

2. Citado, o Réu veio contestar, impugnando os factos e pedindo a condenação da autora como litigante de má fé e concluindo pela improcedência do pedido.

3. Após convite para aperfeiçoar a ação, que lhe foi dirigido, a Autora, em audiência prévia, relatou que os factos alegados se verificaram a partir de 13 de maio de 2014.

4. Realizou-se audiência prévia, tendo sido fixado o valor da ação, proferido despacho saneador tabelar, fixado o objeto do litígio e os temas de prova.

5. Procedeu-se à audiência de julgamento, tendo sido proferida sentença que sentença que decretou:

“Pelo exposto, julgo a ação procedente e, em consequência:
a) Decreto o divórcio entre AA e BB, declarando dissolvido o casamento que os unia (assento n° 148 de 1990, da 2a Conservatória do Registo Civil de Lisboa);
b) Atribuo provisoriamente e de imediato à autora a utilização da casa de morada de família sita na ..., em Lisboa, até à partilha do património comum do agora dissolvido casal.
c) Julgo improcedente o pedido do réu de condenação da autora como litigante de má fé, dele absolvendo a autor”.


6. Inconformado com esta decisão, o Réu interpôs recurso de apelação.

7. O Tribunal da Relação de Lisboa veio a julgar improcedente o recurso, confirmando a sentença proferida.

8. Inconformado com tal decisão, o Réu /Apelante veio interpor o presente recurso de revista, formulando as seguintes (transcritas) conclusões:
1ª. No presente processo há uma situação de dupla conformidade: confirmação pelo Tribunal da Relação de Lisboa do julgado em primeira instância pelo Tribunal de Família de Lisboa;
2ª. Donde, o Recorrente postular ora a Revista excecional, invocando para o efeito e necessariamente os requisitos das alíneas a) e b), do n° 1, do art°. 672°, do CPC, cumprindo o ónus previsto no n° 2, da mesma norma jus-processual;
3ª. Mui douto Acórdão de 30/01/2014 e deste Supremo Tribunal de Justiça, tirado sob o processo 1246/10.9TJLSB.L1.S1 - Revista Excepcional - Admitida - Relevância Jurídica - Relevância Social -, doutrinou no sentido inequívoco de que:
- " 2 - Relevância jurídica e social
... enfatiza-se que as "relevâncias" devem ser analisadas em termos objectivos, assim se densificando os conceitos abertos, irrelevando a importância que a questão, em si, tem para as recorrentes, já que sempre a terá pois, de outro modo, não insistiriam na reapreciação pelo Supremo Tribunal.
(. ..)
Estar-se-á perante uma questão cuja apreciação seja "claramente necessária para melhor aplicação do direito" ?
(. ..)
Como julgaram "inter alia", os Acórdãos deste Colectivo do Supremo Tribunal de Justiça nos Pº.s 1949/08 TBGMR.C1.S1 e 9630/08 -1TBMAI P1.S1, tal requisito ocorre quando a questão em apreço é controversa na doutrina e na jurisprudência, "assumindo laivos de complexidade a sua subsunção jurídica por tal implicar um importante detalhado exercício de exegese"
E tal acontece quando o problema cuja solução se busca é dotado de dificuldade, ou complexidade, por inovador, por conter conceitos indeterminados que importe densificar sendo susceptível de interpretações tão divergentes que ponham em causa a boa aplicação do direito.
(. ..)
No tocante ao outro requisito em apreço, (relevância social) a jurisprudência deste Colectivo/formação vem sendo constante no sentido de os interesses só assumirem particular relevância social se conectados com valores sócio-culturais a porem em causa a eficácia do direito, sua credibilidade, quer na formação legal, quer na aplicação casuística, (cfr., "inter alia", os Acórdãos dos Pº.s 725/08-2TVLSB.L1.S1; 3401/08.2TBCSC.L1.S1; 1195/08.0TBRR.L1.S.1; 1282/08.5TVLSB.L1 e 1593/08 OT JLSB.L1.S1).
(. ..)
Escreveu-se no Acórdão desta Formação (P. ° 216/09.4TVLSB-A.L1.S1) será "uma situação em que possa haver uma colisão de uma decisão jurídica com valores sócio culturais dominantes que a devam orientar e cuja eventual ofensa possa suscitar alarme social determinante de profundos sentimentos de inquietação que minem a tranquilidade de uma generalidade de pessoas, situações em que, nomeadamente, fique em causa a eficácia do direito e a sua credibilidade por se tratar de casos em que há um invulgar impacto na situação da vida que a norma ou normas jurídicas em apreço visem regular, ou em que exista um interesse comunitário que, pela sua peculiar importância, pudesse levar, por si só, à admissão da revista por os interesses em jogo ultrapassarem significativamente os limites do cado concreto. "
4ª. E sob mui douto Acórdão de 14/05/2014 - P.o 217/l0.TBPRD.P1.S1, doutrinou-se em brilhante síntese, no sentido de que se deve de facultar o acesso a um terceiro grau de jurisdição, em situações em que: - "possa estar de modo mais evidente em causa o papel que se reclama do Direito e dos Tribunais como guardiões das expectativas legítimas dos sujeitos jurídicos."
5ª. No presente processo, Venerandos Conselheiros, lidou-se com um dos mais importantes institutos jurídicos da nossa ancestral cultura de raiz judaico-cristã e da nossa História do Direito (este de origem romano-germânica) que versa sobre os quase nove séculos da nossa existência como nação e como país: o casamento;
6ª. Através deste constitui-se com vocação de perpetuidade uma vida assente na Família (quer nuclear - cônjuges e filhos -, quer no sentido mais alargado da parentela, como se dizia na Idade Média e para considerar as relações familiares que vão surgindo com o devir e consequente alargamento da originária Família nuclear);
7ª. E processo ainda o presente, no qual veio a sentenciar-se (em primeira instância) e a acordar-se (em segunda instância e pelos mesmos motivos daquela) o divórcio entre a Autora/Recorrida e o Réu/Recorrente tout court à luz da alínea d), do artº. 1781°, do Código Civil;
8ª. Tal alínea é - e permita-se-nos a expressão, Venerandos Conselheiros - como que um "pouço sem fundo", onde, com toda a incerteza e insegurança jurídicas, ao sabor de uma total subjectividade, poderão ser subsumidos quaisquer factos, que, na opinião (subjectiva) do julgador e caso a caso, se "integrem" em tal normativo legal;
9ª. O mesmo é dizer, na esteira do brilhante Acórdão acima transcrito e deste Altíssimo Tribunal, que a alínea d), do art°. 1781°, do Cód. Civil, carece de densificação relativamente aos conceitos abertos (excessivamente, diga-se) em que se compraz, estando-se perante uma questão, a de saber, quais os factos que poderão mostrar uma ruptura definitiva do casamento, questão que sem sombra de dúvidas, carece da Vossa superior sageza jurídica, no sentido de ser por Vossas Excelências apreciada, porque claramente necessária para melhor aplicação do direito;
10ª. A questão, como se demonstrou na presente peça processual, é controversa na doutrina e na jurisprudência, isto é, é sobremaneira complexa a subsunção e de que tipo de factualidade, na alínea d), do art°. 1781°, do Cód. Civil;
11ª. Tal postula, clara e necessariamente, importante e detalhado exercício de exegese, que com a máxima vénia, se solicita a este Altíssimo Tribunal;
12ª. Até porque se está perante problema, cuja solução é de enorme dificuldade e complexidade jurídicas, tanto mais, que a referida alínea d), do art°. 1781°, do Cód. Civil, é inovadora no quadro do nosso sistema jurídico de divórcio, alínea que contem uma total indeterminação conceptual que importa densificar por Vossas Excelências, alínea ainda que já foi susceptibilizada por interpretações doutrinárias e jurisprudenciais divergentes que põem em causa a boa aplicação do direito, e ainda, a certeza e segurança jurídicas;
13ª. E os interesses da comunidade em sede de casamento e respectivo divórcio, assumem particular relevância no todo social, porque o último bule com valores sócio-culturais extremamente enraizados na nossa comunidade, como o sejam os inerentes ao casamento e a um projecto de toda uma vida em comum e de Família, que pode soçobrar, caso a caso nos Tribunais, por mera vontade unilateral (quiça, caprichosa e irreflectida) de apenas um dos cônjuges;
14ª. A subsunção, em cada processo de divórcio, casuística (ad hoc) e subjectiva de factos não previamente tipificados e definidos pela mais Alta Jurisprudência, na alínea d), do art°. 1781°, do C.C., porá em causa a eficácia do direito, a respectiva credibilidade por parte da comunidade nacional, quer na vertente da formação legal daquele (através do Governo ou da Assembleia da República), quer na da sua aplicação a qualquer caso concreto;
15ª. A alínea d), do art°. 1781°, do C.C., leva, rectius, tem levado - como no presente processo e como vem de se demonstrar - a decisão(ões) jurídica(s) que colide(m) com valores sócio-culturais dominantes, como os inerentes ao casamento e à Família dele decorrente, devendo tal(ais) decisão(ões) jurídica(s) ser orientada(s) à luz daqueles valores sócio-culturais, por forma a não suscitarem alarme social e profundos sentimentos de inquietação e insegurança que minem a tranquilidade do casamento e da Família, de maneira a não ficar em causa a eficácia do direito e a sua credibilidade, em casos que têm um invulgar impacto na situação de vida de milhares e milhares de Famílias, sabendo-se que a norma jurídica em questão visa regular o divórcio, existindo assim um interesse geral da comunidade - para além do das aqui partes processuais - que, pela sua peculiar importância, justifica a admissão do presente recurso de Revista excecional, dado que, os interesses em jogo ultrapassam muito significativamente os limites do presente caso concreto;
16ª. A matéria, Venerandos Conselheiros, traz à memória um pequeno passo do Insígne Mestre Eduardo dos Santos (Pai do Doutor Eduardo dos Santos Júnior, Docente da F.D.L na disciplina de Família e Sucessões, recentemente falecido e ainda jovem), in, Nova Lei do Divórcio, Liber, 1978, a págs. 15 e SS., onde, sobre o D.L. n° 496/77, de 25 de Novembro, doutrinou que:
-... Temos, assim, (então) no nosso actual direito um divórcio-sanção (...); um divórcio-malogro (...); um divórcio-remédio (...); e um divórcio-constatação (. . .).
(...)
Em suma, o único divórcio (então) excluído é o divórcio por vontade unilateral ...
Só falta o divórcio administrativo, aliás, uma raridade em todo o mundo.
(...)
Conhecem-se as principais consequências sociais que procedem da liberalização do divórcio ou dele só: aumento da delinquência juvenil, consequência definitivamente apurada; queda do índice de natalidade, consequência mais ou menos apurada; (...). Pelo menos ... ".;
17ª. Nós acrescentaríamos o péssimo rendimento/abandono escolar, a criminalidade juvenil sob diversos tipos criminais, quer nas escolas, quer na comunidade em geral, tudo com os elevadíssimos custos em sede de erário público;
18ª. E divórcio administrativo aquele que já existe nas Conservatórias do Registo Civil, apesar de como que cumulado (terá sido "esquecimento" do legislador na revisão de 2013, do CPC?) com o divórcio e separação sem consentimento do outro cônjuge, previsto nos actºs. 931 ° e 932°, do mesmo Cód. de Processo Civil;
19ª. Em mui douto Acórdão de 23/11/2011 do Colendo Tribunal da Relação de Lisboa, tirado no processo 88110.6TMFUN.L1-2 de Divórcio Sem Consentimento de Um dos Cônjuges - Aresto que constitui Acórdão Fundamento no presente Recurso e para efeito da alínea c), do n° 1, do artº. 672º, do CPC -, deliberou-se brilhantemente que:
- "II. Para efeitos do preenchimento da previsão da alínea d) do art. 1781º do CC, da matéria de facto provada deverá resultar retratada uma determinada situação objectiva em que os factos, pela sua gravidade ou reiteração, mostrem a ruptura definitiva do casamento, não bastando que os factos traduzam um mero acto de vontade de um dos cônjuges, visto o divórcio "a - pedido" por razões subjectivas, não haver sido acolhido nas novas disposições da lei sobre o divórcio.
(…)
IV - 2 - ... delimitação e definição do âmbito da alínea d) do art. 1781° CC no confronto com os factos julgados provados.
Trata-se de um texto legal novo e que contém uma cláusula geral, daí se justificando uma aproximação algo cautelosa ao mesmo.
(…)
Guilherme de Oliveira (A Nova Lei do Divórcio, págs. 13-15), numa relevante contribuição - dada a sua intervenção na delienação da lei que introduziu as alterações - para esclarecimento do que deverá comportar-se na alínea d) do art. 1781º do CC, refere que "o conhecimento da experiência dos sistemas estrangeiros que têm praticado esta via de dissolução mais amplamente do que o nosso país sugere que a utilização da alínea d) do novo 17810 não deve permitir a relevância de factos banais e esporádicos" e que "devem ser factos objectivos capazes de convencer o tribunal de que os laços matrimoniais se romperam e se romperam definitivamente". Adiantando que a redacção da alínea d) poderia ser a seguinte: "d) Quaisquer outros factos que, pela sua gravidade ou reiteração, mostrem a ruptura definitiva do casamento, independentemente da culpa dos cônjuges" e explicando haver "uma razão importante, de natureza sistemática, que sugere a necessidade de uma aplicação exigente da alínea d)" que é a de ela dever "ser feita no contexto, isto é, em harmonia com as alíneas anteriores". "Uma atitude mais condescendente em relação às exigências de prova que a lei definiu para as três primeiras alíneas poderia dar a sugestão de que a alínea d), afinal, poderia servir como um caminho para o divórcio simplesmente a-pedido de um dos cônjuges, por razões subjectivas, ou pelo menos, ficar a meio caminho entre um divórcio-ruptura, por causas objectivas, e um divórcio a-pedido", acrescentando que a história das iniciativas legislativas em torno do divórcio, nos últimos anos, mostra que "o Parlamento não quis acolher um regime de divórcio a-pedido; pretendeu apenas reforçar o sistema de divórcio-ruptura, que se baseia em índices objectivos da falência irreversível do matrimónio ".
Salientando, a propósito, Amadeu Colaço (Novo Regime do Divórcio, págs. 70-72) que o cônjuge que pretenda interpor uma acção com fundamento expresso na alínea d) do art. 1781º "terá que alegar e provar a existência de uma situação objectiva e passível de constatação, que revele uma situação de ruptura definitiva do casamento (a sua falência ou fracasso)" .
... relevante para o caso que nos ocupa a necessidade de nos autos, através da matéria de facto provada, dever resultar retratada uma determinada situação objectiva em que os factos, pela sua gravidade ou reiteração, mostrem a ruptura definitiva do casamento, não bastando para o efeito que os factos traduzam um mero acto de vontade de um dos cônjuges, visto o divórcio "a-pedido" por razões subjectivas, não haver sido acolhido".;
20ª. O Acórdão (fundamento) supra, confirmou/reiterou sentença de primeira instância que julgou improcedente o divórcio;
21ª. Face ao mesmo Acórdão e à doutrina na qual se estribou, concatenando-o com o Acórdão de sinal contrário aqui sob recurso, parece, Venerandos Conselheiros, que por tal via é também por demais evidente e justificada a Revista excecional objecto do presente Recurso, e pelas razões seguintes:
* Alínea d), do art°. 1781°, do CC: compraz-se num conceito aberto e indeterminado que carece de densificação jurisprudencial ao mais alto nível, necessária para melhor aplicação do direito;
* A questão de que factos podem ser subsumidos na mesma alínea, é já controversa na jurisprudência, mormente, no Acórdão da Relação de Lisboa acima citado e no Acórdão objecto do presente recurso;
* Tal subsunção é complexa e implica um importante e detalhado exercício de exegese, que, melhor que ninguém, este Magnífico Supremo Tribunal de Justiça fará no quadro do presente processo;
* A referida alínea é inovadora, nela não estando expressamente previstos os conceitos de gravidade e reiteração, como entende que nela deveriam de estar o doutrinador Guilherme de Oliveira que interveio na delienação da lei que introduziu as mais recentes alterações ao regime do divórcio;
* Um divórcio a-pedido sempre estaria contra os interesses de particular relevância social da nossa comunidade face aos valores sócio-culturais vigentes na mesma em sede de casamento (civil ou católico) e de divórcio;
* A mesma alínea, pela sua indeterminação conceptual, põe em causa a eficácia e a credibilidade do direito, quer na vertente da formação deste, quer na sua aplicação casuística, nomeadamente, por deixar uma excessiva margem de subjectividade analítica ao julgador, e do que sejam factos objectivos que nela se possam subsumir, contra "factos" plenos de subjectividade (no sentido de eventuais sentimentos humanos que objectivamente se não exteriorizam e não se constatam, não podendo por isso constituir meios de "prova" aceitáveis pelo julgador - de internus solus Deus -), que na mesma alínea se não podem subsumir;
* Alínea ainda que leva à prolação de decisões em colisão com valores sócio-culturais dominantes (o casamento e a não admissão de divórcio a-pedido), devendo tais valores orientar aquelas decisões no sentido de não surgir alarme social e inquietação que minem a generalidade das pessoas casadas e das Famílias, por forma a não ficar em causa a eficácia e credibilidade do direito, o que traria como consequências, não só invulgar impacto na vida de quem é casado, como um total esvaziamento do casamento e dos votos e deveres recíprocos que ainda hoje lhe estão subjacentes e inerentes nos termos da lei;
* E na nossa História, os Tribunais, desde tempos seculares, são os Órgãos de Soberania em quem o povo mais confia e aos quais recorre como guardiões que são das legítimas expectativas jurídicas do mesmo povo;
22ª. Analisados criticamente os pontos 3. e 4. dos factos tidos como provados na Sentença de primeira instância e no Acórdão recorrido, não cuida de encontrar-se como é que meras discussões e desentendimentos (mesmo que regulares tão só desde Maio de 2014, num casamento que tem 25 anos de duração - vide, ponto 1. dos factos provados -), discussões e desentendimentos, cujos teores e conteúdos são completamente omissos na matéria provada, portanto desconhecidos, ocorridos entre Recorrida e Recorrente, possam ser factos subsumíveis na alínea d), do art°. 1781°, do CC., como o fizeram a Sentença de primeira instância e o Acórdão recorrido;
23ª. Discussões e desentendimentos, Venerandos Conselheiros, são próprios da natureza humana e da alteridade;
24ª. Cabe in casu a pergunta enfática:
* Como é que discussões e desentendimentos, cujos teores e conteúdos a matéria tida por provada não especifica, ou seja, não precisa terminológica e substancialmente em que é que eventualmente consistiram, entre cônjuges, podem subsumir-se na alínea d), do artº. 1781°, do CC, por forma a concluir-se que "mostram" a ruptura definitiva do casamento sub judice?
25ª. Tais discussões e desentendimentos (não especificados), não podem constituir situação objectiva, que "monstre(m)" a ruptura definitiva do casamento sub judice, tanto mais, que contra a jurisprudência e a doutrina em que se estriba o Acórdão (aqui fundamento e a final junto) da Relação de Lisboa, de 23/11/2011, sob o proc. ° 88/1 0.6TMFUN.L 1-2, o Acórdão recorrido (tal como a Sentença de primeira instância) nada descretearam sobre eventual gravidade ou reiteração das mencionadas discussões e desentendimentos, sendo a decisão da primeira instância e a deliberação da segunda instância, completamente omissas quanto à eventual substância, matéria fáctica, teor, conteúdo ou terminologia que eventualmente pudessem ter estado subjacentes a tais discussões e desentendimentos;
26ª. Por outro lado, as expressões constantes do ponto 3. dos factos provados, como "deixando de ser afectuoso para com ela ,. (a Autora/Recorrida), "provocando-lhe sentimentos de mal-estar, angústia e sofrimento ", são de natureza e de cariz meramente subjectivo (em rigoroso sentido técnico-jurídico), e por isso, nos termos do Acórdão fundamento e da doutrina em que ele se estriba, não podem ser subsumidas na alínea d), do artº. 1781°, do CC, ou seja, são "razões" subjectivas carecidas de valor probatório e que não são acolhidas por aquele normativo legal, por se traduzirem afinal num mero acto de vontade unilateral da Autora/Recorrida em se divorciar;
27ª. Destarte, Venerandos Conselheiros, requerer-se a Vossas Excelências seja o Acórdão recorrido revogado/anulado por vosso douto Acórdão que delibere a improcedência do divórcio sub judice, assim se fazendo uma melhor (in)aplicação da alínea d), do artº. 1781°, do CC.;
28ª. No Acórdão fundamento, para que se aplique a alínea d), do art°. 1781°, do CC, terá que da matéria de facto provada resultar retratada uma determinada situação objectiva em que os factos, pela sua gravidade ou reiteração, mostrem a ruptura definitiva do casamento, não bastando que os factos traduzam um mero acto de vontade de um dos cônjuges, visto o divórcio "a-pedido" por razões subjectivas, não haver sido acolhido nas novas disposições da lei sobre o divórcio;
29ª. O Acórdão recorrido, atendendo aos pontos 3. e 4. da matéria provada, nos quais apenas está como situação objectiva que "Desde (..) Maio de 2014, que o réu discute e se desentende regularmente com a autora, mesmo na presença dos filhos ", e sem que o mesmo Aresto se tenha pronunciado sobre eventual gravidade ou reiteração de tais discussões e desentendimentos, entendeu que tal matéria era subsumível na alínea d), do art°. 1781°, do CC, sem que tenha especificado em que consistiram tais discussões e desentendimentos ou o que esteve materialmente subjacente às mesmas e aos mesmos;
30ª. Acórdão recorrido que à luz dos mesmos pontos da matéria provada, nos quais estão também "razões" de cariz e de natureza subjectiva e abstracta, não constatadas ou constactáveis exteriormente, por isso, inobjectiváveis e insubsumíveis na alínea d), do artº. 1781°, do CC, "razões" como "deixando de ser afectuoso para com ela, provocando-lhe sentimentos de mal-estar, angústia e sofrimento, levando a que esta não pretenda reatar a relação de comunhão de vida", ainda assim (em contradição com o Acórdão fundamento), subsumiu tais "razões" subjectivas no mencionado normativo legal, tendo decidido contra este ao ter deliberado um divórcio a-pedido e sobretudo pela "razão" subjectiva da Autora/Recorrida em não pretender reatar a relação de comunhão de vida;
31ª. Motivos pelos quais, Venerandos Conselheiros, se requer Vossas Excelências se dignem revogar/anular o Acórdão recorrido através de vosso douto Acórdão que delibere a improcedência do divórcio, porque a matéria naquele tida por provada é insubsumível na alínea d), do art°. 1781°, do CC, tanto mais, que, quer em primeira instância, quer em segunda instância, não se fez uma aplicação exigente da referida alínea, ou seja, tal aplicação não foi contextualizada harmoniosamente com as alíneas anteriores do mesmo referido normativo legal, aplicação, portanto, contraditória com o deliberado no Acórdão fundamento;
Conclui pela procedência do recurso, “e em consequência … seja revogado/anulado o Acórdão do Colendo Tribunal da Relação de Lisboa aqui recorrido; Deliberando-se, decorrentemente, a improcedência do divórcio objecto dos autos”.

9. A Recorrida não contra-alegou.

10. Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.


II. Delimitação do objeto do recurso
Como é jurisprudência sedimentada, o objeto do recurso é delimitado em função das conclusões formuladas pelo recorrente, pelo que, dentro dos preditos parâmetros, da leitura das conclusões recursórias formuladas pelo Réu/ora Recorrente decorre que o objeto do presente recurso está circunscrito à questão de saber se se verifica o fundamento de divórcio a que se refere a alínea d) do artigo 1781º do Código Civil.


III. Fundamentação.
1. As instâncias deram como provados os seguintes factos:
1.1. A autora e o réu casaram um com o outro, sem convenção antenupcial no dia 06 de outubro de 1990.
1.2. CC, nascido a ..../1993 e DD, nascida a .../1997, são filhos da autora e do réu.
1.3. Desde (pelo menos) maio de 2014, que o réu discute e se desentende regularmente com a autora, mesmo na presença dos filhos, deixando de ser afetuoso para com ela, provocando-lhe sentimentos de mal-estar, angústia e sofrimento, levando a que esta não pretenda reatar a relação de comunhão de vida com o autor.
1.4. A autora, o réu e os filhos do casal moram juntos na casa sita na ..., em Lisboa, pertença das partes, onde reina o ambiente consequente ao descrito em 3.

2. Do mérito do recurso
2.1. Do Artigo 1781º do Código Civil

Prescreve, sob a epígrafe Ruptura do casamento, o artigo 1781º do Código Civil que:

São fundamento do divórcio sem consentimento de um dos cônjuges:

a) A separação de facto por um ano consecutivo;

b) A alteração das faculdades mentais do outro cônjuge, quando dure há mais de um ano e, pela sua gravidade, comprometa a possibilidade de vida em comum;

c) A ausência, sem que do ausente haja notícias, por tempo não inferior a um ano;

d) Quaisquer outros factos que, independentemente da culpa dos cônjuges, mostrem a ruptura definitiva do casamento.

Nos presentes autos, está em causa a alínea d) citada, sendo este o fundamento legal invocada pela Autora e que obteve acolhimento pelas instâncias.

O atual regime do divórcio foi introduzido no Código Civil pela Lei n.º 61/2008, de 31de outubro.

Conforme consta na Exposição de motivos do Projeto de Lei n.º 509/10, que esteve na origem daquele diploma, procurou-se adaptar o regime jurídico do divórcio a uma visão atual do matrimónio, tido como espaço de vida a dois assente fundamentalmente no laço afetivo: “decorrendo do princípio da liberdade, ninguém deve permanecer casado contra sua vontade ou se considerar que houve quebra do laço afectivo. O cônjuge tratado de forma desigual, injusta ou que atente contra a sua dignidade deve poder terminar a relação conjugal mesmo sem a vontade do outro.

(…) Elimina-se a modalidade de divórcio por violação culposa dos deveres conjugais – a clássica forma de divórcio-sanção – que tem sido sistematicamente abandonada nos países europeus por ser, em si mesma, fonte de agravamento de conflitos anteriores, com prejuízo para os ex-cônjuges e para os filhos; o divórcio não deve ser uma sanção. O cônjuge que quiser divorciar-se e não conseguir atingir um acordo para a dissolução, terá de seguir o caminho do chamado “divórcio ruptura”, por “causas objectivas”, designadamente a separação de facto. E nesta modalidade de divórcio, ao contrário do que hoje acontece, o juiz nunca procurará determinar e graduar a culpa, para aplicar sanções patrimoniais; afastam-se agora também estas sanções patrimoniais acessórias. As discussões sobre culpa, e também sobre danos provocados por actos ilícitos, ficam alheias ao processo de divórcio. Encurtam-se para um ano os prazos de relevância dos fundamentos do divórcio sem consentimento de um dos cônjuges. Se o sistema do “divórcio ruptura” pretende reconhecer os casos em que os vínculos matrimoniais se perderam independentemente da causa desse fracasso, não há razão para não admitir a relevância de outros indicadores fidedignos da falência do casamento. Por isso, acrescenta-se uma cláusula geral que atribui relevo a outros factos que mostram claramente a ruptura manifesta do casamento, independentemente da culpa dos cônjuges e do decurso de qualquer prazo. O exemplo típico, nos sistemas jurídicos europeus, é o da violência doméstica – que pode mostrar imediatamente a inexistência da comunhão de vida própria de um casamento”.

“O abandono do fundamento da culpa é, aliás, ponto de convergência na legislação europeia como se pode ler na obra atrás citada: “A eliminação a qualquer referência à culpa é consistente com a evolução da lei e da prática nos sistemas legais europeus analisados. Em muitos desses sistemas a culpa foi abandonada. Mesmo os poucos que, de forma parcial, a mantém muitas vezes na prática evoluíram na direcção do divórcio sem culpa. De qualquer dos modos é difícil atribuir culpa apenas a um dos cônjuges” (in Boele-Woelki et al. (2004), Principles of European Family Law Regarding Divorce and Maintenance Between Former Spouses, Commission on European Family Law, Antwerp-Oxford, Intersentia, p.55)”.

- Do citado Projeto Lei nº509/X -

Assim, ao “divórcio-sanção”, em que se procurava apurar a quem cabia a culpa da dissolução do vínculo conjugal, sucede o “divórcio-rutura”, em que “a invocação da ruptura definitiva da vida em comum deve ser fundamento suficiente para que o divórcio possa ser decretado”, sem a carga estigmatizadora e punitiva inerente ao apuramento da culpa.

O divórcio sem consentimento do outro cônjuge assentará em causas objetivas, que manifestem uma situação de rutura definitiva da relação conjugal, traduzida não só num determinado período de afastamento dos cônjuges (separação de facto), mas também noutros factos que indiciem claramente, de acordo com a cláusula geral prevista na alínea d) do artigo 1781.º do Código Civil, o fim do vínculo matrimonial, o que encontrava defensores na doutrina antes da reforma efectuada.

Assim, Pereira Coelho e Guilherme Oliveira afirmavam “A utilização de uma cláusula geral é o sistema que vem a ser consagrado nas legislações mais recentes e na verdade afigura-se o preferível. A enumeração legal das causas do divórcio traduzia, no fundo, o carácter repressivo e penal de que o divórcio se revestia na teoria clássica do divórcio-sanção. Era, de alguma maneira uma expressão do princípio nullum crimen sine lege: a “pena” do divórcio só devia ser imposta aos ilícitos conjugais como tais tipificados na lei. Abandonada a teoria do divórcio-sanção, não havia porém razão para que o sistema do numerus clausus das causas do divórcio permanecesse. A violação dos deveres conjugais podem revestir formas tão variadas que qualquer catálogo é necessariamente deficiente. De resto, a lição do direito comparado ensina-nos que as poucas legislações que se mantêm fiéis ao sistema do numerus clausus não se dispensam, quase todas, de inserir na lista uma cláusula geral, o que torna o sistema confuso.”

(in Curso de Direito da Família, 4ª edição, págs.619/620)

O legislador, com a nova “lei”, pretendeu afastar definitivamente o modelo que se baseava na ideia de divórcio-sanção e substituiu-o pelo chamado divórcio-constatação, divórcio-fracasso, divórcio-falência ou divórcio rutura, partindo do pressuposto que a relação matrimonial se fundamenta em exclusivo no afeto e que desaparecendo o afeto entre os cônjuges desaparece a razão de ser da relação matrimonial, justificando reconhecer a vontade da pessoa quando já não pretende continuar vinculada ao seu cônjuge, respeitando o livre desenvolvimento da personalidade garantido no artigo 26º da CRP e daí que na Exposição de motivos da Lei se expresse claramente:

“É o facto de a dimensão afectiva da vida se ter tornado tão decisiva para o bem estar dos indivíduos que confere à conjugalidade particular relevo. Sendo esta decisiva para a felicidade individual, tolera-se mal o casamento que se tornou fonte persistente de mal-estar. Assim, é a importância do casamento e não a sua desvalorização que se destaca quando se aceita o divórcio. Daqui decorre também que importa evitar que o processo de divórcio, já de si emocionalmente doloroso, pelo que representa de quebra das expectativas iniciais, se transforme num litígio persistente e destrutivo com medição de culpas sempre difícil senão impossível de efectivar”.

- Do Projeto Lei nº509/X –

E adotou claramente a ideia do “divórcio-ruptura, ao afirmar o princípio de que a dissolução do casamento pode sempre fundar-se na ruptura definitiva do matrimónio, e de que esta ruptura pode ser demonstrada através da prova de quaisquer factos (alínea d)).

Dito de outro modo, a ruptura do casamento não é relevante apenas quando se provam as “causas determinadas” pela lei (das alíneas a), b) e c)), mas também noutras situações que não são especificadamente previstas.

(…) O conhecimento da experiência dos sistemas estrangeiros que têm praticado esta via de dissolução mais amplamente de que o nosso país sugere que a utilização da alínea d) do novo art.1781º não deve permitir a relevância de factos banais e esporádicos.

Os factos a que os sistemas jurídicos dão relevo devem ser factos capazes de convencer o tribunal de que os laços matrimoniais se romperam, e se romperam definitivamente. A importância dos factos mencionados pela jurisprudência estrangeira pode chegar ao atentado contra direitos fundamentais de um cônjuge, ou atingir um patamar de gravidade ostensiva capaz de revelar claramente o fim do matrimónio”

(Guilherme de Oliveira, in A Nova Lei do Divórcio, págs.13/14 – Lex Familiae)

De tudo o que se referiu, o que é determinante para que se verifique o fundamento previsto na alínea d) do artigo 1781º do Código Civil é que, perante os factos provados, se possa concluir com segurança que o vínculo conjugal está destruído, e que essa situação não é transitória, mas consolidada, e sem quaisquer perspetivas de ser ultrapassada, isto é que se está perante uma rutura definitiva do casamento.

2.2. O caso presente

Como se referiu atrás, a Autora intentou a presente ação de divórcio sem consentimento do outro cônjuge, invocando como fundamento legal o disposto na alínea d) do artigo 1781º do Código Civil.
O Tribunal de 1ª instância veio a julgar procedente a ação, que, perante o recurso de apelação interposto pelo Réu, veio a ser confirmado pelo Tribunal da Relação de Lisboa.
Inconformado, ainda, com esta decisão, o Réu veio interpor este recurso de revista.

Encontra-se provado no que, para o caso, importa:

1.3. Desde (pelo menos) maio de 2014, que o réu discute e se desentende regularmente com a autora, mesmo na presença dos filhos, deixando de ser afetuoso para com ela, provocando-lhe sentimentos de mal-estar, angústia e sofrimento, levando a que esta não pretenda reatar a relação de comunhão de vida com o autor.
1.4. A autora, o réu e os filhos do casal moram juntos na casa sita na Avenida de Roma, n° 77, r/c Esq., em Lisboa, pertença das partes, onde reina o ambiente consequente ao descrito em 3.

Importa ter em consideração que a situação dada como provada ocorre, pelo menos, desde maio de 2014, sendo certo a ação foi intentada em 10 de novembro de 2014 (cerca de 6 meses depois) e que a audiência de julgamento (produção de prova) ocorreu em 11 de novembro de 2015, isto é, 1 ano de 6 meses depois do início dos comportamentos relatados.

Ora, o facto de o Réu discutir com a Autora e de se desentender, mesmo na presença dos filhos da Autora e do Réu, deixando este de ser afectuoso para com a Autora, provocando-lhe sentimentos de mal-estar, angústia e sofrimento ao longo deste tempo de cerca de 1 ano e 6 meses, e que não foram ultrapassados, é demonstrativo da inexistência de qualquer proximidade afetiva entre a Autora e o Réu.
Assim, o casamento deixou de constituir o centro de realização pessoal da Autora e que deixou de haver afeto entre a Autora e o Réu.
Atendendo a toda a situação de conflito existente, e perante o mal-estar, angústia e sofrimento que o Réu lhe aflige, a Autora não pretende reatar a relação de comunhão de vida com o Autor.
Tudo isto é demonstrativo de que a situação não é passageira e que se está perante um vínculo conjugal desfeito, não tendo quaisquer perspetivas de ser ultrapassada; isto é, estamos em presença de uma rutura definitiva do casamento.
Voltando à Exposição de Motivos do Projeto de Lei nº509/X, “Dada a centralidade dos afectos para o bem-estar dos indivíduos, passou a considerar-se que em caso de persistente desentendimento no casamento os indivíduos não seriam obrigados a manter a qualquer preço a instituição. Assume-se, aliás, ser difícil construir a harmonia familiar sobre o sacrifico e o mal-estar de algum dos seus membros. Aceitar o divórcio passou a ser sinal, não de facilitismo, mas de valorização de uma conjugalidade feliz e conseguida.”

Deste modo, encontra-se provado o fundamento de divórcio, nos termos da alínea d) do artigo 1781º do Código Civil, pelo que o recurso não merece provimento.
IV. Decisão
Posto o que precede, nega-se a revista, confirmando-se o acórdão recorrido.

As custas ficam a cargo do Recorrente.

Lisboa, 9 de janeiro de 2018
(Processado e integralmente revisto pelo relator, que assina e rubrica as demais folhas)




(António Pedro de Lima Gonçalves)
(João Cabral Tavares)
(Maria de Fátima Gomes)